Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
04P1578
Nº Convencional: JSTJ000
Relator: PEREIRA MADEIRA
Descritores: LEGITIMIDADE
Nº do Documento: SJ200405200015785
Data do Acordão: 05/20/2004
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: T REL LISBOA
Processo no Tribunal Recurso: 8546/02
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REC FIXAÇÃO JURIS.
Decisão: REJEITADO O RECURSO.
Sumário : Diversamente do que acontece com o «recurso ordinário» (cuja legitimidade activa se dispersa entre o Ministério Público, o arguido, o assistente, as partes civis, aqueles que tiverem sido condenados ao pagamento de quaisquer importâncias e aqueles que tiverem a defender um direito afectado pela decisão), só gozam de legitimidade para o «recurso extraordinário de fixação de jurisprudência» «o Ministério Público, o arguido, o assistente ou as partes civis».
Decisão Texto Integral: Acordam no Supremo Tribunal de Justiça

1. No processo de inquérito pendente no 2.º Juízo do TIC de Lisboa, em que é queixoso por alegada prática de crime de difamação e injúrias - art.ºs 180.º e 181.º do Código Penal - o advogado Dr. VMMSP e denunciados JMR, MGGS e ARA, todos devidamente identificados, o denunciante, pretendendo exercer patrocínio em causa própria, requereu a sua constituição como assistente.
Porém, o respectivo o juiz considerando que o requerente haveria de estar representado por outro advogado, mandou notificá-lo «para, em oito dias, juntar procuração a mandatário judicial».
O participante requereu então a rectificação daquela decisão judicial, mas, por despacho de 26/04/02, foi tal requerimento indeferido e mantido o anterior despacho a ordenar o constituição de mandatário judicial no prazo de oito dias, «sob pena de lhe ser indeferido o pedido de constituição como assistente».
Notificado desta nova decisão, o participante queixoso juntou uma alegada «procuração» em que se constitui a si próprio como procurador...[de si próprio].
Foi então tal documento mandado desentranhar e proferido novo despacho, em 7/6/02, a indeferir a requerida constituição como assistente.
Inconformado, recorreu então o Dr. SP à Relação de Lisboa, deste despacho do JIC.
O recurso, porém, foi rejeitado pela Relação com base em extemporaneidade e irrecorribilidade, já que, segundo ali foi entendido, este último despacho do JIC mais não foi que execução dos anteriores, mormente da cominação que lhe fora imposta no primeiro despacho referido (a mandar juntar procuração a outro advogado), despacho aquele que, por inatacado, foi deixado transitar em julgado.
Com a alegação de que tal acórdão da Relação de Lisboa está em contradição com outro da Relação do Porto, segundo o qual «não existe, à partida, qualquer impedimento legal ao exercício do seu próprio patrocínio judiciário [de um advogado como assistente]», interpôs o presente recurso extraordinário para fixação de jurisprudência, que, segundo alega, o deve ser no sentido deste último aresto.
O Ex.mo Procurador-Geral Adjunto, na vista que teve do processo, pronunciou-se pela imediata rejeição do recurso, já que o acórdão recorrido não se pronunciou sobre a questão indicada e decidida no acórdão tido como fundamento.
Cumprido o disposto no artigo 417.º, n.º 2, do Código de Processo Penal, não foi apresentada qualquer resposta.
2. Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.
O recurso não pode, efectivamente, deixar de ser rejeitado.
Com efeito, como assinala o Ex.mo Procurador-Geral Adjunto, não existe sequer afinidade entre os dois arestos em confronto, já que o que se decidiu no acórdão ora recorrido - rejeição por extemporaneidade ou irrecorribilidade da decisão - não afronta directamente o que se decidiu no acórdão fundamento - possibilidade de um advogado intervir, em processo penal, como assistente, em causa própria.
Haveria oposição, sim, acaso no acórdão ora recorrido se tivesse afirmado a impossibilidade legal de um advogado - no caso o requerente - não poder intervir em causa própria, em processo penal, na qualidade de assistente, necessitando, para o efeito, de constituir outro mandatário.
Mas não. O Acórdão recorrido ao limitar-se a rejeitar o recurso com os fundamentos indicados, não é exactamente o «oposto» do outro, como é reclamado, nomeadamente, pelo artigo 437.º, n.º 2, do Código de Processo Penal.
Assim, falece aquele pressuposto processual de admissibilidade do recurso extraordinário em causa.
De resto, tal como foi decidido por este Supremo Tribunal, por Acórdão de 22/4/04, proferido no recurso n.º 3552/03-5, com o mesmo relator e em que, curiosamente, também figurava o mesmo o recorrente, «diversamente do que acontece com o «recurso ordinário» (cuja legitimidade activa se dispersa entre o Ministério Público, o arguido, o assistente, as partes civis, aqueles que tiverem sido condenados ao pagamento de quaisquer importâncias e aqueles que tiverem a defender um direito afectado pela decisão - art.º 401.º do Código de Processo Penal), só gozam de legitimidade para o «recurso extraordinário de fixação de jurisprudência» «o Ministério Público, o arguido, o assistente ou as partes civis» (art.º 437.º, n.º 1).»
«(...) Ora, o aqui recorrente não é «assistente». E se, oportunamente, foi admitido a recorrer «ordinariamente», ao abrigo de norma específica do art. 401.º do Código de Processo Penal, foi-o como titular de «um direito [de se constituir assistente] afectado pela decisão». Só que esses «não sujeitos processuais» não gozam - como se viu - de legitimidade (compreensivelmente constrita) para o «recurso extraordinário de fixação de jurisprudência».
«(...) Com o seu pedido (apesar de indeferido ...) de intervenção como assistente no processo criminal e com o recurso ordinário (ainda que julgado improcedente) que a lei processual lhe facultou para defesa do direito que aquela decisão possa ter afectado, ficaram assegurados e esgotados os seus direitos constitucionais de «acesso ao direito» e de «tutela jurisdicional efectiva», mediante «processo equitativo», dos seus «direitos e interesses legalmente protegidos» (art.º 20.º da Constituição).»
No caso, a situação de facto é em tudo semelhante, pelo que, pelos mesmos fundamentos, o recurso tem de ser rejeitado.
Na verdade, com ou sem assistência de (outro) advogado, no caso em apreço o recorrente só estaria legitimado para mover o recurso extraordinário de que lançou mão, sendo assistente, o que não se verifica.
3. Tudo visto, o Supremo Tribunal de Justiça, concluindo, em conferência, pela inexistência de relevante oposição de julgados e pela ilegitimidade do recorrente Dr. VSP, rejeita o seu recurso extraordinário de fixação de jurisprudência (art.º 441.º, n.º 1, do Código de Processo Penal).
Custas pelo recorrente com taxa de justiça que se fixa em 5 unidades de conta.

Supremo Tribunal de Justiça, 20 de Maio de 2004.
Pereira Madeira
Santos Carvalho
Costa Mortágua
Costa Pereira