Pareceres PGR

Parecer do Conselho Consultivo da PGR
Nº Convencional: PGRP00003110
Parecer: CA00042010
Nº do Documento: PCA1609201000400
Descritores: CONTRATO DE AQUISIÇÃO DE EQUIPAMENTO MILITAR
CONTRATO DE CONTRAPARTIDAS
CLÁUSULA CONTRATUAL
TRIBUNAL ARBITRAL
CLÁUSULA PENAL
INVALIDADE PROCEDIMENTAL
ACTO PRÉ-CONTRATUAL
ADJUDICAÇÃO
INVALIDADE DO CONTRATO
INDEMNIZAÇÃO
INCUMPRIMENTO DO CONTRATO
REDUÇÃO DO NEGÓCIO JURÍDICO
PROVIDÊNCIA CAUTELAR
CONTENCIOSO ADMINISTRATIVO
Livro: 00
Numero Oficio: S/N
Data Oficio: 05/25/2010
Pedido: 05/27/2010
Data de Distribuição: 05/27/2010
Relator: MANUELA FLORES
Sessões: 01
Data da Votação: 09/16/2010
Tipo de Votação: UNANIMIDADE
Sigla do Departamento 1: MDN
Entidades do Departamento 1: GABINETE DO SR.MINISTRO
Posição 1: HOMOLOGADO
Data da Posição 1: 05/30/2011
Privacidade: [01]
Data do Jornal Oficial: 07-07-2011
Nº do Jornal Oficial: 129
Nº da Página do Jornal Oficial: 28636
Indicação 2: ASSESSOR: MARIA JOSÉ RODRIGUES
Área Temática:DIR ADM * ADM PUBL / DIR CIV * TEORIA GERAL * DIR OBG * CONTRATOS / DIR COM / DIR ECON * DIR CONC
Ref. Pareceres:P000042010Parecer: P000042010
Legislação:L 31/86 DE 1986/08/29; CPA ART188 ; RCM 14/98 DE 1998/01/30 ; RCM 100/99 DE 1999/09/01 ; CCIV66 ART810 811 N2 ART292 ; DESP CONJ 325/2002 DE 2002/03/27 ; CPA ART180 ART185 ART134 ; RCM 67/2003 DE 2003/05/05 ; CPTA ART112 N2 ART132
Direito Comunitário:
Direito Internacional:
Direito Estrangeiro:
Jurisprudência:
Documentos Internacionais:
Ref. Complementar:
Conclusões: Em face do exposto, mantém-se o que se disse e concluiu no parecer principal, o parecer n.º 4/2010, de 4 de Maio de 2010.

Texto Integral:




Senhor Ministro da Defesa Nacional,
Excelência:





I


Dignou-se Vossa Excelência solicitar esclarecimentos complementares ao parecer n.º 4/2010, de 4 de Maio de 2010, deste Conselho Consultivo[1], após uma análise cuidada do seu teor e tendo em consideração a complexidade da matéria em causa[2] [3].

Cumpre, assim, emitir parecer complementar.

II


Antes do mais, impõe-se indicar o enquadramento dos esclarecimentos pretendidos que é feito na exposição que acompanhou o pedido de esclarecimentos e que, como ali se refere, optou «por identificar, prévia e sumariamente, as questões colocadas ao Conselho Consultivo da Procuradoria-Geral da República no pedido de parecer e as conclusões a que o mesmo chegou».

Assim:

«No primeiro bloco de questões colocadas ao Conselho Consultivo da Procuradoria-Geral da República (adiante CC da PGR) sobre a "Eventual invalidade de algumas cláusulas do Contrato de Contrapartidas e do Contrato de Aquisição" foram suscitadas dúvidas relativas à:
a) "Competência do Tribunal Arbitral" (validade da Cláusula 55.ª do Contrato de Aquisição e da Cláusula 30.ª do Contrato de Contrapartidas); e
b) "Limitação dos direitos do Estado Português em caso de incumprimento definitivo do Contrato de Contrapartidas" (validade das Cláusulas 18.ª e 19.ª do Contrato de Contrapartidas).
Relativamente à questão identificada na alínea a) supra, o CC da PGR conclui que:

"Face ao disposto nos artigos 1.º, n.º 1 e 4 da Lei n.º 31/86, de 29 de Agosto [geralmente designada por Lei da Arbitragem Voluntária (LAV)], 188.º do Código de Procedimento Administrativo (CPA) e 180.º do CPTA, a cláusula 55.ª do Contrato de Aquisição e a cláusula 30.ª do Contrato de Contrapartidas (…) são válidas"; ou seja, entre outros aspectos, entende o CC da PGR não haver violação do Programa Relativo à Aquisição dos Submarinos (adiante PRAS), aprovado pela Resolução do Conselho de Ministros (RCM) n.º 14/98, de 30 de Janeirox.
O CC da PGR alega que: é o próprio PRAS a admitir a possibilidade de se recorrer à arbitragem através da alínea j) do artigo 38.º PRAS, na redacção dada pela RCM n.º 100/99, de 1 de Setembro.
Conclui ainda que: "A arbitragem é, portanto, admissível, estando apenas vedada ao tribunal arbitral analisar questões de invalidade dos contratos que sejam consequência de invalidades procedimentais (invalidade derivada ou consequente)".
Acrescenta que: as cláusulas dos contratos em causa não esgotam a utilidade do artigo 54.º do PRASx1 que sempre se aplicará (i) aos litígios decorrentes da própria execução do programa, (ii) a questões de contencioso pré-contratual, e (iii) à hipótese de anulação da sentença arbitral.

Esclarecimentos complementares:

i) Em primeiro lugar, se o litígios emergentes "de invalidade dos contratos que sejam consequência de invalidades procedimentais (invalidade derivada ou consequente)" estão subtraídos à arbitragem, as cláusulas 30.ª e 55.ª dos contratos ao sujeitarem a arbitragem todas as questões relativas a sua invalidade não violam as disposições legais que vedam a submissão de litígios pré-contratuais a arbitragem?
ii) No nosso entender o artigo 54.º do PRAS, na parte referente à resolução de litígios relativos à execução do(s) contrato(s) celebrado(s), não é posto em crise pela alínea j) do artigo 38.ºx2. Assim, questiona-se:
• Porque é que o artigo 54.º do PRAS não mantém, para o CC da PGR, utilidade na parte em que prescreve que "Em caso de litígio de qualquer situação resultante da execução (...) do contrato celebrado (…) o foro competente é a comarca de Lisboa"; e
• Como se articula este artigo do PRAS com as cláusulas dos contratos que submetem os "litígios derivados ou relacionados com o (…) Contrato de Contrapartidas, designadamente, questões de (…) execução" ao tribunal arbitral.
iii) Os esclarecimentos supra são, a nosso ver, (ainda mais) pertinentes se tivermos em consideração que, o PRAS consubstancia, no nosso entender, o que tradicionalmente é designado por "lei do concurso". A não ser assim teríamos de concluir que, in casu, não houve programa de concurso. Neste sentido, o PRAS poderia ser considerado lei especial (nos termos do artigo 1.º, n.º 1 da LAVx3), excluindo-se os litígios aí previstos de resolução arbitral?

Admitindo, como parece ser o entendimento do CC da PGR, que o recurso a arbitragem é um mecanismo de resolução de litígios paralelo ao dos tribunais judiciais, os pedidos de esclarecimentos supra solicitados são importantes, para que o Estado, caso venha a necessitar recorrer a arbitragem, esteja totalmente elucidado quanto aos litígios passíveis de resolução por via arbitral e quais os que devem ser submetidos a Tribunal.

Em relação à questão identificada na alínea b) supra, relativa à validade das cláusulas 18.ª e 19.ª do Contrato de Contrapartidas, o CC da PGR entende que: o "(…)normativo nacional, inclusive o mais recente, bem como pelos textos comunitários e por alguns exemplos estrangeiros, [serve] para mostrar que as soluções consagradas nas cláusulas 18.ª e 19.ª do Contrato de Contrapartidas se inserem naquilo que habitualmente é estipulado ou regulado".

O CC da PGR concluiu que: o Contrato de Contrapartidas é um contrato administrativo e, portanto, sujeito ao regime estipulado, à data, no artigo 185.º do CPA, mais especificamente ao disposto da alínea b), do n.º 3, que remete para o regime de invalidade do negócio jurídico previsto do Código Civil (adiante CC), defendendo desta forma a aplicação do disposto no artigo 810.º do CC, ou seja, que as partes podem fixar por acordo o montante da indemnização exigível.
Acrescenta que: "Pode naturalmente questionar-se se as partes estabelecem uma pena simbólica que corresponda no fundo à eliminação da responsabilidade ou (…) se são cumpridas os princípios da legalidade e da proporcionalidade". Mas, no seu entender a estipulação de contrapartidas implica um acréscimo no preço da aquisição. "Daí que a indemnização pelo incumprimento das contrapartidas deve obviamente ter esse acréscimo em consideração. Isto é, no caso de incumprimento, o Estado deverá ser indemnizado por forma a que o eventual acréscimo do preço no contrato de aquisição seja recuperado".
Conclui, assim, que as cláusulas 18.ª e 19.ª do Contrato de Contrapartidas são válidas.

Esclarecimentos complementares:

No nosso entender, e salvo o devido respeito, o CC da PGR analisou a questão da (in)validade das cláusulas 18.ª e 19.ª do Contrato de Contrapartidas sem a abrangência com que a mesma foi colocada, limitando-se a constatar, face à redacção do artigo 810.º do CC, a possibilidade (legal) da estipulação de uma cláusula penal. No entanto, se é verdade que a autonomia privada pode intervir no domínio da responsabilidade civil, também o é o facto de essa liberdade não ser absoluta. Assim:
i) Os 10% acordados na cláusula 18.°, a título de cláusula penal, não se inserem, no nosso entender, naquilo que habitualmente é regulado. Basta atentar, a título meramente exemplificativo, no regime de contrapartidas em vigor à data da celebração do contrato de Contrapartidasx4 (despacho conjunto n.° 325/2002, de 27 de Marçox5), assim como no disposto no Enquadramento Contratual das Contrapartidas, assinado em 6 de Novembro de 2000, pelos concorrentes e a Comissão do PRAS (junto como DOC. 8 ao pedido de parecer e cuja versão assinada se junta como DOC. 1)x6.
ii) O facto de o valor da cláusula penal cobrir, alegadamente, (e apenas) o acréscimo no preço da aquisição do equipamento militar, foi uma das razões que nos levou a questionar se esse valor (simbólico) equivale à inexistência de uma verdadeira sanção em caso de incumprimento do Contrato de Contrapartidasx7 (i.e. se o Estado antecipadamente não renunciou aos seus direitos), até porque o consórcio fornecedor, na prática, não se vê compelido a cumprir as suas obrigações.
iii) Este entendimento é reforçado pelo facto de a cláusula 19.ª (limite máximo da responsabilidade) limitar a responsabilidade ao pagamento das penalidades previstas nas cláusulas antecedentes, excluindo a possibilidade de o Estado exigir o pagamento de qualquer outra indemnização, seja a que título for, bem como o pagamento de danos excedentes, mesmo em caso de incumprimento de outras obrigações que não as operações de contrapartidas.
iv) A questão que se colocou, e coloca, é a de saber se estas cláusulas não são, efectivamente, limitativas da responsabilidade. Aliás, não nos podemos esquecer que a cláusula 18.ª do Contrato de Contrapartidas prescreve uma penalização igual para os casos de dolo e negligência.
v) Assim, tendo em conta o acima exposto nos pontos i) a iv), e que estamos perante um contrato administrativo, com as inerentes consequências, as ditas cláusulas, no seu conjunto, protegem o interesse público? Não consubstanciam uma violação do princípio da proporcionalidade?

2. No bloco seguinte de questões colocadas ao CC da PGR sobre a "Eventual invalidade do Contrato de Contrapartidas" foram, genericamente, enunciadas as seguintes dúvidas:
a) Se, em virtude da existência de pré-contrapartidas fictícias, o Contrato de Contrapartidas padecia de alguma invalidade. Em caso afirmativo, que invalidade estava em causa (erro na formação da vontade), qual o prazo para sua arguição e quais as suas consequências?
b) Se o Estado poderia, antes do trânsito em julgado do processo criminal em curso, questionar judicialmente a eventual invalidade do Contrato de Contrapartidas.
c) Quais os meios processuais (normais e urgentes) que Estado poderia utilizar para questionar uma eventual invalidade do Contrato de Contrapartidas, e qual o Tribunal Competente?
O CC da PGR defendeu no seu parecer que: "nos contratos precedidos de procedimento concursal o erro na formação da vontade ou na declaração da vontade estará praticamente afastado."
Em função disso, apreciam a questão da (in)validade do Contrato de Contrapartidas sob uma perspectiva distinta: invalidade de actos pré-contratuais e seus efeitos nesse contrato. O CC da PGR concluiu existir: (i) um acto pré-contratual anulável (acto de adjudicação que entretanto se convalidou na ordem jurídica); e (ii) um acto pré-contratual nulo (deliberação da Comissão Permanente de Contrapartidas — adiante CPC — que, em 20 de Abril de 2004, aprovou todos os projectos de contrapartidas a incluir no Contrato de Contrapartidasx8 e cuja arguição não está sujeita a prazo).
Assim, segundo o CC da PGR: a nulidade da deliberação da CPC determinaria uma invalidade consequente ou derivada do Contrato de Contrapartidas, que se apresentava como uma invalidade parcial (cláusulas 4.ª, n.° 5, 20.ª, n.° 1 e Anexo II).
"Com efeito, face à sua relação com o contrato de aquisição (...)", entende o CC da PGR que "(...) o caminho será expurgar o Contrato de contrapartidas do que seja ilegal (artigo 292.º do CC aplicável ex vi alínea b) do n.º 3 do art.º 185 do CPA)."
De acordo com o CC da PGR: será necessário proceder à declaração de nulidade da deliberação da CPC, a qual pode ser obtida por duas vias: (i) instauração de acção administrativa especial pelo Estado (o Ministério Público tem legitimidade para propor esta acção); ou (ii) declaração do órgão administrativo que aprovou a deliberação, a CPC (n.° 2 do artigo 134.° do CPA).
Assim, deveria "o contrato ser objecto de redução com a declaração de nulidade e redução das cláusulas referidas e do Anexo II na parte em que consideram os projectos 2.2.2, 2.1.4., 2.1.5, 2.1.9. e 2.1.14." (negrito e sublinhado nosso)x9.
O CC da PGR conclui ainda que: "se for declarada a nulidade da deliberação da CPC e tal não for impugnado, do ponto de vista administrativo ficará resolvido que aqueles projectos não podiam ser aprovados e tudo se passará como não tendo sido, com as consequentes implicações no Contrato de Contrapartidas".
Assim, segundo o CC da PGR: as eventuais divergências quanto às implicações no Contrato de Contrapartidas terão que ser dirimidas pelo tribunal arbitral.
Quanto à invocação da nulidade da deliberação da CPC antes do trânsito em julgado do processo penal, o CC da PGR parece defender que: tal nulidade é passível de ser invocada antes do trânsito em julgado do processo penal, ainda que, se o for no âmbito do processo administrativo, seja necessário fazer prova de que "os projectos em questão não preenchiam os requisitos necessários"x10. Porém, o CC da PGR admite que, no âmbito do Tribunal Arbitral, o consórcio fornecedor possa contestar que as contrapartidas sejam fictícias, o que poderia determinar a suspensão da arbitragem para apreciacão da factualidade em causa no processo-crime.
Por último, quanto à questão sobre os meios processuais urgentes, o CC da PGR afirma que: "a arbitragem não obstaculiza o recurso a procedimentos cautelares, porém, face aos elementos disponíveis não vemos em que se deveriam traduzir".

Esclarecimentos complementares:

Face às conclusões apresentadas pelo CC da PGR, o Estado tem, neste momento, algumas incertezas quanto: a) à necessidade de adoptar algumas das medidas indicadas, como hipóteses, no parecer do CC da PGR, para defesa do interesse público; b) à actuacão que deve seguir para melhor proteger esse interesse; e c) às consequências práticas dessa actuação. Assim:
i) Em primeiro lugar, estando em causa uma invalidade consequente ou derivada do Contrato de Contrapartidas, porque razão o CC da PGR defende a aplicação da alínea b) do n.° 3 do artigo 185.° do CPA (invalidades originárias) em detrimento do n.° 1 deste mesmo preceito (invalidades derivadas), concluindo, consequentemente, pela invalidade parcial do Contrato de Contrapartidas e pela necessidade da sua redução? A aplicação do disposto no artigo 185.°, n.° 1 não determinaria a nulidade do Contrato de Contrapartidas?
ii) Em segundo lugar, e sem prejuízo do sentido da resposta à questão antecedente, o CC da PGR parece defender que a declaração de nulidade determinaria a invalidade parcial do Contrato de Contrapartidas, com a consequente redução das "cláusulas viciadas". Por outro lado, parece também defender que, após ser declarada a nulidade da deliberação da CPC (quer pela própria CPC, quer pelo Tribunal Administrativo), "as eventuais divergências quanto às implicações no Contrato de Contrapartidas terão que ser dirimidas pelo tribunal arbitral". Assim:

• Quais as consequências práticas, ou seja, o efeito útil da declaracão de nulidade quando a não aceitação pelo consórcio fornecedor sempre "obrigaria" o Estado a recorrer a tribunal arbitral?
• A questão antecedente assume maior relevo caso a
declaração de nulidade seja decretada pelo Tribunal
Administrativo. Não fica a sentença do Tribunal
Administrativo "esvaziada" por essa "obrigatoriedade"?
• Em concreto, como se opera a redução do contrato e a expurgação das"cláusulas viciadas"?
iii) Quanto à eventual invocação da invalidade (parcial) do contrato antes do trânsito em julgado do processo criminal, questiona-se:
• A eventual impugnação, pelo consórcio fornecedor, da declaração de nulidade da deliberação da CPC não tem de ser pedida, obrigatoriamente, no Tribunal Administrativo (e não no Tribunal Arbitral como refere o CC da PGR)x11.
• Como é que o CC da PGR defende que o Estado possa invocar a nulidade da deliberação da CPC antes do trânsito em julgado do processo penal e, ao mesmo tempo, admite que se possa invocar a nulidade da deliberação da CPC em sede arbitral, o que implicaria, necessariamente, a sua apreciação pelo Tribunal Penal?
iv) Qual o procedimento cautelar que permite ao Estado obter, provisoriamente, a declaração judicial da nulidade da deliberação da CPC, ainda que o CC da PGR possa concluir que não existem fundamentos para se avançar nesse sentido.
v) Se "o orgão administrativo pode declarar a nulidade do acto, não fazendo qualquer sentido nessa perspectiva ponderar a propositura de qualquer mecanismo judicial" deve o Estado optar pela declaração de nulidade, via CPC? Porque razão?

3. No bloco terceiro de questões colocadas ao CC da PGR relativas ao "Eventual incumprimento do contrato de contrapartidas" questionou-se se o cumprimento defeituoso e/ou incumprimento definitivo do Contrato de Contrapartidas permitiria ao Estado exigir a sua modificação ou, no limite, a sua resolução?
O CC da PGR entende que: as pré-contrapartidas fictícias determinam a invalidade parcial do Contrato de Contrapartidas, parecendo não admitir que tal determine qualquer incumprimento desse contrato.
Assim, a possibilidade de modificação do Contrato de Contrapartidas é apenas abordada como consequência directa da nulidade da deliberação da CPC, admitindo-se essa modificação, ou melhor, a substituição das operações de contrapartidas em causa através da aplicação da cláusula 10.ª (modificação e substituição de operações de contrapartida) do Contrato de Contrapartidas.
Quanto ao direito de resolução do Contrato de Contrapartidas, o CC da PGR analisa-o, exclusivamente, na perspectiva contratual da mora e do incumprimento definitivo. Este último apenas ocorre quando se esgotam os prazos contratuais (cfr. cláusula 16.ª) e determina somente a aplicação da cláusula penal (cláusula 18.ª).
Face a tal entendimento, o CC da PGR parece defender que em momento algum assiste ao Estado o direito de resolução do contrato.
Igualmente "(…) haveria que analisar a possibilidade de modificação unilateral, como aliás da rescisão por imperativos de interesse público, já que haveria que apurar se no caso o Estado apenas está investido dos poderes públicos ali referidos ou se está investido, em geral, de todos os poderes públicos do artigo 180.º CPA".

Esclarecimentos complementares:

i) A existência de pré-contrapartidas fictícias é uma situação imputável ao consórcio fornecedor. A cláusula 10.ª do Contrato de Contrapartidas prevê um mecanismo de substituição de contrapartidas que depende da iniciativa e/ou disponibilidade do consórcio fornecedor. Como é que se conclui pela aplicação (automática) desta cláusula à situação em concreto?
ii) O CC da PGR defende que a redução do Contrato de Contrapartidas, em virtude da declaração de nulidade da deliberação da CPC, deve operar por via da aplicação desta cláusula 10.ª? Em que medida?
iii) Não assiste ao Estado nenhum mecanismo que permita impor ao consórcio fornecedor a substituição das pré- contrapartidas fictícias e a consequente modificação (redução) do Contrato de Contrapartidas?
iv) Caso seja declarada a nulidade da deliberação da CPC e as pré-contrapartidas fictícias se considerem não cumpridas na data da assinatura do Contrato de Contrapartidas, tal não determina o incumprimento definitivo dessas operações de contrapartidas?
v) A existência de pré-contrapartidas fictícias não permite (independentemente da resposta à questão antecedente) resolver o Contrato de Contrapartidas por justificada perda de interesse na continuação da relação contratual em virtude da quebra de confiança entre as partes (justa causa)?
vi) Assiste ao Estado o poder de modificar unilateralmente o Contrato de Contrapartidas e/ou de resolver o mesmo por questões de interesse público, ao abrigo do artigo 180.º do CPA?
vii) O CC da PGR defende, efectivamente, que o Estado não pode resolver o Contrato de Contrapartidas? Em caso afirmativo, tal não consubstancia uma renúncia antecipada aos seus direitos?

4. No último bloco de questões foi abordada a relação existente entre o Contrato de Aquisição e Contrato de Contrapartidas, questionando-se principalmente se a modificação e/ou a resolução do Contrato de Contrapartidas teria ou não consequência no Contrato de Aquisição.
A estas questões o CC da PGR responde com a aplicação da cláusula 22.ª do Contrato de Contrapartidas que estipula a acessoriedade deste em relação ao Contrato de Aquisição, assim defendendo que não há consequências na execução do Contrato de Aquisição decorrentes da execução do Contrato de Contrapartidas.

Esclarecimentos complementares:

No nosso entendimento, o CC da PGR respondeu apenas sobre a possibilidade de a execução do Contrato de Contrapartidas se repercutir na execução do Contrato de Aquisição, quando as questões colocadas tinham outra amplitude. Acresce que, a cláusula 22.ª ao estipular que (i) a extinção do Contrato de Aquisição, por forma diferente do cumprimento, determina a extinção automática do Contrato de Contrapartidas; e que, (ii) apesar deste último facto, tal não determina a extinção dos contratos acessórios celebrados entre o consórcio fornecedor e os beneficiários das contrapartidas, não permite responder às questões que foram colocadas no pedido de parecer.
Assim, e em caso de resposta afirmativa aos esclarecimentos complementares colocados em v), vi) e vii) do bloco anterior, a extinção do Contrato de Contrapartidas (nomeadamente, através de resolução) não teria consequências na subsistência do Contrato de Aquisição?»

III


Importa, agora, ensaiar a resposta aos esclarecimentos pretendidos.

1. No que concerne ao primeiro grupo de questões analisado no Parecer n.º 4/2010 (doravante o parecer principal) – «eventual invalidade de algumas cláusulas do Contrato de Contrapartidas e do Contrato de Aquisição» –, comecemos, então, pelos esclarecimentos sobre a competência do tribunal arbitral.
1.1. O primeiro esclarecimento solicitado é, recorde-se, o seguinte:

«i) Em primeiro lugar, se o litígios emergentes "de invalidade dos contratos que sejam consequência de invalidades procedimentais (invalidade derivada ou consequente)" estão subtraídos à arbitragem, as cláusulas 30.ª e 55.ª dos contratos ao sujeitarem a arbitragem todas as questões relativas a sua invalidade não violam as disposições legais que vedam a submissão de litígios pré-contratuais a arbitragem?»

Afigura-se-nos ser, desde já, de notar que a propósito deste primeiro esclarecimento, bem como, aliás, dos restantes, são feitas, na exposição anexa ao pedido de esclarecimentos, referências isoladas à fundamentação do parecer principal e/ou às suas conclusões, o que naturalmente não pode dispensar a análise de todo o desenvolvimento ali efectuado.

Mas, atentando nas cláusulas compromissórias dos contratos de aquisição e de contrapartidas, uma vez que se reportam aos litígios emergentes dos contratos e não fazem sequer qualquer alusão aos litígios atinentes aos actos pré-contratuais, não se vislumbra fundamento para considerar que violam qualquer disposição legal.

1.2. Veja-se o seguinte esclarecimento pretendido:

«ii) No nosso entender o artigo 54.º do PRAS, na parte referente à resolução de litígios relativos à execução do(s) contrato(s) celebrado(s), não é posto em crise pela alínea j) do artigo 38.º Assim, questiona-se:
• Porque é que o artigo 54.º do PRAS não mantém, para o CC da PGR, utilidade na parte em que prescreve que "Em caso de litígio de qualquer situação resultante da execução (...) do contrato celebrado (…) o foro competente é a comarca de Lisboa"; e
• Como se articula este artigo do PRAS com as cláusulas dos contratos que submetem os "litígios derivados ou relacionados com o (…) Contrato de Contrapartidas, designadamente, questões de (…) execução" ao tribunal arbitral.»

Este pedido de esclarecimento parte de um entendimento ("no nosso entender") diferente do desenvolvido no parecer principal, o que é, com certeza legítimo, mas não traduzirá ambiguidade ou obscuridade do parecer principal.

Conforme se refere no parecer principal, o artigo 54.º do PRAS teria o seu campo de aplicação, não estando dele excluída a execução das próprias decisões arbitrais (no que haveria de considerar o que resulta da lei – cfr. artigo 30.º da LAV e também, à data da celebração dos contratos, o artigo 181.º, n.º 2, do CPTA[4]).

Mas daquele artigo 54.º não resulta nem poderia resultar a exclusão da arbitragem.

As Resoluções do Conselho de Ministros podem ter natureza regulamentar, como, no caso vertente, a terão as Resoluções que aprovaram e alteraram o PRAS[5].

Assim, e independentemente da natureza da inserção do artigo 54.º no PRAS[6], as resoluções não podem ser consideradas lei especial para efeitos do n.º 1 do artigo 1.º da LAV.

Aliás, de acordo com alínea p) do n.º 1 do artigo 165.º da Constituição da República Portuguesa, tal matéria é da competência reservada da Assembleia da República.

Por fim, recorde-se, é o próprio PRAS que admite a arbitragem.

Portanto, os contratos podiam estabelecer cláusulas compromissórias.

1.3. Do que acaba de dizer-se, resultará já a resposta ao pedido de esclarecimento que se segue e cujo teor é:

«iii) Os esclarecimentos supra são, a nosso ver, (ainda mais) pertinentes se tivermos em consideração que, o PRAS consubstancia, no nosso entender, o que tradicionalmente é designado por "lei do concurso". A não ser assim teríamos de concluir que, in casu, não houve programa de concurso. Neste sentido, o PRAS poderia ser considerado lei especial (nos termos do artigo 1.º, n.º 1 da LAV), excluindo-se os litígios aí previstos de resolução arbitral?»

Repete-se o PRAS não pode ser considerado lei especial.

A este entendimento será, como se disse supra, indiferente o estar ou não o artigo 54.º do PRAS inserido no que tradicionalmente se designa por lei do concurso[7], pois, mesmo que assim fosse, no caso, a lei do concurso não poderá ser qualificada como lei especial para efeitos do n.º 1 do artigo 1.º da LAV.

1.4. Em suma, mantém-se tudo o que se explanou e concluiu no parecer principal sobre a validade das cláusulas 55.ª do Contrato de Aquisição e 30.ª do Contrato de Contrapartidas.

2. Atentemos de seguida nos pretendidos esclarecimentos sobre a validade das cláusulas 18.ª e 19.ª do Contrato de Contrapartidas.

A colocação desses esclarecimentos é antecedida dos seguintes dizeres:

«No nosso entender, e salvo o devido respeito, o CC da PGR analisou a questão da (in)validade das cláusulas 18.ª e 19.ª do Contrato de Contrapartidas sem a abrangência com que a mesma foi colocada, limitando-se a constatar, face à redacção do artigo 810.º do CC, a possibilidade (legal) da estipulação de uma cláusula penal. No entanto, se é verdade que a autonomia privada pode intervir no domínio da responsabilidade civil, também o é o facto de essa liberdade não ser absoluta.»

Ora, será pertinente lembrar que não cabe ao Conselho Consultivo a averiguação de matéria de facto.

E deverá acrescentar-se que, nem aquando da elaboração do parecer principal, nem presentemente, nos foi dado a conhecer, designadamente, quais as reais implicações das contrapartidas no preço no contrato de aquisição – apenas é referenciado que terá havido um acréscimo no preço ente 5% e 15%.

Deve ainda referir-se que no parecer principal o excurso pelo normativo nacional – mesmo que não aplicável ao caso em apreço –, bem como pelos textos comunitários e alguns exemplos estrangeiros visaram apenas mostrar que a solução habitual é a estipulação duma cláusula penal ("penalidades"), fixando-se uma percentagem do valor contratado.

2.1. O texto do primeiro esclarecimento solicitado sobre as cláusulas 18.ª e 19.ª do Contrato de Contrapartidas é o seguinte:

«i) Os 10% acordados na cláusula 18.ª, a título de cláusula penal, não se inserem, no nosso entender, naquilo que habitualmente é regulado. Basta atentar, a título meramente exemplificativo, no regime de contrapartidas em vigor à data da celebração do contrato de Contrapartidas (despacho conjunto n.° 325/2002, de 27 de Março), assim como no disposto no Enquadramento Contratual das Contrapartidas, assinado em 6 de Novembro de 2000), pelos concorrentes e a Comissão do PRAS (junto como DOC. 8 ao pedido de parecer e cuja versão assinada se junta como DOC. 1).»

Mais uma vez, este ponto traduz um entendimento diferente.

Mas vejamos, entende-se que não é possível estipular uma cláusula penal no que respeite a contrapartidas em aquisição de material de defesa?

Parece que não.

Então a divergência estará no valor fixado. E nesse sentido são convocados o despacho n.º 325/2002 e o Enquadramento Contratual das Contrapartidas.

O despacho n.º 325/2002, como melhor se enquadra no parecer principal não é de considerar na questão em apreço – cfr. o PRAS, que nada define quanto ao valor das cláusulas penais.

Quanto ao designado Enquadramento Contratual das Contrapartidas[8], impõe-se, desde logo, dizer que posteriormente se seguiram negociações e em especial houve o impacte no procedimento em virtude da Resolução do Conselho de Ministros n.º 67/2003 (ajustamentos das BAFO). Assim não se vê que apoio se poderá retirar daquele documento, que tem natureza meramente contratual e não pode prevalecer sobre o Contrato de Contrapartidas.

Mas atentemos no ponto 10 daquele Enquadramento Contratual das Contrapartidas:

«10. Penalidades por incumprimento definitivo

10.1. Em caso de incumprimento definitivo doloso tanto da obrigação de prestação de contrapartidas como da obrigação de celebrar Contrato Adicional, com excepção do que resulte de dolo eventual, o Adjudicatário pagará ao Estado, a título de cláusula penal:
a) se .não tiver sido atingida a parte do Valor Contabilizável Contratado das Contrapartidas relativa às contrapartidas obrigatórias ou mínimas, um valor correspondente à diferença entre o Valor Contabilizado Global das
Contrapartidas e o valor das contrapartidas obrigatórias ou mínimas, acrescido de metade do Valor Contabilizável Contratado das Contrapartidas relativo às contrapartidas suplementares:
b) se tiver sido atingida a parte do Valor Contabilizável
Contratado das Contrapartidas relativa às contrapartidas obrigatórias ou mínimas, metade da diferença entre o Valor Contabilizado Global das Contrapartida e o Valor Contabilizável Contratado relativo às contrapartidas suplementares.

10.2. As penalidades referidas em 10.1 serão aplicadas quanto ao valor das operações de contrapartidas relativamente as quais se verifique dolo, com excepção do dolo eventual.

10.3. Para efeitos de indemnização por incumprimento definitivo não abrangido em 10.1 e em 10.2, o Interesse do Estado nas operações de contrapartidas é fixado em 10% do Valor Contabilizável Contratado das mesmas.

10.4. Em caso de incumprimento definitivo, não abrangido em 10.1 da obrigação de prestação de contrapartida ou de celebração do Contrato Adicional, o Adjudicatário pagará ao Estado, a título de cláusula penal, o valor do Interesse do Estado, proporcional ao Valor Contabilizável Contratado das Contrapartidas em falta, ou seja, à diferença entre o Valor Contabilizável Contratado das Contrapartidas e o Valor Contabilizada Global das Contrapartidas.

10.5. Não há lugar a indemnização por dano excedente.»

Constatamos que o valor de indemnização por incumprimento definitivo, mesmo com dolo eventual, é fixado em 10% do valor contabilizável contratado das contrapartidas em falta, prevendo-se, é certo, para os casos de dolo (não eventual) outro cálculo para o valor a pagar ao Estado a título de cláusula penal. Porém, neste caso, não é fácil agora determinar esse valor uma vez que parte da consideração de "contrapartidas obrigatórias ou mínimas", que não foram estabelecidas.

De todo o modo, repete-se, não parece daqui retirar-se fundamento para questionar as cláusulas penais estipuladas no Contrato de Contrapartidas.

2.2. Recorde-se o texto do ponto seguinte:

«ii) O facto de o valor da cláusula penal cobrir, alegadamente, (e apenas) o acréscimo no preço da aquisição do equipamento militar, foi uma das razões que nos levou a questionar se esse valor (simbólico) equivale à inexistência de uma verdadeira sanção em caso de incumprimento do Contrato de Contrapartidas (i.e. se o Estado antecipadamente não renunciou aos seus direitos), até porque o consórcio fornecedor, na prática, não se vê compelido a cumprir as suas obrigações.»

Ora, não sabemos se o valor da cláusula penal cobre ou apenas cobre o (eventual) acréscimo no preço de aquisição do equipamento militar, embora tudo indique, como se dá conta no parecer principal, que tal terá sido considerado na estipulação das cláusulas penais[9].

Não se dispõe é de elementos que permitam considerar os valores das cláusulas penais estabelecidas de meramente simbólicos, nem se vê que tal seja viável[10].

2.3. Contudo, o ponto seguinte acrescenta:

«iii) Este entendimento é reforçado pelo facto de a cláusula 19.ª (limite máximo da responsabilidade) limitar a responsabilidade ao pagamento das penalidades previstas nas cláusulas antecedentes, excluindo a possibilidade de o Estado exigir o pagamento de qualquer outra indemnização, seja a que título for, bem como o pagamento de danos excedentes, mesmo em caso de incumprimento de outras obrigações que não as operações de contrapartidas.»

Aqui alude-se ao incumprimento de outras obrigações que não as operações de contrapartidas. Ora, tratando-se do Contrato de Contrapartidas, não se percebe de que outras obrigações se fala.

Sublinha-se, de todo o modo, que é excluída a possibilidade de o Estado exigir o pagamento de qualquer outra indemnização. Mas isso é o que naturalmente acontece quando as partes fixam por acordo o montante da indemnização exigível.

De acordo com o n.º 2 do artigo 811.º do Código Civil, «[o] estabelecimento da cláusula penal obsta a que o credor exija indemnização pelo dano excedente, salvo se outra for a convenção das partes».

2.4. E a questão da limitação da responsabilidade surge de novo no ponto seguinte:

«iv) A questão que se colocou, e coloca, é a de saber se estas cláusulas não são, efectivamente, limitativas da responsabilidade. Aliás, não nos podemos esquecer que a cláusula 18.ª do Contrato de Contrapartidas prescreve uma penalização igual para os casos de dolo e negligência.»

Face ao que se acabou de dizer, não vemos que se possa acrescentar algo mais.

2.5. No último ponto, colocam-se as seguintes perguntas:

«v) Assim, tendo em conta o acima exposto nos pontos i) a iv), e que estamos perante um contrato administrativo, com as inerentes consequências, as ditas cláusulas, no seu conjunto, protegem o interesse público? Não consubstanciam uma violação do princípio da proporcionalidade?»

Ora, do que se vem dizer e de tudo o mais que se disse no parecer principal, não se pode considerar que esteja em causa o interesse público ou que tenha havido violação do princípio da proporcionalidade.

Em suma, mantém-se o que se disse e se concluiu no parecer principal acerca das cláusulas 18.ª e 19.ª do Contrato de Contrapartidas.

IV


1. Antes de se proceder à análise dos esclarecimentos solicitados acerca do grupo de questões sobre a eventual invalidade do Contrato de Contrapartidas, impõem-se algumas precisões relativamente aos excertos do parecer principal que são referenciados, conquanto não se dispense, como já atrás se sublinhou, a análise na íntegra do texto do parecer principal, para o qual se remete.

Assim, ao invés do que é referido na exposição anexa ao presente pedido de esclarecimentos, não se diz no parecer principal que a deliberação da Comissão Permanente de Contrapartidas (CPC), de 20 de Abril de 2004, aprovou todos os projectos de Contrapartidas a incluir no Contrato de Contrapartidas, pois, como ali se dá conta (cfr. nota de rodapé n.º 75), não se tinha recebido qualquer documento relativo à Comissão, incluindo o texto da própria deliberação, que só agora foi enviado. Daí que também a questão relativa ao projecto 2.1.14 reportada na nota de rodapé n.º 10 daquela exposição se deva à impossibilidade de delinear melhor a situação, o que de algum modo se mantém, não querendo com isto dizer-se que o entendimento deva ser outro. Com efeito, a aprovação daquele projecto pela CPC deverá ser considerada.

A deliberação, de 20 de Abril de 2004, da CPC consubstancia, sob uma aparente unidade, vários actos distintos – no que agora releva, actos de aprovação de diversos projectos.

Ainda, quando na exposição se alude à instauração de acção administrativa especial pelo Estado[11], não se trata, obviamente, de acção a propor pelo Estado, mas sim pelo Ministério Público, como é referido no parecer principal[12].

2. Abordemos, então, o primeiro ponto cujo teor é o seguinte:

«i) Em primeiro lugar, estando em causa uma invalidade consequente ou derivada do Contrato de Contrapartidas, porque razão o CC da PGR defende a aplicação da alínea b) do n.° 3 do artigo 185.° do CPA (invalidades originárias) em detrimento do n.° 1 deste mesmo preceito (invalidades derivadas), concluindo, consequentemente, pela invalidade parcial do Contrato de Contrapartidas e pela necessidade da sua redução? A aplicação do disposto no artigo 185.°, n.° 1 não determinaria a nulidade do Contrato de Contrapartidas?»

Ora, cabe, desde logo, precisar que no parecer principal se considera a invalidade do Contrato de Contrapartidas uma invalidade consequente ou derivada e que precisamente, face ao n.º 1 do artigo 185.º do CPA, a nulidade da deliberação da CPC reflecte-se no Contrato de Contrapartidas.

É certo que, à primeira vista, de acordo com o princípio de equiparação, fixado naquele n.º 1 do artigo 185.º do CPA, entre o tipo de invalidade do acto prévio e o tipo de invalidade do contrato, a nulidade da deliberação acarretaria sem mais a nulidade do Contrato de Contrapartidas.

Porém, afigura-se-nos que há que considerar a inserção da deliberação no procedimento pré-contratual.

A nulidade da deliberação da CPC não tem impacte em todo o procedimento antecedente e, em especial, na adjudicação, que se consolidou na ordem jurídica, como se procurou demonstrar no parecer principal.

O que está em causa naquela deliberação da CPC é tão-somente a aprovação das pré-contrapartidas fictícias, aprovação que influenciou o conteúdo das cláusulas 4.ª n.º 5, e 20.ª, n.º 1, e do Anexo II do Contrato de Contrapartidas.

Assim, não significando a nulidade daquela deliberação que não possam ou não devam manter-se todos os outros actos do procedimento, no caso impunha-se a celebração do Contrato de Aquisição e inerentemente do Contrato de Contrapartidas, como aconteceu, havendo apenas que expurgar este da parte afectada[13].

3. Observe-se, de seguida, o segundo ponto de esclarecimento atinente:

«ii) Em segundo lugar, e sem prejuízo do sentido da resposta à questão antecedente, o CC da PGR parece defender que a declaração de nulidade determinaria a invalidade parcial do Contrato de Contrapartidas, com a consequente redução das "cláusulas viciadas". Por outro lado, parece também defender que, após ser declarada a nulidade da deliberação da CPC (quer pela própria CPC, quer pelo Tribunal Administrativo), "as eventuais divergências quanto às implicações no Contrato de Contrapartidas terão que ser dirimidas pelo tribunal arbitral". Assim:

• Quais as consequências práticas, ou seja, o efeito útil da declaracão de nulidade quando a não aceitação pelo consórcio fornecedor sempre "obrigaria" o Estado a recorrer a tribunal arbitral?
• A questão antecedente assume maior relevo caso a
declaração de nulidade seja decretada pelo Tribunal
Administrativo. Não fica a sentença do Tribunal
Administrativo "esvaziada" por essa "obrigatoriedade".?
• Em concreto, como se opera a redução do contrato e a expurgação das"cláusulas viciadas"?»

Relativamente ao que é afirmado na introdução às perguntas, impõe-se precisar que as implicações no Contrato de Contrapartidas da declaração de nulidade da deliberação do CPC terão, com efeito, se for caso disso, de ser dirimidas pelo tribunal arbitral face à estipulação da cláusula compromissória. Porém, no caso de propositura pelo Ministério Público de acção administrativa especial com vista à declaração de nulidade, o pedido atinente ao contrato pode ser cumulado, conforme se referiu na parte VII do parecer principal, pressupondo é uma análise que reclame esse tipo de actuação do Ministério Público, o que, face aos elementos disponíveis, não se vislumbra.

Sobre a utilidade da declaração de nulidade, entenda-se, como caso decidido ou mesmo como caso julgado é, obviamente, o de tal matéria ficar resolvida na ordem jurídica e, consequentemente, o tribunal arbitral não poder deixar de a aceitar[14].

A questão seguinte sobre a sentença do Tribunal Administrativo ficar "esvaziada" parece, pois, não se colocar.

E quanto à redução do Contrato, caso não seja resolvida em tribunal administrativo, serão os outorgantes que a deverão concretizar, ou sendo caso disso no âmbito do tribunal arbitral.

4. Recorde-se agora o ponto seguinte:

«iii) Quanto à eventual invocação da invalidade (parcial) do contrato antes do trânsito em julgado do processo criminal, questiona-se:
• A eventual impugnação, pelo consórcio fornecedor, da declaração de nulidade da deliberação da CPC não tem de ser pedida, obrigatoriamente, no Tribunal Administrativo (e não no Tribunal Arbitral como refere o CC da PGR).
• Como é que o CC da PGR defende que o Estado possa invocar a nulidade da deliberação da CPC antes do trânsito em julgado do processo penal e, ao mesmo tempo, admite que se possa invocar a nulidade da deliberação da CPC em sede arbitral, o que implicaria, necessariamente, a sua apreciação pelo Tribunal Penal?»

É claro que a eventual impugnação da declaração de nulidade da deliberação da CPC tem de ser feita no Tribunal Administrativo, nem se vê donde é que se retira que no parecer principal se refere o Tribunal Arbitral.

A pergunta seguinte apresenta-se-nos algo ininteligível. Mas vejamos.

Se (ou enquanto) não for proposta acção administrativa especial (pelo Ministério Público) com vista à declaração de nulidade da deliberação do CPC e se (ou enquanto) esta própria não declarar a nulidade da sua deliberação o Estado não está impedido de no âmbito do Tribunal Arbitral invocar que as pré-contrapartidas em causa eram fictícias, pode admitir-se a hipótese de o tribunal arbitral entender que essa factualidade deve ser apreciada no processo crime[15].

5. O esclarecimento seguinte é assim colocado:

«iv) Qual o procedimento cautelar que permite ao Estado obter, provisoriamente, a declaração judicial da nulidade da deliberação da CPC, ainda que o CC da PGR possa concluir que não existem fundamentos para se avançar nesse sentido.»

Ora, o n.º 2 do artigo 112.º do CPTA, além de referir expressamente que podem ser adoptadas as providências cautelares especificadas no Código de Processo Civil, contém um elenco exemplificativo das providências cautelares mais frequentes, aparecendo em primeiro lugar a suspensão da eficácia de acto administrativo.

Considerando já o que se disse no parecer principal (cfr. parte V 2), uma vez que seria de afastar no caso a aplicação da regulação específica do contencioso pré-contratual, também parece não se colocar a hipótese de aplicação das providências a que se refere o artigo 132.º do CPTA.

Temos, pois, a hipótese das acções cautelares, nos termos dos artigos 112.º e ss. da CPTA, com vista a obter a providência cautelar adequada no caso concreto.

E é claro que se poderia ponderar a suspensão da eficácia do acto (ou actos) nulo(s), mas atendendo, por um lado, ao estado da situação – desde logo, o contrato foi já celebrado em 21 de Abril de 2004 – e, por outro lado, que a própria CPC poderá declarar a nulidade, não se vê que razões justificariam que tal fosse requerido.

De todo o modo, essa hipótese, como resulta do expendido, colocar-se-á ao Ministério Público que, se e quando confrontado com a propositura da acção administrativa especial com vista à declaração de nulidade, ponderará, tomando em conta todo o quadro jurídico-factual, a pertinência de accionar mecanismo cautelar.

6. Finalmente, atente-se no último pedido de esclarecimento do bloco de questões:

«v) Se "o orgão administrativo pode declarar a nulidade do acto, não fazendo qualquer sentido nessa perspectiva ponderar a propositura de qualquer mecanismo judicial" deve o Estado optar pela declaração de nulidade, via CPC? Porque razão?»

A resposta parece-nos que está dada no parecer principal e em especial na frase a que se refere[16].

Conquanto não estejamos na posse de todos os elementos de facto, a declaração de nulidade pelo órgão parece, desde logo, apresentar-se como mais célere.

Acresce que, obviamente, se o Ministério Público propuser a competente acção administrativa especial, o Estado, ou melhor, os Ministérios da Defesa Nacional e da Economia (cfr. n.º 2 do artigo 10.º do CPTA) serão também demandados na acção[17].

V


No que diz respeito ao terceiro grupo de questões analisado no parecer principal, desde logo, e mais uma vez, se remete para o desenvolvimento ali elaborado[18].

Vejamos então os esclarecimentos.

1. Recorde-se o primeiro esclarecimento:

«i) A existência de pré-contrapartidas fictícias é uma situação imputável ao consórcio fornecedor. A cláusula 10.ª do Contrato de Contrapartidas prevê um mecanismo de substituição de contrapartidas que depende da iniciativa e/ou disponibilidade do consórcio fornecedor. Como é que se conclui pela aplicação (automática) desta cláusula à situação em concreto?»

Ora, a resposta à pergunta que se acabou de transcrever parece-nos óbvia. No parecer principal não se conclui pela aplicação automática da cláusula 10.ª do Contrato de Contrapartidas.

Esta cláusula é convocada para reforçar o entendimento da divisibilidade – e, diga-se, em certa medida, da fungibilidade – do objecto do Contrato de Contrapartidas.

2. O esclarecimento seguinte é:

«ii) O CC da PGR defende que a redução do Contrato de Contrapartidas, em virtude da declaração de nulidade da deliberação da CPC, deve operar por via da aplicação desta cláusula 10.ª? Em que medida?»

As respostas parecem já estar dadas.

Como se desenvolve no parecer principal[19], a "redução" do Contrato de Contrapartidas decorrerá da nulidade da deliberação da CPC.

3. A seguir é feita a pergunta:

«iii) Não assiste ao Estado nenhum mecanismo que permita impor ao consórcio fornecedor a substituição das pré-contrapartidas fictícias e a consequente modificação (redução) do Contrato de Contrapartidas?»

No contexto, não se vislumbra, com segurança, qual o alcance da pergunta.

Porém, conforme resulta do parecer principal, a questão da "substituição das pré-contrapartidas fictícias" deverá ser, se for caso disso (se não houver acordo), dirimida no Tribunal Arbitral.

4. Atente-se no esclarecimento seguinte:

«iv) Caso seja declarada a nulidade da deliberação da CPC e as pré-contrapartidas fictícias se considerem não cumpridas na data da assinatura do Contrato de Contrapartidas, tal não determina o incumprimento definitivo dessas operações de contrapartidas?»

O Conselho Consultivo tratou a problemática das "pré-contrapartidas fictícias" no plano da validade do contrato[20]. Ficará, portanto, prejudicada a pergunta.

5. O teor do esclarecimento que se segue é:

«v) A existência de pré-contrapartidas fictícias não permite (independentemente da resposta à questão antecedente) resolver o Contrato de Contrapartidas por justificada perda de interesse na continuação da relação contratual em virtude da quebra de confiança entre as partes (justa causa)?»

Impõe-se de novo remeter para o desenvolvimento produzido no parecer principal, em especial na parte V, mas também na parte VI 3.4.

Não pode, a nosso ver, deixar de considerar-se todo o procedimento pré-contratual, designadamente a adjudicação.

Assim, a resposta terá de ser negativa.

6. A pergunta seguinte é:

«vi) Assiste ao Estado o poder de modificar unilateralmente o Contrato de Contrapartidas e/ou de resolver o mesmo por questões de interesse público, ao abrigo do artigo 180.º do CPA?»

As vicissitudes dos contratos administrativos foram referenciadas na parte VI do parecer principal. E aí, dada a natureza dos contratos em apreço, suscitou-se, com efeito, a questão de saber se o Estado estará investido dos poderes públicos de modificação unilateral e de rescisão por imperativos de interesse público (cfr. ponto 3.4.). Porém, e independentemente do entendimento sobre esta questão, face à factualidade que nos foi apresentada (pré-contrapartidas fictícias), não se vê, como não se viu no parecer principal, fundamento – não se trata da adaptação do contrato a novas exigências de interesse público – que justifique o exercício de tais poderes.

7. Os últimos esclarecimentos solicitados acerca do terceiro grupo de questões colocadas ao Conselho Consultivo são os seguintes:

«vii) O CC da PGR defende, efectivamente, que o Estado não pode resolver o Contrato de Contrapartidas? Em caso afirmativo, tal não consubstancia uma renúncia antecipada aos seus direitos?»

Conforme se expendeu no parecer principal, face aos elementos fácticos que nos foram apresentados – "pré-contrapartidas fictícias" –, entendemos que, com efeito, o Estado não pode resolver o Contrato de Contrapartidas.

À segunda pergunta, que surge algo equívoca, deverá dizer-se que não se vê onde é que o Estado renunciou antecipadamente aos seus direitos. Mas se se refere às cláusulas penais trata-se de matéria que foi analisada na parte IV (pontos 2.1. a 2.5.) do parecer principal[21], para a qual agora se remete, sendo que especificamente a hipótese de incumprimento foi também abordada no parecer principal (parte VI 3.5.).

VI


Observem-se, por fim, os esclarecimentos pretendidos acerca do último grupo de questões analisado no parecer principal, recordando para já o seu teor:

«No nosso entendimento, o CC da PGR respondeu apenas sobre a possibilidade de a execução do Contrato de Contrapartidas se repercutir na execução do Contrato de Aquisição, quando as questões colocadas tinham outra amplitude. Acresce que, a cláusula 22.ª ao estipular que (i) a extinção do Contrato de Aquisição, por forma diferente do cumprimento, determina a extinção automática do Contrato de Contrapartidas; e que, (ii) apesar deste último facto, tal não determina a extinção dos contratos acessórios celebrados entre o consorcio fornecedor e os beneficiários das contrapartidas, não permite responder às questões que foram colocadas no pedido de parecer.

Assim, e em caso de resposta afirmativa aos esclarecimentos complementares colocados em v), vi) e vii) do bloco anterior, a extinção do Contrato de Contrapartidas (nomeadamente, através de resolução) não teria consequências na subsistência do Contrato de Aquisição?»

De novo, parece considerar-se aqui entendimento diferente do Conselho Consultivo, conquanto não se explicite qual.

E, mais uma vez, se impõe precisar que no parecer principal, para cujo texto se remete, não se analisou "apenas" a possibilidade de a execução do Contrato de Contrapartidas se repercutir na execução do Contrato de Aquisição.

Aliás, face à factualidade que nos foi apresentada "pré-contrapartidas fictícias" –, analisou-se, desde logo, como se impunha, a questão da validade. E, precisamente, a propósito da validade, refere-se a dado passo que «se estivéssemos perante uma invalidade – ainda, invocável – decorrente do acto de adjudicação ambos os contratos seriam afectados»[22].

Finalmente, não se vislumbra que haja algo mais a clarificar sobre o desenvolvimento atinente feito no parecer principal. De todo o modo, repete-se, o incumprimento do Contrato de Contrapartidas não se repercute no Contrato de Aquisição.

VII


1. Por tudo quanto se vem de dizer, impõe-se sublinhar que, conquanto se tenha procurado responder aos esclarecimentos solicitados, rigorosamente, estes manifestam eventuais divergências com a doutrina do parecer principal, não havendo, na verdade, necessidade de pronúncia complementar.

2. Quando o presente texto já se encontrava preparado, recebemos, em 28 de Junho de 2010, cópia de três cartas e documentação anexa da Sérvulo & Associados, Sociedade de Advogados, RL[23].

Aquelas cartas, produzidas no âmbito do relacionamento daquele escritório de advogados com o Estado, não trazem a este Conselho Consultivo matéria ou circunstâncias novas que na economia do parecer elaborado mereçam apreciação[24].

Aliás, deverá mesmo acrescentar-se que não se vêem sequer divergências de entendimento relativamente ao parecer principal[25], ressalvando apenas um ponto na carta de 17 de Junho de 2010, a que foi feita referência expressa no despacho de Vossa Excelência que determinou a remessa à PGR e que a seguir se transcreve:

«13. Poderá opinar-se que o caso, presentemente em julgamento, de apresentação como contrapartidas de operações que, de acordo com a acusação, geneticamente o não terão sido demonstra a utilidade que se teria preservado com um regime sancionatório reforçado para o dolo directo ou necessário.
A verdade, porém, é que, se realmente se provar que nos Anexos do Contrato de Contrapartidas foram incluídas "contrapartidas falsas", não estaremos perante uma inexecução dolosa do contrato (que pressuporia uma formação válida do contrato e o seu posterior não cumprimento intencional), mas sim perante uma sua invalidade originária, por vício da vontade gerador de anulabilidade (parcial ou total: seria caso para ver), consubstanciada em erro sobre o objecto provocado por dolo. Estar-se-ia perante um acto ilícito, que sujeitaria o autor a responsabilidade civil e criminal nos termos gerais de direito (estando o "processo das contrapartidas", aliás, já em fase de instrução). No plano contratual, não estando ainda cumprido o Contrato de Contrapartidas, a anulabilidade pode ser arguida sem dependência de prazo (Código Civil, artigo 287.°, n.° 2). A questão está em saber se se poderia demonstrar a natureza absolutamente essencial deste erro, i.e., que o Estado não teria celebrado, de todo, o Contrato de Contrapartidas se tivesse tido conhecimento da situação real existente, e não apenas que não o teria celebrado nos termos em que o fez (caso em que a invalidade do contrato seria apenas parcial – artigo 292.° do Código Civil). Mas, a haver invalidade total, poderia pensar-se em estendê-la ao Contrato de Aquisição, argumentando que se trata de uma união de contratos com dependência, consubstanciada num conjunto económico desenhado para a obtenção de objectivos comuns, e que a vontade subjacente à celebração do contrato de aquisição se encontra alicerçada na convicção da validade do contrato de contrapartidas, i.e., na susceptibilidade efectiva de este assegurar um reflexo positivo na economia nacional em valor não inferior ao preço dos bens.»

Aqui haverá, portanto, um entendimento diferente do defendido no parecer principal.

Com efeito, no parecer principal, não se deixando de cogitar nas hipóteses de invalidade originária, considerou-se que estávamos perante uma invalidade derivada ou consequente do Contrato de Contrapartidas pelas razões ali invocadas e que agora nos dispensamos de repetir.

De todo o modo, na perspectiva que parece defendida no excerto acima reproduzido, não poderá certamente esquecer-se, como, aliás, ali não se esquece, a problemática da natureza do dolo, não vendo nós com base em que elementos se poderia considerar o dolo essencial e não incidental.

Refira-se, ainda, que a considerar-se a invalidade originária, para além de outros aspectos a atender, o litígio teria de ser dirimido tão-somente no Tribunal Arbitral, não havendo, portanto, a possibilidade de os tribunais administrativos definirem a questão relacionada com as "pré-contrapartidas fictícias", nem se colocando, obviamente, a hipótese de a CPC declarar a nulidade da deliberação que as aprovou.

Enfim, repete-se, o entendimento do Conselho Consultivo é outro.

VIII


Em face do exposto, mantém-se o que se disse e concluiu no parecer principal, o parecer n.º 4/2010, de 4 de Maio de 2010.


ESTE PARECER FOI VOTADO NA SESSÃO DO CONSELHO CONSULTIVO DA PROCURADORIA-GERAL DA REPÚBLICA, DE 16 DE SETEMBRO DE 2010.

Fernando José Matos Pinto Monteiro – Maria Manuela Flores Ferreira (Relatora) – José David Pimentel Marcos – Alberto Esteves Remédio – Manuel Pereira Augusto de Matos – José Luís Paquim Pereira Coutinho – Fernando Bento – António Leones Dantas – José Carlos Lopes.








[1] Ofício de 25 de Maio de 2010, entrado na Procuradoria-Geral da República em 27 do mesmo mês.
[2] Cfr. exposição anexa ao pedido de esclarecimentos.
[3] É de esclarecer que o Parecer n.º 4/2010 foi emitido ao abrigo da alínea a) do artigo 37.º do Estatuto de Ministério Público e não da alínea c) do mesmo preceito, pois não se trata de uma apreciação prévia à celebração dos contratos.
x Alterado pela RCM n.º 100/99, de 1 de Setembro e pela RCM n.º 67/2003, de 5 de Maio.
x1 "Em caso de litígio de qualquer situação resultante da execução do presente programa ou do contrato celebrado no âmbito do mesmo, o foro competente é o da comarca de Lisboa, com expressa renúncia a qualquer outro."
x2 Esta alínea não obriga as partes a submeterem os litígios a arbitragem, nem que, ao optar-se pela via arbitral, se incluam os litígios relativos à execução dos contratos.
x3 "Desde que por lei especial não esteja submetido exclusivamente a tribunal judicial ou a arbitragem necessária, qualquer litígio que não respeite a direitos indisponíveis pode ser cometido pelas partes, mediante convenção de arbitragem, à decisão de árbitros".
x4 Note-se que à data da celebracão do Contrato de Contrapartidas o regime legal de 2006, invocado no parecer do CC da PGR, não tinha ainda sido aprovado.
x5 No ANEXO ao regulamento interno da Comissão de Contrapartidas, aprovado por este Despacho, na alínea B) Princípios gerais para os termos de referência das contrapartidas, ficou previsto o seguinte: "15 - O cumprimento das contrapartidas será apreciado projecto a projecto. O seu incumprimento, total ou parcial, implicará o pagamento ao Estado Português pelo adjudicatário de uma penalização:
1. A penalização será calculada da seguinte forma:
a. Quando o valor total realizado do projecto no final do prazo de execução do mesmo for inferior ao constante no contrato de contrapartidas, a penalização a pagar será igual a 25% da diferença entre os dois montantes;
b. Quando a execução de um projecto se atrasar em relação às metas inter- calares constantes do contrato de contrapartidas, será aplicada uma pena- ização por mora igual a 1% por mês, até um máximo de 25% do valor total do projecto, altura em que será considerado incumprimento definitivo do projecto. As penalizações por incumprimento definitivo e por mora de cada projecto não são cumulativas, sendo os montantes das penalidades aplica- das por mora, se esta se converter em incumprimento definitivo, e na medi- da em que se converta, deduzidos na pena por incumprimento definitivo, até ao limite desta;
c. Para efeito do cálculo das penalizações a aplicar referidas nas alíneas anteriores, admite-se que, mediante acordo da CPC, a avaliação do cumpri mento das contrapartidas possa ser feita por conjuntos de projectos aceites pela CPC e não projecto a projecto.
2. As penalizações calculadas poderão ser deduzidas dos montantes devidos ao adjudicatário pela celebração do contrato de aquisição a que se refere a obrigação de prestação de contrapartidas;
3. Sem prejuízo da caução prevista no artigo 13.º do despacho conjunto n.º 341/99, de 8 de Abril, dos Ministros da Defesa Nacional e da Economia, o adjudicatário é obrigado complementarmente a prestação de garantia bancária first demand, no valor de 25% do valor das contrapartidas, de modo a garantir o eventual pagamento das penalizações. Esta garantia poderá não ser exigida desde que o contrato de aquisição preveja e possibilite expressamente o disposto no n.º 2 deste artigo. Esta garantia complementar poderá ainda, a requerimento do adjudicatário, ser libertada parcialmente à medida que os projectos de contrapartidas forem executados".
x6 O Enquadramento Contratual das Contrapartidas segue de perto (contrariamente ao Contrato de Contrapartidas) o regime estabelecido no despacho de 2002 acima parcialmente transcrito. Veja-se o regime acordado no ponto 10. deste Enquadramento, o qual não estabelece a dita percentagem de 10% para os casos de incumprimento por dolo (com excepção do dolo eventual).
x7 Como parece ser o entendimento plasmado na declaração de voto anexa ao parecer do CC da PGR.
x8 Documento que segue em anexo como DOC.2.
x9 Julgamos entender do parecer do CC da PGR que, apesar de inicialmente terem autonomizado a invalidade do acto de adjudicação (em virtude da referência ao projecto 2.1.14.) da invalidade da deliberação da CPC, acabam por considerar que todos os projectos de pré-contrapartidas fictícias, incluindo o 2.1.14, foram aprovados pela referida deliberação da CPC e, consequentemente, fica incluído na nulidade dessa deliberação.
x10 Com efeito, o CC da PGR parece seguir o principio da competência do tribunal sobre a questão prejudicial penal (artigo 15.º do Código de Processo dos Tribunais Administrativos), em vigor no direito português.
x11 É que o CC da PGR, sustenta, igualmente, que a declaração de nulidade da deliberação da CPC (acto pré-contratual) não pode ser feita em sede arbitral.
[4] Face, precisamente, ao regulado no CPTA se terá tornado inútil a referência ao foro competente nos contratos.
[5] Cfr. parte IV 1.7 do parecer.
[6] Cfr. também ibidem.
[7] De todo o modo, vide a posição assumida no parecer.
[8] Assinado, em 6 de Novembro de 2000, pelo Presidente da Comissão a que se refere o artigo 5.º do PRAS e pelos representantes legais do GSC e da DCN I, de acordo com a cópia agora junta.
[9] Cfr., especialmente, parte IV 2.5. do parecer.
[10] Não será por se estabelecer o valor de 10% e não de 15%, por exemplo, que se deverá considerar, obviamente, um valor meramente simbólico.
Aliás, se alargarmos a análise feita no parecer, temos a Noruega com uma percentagem não inferior a 10% e os Países Baixos com uma percentagem de 15%, no caso de 50% de incumprimento e de 30% no caso de 100% de incumprimento, mas temos a República Checa e a Áustria a prever penalidades entre 5% e 10% da parte não cumprida da obrigação de contrapartidas e a Bélgica a prever 10%, além da Finlândia com a percentagem a estabelecer caso a caso (cfr. in www.EDA.EU).
[11] Itálico nosso.
[12] Vide partes V 2 e VII 7.
[13] Daí a referência ao artigo 292.º do Código Civil ex vi alínea b) do n.º 3 do artigo 185.º do CPA, para, de algum modo, demonstrar que os contratos administrativos também são susceptíveis de redução.
[14] Cfr. parte V 4 do parecer.
[15] Cfr. parte V 3 do parecer.
[16] Frase que, contudo, não reproduz ipsis verbis o que foi dito no parecer (cfr. parte V 2).
[17] A par do GSC.
[18] Com efeito, também aqui, a anteceder os esclarecimentos pretendidos se fazem referências ao parecer que não traduzem o raciocínio que ali se fez.
[19] Cfr. especialmente parte V 1.3.
[20] Conforme se frisou na parte VI 3.5. do parecer.
[21] E a que também já nos referimos no presente texto.
[22] Cfr. parte VII 4.
[23] A primeira, datada de 6 de Maio de 2010, foi remetida por ofício de 17 de Maio de 2010 do Ministério da Defesa Nacional à PGR, onde foi recebida a 18 do mesmo mês. A segunda, datada de 17 de Junho 2010, foi remetida por ofício do Ministério da Defesa Nacional de 25 do mesmo mês à PGR, onde foi recebida no mesmo dia. E a terceira carta, datada de 18 de Junho de 2010, foi remetida por ofício do Ministério da Defesa Nacional de 25 do mesmo mês à PGR, onde também foi recebida no mesmo dia.
[24] Embora tenha sido solicitado o envio à PGR e sem prejuízo do interesse do seu conhecimento para outros efeitos.
[25] E mesmo quanto a factos que não tinham sido apresentados ao Conselho Consultivo, como é o caso das negociações sobre as minutas dos contratos, o raciocínio feito no parecer não é posto em causa pelos elementos constantes das cartas.