Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães
Processo:
669/09.0TBPVL-D.GMR.G1
Relator: EVA ALMEIDA
Descritores: INCIDENTE PROCESSUAL
TRIBUTAÇÃO
Nº do Documento: RG
Data do Acordão: 04/24/2024
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: APELAÇÃO PROCEDENTE
Indicações Eventuais: 2ª SECÇÃO CÍVEL
Sumário:
I - São procedimentos ou incidentes anómalos as ocorrências estranhas ao desenvolvimento normal da lide que devam ser tributados segundo os princípios que regem a condenação em custas – n.º 8 do artigo 7.º do RCP.
II - As diligências e informações solicitadas pela exequente ao A.E., foram-no na sequência da notificação que dele recebera para requerer o que tivesse por conveniente, inserindo-se assim no normal desenvolvimento do processo.
III - A apresentação a despacho, pelo agente de execução, de um requerimento da exequente que só a ele era dirigido na sequência da notificação que dele recebera, não constitui um incidente processual, nem nas circunstâncias concretas deve ser considerado um incidente anómalo (a única anomalia foi ter sido remetido pelo AE para despacho), ou infundado e como tal não deve ser tributado.
Decisão Texto Integral:
ACORDAM NO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE GUIMARÃES

 I – RELATÓRIO

 Em 13-9-2023 EMP01..., SARL., na sequência de notificação do Agente de Execução para requerer o que tivesse por conveniente, enviou ao Agente de Execução o seguinte requerimento:
 EMP01..., SARL., Exequente nos autos melhor identificados supra, no seguimento da notificação datada de 11.09.2023 (Ref.ª Citius 15024224)[[1]], vem, mui respeitosamente, requerer junto de V. Exa. que se digne a notificar o Serviço de Finanças ... para vir informar de forma inequívoca se se opõe à promoção da venda do imóvel sub judice no âmbito do presente processo executivo – advertindo que o mesmo será citado para salvaguardar a sua posição jurídica e vir reclamar os créditos detidos diante a Executada EMP02..., Lda. – uma vez que, apenas, “não há despacho de marcação de venda a efetuar nos termos do artigo 248.º e ss. do Código de Procedimento e de Processo Tributário, do imóvel inscrito na matriz predial urbana da freguesia ... ( ...) sob o artigo ...55 fração ..., atento o número de processos executivos a tramitar por este serviço de finanças (conforme resposta dada pelo Serviço de Finanças ... em 07.12.2022 (Ref.ª Citius 13855870).
*
Em 19-9-2023 foi inserido nos autos de execução o seguinte expediente:
«AA, Agente de Execução nos presentes autos, vem remeter os presentes autos para despacho face ao requerido pela Ilustre Mandatária no requerimento apresentado a 13-09-2023 cuja cópia anexo».
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Aberta conclusão, a Mmª Sra. Juiz “a quo” proferiu o seguinte despacho:

«Requerimento de 26/8/2021:
A exequente não carreia para os autos factos novos que imponham a alteração das decisões proferidas em 28/4/2021 e 26/8/2021 relativamente à mesma questão.
Note-se que a execução apenas prosseguirá se ficar demonstrado que a AT não realizará a venda, sendo inócuo que declare que não se opõe à realização da venda nestes autos.
A decisão de prosseguimento é, como da posição assumida já resulta, uma actuação excepcional e como tal devem estar reunidos os elementos que o tribunal considera essenciais, nomeadamente a referida posição da AT, cumprindo à exequente demonstrar que a venda não se realizará.
Indefere-se, pois, também com os mesmos fundamentos constantes das ditas decisões – que se dão por reproduzidas - ao requerido.
Custas do incidente, porque anómalo, a cargo da exequente, fixando-se a taxa de justiça em 4 Ucs
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Inconformada, a exequente apresentou o seguinte requerimento:
EMP01..., S.A.R.L., Exequente nos autos melhor identificados supra, notificada do douto despacho proferido em 23.10.2023 (Ref.ª Citius 187141467), vem, mui respeitosamente, requerer a sua retificação ao abrigo do artigo 614.º do CPC, o que faz nos termos e com os seguintes fundamentos:
A título de premissa, cumpre evidenciar que existe lapso de escrita na identificação da data do Requerimento sobre o qual se pronuncia, na medida em que o requerimento de 26.08.2021 indicado já foi objeto de prévia decisão datada de 24.09.2021 (Ref.ª Citius 175089276).
(…)
A Exequente não dirigiu qualquer pedido a V. Exa. e muito menos que fosse proferida decisão diversa das que já haviam sido previamente proferidas quanto ao prosseguimento da venda nesta execução.
Ao invés, limitou-se a remeter comunicação ao Senhor Agente de Execução na qual solicitou que este encetasse diligências prévias junto da Autoridade Tributária e Aduaneira com o intuito de:
por um lado, verificar se existirá alteração de circunstâncias quanto à venda nos autos de execução fiscal desde as decisões anteriormente proferidas;
por outro, obter uma pronúncia expressa por parte daquela entidade sobre se se opunha à promoção da venda do imóvel sub judice no âmbito do presente processo executivo, apelando que o Senhor Agente de Execução advertisse, expressamente, que a Autoridade Tributária seria citada para salvaguardar a sua posição jurídica e vir reclamar os créditos detidos diante a Executada EMP02..., Lda.
Sucede, todavia, que o Senhor Agente de Execução, ignorando as diligências pedidas, se limitou a remeter a comunicação da Exequente à consideração do Mmo. Juiz.
Resulta claro e manifesto que a Exequente não dirigiu a V. Exa. qualquer requerimento; ao invés, foi o Senhor Agente de Execução quem despoletou – contrariamente ao que lhe foi solicitado – o presente incidente.
(…)
Pelo que deverá o despacho proferido ser retificado em conformidade, ao abrigo do artigo 614.º do CPC, por padecer de lapso manifesto, sendo substituído por outro que dê sem efeito a condenação do Exequente na abertura de incidente e custas fixadas, ditando, outrossim, que o Agente de Execução tramite o processo judicial, ao abrigo das competências que lhe estão atribuídas, nos termos do artigo 719º do C.P.C»
Bem como interpôs o presente recurso, que instruiu com as pertinentes alegações, em que formula as seguintes conclusões:
 «I. Andou mal o Tribunal a quo na ponderação e valoração da matéria de facto e de direito, porquanto proferiu uma decisão que, alcançando as últimas consequências legais, incontornável e inevitavelmente, atentará contra o princípio da causalidade, da vantagem ou proveito processual, da confiança e da segurança jurídicas;
II. O incidente sobre o qual se debruça a decisão recorrida foi despoletado pelo Senhor Agente de Execução que, sem adotar as diligências prévias peticionadas pela Recorrente, deu a conhecer ao douto Tribunal a quo o teor da comunicação por remetida pela Recorrente, sem mais;
III. Com efeito, o Senhor Agente de Execução, ignorando as diligências pedidas, limitou-se a remeter a comunicação da Recorrente – através do qual solicitava ao Agente de Execução que solicitasse informação do processo de execução fiscal onde se encontra registada a 1ª penhora sobre o imóvel também penhorado nos presentes autos – para apreciação do Meritíssimo Juiz.
IV. Sem antes aferir que o ora Recorrente não colocava, pela comunicação remetida, qualquer pedido à consideração do tribunal, veio o Mmo. Juiz do Tribunal a quo indeferir o incidente e condenar o ora Recorrente em custas;
V. Ora, dita o n.º 1 do artigo 527.º que “a decisão que julgue a ação ou algum dos seus incidentes condena em custas a parte que a elas houver dado causa”;
VI. A Recorrente não deu origem ao presente incidente e, por conseguinte, não poderá ser responsabilizada pelo pagamento das custas fixadas no valor de 4 UC’s no despacho recorrido;
VII. Acresce evidenciar que se consideram procedimentos ou incidentes anómalos as ocorrências estranhas ao desenvolvimento normal da lide que devam ser tributados segundo os princípios que regem a condenação em custas – n.º 8 do artigo 7.º do RCP.
VIII. Nas execuções cíveis sustadas ao abrigo do 794.º do CPC por penhora prévia registada à ordem de processos de execução fiscal, o pedido de informações à Autoridade Tributária e Aduaneira sobre o estado do processo onde se encontre registada a 1ª penhora de imóvel penhorado também na execução cível, é o mínimo de diligência que se impõe ao Credor.
IX. Face ao exposto, o presente incidente – ainda que não despoletado pela Recorrente - não consubstancia atividade anómala ou invulgar ao andamento do processo;
X. Destarte, tratar-se-á de um incidente inominado não merecedor de qualquer censura, pelo que não deverá ser tributado como se de uma “litigância imponderada ou irrefletida” se tratasse;
XI. Em suma, a decisão recorrida merece censura por parte do douto Tribunal ad quem, devendo, por isso, ser substituída por outra que melhor tutele a questão jurídica sub judice, pois só assim se salvaguardará a segurança e confiança jurídicas.»
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Dos autos não constam contra-alegações.
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O requerimento apresentado mereceu a seguinte decisão:
«Requerimento de 13/11/2023:
Veio a exequente EMP01..., S.A.R.L. veio requerer a rectificação do despacho de 23/10/2023, nos termos do art. 614º do Cód. Proc. Civil, alegando, em suma, que lavra o mesmo em erro por não ter sido o requerimento que o espoleta dirigido ao tribunal e, assim sendo, não é devida a multa aplicada.
Observou-se o contraditório
Cumpre apreciar e decidir.
Dispõe o art. 614º do Cód. Proc. Civil que “1 - Se a sentença omitir o nome das partes, for omissa quanto a custas ou a algum dos elementos previstos no n.º 6 do artigo 607.º, ou contiver erros de escrita ou de cálculo ou quaisquer inexatidões devidas a outra omissão ou lapso manifesto, pode ser corrigida por simples despacho, a requerimento de qualquer das partes ou por iniciativa do juiz. 2 - Em caso de recurso, a retificação só pode ter lugar antes de ele subir, podendo as partes alegar perante o tribunal superior o que entendam de seu direito no tocante à retificação. 3 - Se nenhuma das partes recorrer, a retificação pode ter lugar a todo o tempo.”
O Tribunal entende que não há qualquer lapso a corrigir.
Vejamos.
A exequente EMP01..., S.A.R.L. veio, por requerimento de 22/1/2021, requerer o prosseguimento da execução não obstante a penhora anterior a favor da autoridade tributária, o que foi indeferido por despacho de 28/4/2021, que não mereceu impugnação.
Posteriormente, voltou a requerer o prosseguimento da execução, alegando que a venda no processo executivo não se realiza atenta a pendência de acordo de pagamento celebrado com a autoridade tributária.
Em 24/9/2021 foi a pretensão da exequente novamente indeferida, por despacho que não mereceu impugnação.
Desde então vem a exequente dirigido comunicações ao SE instando-o a notificar as finanças – cfr. comunicações de 5/12/2022 e 13/9/2023 - com vista a que o mesmo prossiga a execução.
O Sr. SE solicitou, face à última comunicação referida, a intervenção do tribunal (conforme, de resto, o prevê o art. 723º, nº 1, al. d), do Cód. Proc. Civil), tendo sido novamente indeferida a pretensão do exequente, nos termos e com os fundamentos do despacho de 23/10/2023, cujo teor se dá por reproduzido.
O tribunal entendeu, e assim permanece o entendimento, que a exequente persiste na pretensão formulada sem dar cumprimento às premissas de que sabe estar dependente a procedência daquela.
E, em vez de providenciar por esse cumprimento, pretende alcançar o seu desiderato através do SE, dirigindo-lhe comunicações com o intuito – afigura-se – de evitar a intervenção do tribunal já que sabe que não obteria vencimento.
Assim, indefere-se à requerida rectificação.
Custas do incidente a cargo da exequente, fixando-se a taxa de justiça em 2 Ucs – art. 7º, nº 4 do RCP e Tabela II anexa ao mesmo diploma.»
*
O recurso foi admitido a subir de imediato, em separado e com efeito meramente devolutivo.
Os autos foram remetidos a este Tribunal da Relação, onde foi recebido nos termos em que o fora na 1ª instância e com o mesmo efeito, por ser o legalmente previsto.
 Colhidos os vistos, cumpre decidir.

II - DELIMITAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO E QUESTÕES A DECIDIR.

 O objecto do recurso é delimitado pelas conclusões das alegações da apelante, tal como decorre das disposições legais dos artºs 635º nº4 e 639º do CPC, não podendo o tribunal conhecer de quaisquer outras questões, salvo se a lei lhe permitir ou impuser o seu conhecimento oficioso (art.º 608º nº2 do CPC). 
As questões a resolver são as que constam das conclusões da apelação, acima reproduzidas e que assim se sintetizam:
– Se se justifica a tributação da recorrente na sequência do requerimento que apresentou ao AE.

III - FUNDAMENTOS DE FACTO

Os factos com interesse para a apreciação do presente recurso são os que constam do relatório supra.

IV – FUNDAMENTOS DE DIREITO

 No processo executivo o art.º 719.º do CPC estabelece a repartição de competências entre o Agente de Execução e a Secretaria, dispondo:

1 - Cabe ao agente de execução efetuar todas as diligências do processo executivo que não estejam atribuídas à secretaria ou sejam da competência do juiz, incluindo, nomeadamente, citações, notificações, publicações, consultas de bases de dados, penhoras e seus registos, liquidações e pagamentos.
2 - Mesmo após a extinção da instância, o agente de execução deve assegurar a realização dos atos emergentes do processo que careçam da sua intervenção.
(…)
Por seu turno o art.º 723.º do CPC define os actos que são da competência do Juiz, estabelecendo:
1 - Sem prejuízo de outras intervenções que a lei especificamente lhe atribui, compete ao juiz:
a) Proferir despacho liminar, quando deva ter lugar;
b) Julgar a oposição à execução e à penhora, bem como verificar e graduar os créditos, no prazo máximo de três meses contados da oposição ou reclamação;
c) Julgar, sem possibilidade de recurso, as reclamações de atos e impugnações de decisões do agente de execução, no prazo de 10 dias;
d) Decidir outras questões suscitadas pelo agente de execução, pelas partes ou por terceiros intervenientes, no prazo de cinco dias.
2 - Nos casos das alíneas c) e d) do número anterior, pode o juiz aplicar multa ao requerente, de valor a fixar entre 0,5 UC e 5 UC, quando a pretensão for manifestamente injustificada.
No caso em apreço, na sequência da comunicação do A.E. para requerer o que tivesse por conveniente (ver nota 1), a recorrente solicitou ao A.E. a realização de determinadas diligências junto da AT, nomeadamente informações sobre o curso da execução que aí corre termos e onde fora efectuada a 1ª penhora sobre os bens também penhorados nestes autos, já que tal execução estava sem andamento e inexistiam outros bens penhoráveis.
Trata-se de uma diligência da exclusiva competência do A.E..
O A.E. remeteu para despacho tal requerimento, sem suscitar qualquer questão ou dúvida sobre o que lhe fora solicitado pela exequente.
Pelo exposto pode afirmar-se linearmente que a exequente nada requereu ao Tribunal, não suscitou ao Juiz a decisão ou pronúncia sobre qualquer questão.
Tampouco a exequente reclamou de acto do AE ou impugnou qualquer decisão deste.
Concluímos, por isso, que, a ser considerado incidente processual a submissão pelo AE ao Tribunal do requerimento que lhe fora dirigido pela exequente, não foi a exequente que lhe deu azo.
Mais ainda, entendemos que não consubstancia incidente a mera solicitação de diligências ao AE no âmbito da execução – nem incidente tipificado, nem atípico, ou inominado.
Com efeito, ainda que requerimentos com vista ao prosseguimento da execução, tenham sido apresentados em 2021 e 2022 e indeferidos pelo Tribunal, não deve ser qualificado como incidente anómalo a justificada tentativa do exequente de ver satisfeito o seu direito e requerer que seja obtida informação com vista a alcançar tal desiderato.
São procedimentos ou incidentes anómalos as ocorrências estranhas ao desenvolvimento normal da lide que devam ser tributados segundo os princípios que regem a condenação em custas – n.º 8 do artigo 7.º do RCP.
Ora as informações solicitadas pela exequente ao A.E., foram-no na sequência da notificação que dele recebera para requerer o que tivesse por conveniente, inserindo-se assim no normal desenvolvimento do processo e não justificavam, sem mais, a sua submissão a despacho do juiz.
E mesmo que se entenda que o A.E.  pode, sem qualquer justificação, submeter a questão ao juiz do processo, entendemos que o requerido pela Exequente, na sequência da notificação recebida e no contexto de uma execução pendente há 14 anos, não era descabido, nem lhe estava processualmente vedado, considerando os poderes deveres do juiz na adequação de uma tramitação processual adequada às especificidades da causa, desde que para tanto obtivesse a concordância da Autoridade Tributária.
É preciso ter presente que o art.º 20º da Constituição consagra o direito fundamental de acesso ao direito e à tutela jurisdicional efectiva – que se realiza por meio de um processo célere e equitativo.
Em concretização de tal princípio, o art.º 6º do CPC passou a responsabilizar o juiz pela consecução desses objectivos (celeridade com equidade).
Como refere o Excelentíssimo Conselheiro Jorge Manuel Leitão Leal, no artigo  publicado na Revista Electrónica De Direito, Junho 2021, N.º 2, VOL. 25, “AECOP, em compensação e gestão processual” – WWW.CIJE.UP.PT/REVISTARED (págs. 201/204):
– «Mais do que um poder, a gestão processual é um dever do juiz que, uma vez iniciado o processo por impulso da parte, deverá adoptar uma postura proactiva, norteada pela optimização do tempo e dos recursos disponíveis.
Nos termos do n.º 1 do art.º 6.º a gestão processual passa também pela adopção de “mecanismos de simplificação e agilização processual”.
Trata-se de aplicar ao conjunto da tramitação processual o princípio que vigora quanto a cada acto processual: “Os actos processuais têm a forma que, nos termos mais simples, melhor correspondam ao fim que visam atingir” (art.º 131.º n.º 1).
Sendo certo que segundo o “princípio da limitação dos actos”, proclamado no art.º 130.º, “Não é lícito realizar no processo atos inúteis”.
A simplificação e agilização processual concretizam-se através da adequação formal, regulada no art.º 547.º
Este artigo insere-se no Título VII do Livro II do CPC, ou seja, no Título que contém as disposições gerais enunciadoras das formas do processo de declaração e do processo de execução.
É neste “ambiente normativo” que o legislador confere expressamente ao juiz não só o poder mas também o dever da adequação formal, nos termos que aqui se transcrevem:
“O juiz deve adotar a tramitação processual adequada às especificidades da causa e adaptar o conteúdo e a forma dos atos processuais ao fim que visam atingir, assegurando um processo equitativo.”
A adequação formal pode consistir na alteração da sequência de atos da tramitação legal, na eliminação de ato previsto na tramitação legal, na alteração do conteúdo ou da forma do ato, no adicionamento de ato não previsto na lei, mas que se considera que facilitará (agilizará) a realização dos fins do processo.
No final do art.º 547.º subordina-se a adequação formal ao modelo do processo equitativo. Também no n.º 1 do art.º 6.º se pauta o cumprimento do dever de gestão processual pela justa composição do litígio.
A adequação formal significa que o juiz não está obrigado a cumprir à risca o guião processual legalmente previsto
Mesmo que se entendesse indeferir o requerimento apresentado pela exequente ao A.E., sempre seria excessivo qualificá-lo como incidente, penalizando a exequente com o pagamento de 4UCs de taxa de justiça (mais 2Ucs pelo requerimento de rectificação desse despacho), num total de € 666, numa execução que se arrasta há 14/15 anos, sem que o exequente obtenha o pagamento do crédito que adquiriu, o que lhe é vedado por uma penhora anterior em execução fiscal, suspensa por acordos celebrados entre a AT e o executado, ou, agora, por tal jurisdição não conseguir dar andamento às suas execuções, seja pela pendência excessiva, seja por falta de meios.
Ao Estado e a todos os seus órgãos de soberania, incluindo os Tribunais, não se exige apenas o cego cumprimento do formalismo legal, exige-se que actuem com equidade e celeridade, sopesando os direitos dos cidadãos, nomeadamente o direito a uma tutela jurisdicional efectiva dos seus direitos, no confronto com outros interesses, nomeadamente o da cobrança de dívidas ao fisco, quando é o próprio Estado que não a obtém em tempo útil, por diversas razões, nenhuma delas imputável à exequente.
Por tudo o que fica exposto, entendemos que a apresentação a despacho, pelo agente de execução, de um requerimento da exequente que só a ele era dirigido na sequência da notificação que dele recebera, não constitui um incidente processual, nem nas circunstâncias concretas deve ser considerado um incidente anómalo (a única anomalia foi ter sido remetido pelo AE para despacho), ou infundado e como tal não deve ser tributado.
Consequentemente, acolhemos as conclusões da apelante, impondo-se a revogar o despacho recorrido na parte em que considerou que o requerimento apresentado pelo exequente ao A.E. em 13-9-2023 constituía um incidente anómalo, condenando a exequente em custas.

V - DELIBERAÇÃO

Nestes termos, acordam os juízes deste Tribunal da Relação de Guimarães em julgar procedente a apelação, revogando a decisão recorrida na parte em que julgou estar perante um incidente anómalo e condenou o exequente em custas.
As custas desta apelação acrescem às da execução.
Guimarães, 24-4-2024

Eva Almeida      
António Figueiredo de Almeida
Carla Sousa Oliveira                                       


[1] O teor da notificação era o seguinte: “Cumpre-me notificar V.Exª., na qualidade de Ilustre Mandatário do Banco Exequente nos autos de execução comum acima identificados, e face á sustação do imóvel penhorado nos autos, no prazo de 10 dias requer o que tiver por conveniente.