Pareceres PGR

Parecer do Conselho Consultivo da PGR
Nº Convencional: PGRP00003399
Parecer: P000052017
Nº do Documento: PPA2303201700500
Descritores: PENA DISCIPLINAR
PRESCRIÇÃO
POLÍCIA DE SEGURANÇA PÚBLICA
CASO ADMINISTRATIVO DECIDIDO
CASO JULGADO
RECURSO HIERÁRQUICO NECESSÁRIO
DEFINITIVIDADE VERTICAL
OMISSÃO DE DECISÃO
EXTEMPORANEIDADE DA DECISÃO
ATO CONFIRMATIVO
ANULAÇÃO ADMINISTRATIVA
DECISÃO DE NÃO CUMPRIMENTO DA PENA
CONVENIÊNCIA DE SERVIÇO
REVISÃO EXTRAORDINÁRIA
Texto Integral:


Senhora Ministra da Administração Interna ,
Excelência:


Dignou-se Vossa Excelência solicitar à Procuradoria-Geral da República[1] que, através deste Conselho Consultivo, sejam esclarecidas dúvidas na interpretação de algumas normas do Regulamento Disciplinar da Polícia de Segurança Pública (RDPSP) aprovado pela Lei n.º 7/90, de 20 de fevereiro[2], mais concretamente das normas respeitantes à prescrição das sanções disciplinares aplicadas a trabalhadores com funções policiais.

E, porque o sentido que vier a ser precisado é suscetível de imprimir efeito imediato em situações disciplinares individuais e concretas, Vossa Excelência houve por bem requerer que a nossa pronúncia seja prolatada com urgência, tanto quanto possível, em 30 dias.

Após distribuição do pedido, por Sua Excelência a Conselheira Procuradora-Geral da República, cumpre-nos emitir parecer, nos termos da alínea a) do artigo 37.º do Estatuto do Ministério Público[3], imprimindo à consulta a brevidade possível.


§ 1.º - Delimitação do objeto da consulta.

São enunciadas, no pedido, três questões que, parcialmente, retomam anterior consulta pedida pelo Senhor Ministro da Administração Interna do XIX Governo Constitucional, em 27 de outubro de 2014.

Com efeito, reunido na sessão de 15 de janeiro de 2015, este Conselho Consultivo aprovou o Parecer n.º 37/2014[4]. Entre outras questões atinentes a normas disciplinares da Polícia de Segurança Pública e da Guarda Nacional Republicana, no referido parecer foi apreciado o regime da prescrição de penas disciplinares no âmbito do Regulamento Disciplinar da Polícia de Segurança Pública (RDPSP) na sua articulação com os meios graciosos e contenciosos, ao dispor do arguido, para defender os seus direitos e interesses legalmente protegidos.

O Parecer n.º 37/2014, contudo, terá deixado subsistir algumas dúvidas e suscitado outras tantas, por, como expõe Vossa Excelência, prestar-se, ele próprio, a «diferentes interpretações».

Em particular, referem-se duas das conclusões, cuja conjugação «tem suscitado dúvidas quanto à correta implicação da faculdade reconhecida ao membro do Governo de poder ainda vir a decidir, após o decurso do prazo legalmente previsto, na contagem dos prazos de prescrição previstos no artigo 56.º do regulamento Disciplinar da PSP».

Trata-se das conclusões 9.ª e 16.ª cujo teor se transcreve:

«9.ª – Decorrido o respetivo prazo sem que tenha sido proferida a decisão do recurso hierárquico com a consequente consolidação do ato recorrido se não for objeto de impugnação contenciosa, pode admitir-se a prática de um ato expresso posterior, pelo seu autor ou pelo superior hierárquico deste;

(…)

16.ª – O regime da prescrição das penas disciplinares aplicadas ao abrigo do Estatuto Disciplinar da Polícia de Segurança Pública encontra-se condensado no seu artigo 56.º, contando-se os prazos da data em que a decisão punitiva se tornou irrecorrível ou da data da decisão do recurso».

Considerando a aparente antinomia de uma e outra, são especificadas as seguintes questões à consideração deste corpo consultivo:

«a) À luz do Regulamento Disciplinar da PSP, quando e em que termos prescrevem as penas disciplinares?

b) Qual a implicação da faculdade reconhecida ao membro do Governo de poder ainda vir a decidir expressamente recurso hierárquico, após o decurso do prazo legalmente previsto, na contagem dos prazos de prescrição previstos no artigo 56.º do Regulamento Disciplinar da PSP?

c) A partir de que momento é que se deve considerar que a decisão punitiva se tornou irrecorrível para efeitos do disposto no artigo 56.º do Regulamento Disciplinar da PSP, ou seja, qual o momento a partir do qual se deve contar o prazo de prescrição das penas disciplinares?»


Embora delimitadas as questões, é necessário deixar formuladas duas considerações.

A primeira, para antecipar que a doutrina expendida no Parecer n.º 37/2014, votado em 15 de janeiro de 2015, nos seus fundamentos e conclusões, servirá de referente essencial à presente incumbência, sem nada prejudicar a aclaração requerida.

Este corpo consultivo, ciente da elevada missão que é chamado a desempenhar, tudo fará com vista a contribuir para que, em definitivo, cessem as dúvidas enunciadas a respeito do entendimento deliberado e oportunamente apresentado através do referido Parecer.

A segunda consideração visa dar nota de que o quadro normativo aplicável conheceu, nestes dois anos, alterações muito significativas, as quais importam um novo, mas indispensável, exame de tais vicissitudes e do seu possível efeito na pronúncia.

Referimo-nos, em especial, à entrada em vigor do Decreto-Lei n.º 4/2015, de 7 de janeiro[5], e do Código do Procedimento Administrativo que o mesmo aprovou[6], assim como à publicação e entrada em vigor do Estatuto Profissional do Pessoal com Funções Policiais da Polícia de Segurança Pública (PSP), aprovado pelo Decreto-Lei n.º 243/2015, de 19 de outubro[7], e ainda das alterações operadas no Código do Processo nos Tribunais Administrativos, por meio do Decreto-Lei n.º 214-G/2015, de 2 de outubro[8].


§ 2.º - Da prescrição de penas disciplinares no regulamento Disciplinar da Polícia de Segurança Pública.

A prescrição é um limite ao exercício extemporâneo de um direito ou de um poder, em ordem a fazer convergir, de modo razoável, o tempo da ação e o tempo da reação adequada, o tempo da atribuição e o da retribuição, o tempo da causa e o tempo das consequências.

Em ordem, ainda, a satisfazer motivações de segurança jurídica e que, ao nível dos sujeitos, se manifestam no princípio de proteção da confiança, pacificamente reconhecido como corolário do Estado de direito, garantia primordial que a Constituição consagra no seu artigo 2.º.

Com a prescrição – por vezes, através da caducidade[9] – a lei condiciona o exercício de certos poderes e de certos direitos a um termo certo resolutivo, a ponto de considerar extintas (ou convoladas em simples obrigações naturais) as situações jurídicas correspetivas[10].

É verdade que a competência é de ordem pública e não admite renúncia nem alienação, como se determina no n.º 1 do artigo 36.º do novo Código do Procedimento Administrativo, mas a lei, com a mesma legitimidade que define e atribui a competência, pode conceder preferência à estabilidade, de modo que o exercício de certo poder ou faculdade, decorrido que seja um tempo definido como razoável, não subverta o seu fim, capaz de prejudicar o interesse público e de perturbar, com reduzido proveito, a paz social.

Por isso, decorrido um prazo de prescrição, que a lei estabeleça inequivocamente, os administrados podem opor-se aos meios de autotutela declarativa e executiva que a administração pública acione demasiado tarde. Permite-se que não cumpram nem se sujeitem a atos que, se tivessem sido praticados tempestivamente, os obrigariam.

O Regulamento de Disciplina da Polícia de Segurança Pública (RDPSP) contém normas relativas à prescrição das penas disciplinares (artigo 56.º) como também à denominada prescrição do procedimento disciplinar (artigo 55.º).

Começamos por transcrever estas últimas:
«Artigo 55.º
( Prescrição do procedimento disciplinar)

1 – O direito de instaurar procedimento disciplinar prescreve passados três anos sobre a data em que a infração tiver sido cometida.

2 – Excetuam-se as infrações disciplinares que constituam ilícito penal, as quais só prescrevem, nos termos e prazos estabelecidos na lei penal, se os prazos de prescrição do procedimento criminal forem superiores a três anos.

3 – A responsabilidade prescreve também se, conhecida a falta pela entidade com competência disciplinar, não for instaurado procedimento no prazo de três meses.

4 – A prescrição considera-se interrompida pela prática de ato instrutório com incidência na marcha do processo e pela notificação da acusação ao arguido.

5 - Suspende o decurso do prazo prescricional a instauração de processo de sindicância ou de mero processo de averiguações, bem como a instauração de processo de inquérito ou disciplinar em que, embora não dirigidos contra funcionário ou agente, venham a apurar‑se infrações por que seja responsável».


E transcrevem-se, seguidamente as disposições que regulam a prescrição das penas disciplinares:
«Artigo 56.º
(Prescrição da pena)

1 - As penas disciplinares previstas no n.º 1 do citado artigo 25.º prescrevem nos prazos seguintes, contados da data em que a decisão punitiva se tornou irrecorrível:

a) Seis meses, para as penas previstas nas alíneas a) e b);

b) Dois anos, para as penas previstas nas alíneas c) a e);

c) Cinco anos, para as penas previstas nas alíneas f) e g).

2 - No caso de recurso, a prescrição da pena suspende-se até à decisão final do mesmo».


Vale a pena demarcar a esfera de aplicação das normas de ambos os artigos.

Ao passo que a prescrição das penas tem como pressuposto um ato administrativo, já praticado, de aplicação de uma pena disciplinar, mas ainda por executar (cfr. n.º 1 do artigo 56.º do RDPSP), já a prescrição do procedimento disciplinar refere-se à iniciativa de formar e formalizar uma decisão disciplinar, que pode vir a ser punitiva, ou não (cfr. artigo 55.º), pressupondo factos que indiciem a prática de uma infração disciplinar (n.º 1) e o conhecimento desses mesmos factos pelos órgãos hierarquicamente superiores e investidos em competência disciplinar (n.º 3).

A prescrição das penas – com o sentido de se extinguirem os requisitos de punibilidade – obedece a prazos diversos, de acordo com a sanção disciplinar aplicada.

Ao coordenarmos o disposto no n.º 1 do artigo 56.º do RDPSP, com o enunciado do n.º 1 do artigo 25.º, obtemos um quadro mais nítido dos prazos de prescrição das penas disciplinares. Assim, deixam de poder executar-se:

a) As penas de repreensão, ao fim de seis meses;

b) As penas de multa e de suspensão, ao fim de dois anos; e,

c) As penas expulsivas, i. e., de aposentação compulsiva e de demissão, ao fim de cinco anos.

Por seu turno, o procedimento disciplinar deixa de poder ser instaurado três anos transcorridos sobre o(s) facto(s) ilícito(s), nos termos do n.º 1 do artigo 55.º do RDPSP, a menos que:

a) O ilícito disciplinar concorra com um ilícito penal, de sorte que o prazo pode ser elevado até coincidir com prazo maior de prescrição criminal (n.º 2 do artigo 55.º do RDPSP); ou,

b) Embora não atingido o prazo comum de três anos (ou superior, na hipótese acabada de expor) a autoridade investida de competência disciplinar (por regra, o superior hierárquico) tenha tido conhecimento dos factos relevantes há mais de três meses e não tenha instaurado nenhum procedimento.

Quer isto dizer que, a partir do conhecimento do facto ilícito pela autoridade com poder disciplinar sobre o trabalhador em funções policiais da PSP, é o prazo de três meses que adquire relevância, pois o procedimento disciplinar já não pode ser instaurado, o que declina a utilidade do prazo comum de três anos.

Ao contrário do que sucede com os prazos de caducidade (cfr. 328.º do Código Civil), os prazos de prescrição conhecem vicissitudes.

Designadamente, interrompem-se e suspendem-se.

A suspensão significa apenas que a contagem do prazo não começa nem corre entre dois termos (cfr. artigos 318.º e seguintes do Código Civil).

Citando ANA FILIPA MORAIS ANTUNES[11], «[e]stão em causa situações que, não obstante a existência de uma obrigação exigível, se verificam determinadas circunstâncias que dificultam o exercício do direito pelo credor ou que justificam a sua inércia».

Maior é o alcance da interrupção, porquanto «inutiliza todo o tempo decorrido anteriormente, começando a correr novo prazo a partir do ato interruptivo (…)», como se dispõe no n.º 1 do artigo 326.º do Código Civil[12].

Viu-se que, de acordo com o disposto no n.º 4 do artigo 55.º do RDPSP, o prazo para iniciar o procedimento disciplinar é interrompido por efeito[13]:

a) De um ato instrutório com incidência na marcha do procedimento; e,

b) Da notificação da nota de culpa (acusação) ao arguido.

Saber da prescrição do exercício do poder de instaurar procedimento disciplinar – que é afinal do que se ocupam as normas do artigo 55.º – releva não só para o procedimento a iniciar, como também para, em caso de anulação do processado, sabermos se ainda é tempo de dar início a um novo procedimento disciplinar.

Por seu turno, o prazo de prescrição suspende-se por efeito de certos meios privilegiados de conhecimento que podendo, ou não, ter em vista uma determinada infração imputada ao trabalhador, venham a revelar factos que a indiciem.

Confere-se uma tal aptidão aos seguintes procedimentos:

a) De averiguações;

b) De inquérito;

c) De sindicância; ou

d) Disciplinar[14].


Pelo contrário, a prescrição das penas disciplinares não admite interrupções, mas encontra na letra da lei uma ampla causa de suspensão: a interposição de recurso e que perdura até à sua decisão, nos termos do n.º 2 do artigo 56.º:

«2 – No caso de recurso, a prescrição da pena suspende-se até à decisão final do mesmo».

Vimos já, bem assim, que a contagem do prazo de prescrição só tem início depois de o ato punitivo se tornar irrecorrível:

«1 – As penas disciplinares previstas no n.º 1 do citado artigo 25.º prescrevem nos prazos seguintes, contados da data em que a decisão punitiva se tornou irrecorrível[15]: (…)»

De resto, a pena disciplinar não pode ser executada imediatamente após a notificação do arguido.

Dispõe-se no n.º 1 do artigo 57.º do RDPSP o que vai transcrito:
«Artigo 57.º
(Cumprimento da pena)
1 – As decisões que apliquem penas disciplinares devem ser sempre notificadas pessoalmente ao funcionário ou agente punido e, não havendo recurso no prazo legal[16], serão publicadas em ordem de serviço, começando a produzir efeitos no dia imediato ao da publicação.
(…)».

A expressão «recurso», no contexto histórico do RDPSP (1990) compreende não apenas os meios graciosos de impugnação junto de outro órgão administrativo, investido de poderes de direção ou de tutela, como também o antigo recurso contencioso de anulação, instrumento comum de reintegração da legalidade e de proteção dos direitos e interesses legalmente protegidos dos administrados, através dos tribunais.

«Recurso» na tradição de continuidade entre os meios graciosos e contenciosos de impugnação porque, de algum modo, julgar a administração pública seria ainda administrar.

A reforma do contencioso administrativo, empreendida com a entrada em vigor, a 1 de janeiro de 2004, do novo Estatuto dos Tribunais Administrativos e Fiscais[17] e com a aprovação de um Código do Processo nos Tribunais Administrativos[18] fez da ação administrativa o eixo central da jurisdição administrativa, em lugar do tradicional recurso contencioso de anulação e do campo restrito que tinham as ações no direito anterior. Isto, numa progressiva aproximação ao direito processual civil e num crescente afastamento em relação ao contencioso tributário.

Como tal, dispõe-se, no artigo 191.º do Código do Processo nos Tribunais Administrativos, o seguinte:
«Artigo 191.º
(Recurso contencioso de anulação)

A partir da data da entrada em vigor deste Código, as remissões que, em lei especial, são feitas para o regime do recurso contencioso de anulação de atos administrativos consideram-se feitas para o regime da ação administrativa».

Tudo isto para dizer que, tanto a irrecorribilidade que é pressuposto para iniciar a contagem do prazo (n.º 1 do artigo 56.º do RDPSP) como a decisão final sobre recurso interposto (n.º 2 do artigo 56.º) remetem para a generalidade das garantias graciosas e contenciosas que assistem ao arguido (e, eventualmente aos órgãos administrativos inconformados com decisão que invalide ou reforme o ato punitivo): reclamar junto do autor do ato; recorrer ao superior hierárquico, se o houver[19]; interpor recurso administrativo especial[20], designadamente para o delegante, se for esse o caso; intentar ação administrativa com vista à impugnação do ato, se este já for verticalmente definitivo; e interpor recurso jurisdicional da sentença.

À primeira vista, o disposto no n.º 1 e no n.º 2 do artigo 56.º do RDPSP sugerem uma contradição.

Com efeito, se o prazo de prescrição começa a correr depois de o ato se tornar irrecorrível, melhor dizendo, inimpugnável, pode parecer incongruente suspender-se a contagem do prazo até à decisão final do recurso interposto, visto que, por definição, já estaria excluído o exercício desse direito.

Por outras palavras, a contradição estaria no seguinte: só haveria de suspender-se o prazo de prescrição se este já tivesse começado a correr; ora, se apenas começa a correr depois de o ato punitivo já não admitir impugnação, estar-se-ia a admitir a suspensão de um prazo cuja contagem se encontra por iniciar.

Em nosso entender, a distinção entre as duas normas passa por um pressuposto diferenciado que apenas implicitamente se identifica na primeira.

O prazo de prescrição da pena aplicada começaria a correr com a notificação ao arguido[21], não fora o disposto no n.º 1 do artigo 56.º e no n.º 1 do artigo 57.º do RDPSP, que relegam, respetivamente, o termo inicial do prazo de prescrição e a necessária publicação interna para o momento em que ato punitivo atinja a inimpugnabilidade: «[a] data em que a decisão punitiva se tornou irrecorrível (…)» e «não havendo recurso no prazo legal», respetivamente.

O arguido dispõe de dez dias, nos termos do n.º 1 do artigo 91.º do RDPSP, para recorrer hierarquicamente da decisão sancionatória (cfr. n.º 1 do artigo 90.º) proferida no termo do procedimento disciplinar.

Concluiu-se no Parecer n.º 37/2014 ser este recurso um recurso hierárquico necessário:

«6.ª – Não obstante a falta de menção expressa quanto à sua natureza, o recurso hierárquico previsto nas disposições legais citadas do Regulamento Disciplinar da Polícia de Segurança Pública, reveste caráter necessário».

Teremos oportunidade de confirmar[22] que o novo Código do Procedimento Administrativo não põe em causa esta conclusão. Antes pelo contrário.

A interposição do recurso hierárquico necessário suspende, de imediato, a eficácia do ato punitivo (cfr. n.º 1 do artigo 189.º do CPA).

Antes disso, pode o arguido reclamar junto do órgão que aplicou a sanção disciplinar; iniciativa que, embora não suspenda a eficácia do ato reclamado (pois a reclamação, em si, é facultativa) suspende, no entanto, a contagem do prazo para interpor o recurso hierárquico necessário (cfr. n.º 1 do artigo 190.º do CPA).

Se o arguido não recorrer hierarquicamente, o prazo de prescrição corre inexoravelmente, desde o termo final do prazo para interpor recurso hierárquico, pois o ato punitivo deixou de poder ser impugnado.

Na expressão do n.º 1 do artigo 56.º, tornou-se «irrecorrível» graciosa e contenciosamente.

Esta norma refere-se ao trabalhador a quem foi aplicada pena disciplinar e que se absteve de interpor recurso hierárquico, com a consequência de já não poder valer-se dos meios contenciosos.

E vale, bem assim, para a aplicação de pena disciplinar pelo órgão supremo da cadeia hierárquica sem ter sido intentada ação administrativa com pedido de impugnação:

- No prazo de três meses, pelo arguido, contados da data da notificação (alínea b) do n.º 1 do artigo 58.º, e n.º 2 do artigo 59.º [23] do CPTA); ou

- No prazo de um ano, pelo Ministério Público, contado da data em que o ato tiver sido praticado ou da sua publicação, quando for obrigatória (alínea a) do n.º 1 do artigo 58.º, e n.º 6 do artigo 59.º do CPTA).

Em suma, o enunciado do n.º 1 do artigo 56.º do RDPSP tem como pressuposto a inércia do arguido, a falta de reação pronta e adequada à pena disciplinar aplicada[24].

Este sentido pode não ser muito claro na letra da norma, quando observada isoladamente.

Porém, uma vez confrontada com o teor do n.º 2 do mesmo artigo 56.º do RDPSP, é inequívoco que esta última tem como pressuposto inelutável haver ou ter havido uma reação eficaz do arguido ou do Ministério Público (pelo menos, tempestivamente).

Percebe-se por que motivo o n.º 2 do artigo 56.º do RDPSP começa por enunciar, de forma incisiva, que a estatuição só é desencadeada «[n]o caso de recurso (…)»:

«2 – No caso de recurso, a prescrição da pena suspende-se até à decisão final do mesmo».

Quer isto dizer que, ao contrário do que cabe na previsão implícita do n.º 1, perante situações em que alguém com legitimidade impugna o ato – o que pressupõe, pois, que o ato não seja ainda «irrecorrível» – o prazo de prescrição começa a contar-se só com uma decisão final, da qual já não se admita mais nenhuma impugnação nem recurso.

Regressa-se, afinal, à «irrecorribilidade», mas só depois de percorrido um caminho mais ou menos longo de vias administrativas ou contenciosas.

Iremos seguidamente identificar que vias são essas e quais os seus regimes para podermos saber exatamente como e quando se produz uma decisão final, apta a dar curso ao prazo de prescrição da pena disciplinar.

§ 3.º - Do recurso hierárquico necessário no novo Código do Procedimento Administrativo.

Para esse efeito, é preciso começar por confirmar a natureza e regime do recurso hierárquico previsto nos artigos 90.º e seguintes do RDPSP.

Apenas algumas breves palavras sobre a conformidade constitucional do recurso hierárquico necessário desde que a Lei Constitucional n.º 1/89, de 8 de julho (2.ª Revisão Constitucional) eliminou do n.º 4 do artigo 268.º da Constituição, a definitividade e a executoriedade como marcas próprias do ato administrativo suscetível de impugnação contenciosa.

Breves palavras, pois não há muito a acrescentar às considerações expendidas no sempre citado Parecer n.º 37/2014 deste Conselho.

Mas, ainda assim, julga-se conveniente deixar uma nota relativa à não inconstitucionalidade de normas que, fundada e razoavelmente, estabeleçam ou venham a estabelecer, como pressuposto necessário da impugnação contenciosa, a impugnação ou petição administrativa prévia (consoante o objeto seja um ato ou a sua omissão).

O conflito estaria na restrição ou no mero condicionamento do acesso aos tribunais e à tutela jurisdicional efetiva, ao exigir-se dos administrados que comecem por exaurir as vias ordinárias ao seu dispor dentro da administração pública[25].

A verdade é que a controvérsia pouco buliu com a jurisprudência que, pacificamente, anteviu no recurso hierárquico necessário uma simples limitação, útil e justificada, de resto, por interesses constitucionalmente protegidos.

A questão chegou a ser posta à jurisdição administrativa em múltiplas ocasiões, entre as quais, precisamente a propósito do recurso hierárquico consignado no RDPSP.

E a posição do Supremo Tribunal Administrativo pode encontrar-se no acórdão da 2.ª Subsecção, de 17 de janeiro de 1995[26]:

«Não há violação do princípio da acionabilidade consagrado no n.º 4 do artigo 268.º da CRP – redação da Lei de Revisão Constitucional n.º 1/89, de 8 de julho – se o legislador estabelecer um recurso hierárquico prévio (recurso hierárquico necessário) à interposição do recurso contencioso, já que tal princípio não impõe a abertura de um recurso contencioso imediato, apenas determinando que não pode recusar-se a abertura da via contenciosa quando há ato administrativo».

Julga-se relevante, bem assim, ao menos para os recursos hierárquicos necessários a interpor para membros do Governo, não deixar na sombra o princípio da separação de poderes (n.º 1 do artigo 111.º, da Constituição) e a posição de supremacia daquele órgão (artigo 182.º) como garantia de unidade da atividade administrativa (n.º 2 do artigo 267.º). Na discussão, que aqui damos por apenas relembrada, tais normas terão decerto uma palavra a dizer.

Nesta linha – e eis, por fim, a razão determinante da breve incursão – pensa-se que a definitividade vertical do ato administrativo lesivo[27] – que é, pouco mais ou menos, o mesmo que dizer a prévia exaustão das vias unitárias de recurso hierárquico – enquanto pressuposto de impugnabilidade contenciosa dos atos sancionatórios disciplinares aplicados a polícias da PSP, vem precisamente corresponder às exigências da estrutura hierárquica desta força de segurança e ao imperativo que resulta do n.º 4 do artigo 272.º da Constituição:

«A lei fixa o regime das forças de segurança, sendo a organização de cada uma delas única para todo o território nacional».

E, de qualquer modo, das mais recentes alterações ao CPTA e do novo CPA[28] pode dizer-se que limaram algumas arestas vivas que o recurso hierárquico necessário ainda pudesse ostentar.

Assim, com a entrada em vigor do Decreto-Lei n.º 4/2015, de 7 de janeiro, o recurso hierárquico necessário circunscreve-se aos casos em que a lei o dispuser expressa e inequivocamente (n.º 4 do artigo 3.º). Só perante tal qualificação devem os tribunais abster-se de conhecer do pedido formulado numa impugnação contenciosa, ainda privada da última palavra da administração pública acerca da legalidade e do mérito do ato.

Por outro lado, este diploma definiu critérios objetivos de qualificação das reclamações e dos recursos hierárquicos para efeitos processuais (n.º 1 do artigo 3.º).

A fim de verificar se o recurso hierárquico previsto nos artigos 90.º e seguintes do RDPSP continua a ser necessário, impõe-se percorrer as pertinentes normas do Decreto-Lei n.º 4/2015, de 7 de janeiro:
«Artigo 3.º
(Impugnações administrativas necessárias)

1 – As impugnações administrativas existentes à data da entrada em vigor do presente decreto-lei são necessárias quando previstas em lei que utilize uma das seguintes expressões:

a) A impugnação administrativa em causa é “necessária”;

b) Do ato em causa “existe sempre” reclamação ou recurso;

c) A utilização de impugnação administrativa “suspende” ou “tem efeito suspensivo” do ato impugnado.

2 – O prazo mínimo para a utilização de impugnações administrativas necessárias é de 10 dias, passando a ser esse o prazo a observar quando seja previsto prazo inferior na legislação existente à data da entrada em vigor do presente decreto-lei.

3 – As impugnações administrativas necessárias previstas na legislação existente à data da entrada em vigor do presente decreto-lei têm sempre efeitos suspensivos da eficácia do ato impugnado.

4 – São revogadas as disposições incompatíveis com o disposto nos n.ºs 2 e 3».


Perante este enunciado, não nos restam dúvidas de que o recurso hierárquico previsto nos artigos 90.º e seguintes do RDPSP não passou a ser facultativo.

Continua a ser um recurso hierárquico necessário, pois, de acordo com o n.º 2 do artigo 95.º, a sua interposição «tem efeito suspensivo», o que corresponde, justamente à quarta das alternativas consignadas no n.º 1 do artigo 3.º do Decreto-Lei n.º 4/2015, de 7 de janeiro.

Justifica-se, então, recapitular o seu regime para sabermos da «decisão final» a que se alude no n.º 2 do artigo 56.º do RDPSP.

Esta operação, porém, não se basta com o simples enunciado dos artigos 90.º e seguintes do RDPSP.

Conquanto não se apliquem as normas de direito disciplinar contidas na Lei Geral do Trabalho em Funções Públicas[29], impõe-se, no entanto, uma conjugação das pertinentes disposições do RDPSP com as do CPA, segundo o critério que este último estabelece:
«Artigo 2.º
(Âmbito de aplicação)
(…)
5 – As disposições do presente Código, designadamente as garantias nele reconhecidas aos particulares, aplicam-se subsidiariamente aos procedimentos administrativos especiais».

Assim, o recurso hierárquico pode ser interposto diretamente para o Ministro da Administração Interna[30], uma vez que se garante, no n.º 1 do artigo 194.º, do novo CPA, o recurso hierárquico per saltum e com notória vantagem para as garantias do administrado, eximido ao ónus de percorrer, sucessivamente, todas e cada uma das instâncias hierárquicas.

E tem de ser interposto para o Ministro da Administração Interna, a tratar-se de pena disciplinar aplicada pelo Diretor Nacional da PSP[31] (cfr. artigo 93.º do RDPSP).

O recurso tem a forma de requerimento e é apresentado junto do órgão que tiver praticado o ato punitivo (o Diretor Nacional, os diretores nacionais adjuntos e seus subalternos com poderes disciplinares) que o remete ao Ministro, no prazo de cinco dias, «acompanhado de informação justificativa da confirmação, revogação ou alteração da pena» (cfr. n.º 2, do artigo 91.º do RDPSP).

O órgão ad quem dispõe de 30 dias para se pronunciar «a contar da receção do respetivo processo» remetido pelo órgão a quo (cfr. artigo 92.º do RDPSP).

Contudo, este prazo pode ser elevado a 90 dias, se houver necessidade de nova instrução ou de diligências complementares (n.º 2 do artigo 198.º do CPA).

Sobre o recurso hierárquico, podem recair diferentes decisões relativamente à punição aplicada:

a) Confirmação[32];

b) Anulação simples[33];

c) Anulação com reenvio ao órgão competente para nova instrução ou diligências complementares[34];

d) Revogação, segundo considerações de mérito[35]; ou,

e) Sanação, designadamente por ratificação, reforma ou conversão do ato impugnado[36].


Trata-se de um recurso de reexame e não de simples revisão[37], pois não se encontra no anexo V a que se refere o artigo 157.º do Decreto-Lei n.º 243/2015, de 19 de outubro, nenhum caso de competência exclusiva ou reservada[38] dos subalternos na aplicação de sanções disciplinares.

Por outras palavras, o superior, ao decidir o recurso dispõe de poderes:

e) De modificação[39] qualitativa da repreensão ou quantitativa das sanções de multa ou de suspensão, além de alterações em matéria de sanções cumulativas[40] ou acessórias[41]; e

f) De substituição[42] por outra sanção disciplinar, mais ou menos grave[43].

Também no recurso hierárquico, o órgão encontra-se adstrito ao dever de decisão, sem embargo de o recurso poder ser rejeitado, nos termos que se transcrevem do pertinente artigo do CPA:
«Artigo 196.º
(Rejeição do recurso)

1 - O recurso deve ser rejeitado nos casos seguintes:

a) Quando o ato impugnado não seja suscetível de recurso;

b) Quando o recorrente careça de legitimidade;

c) Quando o recurso haja sido interposto fora do prazo;

d) Quando ocorra qualquer outra causa que obste ao conhecimento do recurso.

2 - Quando o recurso haja sido interposto para órgão incompetente, é aplicável o disposto no artigo 41.º».



A ser despachado o recurso hierárquico em devido tempo, há uma decisão que, embora definitiva no interior da administração pública, não pode ainda ter-se como final, de modo a iniciar o cômputo do prazo de prescrição (n.º 2 do artigo 56.º do RDPSP). Há ainda a possibilidade de a impugnar nos tribunais administrativos.

Se, ao invés, o termo final do prazo para decidir no recurso hierárquico for atingido sem o órgão tomar posição, não resta ao arguido senão propor ação administrativa com pedido de Impugnação do ato sancionatório praticado pelo subalterno, uma vez que se considera satisfeito o ónus de prévio recurso hierárquico com o termo do prazo para a sua decisão (cfr. n.º 4 do artigo 198.º do CPA) dispondo, para esse efeito, de três meses (cfr. alínea b) do n.º 1 do artigo 58.º do CPTA).

Seria desprovido de sentido que o arguido pudesse intentar, no prazo de um ano (cfr. n.º 1 do artigo 69.º do CPTA), ação administrativa de condenação do órgão ad quem a decidir o recurso hierárquico (cfr. alínea b) do n.º 1 do artigo 37.º do CPTA) se, perante sanção disciplinar lesiva, o interesse do arguido e o interesse público o que exigem é a sua anulação[44]. Até porque uma eventual condenação do superior hierárquico a praticar um ato decisório do recurso administrativo não afasta a possibilidade de o resultado vir a ser um puro ato confirmativo da pena disciplinar e, como tal, não impugnável (cfr. n.º 1 do artigo 53.º do CPTA).

Já por seu turno, assiste ao arguido o direito a deduzir reclamação junto do órgão a quem recorreu hierarquicamente, a fim de ver suprida a omissão (cfr. artigo 187.º do CPA). No entanto, o exercício deste meio não possui efeito suspensivo de execução da pena disciplinar (cfr. n.º 2 e n.º 3 do artigo 190.º do CPA) e em nada obsta a que o ato expresso que venha a ser praticado seja meramente confirmativo ou mais gravoso, do que resultará ter de valer-se dos meios contenciosos.



§ 4.º - Omissão de decisão no recurso hierárquico necessário relativo a penas disciplinares de polícias da PSP.

Mostra-se de extrema importância assinalar que o legislador suprimiu a menção ao indeferimento tácito a que se aludia no n.º 3 do artigo 175.º do anterior CPA, como efeito do decurso do prazo para tomar decisão sobre o recurso hierárquico.

Deixou de ficcionar-se uma decisão final do recurso pelo esgotamento do prazo de decisão sobre o recurso hierárquico, alteração que não passa isenta de repercussões em matéria de prescrição das sanções disciplinares que temos sob análise, se tivermos presente a expressão concretamente utilizada no n.º 2 do artigo 56.º do RDPSP: «até à decisão final».

Nas palavras de JOSÉ CARLOS VIEIRA DE ANDRADE[45]:

«O silêncio do órgão superior releva apenas como facto jurídico e tem esse único efeito, por força da lei – ao contrário do que se entendia antes, não releva como ato, nem tem efeitos homologatórios».

Impedida a formação de um ato tácito de indeferimento, o decurso integral do prazo para proferir decisão no recurso hierárquico já não dá lugar a nenhuma decisão final, nem à ficção legal de uma decisão, sequer.

Vale a pena registar que, sem ter obtido decisão no recurso hierárquico, a aplicação da pena disciplinar continua suspensa (cfr. n.º 1 do artigo 189.º do CPA), o que, por seu turno, explica que, colateralmente, se mantenha suspenso o prazo de prescrição, pelo menos, enquanto o superior hierárquico, podendo ainda proferir decisão, não o faça.

O arguido, como vimos, dispõe de três meses para impugnar contenciosamente o ato sancionatório, contando-se este prazo a partir do termo final para a decisão não proferida do recurso hierárquico (cfr. alínea b) do n.º 1 do artigo 58.º, e n.º 4 do artigo 59.º, ambos do CPTA).

Todavia, como já assinalámos[46], o Ministério Público dispõe de um ano, a contar da prática do ato ou da sua publicação, se for obrigatória (cfr. alínea a) do n.º 1 do artigo 58.º, e n.º 6 do artigo 59.º do CPTA).

Se, durante esse período, cessar a inércia do órgão administrativo, pela confirmação da pena disciplinar, pela sua substituição ou modificação, deixam de estar suspensos os prazos de prescrição a que se refere o n.º 1 do artigo 56.º do RDPSP. Mas, muito provavelmente a sua contagem deixou de ter interesse, pois terá surgido um novo ato sancionatório na ordem jurídica.

O mesmo acontece na eventualidade de o arguido se abster de impugnar contenciosamente o ato que aplicou a pena disciplinar e de tão-pouco o Ministério Público tomar a iniciativa. Decorrido um ano da prática do ato (n.º 6 do artigo 59.º do CPTA) deixa de estar suspensa a prescrição. Dispomos de decisão final e a pena disciplinar já não pode ser anulada pelos tribunais[47].


§ 5.º - Decisão extemporânea do recurso hierárquico.

Iremos retomar, em seguida, a questão relativa às consequências da prática de ato administrativo pelo competente membro do Governo que, já depois de exaurido o prazo de decisão, se pronuncie sobre recurso hierárquico interposto de aplicação de sanção disciplinar a um trabalhador com funções policiais da PSP.

Sem o superior ter decidido o recurso hierárquico e até se esgotar o prazo de impugnação contenciosa, a pena continua com a sua eficácia suspensa pois ainda não se perdeu esse efeito que recurso hierárquico necessário lhe concedeu (n.º 1 do artigo 189.º do CPTA).

Por outro lado, o prazo de prescrição da pena disciplinar aplicada, mas não executada, mantém-se suspenso, pois continua a não haver uma decisão final (cfr. n.º 2 do artigo 56.º do RDPSP) enquanto não for proposta ação administrativa de impugnação do ato ou transcorrido o prazo para o fazer.

É certo que, a partir do momento em que se esgotar o prazo de decisão sobre o recurso hierárquico, o arguido tem o ónus de impugnar contenciosamente o ato recorrido, mas dispõe de um prazo relativamente amplo para o fazer: três meses, nos termos da alínea b) do n.º 1 do artigo 58.º do CPTA[48].

Se ninguém com legitimidade propuser ação administrativa para impugnação do ato, a decisão do subalterno, que entretanto se torna verticalmente definitiva, estabiliza-se. Vem a ser uma «decisão final» para o efeito de ser contado o prazo de prescrição da pena disciplinar, nos termos do n.º 2 do artigo 56.º do RDPSP.

Em todo o caso, o superior hierárquico, a quem cumpria e continua a cumprir a apreciação do recurso hierárquico necessário, embora extemporaneamente, pode ainda proferir decisão.

Nada o eximiu ao cumprimento do dever de decisão, até porque lhe está reservado valorar o mérito do ato recorrido, submetê-lo a uma nova ponderação discricionária segundo critérios de conveniência para o interesse público.

Se essa decisão no recurso hierárquico, proferida dentro dos referidos pressupostos, for simplesmente confirmativa, não tem relevância alguma para a contagem do prazo de prescrição da pena disciplinar.

Mas se vier substituí-la ou modificar-lhe o conteúdo, designadamente por agravamento da sanção[49], o arguido encontra‑se diante de um novo ato administrativo e já verticalmente definitivo, pois tem como autor o máximo superior hierárquico.

Cumpre ao arguido providenciar pela impugnação contenciosa do novo ato, que substituiu o anterior (do subalterno), passando a ter interesse apenas o início da contagem do prazo da prescrição da pena disciplinar – nova ou diferente.

A contagem do prazo de prescrição do ato punitivo substituído ou modificado tornou-se inútil, pois doravante aquela que pode vir a ser a «decisão final» a atingir a «irrecorribilidade» é a do ato substituto ou modificador.

O superior hierárquico só o pode fazer até se esgotar o prazo de impugnação contenciosa (cfr. 1.ª parte do n.º 5 do artigo 168.º do CPA).

Depois disso, outro qualquer ato que o superior hierárquico ou o subalterno vierem a praticar sobre a pena disciplinar aplicada só podem resultar de iniciativa oficiosa e que se destine a anular o ato, nos termos dos n.ºs 1 e 5 do artigo 168.º do CPA:
«Artigo 168.º
(Condicionalismos aplicáveis à anulação administrativa)

1 - Os atos administrativos podem ser objeto de anulação administrativa no prazo de seis meses, a contar da data do conhecimento pelo órgão competente da causa de invalidade, ou, nos casos de invalidade resultante de erro do agente, desde o momento da cessação do erro, em qualquer dos casos desde que não tenham decorrido cinco anos, a contar da respetiva emissão.

2 – (…)

3 – (…)

4 – (…)

5 - Quando, nos casos previstos nos n.os 1 e 4, o ato se tenha tornado inimpugnável por via jurisdicional, o mesmo só pode ser objeto de anulação administrativa oficiosa».

Em suma, depois de o ato se tornar inimpugnável pelo decurso do prazo para intentar ação administrativa, o subalterno e o superior hierárquico perdem a competência dispositiva sobre a pena disciplinar aplicada.

Conservam apenas uma competência de revisão, ou de segundo grau, que lhes permite anular a pena[50], já não a título de decisão do recurso hierárquico, mas por iniciativa própria; já não por razões de oportunidade ou conveniência, mas tão-só com fundamento em ilegalidade[51]. E terão de exercê-la nos seis meses subsequentes ao conhecimento do erro ou à sua cessação com o limite de cinco anos (cfr. n.º 1 do artigo 168.º do CPTA).

Anulada a pena, perde interesse saber da sua prescrição e da contagem do prazo respetivo.

Foram estes poderes de intervenção a que se fez refêrencia no Parecer n.º 37/2014, nomeadamente na 9.ª conclusão.


§ 6.º - Da decisão de não cumprimento da pena e da revisão extraordinária.

De contrário, resta aos órgãos competentes executar a pena disciplinar ou deixar correr o prazo prescricional.

E esta última opção afigura-se legítima, em face do disposto no n.º 3 do artigo 57.º do RDPSP:
«Artigo 57.º
(Cumprimento da pena)

(…)
3 – Se, por motivo de serviço, não puderem ser efetivamente executadas as penas disciplinares, os seus efeitos produzir-se-ão como se aquelas tivessem sido cumpridas.
(…)».

Há ainda a possibilidade de o arguido vir, a todo o tempo, pedir a revisão do processo disciplinar, nos termos do n.º 1 do artigo 98.º do RDPSP.

Trata-se de um recurso administrativo extraordinário que pressupõe trazer «circunstâncias ou a disponibilidade de novos meios de prova suscetíveis de demonstrarem a inexistência dos factos que tiverem determinado a condenação e que não tiverem podido ser utilizados pelo arguido no processo disciplinar».

Se for concedida a revisão, é reaberta a instrução (com nomeação de outro instrutor, nos termos do artigo 101.º do RDPSP) e a pena pode ser revogada ou anulada (artigo 102.º).

O procedimento de revisão, todavia, não suspende o cumprimento da pena (n.º 4 do artigo 98.º do RDPSP), motivo por que também não deve suspender o prazo de prescrição da pena se esta ainda não tiver começado a ser executada.



§ 7.º - Do ato praticado posteriormente à impugnação contenciosa e das vicissitudes da instância.

Olhemos, em seguida, para o cenário alternativo: a impugnação contenciosa da pena disciplinar.

Se a ação administrativa tiver sido tempestivamente proposta pelo arguido no competente tribunal, nada impede que o processo veja o seu objeto ampliado pela prática de novos atos.

A instância pode vir a ser ampliada, nos termos do artigo 63.º, n.º 1, do CPTA «[a]té ao encerramento da discussão em primeira instância» em virtude de «atos que venham a surgir no âmbito ou na sequência do procedimento em que o ato impugnado se insere» ou pela formulação de novas pretensões que possam ser cumuladas com as que constam da petição inicial.

E, de modo a que novos atos avulsos, mas conexos, sejam carreados para a instância, recai sobre a administração pública um dever específico:


«3 - Para o efeito do disposto nos números anteriores, deve a Administração trazer ao processo a informação da existência dos eventuais atos conexos com o ato impugnado que venham a ser praticados na pendência do mesmo».

Refira-se que o objeto do processo não é ampliado oficiosamente:


«4 - A ampliação do objeto é requerida pelo autor em articulado próprio, que é notificado à entidade demandada e aos contrainteressados, para que se pronunciem no prazo de 10 dias».

E, além de novos atos com estreita ligação, pode ainda, também aqui, sobrevir decisão sobre o recurso hierárquico.

O órgão administrativo pode-o fazer até ao encerramento da discussão (cfr. n.º 3 do artigo 168.º do CPA) mas a relevância processual desse ato depende do alcance inovador que manifeste (cfr. artigo 64.º do CPTA).

Se a decisão do superior hierárquico se limitar a confirmar o ato punitivo praticado pelo subalterno, é processualmente desprovida de efeitos, como, regra geral, sucede com os atos meramente confirmativos (cfr. n.º 1 do artigo 53.º do CPTA).

Se a decisão do superior hierárquico anular simplesmente o ato punitivo, extingue-se a instância[52].

Se sobrevier pena disciplinar diferente – quantitativa ou qualitativamente – pode a instância vir a ser modificada sem, necessariamente, ser ampliada. Isto, nos termos do artigo 64.º do CPTA.

A ocorrer modificação ou substituição da pena aplicada ao arguido, ora autor, este pode «requerer que o processo prossiga contra o novo ato com fundamento da reincidência nas mesmas ilegalidades, sendo aproveitada a prova produzida e dispondo o autor da faculdade de oferecer novos meios de prova» (cfr. n.º 1 do artigo 64.º do CPTA).

Quer isto dizer que, na hipótese de o órgão administrativo vir reduzir a multa aplicada ou, em lugar da multa, aplicar outra pena disciplinar, o autor não se vê frustrado na tutela judicial efetiva dos seus direitos.

E esta faculdade assiste ao autor que, só depois de ter intentado a ação administrativa, venha a ter conhecimento da decisão tomada no recurso hierárquico, tenha, ou não, sido oportunamente notificado do seu teor (cfr. n.º 3, in fine, do artigo 64.º do CPTA).

Se a decisão vier «sanar os efeitos do ato impugnado[53], o autor pode requerer a anulação dos efeitos lesivos produzidos por aquele ato durante o período de tempo que precedeu a respetiva sanação» (cfr. n.º 6 do artigo 64.º do CPTA).

Admita-se, por hipótese, que o ato praticado pelo subalterno exigia a competência de um superior (v.g. do Ministro da Administração Interna) e que este vem ao processo apresentar a ratificação sanatória do mesmo, nos termos do disposto no n.º 3 do artigo 164.º do CPA.

O autor da ação administrativa pode, então, requerer a anulação de atos lesivos praticados indevidamente até à ratificação, designadamente a aplicação de medidas cautelares sobre as quais se dispõe no artigo 74.º do RDPSP, o seguinte:
«Artigo 74.º
(Medidas cautelares)
1 - Sempre que a sua manutenção em funções se revele inconveniente para o serviço ou para o apuramento da verdade, pode ser determinada a aplicação das seguintes medidas cautelares aos funcionários e agentes policiais:

a) Desarmamento;

b) Apreensão de qualquer documento ou objeto que tenha sido usado, ou possa continuar a sê-lo, na prática da infracão;

c) Suspensão preventiva.

2 - As medidas cautelares são aplicadas por iniciativa da entidade que ordene a instauração do processo ou, no decurso das averiguações, por proposta do instrutor.

3 - O desarmamento consiste em retirar ao funcionário ou agente as armas que, por motivo de serviço, lhe tenham sido distribuídas ou estejam a seu cargo e pode ser ordenado, quando se mostre necessário ou conveniente, por qualquer superior hierárquico com funções de comando ou chefia.

4 - A apreensão de documento ou objeto consiste em desapossar o funcionário ou agente de documento ou objeto que tenha sido usado, ou possa continuar a sê-lo, para a prática da infração ou de qualquer outro cujo exame seja necessário para a instrução do processo.

5 - A apreensão a que se refere o número anterior, se recair em documento ou objeto pertencente a terceiros, só pode manter‑se pelo tempo indispensável à realização dos exames necessários à instrução do processo.

6 - A suspensão preventiva consiste na separação do serviço, com perda de um sexto do vencimento base, até decisão final do processo, por prazo não superior a 90 dias, prorrogável por igual período, sem prejuízo do disposto no n.º 2 do artigo 95.º.

7 - A suspensão preventiva só pode ser ordenada e prorrogada pelo Ministro da Administração Interna ou pelo [Diretor Nacional] no caso de falta grave de serviço punível com alguma das penas previstas nas alíneas e) e seguintes do n.º 1 do artigo 25.º.

8 - A perda de um sexto do vencimento base a que se refere o n.º 6 será reparada ou levada em conta na decisão final do processo no caso de absolvição ou de aplicação de pena que não implique a perda definitiva de vencimentos.

9 - Durante a pendência do processo, o funcionário ou agente é graduado para promoção ou acesso, suspendendo-se o movimento até decisão final.

10 - Se o processo for arquivado ou for aplicada uma pena que não prejudique a promoção ou acesso, o funcionário ou agente vai ocupar o seu lugar na lista de antiguidades.

11 - O disposto nos n.os 9 e 10 é aplicável, com as necessárias adaptações, na pendência de processo criminal».

Em todo o caso, uma vez intentada ação administrativa, a contagem do prazo de prescrição da pena disciplinar só tem início com o trânsito em julgado.


§ 8.º - Inimpugnabilidade, decisão final e prazo de prescrição da pena disciplinar.

Julgamos estar, neste ponto, em condições de arrumar os critérios de apuramento do termo inicial do prazo de prescrição das penas disciplinares aplicadas ao pessoal da PSP com funções policiais, identificando as circunstâncias que dão por certa a inimpugnabilidade do ato punitivo, em conformidade com ambos os números do artigo 56.º do Regulamento Disciplinar, aprovado pela Lei n.º 7/90, de 20 de fevereiro.

Inimpugnabilidade por não ter havido reação adequada (n.º 1 do artigo 56.º do RDPSP) ou inimpugnabilidade por já ninguém com legitimidade dispor de meios para alcançar a revisão (ordinária) do ato sancionatório.

Uma coisa é certa. No artigo 56.º do RDPSP, o legislador não indexou o prazo de prescrição da pena disciplinar à eficácia do ato.

Já houve oportunidade de identificar vários momentos em que a sanção, embora eficaz – por exemplo, logo após ser proferida decisão confirmativa no recurso hierárquico e notificada ao arguido – não viu iniciar-se o cômputo do prazo de prescrição.

E tão-pouco o indexou à executoriedade, pois, apesar de, nos termos do n.º 1 do artigo 57.º do RDPSP[54], ter sido relegada a execução coerciva da pena para quando já não houver recurso admissível («não havendo recurso no prazo legal») e para o dia imediatamente subsequente à publicação interna, o certo é que a contagem do prazo de prescrição em nada depende deste último fator. Só do primeiro.

O critério terá sido o da estabilidade da decisão, motivo por que é usada a expressão «irrecorribilidade» no n.º 1 do artigo 56.º e «decisão final» no n.º 2, consoante não tenham ou tenham sido exercidos os meios próprios de reação graciosa ou contenciosa que assistem ao arguido e, no que toca a estes últimos, ao Ministério Público para defesa da legalidade.

Veremos, então, os factos que removem a suspensão do prazo de prescrição das penas disciplinares.

8.1. – Temos, em primeiro lugar, a falta de interposição de recurso hierárquico necessário.

Já pôde ver-se por que motivo o recurso hierárquico previsto nos artigos 90.º e seguintes do RDPSP continua a dever ser qualificado como necessário.

E, como tal, no prazo para a sua interposição – 10 dias, nos termos do n.º 1 do artigo 91.º do RDPSP – o ato punitivo é recorrível, o que impede, nos termos do n.º 1 do artigo 56.º do RDPSP, iniciar a contagem do prazo de prescrição da pena[55].

Sem a interposição do recurso hierárquico – porque necessário – e sem o órgão superior decidir ou decorrer o prazo previsto para esse efeito – o tribunal não pode conhecer do pedido.

Apesar de o Decreto-Lei n.º 214-G/2015, de 2 de outubro, ao alterar o CPTA, não ter configurado especificamente este pressuposto processual nem as consequências da sua preterição, parece não haver dúvidas de que a sua falta obsta ao conhecimento do pedido, tal como – recorda-nos JOSÉ CARLOS VIEIRA DE ANDRADE[56] – em outras situações de incumprimento do ónus de prévia interpelação administrativa necessária, designadamente a falta de requerimento junto do órgão administrativo competente diante de omissão pura de decisão e a fim de obter do tribunal administrativo a condenação na prática de ato devido (cfr. n.º 1 do artigo 67.º do CPTA).

Para MÁRIO AROSO DE ALMEIDA[57], uma vez preterido o recurso hierárquico necessário, é a falta de interesse processual do autor que se acusa:

«Por conseguinte, quando, nesses casos, o interessado opte por impugnar o ato perante os tribunais sem ter feito prévio uso da impugnação administrativa necessária que ao caso a lei expressamente fazia corresponder, a sua pretensão deve ser rejeitada porque a lei não lhe reconhece o interesse processual que, no caso, se deveria sustentar na demonstração de ter tentado infrutiferamente obter o resultado pretendido pela via extrajudicial legalmente estabelecida».

Sem nominar o pressuposto processual, é fora da lei adjetiva, no n.º 1 do artigo 185.º do CPA que se encontra um arrimo literal para o efeito condicionante dos meios graciosos necessários:
«Artigo 185.º
(Natureza e fundamentos)
1 – As reclamações e os recursos são necessários ou facultativos, conforme dependa ou não, da sua prévia utilização a possibilidade de acesso aos meios contenciosos de impugnação ou condenação à prática de ato devido
(…)».

Nesta eventualidade, de inércia do arguido, abstendo-se de recorrer para o superior hierárquico, dá-se por preenchida a previsão do n.º 1 do artigo 56.º do RDPSP: o ato já atingiu a inimpugnabilidade.

Tem início, sem mais, a contagem do prazo de prescrição da pena disciplinar e já não poderá suspender-se.

8.2. – Temos, em segundo lugar, aqueles casos em que a decisão do recurso hierárquico necessário venha confirmar a pena aplicada e sem que seja tempestivamente impugnada na jurisdição administrativa.

Findo o prazo maior para impugnação (cfr. artigos 58.º e 59.º do CPTA) o ato sancionatório constitui decisão final.

Em princípio, um ano (cfr. alínea a), do n.º 1 do artigo 58.º do CPTA) após a prática do ato sancionatório (cfr. n.º 6 do artigo 59.º do CPTA) porquanto assiste ao Ministério Público legitimidade para intentar ação pública, desde então e até lá.

Convolada a aplicação da pena disciplinar em decisão final, deixa de estar suspenso o início do prazo de prescrição da pena, nos termos do n.º 2 do artigo 56.º do RDPSP.

8.3. – Em terceiro lugar, e pela mesma ordem de razão, encontram-se os casos de não decisão do recurso hierárquico no prazo previsto sem haver lugar à impugnação contenciosa (cfr. 2.ª parte do n.º 4 do artigo 59.º do CPTA).

Caso o superior hierárquico se abstenha de proferir decisão no recurso hierárquico necessário, ainda não pode dizer-se ter havido uma decisão final (pois nem sequer há indeferimento tácito) nem pode afirmar-se que a pena aplicada é irrecorrível ou inimpugnável.

Só mais tarde se poderá dar por constituída uma decisão final, definitiva, e só mais tarde ganha curso o prazo de prescrição do ato punitivo.

Interposto o recurso hierárquico necessário, suspende-se a eficácia do ato (n.º 1 do artigo 189.º do CPA) e o prazo para intentar a pertinente ação administrativa só começa a contar-se com a notificação da decisão sobre o recurso ou com o transcurso do prazo de decisão (n.º 4 do artigo 198.º do CPA).

Aplicam-se, mutatis mutandis, os prazos de três meses para o arguido (alínea b) do n.º 2 do artigo 58.º do CPTA) e de um ano para o Ministério Público (alínea a]).

Há contudo uma diferença relativamente ao dies a quo. É que o prazo da ação pública, nos termos do n.º 6 do artigo 59.º do CPTA conta-se da prática do ato ou da sua publicação, quando esta for obrigatória.

Sem ter havido pronúncia no recurso hierárquico necessário e sem que ao Ministério Público assistisse legitimidade para o interpor, o prazo de um ano deve contar-se do termo final do prazo para o superior hierárquico decidir o recurso interposto pelo arguido.

E mais ainda. Consideradas as dilações que constam do n.º 3 do artigo 58.º do CPTA, em ordem a uma maior proteção do destinatário do ato, nem sempre o prazo do Ministério Público é o último a esgotar-se.

8.4. – Temos, por fim, e em último lugar, o trânsito em julgado da sentença ou do acórdão que os tribunais administrativos vierem a proferir em ação administrativa proposta pelo interessado ou pelo Ministério Público.

Referimo-nos, claro está, ao trânsito de decisão jurisdicional favorável à PSP e ao Ministro da Administração Interna, pois de outro modo, a decisão punitiva é anulada e a questão da sua prescrição perde razão de ser.

Com o trânsito em julgado temos inexoravelmente uma decisão final, (irrecorrível ou inimpugnável) satisfazendo ao disposto no n.º 2 do artigo 56,º do RDPSP.


§ 9.º - Conclusões.

Em face do exposto, somos a apresentar como conclusões as que vão seguidamente enunciadas:

1.ª – O Regulamento Disciplinar da Polícia de Segurança Pública faz depender da formação de caso decidido ou de caso julgado o início da contagem dos prazos de prescrição das penas aplicadas aos trabalhadores em funções policiais. Por outras palavras, a prescrição da pena tem como requisito a inimpugnabilidade, que, na letra da lei surge designada, ora como «decisão final» (n.º 2 do artigo 56.º), ora como «irrecorribilidade» (n.º 1 do artigo 56.º) consoante o arguido se tenha valido, ou não, dos meios graciosos e contenciosos que lhe assistem.

2.ª – Do ato administrativo de um órgão subalterno que aplique pena disciplinar cabe recurso hierárquico, o qual, por dever continuar a ser considerado necessário (à luz dos critérios enunciados no artigo 3.º do Decreto-Lei n.º 4/2015, de 7 de janeiro) tem efeito suspensivo da eficácia do ato (n.º 1 do artigo 189.º, do novo Código do Procedimento Administrativo) e é pressuposto processual da impugnação contenciosa (n.º 1 do artigo 185.º, do novo Código do Procedimento Administrativo).

3.ª – Trata-se de recurso de reexame e não de mera revisão, pois nas competências disciplinares dos órgãos da Polícia de Segurança Pública não se encontram domínios dispositivos exclusivos ou reservados dos subalternos, o que significa poder o órgão ad quem, não apenas confirmar, sanar, revogar ou anular a pena disciplinar, como também substitui-la por outra, mais pesada ou mais leve, e modificá-la (atenuando-a ou agravando-a).

4.ª – Ultrapassado o termo final do prazo concedido ao órgão ad quem para proferir decisão no recurso hierárquico necessário, sem o ter feito, deixou de presumir-se o indeferimento tácito, como estatuía o anterior Código do Procedimento Administrativo (n.º 3 do artigo 175.º), de modo que não pode sequer identificar-se uma decisão final por ficção legal.

5.ª – Pode o arguido impugnar contenciosamente o ato punitivo no prazo de três meses (alínea b) do n.º 1 do artigo 58.º do Código do Processo nos Tribunais Administrativos) a contar da notificação do indeferimento do recurso hierárquico ou simplesmente do termo final sem decisão pelo órgão ad quem, uma vez que se considera satisfeito o ónus de prévia impugnação administrativa.

6.ª – Por seu turno, o Ministério Público dispõe de um ano (alínea a) do n.º 1 do artigo 58.º do Código do Processo nos Tribunais Administrativos), embora a contar da aplicação da pena disciplinar pelo superior hierárquico ou pelo subalterno, consoante a competência dispositiva primária (n.º 6 do artigo 59.º).

7.ª – O órgão ad quem, não obstante ter deixado por decidir o recurso hierárquico, em devido tempo, pode, ainda assim, vir a fazê-lo.

8.ª – Pode anular o ato recorrido até ao termo final dos prazos de impugnação contenciosa (1.ª parte do n.º 5 do artigo 168.º do novo Código do Procedimento Administrativo) ou, até ao encerramento da discussão no processo, se tiver sido proposta ação administrativa (n.º 3).

9.ª – O órgão ad quem, pode, ainda para além destes prazos, mas contanto que o faça por iniciativa oficiosa, anular o ato punitivo, se este já não puder ser impugnado contenciosamente e se ainda não se encontrarem exauridos os prazos gerais da anulação administrativa (2.ª parte do n.º 5 e n.º 1 do artigo 168.º do novo Código do Procedimento Administrativo).

10.ª – O órgão ad quem e o subalterno podem até o ato punitivo já não poder ser impugnado contenciosamente, revogá-lo, saná-lo, alterar a medida da pena ou substituí-la por outra, sem embargo da impugnação contenciosa própria que um novo ato justifique.

11.ª – Como também podem fazê-lo depois de intentada ação administrativa e até ao encerramento da discussão, sem prejuízo de tais atos virem à instância por iniciativa do autor, subsistindo ou sendo agravado o efeito lesivo e sob autorização do tribunal, nos termos dos artigos 63.º a 65.º do Código do Processo nos Tribunais Administrativos).

12.ª – Os prazos de prescrição das penas disciplinares aplicadas nos termos do Regulamento Disciplinar da Polícia de Segurança Pública não admitem interrupção e começam a correr:

a) Com o termo do prazo para o arguido interpor recurso hierárquico do ato punitivo, se o não interpuser;

b) Com o termo do prazo maior para a impugnação contenciosa do ato punitivo, sem esta ter lugar, e depois de no recurso hierárquico:

- ter sido simplesmente confirmado o ato recorrido;

- ter sido substituída ou modificada a pena;

- ter ficado sanado o ato do vício de que enfermasse; ou

- não ter sido tomada decisão alguma no prazo legalmente previsto;

c) Uma vez proposta ação administrativa, com o trânsito em julgado da sentença ou do acórdão que os tribunais administrativos vierem a proferir, recusando a anulação do ato impugnado.

13.ª – Conferem inutilidade superveniente ao conhecimento da prescrição da pena disciplinar:

a) O seu cumprimento;

b) A anulação administrativa, antes ou depois de esgotado o prazo para decidir o recurso hierárquico, já que a sanção deixa de existir na ordem jurídica, tornando-se inútil conhecer da sua prescrição;

c) A anulação jurisdicional do ato sancionatório, pelas razões enunciadas na alínea anterior;

d) A revogação do ato sancionatório, privando-o de efeitos, pelas razões enunciadas nas alíneas anteriores;

14.ª – Não retardam, não antecipam e nem suspendem o prazo de prescrição (se já tiver começado a contagem respetiva):

a) A confirmação do ato punitivo, depois de exaurido o prazo de decisão do recurso hierárquico, pois nada inova e já nem sequer condiciona o prazo de impugnação pelo arguido;

b) A substituição ou simples alteração da pena aplicada, depois de esgotado o prazo de decisão do recurso hierárquico e até ao encerramento da discussão, por tomarem o lugar do ato punitivo originário, seja através da modificação da instância (caso tenha sido intentada ação administrativa) seja por impugnação contenciosa dos novos atos (surgidos extemporaneamente na ordem jurídica);

c) A nulidade ou inexistência do ato punitivo, por definição, insuscetível de cumprir e de prescrever, pois sendo impugnável a todo o tempo, nunca pode, por isso, ser considerado uma decisão final;

d) A interposição de recurso extraordinário de revisão da pena aplicada, pois tão-pouco suspende o cumprimento já iniciado da pena (n.º 4 do artigo 98.º do Regulamento Disciplinar da Polícia de Segurança Pública).

15.ª – À Polícia de Segurança Pública é permitido deixar correr o prazo prescricional, abstendo-se de fazer cumprir uma pena disciplinar, ao abrigo de razões de conveniência de serviço, sem prejuízo de se ficcionar juridicamente a produção dos efeitos que não impliquem a execução efetiva pelo trabalhador (cfr. artigo 57.º, n.º 3, do Regulamento Disciplinar da Polícia de Segurança Pública).

16.ª – Requisito essencial da eficácia jurídica da aplicação de pena disciplinar e, por sua vez, do termo inicial da contagem do prazo de prescrição é, em qualquer caso, a notificação ao arguido ou, uma vez impossibilitada esta, a publicação no Diário da República (n.º 1 e n.º 2 do artigo 57.º do Regulamento Disciplinar da Polícia de Segurança Pública).

17.ª – Já a publicação interna, em ordem de serviço, apenas constitui requisito de executoriedade da pena disciplinar, mas não se apresenta como condição para iniciar o cômputo do prazo prescricional.


ESTE PARECER FOI VOTADO NA SESSÃO DO CONSELHO CONSULTIVO DA PROCURADORIA-GERAL DA REPÚBLICA, DE 23 DE MARÇO DE 2017.

Adriano Fraxenet de Chuquere Gonçalves da Cunha – Eduardo André Folque da Costa Ferreira (Relator) – João Edurado Cura Mariano Esteves – Vinício Augusto Pereira Ribeiro – Maria Isabel Fernandes da Costa – Fernando Bento – Maria Manuela Flores Ferreira – Paulo Joaquim da Mota Osório Dá Mesquita – Francisco José Pinto dos Santos.








[1] Ofício entrado em 6/3/2017.
[2] Com uma única alteração, não relevante para a consulta, por via do Decreto-Lei n.º 255/95, de 30 de setembro, cuja redação, por conter um lapso, é a que consta da Declaração de Retificação n.º 151/95, de 30 de novembro (Diário da República, I Série-A, n.º 277, de 30 de novembro de 1995).
[3] Aprovado pela Lei n.º 47/86, de 15 de outubro, na redação que lhe foi conferida pela 14ª alteração, introduzida pela Lei n.º 9/2011, de 12 de abril.
[4] Aprovado por maioria. Não foi homologado nem se encontra publicado. Encontra-se na base de dados dos pareceres do Conselho Consultivo da PGR sob acesso reservado.
[5] Em 8 de abril de 2015, de acordo com o artigo 9.º.
[6] No exercício de autorização legislativa concedida pela Lei n.º 42/2014, de 11 de julho.
[7] Em 2 de dezembro de 2015, de acordo com o artigo 167.º.
[8] Em 1 de dezembro de 2015, de acordo com o n.º 1 do artigo 15.º.
[9] Acerca da caducidade no direito administrativo, v. MARIA FERNANDA MAÇÃS, A caducidade no direito administrativo: breves considerações, in Estudos em Homenagem ao Conselheiro José Manuel Cardoso da Costa, vol. II, Coimbra Ed., Coimbra, 2005, pp. 121 e seguintes; LUÍS FÁBRICA, O tempo e a caducidade em direito administrativo, in V Encontro dos Professores Portugueses de Direito Público (org. CARLA AMADO GOMES), Instituto de Ciências Jurídico‑Políticas da Faculdade de Direito de Lisboa, Lisboa, 2012, pp. 67 e seguintes.
[10] A respeito da distinção entre prescrição e caducidade, v. por todos, ANA FILIPA MORAIS ANTUNES, Prescrição e Caducidade – Anotação aos Artigos 296.º a 333.º do Código Civil (‘O tempo e a sua repercussão nas relações jurídicas’), 2.ª ed., Coimbra Ed., Coimbra, 2014, em especial, a anotação ao artigo 298.º do Código Civil, pp. 21 e seguintes.
[11] Ob. cit., p. 202.
[12] V. por todos, ADRIANO VAZ SERRA, Prescrição extintiva e caducidade, in Boletim do Ministério da Justiça, n.º 106 (V‑1961), pp. 185 e seguintes.
[13] Atribuindo um sentido alternativo, às duas previsões de interrupção, v. Acórdão STA, 2.ª Sub., de 9 de julho de 1991: «Instaurado o procedimento disciplinar dentro do limite temporal (…) toda a demora posterior na conclusão do processo apenas releva no âmbito do prazo geral de prescrição (3 anos), contado a partir do momento em que a infração tiver sido cometida, da prática do último ato instrutório com incidência na marcha do processo ou da notificação da acusação ao arguido, face ao que se dispõe nos n.ºs 1 e 4 do citado artigo 55.º» (www.dgsi.pt/jsta).
[14] Instaurado por infração cometida pelo mesmo arguido ou por terceiros.
[15] Itálico nosso.
[16] Itálico nosso.
[17] Aprovado pela Lei n.º 13/2002, de 19 de fevereiro, com alterações introduzidas pelo Decreto-Lei n.º 214-G/2015, de 2 de outubro.
[18] Aprovado pela Lei n.º 15/2002, de 22 de fevereiro, e alterado pela Lei n.º 4-A/2003, de 19 de fevereiro, pela Lei n.º 59/2008, de 11 de setembro, pela Lei n.º 63/2011, de 14 de dezembro, e pelo Decreto-Lei n.º 214-G/2015, de 2 de outubro.
[19] Das penas disciplinares aplicadas pelo Ministro da Aministração Interna já não cabe recurso hierárquico. Cfr. escalões de competência disciplinar consignados no Anexo V a que se refere o artigo 157.º do Estatuto Profissional do Pessoal com Funções Policiais da Polícia de Segurança Pública, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 243/2015, de 19 de outubro.
[20] Recurso hierárquico impróprio, na designação tradicional e que se mantinha no anterior Código do Procedimento Administrativo.
[21] Notificação pessoal, seguida de prazo para recurso. A necessária publicação em ordem de serviço permite a execução no dia imediatamente posterior, mas só terá lugar quando o ato se tornar inimpugnável (n.º 1 do artigo 57.º do RDPSP). Basta a inimpugnabilidade, contudo, para começar a contar o prazo prescricional (artigo 56.º). A não ser possível a notificação, determina-se a publicação por extrato, no Diário da República, começando os efeitos a produzir-se passados 15 dias (n.º2 do artigo 57.º do RDPSP).
[22] Infra, pp. 19 e seguintes.
[23] A haver também notificação do mandatário constituído no procedimento disciplinar, dispõe-se no mesmo preceito que releva a notificação praticada em último lugar.
[24] Ou a reação intempestiva, esgotados os prazos para impugnação graciosa ou contenciosa, consoante o ato seja, ou não, verticalmente definitivo.
[25] Para uma visão de conjunto das posições em conflito na doutrina, após a 2.ª Revisão Constitucional (1989), v. PEDRO GONÇALVES, Relações entre as Impugnações Administrativas Necessárias e o Recurso Contencioso de Anulação de Atos Administrativos, Almedina Ed., Coimbra, 1996, pp. 42 e seguintes.
[26] Rec. 034713 (www.dgsi.pt/jsta).
[27] Sobre o conceito de definitividade do ato administrativo, v. MARCELLO CAETANO, Manual de Direito Administrativo, 1.º vol., 10.ª ed., 2.ª reimp., Almedina Ed., Coimbra, 1982, pp. 443 e seguintes: «Chama-se ato definitivo à resolução final que define a situação jurídica da pessoa cujo órgão se pronunciou ou de outra que com ela está ou pretende estar em relação administrativa» (itálico do Autor que sugere v. em especial os acórdãos do Supremo Tribunal Administrativo de 8 de julho de 1938 e de 25 de março de 1955).
[28] Cfr. MÁRIO AROSO DE ALMEIDA, Manual de Processo Administrativo, 3.ª edição, Almedina Ed., Coimbra, 2017, p. 298.
[29] Designadamente, do artigo 225.º, em matéria de recurso hierárquico de sanções disciplinares, porquanto este domínio está excluído para o pessoal da PSP com funções policiais por força do n.º 2 do artigo 2.º da Lei Geral do Trabalho em Funções Públicas, aprovada pela Lei n.º 35/2014, de 20 de junho, cuja redação ficou assente com a Declaração de Retificação n.º 37-A/2014, de 19 de agosto, tendo sido alterada pela Lei n.º 42/2016, de 28 de dezembro, pela Lei n.º 82‑B/2014, de 31 de dezembro, pela Lei n.º 84/2015, de 7 de agosto, e pela Lei n.º 18/2016, de 20 de junho.
[30] Os despachos de delegação de poderes da atual Ministra da Administração Interna na Secretária de Estado Adjunta e da Administração Interna (Despacho n.º 180/2016, de 28 de dezembro de 2015) e no Secretário de Estado da Administração Interna (Despacho n.º 181/2016, de 28 de dezembro de 2015), ambos publicados no Diário da República, 2.ª Série, n.º 4, de 7 de janeiro de 2016, não contemplam competências de natureza disciplinar relativas à Polícia de Segurança Pública.
[31] Já não o Comandante-Geral, como permanece no RDPSP, mas o Diretor Nacional e os diretores nacionais-adjuntos, segundo a atual orgânica da PSP (Lei n.º 53/2007, de 31 de agosto) e de acordo com as competências disciplinares consignadas no Anexo V a que se refere o artigo 157.º do Estatuto Profissional do Pessoal com Funções Policiais da Polícia de Segurança Pública, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 243/2015, de 19 de outubro.
[32] Cfr. n.º 1 do artigo 197.º do CPA.
[33] Idem.
[34] Cfr. n.º 3 do artigo 197.º do CPA.
[35] Cfr. n.º 1 do artigo 197.º do CPA.
[36] Cfr. artigo 164.º do CPA.
[37] Sobre a distinção, v. por todos, DIOGO FREITAS DO AMARAL, Conceito e Natureza do Recurso Hierárquico, 1.º volume, 2.ª edição, Almedina Ed., Coimbra, 2005, pp. 239 e seguintes.
[38] Sobre estes conceitos, v. DIOGO FREITAS DO AMARAL, ob cit., p. 291.
[39] Cfr. n.º 1 do artigo 197.º do CPA.
[40] Cessação da comissão de serviço de dirigente (cfr. n.º 2 do artigo 25.º do RDPSP).
[41] Transferência do trabalhador (cfr. artigo 28.º do RDPSP).
[42] Cfr. n.º 1 do artigo 197.º do CPA. V. também n.º 1 do artigo 173.º, ao remeter a disciplina dos atos substitutivos e dos atos modificativos para o regime da revogação, não sem dificuldades de adaptação, como se vê nos restantes números, a reclamarem uma disciplina da substituição de ato administrativo anulável com possível efeito sanatório.
[43] Cfr. n.º 1 (in fine) do artigo 197.º do CPA, que permite a reformatio in pejus.
[44] Neste sentido, v. MÁRIO AROSO DE ALMEIDA, ob. cit., p. 303.
[45] A Justiça Administrativa – Lições, 15.ª ed., Almedina Ed., Coimbra, 2016, p. 289, nota 723.
[46] V. Supra, §2.º
[47] Isto, claro está, se o ato não for nulo ou inexistente, pois nessas hipóteses, a ação pode ser intentada a todo o tempo (cfr. n.º 1 do artigo 58.º do CPTA).
[48] E, eventualmente, além deste prazo, em vista das dilações que se instituíram no n.º 3 do artigo 58.º, para maior proteção dos administrados.
[49] Não cuidaremos da decisão que simplesmente revogue ou anule a aplicação da pena disciplinar não executada, posto que tais casos representam a extinção do ato sancionatório e, por isso, não interessam à questão apresentada pela Consulente: quando e em que termos prescrevem as penas disciplinares?
[50] Não é de excluir a anulação parcial que, não obstante alterar a pena, não envolve poderes dispositivos.
[51] Traço distintivo da anulação perante a revogação.
[52] Sem prejuízo de, vindo posteriormente a ser substituído por outro ato com reincidência nas mesmas ilegalidades, poder o interessado requerer ao tribunal a reabertura do processo, dentro do prazo comum de impugnação contenciosa, sendo aproveitada a prova e dispondo o autor da faculdade de oferecer novos meios de prova (cfr. n.º 4 do artigo 64.º do CPTA).
[53] Tratando-se de «ato que tenha determinado a imposição de deveres, encargos, ónus ou sujeições, a aplicação de sanções ou a restrição de direitos ou interesses legalmente protegidos».
[54] Cfr. Supra, §2.º.
[55] O referido prazo suspende-se caso seja deduzida reclamação, ou seja, se o arguido exercer o direito de requerer a revisão do ato junto do órgão que o tiver praticado (n.º 1 do artigo 190.º do CPA). De todo o modo, sem haver decisão favorável no prazo de 30 dias (n.º 2 do artigo 192.º do CPA) e sem a tempestiva interposição do recurso hierárquico necessário, o ato punitivo torna-se inimpugnável. Não há nenhum outro órgão administrativo a quem recorrer e, por outro lado, a ação administrativa já não pode ser proposta.
[56] Ob. cit., p. 289.
[57] Ob. cit., p. 301.