Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça | |||
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| Nº Convencional: | 3.ª SECÇÃO | ||
| Relator: | LOPES DA MOTA | ||
| Descritores: | CONCURSO DE INFRAÇÕES CONHECIMENTO SUPERVENIENTE CULPA PREVENÇÃO ESPECIAL INTERNAMENTO HOSPITALAR PENA DE PRISÃO PENA ÚNICA DETERMINAÇÃO DA MEDIDA DA PENA | ||
| Data do Acordão: | 10/01/2025 | ||
| Votação: | UNANIMIDADE | ||
| Texto Integral: | S | ||
| Privacidade: | 1 | ||
| Meio Processual: | RECURSO PENAL | ||
| Decisão: | PROVIDO EM PARTE | ||
| Sumário : | I – Obtida a moldura penal do concurso nos termos do art.º 77.º, n.º 2, do CP, o tribunal determina a pena única, conjunta, seguindo os critérios da culpa e da prevenção (artigo 71.º do CP) e o critério especial fixado na segunda parte do n.º 1 do mesmo preceito, considerando, em conjunto, os factos e a personalidade do agente, incluindo as circunstâncias relativas às condições económicas e sociais deste, reveladoras das necessidades de socialização, a sensibilidade à pena, a suscetibilidade de por ela ser influenciado e as qualidades da personalidade manifestadas no facto, nomeadamente a falta de preparação para manter uma conduta lícita. III – Se o grau de censurabilidade dos factos (de culpa), avaliado com referência à data em que os crimes foram cometidos, é particularmente elevado, já o mesmo não ocorre no que respeita às circunstâncias que, na determinação da medida da pena, são de ponderar por via da prevenção, com referência ao momento da aplicação desta, em conhecimento superveniente do concurso (art.º 78.º do CP). IV – As razões que justificam a modificação da execução da pena de prisão (art.º 118.º do CEPMPL), a cumprir em regime de internamento em estabelecimento de saúde ou de acolhimento adequado, tendo em conta as graves, irreversíveis e incapacitantes condições de saúde descritas, permitem que, na fundamentação de um juízo de prognose sobre o cometimento de novos crimes, atualmente se devam considerar significativamente reduzidas as exigências de prevenção especial. V – Assim, considerando, em conjunto, a gravidade dos factos, evidenciada pela reiteração de comportamentos a revelarem tendência para a prática de atos de idêntica natureza, e pelo elevado impacto financeiro das suas consequências a que se refere um dos processos, bem como as caraterísticas de personalidade neles manifestada e as atuais circunstâncias pessoais reveladoras de acentuada diminuição das exigências de ressocialização, nos termos dos artigos 71.º e 77.º do CP, mostra-se justificada uma intervenção corretiva na medida da pena única, que se reduz para 7 anos de prisão, por, nesta medida, se afigurar mais conforme aos critérios de adequação e proporcionalidade legalmente impostos. | ||
| Decisão Texto Integral: | Acordam na 3.ª Secção do Supremo Tribunal de Justiça: I. Relatório 1. AA, arguida no processo em epígrafe, recorre do acórdão de 28.06.2014 do Juízo Central Criminal de Lisboa, Juiz 13, do Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa que, em conhecimento superveniente do concurso de crimes, procedeu ao cúmulo jurídico das penas aplicadas nos processos 703/20.3TELSB (presentes autos), 871/17.1T9GRD e 252/19.2GDSTB, condenando-a na pena única de 8 (oito) anos de prisão pela prática de crimes de peculato, branqueamento, falsificação ou contrafação de documento, usurpação de funções e de burla, e determinando que o cumprimento do tempo de prisão que lhe falta cumprir seja executado em regime de internamento em estabelecimento de saúde ou de acolhimento adequado, a identificar pela DGRSP. 2. Discordando da medida da pena aplicada, apresenta motivação de que extrai as seguintes conclusões (transcrição): «1. A ora recorrente foi condenada numa pena ÚNICA de 8 anos de prisão efectiva, em sede de cúmulo jurídico, que englobou os processos n.º 871/17.1G9GRD que correu termos no Juízo Local Criminal de Guarda – Juiz 2, com a prática de factos em Julho de 2017, com sentença proferida em 14/05/2021 e trânsito em julgado em 13/09/2021 em pena de prisão efectiva de 2 anos e 6 meses, pelo crime de usurpação de funções, tendo a mesma sido extinta por cumprimento no dia 14/10/2023, Processo n.º º 703/20.3TELSB que correu termos no Juízo Central de Lisboa – Juiz 13, com a prática de factos em Novembro de 2020, com sentença proferida em 10/10/2023 e trânsito em julgado em 22/02/2024 em pena de prisão efectiva de 4 anos, pelo crime de peculato e crime de branqueamento de capitais e processo n.º 252/19.2 GDSTB que correu termos no Juízo Local Criminal – Juiz 3, com a prática de factos em Março de 2019, com trânsito em julgado em 18/10/2023, em pena de prisão efectiva de 16 meses, pelo crime de burla simples e falsificação ou contrafacção de documento. 2. No entendimento da recorrente, quanto à determinação da medida da pena, o Tribunal “a quo” não fez boa apreciação e utilização da prova produzida em Audiência de Discussão e Julgamento, e demais elementos constantes nos autos, que impunham uma pena única diversa da que ora se recorre. 3. E há agora que tentar o que a lei processual portuguesa não proíbe, que é a apreciação por este Tribunal dos critérios que fundamentam a determinação da pena a aplicar à Recorrente. 4. Ora, o Tribunal “a quo”, no entender da Recorrente, violou claramente os artigos 40.º n.º 1, e 71.º n.º 1 e 2 do Código Penal, ao lhe ter aplicado uma pena única de prisão de 8 anos, em sede de cúmulo, pena esta que se considera excessiva e desproporcional para os fins cominados pelo legislador em matéria de reintegração social. 5. Extrai-se do art. 40º n.º 1 que a aplicação das penas visa a protecção dos bens jurídicos e a reintegração do agente na sociedade. 6. Ora, de acordo com o que resulta do Relatório Social elaborado pela DGRSP em 07/05/2024: • “Nos últimos anos e à data da sua reclusão (D/M/2021) AA disse ter exercido a profissão de conselheira e consultora financeira por conta própria, tendo trabalhado num escritório em ...”. • “A arguida equaciona o futuro de modo a prosseguir com a sua actividade de voluntaria para com a Associação ..., que disse manter ligação há mais de 30 anos. Nessa contextualização mesmo perante os seus condicionalismos físicos, devido à sua situação de saúde, dentro do possível mantém o seu contributo, disse também que manteve contacto com a paróquia da sua residência”. • “Quanto à sua situação socioeconomica e da sua sustentabilidade referiu que requereu a sua reforma ao ..., do período que trabalhou, do que foi fatível inferir desde os 18 anos aos 30 anos em diante. Nessas circunstâncias disse poder beneficiar de uma reforma que garante a sua sobrevivência de um modo seguro.” • “No que concerne ao presente processo, AA demonstrou sentido crítico face ao ilícito de que vem acusada.” • “O facto de enfrentar a presente situação com uma aparente maturidade e ajustamento comportamental é um factor positivo.” • “Podemos ainda referir como factores favoráveis os laços familiares afectivos, de apoio e interajuda, em particular com o seu afilhado e seu amigo, Sr. BB. Assim como estar a conseguir estabilizar e consolidar o relacionamento com seu filho.” 7. Resulta deste Relatório Social - assim como das declarações da Arguida prestadas em sede de cumulo jurídico -, que a Recorrente nos últimos anos e até à data da sua reclusão exerceu a profissão de conselheira e consultora financeira, que requereu a sua reforma no ... que lhe garante a sua sobrevivência de um modo seguro, e que a Recorrente se encontra reintegrada na sociedade, a nível social e familiar, pelo que o Tribunal “a quo” ao não ter em consideração esta reintegração, violou o artigo 40.º n.º 1 do Código Penal. 8. Resulta ainda do Relatório Social que a Recorrente tem consciência crítica dos crimes que foi condenada, e que interiorizou a sua conduta, resultando ainda da douta decisão recorrida a este respeito - atenta as declarações da Arguida prestadas em sede de cúmulo jurídico - o seguinte: “A seu favor a circunstância de parte dos prejuízos terem sido ressarcidos, cumprindo com as obrigações de pagamento impostas, mostrando-se a arguida disponível a proceder à liquidação integral daquelas.” E ainda que: “A arguida pretende ressarcir os prejuízos causados liquidando as quantias com que se locupletou” - circunstâncias estas que também não foram relevadas pelo Tribunal “a quo”, em clara violação do art. 71.º n.º 2 do Código Penal. 9. Pelo supra exposto, e atenta todas as circunstâncias invocadas, entende-se que uma pena única de 8 anos de prisão, resultante de cúmulo, numa moldura penal de 3 anos a 9 anos e 11 meses, é deveras excessiva e desproporcional para os fins cominados pelo legislador em matéria de reintegração social, para além de que esta pena resulta num agravamento de dois meses de pena a cumprir, em comparação com o tempo que a arguida teria para cumprir se não tivesse requerido o cúmulo jurídico, o que viola um dos princípios gerais de direito penal, enquanto garantia de defesa, constitucionalmente consagrado no art. 32.º n.º 1 da CRP. 10. Como tal, entende-se que a aplicação de uma pena única de prisão não superior a 6 anos, lograria alcançar melhor os objectivos que a qualquer pena se impõe, que é a de prevenir que a conduta objecto de punição se volte a repetir, e de permitir a ressocialização e reintegração da recorrente na sociedade. Termos em que e nos demais de Direito que V. Exas mui doutamente suprirão, deve o presente recurso ser admitido e merecer provimento, e nesses termos ser revogado parcialmente o douto acórdão no que concerne à al. a) e substituído por outro que proceda ao cúmulo jurídico das penas numa pena única de prisão não superior a 6 anos.» 3. Respondeu o Ministério Público, concluindo que «não se vislumbra a existência de qualquer violação das normas que regem a determinação da medida concreta da pena, nomeadamente os artigos 40.º, 70.º, 71.º, 77.º, 78.º, todos do Código Penal, os quais foram devida e criteriosamente aplicados, não merecendo o acórdão qualquer censura». 4. Os autos foram remetidos ao Tribunal da Relação de Lisboa, onde o Senhor Juiz Desembargador Relator o declarou incompetente e determinou a remessa do processo a este Supremo Tribunal de Justiça por o recurso, tendo por objeto uma decisão de aplicação de pena superior a 5 anos, visar exclusivamente matéria de direito (artigos 432.º, n.º1, al. c), e 434.º do CPP). 5. Recebidos, foram os autos com vista ao Ministério Público, nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 416.º, n.º 1, do CPP, tendo o Exmo. Procurador-Geral Adjunto emitido parecer em que conclui: «(…) Verifica-se, no entanto, que a factualidade provada não contém qualquer alusão aos antecedentes criminais da arguida [pese embora se escreva na fundamentação do acórdão que «foi considerado o teor do certificado de registo criminal junto aos autos sob a referência 39252515» (página 20 do ficheiro pdf do acórdão)] nem tampouco aos abonatórios ressarcimento parcial dos prejuízos causados e cumprimento das «obrigações de pagamento impostas». Essa falha, que resulta do texto do acórdão recorrido, comprometendo a possibilidade de ajuizar se a pena única impugnada é justa e adequada, traduz-se numa insuficiência para a decisão da matéria de facto provada, vício previsto no artigo 410.º, n.º 2, alínea a), do Código de Processo Penal, que consiste numa «lacuna no apuramento da matéria de facto indispensável para a decisão de direito, isto é, quando se chega à conclusão de que com os factos dados como provados não era possível atingir-se a decisão de direito a que se chegou, havendo assim um hiato nessa matéria que é preciso preencher. Ou, como vem considerando o Supremo Tribunal de Justiça, (…) quando há "omissão de pronúncia, pelo tribunal, sobre factos alegados ou resultantes da discussão da causa que sejam, relevantes para a decisão, ou seja, a que decorre da circunstância de o tribunal não ter dado como provados ou como não provados todos os factos que, sendo relevantes para a decisão, tenham sido alegados pela acusação e pela defesa ou resultado da discussão"» (Simas Santos e Leal-Henriques, Recursos em Processo penal, 6.ª edição, 2007, Editora Rei dos Livros, página 69). Desta forma, sendo «oficioso, pelo tribunal de recurso, o conhecimento dos vícios indicados no artigo 410.º, n.º 2, do Código de Processo Penal, mesmo que o recurso se encontre limitado à matéria de direito» (acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de fixação de jurisprudência n.º 7/95, publicado no Diário da República, I série-A, n.º 298, de 28 de dezembro de 1995), só nos resta emitir parecer em ordem ao reenvio do processo para novo julgamento restrito às referidas questões de facto (artigo 426.º, n.º 1, do Código de Processo Penal), devendo o tribunal coletivo proceder ainda à retificação do ponto de facto provado n.º 3 (artigo 380.º, n.º 1, alínea b), do Código de Processo Penal).» 6. Notificada para responder, nos termos do artigo 417.º, n.º 2, do CPP, a arguida nada disse quanto ao parecer do Ministério Público. Posteriormente, veio em requerimento por si subscrito, pedir a «retificação» do decidido por alegada não inclusão da pena de um outro processo nas operações de cúmulo jurídico, o que, por inadmissibilidade processual, não pode ser atendido. 7. Colhidos os vistos e não tendo sido requerida audiência, o recurso é julgado em conferência – artigos 411.º, n.º 5, e 419.º, n.º 3, alínea c), do CPP. Nada obsta ao conhecimento do recurso, o qual tem por objecto um acórdão proferido pelo tribunal coletivo que aplicou uma pena de prisão superior a 5 anos e visa exclusivamente o reexame de matéria de direito, da competência deste tribunal (artigo 432.º, n.º 1, al. c), do CPP). Cumpre decidir. II. Fundamentação 8. A decisão recorrida encontra-se fundamentada nos seguintes termos: 8.1. Fundamentação de facto: «II. Matéria de Facto Da decisão proferida nestes autos, e das certidões das decisões proferidas nos processos abaixo identificados, certificado de registo criminal da arguida e relatório social elaborado pela DGRSP, resultou provado que: 1. Por sentença de 10.10.2023, transitada em julgado a 22.02.2024, proferida nestes autos de Proc. 703/20.3TELSB, a arguida foi condenada pela prática, em co-autoria, de: - 1 (um) crime de peculato, p.p. pelo art. 375º, nº 1 do Código Penal, na pena de 3 (três) anos de prisão, e - 1 (um) crime de branqueamento, p.p. pelo art. 368º-A, nº 1, al. k) e nº 3, do Código Penal, na pena de 2 (dois) anos e 6 (seis) meses de prisão, praticados em novembro de 2020. Pela prática dos seguintes factos: “1) A W..., Lda” é uma sociedade comercial por quotas, com sede na Rua 1 2) O seu capital social está distribuído pelos sócios CC com 13% das quotas; DD com 13% das quotas; e “W..., S.A.” com 74% das quotas. 3) Por sentença datada de 13.11.2017, proferida no Processo n.º 2508/17.0T8PDL do Juízo Local Cível de Ponta Delgada - Juiz 4, foi declarada a insolvência da sociedade “W..., Lda”. 4) Por despacho datado de 17.04.2018, proferido no Processo n.º 2508/17.0T8PDL, foi nomeado EE como administrador de insolvência da sociedade “W..., Lda”. 5) Nessa qualidade, estava sujeito ao cumprimento dos deveres previstos no Estatuto do Administrador Judicial nomeadamente o dever de «no exercício das suas funções e fora delas, considerar-se servidores da justiça e do direito e, como tal, mostrar-se dignos da honra e das responsabilidades que lhes são inerentes»… 6) …bem como o dever de, no exercício das suas funções, «atuar com absoluta independência e isenção, estando-lhes vedada a prática de quaisquer atos que, para seu benefício ou de terceiros, possam pôr em crise, consoante os casos, a recuperação do devedor, ou, não sendo esta viável, a sua liquidação, devendo orientar sempre a sua conduta para a maximização da satisfação dos interesses dos credores em cada um dos processos que lhes sejam confiados». 7) Correspondendo assim o desempenho desse cargo de administrador de insolvência ao exercício de uma função pública jurisdicional. 8) No âmbito dessas suas funções, o arguido EE procedeu a abertura de uma conta bancária na agência/balcão de ... do -C..., Lda.”, cujo IBAN é PT50..........................5. 9) Sendo que, enquanto administrador de insolvência daquela sociedade, o arguido EE era a única pessoa autorizada a movimentar tal conta bancária. 10) Em 30.10.2020, à conta bancária da massa insolvente da sociedade “W..., Lda” estavam associadas duas aplicações financeiras. 11) A primeira consistia num “Depósito Standard” com o n.º ........45, no valor de € 1.304.070,64 (um milhão trezentos e quatro mil e setenta euros e sessenta e quatro cêntimos) por um prazo de 180 dias, com uma taxa de juro de 0,01% e vencimento previsto para 14.11.2020. 12) E a segunda consistia num “Depósito Standard” com o n.º º ........69, no valor de € 5.100.4517,08 (cinco milhões e cem mil quatrocentos e dezassete euros e oito cêntimos) por um prazo de 184 dias, com uma taxa de juro de 0,01% e vencimento previsto para 15.03.2021. 13) Por manter contactos regulares com CC, que tinha sido contabilística certificado da sociedade insolvente e era filho do sócio-gerente, a arguida AA teve conhecimento da existência dos supra referidos depósitos. 14) Sabendo da existência de tais quantias, a arguida AA, encontrou-se com o arguido EE no dia 17.11.2020 e, aproveitando-se do facto do primeiro ser administrador de insolvência da “W..., Lda” e poder movimentar livremente a sua conta bancária, propôs-lhe que aquele lhe entregasse € 4.000.000,00 (quatro milhões de euros) da massa insolvente para investir. 15) De acordo com essa proposta, dos 4.000.000,00 (quatro milhões de euros) que lhe seriam transferidos a arguida AA apenas utilizaria € 3.000.000,00 (três milhões de euros) que seriam destinados ao financiamento de duas farmácias exploradas por CC e ao exercício do direito de remição relativamente a um imóvel da família Ponte. 16) Já quanto ao € 1.000.000,00 (um milhão de euros) remanescente, apesar de passar também pela conta bancária da arguida AA, este seria desde logo destinado ao arguido EE que apenas teria de indicar-lhe a(s) conta(s) bancária(s) para onde queria que o dinheiro fosse a final transferido. 17) Além disso, a arguida AA disse ao arguido EE que ao fim de um período máximo de 8 (oito) meses, com a venda do património imobiliário da família Ponte, seriam restituídos à massa insolvente acrescidos de juros de 3%, pelo que jamais alguém suspeitaria que aquele se tinha apropriado de € 1.000.000,00 (um milhão de euros) pertencente à massa insolvente da sociedade “W..., Lda.”. 18) Aliciado por tal proposta e convencido de que se conseguiria apropriar de € 1.000.000,00 (um milhão de euros) da massa insolvente sem que os credores alguma vez se apercebessem, o arguido EE aceitou a proposta da arguida AA. 19) Assim, no dia 18.11.2020 foi outorgado um contrato de mútuo no qual figurava como mutuante o arguido EE, ainda que a título pessoal e não como administrador da insolvência da “W..., Lda.”, e como mutuária a arguida AA que aí constava como «consultora financeira devidamente registada na AT e CMVM» para investimento dos € 4.000.000,00 (quatro milhões de euros) durante 8 (oito) meses e com uma taxa de juro de 3%. 20) Assim, em execução do acordado, o arguido EE, ordenou a liquidação parcial de € 4.000.000,00 (quatro milhões de euros) do Depósito Standard com o n.º ........96, quantia essa que foi creditada na conta bancária da massa insolvente no dia 19.11.2020.; 21) Ainda nesse mesmo dia, o arguido EE ordenou a transferência daquela quantia para a conta bancária com o IBAN PT50..........................0 sedeada na agência/balcão da Quinta dos Inglesinhos da “CAIXA ECONÓMICA MONTEPIO GERAL” e titulada pela arguida AA. 22) A referida transferência foi ordenada pelo arguido EE sem que tivesse sido dado qualquer conhecimento ao processo de insolvência n.º 2508/17.0T8PDL, inexistindo, por isso, qualquer autorização do tribunal ou aprovação dos credores para a movimentação e/ou aplicação financeira daqueles montantes; 23) Para justificar essa transferência junto do “MILLENIUM BCP” o arguido EE apresentou uma cópia do contrato de mútuo datado de 18.11.2020 e que outorgara juntamente com a arguida AA. 24) O supra referido contrato de mútuo corresponde a um simples documento particular, sem qualquer tipo formalidade, assinado por ambos os arguidos. 25) Além disso, nesse contrato não era feita qualquer referência à sociedade insolvente “W..., Lda” quer fosse enquanto contraente/mutuante quer fosse como beneficiária dos juros do mútuo acordado, não havendo sequer menção de que a quantia mutuada era pertença da massa insolvente. 26) Acresce que, nesse contrato também não era feita qualquer menção à prestação pela arguida AA de quaisquer garantias reais ou pessoais; 27) E nem sequer era explicitado qual o concreto investimento ou aplicação financeira que seria realizado pela arguida AA. 28) Por sua vez, para justificar o recebimento da referida quantia na sua conta, a arguida AA limitou-se a apresentar à “CAIXA ECONÓMICA MONTEPIO GERAL” uma declaração onde se arrogava como «conselheira financeira, devidamente registada na AT e CMVM» e na qual confirmava que iria aplicar os € 4.000.000,00 (quatro milhões de euros) num fundo por si gerido, durante 8 meses e com uma taxa de juro de 3%. 29) A arguida AA não era consultora/conselheira financeira registada como tal na C.M.V.M.. 30) No entanto, apesar de tudo, não foram levantadas quaisquer objecções àquela operação e a transferência bancária veio mesmo a concretizar-se, tendo os € 4.000.000,00 (quatro milhões de euros) ficado disponíveis na conta bancária da arguida AA no dia 20.11.2020. 31) Assim que recebeu a transferência dos € 4.000.000,00 (quatro milhões de euros) na sua conta bancária, a arguida AA ordenou a realização de 7 (sete) transferências bancárias, a seguir discriminadas, num total de € 1.860.000,00 (um milhão e oitocentos e sessenta mil euros). 32) A primeira transferência no valor de € 30.000,00 (trinta mil euros) para a conta bancária com o IBAN PT50..........................2 titulada por FF e descrita como «rendas da minha residência»; 33) A segunda transferência no valor de € 500.000,00 (quinhentos mil euros), para uma conta bancária pessoal do arguido EE com o IBAN PT50..........................0 e sedeada na “CGD” a qual foi descrita como «cumprimento de contrato de mútuo»; 34) A terceira transferência no valor de € 500.000,00 (quinhentos mil euros) para uma conta bancária pessoal do arguido EE com o IBAN PT50...........................3 e sdeada no “NOVO BANCO” a qual foi descrita como «cumprimento de contrato»; 35) A quarta transferência no valor de € 100.000,00 (cem mil euros) para a conta bancária com o IBAN PT50..........................2 titulada por GG, descrita como «liquidação de herança» e justificada pela apresentação de uma declaração autenticada em notário em 17.06.2019 na qual a arguida se declara na posse da quantia de € 90.000,00 pertencentes a GG e se compromete a devolver aquela quantia até 15.07.2019; 36) A quinta transferência no valor de € 130.000,00 (cento e trinta mil euros) para a conta bancária com o IBAN PT50..........................6 titulada por HH, descrita como «liquidação de herança» e justificada pela apresentação de uma declaração autenticada em notário em 17.06.2019 e na qual a arguida se declara na posse da quantia de € 90.000 (noventa mil euros) pertencentes a HH, e se compromete a devolver aquela quantia até 15.07.2019; 37) A sexta transferência no valor de € 300.000,00 (trezentos mil euros) para a conta bancária com o IBAN PT50..........................4 titulada por CC, descrita como «Participação em financiamento de farmácia» e justificada com a apresentação de um documento emitido em 20.11.2020 por CC no qual este declara aceitar o montante de € 300.000.00 para investimento na "Farmácia Central de ... e Farmácia...., Lda” das quais é proprietário; 38) E por último, uma sétima transferência no valor de € 300.000,00 (trezentos mil euros) para a conta bancária com o IBAN PT50..........................6 descrita como «Liquidação de prestações à CEMAH» e justificada pela apresentação de um documento emitido em 20.11.2020 por CC onde este declara que acordou com a arguida a liquidação de € 300.000,00 referentes a prestações em atraso junto da Caixa Económica da Misericórdia de .... 39) As transferências ordenadas pela arguida AA só não se concretizaram porque a “CAIXA ECONÓMICA MONTEPIO GERAL” absteve-se de executar tais operações bancárias e decidiu comunicá-las ao Departamento Central de Investigação e Ação Penal (doravante D.C.I.A.P.) e à Unidade de Informação Financeira (doravante U.I.F.) por suspeitar que as mesmas pudessem estar relacionadas com atividades criminosas; 40) Na sequência dessa comunicação foi decretada pelo Ministério Público e confirmada pela Juiz de Instrução Criminal a medida de suspensão temporária das operações bancárias e de todos os movimentos a débito da conta bancária da arguida. 41) Ainda assim, quando foi decretada a referida medida de suspensão, a arguida AA já tinha conseguido utilizar parte da quantia que lhe foi transferida para efetuar pagamentos de despesas pessoais e outras transferências bancárias de menor valor, pelo que, nesse momento, a sua conta bancária apresentava um saldo de € 3.998.975,15 (três milhões novecentos e noventa e oito mil novecentos e setenta e cinco euros e quinze cêntimos). 42) No dia 25.11.2020 o arguido EE ordenou ainda a transferência de € 1.100.000,00 (um milhão e cem mil euros) da conta “W..., Lda:” para uma sua conta bancária pessoal com o IBAN PT50..........................5 e sedeada no “MILLENIUM BCP”. 43) Também esta transferência de € 1.100.000,00 (um milhão e cem mil euros) foi ordenada pelo arguido EE sem que tivesse sido dado qualquer conhecimento ao processo de insolvência n.º 2508/17.0T8PDL, inexistindo, por isso, qualquer autorização do tribunal ou aprovação dos credores para a movimentação e/ou aplicação financeira daqueles montantes; 44) Para justificar esse movimento bancário junto do “MILLENIUM BCP” o arguido EE apresentou duas declarações escritas. 45) Uma dessas declarações era assinada por CC que declarava aceitar o investimento de € 300.000,00 euros (trezentos mil euros) nas farmácias de que é proprietário denominadas “Farmácia Central ...” e “Farmácia...., Lda”. 46) Essa declaração era igual à referida no ponto 37. e que já havia sido apresentada pela arguida AA para justificar uma das transferências que ordenara. 47) Já a outra declaração apresentada pelo arguido EE era assinada por II (irmão de CC) que nela declarava receber € 577.500,00 euros (quinhentos e setenta e sete mil e quinhentos euros) para exercer o direito de remição relativo ao processo judicial n.º 431/15.1T8PDL. 48) A transferência ordenada pelo arguido EE só não se concretizou porque o “MILLENIUM BCP” absteve-se de executar tal operação bancária e decidiu comunicá-la ao D.C.I.A.P. e à U.I.F. por suspeitar que a mesma pudesse estar relacionada com actividades criminosas: 49) Na sequência dessa comunicação foi decretada pelo Ministério Público e confirmada pela Juiz de Instrução Criminal a medida de suspensão temporária das operações bancárias e de todos os movimentos a débito da conta bancária titulada pela sociedade insolvente “W..., Lda:”. 50) Em 20.12.2020, já depois de tomarem conhecimento das suspensões temporárias das operações bancárias, bem como das reservas levantadas pelas instituições bancárias, e com vista a desbloquearem esta situação e assim poderem levar o seu plano avante, os arguidos EE e AA outorgaram um outro contrato de mútuo no qual apuseram a data de 18.11.2020; 51) Este “novo” contrato de mútuo, quando comparado com o primeiro, apresentava alterações/diferenças na redacção de algumas cláusulas por forma a eliminar as imprecisões e omissões de que o primeiro contrato padecia e, assim, criar em terceiros que com ele fossem confrontados a convicção de que estava em causa um negócio legítimo por forma a conseguirem o levantamento da suspensão que incidia sobre a conta bancária da arguida AA. 52) Assim, na primeira cláusula contratual já era feita menção de que o beneficiário do contrato seria a massa insolvente, especificando-se na segunda cláusula que era a «massa insolvente no âmbito do Processo n.º 2508/17.0T8PDL». 53) Além disso, na sexta cláusula contratual constava que «até ao dia 15 de Janeiro de 2021 será realizado a favor do Mutuante e Segundo Contraente hipotecas reais que permitem ao mutuante e Segundo Contraente garantir com segurança à Massa insolvente o presente mútuo». 54) Por último, sobre a assinatura do arguido EE, na última página do contrato, estava aposto o seu carimbo profissional de administrador judicial. 55) Ainda assim, apesar das alterações introduzidas, este “novo” contrato de mútuo destinou-se apenas a criar a aparência, neste caso junto das autoridades judiciárias, de que se tratava de um negócio legítimo por forma a justificar um eventual levantamento das suspensões temporárias que incidiam sobre as contas bancárias da arguida AA e da massa insolvente da “W..., Lda” e assim permitir que o plano criminoso delineado pelos arguidos corresse conforme havia sido planeado por ambos. 56) Para esse efito, este “novo” contrato de mútuo foi remetido pela arguida AA aos presentes autos nos dias 23.12.2020 e 29.12.2020, via endereço electrónico, juntamente com um requerimento no qual solicitava ao Ministério Público o desbloqueio da sua conta bancária. 57) Apesar do requerido, a conta bancária da arguida AA manteve-se suspensa. 58) Os arguidos EE e AA, ao actuarem da forma descrita e em conjugação de esforços e intentos, agiram com o propósito concretizado de apropriação ilegítima de quantias monetárias que C..., Lda”, bem sabendo ambos que a sua administração havia sido atribuída ao arguido EE por ter sido nomeado para exercer as funções de administrador de insolvência no âmbito do Processo de Insolvência n.º 2508/17.0T8PDL e que ao actuarem desse modo causavam um prejuízo à referida massa insolvente. 59) Mais sabiam os dois arguidos das responsabilidades e deveres funcionais a que se encontrava vinculado EE no exercício das funções públicas de administrador de insolvência, em especial os deveres de probidade e fidelidade, e, ainda assim, decidiram colocar em prática um plano criminoso que implicava a violação desses mesmos deveres. 60) Os arguidos EE e AA, ao utilizarem o contrato referido em 56) no presente processo tinham como objectivo fazer crer às autoridades judiciárias que este era o contrato de mútuo original e que o negócio que lhe estava subjacente era perfeitamente legítimo e justificava não só a saída de quantias monetárias da conta bancária da massa insolvente da sociedade “W..., Lda”, mas também a subsequente circulação de parte dessas quantias entre outras contas bancárias, por forma a conseguirem o levantamento das suspensões de operações bancárias e, desse modo, levarem o seu plano criminoso avante. 61) Ao actuarem da forma descrita, sobretudo no que diz respeito ao esquema engendrado para dissimular o recebimento pelo arguido EE de € 1.000.000,00 (um milhão de euros) pertencente à massa insolvente da sociedade “W..., Lda”, por via de uma primeira transferência para a conta bancária da arguida AA e à qual se seguiram duas transferências de € 500.000,00 (quinhentos mil euros) cada para duas contas bancárias distintas mas ambas tituladas pelo arguido EE, os arguidos agiram ainda com o objetivo de dissimular a proveniência ilícita daquelas quantias que, em conformidade com plano previamente delineado por ambos, haviam sido ilegitimamente subtraídas ao património da massa insolvente da sociedade “W..., Lda.”. 62) A arguida AA atuou ainda com o propósito de fazer-se passar por conselheira/consultora financeira, subscrevendo o contrato referido em 19; onde constava tal designação; 63) Em tudo o que ficou descrito, agiram os arguidos deliberada, livre e conscientemente, bem sabendo que as suas condutas eram proibidas e puníveis por Lei. (...) 2. Por sentença de 14.05.2021, transitado em julgado a 13.09.2021, proferida no Proc. 871/17.1T9GRD, a arguida foi condenada como autora material e como reincidente, de: a) 1 (um) crime de falsificação ou contrafação de documento, p.p. pelo art. 256º, nº 1, al. d) do Código Penal, na pena de 1 (um) ano e 9 (nove) meses de prisão; e b) 1 (um) crime de usurpação de funções, p.p. pelo art. 358º, al. b) do Código Penal, na pena de 1 (um) ano de prisão, praticados em julho de 2017, cumpridas e extintas em 30.10.2023. Pela prática dos seguintes factos: A) No decurso do ano de 2017 correu termos na 2ª Secção de Inquéritos do Ministério Público da ... o inquérito n.º 200/15.9GCGRD, em que se investigava a prática do crime de violência doméstica e em que eram intervenientes JJ como ofendida e KK como arguido. B) A determinada altura, a testemunha LL comentou com a testemunha JJ que esta deveria dispor dos serviços de um advogado para a representar naquele processo, tendo-lhe referido que conhecia uma advogada que costumava frequentar o seu local de trabalho, no Seminário ..., e que a poderia apresentar. C) Com efeito, a arguida já havia, por diversas vezes, frequentado o Seminário ..., apresentando-se sempre na qualidade de advogada. D) Em consequência, a arguida AA abordou então a testemunha JJ, a quem transmitiu ser advogada, assegurando-lhe que iria “tratar” do seu processo. E) Na execução do plano gizado, a arguida manuscreveu a procuração que consta de fls. 6, apondo-lhe os dizeres “Procuração - MM, casada, residente na Localização 2, constitui sua bastante procuradora a Exma. Sra. Dra. NN, ..89 L n.º de cédula, com escritório na Avenida 1”, bem como o local e a data da respectiva elaboração “..., 30 de Janeiro de 2017”, entregando-a posteriormente a JJ para que a assinasse, o que esta fez. F) No dia 30 de Janeiro de 2017, pelas 16.00h, a arguida, juntamente com a ofendida MM, dirigiu-se aos serviços do Ministério Público ... e apresentou aquela procuração manuscrita, em que JJ constituía sua bastante procuradora a arguida, que afirmava encontrar-se inscrita na Ordem dos Advogados com o n.º ..89L, e possuir escritório na Avenida 1. G) Em consequência, convencida da veracidade dos dados inscritos naquela procuração, a Exma. Sra. Técnica de Justiça Adjunta OO apresentou aqueles autos de inquérito à arguida, que os consultou na secção de processos. F) O advogado inscrito na Ordem dos Advogados a quem foi atribuída a cédula n.º ..89 L é o Dr. PP, falecido em D de M de 1991, e a morada indicada naquela procuração não existe. G) A arguida não é licenciada em Direito, nem se encontra inscrita da Ordem dos Advogados. H) Ao introduzir naquela procuração dados que não correspondiam à verdade, nomeadamente quanto ao número de cédula e morada, a arguida pretendeu fazer crer que era advogada e que nessa qualidade poderia consultar um inquérito, o que de outro modo não conseguiria fazer, o que esta bem sabia. I) A arguida sabia que, ao juntar aquela procuração nos autos de inquérito n.º 200/15.9GCGRD e ao consultar aquele inquérito, arrogando-se da qualidade de advogada, estava a exercer um acto próprio de uma profissão para a qual não possuía habilitações, nem cumpria as exigências legais de inscrição na respectiva Ordem Profissional, o que a arguida bem sabia ser condição para exercer aquela actividade. J) A arguida sabia ainda que a sua actuação punha em causa o desempenho de uma actividade compreendida na função pública jurisdicional e, não obstante, não se absteve de actuar da forma descrita. L) A arguida agiu sempre voluntária, livre e conscientemente, bem sabendo que a sua conduta era proibida e punida por lei penal. (...) 3. Por sentença de 07.02.2023, transitada em julgado a 18.10.2023, proferida no Proc. 252/19.2GDSTB, a arguida foi condenada como coautora material de: c) de 1 (um) crime de falsificação ou contrafação de documento, p.p. pelo art. 256º, nº 1, al. a) e e) do Código Penal, na pena de 9 (nove) meses de prisão; e pela prática de 1 (um) crime de burla simples, p.p. pelo art. 217º, do Código Penal, na pena de 11 (onze) meses de prisão, praticados em 20.03.2019, processo à ordem. Pela prática dos seguintes factos: 1. A arguida e QQ conheceram-se em 2017, quando a primeira esteve internada no Hospital ..., em ..., com a mãe daquele, tendo ambas partilhado o mesmo quarto. 2. Nessa altura, iniciaram todos uma relação de amizade, tendo a arguida feito crer a QQ e sua mãe, que era advogada, o que era falso, tendo inclusivamente prestado àqueles alguns serviços jurídicos, o que veio a ocorrer em 2018. Nesse contexto, em 20 de Março de 2019, a arguida contactou telefonicamente a QQ, solicitando a ele e à sua mãe, RR, um empréstimo de € 5.000,00 (cinco mil euros). 4. A arguida alegou, para tanto, dificuldades económicas, motivadas pela circunstância também falsa de a sua conta bancária do Montepio Geral com o IBAN PT50 .... .... .... .... .... 0 ter sido alvo de um ataque informático, através do qual lhe fora subtraída uma elevada quantia monetária, embora sem adiantar o valor concreto. 5. Porém, e por forma a convencer QQ da sua capacidade económica, vontade e boa-fé em cumprir o contrato de mútuo, garantiu-lhe a arguida que o seu banco Montepio no dia 25 de março de 2019 lhe iria restituir o valor que havia sido retirado ilicitamente da sua conta, por via de um fundo de garantia disponibilizado por essa instituição, e que no dia 26 de Março de 2019, no mais tardar, o dinheiro já estaria disponível na sua (da arguida) conta, o que também era falso. 6. Mais referiu a arguida que o valor mutuado de € 5.000,00 (cinco mil euros) deveria ser transferido para a conta do BPI com o IBAN .... .... .... .... .... 1, titulada, entre outros, por SS, para assim não se perder mais tempo, atentos os problemas que afectavam a sua conta do banco Montepio. 7. Perante a pretensa seriedade de tal pedido e, ademais, reforçada pela circunstância de acreditar que a arguida era efectivamente advogada, e após obter a anuência da sua mãe, QQ transferiu no próprio dia 20 de março de 2019 a quantia de € 5.000,00 (cinco mil euros) para o dito IBAN do BPI, sendo tal valor debitado na conta do BCP n.º ......98, titulada por ambos. 8. Contudo, na realidade, a arguida nunca teve intenção de cumprir o contrato de mútuo que celebrou com QQ e sua mãe. 9. Com efeito, a partir do dia 26 de Março de 2019, e após várias insistências, via e-mail e por sms, de QQ, no sentido de saber quando lhe seria restituído o dinheiro, a arguida justificou sempre o incumprimento com incidentes falsos, ora relacionados com o seu banco, ora com um suposto internamento hospitalar com pernoita que nunca ocorreu. 10. De igual sorte, o dinheiro mutuado nunca serviu para remediar o prejuízo sofrido pelo alegado ataque informático à conta da arguida, já que tal quantia de € 5.000,00 (cinco mil euros) se destinou, na verdade, a amortizar uma dívida que aquela havia contraído em Janeiro de 2019, para com SS, para o que usou do mesmo método e alegando os mesmos pretextos falsos ataque informático à sua conta, internamento hospitalar e outros. 11. Tão-pouco a arguida dispôs alguma vez de saldo bancário e outro património suficientes para pagar a dívida que havia contraído para com QQ e sua mãe. 12. Após várias insistências de QQ, e por e-mail de 31 de Março de 2019, às 18h29m, a arguida, a fim de demonstrar o pretenso cumprimento da dívida, enviou-lhe dois comprovativos de transferência bancária através do sistema de homebanking Net24 do banco Montepio, cada um no valor de € 2.500,00 (dois mil e quinhentos euros). 13. Sucede, porém, que tais comprovativos eram falsos, não correspondendo a quaisquer operações reais de transferência bancária, tratando-se antes de meros simulacros das mesmas, criados pela arguida ou, a seu mando, por terceiros. 14. Aliás, à data dos falsos comprovativos 28 de Março de 2019 a arguida nem dispunha de saldo suficiente na sua conta para realizar tais transferências. 15. Sendo que a partir de Abril de 2019 não mais a arguida contactou QQ e sua mãe, nem lhes restituiu o dinheiro A arguida agiu livre, deliberada e conscientemente, com o propósito concretizado de levar QQ e sua mãe a emprestarem-lhe a dita quantia monetária e, simultaneamente, convencê-los da sua vontade, boa-fé e disponibilidade e liquidez patrimonial para garantir a obrigação decorrente do contrato, quando, na verdade, nunca pretendeu cumpri-lo, nem restituir qualquer valor aos ofendidos supra id., assim obtendo a arguida um benefício ilegítimo, e causando um concomitante prejuízo patrimonial àqueles, equivalente ao montante em dívida do contrato. 17. Aproveitou a arguida a relação de amizade com os ofendidos supra id. e, bem assim, a suposta credibilidade que detinha em virtude da sua alegada e falsa condição de advogada para os enganar e levá-los a entregar-lhes a dita quantia monetária. 18. Mais sabia a arguida que os comprovativos de transferência bancária que enviou a QQ eram falsos, já que não correspondiam a quaisquer operações bancárias reais, servindo antes tais documentos para encobrir e facilitar o crime de burla. 19. A arguida sabia ainda ser as suas condutas proibidas e punidas por lei penal. (…)”. 3. A arguida encontra-se em cumprimento da pena referida em 2, desde D.M.2014. 4. Constam do relatório social da arguida, em súmula, os seguintes factos: AA passou por um processo de socialização cujo núcleo familiar clássico de uma família de classe social favorecida economicamente. A arguida usufruiu de uma ambiência familiar aparentemente aprazível e funcional, em que lhe foi possível beneficiar de condição social relativamente elevada, pela situação habitacional, escolar e mais tarde da herança patrimonial por parte do progenitor. Todavia, a sua situação de saúde, em particular ter nascido com doença congénita, mais precisamente uma má formação, designada por luxação congénita bilateral da anca, não lhe permitiu um desenvolvimento do crescimento de modo saudável. Desde a sua infância que a arguida foi sistemática e reiteradamente acompanhada em meio hospitalar, sem sucesso, sendo qua a partir da idade dos 14 anos, por intervenção médica especializada no ..., submetida a intervenção cirúrgica à bacia e à coluna vertebral, foi possível melhorar a condição de saúde. Por volta dos 18 - 19 anos de idade, emigrou para o ..., tendo nos primeiros anos alcançado mobilidade residencial no país de emigração e Portugal. Tendo frequentado curso superior de Direito, ficando apenas pelo 2º ano, alegadamente pelo facto de seu pai ter falecido. Do ponto de vista relacional afetivo, conforme AA nos mencionou teve duas relações conjugais, das quais teve dois filhos. Da primeira relação, teve o primeiro filho, atualmente com 41 anos de idade, com a profissão de ... a trabalhar numa empresa de renome nos ... Da segunda relação teve uma filha que não sobreviveu a doença crónica. Tal acontecimento marcou traumaticamente a arguida. Constata-se o sentimento de alguma insegurança em determinados períodos da sua vida, nomeadamente entre agosto de 1989 e mais tarde julho de 2002 a outubro de 2012, entre o nascimento do segundo filho (1993), seguido do seu falecimento, na sequência de doença crónica prolongada, seu divórcio e falecimento de sua mãe, todos os factos descritos, conduziram-na a uma significativa dificuldade na coordenação e gestão de responsabilidades familiares e por sua vez financeiras. Apesar do seu nível de especialização, sua motivação, o nível de satisfação da atividade laboral, de sua diferenciação, AA não deixou de registar alguns períodos de maior instabilidade/turbulência da sua atividade profissional e de projetar o futuro de modo autodeterminado. Numa atitude autocentrada, com tendência a agir impulsivamente e sem que para isso medisse as consequências dos atos mais imediatos, a arguida não foi capaz de conter o comportamento desviante. A arguida no decurso do seu trajeto pessoal, profissional e familiar revelou competências. Todavia o carácter meritocrático e ascendente do seu percurso profissional, o seu desejo de responder pronta e imediatamente às dificuldades apresentadas, nem sempre se mostraram eficazes. Quando se deparou com situação critica e de maior complexidade teve tendência a querer assumir as responsabilidades por si mesma, projetando resposta para o futuro, sem conseguir ponderar as consequências mais imediatas à tomada de decisão adequada. AA equaciona o futuro alegadamente em torno da causa social. Tem como perspetiva poder trabalhar como voluntária em IPSS’S, dando a sua colaboração e contribuição em projetos de área social. Também manifesta necessidade de diligenciar pela sua reforma das atividades profissionais anteriormente exercidas durante os últimos anos de 2000, designadamente do período que trabalhou no .... No que concerne ao presente processo, AA demonstrou sentido crítico face ao ilícito de que vem acusada. De acordo com os dados anteriormente mencionados, podemos concluir que este comportamento possa estar relacionado com uma certa instabilidade emocional afetiva e reduzida capacidade para encontrar respostas consistentes. O facto de enfrentar a presente situação com uma aparente maturidade e ajustamento comportamental é um fator de prognóstico positivo. Podemos ainda referir como fatores favoráveis os laços familiares afetivos, de apoio e interajuda, em particular com seu afilhado e seu amigo, Sr, BB. Assim como estar a conseguir estabilizar e consolidar o relacionamento com seu filho. 5. Em D.M.2024, aquando da sua entrada no EP, a condenada apresentava os seguintes diagnósticos: - Insuficiência Cardíaca Congestiva, - Hipertensão Arterial, de difícil controle, - Insuficiência Renal, - Doença Pulmonar Obstrutiva Crónica, com crises de dispneia, necessita de apoio permanente de inaladores. -Sequelas de luxação congénita da anca com dificuldades na marcha (só possível com uso de auxílio externo), aguarda colocação de prótese na anca. - Leucemia mielóide, cegueira total do olho esquerdo na sequência de trombose venosa com edema macular na retina ocorrida em Outubro de 2022. 6. Necessita de ajuda para as actividades da vida diária. 7. Tem acompanhamento em oftalmologia, realizando laserterapia. 8. Tem acompanhamento de cardiologia no Hospital .... 9. Tem acompanhamento psicológico e psiquiátrico. 10. Em 23.05.2024 a arguida foi assistida no serviço de urgência do Hospital ..., apresentando queixas de Dor torácica; dor precordial. 11. Realizou Rx ao torax com resultado: sem alteração; análises, teve alta com diagnóstico de bronquite aguda, com prescrição de medicação. 12. Consta da Informação clínica dos serviços médicos do EP: “Desde a sua libertação é evidente a deterioração do seu estado geral, que se agravou desde 18.04.2023. 13. Apresenta queixas de dispneia, cansaço extremo, edemas maleolares, não obstante medicada. 14. Carece de controle de sinais vitais frequente e com equipamento próprio, difícil de realizar no EP. B. Motivação Na definição dos factos provados atendeu-se ao teor da sentença judicial extraída do Proc. 871/17.1T9GRD, de fls. 2356ss e do Proc. 252/19.2GDSTB, na informação clínica e relatórios de urgência do Hospital ... juntos com a referência ......74, ......48, ......49 e ......50, ......53e ......33, e da ficha biográfica com a referência ......36. Quanto aos antecedentes criminais da arguida, foi considerado o teor do certificado de registo criminal junto aos autos sob a referência ......15. Relativamente às condições pessoais e sócio-económicas da arguida, bem como ao seu juízo sobre a sua conduta passada e as suas perspectivas de futuro, atendeu-se às suas declarações, e bem assim ao teor do Relatório Social de fls. 2377, (refª ......50). No que à sua condição de saúde e patologias de que padece, atendeu-se ao teor da informação clínica de fls. 2386, 2391 a 2393ss.» 8.2. Fundamentação de direito: «III. Enquadramento jurídico Prescreve o artigo 471.º, n.º 2, do Código de Processo Penal (conjugado com o seu n.º 1 e o artigo 78.º, n.º 1 e n.º 2, do Código Penal) que, para efeitos de julgamento e decisão da realização de cúmulo jurídico de penas numa situação de conhecimento superveniente de concurso de crimes, é competente o tribunal da última condenação. Estabelece o artigo 77.º do Código Penal, sob a epígrafe “Regras da Punição do Concurso”, que: “1 - Quando alguém tiver praticado vários crimes antes de transitar em julgado a condenação por qualquer deles é condenado numa única pena. Na medida da pena são considerados, em conjunto, os factos e a personalidade do agente. 2 - A pena aplicável tem como limite máximo a soma das penas concretamente aplicadas aos vários crimes, não podendo ultrapassar 25 anos tratando-se de pena de prisão e 900 dias tratando-se de pena de multa; e como limite mínimo a mais elevada das penas concretamente aplicadas aos vários crimes. (…)” Resulta, por sua vez, o artigo 78.º, do Código Penal, sobre a epígrafe Conhecimento Superveniente do Concurso que: “1 - Se, depois de uma condenação transitada em julgado, se mostrar que o agente praticou, anteriormente àquela condenação, outro ou outros crimes, são aplicáveis as regras do artigo anterior, sendo a pena que já tiver sido cumprida descontada no cumprimento da pena única aplicada ao concurso de crimes. 2 - O disposto no número anterior só é aplicável relativamente aos crimes cuja condenação transitou em julgado. 3 - As penas acessórias e as medidas de segurança aplicadas na sentença anterior mantêm-se, salvo quando se mostrarem desnecessárias em vista da nova decisão; se forem aplicáveis apenas ao crime que falta apreciar, só são decretadas se ainda forem necessárias em face da decisão anterior.” In casu, resulta evidente que a última condenação foi proferida no processo 703/20.3TELSB, pelo que é neste que se deve proceder à realização de cúmulo jurídico das aludidas penas, a realizar por tribunal colectivo atenta a moldura penal abstracta aplicável ao caso. Quanto ao momento temporal decisivo para o conhecimento superveniente do concurso de penas, há a considerar “… que o crime de haja só agora conhecimento tenha sido praticado antes da condenação anteriormente proferida, de tal forma que esta deveria tê-lo tomado em conta para efeito da pena conjunta, se dele tivesse tido conhecimento.” (Jorge de Figueiredo Dias, “Dirieto Penal Português – As Consequências Jurídicas do Crime, Aequitas, Editorial Notícias, 1993, pág. 293). Cotejado o registo criminal da arguida, e ponderando-se o disposto nas supra citadas normas, conclui-se que se verificam, os pressupostos previstos para a realização de cúmulo jurídico das penas em que a arguida foi condenada, designadamente, em 14.05.2021, no Proc. 871/17.1T9GRD; em 10.10.2023, em 07.02.2023, no Proc. 252/19.2GDSTB, e neste Proc. 703/20.3TELSB. Em todos os processos a arguida foi condenada em penas de prisão efectiva. Nestes termos, ao abrigo do disposto no artº 78º, nºs 1 e 2, do Código Penal, deverá ser aplicada uma pena única que abranja as três condenações sofridas por AA nos supra identificados processos, porquanto os factos pelos quais foi nos mesmos condenada ocorreram antes que quaisquer deles fossem julgados, pelo que, aquando da prolação da decisão proferida no primeiro dos processos identificados, teria sido ainda possível avaliar conjuntamente a responsabilidade criminal adveniente dos factos que constituem o objecto destes autos, por forma a que à arguida tivesse sido aplicada, nessa altura, uma única pena pelos factos perpetrados nos três processos. Assim não o tendo sido, resulta inequívoco que nos encontramos perante uma situação de conhecimento superveniente de concurso de crimes. No caso concreto, as penas a considerar são de prisão devendo a pena única resultar da aplicação dos critérios estabelecidos nos números anteriores, ser feita nos termos previstos no nº 2 do artigo 77º do Código Penal. Impõe-se agora encetar pela determinação concreta da medida da pena conjunta do concurso, aplicável dentro dos limites da referida moldura penal abstracta máxima e mínima. De acordo com o disposto no artº 77.º, n.º 2, do Código Penal, a moldura penal do concurso tem como limite máximo a soma das penas concretamente aplicadas aos vários crimes (no caso, 9 (nove) anos e 11 (onze) meses de prisão) e como limite mínimo a mais elevada das penas em concurso (no caso, 3 (três) anos de prisão). Conforme atrás se referiu, nos termos do art.º 77.º, n.º 1, do Código Penal, a determinação da medida concreta da pena unitária deverá ter em consideração, de forma conjugada, os factos praticados num e noutros processos e a personalidade do agente. Resulta do art.º 40.º, n.º 1, do Código Penal, que as penas são aplicadas, por um lado, para reafirmar na comunidade jurídica a manutenção da validade do comando normativo violado (no caso, em ambos os processos, estão em causa crimes contra o património), com vista a prevenir, ao nível societário, a prática de novos crimes, deste ou outro tipo (prevenção geral positiva ou de integração); por outro lado, para reintegrar o agente na sociedade, afastando-o, por essa via, da prática de outros delitos (prevenção especial positiva ou de ressocialização). No caso em apreço, são elevadas as exigências de prevenção geral, porquanto os crimes praticados, caracterizados por um elevado grau de ilicitude, dados os bens jurídicos atingidos com a respectiva prática e a gravidade das consequências associados aos mesmos, traduzidas nos avultados prejuízos sofridos pelos ofendidos. Afigura-se-nos que as exigências ao nível da prevenção especial sejam igualmente acentuadas, porquanto a arguida, além dos processos de cujas penas se procede a cúmulo, sofreu, desde o ano de 1989 dez condenações por crimes de burlas simples e qualificadas, burla informática, abuso de cartão, falsificação, evasão, falsas declarações, usurpação de funções, e outros tantos crimes de emissão de cheque sem provisão, integrados num percurso pessoal e profissional integrado de aparente adaptação. Denota, pois, uma personalidade desconforme à vivência de acordo com as regras da sociedade e ao direito. A seu favor a circunstância de parte dos prejuízos terem sido ressarcidos, cumprindo com as obrigações de pagamento impostas, mostrando-se a arguida disponível a proceder à liquidação integral daquelas. Ouvida a arguida em declarações constatou o Tribunal que a mesma mantém um longo percurso a fazer quanto à interiorização do mal da sua conduta, fraca atitude reflexiva e débil capacidade de adequação comportamental. A culpa constitui o fundamento ético e jurídico da aplicação da pena e representa o seu máximo inultrapassável (cfr. art.º 40.º, n.º 2, do Código Penal). O patamar mínimo da prisão corresponde ao nível abaixo do qual a comunidade jurídica não sente suficiente e eficazmente protegido o bem jurídico que foi violado com a prática do crime (prevenção geral positiva). O nível máximo é fornecido pelo grau de culpa, já que esta, constituindo o fundamento ético e jurídico da aplicação das penas, representa também o seu máximo inultrapassável (art.º 40.º, n.º 2). Finalmente, a medida concreta da pena deve ser encontrada atendendo sobretudo às exigências de prevenção especial que o caso reclame. Na tarefa de determinação da medida concreta da pena, o Tribunal atende a todas as circunstâncias que, não fazendo parte do tipo de crime, deponham a favor da arguida e contra ela, nos termos do art.º 71º, n.º 2, do Código Penal. No caso concreto, importa atender às seguintes circunstâncias, relativas quer aos factos praticados, quer à personalidade da arguida: - Os crimes ora em apreço foram praticados entre 2017 e 2020; - Os crimes em causa são de peculato, branqueamento, usurpação de funções, falsificação de documento e burla; - A arguida pretende ressarcir os prejuízos causados liquidando as quantias com que se locupletou; - Pretende requerer a reforma, encontra-se em situação de isolamento familiar (beneficia da ajuda de um amigo de longa data) e padece de doença crónica incapacitante; Como salienta Figueiredo Dias, “Tudo deve passar-se […] como se o conjunto dos factos fornecesse a gravidade do ilícito global perpetrado, sendo decisiva para a sua avaliação a conexão e o tipo de conexão que entre os factos concorrentes se verifique. Na avaliação da personalidade unitária do agente relevará, sobretudo, a questão de saber se o conjunto dos factos é reconduzível a uma tendência (ou eventualmente mesmo a uma «carreira») criminosa, ou tão-só a uma pluriocasionalidade que não radica na personalidade: só no primeiro caso, já não no segundo, será cabido atribuir à pluralidade de crimes um efeito agravante dentro da moldura penal conjunta (As Consequências Jurídicas do Crime, Editorial Notícias, 1993, § 421). Tudo visto e ponderado, considera-se necessária, suficiente e adequada, por proporcional, a aplicação de uma pena única, resultante de cúmulo jurídico, de 8 (oito) anos de prisão. A pena de prisão de 2 (dois) anos e 6 (seis) meses de prisão em que foi condenada no Proc. 871/17.1G9GRD é integralmente descontada na pena única resultante do cúmulo que ora se realiza, pelo que a arguida tem a cumprir o remanescente de 5 (cinco) anos e 6 (seis) meses da pena única de prisão.» Quanto à modificação da execução da pena, depois de notar que «as exigências de prevenção especial se mantêm significativas na medida em que a reclusa embora assuma a prática dos factos, mostrando-se conformada com a sua situação de reclusão como consequência daquela, revela, fragilidades ao nível do seu sentido crítico e pensamento consequencial, mantém um discurso egocentrado, focando-se exclusivamente nas consequências que para si advêm da situação de reclusão» e que «as exigências de prevenção geral permanecem igualmente elevadas», mantendo-se atual o afirmado no acórdão condenatório quanto «às consequências e impacto fortemente negativo que os crimes praticados pela arguida têm no seio da sociedade dada o alarme social resultantes da prática deste tipo de crimes», o acórdão recorrido considerou o seguinte: «Ora, a doença de que a reclusa padece é grave, crónica, irreversível e evolutiva, criando dependência de terceiros para as actividades da vida diária. No caso concreto da arguida tem-se verificado um crescente agravar das suas condições de saúde a par do acentuar das necessidades de monitorização regular e frequente dos seus sinais vitais, a exigir equipamento específico, que inviabiliza a sua normal manutenção e meio prisional. Portanto, de harmonia com parecer clínico dos serviços médicos do EP, poderá concluir-se que a arguida se encontra na situação prevista na al. b) do art. 118º do CEPMPL. Do exposto resulta que à modificação da execução da pena não se opõem fortes exigências de prevenção ou de ordem e paz social, sendo que estas, embora existam, mostram-se diluídas face à patologia de que a arguida padece. Conclui-se, pois, que estão reunidos os pressupostos formais e substanciais para que se determine que a pena única de prisão a cumprir pela arguida, o seja numa das modalidades previstas como alternativa ao cumprimento em meio prisional, por forma a acautelar aquelas necessidades de saúde da mesma», pelo que, considerando desse modo acauteladas as necessidades de prevenção geral e especial que se fazem sentir, determinou, nos termos dos artigos 118.º, al. b), e 120.º, n.º 1, al. a), do CEPMPL, que «o cumprimento do tempo de prisão que lhe falta cumprir seja executado em regime de internamento em estabelecimento de saúde ou de acolhimento adequado, a identificar pela DGRSP no mais curto espaço de tempo.» Objeto e âmbito do recurso 9. O recurso, que se limita ao reexame de matéria de direito (artigo 434.º do CPP), tem, pois, por objeto um acórdão proferido pelo tribunal coletivo que aplicou uma pena de prisão superior a 5 anos, diretamente recorrível para o Supremo Tribunal de Justiça [artigo 432.º, n.º 1, al. c), do CPP]. O âmbito do recurso, que circunscreve os poderes de cognição do tribunal ad quem, delimita-se pelo conteúdo da decisão recorrida e pelas conclusões da motivação (artigos 402.º, 403.º e 412.º do CPP), sem prejuízo dos poderes de conhecimento oficioso, se for caso disso, em vista da boa decisão de direito, de vícios da decisão recorrida a que se refere o artigo 410.º, n.º 2, do CPP (acórdão de fixação de jurisprudência n.º 7/95, DR-I, de 28.12.1995), de nulidades não sanadas (n.º 3 do mesmo preceito) e de nulidades da sentença (artigo 379.º, n.º 2, do CPP, na redação da Lei n.º 20/2013, de 21 de fevereiro). Em síntese, tendo em conta as conclusões da motivação, este Tribunal é, pois, chamado a apreciar e decidir da adequação e proporcionalidade da medida da pena única aplicada, de 8 anos de prisão, que o recorrente considera excessiva porque fixada em violação dos artigos 40º n.º 1, e 71º n.º 1 e 2 do Código Penal. 10. Como se tem reiteradamente afirmado, importa considerar as circunstâncias que, nos termos dos artigos 71.º e 77.º do CP, constituindo o respetivo substrato, a justificam, tendo presente que o recurso não se destina a proceder a uma nova determinação da pena, mas, apenas, a verificar o respeito por aqueles critérios, com eventual correção da medida da pena aplicada, se o caso a justificar (acórdão de 10.09.2025, Proc. n.º 200/24.8PAVNF.S1; assim, por todos, o acórdão de 17.12.2024, Proc. 77/12.6GTCSC.L2.S1, e outros nele citados, reafirmando jurisprudência reiterada, em particular, o acórdão de 21.12.2011, Proc. n.º 595/10.0GFLLE.S1, com exaustiva indicação de jurisprudência, em https://www.dgsi.pt). 11. A pena única corresponde a uma pena conjunta resultante das penas aplicadas aos crimes em concurso segundo um princípio de cúmulo jurídico, seguindo-se, na sua fixação, o procedimento normal de determinação e escolha das penas, a partir das quais se obtém a moldura penal do concurso (pena aplicável), que tem como limite máximo a soma das penas concretamente aplicadas, não podendo ultrapassar 25 anos de prisão, e, como limite mínimo, a mais elevada das penas concretamente aplicadas aos vários crimes (artigo 77.º, n.º 2, do Código Penal). Assim definida a moldura do concurso, o tribunal determina a pena conjunta, seguindo os critérios da culpa e da prevenção (artigo 71.º do Código Penal) e o critério especial fixado na segunda parte do n.º 1 do artigo 77.º do Código Penal, segundo o qual na medida da pena são considerados, em conjunto, os factos e a personalidade do agente, em que se incluem as circunstâncias relacionadas com as condições económicas e sociais deste, reveladoras das necessidades de socialização, a sensibilidade à pena, a suscetibilidade de por ela ser influenciado e as qualidades da personalidade manifestadas no facto, nomeadamente a falta de preparação para manter uma conduta lícita. O substrato da medida da pena compreende, pois, as circunstâncias que, não fazendo parte do tipo de ilícito ou do tipo de culpa, possam depor a favor do agente ou contra ele, nos termos do n.º 2 do artigo 71.º do Código Penal (cfr., a título exemplificativo, o acórdão de 25.10.2023, Proc. 3761/20.7T9LSB.S1, em www.dgsi.pt, e jurisprudência mencionada). 12. Recordando jurisprudência constante, com a fixação da pena conjunta pretende-se sancionar o agente não só pelos factos individualmente considerados, mas também, e especialmente, pelo seu conjunto, enquanto revelador da dimensão e gravidade global do seu comportamento. É o conjunto dos factos descritos na sentença que evidencia a gravidade do ilícito perpetrado (o “grande facto”), sendo decisiva, para a sua avaliação, a conexão e o tipo de conexão que se verifique entre os factos que constituem os tipos de crime em concurso. Há que atender ao conjunto de todos os factos e ao fio condutor presente na repetição criminosa, estabelecendo uma relação desses factos com a personalidade do agente neles documentada, levando-se em consideração a natureza dos crimes e a identidade ou não dos bens jurídicos violados, tendo em vista verificar se os factos, no seu conjunto, são expressão de uma tendência criminosa, caso em que lhe deverá ser atribuído um efeito de agravação dentro da moldura da pena conjunta, ou se, diversamente, a repetição resulta de fatores meramente ocasionais (assim, o citado acórdão de 25.10.2023 e jurisprudência nele citada, retomando-se anteriores acórdãos, nomeadamente o citado acórdão de 10.09.2025, em https://www.dgsi.pt). 13. Nos termos do artigo 40.º do Código Penal, a aplicação de penas visa a proteção de bens jurídicos e a reintegração do agente na sociedade e em caso algum a pena pode ultrapassar a medida da culpa. Estabelece o n.º 1 do artigo 71.º do Código Penal que a determinação da medida da pena, dentro dos limites definidos na lei, é feita em função da culpa do agente e das exigências de prevenção, devendo o tribunal atender a todas as circunstâncias relacionadas com o facto praticado (facto ilícito típico) e com a personalidade do agente manifestada no facto, relevantes para avaliar da medida da pena da culpa e da medida da pena preventiva, que, não fazendo parte do tipo de crime (proibição da dupla valoração), deponham a favor do agente ou contra ele considerando, nomeadamente, as indicadas no n.º 2 do mesmo preceito1. Para a medida da gravidade da culpa, há que considerar os fatores reveladores da censurabilidade manifestada no facto, nomeadamente, nos termos do n.º 2 do artigo 71.º, os fatores capazes de fornecer a medida da gravidade do tipo de ilícito objetivo e subjetivo (grau de ilicitude do facto, modo de execução e gravidade das suas consequências e intensidade do dolo ou da negligência), os sentimentos manifestados no cometimento do crime e fins ou motivos que o determinaram e o grau de violação dos deveres impostos ao agente [als. a), b) e c)], bem como os fatores atinentes ao agente, que têm que ver com a sua personalidade [condições pessoais e situação económica, conduta anterior e posterior ao facto, e falta de preparação para manter uma conduta lícita, manifestada no facto – als. d), e), f)]. Na consideração das exigências de prevenção, a ter em conta ao tempo da aplicação da pena, destacam-se as circunstâncias relevantes em vista da satisfação de exigências de prevenção geral – traduzida na proteção do bem jurídico ofendido mediante a aplicação de uma pena proporcional à gravidade dos factos, reafirmando a manutenção da confiança comunitária na norma violada – e, sobretudo, de prevenção especial, que permitem fundamentar um juízo de prognose sobre o cometimento, pelo agente, de novos crimes no futuro, e assim avaliar das suas necessidades de socialização. Aqui se incluem as consequências não culposas do facto [v.g. frequência de crimes de certo tipo, insegurança geral ou pavor causados por uma série de crimes particularmente graves, comportamento anterior e posterior ao crime (com destaque para os antecedentes criminais) e a falta de preparação para manter uma conduta lícita, manifestada no facto [als. a) e) e f)]. O comportamento do agente [als. e) e f)] adquire particular relevo em vista da satisfação das exigências de prevenção especial, em função das necessidades individuais e concretas de socialização do agente, devendo evitar-se a dessocialização. Como se tem sublinhado, é na consideração destes fatores, determinados na averiguação do «grande facto» caraterizado pelas circunstâncias que, não fazendo parte do tipo de crime, constituem o substrato da determinação da pena, que deve avaliar-se a concreta gravidade da lesão do bem jurídico protegido pela norma incriminadora, materializada na ação levada a efeito pelo arguido pela forma descrita nos factos provados, de modo a verificar se a pena aplicada respeita os critérios de adequação e proporcionalidade constitucionalmente impostos (artigo 18.º, n.º 2, da Constituição), que devem pautar a sua aplicação2 . Não se podendo fundar em considerações de ordem geral pressupostas na definição dos crimes e das molduras abstratas das penas em vista da adequada proteção dos bens jurídicos postos em causa, sob pena de violação da proibição da dupla valoração, a determinação da pena dentro da moldura penal correspondente ao crime praticado há de comportar-se no quadro e nos limites da gravidade dos factos concretos, nas suas próprias circunstâncias concorrentes por via da culpa e da prevenção (artigo 71.º do Código Penal), tendo em conta as finalidades de prevenção especial de ressocialização3. 14. Em síntese, a arguida invoca a seu favor algumas afirmações e intenções suas e juízos de avaliação constantes do relatório social a que, diversamente do afirmado, o tribunal a quo não deixou, no essencial, de conceder relevância por consideração nos «factos» (supra, 8.1.II.4) que extraiu desse relatório, bem como alegada deficiência na ponderação de circunstâncias que se afiguram relevantes na determinação da pena por via da prevenção, nomeadamente as referentes às suas condições pessoais e familiares e a aspetos relacionados com o seu comportamento posterior aos crimes, em particular no que respeita à reparação das suas consequências, que, a seu ver, justificam uma atenuação da pena. Não questiona a ponderação de circunstâncias relativas ao comportamento anterior aos crimes, que o acórdão recorrido extraiu do certificado do registo criminal. No confronto com as demais circunstâncias relacionadas com a atual situação pessoal da arguida, no que releva em vista da formulação de um juízo de prognose sobre o cometimento de novos crimes no futuro, para se avaliar das necessidades de socialização (prevenção especial), não se mostra que se revele necessário um maior grau de concretização para além do que consta da fundamentação de facto em observância do disposto nos artigos 71.º, n.º 3, do CP e 375.º do CPP, que definem a obrigação de especificação dos fundamentos da sentença condenatória. Assim sendo, tendo em conta o objeto do recurso, delimitado pelas questões suscitadas pela recorrente, não se encontra o tribunal em situação de impossibilidade de decidir, de modo a que se deva considerar a necessidade de reenvio do processo para novo julgamento com fundamento em vício de insuficiência para a decisão da matéria de facto provada (artigo 410.º, n.º 1, al. c), do CPP), como defende o Senhor Procurador-Geral Adjunto em seu parecer (supra, 5). 15. Para além disso, não se compreende e não procede o argumento da arguida de que o agravamento, em dois meses, da pena a cumprir resultaria numa violação da garantia de defesa oferecida pelo artigo 32.º, n.º 1, da Constituição (ponto 9 das conclusões). Com efeito, para além de o novo cúmulo obrigar a desfazer anteriores cúmulos jurídicos de modo a nele serem incluídas as penas parcelares nos termos do artigo 77.º do CP, pois não há cúmulos de cúmulos, à adição de novos crimes e de novas penas corresponde, em princípio, à aplicação de penas mais elevadas. 16. Porém, como resulta da decisão recorrida e das razões que justificam modificação da execução da pena de prisão, as circunstâncias pessoais da arguida, em particular as graves, irreversíveis e incapacitantes condições de saúde descritas nos pontos 5 a 9 da matéria de facto provada - , com deterioração a partir de 2023 (facto 12), afiguram-se de um muito elevado nível de gravidade a justificarem que atualmente se devam considerar significativamente reduzidas as exigências de prevenção especial. Como se disse, se o grau de censurabilidade (de culpa), avaliado com referência à data em que os crimes foram cometidos, é particularmente elevado, em particular no que respeita aos factos deste processo, já o mesmo não ocorre no que respeita às circunstâncias que, na determinação da medida da pena, importa ponderar por via da prevenção com referência ao momento da aplicação desta. Se, por um lado, a doença de que a arguida padece, doença que vem caraterizada como «grave, crónica, irreversível e evolutiva, criando dependência de terceiros para as actividades da vida diária», em termos que apontam decididamente neste sentido, é, por outro, a não oposição de «fortes exigências de prevenção ou de ordem e paz social» (artigo 118.º do CEPMPL) que justifica a modificação da execução da pena de prisão e o internamento em estabelecimento de saúde adequado. 17. Assim sendo, considerando, em conjunto, a gravidade dos factos praticados, evidenciada pela reiteração de comportamentos a revelarem tendência para a prática de atos de idêntica natureza – mas sem esquecer a necessidade de evitar a dupla valoração, tendo em conta a punição pela reincidência –, e pelo elevado impacto financeiro das consequências dos factos a que se refere um dos processos, bem como as caraterísticas de personalidade neles manifestada e as atuais circunstâncias pessoais reveladoras de acentuada diminuição das exigências de ressocialização, nos termos dos artigos 71.º e 77.º do Código Penal, mostra-se justificada uma intervenção corretiva na medida da pena única, que se reduz para 7 anos de prisão, por, nesta medida, se afigurar mais conforme aos critérios de adequação e proporcionalidade legalmente impostos. Nesta conformidade, embora com fundamentos não coincidentes, é o recurso julgado parcialmente procedente. Quanto a custas 18. De acordo com o disposto no artigo 513.º do CPP (responsabilidade do arguido por custas), só há lugar ao pagamento da taxa de justiça quando ocorra condenação em 1.ª instância e decaimento total em qualquer recurso. O que não é o caso. III. Decisão 19. Pelo exposto, acorda-se em julgar parcialmente procedente o recurso interposto pela arguida AA, reduzindo-se a pena para 7 (sete) anos de prisão e mantendo-se, no mais, a decisão recorrida. Sem custas. Supremo Tribunal de Justiça, 1 de outubro de 2025. José Luís Lopes da Mota (relator) Maria Margarida Ramos de Almeida José A. Vaz Carreto ________
1. Sobre estes pontos, que seguidamente se desenvolvem, na determinação do sentido e alcance do artigo 71.º do Código Penal, segue-se, em particular, como em acórdãos anteriores, Anabela M. Rodrigues, A Determinação da Medida da Pena Privativa da Liberdade, Os Critérios da Culpa e da Prevenção, Coimbra Editora, 2014, pp. 611-678, em especial, e Figueiredo Dias, Direito Penal, As Consequências Jurídicas do Crime, Coimbra Editora, 2011, pp. 232-357 – cfr., de entre muitos outros, o acórdão de 15.1.2019, Proc. 4123/16.6JAPRT.G1.S1, e, de entre os mais recentes, o citado acórdão de 10.09.2025, Proc. 200/24.8PAVNF.S1, em www.dgsi.pt. 2. Assim, entre outros, os acórdãos de 8.6.2022, Proc. 430/21.4PBPDL.L1.S1, de 26.06.2019, Proc. 174/17.1PXLSB.L1.S1, de 9.10.2019, Proc. 24/17.9JAPTM-E1.S1, e de 3.11.2021, Proc. 875/19.0PKLSB.L1.S1, em www.dgsi.pt. 3. Salientando este ponto, entre muitos outros, o acórdão de 29.4.2020, Proc. 16/05.0GGVNG.S1, em www.dgsi.pt., com referência à doutrina anteriormente citada. |