Pareceres PGR

Parecer do Conselho Consultivo da PGR
Nº Convencional: PGRP00003372
Parecer: P000192016
Nº do Documento: PPA26012017001900
Descritores: PROCESSO DISCIPLINAR
PLURALIDADE DE INFRAÇÕES
UNIDADE DA SANÇÃO DISCIPLINAR
APENSAÇÃO
SEPARAÇÃO DE PROCESSOS
SUCESSÃO DE INFRAÇÕES
ACUMULAÇÃO DE INFRAÇÕES
CIRCUNSTÂNCIA AGRAVANTE ESPECIAL
PROCEDIMENTO DISCIPLINAR
PRINCÍPIO NON BIS IN IDEM
PROCESSO PENAL
APLICAÇÃO SUBSIDIÁRIA
FUNÇÃO PÚBLICA
PRAZO DE PRESCRIÇÃO
TERMO INICIAL
Área Temática:DIR ADM*FUNÇÃO PUBL*DISC FUNC/DIR PROC PENAL/DIR CONST
Ref. Pareceres:P000521987Parecer: P000521987
P000371998Parecer: P000371998
P000641998Parecer: P000641998
P000751998Parecer: P000751998
P000252009Parecer: P000252009
P000382010Parecer: P000382010
P000172015Parecer: P000172015
P000032016Parecer: P000032016
Legislação:L58/2008 DE 09/09 ART9 N3 ART24 ART31; L35/2014, DE 20/06 ART 180 N3 ART191 ART199; L82-B/2015 DE 07/08; L18/2016 DE 20/06; DL24/84 DE 16/01 ART48; DL32659 DE 09/02/1943 ART14 ART40; CPC ART130; DL31095 DE 31/12/1940 ART569; DL27424 DE 31/12/1936 ART494; CPENAL ART30 N2 ART79 N1; D DE 22/02/1913 ART7; CADM1936 ART583; CPENAL1886 ART34 ART38; CPENAL82 ART30 N1 ART77; CADM1896 ART396 A 413; CADM1940 ART569; L145/99 DE 01/09 ART80 N1 N2 N4; L66/2014 DE 28/08; L7/90 DE 20/02 ART63 N2; DL255/95 DE 30/09; L5/99 DE 27/01; LO 2/2009 DE 22/06 ART88 N1 N2; DL97/99 DE 24/03 ART64 N2; CPA ART6 N1 N2; CPPENAL ART24 ART29 ART30
Direito Comunitário:AC TEDH DE 08/06/1976 (ENGEL E OUTROS VS HOLANDA)
Direito Internacional:
Direito Estrangeiro:
Jurisprudência:AC TCONST N252/2016
AC TCONST N3/2006
AC TCONST N635/2015
AC TCONST N263/94
AC TCONST N161/95
AC TCONST N306/03
AC TCONST N745/13
AC TCONST N21/2012
AC TCONST N154/2010
AC STA 12/05/2005 P930/04
AC STA 16/04/1997 P21488
AC STA 16/01/2003 P604/02
AC STA 16/06/2011 P1106/09
AC RP 24/10/2012 P681/09
AC STA 13/11/1964 P6799
Documentos Internacionais:
Ref. Complementar:
Conclusões: 1. Existindo uma pluralidade de infrações disciplinares não punidas imputadas ao mesmo trabalhador em funções públicas:
a) Conhecida a notícia das várias infrações antes da instauração de qualquer processo deverá ser organizado um único processo;
b) Tendo sido instaurada uma pluralidade de processos ainda pendentes deverão os mesmos ser apensos.
2. As normas referidas na conclusão precedente atualmente encontram-se consagradas no artigo 199.º, n.os 1 e 2, da Lei Geral do Trabalho em Funções Públicas (LTFP), aprovada pela Lei n.º 35/2014, de 20 de junho, cuja fonte histórica foi o artigo 40.º do Estatuto Disciplinar dos Funcionários Civis do Estado aprovado pelo Decreto-Lei n.º 32659, de 9 de fevereiro de 1943, que já estabelecia as referidas regras, sucessivamente mantidas no artigo 47.º do Estatuto Disciplinar dos Funcionários e Agentes da Administração Central, Regional e Local aprovado pelo Decreto-Lei n.º 191-D/79, de 25 de junho, no artigo 48.º do Estatuto Disciplinar dos Funcionários e Agentes da Administração Central, Regional e Local aprovado pelo Decreto-Lei n.º 24/84, de 16 de janeiro, e no artigo 31.º do Estatuto Disciplinar dos Trabalhadores da Administração Pública aprovado pela Lei n.º 58/2008, de 9 de setembro.
3. O regime legal sobre apensação de processos relativos a uma pluralidade de infrações não punidas eventualmente cometidas por um trabalhador relaciona-se com a regra da unidade de sanção disciplinar em caso de acumulação de infrações apreciadas num único processo ou em processos apensos, consagrada no sistema normativo português desde o Código Administrativo aprovado pelo Decreto-Lei n.º 31095, de 31-12-1940 (artigo 569.º).
4. A destrinça entre unidade e pluralidade de infrações integra a teoria geral da infração disciplinar e conforma o procedimento disciplinar, impondo, nomeadamente, que cada infração disciplinar noticiada seja objeto de apreciação especificada, apesar de as indagações, recolhas de provas e decisões sobre uma pluralidade de infrações poderem ser desenvolvidas no mesmo processo e este culminar num único ato administrativo sancionatório.
5. O artigo 180.º, n.º 3, da LTFP compreende duas previsões sobre temas independentes:
a) Cada infração una apenas pode determinar a aplicação de uma sanção disciplinar;
b) Relativamente às infrações acumuladas apreciadas num único processo ou em processos apensos também deverá ser aplicada uma única sanção disciplinar.
6. A regra de apensação prescrita no n.º 2 do artigo 199.º da LTFP reporta-se exclusivamente a pluralidade de infrações não punidas, sendo independente do princípio non bis in idem do qual decorre a obrigatoriedade de arquivamento de um processo quando sejam instaurados dois processos relativos a uma única infração, por inadmissibilidade de duplo procedimento disciplinar pela mesma infração.
7. A individualidade de cada infração disciplinar é, nomeadamente, relevante para efeitos da prescrição atualmente prevista no artigo 178.º, n.º 1, da LTFP.
8. Ao nível do direito disciplinar público substantivo a prática de duas infrações pelo mesmo trabalhador pode configurar:
a) Sucessão de infrações, quando a segunda infração é praticada depois de o agente ter sido punido pela anterior; ou
b) Acumulação de infrações, quando as duas infrações foram cometidas antes de qualquer delas ter sido sancionada.
9. A sucessão de duas infrações pode fazer operar uma circunstância agravante especial da sanção aplicável à infração posterior quando:
a) A infração posterior foi cometida durante o cumprimento de sanção disciplinar ou enquanto decorria o período de suspensão da sanção disciplinar aplicada à infração anterior (artigo 191.º, n.º 1, alínea e), da LTFP); ou
b) A infração posterior foi cometida antes de decorrido um ano sobre o dia em que tinha findado o cumprimento de sanção disciplinar aplicada por virtude da infração anterior (artigo 191.º, n.º 1, alínea f), e n.º 3, da LTFP).
10. Independentemente de se encontrar preenchida uma das duas circunstâncias agravantes especiais referidas na conclusão precedente, a sucessão de duas infrações deve dar origem a pluralidade de sanções disciplinares.
11. A acumulação de infrações constitui uma circunstância agravante especial suscetível de se repercutir na escolha da espécie e medida concreta da sanção disciplinar, por força do disposto no artigo 191.º, n.º 1, alínea g), e n.º 4, da LTFP.
12. A operatividade da circunstância agravante especial prevista no artigo 191.º, n.º 1, alínea g), da LTFP está dependente de as várias infrações acumuladas serem apreciadas no mesmo processo ou processos apensos, repercutindo-se na sanção disciplinar única aplicada a todas as infrações disciplinares abrangidas pela decisão proferida ao abrigo do artigo 180.º, n.º 3, da LTFP.
13. A opção de política legislativa em matéria disciplinar expressa no artigo 180.º, n.º 3, da LTFP sobre sanção disciplinar única para determinados casos de acumulação de infrações integra o tratamento da acumulação de infrações disciplinares como circunstância agravante especial e faz depender a sanção disciplinar única de uma condição processual contingente (que as infrações sejam apreciadas num único processo ou em processos apensos).
14. No processo disciplinar, a apreciação das várias infrações acumuladas com vista à aplicação de uma sanção única faz operar uma circunstância agravante especial e pode determinar uma sanção única concreta mais grave (no plano qualitativo ou quantitativo) do que a que resultaria da aplicação de sanções autónomas para cada infração.
15. Diferentemente, no regime penal atualmente em vigor sobre cúmulo jurídico a pena conjunta é uma solução mais favorável para o agente do que a adição material de penas parcelares, já que não altera a natureza das várias penas parcelares e a respetiva moldura situa-se entre a pena parcelar mais grave concretamente aplicada e a soma de todas as penas parcelares, nunca podendo ultrapassar este limite.
16. A unidade de sanção disciplinar para infrações acumuladas objeto do mesmo processo ou processos apensos é independente do princípio non bis in idem, não existindo nenhuma proibição constitucional de adição material de sanções disciplinares aplicadas a diferentes infrações disciplinares praticadas pelo mesmo trabalhador (quer se trate de uma sucessão de infrações ou de uma acumulação de infrações objeto de processos autónomos).
17. O princípio da adequação formal, reconhecido ao nível do direito disciplinar público nomeadamente pelo n.º 1 do artigo 201.º da LTFP, visa flexibilizar a tramitação do processo, conformando-a pelas exigências de concordância prática axiologicamente fundamentada dos valores ponderados no caso concreto, em particular o interesse e necessidade de aperfeiçoamento progressivo do serviço público e o respeito dos princípios essenciais do procedimento disciplinar como o direito ao contraditório.
18. As decisões sobre a apensação de processos proferidas ao abrigo do artigo 199.º, n.º 2, da LTFP envolvem uma margem de valoração, ao abrigo do princípio da adequação formal, podendo determinar uma decisão de não apensação, desde que se fundamente o ato em concretos e especificados inconvenientes para a administração da justiça disciplinar.
19. O princípio da adequação formal que conforma a ponderação dos inconvenientes para a administração da justiça disciplinar da apensação de processos em determinados casos é incompatível com enunciações taxativas de motivos de recusa, cuja apreciação deve ser conformada pelos princípios da proporcionalidade, justiça e razoabilidade.
20. Em face das circunstâncias do caso concreto, a decisão de não apensação de processos pode, designadamente, ser legitimada por:
a) Riscos para efetividade da responsabilidade disciplinar derivados dos prazos de prescrição da infração disciplinar ou do procedimento disciplinar (artigo 178.º, n.os 1 e 5 da LTFP);
b) Perigo de se atingir o termo dos prazos de caducidade da decisão disciplinar (artigo 220.º, n.º 6, da LTFP);
c) Impacto negativo para o serviço, descoberta da verdade ou direitos do trabalhador quando foi aplicada medida cautelar de suspensão preventiva (artigo 211.º da LTFP); ou
d) Retardamento excessivo do procedimento relativo a uma infração mais grave e consequente lesão de exigências específicas de proteção da capacidade funcional da Administração.
21. A LTFP não regula nem proíbe a separação de processos disciplinares apensos ao abrigo do artigo 199.º, n.º 2, desse diploma.
22. O artigo 30.º, n.º 1, alíneas a) e b), do Código de Processo Penal é subsidiariamente aplicável, com as necessárias adaptações, aos processos disciplinares apensos ao abrigo do artigo 199.º, n.º 2, da LTFP, podendo, oficiosamente ou a requerimento do trabalhador, ser ordenada a separação de algum ou alguns processos apensos sempre que:
a) Houver na separação um interesse ponderoso e atendível do trabalhador, nomeadamente no não prolongamento da suspensão preventiva; ou
b) A manutenção da apensação puder representar um grave risco para a administração da justiça disciplinar.
23. Ocorrendo separação de processos, o termo inicial do prazo de prescrição do procedimento disciplinar separado, previsto no artigo 178.º, n.º 5, da LTFP, é a data da instauração originária do respetivo processo apenso entretanto objeto de separação ou, caso não tenha havido instauração autónoma, a data em que foi junta a primeira notícia dessa infração ao processo principal ou a um processo apenso.