Pareceres PGR

Parecer do Conselho Consultivo da PGR
Nº Convencional: PGRP00002856
Parecer: P000032007
Nº do Documento: PPA0103200700300
Descritores: CASAMENTO DE ESTRANGEIROS EM PORTUGAL
FORMA
NORMA DE CONFLITO
LEI DO LUGAR DA CELEBRAÇÃO DO ACTO
LEI PESSOAL
COMPETÊNCIA
CELEBRAÇÃO DO CASAMENTO
FUNCIONÁRIO CONSULAR
PRINCÍPIO DA RECIPROCIDADE
CONSERVADOR DO REGISTO CIVIL
ORGANIZAÇÃO
PROCESSO PRELIMINAR DE PUBLICAÇÕES
POSTO CONSULAR
CONSERVATÓRIA DO REGISTO CIVIL
DOMICÍLIO
RESIDÊNCIA
CERTIFICADO DE CAPACIDADE MATRIMONIAL
ORDEM PÚBLICA
CASAMENTO DE PORTUGUÊS COM ESTRANGEIRO
CASAMENTO DE PORTUGUESES NO ESTRANGEIRO
DIREITO DOS ESTRANGEIROS
PRINCÍPIO DA EQUIPARAÇÃO
PRINCÍPIO DO TRATAMENTO NACIONAL
Livro: 00
Numero Oficio: 32
Data Oficio: 01/05/2007
Pedido: 01/09/2007
Data de Distribuição: 01/09/2007
Relator: LEONES DANTAS
Sessões: 01
Data da Votação: 03/01/2007
Tipo de Votação: UNANIMIDADE
Sigla do Departamento 1: MNE
Entidades do Departamento 1: SE DAS COMUNIDADES PORTUGUESAS
Posição 1: HOMOLOGADO
Data da Posição 1: 04/10/2007
Privacidade: [01]
Data do Jornal Oficial: 25-05-2007
Nº do Jornal Oficial: 101
Nº da Página do Jornal Oficial: 14198
Indicação 2: ASSESSOR:TERESA BREIA
Área Temática:DIR CIV * DIR FAM / DIR ESTR / DIR INT PRIV / DIR REG NOT / DIR ADM * ADM PUBL
Legislação:CONST76 ART4 ART13 N2 ART15 N1 ART18 N2 N3; CCIV66 ART49 ART50 ART51 N1 ART82 ART1600 ART1610 ART1611 ART1612 ART1613 ART1614 ART1615; L 37/2006 DE 2006/08/09 ART1 ART4 ART6 ART7 ART10 ART16 ART17 ART21; DL 244/98 DE 1998/08/08 ART2 ART3 ART4 ART9 ART12 N3 ART13 N3 ART26 N1 ART27 ART33 ART34 ART35 ART36 ART38 ART47 ART81 ART85 ART87 ART90 ART95 ART96 ART97; L 97/99 DE 1999/07/26; DL 4/2001 DE 2001/01/10; DL 34/2003 DE 2003/02/25; DRGU 6/2004 DE 2004/04/26; L 204/2006 DE 2006/10/27 ART4 N2 ART14 N2 A; DL 381/97 DE 1997/12/30 ART51 ART52 N1 B ART35 N2 A ART53 ART54; L 22/98 DE 1998/05/12; DL 162/2006 DE 2006/08/08; DL 75/98 DE 1998/03/27 ART1 N2 ART1 N3; PORT 350/98 DE 1998/06/22; CRC95 ART9 N1 A ART134 ART135 ART136 N2 A F J ART137 ART138 ART140 ART141 ART143 ART151 ART152 ART161 ART162 ART163 ART164 ART165; CRC78 ART164 ART171 N5; CRC67 ART166 ART173 N5; CRC58 ART148 ART156 N3; CRC32 ART265 ART278 §ÚNICO; L 16/2001 DE 2001/06/22 ART19
Direito Comunitário:DIR 2004/38/CE DE 2004/04/29
Direito Internacional:CONVENÇÃO DE VIENA SOBRE RELAÇÕES CONSULARES DE 1963/04/24 IN DL 183/72 DE 1972/05/30 ART1 N2 ART2 N1 ART5 F
RECT DE 1972/07/11
RECT DE 1975/12/29
CONVENÇÃO EUROPEIA SOBRE FUNÇÕES CONSULARES DE 1967/12/11 IN DG 60/84 DE 1984/10/03 ART13 N1 B
CONVENÇÃO RELATIVA À EMISSÃO DE UM CERTIFICADO DE CAPACIDADE MATRIMONIAL DE 1980/10/05 IN DG 40/84 DE 1984/07/24
Direito Estrangeiro:
Jurisprudência:
Documentos Internacionais:
Ref. Complementar:
Conclusões: 1.ª – O artigo 134.º do Código do Registo Civil estabelece um período de residência mínimo de 30 dias, de um dos nubentes pelo menos, na área de uma conservatória do registo civil, para atribuir a essa conservatória a competência para a organização do processo preliminar de publicações;
2.ª – Essa exigência decorre dos interesses de ordem pública que estão subjacentes à forma do casamento, nomeadamente a sua publicidade, e não é alterada pela nacionalidade dos nubentes ou pela residência habitual dos mesmos no estrangeiro.
3.ª – Os postos consulares portugueses são incompetentes para a organização do processo preliminar de publicações relativamente a dois nubentes estrangeiros, residentes no estrangeiro, que pretendam vir a celebrar casamento em Portugal, de acordo com a lei portuguesa.

Texto Integral:

Senhor Secretário de Estado das
Comunidades Portuguesas,

Excelência:


I


Tendo-se suscitado dúvidas sobre a competência dos agentes consulares portugueses no estrangeiro para a organização do processo preliminar de publicações, com vista à celebração de casamento, em Portugal, de cidadãos estrangeiros domiciliados em território estrangeiro, e tendo-se verificado igualmente divergências de procedimento entre as conservatórias do registo civil nesta matéria, entendeu Vossa Excelência solicitar parecer deste corpo consultivo([1]), sendo formuladas as seguintes questões:

«a) Têm os agentes consulares portugueses competência para a organização do processo preliminar de publicações de dois cidadãos estrangeiros, não residentes em Portugal, mas que aqui desejem contrair matrimónio?

b) Em caso afirmativo, podem as conservatórias do registo civil português recusar a celebração do casamento?»

Na informação de serviço que acompanhou o pedido de parecer equacionam-se as questões suscitadas no quadro das normas de conflitos previstas no Código Civil relativas à forma do casamento, à luz do direito convencional relativo à competência dos consulados em matéria de registo civil, e no âmbito das disposições do Código do Registo Civil sobre o casamento e respectivo processo preliminar, tendo-se concluído no sentido de que «a competência dos agentes consulares portugueses no estrangeiro, no atinente a actos de registo civil, designadamente casamentos, é limitada a portugueses aí residentes, habitual ou ocasionalmente», e que «os estrangeiros podem celebrar casamento em Portugal, nos termos da lei do lugar de celebração, mas para tanto, necessário se torna que um dos nubentes tenha domicílio ou residência estabelecida, nos últimos 30 dias anteriores à data da declaração do casamento ou da apresentação do requerimento para efeitos de instauração do respectivo processo de publicações, na área da conservatória do registo civil competente».

Cumpre, pois, emitir, com carácter de urgência, o solicitado parecer.

II


1 - A Constituição da República, no seu artigo 15.º, n.º 1, estabelece o princípio da equiparação dos estrangeiros e dos apátridas aos cidadãos portugueses, relativamente ao gozo de direitos, referindo que os mesmos, desde que se «encontrem ou residam em Portugal», «gozam dos direitos e estão sujeitos aos deveres do cidadão português».

O mesmo princípio já resultava do artigo 14.º, n.º 1, do Código Civil que determinava que «os estrangeiros são equiparados aos nacionais quanto ao gozo dos direitos civis».

O sistema jurídico português consagra, pois, em relação aos estrangeiros, um regime de tratamento nacional, do qual resulta que aqueles cidadãos gozam de um tratamento tão favorável como aquele que é atribuído aos cidadãos nacionais.

Esta equiparação, segundo J.J. GOMES CANOTILHO e VITAL MOREIRA, «vale para todos os direitos, pelo que, para além da tradicional paridade civil e dos clássicos direitos de liberdade, eles gozam também, em princípio, dos direitos de prestação, como por exemplo, o direito à saúde, ao ensino, à habitação etc.»([2]).


2 - A amplitude da equiparação prevista naquele artigo 15.º, n.º 1, da Constituição da República pode suscitar dúvidas na compatibilização das restrições decorrentes de cláusulas de reciprocidade consagradas em normas avulsas com aquele princípio constitucional.

Na verdade, o princípio da equiparação dos estrangeiros aos nacionais, decorrente daquela norma, e o princípio da proibição de discriminações em função da origem, previsto no artigo 13.º, n.º 2, da Lei Fundamental, podem determinar a inconstitucionalidade das normas que estabeleçam tais cláusulas, uma vez que «vale a regra constitucional da equiparação», relativamente à generalidade dos direitos, «designadamente os direitos sociais»([3]).

Segundo MÁRIO TORRES, «da Constituição resulta que, em princípio, não há discriminação entre estrangeiros, mas apenas entre portugueses, por um lado, e estrangeiros, por outro, excepto as discriminações positivas de que podem beneficiar os cidadãos dos países de língua oficial portuguesa e os cidadãos dos Estados membros da União Europeia»([4]).

Uma das cláusulas de reciprocidade mais importantes é que resulta do n.º 2 do artigo 14.º do Código Civil, que prevê que não são «reconhecidos aos estrangeiros os direitos que sendo atribuídos pelo respectivo Estado aos seus nacionais, o não sejam aos portugueses em igualdade de circunstâncias».

Decorre desta norma que não são reconhecidos aos estrangeiros em Portugal os direitos que nos seus países de origem não sejam reconhecidos aos cidadãos portugueses aí residentes, em igualdade de circunstâncias.

Através deste tipo de cláusulas procurava-se pressionar os Estados estrangeiros no sentido de reconhecerem aos portugueses aí residentes os direitos reconhecidos aos seus nacionais, contribuindo desta forma para o combate a situações de desigualdade que afectem os cidadãos portugueses.

Como referia FERRER CORREIA, relativamente à justificação daquela cláusula, «a única coisa que se exige é que, relativamente ao gozo de tal direito, não se encontrem os estrangeiros naquele Estado, e em particular os portugueses, em condições de inferioridade perante os nacionais»([5]).

MÁRIO TORRES pronunciou-se pela incompatibilidade daquela norma do Código Civil com a Constituição da República, referindo que a mesma se deve considerar revogada ou caducada, «conforme a tese que se adopte quanto ao efeito da incompatibilidade de normas de direito ordinário com uma nova Constituição), por incompatível com o artigo 15.º da Constituição»([6])([7]).

JORGE MIRANDA, por seu lado, depois de referir que o regime decorrente do artigo 15.º da Lei Fundamental permite a «possibilidade de a reserva legal de certos direitos aos portugueses ser feita tanto em termos absolutos como – por maioria de razão – em termos relativos, através de cláusulas de reciprocidade”([8]), refere, quanto à compatibilização da cláusula do artigo 14.º, n.º 2, do Código Civil, com o art. 15.º da Constituição da República, que a resposta «não pode deixar de ser afirmativa na lógica do princípio da equiparação – o qual deverá jogar em ambas as direcções e não favorecer apenas os estrangeiros – e tendo ainda em conta a referência à lei na parte final do art. 15.º, n.º 2: se a lei pode reservar exclusivamente aos portugueses certos direitos, pode não conceder a estrangeiros direitos civis que o respectivo Estado não conceda aos portugueses»([9]).


3 - O princípio da equiparação, por força do disposto no n.º 2 daquele artigo 15.º, sofre restrições relativamente a «direitos políticos», ao «exercício de funções que não tenham carácter predominantemente técnico» e «aos direitos e deveres reservados pela Constituição e pela lei exclusivamente aos cidadãos portugueses».

Embora a norma constitucional preveja a possibilidade de serem estabelecidas outras restrições relativamente ao gozo de direitos por parte de estrangeiros, «todas as excepções têm de ser justificadas e limitadas, devendo observar os princípios da necessidade, adequação e proporcionalidade quanto à restrição de direitos constitucionais»([10]), por força dos princípios decorrentes dos n.ºs 2 e 3 do artigo 18.º da Constituição.

No que se refere a cidadãos oriundos dos países da União Europeia, a possibilidade de restrição sofre de uma importante limitação porque relativamente a estes cidadãos vigora o princípio do tratamento nacional, «em todos os domínios integrantes da liberdade de circulação de pessoas, incluindo a liberdade de residência, de trabalho, de estabelecimento e de prestação de serviço»([11]).

As limitações ao gozo de direitos políticos por parte de cidadãos estrangeiros, decorrentes do n.º 2 do citado artigo 15.º da Lei Fundamental, são objecto das restrições previstas nos n.ºs 3, 4 e 5 daquele artigo, que prevêem a atribuição de direitos daquela natureza a cidadãos dos «Estados de língua oficial portuguesa»; a atribuição de capacidade eleitoral activa e passiva «para a eleição dos titulares de órgãos de autarquias locais», e, relativamente a cidadãos da União Europeia, o direito de «elegerem e serem eleitos Deputados ao Parlamento Europeu».


4 - Embora se configure como uma cláusula de reciprocidade, a faculdade de os estrangeiros celebrarem casamento em Portugal, de acordo com a sua lei pessoal, perante os agentes diplomáticos ou consulares dos países de que são nacionais, prevista no artigo 51.º, n.º 1, do Código Civil, «desde que igual competência seja reconhecida (...) aos agentes diplomáticos e consulares portugueses», não ofende o princípio da equiparação.

Na verdade, os estrangeiros são equiparados aos cidadãos nacionais podendo celebrar casamento perante as autoridades nacionais, de acordo com a lei portuguesa, nas mesmas circunstâncias que os portugueses.

Aquela norma introduz, assim, uma discriminação positiva dos estrangeiros em Portugal, discriminação esta condicionada ao facto de os países de onde são nacionais reconhecerem aos agentes consulares portugueses idêntica competência, para celebrar casamentos de cidadãos portugueses.

Aquela cláusula não priva, deste modo, os estrangeiros do exercício de qualquer direito concedido aos portugueses, uma vez que estes têm abertas as portas ao casamento de acordo com a lei portuguesa, em pé de igualdade com os nacionais([12]).

5 – A Constituição da República Portuguesa é omissa sobre os princípios que devem nortear a fixação da nacionalidade, remetendo no seu artigo 4.º para a lei ou convenção internacional a especificação de quem são os cidadãos portugueses.

Importa, contudo, que se tenha presente que não é uniforme a situação dos estrangeiros face ao sistema jurídico português, havendo sempre que individualizar, no contexto dos não nacionais, os cidadãos dos países de língua oficial portuguesa e os cidadãos dos demais países da União Europeia([13]).

A cidadania portuguesa, por força do disposto no artigo 14.º opera relativamente aos portugueses residentes no estrangeiro, a quem são atribuídos os direitos que não sejam incompatíveis com a ausência do país.

A cidadania, tal como referem J.J. GOMES CANOTILHO e VITAL MOREIRA é um atributo «que acompanha o cidadão onde quer que ele se encontre» pelo que se compreende «a regra de atribuir, em princípio, aos cidadãos portugueses que se encontrem ou residam no estrangeiro, os mesmos direitos e deveres dos residentes em território nacional»([14]).

A cidadania abrange para os cidadãos nacionais no estrangeiro o direito à protecção diplomática por parte do Estado Português através das várias formas em que aquela protecção é internacionalmente assumida.

III


1 - O sistema jurídico português estabelece uma dualidade de regimes relativamente à «entrada, permanência, saída e afastamento do território nacional» de estrangeiros, conforme eles tenham ou não nacionalidade de um outro Estado membro da União Europeia.

Com efeito, estes últimos beneficiam do «direito de livre circulação e residência», sendo os condicionalismos de natureza administrativa relativamente ao exercício desse direito comuns aos vários Estados membros, encontrando-se presentemente fixados na Directiva n.º 2004/38/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 29 de Abril, que foi transposta para o ordenamento jurídico português pela Lei n.º 37/2006, de 9 de Agosto.

Os estrangeiros em geral estão sujeitos ao regime decorrente do Decreto-Lei n.º 244/98, de 8 de Agosto([15]), com as alterações decorrentes da Lei n.º 97/99, de 26 de Julho, e dos Decretos-Leis n.º s 4/2001, de 10 de Janeiro, e 34/2003, de 25 de Fevereiro.

A Lei n.º 37/2006, de 9 de Agosto, define, tal como decorre do seu artigo 1.º, «a) As condições que regem o exercício do direito de livre circulação e residência no território nacional pelos cidadãos da União e seus familiares»; «b) O regime jurídico do direito de residência permanente no território nacional dos cidadãos da União e seus familiares»; e «c) As restrições aos direitos a que se referem as alíneas a) e b), fundadas em razões de ordem pública, de segurança pública ou de saúde pública».

Por força do disposto no artigo 4.º, n.º 1, daquela Lei, os cidadãos da União entram no território nacional «mediante a simples apresentação de um bilhete de identidade ou de passaporte válidos e sem qualquer visto de entrada ou formalidade equivalente», estabelecendo-se depois, nos números 2 e 3 deste artigo, condicionalismos específicos relativamente aos familiares destes cidadãos que não tenham nacionalidade de um país da União.

Uma vez em território nacional, por força do disposto no artigo 6.º, n.º 1, os cidadãos da União têm direito de aqui residir «por período até três meses sem outras condições e formalidades além da titularidade de um bilhete de identidade ou passaporte válidos», o que face ao disposto no n.º 2 do mesmo artigo, é extensível aos familiares, «que, munidos de um passaporte válido, acompanhem ou se reúnam ao cidadão da União».

Aquela lei define depois, no seu artigo 7.º, as condições de permanência em território nacional daqueles cidadãos quando a permanência se prolongue para além de 3 meses, e estabelece nos seus artigos 10.º e ss. as condições em que o direito de permanência se torna definitivo.

Refere-se no mencionado artigo 7.º:

«Artigo 7.º
Direito de residência dos cidadãos da União e dos seus familiares
1 - Qualquer cidadão da União tem o direito de residir no território nacional por período superior a três meses desde que reúna uma das seguintes condições:
a) Exerça no território português uma actividade profissional subordinada ou independente;
b) Disponha de recursos suficientes para si próprio e para os seus familiares, bem como um seguro de saúde, desde que tal seja exigido no Estado membro da sua nacionalidade aos cidadãos portugueses;
c) Esteja inscrito num estabelecimento de ensino público ou privado, oficialmente reconhecido, desde que comprove, mediante declaração ou outro meio de prova à sua escolha, a posse de recursos financeiros suficientes para si próprio e para os seus familiares, bem como disponha de um seguro de saúde, desde que tal seja exigido no Estado membro da sua nacionalidade aos cidadãos portugueses;
d) Seja familiar que acompanhe ou se reúna a um cidadão da União abrangido pelas alíneas anteriores.
2 - Têm igualmente o direito de residir no território nacional por período superior a três meses os familiares que não tenham a nacionalidade de um Estado membro que acompanhem ou se reúnam a um cidadão da União que preencha as condições a que se referem as alíneas a), b) ou c) do número anterior.
3 - Para os efeitos da alínea a) do n.º 1, o cidadão da União que tiver deixado de exercer uma actividade profissional mantém o estatuto de trabalhador subordinado ou independente nos seguintes casos:
a) Quando tiver uma incapacidade temporária para o trabalho resultante de doença ou acidente;
b) Quando estiver em situação de desemprego involuntário devidamente registado e estiver inscrito no Instituto do Emprego e Formação Profissional, I. P., como candidato a um emprego;
c) Quando frequentar uma formação profissional, desde que exista uma relação entre a actividade profissional anterior e a formação em causa, salvo se o cidadão estiver em situação de desemprego involuntário.»

O direito à residência por mais de 3 meses fica, deste modo, condicionando ao exercício de uma concreta actividade, das mencionadas nas alíneas a) e c) do n.º 1, ou que o cidadão em causa se encontre em qualquer uma das outras situações definidas nas restantes alíneas daquele número e do n.º 2 daquele artigo.

Os cidadãos da União e respectivos familiares que se encontrem numa situação de permanência por período superior a três meses estão sujeitos às obrigações de natureza administrativa decorrentes dos artigos 14.º e seguintes daquela diploma.

Refere-se no referido artigo 14.º:

«Artigo 14.º
Registo dos cidadãos da União
1 - Os cidadãos da União cuja estada no território nacional se prolongue por período superior a três meses devem efectuar o registo que formaliza o seu direito de residência no prazo de 30 dias após decorridos três meses da entrada no território nacional.
2 - O registo a que se refere o número anterior é efectuado junto da câmara municipal da área de residência.
3 - No acto de registo é emitido um certificado de registo, de modelo a aprovar por portaria do membro do Governo responsável pela área da administração interna, com o nome e o endereço do titular do direito de residência e a data do registo.
4 - O certificado de registo a que se refere o número anterior é válido por cinco anos a contar da data da sua emissão ou para o período previsto de residência do cidadão da União, se este período for inferior a cinco anos.
5 - Para a emissão do certificado de registo do cidadão da União é exigido bilhete de identidade ou passaporte válido, bem como a declaração, sob compromisso de honra, de que o requerente preenche as condições referidas nas alíneas a), b) ou c) do n.º 1 do artigo 7.º, consoante o caso.
6 – (...).»

Resulta deste artigo, em síntese, que o registo «formaliza» o direito de residência dos cidadãos da União e que o mesmo deve ser efectuado «no prazo de 30 dias, após decorridos três meses da entrada em território nacional».

O registo dá lugar à emissão de um título – o certificado de registo – que é válido por cinco anos, ou pelo período de permanência previsto, se for inferior.

Por força do disposto no artigo 10.º, n.º 1, daquela lei, «têm direito a residência permanente os cidadãos da União que tenham residido legalmente no território nacional por um período de cinco anos consecutivos».

A residência permanente é igualmente titulada por um «certificado de residência» que é emitido pelo Serviço de Estrangeiros e Fronteiras, nos termos do artigo 16.º daquela Lei, que relativamente aos familiares é substituído por um «cartão de residência», em conformidade com o disposto no artigo 17.º do mesmo diploma.

Importa, contudo, ter presente que a posse destes títulos, por força do disposto no artigo 21.º do mesmo diploma, «não é, em caso algum, uma condição prévia para o exercício de um direito ou o cumprimento de uma formalidade administrativa, podendo a qualidade de beneficiário dos direitos de residente ao abrigo do regime comunitário ser atestada por qualquer outro meio de prova».


2 – O Decreto-Lei n.º 244/98, de 8 de Agosto, no seu artigo 2.º, considera estrangeiro «todo aquele que não prove a nacionalidade portuguesa» e no seu artigo 3.º considera residente o «estrangeiro habilitado com título válido de autorização de residência em Portugal».

Por força do disposto no artigo 9.º deste diploma, a «entrada em território português e a saída devem efectuar-se pelos postos de fronteira qualificados para o efeito e durante as horas do respectivo funcionamento, sem prejuízo do disposto na Convenção de Aplicação sobre a livre circulação de pessoas». Por Convenção de Aplicação deve entender-se, nos termos do artigo 4.º daquele Decreto-Lei, a «Convenção de Aplicação do Acordo de Schengen de 14 de Junho de 1985».

Os estrangeiros que entrem em território nacional «por uma fronteira não sujeita a controlo, vindos de outro Estado membro, são obrigados a declarar esse facto no prazo de três dias úteis a contar da data da entrada», nos termos do artigo 26.º, n.º 1, daquele diploma.

Para entrarem em território nacional os estrangeiros devem ser portadores de um «documento de viagem válido reconhecido» que pode ser substituído pelos títulos discriminados no n.º 3 do artigo 12.º do referido Decreto-Lei, e de um visto «válido e adequado à finalidade da deslocação», obrigação esta que pode ser dispensada, nos casos previsto no n.º 3 do artigo 13.º do mesmo diploma.

Os vistos emitidos no estrangeiro, obedecem a várias categorias em função dos fins subjacentes à intenção de entrada em território nacional, discriminadas nos artigos 27.º e seguintes.

Nos postos de fronteira podem também ser emitidas algumas categorias de vistos, conforme decorre dos artigos 47.º e seguintes.

Assim, o «visto de residência», referido no artigo 34.º, conforme resulta do n.º 1 deste artigo, destina-se a «permitir a entrada em território português ao seu titular a fim de solicitar autorização de residência», enquanto, nos termos do artigo 36.º daquele diploma, o «visto de trabalho» se destina a «permitir ao seu titular a entrada em território português a fim de exercer temporariamente uma actividade profissional».

Com interesse no âmbito do presente pedido de consulta podem ainda referir-se o «visto de estudo», o «visto de curta duração» e o «visto de estada temporária», a que se referem, respectivamente, os artigos 35.º, 33.º e 38.º

Os vistos legitimam a presença em território nacional durante um determinado período de tempo, variável em função da categoria respectiva.

Assim, o visto de curta duração, nos termos do n.º 2 do artigo 33.º, «pode ser concedido com um prazo de validade de um ano e para uma ou mais entradas, não podendo a duração de uma estada ininterrupta ou a duração total das estadas sucessivas exceder três meses por semestre a contar da data da primeira passagem de uma fronteira externa».

O visto de residência «é válido para duas entradas em território nacional e habilita o seus titular a nele permanecer seis meses», nos termos do n.º 2 do artigo 34.º.

Por sua vez, o visto de trabalho é válido para múltiplas entradas em território nacional e «pode ser concedido para a permanência até um ano», nos termos do n.º 6 do artigo 36.º e o visto de estadia temporária, por força do n.º 3 do artigo 38.º pode ser concedido para uma permanência até um ano.

A autorização de residência é materializada num título «título de residência», que substitui o bilhete de identidade, nos termos do artigo 90.º e pode ser temporária, quando «válida por dois anos a partir da data da emissão do título», ou permanente, e depende do preenchimento dos requisitos estabelecidos no artigo 81.º, que prevê:

«Artigo 81.º
Concessão
Para a concessão da autorização de residência deve o requerente satisfazer os seguintes requisitos:
a) Posse de visto de residência válido;
b) Inexistência de qualquer facto que, se fosse conhecido pelas autoridades competentes, teria obstado à concessão do visto;
c) Presença em território português.»

A titularidade de visto de residência é dispensada para a obtenção da autorização de residência nas circunstâncias referidas no artigo 87.º

As condições subjacentes à atribuição do direito de residência permanente resultam do artigo 85.º, que prevê:

«Artigo 85.º
Concessão da autorização de residência permanente
1 - Podem beneficiar de uma autorização de residência permanente os estrangeiros que, cumulativamente:
a) Residam legalmente em território português há pelo menos cinco ou oito anos, conforme se trate, respectivamente, de cidadãos de países de língua oficial portuguesa ou de outros países;
b) Durante os últimos cinco ou oito anos de residência em território português, conforme os casos, não tenham sido condenados, por sentença transitada em julgado, em pena ou penas que, isolada ou cumulativamente, ultrapassem 1 ano de prisão.
2 - O período de residência anterior à entrada em vigor do presente diploma conta para efeitos do disposto no número anterior.»

Nos termos do artigo 95.º daquele diploma, os «residentes devem comunicar ao Serviço de Estrangeiros e Fronteiras, no prazo de 60 dias contados da data em que ocorra, a alteração do seu estado civil ou do domicílio».

Da autorização de residência estão dispensados, nos termos do artigo 96.º, os «agentes diplomáticos e consulares acreditados em Portugal» e o «pessoal administrativo e doméstico ou equiparado que venha prestar serviço nas missões diplomáticas e postos consulares».

IV


1 - Os postos consulares são serviços de natureza administrativa de um Estado instalados noutro, através dos quais são realizadas tarefas que «no essencial visam a protecção dos interesses do Estado que envia e dos seus nacionais»([16]).

Nascidas de convenções bilaterais entre os Estados interessados, as relações consulares dispõem hoje de um quadro jurídico internacional que tem os seus instrumentos fundamentais na Convenção sobre Relações Consulares, adoptada em Viena em 24 de Abril de 1963([17])([18]).

Embora tenha sido aprovada em 1967 e se tenha assumido como um instrumento de aprofundamento das relações consulares e da cooperação entre os membros do Conselho da Europa, não entrou ainda em vigor a Convenção Europeia Sobre Funções Consulares, aberta à assinatura em Paris, em 11 de Dezembro de 1967([19])([20]).

Apesar da existência de instrumentos de natureza internacional que enquadram as relações consulares, o seu estabelecimento, tal como o das relações diplomáticas, está sujeito à regra do consentimento mútuo entre os Estados intervenientes, nos termos do artigo 2.º, n.º 1, da Convenção de Viena.

Tal como observou o Tribunal Internacional de Justiça, «o desenvolvimento sem entraves das relações consulares, igualmente tecidas entre os povos desde os tempos antigos, não é menos importante que o das relações diplomáticas no direito internacional contemporâneo, já que favorece o desenvolvimento de relações amigáveis entre as nações e porque assegura protecção e assistência aos estrangeiros residentes no território de outros Estados»([21]).

Através dos postos consulares são, assim, prosseguidas as funções consulares que são uma das componentes das relações internacionais entre Estados, ao lado das relações diplomáticas, das quais têm, contudo, autonomia([22]).

A prática de actos de notariado e de registo civil é prevista no artigo 5.º, alínea f), da Convenção de Viena, no âmbito das funções consulares.

Refere-se naquela alínea que tais funções consistem em «Agir na qualidade de notário e conservador do registo civil e exercer funções similares, assim como certas funções de carácter administrativo, desde que não contrariem as leis e os regulamentos do Estado receptor».

A Convenção Europeia sobre Funções Consulares dedica às funções em matéria de registo civil o seu artigo 13.º, que estabelece:
«Artigo 13.º
1 - Os funcionários consulares têm direito de:
a) Lavrar ou transcrever assentos de nascimento ou de óbito ou quaisquer outros documentos relativos ao estado civil dos nacionais do Estado que envia;
b) Celebrar casamentos, desde que, pelo menos, um dos nubentes seja nacional do Estado que envia, que nenhum deles seja nacional do Estado receptor e que as leis e regulamentos do Estado receptor não obstem à celebração do casamento pelos funcionários consulares.
2 - A emissão dos documentos referidos no n.º 1, alínea a), não implica a isenção das obrigações impostas pelas leis e regulamentos do Estado receptor.»


2 – A Lei Orgânica do Ministério dos Negócios Estrangeiros, aprovada pelo Decreto-Lei n.º 204/2006, de 27 de Outubro, no seu artigo 4.º, n.º 2, enquadra os postos consulares na administração directa do Estado, como serviços periféricos, ao lado das embaixadas e das «missões e representações permanentes e missões temporárias».

No exercício da sua actividade os postos consulares, por força do disposto no artigo 14.º, n.º 2, alínea a), estão sujeitos à supervisão e orientação da Direcção-Geral dos Assuntos Consulares e das Comunidades Portuguesas.

A organização e funcionamento dos consulados é enquadrada pelo Regulamento Consular, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 381/97, de 30 de Dezembro([23]), que dedica os seus artigos 51.º a 54.º às funções na área do registo civil, do seguinte teor:

«Artigo 51.º
Órgãos especiais
Os cônsules titulares de postos de carreira e os encarregados das secções consulares são órgãos especiais de registo civil relativamente aos portugueses residentes habitualmente no estrangeiro ou que aí se encontrem acidentalmente.

Artigo 52.º
Competência
1 – No exercício das funções referidas no artigo anterior, compete aos cônsules titulares de postos de carreira, aos encarregados das secções consulares e aos cônsules-adjuntos por aqueles expressamente autorizados lavrar, nomeadamente, os seguintes actos de registo:
a) (...);
b) De casamento no estrangeiro de dois portugueses ou de português e estrangeiro;
c) (...);
d) (...).
2 – Os vice-cônsules, os chanceleres dos consulados de carreira e das secções consulares e outros funcionários especialmente designados para o efeito pelo Ministro dos Negócios Estrangeiros podem desempenhar todas as funções das entidades referidas no número anterior, excepto a celebração de casamento.
3 – (...).
4 – Os consulados de carreira e as secções consulares são igualmente competentes para receberem requerimentos e documentos para actos de registo ou para a instrução dos respectivos processos, bem como para receber declarações, incluindo as destinadas à feitura de novos registos e à requisição de certidões, desde que o declarante ou requerente tenha residência no estrangeiro.
5 - No caso previsto no número anterior, os autos de declarações, requerimentos e demais documentos devem ser enviados à conservatória competente no prazo de cinco dias.
6 - A competência atribuída aos consulados de carreira e às secções consulares não abrange a instrução e decisão do processo especial de divórcio e separação de pessoas e bens por mútuo consentimento nem a decisão dos demais processos especiais que, nos termos do Código do Registo Civil, são da exclusiva competência do conservador.

Artigo 53.º
Disposições aplicáveis
O exercício de funções consulares no âmbito do registo civil rege-se, com as necessárias adaptações, pelas disposições do Código do Registo Civil.

Artigo 54.º
Prova dos factos
As certidões do registo consular do casamento ou óbito ocorridos no estrangeiro ainda não integrado na conservatória competente podem ser aceites como sua prova.»

A real dimensão destas competências só se alcança na articulação destas normas com as disposições do Código do Registo Civil relativas à prática dos actos sujeitos a este registo, que são directamente aplicáveis no âmbito da função consular, por força do disposto no artigo 53.º do Regulamento acima referido.

Na abordagem destes dispositivos deverá igualmente ter-se presente que, por força do n.º 2 do artigo 1.º da Convenção de Viena, existem duas categorias de funcionários consulares: os funcionários consulares de carreira e os funcionários consulares honorários.

Os primeiros «pertencem ao serviço regular do Estado que envia», são funcionários desse Estado e seus nacionais, enquanto os segundos são, por norma, cidadãos do Estado onde o posto consular está instalado, podem desempenhar e normalmente desempenham outras actividades, não beneficiando, contudo, das imunidades próprias dos funcionários de carreira.

Em coerência com as disposições de natureza orgânica e funcional dos consulados, o Código do Registo Civil, no seu artigo 9.º, n.º 1, alínea a), veio considerar os «agentes diplomáticos e consulares portugueses no estrangeiro» como «órgãos especiais» do registo civil, referindo que os mesmos podem desempenhar «a título excepcional» funções de registo civil e impondo no n.º 2 deste mesmo artigo, a sujeição dos actos de registo levados a cabo por estes órgãos «na parte aplicável», aos preceitos daquele código.

Por força do disposto no artigo 35.º, n.º 2, alínea a), do Regulamento Consular, os cônsules honorários não tem competência para a prática de actos de registo civil e de notariado.

Contudo, o Decreto-Lei n.º 75/98, de 27 de Março, no n.º 2 do seu artigo 1.º, veio permitir que o Ministro dos Negócios Estrangeiros, «a título excepcional e em casos devidamente fundamentados», autorizasse os «cônsules honorários» a exercer «as competências próprias dos vice-cônsules dos consulados de carreira» relativamente a «Actos de registo civil e de notariado».

Esta autorização, nos termos do n.º 3 daquele artigo 1.º, seria conferida por portaria que enumeraria os actos que poderiam ser praticados a coberto da mesma([24]).



V


1 - Conforme referia FERRER CORREIA, «todos os dias se constituem ou desenvolvem no território de cada Estado relações privadas que não se apresentam como expressão pura e simples da vida jurídica local, mas que, já pela nacionalidade ou domicílio dos sujeitos, já em razão do lugar onde foram estabelecidas, ou onde devem ser executadas as respectivas obrigações, (...), se definem antes como fenómenos do comércio jurídico internacional»([25]).

A intenção manifestada por estrangeiros no sentido de celebrarem casamento em Portugal, quer ambos os nubentes sejam estrangeiros, quer qualquer um deles tenha nacionalidade portuguesa, faz apelo a «pontos de contacto» com outras ordens jurídicas, que exigem a intervenção de uma normatividade autónoma – o direito dos conflitos - no sentido de encontrar a disciplina aplicável à situação em concreto.

Os diversos sistemas jurídicos orientaram-se, no que se refere ao direito de conflitos na área matrimonial, de acordo com dois grandes critérios: os aspectos substanciais do casamento, nomeadamente a capacidade para casar e a declaração de vontade, são enquadrados pela lei nacional dos nubentes; no que se refere à forma do casamento, tem-se imposto o princípio de que o local da celebração do casamento, é o elemento relevante para a determinação da lei aplicável.

São estes princípios que inspiram os artigos 49.º e 50.º do Código Civil.

Refere-se no primeiro daqueles artigos que «a capacidade para contrair casamento ou celebrar a convenção antenupcial é regulada, em relação a cada nubente, pela respectiva lei pessoal, à qual compete ainda definir o regime da falta e dos vícios da vontade dos contraentes».

A «capacidade» para contrair casamento prevista neste artigo 49.º, atento o disposto no artigo 1600.º do mesmo código, como ensinava FERRER CORREIA, deve ser entendida como a «ausência de qualquer dos impedimentos matrimoniais previstos na lei»([26]).

Por sua vez o artigo 50.º prevê que «a forma do casamento é regulada pela lei do Estado em que o acto é celebrado, salvo o disposto no artigo seguinte».

Na síntese de BAPTISTA MACHADO, «é, portanto, pela lei pessoal de cada nubente que se apreciará, desde logo, quais as características que deve revestir o consentimento, (...). A mesma lei determina ainda a habilitas ad nupciae, ou seja, toda a matéria de impedimentos matrimoniais»([27]).

De acordo com o mesmo autor, «em matéria de forma do casamento, regem os artigos 50.º e 51.º. O primeiro dos referidos artigos estabelece a regra lex loci regit actum»([28]).

Deste modo, o casamento celebrado em Portugal, perante as autoridades portuguesas, terá, por força do disposto naquele artigo 50.º do Código Civil, que respeitar a forma prescrita na lei portuguesa. Trata-se de uma disposição de carácter imperativo([29]).

O artigo 51.º do Código Civil, comporta, contudo, excepções ao princípio consagrado no artigo 50.º em matéria de forma do casamento, permitindo a celebração em Portugal, perante os agentes consulares respectivos, de casamentos de estrangeiros, de acordo com a lei pessoal de um deles, e a celebração no estrangeiro de casamento de cidadãos portugueses, entre si ou com estrangeiro, de acordo com a lei portuguesa.

Determina, com efeito, o n.º 1 daquele artigo 51.º do Código Civil, que «o casamento de dois estrangeiros em Portugal pode ser celebrado segundo a forma prescrita na lei nacional de qualquer dos contraentes, perante os respectivos agentes diplomáticos ou consulares, desde que igual competência seja reconhecida por essa lei aos agentes diplomáticos e consulares portugueses».

Por sua vez, o n.º 2 deste artigo prevê que «o casamento no estrangeiro de dois portugueses ou de português e estrangeiro pode ser celebrado perante o agente diplomático ou consular do Estado português ou perante os ministros do culto católico; em qualquer caso, o casamento deve ser precedido de processo de publicações, organizado pela entidade competente (...)».

As normas dos n.ºs 1 e 2 do artigo 51.º do Código Civil mostram-se em sintonia com o artigo 13.º da Convenção Europeia sobre Funções Consulares acima referida, nomeadamente a sua alínea b), da qual decorre serem os funcionários consulares competentes para «Celebrar casamentos, desde que, pelo menos, um dos nubentes seja nacional do Estado que envia, que nenhum deles seja nacional do Estado receptor e que as leis e regulamentos do Estado receptor não obstem à celebração do casamento pelos funcionários consulares».


2 – Por força do disposto no artigo 1615.º do Código Civil, o casamento, pode ser celebrado pela forma fixada «neste código e nas leis do registo civil» - o casamento civil -, ou pela forma religiosa, nos termos de «legislação especial»([30]).

Contudo, a celebração, quer do casamento civil quer do casamento religioso, nos termos do disposto no artigo 1610.º daquele código e do 151.º do Código do Registo Civil, é precedida de um procedimento específico, denominado processo preliminar de publicações, que visa essencialmente indagar da existência de impedimentos à celebração do projectado casamento([31]).

O processo preliminar de publicações, para além das normas dos artigos 1610.º a 1614.º do Código Civil, é disciplinado pelos artigos 134.º a 148.º do Código do Registo Civil.

O artigo 134.º daquele código prevê:

«Artigo 134.º
(Competência para a organização)
A organização do processo preliminar de publicações para casamento compete à conservatória do registo civil da área em que um dos nubentes tenha domicílio ou residência estabelecida durante, pelos menos, ou últimos 30 dias anteriores à data da declaração ou da apresentação do requerimento a que se referem os artigos seguintes.»

A lei civil não nos dá uma noção de residência devendo entender-se que a mesma constitui «o local onde a pessoa tem a sua existência organizada e que como tal, lhe serve de base de vida»([32]).

No conceito de residência importa ainda autonomizar a residência habitual da residência ocasional. Por residência habitual deve entender-se o local onde a «pessoa normalmente vive e tem o seu centro de vida»([33]). Se a pessoa viver temporariamente ou acidentalmente noutro local, que não o da sua residência habitual, aí terá a sua residência ocasional.

A residência habitual surge, assim, como o local onde uma pessoa vive com estabilidade e onde tem organizada a sua vida, não podendo confundir-se com a residência permanente.

Por força do disposto no artigo 82.º do Código Civil, «a pessoa tem domicílio no lugar da sua residência habitual», pelo que a noção de domicílio tem sob o ponto de vista jurídico uma dimensão diversa do conceito corrente de domicílio que o identifica com a morada, ou seja o local onde a pessoa tem a sua habitação([34]).

O referido artigo 134.º do Código do Registo Civil define como conservatória competente para a organização do processo preliminar aquela em que um dos nubentes tenha domicílio, ou em que tenha residência estabelecida pelo menos nos últimos 30 dias, anteriores ao início do processo.

Deste modo, os nubentes não podem escolher livremente a conservatória a que se dirigem para dar início ao seu processo de casamento, exigindo-se um vínculo com uma determinada conservatória - o que deriva do facto de um dos nubentes ter domicílio na sua área de jurisdição, ou ter ali residência, pelo menos durante os 30 dias que antecedem o início do processo.

O domicílio ou a mera residência dos nubentes é o espaço onde os mesmos são conhecidos e onde mais facilmente podem encontrar-se pessoas que tenham conhecimento da existência de impedimentos à celebração do casamento, fazendo por isso sentido a divulgação da intenção dos nubentes nessa área.

Acresce que o legislador não pode abstrair da importância da dimensão social do casamento pelas consequências de natureza jurídica que do mesmo resultam.

Não admira, por isso, que o artigo 136.º do Código do Registo Civil exija, no âmbito da declaração para casamento a prestar pelos nubentes, que seja indicada a «residência habitual» dos mesmos – alínea a) do n.º 2, «as residências dos nubentes nos últimos doze meses, se tiverem sido diversas das que tinham no momento da declaração» – alínea f) do mesmo n.º 2, e, por força da alínea j), «a declaração expressa de um dos nubentes de que tem domicílio ou residência estabelecida, nos termos do artigo 134.º», ou seja residência diversa da habitual, estabelecida pelo menos nos referidos últimos 30 dias que antecedem a apresentação da declaração.

As diversas residências relevam no âmbito do processo para o efeito da afixação de editais através dos quais se divulga a intenção dos nubentes de celebrarem casamento, afixação esta prevista no artigo 140.º do mesmo código, que prevê:

«Artigo 140.º
Afixação de editais
1 - À pretensão dos nubentes é dada publicidade por meio de edital, no qual são convidadas as pessoas que conheçam impedimentos à celebração do casamento a virem declará-los na conservatória.
2 – O edital, escrito em impresso de modelo aprovado, é afixado à porta da conservatória, por forma bem visível, durante oito dias consecutivos.
3 - Se algum dos nubentes residir, ou tiver residido nos últimos 12 meses, fora da área da conservatória organizadora do processo, o conservador remete cópia do edital à conservatória dessa residência, para aí ser afixada nas condições do número anterior, salvo se o nubente for estrangeiro.
4 - A cópia do edital, quando tenha de ser afixada no estrangeiro, é remetida ao competente agente diplomático ou consular português.
5 – (...).»

Por força do disposto neste artigo, os editais são afixados na conservatória que organiza o processo, na conservatória em que algum dos nubentes resida, ou tenha residido nos últimos doze meses, salvo se o nubente em causa for estrangeiro. Contudo, se sendo português tiver residido nesse período de tempo no estrangeiro, o edital é remetido para afixação ao «agente diplomático ou consular português» competente na área onde essa residência tiver ocorrido, nos termos do n.º 4 deste artigo.

A afixação de editais pode ser substituída, nos termos do artigo 141.º do Código do Registo Civil, pela inquirição de testemunhas, sobre a existência de impedimentos à celebração do casamento.

Refere-se, naquele artigo 141.º:
«Artigo 141.º
Substituição da afixação do edital no local da residência
1 - Se algum dos nubentes residir, ou houver residido durante os últimos 12 meses, fora da área da conservatória organizadora do processo, o conservador, quando tal lhe seja requerido e sejam alegados motivos justificativos, em substituição da afixação do edital no local dessa residência pode ouvir, em auto de inquirição, duas testemunhas idóneas acerca da identidade e capacidade desse nubente para contrair casamento.
2 – (...).»

No artigo 143.º daquele código é atribuída ao conservador do registo civil um conjunto vasto de poderes através dos quais aquele poderá averiguar da capacidade matrimonial dos nubentes e dos demais elementos relevantes para o processo, nos seguintes termos:
«Artigo 143.º
Diligências a efectuar pelo conservador
1 - Sem prejuízo do disposto nos artigos anteriores, compete ao conservador verificar a identidade e capacidade matrimonial dos nubentes, podendo colher informações junto de autoridades, exigir prova testemunhal e documental complementar e convocar os nubentes ou os seus representantes legais, quando se mostre necessário.
2 – (...).
3 – (...).»

A natureza de ordem pública dos interesses subjacentes à celebração do casamento, de que decorrem as exigências relativas à capacidade matrimonial, impõe ao conservador uma intervenção activa no sentido da indagação daquela capacidade, indagação que pode levar a cabo através das diligências previstas no n.º 1 daquele artigo.


3 – A fixação da conservatória competente para a organização do processo preliminar de publicações, em função da residência de pelo menos um dos nubentes no período que antecede o início do processo tendente à celebração do casamento, é um velho princípio do registo civil português, encontrando-se eco do mesmo nos vários Códigos do Registo Civil.

Assim, o Código de 1978([35]), previa no seu artigo 164.º que «A organização do processo preliminar de publicações para casamento compete à conservatória do registo civil da área em que qualquer dos nubentes tiver domicílio ou residência estabelecida por meio de habitação contínua, durante, pelo menos, os últimos 30 dias anteriores à data da declaração ou da apresentação do requerimento».

O Código de 1967([36]) tratava desta matéria no seu artigo 166.º que tinha a mesma redacção daquele artigo 164.º do Código de 1978, o que igualmente sucedia com o Código de 1958([37]), que dedicava a essa matéria o seu artigo 148.º.

À redacção destes artigos não era alheio o teor do artigo 265.º do Código de 1932([38]) que estabelecia que «o processo de casamento será organizado na repartição em cuja área qualquer dos nubentes tiver o seu domicílio ou a sua residência, estabelecida por meio de habitação contínua durante 30 dias, pelo menos, anteriormente à publicação dos éditos».

O relevo da verdade sobre a residência no processo de casamento sempre foi objecto de preocupação específica por parte do legislador que estabelecia uma disposição própria para as situações em que surgissem dúvidas sobre a residência dos nubentes.

Assim, logo o Código de 1932 previa no § único do seu artigo 278.º, que «no caso de o funcionário do registo civil ter dúvidas sobre a residência dos nubentes no País durante os últimos doze meses, poderá exigir prova da sua residência».

O Código de 1958 consagrava idêntico princípio no n.º 3 do artigo seu 156.º, disposição que se manteve no n.º 5 do artigo 173.º do Código de 1967 e que se mostrava também consagrada no n.º 5 do artigo 171.º do Código de 1978, que previa que «sempre que tenha alguma dúvida sobre a residência dos nubentes no País durante os últimos doze meses, o funcionário do registo civil pode exigir a prova dessa residência, por meio de atestado passado pelo entidade administrativa competente do local onde os interessados afirmem ter residido durante aquele período».


4 – O Código do Registo Civil dedica a sua «Subsecção VII», da «Secção III», que tem por título «casamento», ao «casamento de portugueses no estrangeiro e de estrangeiros em Portugal» que inclui os artigos 161.º a 166.º daquele código.

No artigo 161.º reafirmam-se princípios emergentes do Código Civil, já acima ponderados, referindo-se que «o casamento contraído no estrangeiro entre dois portugueses ou entre português e estrangeiro pode ser celebrado perante os ministros do culto católico, ou pela forma estabelecida no presente Código, perante os agentes diplomáticos ou consulares portugueses ou ainda pela forma prevista na lei do lugar da celebração».

À luz do disposto neste artigo, os portugueses no estrangeiro podem celebrar casamento, de acordo com a lei do local da celebração, de acordo com a lei nacional portuguesa, perante os agentes diplomáticos ou consulares portugueses, ou pela forma canónica, situação em que o casamento é reconhecido em Portugal como casamento católico, mesmo que a lei local não conheça essa forma de casamento.

O casamento de português no estrangeiro, quando celebrado de acordo com a lei portuguesa, é precedido de processo preliminar de publicações, nos termos do artigo 162.º do Código do Registo Civil, sendo competente para a organização deste processo, conforme os casos, a representação consular portuguesa, no caso de o nubente residir no estrangeiro, ou a conservatória portuguesa, no caso da residência em Portugal.

Os postos consulares são, assim, competentes para organizar os processos preliminares de publicações dos portugueses residentes na sua circunscrição, no caso de os mesmos pretenderem casar nesses postos, no caso de o pretenderem fazer sob a forma canónica no país da residência – artigo 152.º do Código do Registo Civil, ou no caso de pretenderem vir casar a Portugal.

Do mesmo modo, no artigo 164.º reafirma-se que «o casamento de português com estrangeiro celebrado em Portugal só pode efectuar-se pelas formas e nos termos previstos neste Código» e no artigo 165.º retomam-se princípios consagrados no Código Civil referindo que «o casamento de estrangeiros em Portugal pode ser celebrado segundo a forma e nos termos previstos na lei nacional de algum dos nubentes, perante os respectivos agentes diplomáticos ou consulares, desde que igual competência seja reconhecida pela mesma lei aos agentes diplomáticos e consulares portugueses».


5 – Tal como referimos, a capacidade matrimonial é aferida pela lei pessoal dos nubentes, nos termos do artigo 49.º do Código Civil. Em coerência com este princípio, o artigo 166.º do Código do Registo Civil impõe aos estrangeiros que pretendam casar-se em Portugal, de acordo com a lei portuguesa, a demonstração da sua capacidade matrimonial.

Refere, com efeito, aquele artigo 166.º:

«Artigo 166.º
Certificado exigido ao estrangeiro que
pretenda casar em Portugal
1 - O estrangeiro que pretenda celebrar casamento em Portugal, por qualquer das formas previstas neste Código, deve instruir o processo de publicações com o certificado, passado há menos de seis meses, se outro não for o prazo de validade fixado pela entidade competente do país de que é nacional, destinado a provar que, de harmonia com a sua lei pessoal, nenhum impedimento obsta à celebração do casamento.
2 - Quando ao nubente, por não haver representação diplomática ou consular do país da sua nacionalidade, ou por outro motivo de força maior, não seja possível apresentar o certificado, pode a falta do documento ser suprida pela verificação da sua capacidade matrimonial feita através de processo organizado na conservatória competente para o processo de casamento.»

O processo previsto no n.º 2 deste artigo 166.º segue os termos dos artigos 261.º a 265.º do Código do Registo Civil.

A demonstração da capacidade matrimonial é feita de acordo com a lei nacional dos nubentes e pelas autoridades nacionais respectivas.

Em coerência com o mesmo princípio, nos termos do artigo 163.º daquele código, o português que pretenda casar no estrangeiro, perante as autoridades locais, pode requerer a «verificação da sua capacidade matrimonial e a passagem do respectivo certificado», documento este que demonstrará o preenchimento do aludido pressuposto da celebração do matrimónio.

A certificação da capacidade matrimonial para efeitos de celebração de casamento no estrangeiro é objecto da Convenção Relativa à Emissão de um Certificado de Capacidade Matrimonial, concluída em Munique, em 5 de Outubro de 1980, e que foi aprovada para aceitação pelo Estado Português pelo Decreto do Governo n.º 40/84, de 24 de Julho([39]).

VI


1 - Estamos agora em condições de responder às questões formuladas pela entidade consulente, à luz do ordenamento jurídico em vigor.

Os estrangeiros que pretendam casar em Portugal perante as autoridades portuguesas, só o poderão fazer desde que pelo menos um dos nubentes tenha residência em Portugal durante os trinta dias que antecedem a apresentação da declaração de intenção de celebrar casamento.

Trata-se de uma exigência decorrente do artigo 134.º do Código do Registo Civil, norma que define a conservatória competente para a organização do processo preliminar de publicações em função da residência de um dos nubentes naquele período de tempo, e que tem como fundamento a relação da residência com a possibilidade de conhecimento de impedimentos à celebração de casamento e com a intenção de divulgação pública da celebração do mesmo.

Aquela exigência decorre directamente da lei sendo indiferente a nacionalidade dos nubentes, impondo-se igualmente aos estrangeiros, e vale quer o casamento assuma a forma civil, quer a forma religiosa.

A capacidade matrimonial dos nubentes é demonstrada nos termos do artigo 166.º do Código do Registo Civil, pelo certificado respectivo, ou através do procedimento previsto no n.º 2 daquele artigo.

Tal como acima se referiu, a exigência de um período de residência mínimo na área de uma conservatória para definir a competência da mesma para a realização do casamento, decorre da natureza e função do processo preliminar de publicações, do relevo que a publicidade tem no reconhecimento do casamento e da necessidade da divulgação da intenção de celebração do casamento por parte dos nubentes.

Não podem, assim, as conservatórias de registo civil deixar de indagar a relação dos nubentes com a residência invocada, dada a natureza de ordem pública dos interesses em causa, o que podem fazer ao abrigo do disposto no artigo 143.º do mencionado código.


2 – Os postos consulares portugueses não têm competência para organizar processos preliminares de casamento relativamente a estrangeiros residentes na sua circunscrição e que pretendam vir celebrar casamento a Portugal.

Pela própria natureza, os postos consulares destinam-se a acautelar os interesses de Portugal e dos portugueses residentes no estrangeiro, não tendo, por norma, qualquer capacidade de intervenção relativamente aos estrangeiros nacionais do país onde o consulado se encontra instalado.

Importa, contudo, que se estabeleçam algumas precisões, uma vez que a posição acima avançada tem como pressuposto que se trata de casamento a celebrar entre estrangeiros.

Se o projectado casamento envolver um cidadão português residente na circunscrição consular em causa, nomeadamente por se tratar do casamento de um cidadão português com um estrangeiro, eventualmente nacional desse país, esse casamento pode ser celebrado em Portugal, de acordo com a lei portuguesa, e por força da relação de um dos nubentes com o consulado em causa, essa relação arrastará a competência do consulado para a organização do mencionado processo.

No que se refere à demonstração da capacidade matrimonial do nubente estrangeiro ela é feita, nos termos acima referidos, ou seja pela forma prevista no artigo 166.º do Código do Registo Civil, de acordo com a sua lei nacional.

Acresce que a esse consulado estaria vedada a celebração do casamento de um cidadão português com um cidadão nacional do país onde se encontra instalado, por força dos princípios e das normas de natureza convencional acima referidas.




VII


Face ao exposto, formulam-se as seguintes conclusões:


1.ª – O artigo 134.º do Código do Registo Civil estabelece um período de residência mínimo de 30 dias, de um dos nubentes pelo menos, na área de uma conservatória do registo civil, para atribuir a essa conservatória a competência para a organização do processo preliminar de publicações;

2.ª – Essa exigência decorre dos interesses de ordem pública que estão subjacentes à forma do casamento, nomeadamente a sua publicidade, e não é alterada pela nacionalidade dos nubentes ou pela residência habitual dos mesmos no estrangeiro.

3.ª – Os postos consulares portugueses são incompetentes para a organização do processo preliminar de publicações relativamente a dois nubentes estrangeiros, residentes no estrangeiro, que pretendam vir a celebrar casamento em Portugal, de acordo com a lei portuguesa.







[1] Ofício n.º 0000032/07-GSECP, Proc. (15), de 2007-01-05, do Gabinete do Secretário de Estado das Comunidades Portuguesas.
[2] Constituição da República Portuguesa Anotada, 4.ª Edição, Volume I, 2007, Coimbra Editora, p. 357.
[3] MARIO TORRES, “O Estatuto Constitucional dos Estrangeiros”, Scientia Ivridica, Tomo L, n.º 290 – Maio/Agosto de 2001, p. 23.
[4] Obra cit., pp. 22 e 23.
[5] Lições de Direito Internacional Privado, 1973, Coimbra, p. 94.
[6] Obra citada, p. 22.
[7] No mesmo sentido, podem ver-se as opiniões de CASTRO MENDES, Teoria Geral do Direito Civil, Volume I, AAFDL, 1978, p. 121 e CARVALHO FERNANDES, Teoria Geral do Direito Civil, Vol. I, Lex, 1995, p. 204.
[8] Manual de Direito Constitucional, Tomo III, 5.ª Edição, Coimbra Editora, 2004, p. 152.
[9] Obra cit., p. 155.
[10] J.J. GOMES CANOTILHO e VITAL MOREIRA, Obra cit., p. 358.
[11] J.J. GOMES CANOTILHO e VITAL MOREIRA, Obra cit., p. 358
[12] Sobre casamento em instituições consulares, cfr. SALOMÉ ADROCHER BIOSCA, Forma del Matrimónio y Derecho Internacional Privado, Bosch Casa Editorial, Barcelona, 1993, 115 e ss.
[13] Este Conselho tem-se debruçado várias vezes sobre a situação jurídica dos estrangeiros em Portugal, conforme se pode ver nos pareceres n.ºs 6/94, de 10 de Novembro de 1994, inédito, e 100/02, de 6 de Novembro de 2003, inédito igualmente.
[14] J.J. GOMES CANOTILHO e VITAL MOREIRA, Obra cit., p. 352.
[15] Que foi regulamentado pelo Decreto Regulamentar n.º 6/2004, de 26 de Abril, na sequência das alterações decorrentes do Decreto-Lei n.º 34/2003.
[16] A da COSTA LOBO, “Cônsul”, Polis, Verbo, 1983 - 1987.
[17] Aprovada para adesão pelo Decreto-Lei n.º 183/72, de 30 de Maio, que foi objecto das rectificações publicadas no Diário da República, I Série, de 11 de Julho de 1972, e 29 de Dezembro de 1975.
[18] Por aviso publicado no Diário da República, 1.ª Série, de 7 de Outubro de 1972, foi divulgado o depósito dos instrumentos de adesão de Portugal a esta convenção.
[19] Aprovada para ratificação pelo Decreto do Governo n.º 60/84, de 3 de Outubro, incluindo os respectivos Anexos I e II, bem como o Protocolo Relativo à Protecção de Refugiados e o Protocolo sobre Funções Consulares em Matéria de Aeronáutica Civil.
[20] Por aviso publicado no Diário da República, I Série, de 11 de Maio de 1985, foi tornado público que Portugal depositou em 11 de Janeiro de 1985 o instrumento de ratificação desta convenção
[21] Ordenação de 15 de Dezembro de 1979, Personnel diplomatique et consulaire dês États Unis à Téhéran, Rec. 1979, p. 19-20, citado por NGUYEN QUOC DING E OUTROS, Direito Internacional Público, Fundação Calouste Gulbenkian, 2.ª Edição, 2003, p. 772.
[22] Sobre a relação entre «relações diplomáticas» e «relações consulares», cfr. JEAN SALMON, Manuel de Droit Diplomatique, Bruylant, Bruxelles, 1994, pp. 515 e ss.
[23] Alterado pela Lei n.º 22/98, de 12 de Maio, e pelo Decreto-Lei n.º 162/2006, de 8 de Agosto.
[24] Em execução desta previsão foi publicada, entre outras, a Portaria n.º 350/98, de 22 de Junho.
[25] Lições de Direito Internacional Privado, Universidade de Coimbra, 1973, p. 5.
[26] Temas de Direito Comercial, Arbitragem Comercial Internacional, Reconhecimento de Sentenças Estrangeiras, Conflitos de Leis, Almedina, Coimbra, 1989, p. 347
[27] Lições de Direito Internacional Privado, Atlântida Editora, Coimbra 1974, p. 393.
[28] Obra cit., p. 395.
[29] FERRER CORREIA, Temas, p. 340.
[30] A Lei n.º 16/2001, de 22 de Junho – Lei da Liberdade Religiosa – veio no seu artigo 19.º reconhecer efeitos civis «aos casamentos celebrados por forma religiosa perante o ministro do culto de um igreja ou comunidade religiosa radicada no País», estabelecendo os pressupostos desse reconhecimento, na linha da solução vigente para o casamento católico.
[31] Sobre o processo preliminar de publicações, cfr. PEREIRA COELHO e GUILHERME de OLIVEIRA, Curso de Direito de Família, Volume I, 3.ª Edição, 2003, Coimbra Editora, pp. 321 e ss.
[32] CARVALHO FERNANDES, Teoria Geral do Direito Civil, Vol. I, 2.ª Edição, Lex, Lisboa, 1985, p. 316.
[33] CARVALHO FERNANDES, Obra cit., p. 316.
[34] CARVALHO FERNANDES, Obra cit., p. 316.
[35] Aprovado pelo Decreto-Lei n.º 51/78, de 30 de Março.
[36] Aprovado pelo Decreto-Lei n.º 47 678, de 5 de Maio de 1967.
[37] Aprovado pelo Decreto-Lei n.º 41 967, de 22 de Novembro de 1958.
[38] Aprovado pelo Decreto n.º 22:018, de 22 de Dezembro de 1932.
[39] Por Aviso publicado no Diário da República, I Série, de 16 de Janeiro de 1985, foi tornado público o depósito do instrumento de aceitação desta convenção por parte de Portugal.