Pareceres PGR

Parecer do Conselho Consultivo da PGR
Nº Convencional: PGRP00003208
Parecer: P000182012
Nº do Documento: PPA25102012001800
Descritores: CONTRATO PÚBLICO
CÓDIGO DOS CONTRATOS PÚBLICOS
FORNECIMENTO DO ESTACIONARIO
EDITORIAL DO MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO E CIÊNCIA
PERSONALIDADE JURÍDICA
CONTRATAÇÃO IN HOUSE
PRINCÍPIO DA CONCORRÊNCIA
Área Temática:DIR CONST* DIR ADM
Ref. Pareceres:P000502009Parecer: P000502009
P000362011Parecer: P000362011
P000372011Parecer: P000372011
P000192012Parecer: P000192012
Legislação:CONST76 - ART199 ART266 ART267 N2 N5; DL 648/76 DE 1976/07/31 - ART1; DL 143/96 DE 1996/08/26 - ART32 N1 A) B) C) D) E) F) G) H); DL 125/2011 DE 2011/12/29; DL 201/72 DE 1972/06/19 - ART7; DL 18/2008 DE 2008/01/29 - ART2 N1 A) B) C) D) E) F) G) ART5 N1 N2 ART6 N1;
Direito Comunitário:
Direito Internacional:
Direito Estrangeiro:
Jurisprudência:AC TECKAL DE 2009/11/18 (PROCESSO N C-107/98)
AC STADT HALLE E RPL LOCHAU DE 2004/09/23 (PROCESSO N C26/03)
AC PARKING BRIXEN DE 2005/03/01 (PROCESSO N C-458/03)
Documentos Internacionais:
Ref. Complementar:
Conclusões: 1.ª A contratação imperativamente sujeita ao Código de Contratos Públicos é apenas a que envolve pessoas jurídicas distintas, pelo que as relações interorgânicas de fornecimento de serviços e bens no âmbito da pessoa coletiva Estado não têm de se submeter aos procedimentos pré-contratuais previstos no Código de Contratos Públicos.

2.ª A Editorial do Ministério da Educação e Ciência (EMEC) constitui um organismo da Administração Pública integrado no Ministério da Educação e Ciência e sem personalidade jurídica.

3.ª Os acordos de fornecimento de material gráfico (nomeadamente folhas, capas e sobrescritos impressos) pela EMEC a ministérios distintos do Ministério da Educação e Ciência integram-se na liberdade de auto-organização administrativa e não estão sujeitos às regras do Código de Contratos Públicos.

Texto Integral:


Senhora Secretária de Estado do Ensino Básico e Secundário
Excelência:



I. Consulta

Sua Excelência a Secretária de Estado do Ensino Básico e Secundário solicitou ao Conselho Consultivo da Procuradoria-Geral da República a emissão de parecer sobre a «questão da aplicabilidade do Código dos Contratos Públicos ao fornecimento do estacionário dos Ministérios pela Editorial do Ministério da Educação e da Ciência»[1].

Cumpre emitir parecer.


II. Fundamentação

§ II.1 Objeto do parecer e enquadramento metodológico

O Conselho Consultivo nesta sede relativa à emissão de «parecer restrito a matéria de legalidade» a solicitação do Governo, nos termos da alínea a) do artigo 37.º do Estatuto do Ministério Público, carece de legitimidade para o desenvolvimento de qualquer investigação autónoma sobre «matéria de fato», que, aliás, não lhe foi solicitada pelo órgão de soberania competente.

Já o enquadramento jurídico das questões suscitadas será da responsabilidade do Conselho Consultivo, de acordo com uma matriz conformada pelos princípios da legalidade e objetividade.

O parecer tem como objeto uma questão de direito constituído: O fornecimento do «estacionário» dos Ministérios pela Editorial do Ministério da Educação e da Ciência está sujeito ao Código dos Contratos Públicos (CCP)?

O desenvolvimento do parecer vai ser determinado pela componente funcional dos pareceres do Conselho Consultivo que, de acordo com o n.º 1 do artigo 43.º do EMP, incidam «sobre disposições de ordem genérica», os quais sendo homologados passarão a valer «como interpretação oficial, perante os respetivos serviços, das matérias que se destinam a esclarecer».

A consulta apresenta-se balizada pela questão identificada pelo consulente, única sobre a qual se pretende a pronúncia do Conselho Consultivo, não se devendo extravasar da mesma, sem embargo da ponderação de questões prévias necessárias à abordagem jurídica do problema apresentado[2].

O parecer vai cingir-se ao universo compreensivo dos problemas jurídicos diretamente colocados na consulta, aplicabilidade do CCP «ao fornecimento do estacionário dos Ministérios pela Editorial do Ministério da Educação e da Ciência», não se empreendendo incursões sobre outras questões jurídicas que possam estar envolvidas nessa atividade da EMEC. Com efeito, este órgão consultivo num parecer facultativo, como o presente, apenas se deve pronunciar sobre disposições de ordem genérica em matéria de legalidade cuja apreciação lhe foi diretamente solicitada pelo órgão de soberania competente, atentas as disposições dos artigos 37.º, alínea a), e 43.º, n.º 1, do EMP conjugadas com as dos artigos 98.º, n.º 1, e 99.º, n.º 1, do Código de Procedimento Administrativo (CPA).

A estrutura do parecer vai ser determinada pelo escopo da consulta, desdobrando-se pelas seguintes duas partes:
§ II.2 A Editorial do Ministério da Educação e Ciência
§ II.3 O fornecimento pela Editorial do Ministério da Educação e Ciência do material designado como «estacionário» a outros departamentos do Estado em face do âmbito de aplicação do Código dos Contratos Públicos

Depois da fundamentação, serão enunciadas as conclusões do parecer visando responder à questão colocada na consulta.


§ II.2 A Editorial do Ministério da Educação e Ciência

§ II.2.1 A Editorial do Ministério da Educação e Ciência (EMEC) foi criada pelo Decreto-Lei n.º 648/76, de 31 de Julho como organismo do referido Ministério da Educação e Ciência (MEC) com «autonomia administrativa e financeira»[3].

Na altura da sua criação, as atribuições legais da EMEC dividiam-se por quatro categorias:
a) Impressão do material de apoio burocrático dos serviços centrais;
b) Organização da publicação de relatórios, documentos de trabalho, textos legais e outra documentação de interesse para os serviços;
c) Edição de boletins oficiais, textos didácticos, documentos bibliográficos e revistas publicadas pelos diferentes departamentos;
d) Reedição de obras de reconhecido interesse cuja propriedade pertença ao MEC.

Posteriormente, o artigo 32.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 143/1996, de 26 de Agosto, alargou o leque de atribuições da EMEC que passaram a abranger também:
e) Conceção, orientação, tratamento gráfico e promoção da qualidade global de todos os documentos;
f) Promoção e venda das publicações do MEC por si editadas;
g) Prestação de serviços, no âmbito das suas atividades, a entidades públicas ou privadas;
h) Organização e realização de formação profissional, na sua área de atividade, destinada a jovens habilitados com cursos do ensino secundário, das escolas profissionais e das escolas superiores, de acordo com orientações a estabelecer por despacho do Ministro da Educação.

A atual Lei Orgânica do Ministério da Educação e Ciência aprovada pelo Decreto-Lei n.º 125/2011, de 29 de Dezembro, apenas alterou a composição do Conselho de Administração da EMEC não interferindo com o estatuto dessa entidade[4].

Retornando ao estatuto da EMEC, a lei regula as respetivas receitas próprias[5]. A lei também estabelece que as responsabilidades da EMEC quanto a impostos, contribuições ou taxas, custos e emolumentos e selos nos processos, atos notariais de registo ou outros em que intervenha se operam nos termos e condições aplicáveis à generalidade dos organismos da administração direta do Estado[6].


§ II.2.2 Como já se destacou, o presente parecer tem como objeto uma única pergunta relativa à aplicabilidade do CCP ao fornecimento do «estacionário» dos Ministérios pela EMEC[7]. De qualquer modo, na consulta também se refere, a dado passo, a «sua [da EMEC] natureza jurídica, como questão prévia à ora colocada careceria de ser esclarecida». Abordagem que se vai empreender com esse preciso recorte funcional, simples questão prévia à matéria objeto do parecer, sem enveredar por quaisquer desenvolvimentos (conceptuais e na integração da categoria numa taxonomia exaustiva de organismos estaduais) que se revelem despiciendos nesta sede (cingida à aludida problemática da aplicabilidade do CCP).

O diploma que criou a EMEC, Decreto-Lei n.º 648/76, no seu artigo 1.º aditou um novo número ao artigo 7.º do diploma que regulava a orgânica da Secretaria-Geral do MEC (Decreto-Lei n.º 201/72, de 19 de Junho) e tinha como epígrafe Dos serviços em geral[8]. Aditamento em que se prescreveu que «Na Secretaria-Geral funciona a Editorial do Ministério da Educação e Investigação Científica, que gozará de autonomia administrativa e financeira e que terá as atribuições e a composição que lhe forem fixadas em diploma legal». Secretaria-Geral do MEC que integra a administração direta do Estado no âmbito do MEC[9].

A profusão de diplomas incidentes sobre as sucessivas orgânicas dos antecessores do actual MEC e respetiva secretaria-geral repercutiu-se nalguma amálgama de disposições sobre a EMEC[10].

A EMEC compreende um Conselho de Administração constituído por um presidente, por inerência o secretário-geral do MEC, e dois vogais, um dos quais é o diretor executivo, o qual se encontra equiparado para efeitos remuneratórios a cargo de direcção superior de 2.º grau[11].

Relativamente à questão prévia podem, em resumo, destacar-se quatro coordenadas centrais:
1- A EMEC nunca teve personalidade jurídica nem transitou do Estado pessoa coletiva para outra pessoa coletiva pública ou privada;
2- A EMEC é um organismo com autonomia administrativa e financeira;
3- A EMEC manteve-se ao longo de 36 anos na órbita do MEC;
4- A EMEC está sujeita à tutela e superintendência do Ministro da Educação e Ciência.

A análise da natureza jurídica da EMEC remete o intérprete para o conceito de Estado-Administração, corrente na doutrina administrativista nacional, em que, como enfatiza Freitas do Amaral, a «pessoa coletiva pública autónoma» não é «confundível com os governantes que o dirigem, nem com os funcionários que o servem, nem com as outras entidades autónomas que integram a Administração, nem com os cidadãos que com ele entram em relação»[12].

Quadro em que a EMEC apresenta características que exigem uma atenção cautelosa que não obnubile o essencial: Trata-se de uma entidade integrada na pessoa coletiva Estado que tem autonomia administrativa e financeira e beneficia de receitas próprias que podem não ser oriundas do orçamento de Estado[13].

Na pluralidade de elementos que constituem os traços reveladores da fisionomia jurídica da EMEC apresenta-se como aspecto primário a sua incorporação na pessoa coletiva Estado. Com efeito, ainda que a EMEC revele uma dimensão empresarial, ou mais propriamente se apresente como uma unidade funcional com funções prestadoras, subsiste como ente sem personalidade jurídica e, como sublinha Freitas do Amaral, «se a empresa pública está integrada numa pessoa coletiva mais vasta, não é, ela própria, uma pessoa coletiva»[14].

Chegados a este passo importa concluir a resposta à questão prévia:
A Editorial do Ministério da Educação e Ciência (EMEC) constitui um organismo da Administração Pública integrado no Ministério da Educação e Ciência sem personalidade jurídica.

Sem embargo, a amálgama de disposições normativas sobre a EMEC e o cruzamento de filosofias distintas, traduzindo-se na atribuição a tal organismo de algumas características que tradicionalmente são específicas das entidades personalizadas, estão na génese da dúvida sobre se essa entidade tem ou não personalidade jurídica[15]. Na medida em que na última Lei Orgânica do MEC se voltou a a anunciar a redefinição do estatuto jurídico da EMEC será conveniente que essa problemática seja então clarificada.


§ II.2.3 O tema da consulta poderia, ainda, compreender um outro tópico problemático: Enquadramento no estatuto da EMEC da atividade de fornecimento do «estacionário» de outros ministérios além do MEC e respetiva regulação jurídica.

Entende-se que a abordagem aprofundada desse tema deve ser excluída por duas ordens de razões:
1- A resposta à pergunta colocada na consulta pode ser empreendida sem abordar diretamente esse problema jurídico, sendo metodicamente adequado enfrentar autonomamente a questão de saber se a eventual atividade de fornecimento do material impresso designado como «estacionário» pela EMEC (preservando esta o perfil institucional vigente) a outros ministérios está sujeita ao regime fixado no CCP?
2- O problema da regulação jurídica da atividade de fornecimento de «estacionário» a ministérios distintos do MEC que esteja para além da sujeição ao CCP não foi, sequer, aflorado na consulta (ao contrário da «natureza jurídica» da EMEC enunciada como «questão prévia»).

Prevalecem neste domínio imperativos de contenção, no respeito da separação entre as responsabilidades do órgão de soberania executivo que delimita o objeto da pronúncia e do órgão consultivo que tem um estatuto de autonomia em relação àquele[16].

Nesta medida, o parecer não vai incidir sobre a aplicação dos princípios gerais da atividade administrativa ao universo fenomenológico recortado na consulta naquilo que se apresente autónomo do problema diretamente suscitado pela entidade consulente: A aplicabilidade do CCP.

Limites da abordagem determinados, ainda, por imperativos constitucionais:
O Ministério Público apenas tem as funções consultivas que se encontrem previstas na lei, por força das disposições conjugadas dos artigos 219.º, n.º 1, e 165.º, n.º 1, alínea p), da Constituição da República Portuguesa.
A autonomia do Ministério Público é conformada pela sua vinculação a critérios de legalidade e objetividade e pela exclusiva sujeição dos magistrados do Ministério Público às diretivas, ordens e instruções previstas na lei[17].
As funções consultivas do Ministério Público devem ser exercidas «nos termos» do Estatuto do Ministério Público (EMP) – alínea m) do n.º 1 do artigo 3.º do EMP.
A Procuradoria-Geral da República exerce funções consultivas por intermédio do seu Conselho Consultivo, por via do disposto no artigo 36.º do EMP.
Relativamente a matérias de legalidade sobre a atividade administrativa dirigida pelo Governo o parecer do Conselho Consultivo tem de ser precedido de solicitação do órgão de soberania competente (artigo 37.º, alínea a), do EMP).


§ II.3 O fornecimento pela Editorial do Ministério da Educação e Ciência do material designado como «estacionário» a outros ministérios em face do âmbito de aplicação do Código dos Contratos Públicos

§ II.3.1 A problemática objeto do parecer incide no fornecimento pela EMEC de material impresso para ministérios distintos do MEC. Reportando-‑se o universo físico designado na consulta como «estacionário» a diferentes tipologias de materiais impressos em suporte papel: folhas, sobrescritos e capas[18].

Em termos de categorias conceptuais deve ser destacado que o objeto da consulta se circunscreve à problemática dos «limites entre as situações que cabem no âmbito de aplicação das regras sobre adjudicação de contratos públicos e as formas de colaboração interadministrativa»[19].


§ II.3.2 A pergunta sobre a aplicação do CCP ao fornecimento pela EMEC de materiais designados como «estacionário» a «outros departamentos do Estado» não envolve qualquer dúvida sobre o preenchimento do conceito de entidade adjudicante no quadro do CCP, problemática que já foi objeto central de dois pareceres do Conselho Consultivo, o n.º 36/2011, de 1-3-2012, e o n.º 19/2012, de 13-9-2012[20]. Com efeito, afigura-se inequívoco que o Estado, independentemente do seu «órgão adjudicante», é entidade adjudicante para efeitos do CCP – previsto na alínea a) do n.º 1 do artigo 2.º.

O caso objeto de análise reporta-se à interação de ministérios, como órgãos adjudicantes, com uma unidade funcional com autonomia administrativa e financeira mas sem personalidade jurídica que integra a administração direta do Estado e está dependente do MEC.

Sendo as entidades adjudicantes ministérios, isto é organismos governamentais, devemos ter presente, como lembra Gomes Canotilho, que:
«A palavra “governo” é plurissignificativa: (1) é o complexo organizatório do Estado (conjunto de órgãos) ao qual é reconhecida competência de direcção política (ex.: forma de governo); (2) conjunto de todo os órgãos que desempenham tarefas e funções não enquadráveis no “poder legislativo” e no “poder jurisdicional” (ex.: “poder executivo”); (3) órgão constitucional de soberania com competência para a condução da política geral do país e superintendente na administração pública (art. 182.º da CRP)»[21].

Reporta-se o presente parecer a Governo na última aceção focada, órgão complexo, nomeadamente, responsável pela administração direta do Estado (artigos 199.º e 266.º da Constituição). Como referem Mário Esteves Oliveira / Rodrigo Esteves Oliveira:
«”Acima” de todos, como órgão adjudicante do Estado, aparece o Governo, os seus membros (mais raramente, o Conselho de Ministros), bem como as dependências não personalizadas da administração direta do Estado, a central ou a periférica, ou seja os serviços e organismos sem personalidade jurídica e hierarquicamente dependentes do Governo, as que porventura gozem de competência ou capacidade pré-contratual, como é ou pode ser, paradigmaticamente, o caso das direções gerais e dos governos civis»[22].


§ II.3.3 O problema da sujeição ao regime imperativo do CCP do fornecimento de «estacionário» pela EMEC a outros ministérios tem uma dimensão jurídico-constitucional incidente nos princípios estruturantes da Administração Pública, em particular nas interconexões derivadas da desconcentração de competências envolvendo organismos com autonomia administrativa e financeira mas sem personalidade jurídica, como a EMEC.

Matéria em que ressalta a importância dos princípios da eficácia e unidade da ação administrativa, expressamente consagrados no n.º 2 do artigo 267.º da Constituição. Os quais, como destacam Gomes Canotilho e Vital Moreira, «devem ser conjugados com o princípio da boa administração (ou princípio do bom andamento da administração), que exige o exercício da função administrativa de forma eficiente e congruente, dando cumprimento: (a) à lei geral definidora dos interesses públicos primários e garantidora da unidade de ação; (b) às regras técnicas da experiência e da racionalidade, asseguradoras da adequação, da economicidade, do rendimento, da simplicidade e da prontidão a atividade administrativa; (c) aos princípios e prescrições de coordenação, de forma a evitar duplicações interferências e sobreposições necessárias»[23]. Por seu turno, o princípio da racionalização consagrado no n.º 5 do artigo 267.º da Constituição impõe «a adoção de critérios necessários para a rendibilidade e a organização ótimas dos serviços e atividades administrativas», o que, ainda de acordo com Gomes Canotilho e Vital Moreira, deve ser «uma expressão da melhor utilização dos recursos públicos, de modo a evitar desperdícios»[24].

Neste quadro, o recurso de ministérios distintos do MEC à capacidade e meios específicos da EMEC para o fornecimento de materiais gráficos designados como «estacionário», no quadro de relações interorgânicas entre entidades sem personalidade jurídica que integram a administração pública, é juridicamente legitimada na medida em que se cumpram as regras legais que conformam os referidos acordos interadministrativos, que devem ser norteados pelos princípios constitucionais acima referidos[25].

Como se destacou no parecer n.º 37/2011, de 1-3-2012, deste Conselho Consultivo: «A privatização funcional ocorre quando o particular auxilia a Administração na fase da preparação de uma tarefa ou na sua execução material, sobretudo através do “outsourcing” ou “contracting out”. Neste caso, o particular atua no âmbito do Direito privado»[26]. Nesse parecer este Conselho foi convocado para abordar os limites da privatização, já a questão que agora nos ocupa, em termos geométricos, apresenta-se oposta: Saber se o Estado pode em detrimento da privatização do fornecimento de determinados materiais optar pela solução interna, sem adoptar os procedimentos da contratação pública regulados no CCP, isto é, se outros ministérios, além do MEC, em matéria de aquisição do material designado como «estacionário» podem optar pelo insourcing à EMEC sem precedência dos procedimentos pré-contratuais previstos no CCP.

Problema que se relaciona com o que alguma doutrina designa como in-house puro relativo «a fenómenos de concertação e de articulação do exercício de competências que ocorrem no interior de determinada pessoa coletiva pública, ou seja, acordos celebrados entre dois ou mais órgãos, estruturas ou serviços que comungam a mesma personalidade jurídica»[27].


§ II.3.4 A ponderação da aplicabilidade das exigências do CCP à matéria objeto do parecer deve começar por compreender uma atenção particular ao n.º 1 do artigo 5.º desse código, excludente de «prestações que não estão nem sejam susceptíveis de estar submetidas à concorrência de mercado, designadamente em razão da sua natureza ou das suas características, bem como da posição relativa das partes no contrato ou do contexto da sua própria formação».

Na abordagem da questão prévia relativa ao enquadramento da EMEC concluiu-se que se trata de uma entidade sem personalidade jurídica que integra o Estado, pelo que encerra-se aí o núcleo do primeiro problema: O regime do CCP sobre contratos públicos aplica-se a prestações ou a aquisições entre organismos do Estado pessoa coletiva?

Tema que sendo vizinho da vexata quaestio da admissibilidade de contratos administrativos intra-subjetivos e interorgânicos[28] apresenta autonomia, até porque no direito português «o conceito de contrato público na aceção do Código não equivale ao conceito de contrato administrativo»[29].

Enquadrado o problema no plano sistemático-normativo, deve retornar-se a um ponto anterior e intentar a compreensão da questão suscitada à luz de uma perspectiva axiológico-teleológica do CCP que se apresentou orientado pelo princípio da concorrência, enunciado como um referente «que confere unidade de sentido às soluções do Código»[30].

Princípio da concorrência que constituindo uma matriz teleológica conforma uma norma específica relativa a contratos interadministrativos, o artigo 6.º, sobre contratação pública entre entidades adjudicantes previstas no n.º 1 do artigo 2.º:
a) O Estado;
b) As Regiões Autónomas;
c) As autarquias locais;
d) Os institutos públicos;
e) As fundações públicas, com excepção das previstas na Lei n.º 62/2007, de 10 de Setembro;
f) As associações públicas;
g) As associações de que façam parte uma ou várias das pessoas coletivas referidas nas alíneas anteriores, desde que sejam maioritariamente financiadas por estas, estejam sujeitas ao seu controlo de gestão ou tenham um órgão de administração, de direcção ou de fiscalização cuja maioria dos titulares seja, direta ou indiretamente, designada pelas mesmas.

Essa norma, contudo, não se reporta diretamente à questão objeto do presente parecer pois regula exclusivamente um problema de relações intersubjetivas não estando compreendidas na previsão relações intra-subjetivas. Isto é, o artigo 6.º do CCP estabelece o regime relativo a relações do Estado com outras entidades adjudicantes previstas no n.º 1 do artigo 2.º do CCP, mas a sua letra nada prescreve sobre o problema que nos foi colocado sobre relações interorgânicas no âmbito do Estado Administração.

Por seu turno, o n.º 2 do artigo 5.º, o núcleo da regulação legal da contratação in house, reporta-se, pelo menos na sua letra, a relações intersubjetivas «à formação de contratos, independentemente do seu objeto, a celebrar por entidades adjudicantes com uma outra entidade». A regra sobre contratos in house excluídos remete, assim, para um elemento de alteridade, contratos a celebrar com «uma outra entidade», quando o problema objeto deste parecer se relaciona com relações interadministrativas no seio do Estado, um caso, no que concerne à pessoa jurídica, de operações internas por contraponto a relações externas.

Os artigos 5.º, n.ºs 1 e 2, e 6.º, n.º 1, do CCP, naquilo que regulam e silenciam, parecem apontar para uma perspetiva de contrato público no sentido circunscrito a relações intersubjetivas. Indício carecido de confirmação numa subsequente ponderação que atenda à base axiológico-teleológica do regime orientado pelo princípio da concorrência.


§ II.3.5 Contextualizado o problema no condicionamento das atividades de aquisição de bens e serviços do Estado pelo princípio da concorrência protegido pelo CCP, deve ser tido em atenção que, como destaca João Caupers, «a iniciativa legislativa [do CCP] – ou, talvez, o pretexto legislativo – foi a transposição de direito comunitário»[31]. Em particular, quanto aos limites à livre contratação entre entidades adjudicantes o CCP é um diploma conformado em termos axiológico-teleológicos pelas diretivas e jurisprudência comunitárias.

Marca que constitui fator central para a ausência de referências no CCP a contratos interorgânicos e intra-subjetivos. Com efeito, na jurisprudência do Tribunal de Justiça das Comunidades Europeias (TJCE) a problemática da imperatividade das regras comunitárias sobre contratação pública só envolve relações in house entre pessoas jurídicas autónomas, nunca incidindo sobre as relações entre organismos da administração direta sem personalidade jurídica, ainda que constituam unidades funcionais com alguma autonomia.

Como se pode constatar pela argumentação desenvolvida pelo advogado-geral Georges Cosmas nas conclusões que apresentou em 1 de Julho de 1999 num dos leading cases da jurisprudência do TJCE sobre as relações in-house, o caso Teckal (processo n.º C-107/98): «É necessário que o cocontratante da entidade adjudicante, o fornecedor, tenha efetivamente a qualidade de terceiro relativamente a esta entidade, ou seja, deve tratar-se de uma pessoa distinta desta». Para algumas linhas à frente acrescentar: «O direito comunitário não obriga as entidades adjudicantes a respeitar o processo que assegura uma concorrência efetiva entre os interessados no caso de as entidades em questão pretenderem encarregar-se elas próprias do fornecimento dos produtos de que necessitam». Invocando ainda, em nota de rodapé, as conclusões do advogado-geral La Pergola, num outro caso, em que ressalvou dos imperativos do direito comunitário em matéria de concorrência as situações de «delegação interorgânica»[32].

Perspetiva acolhida pelo TJCE no acórdão Teckal, de 18 de novembro de 2009, no sentido de que os imperativos determinados pela concorrência apenas operam «quando uma entidade adjudicante […] pretende celebrar por escrito, com uma entidade dela distinta no plano formal e dela autónoma no plano decisório, um contrato a título oneroso»[33].

Orientação que veio a ser sistematicamente reiterada pelo TJCE.

No acórdão Stadt Halle e RPL Lochau (processo n.º C-26/03) o TJCE sublinhou: «Uma autoridade pública, que seja uma entidade adjudicante, tem a possibilidade de cumprir as tarefas de interesse público que lhe incumbem pelos seus próprios meios, administrativos, técnicos e outros, sem ser obrigada a recorrer a entidades externas que não pertençam aos seus serviços. Nesse caso, não está em questão um contrato a título oneroso celebrado com uma entidade juridicamente distinta da entidade adjudicante. Assim, não há que aplicar as disposições comunitárias em matéria de contratos públicos»[34]. Nas conclusões apresentadas nesse processo, em 23 de setembro de 2004, pela advogada-geral Christine Stix-Hackl também se tinha destacado que os imperativos sobre concurso público se reportam apenas a relações intersubjetivas: «Efetivamente, na ausência de personalidade jurídica por parte da entidade que realiza a prestação, nem poderia haver contrato. Assim, faltaria também uma condição para a existência de um contrato na aceção das diretivas relativas à adjudicação de contratos públicos»[35].

Por seu turno, a advogada-geral Julianne Kokott no âmbito do processo Parking Brixen (n.º C-458/03), em 1 de março de 2005, foi igualmente clara, «o poder público […] tem naturalmente a liberdade de desempenhar integralmente pelos seus próprios meios as tarefas que lhe incumbem, ou seja, de forma interna, sem recorrer a empresas juridicamente autónomas – públicas ou privadas», para daí extrair a conclusão: «Neste caso, também não está sujeito às obrigações decorrentes do direito dos contratos públicos e do artigo 86.º CE»[36]. Orientação mantida no acórdão proferido nesse caso, que circunscreveu as regras sobre contratação pública aos casos em que a entidade adjudicante «pretende celebrar por escrito, com uma entidade distinta no plano formal e independente dela no plano decisório, um contrato a título oneroso»[37].

Padrão jurisprudencial que se transpõe para os direitos nacionais que tiveram de ser conformados pelos imperativos comunitários em matéria de concorrência. Como destaca Chiara Alberti: «Para se estabelecer o tipo de procedimento que se deve seguir é necessário analisar a natureza jurídica da ligação existente entre a administração adjudicante e o sujeito adjudicatário e, acompanhando uma série de orientações jurisprudenciais, verificar se se está em presença de uma relação de delegação interorgânica, a qual exclui a terciariedade entre os sujeitos»[38]. Para adotar o pressuposto de base estabelecido em Teckal: «O direito dos contratos públicos é, em princípio, aplicável assim que exista uma convenção entre duas pessoas distintas»[39].

Neste ponto a doutrina nacional não introduz subsídios autónomos da jurisprudência comunitária, à luz da qual as relações interorgânicas e intra-subjetivas, como as que a EMEC estabelece com outros ministérios no fornecimento de materiais e serviços de impressão, estão excluídas da imperatividade sobre procedimentos pré-contratuais da contratação pública. Não existindo indícios de que o CCP tivesse pretendido, nesse domínio, ir além das imposições comunitárias, daí que a maioria das leituras da doutrina nacional não colidam com a delimitação estabelecida pela jurisprudência do TJCE: Assim Bernardo Azevedo[40], Mark Kirkby[41], Alexandra Leitão[42], Rui de Medeiros[43], Mário Esteves Oliveira / Rodrigo Esteves Oliveira[44] e Cláudia Viana[45].

Por seu turno, este ente consultivo no parecer n.º 50/2009, de 3 de março de 2011 também já teve oportunidade de perfilhar o entendimento de que a problemática da aplicação das regras do CCP sobre procedimentos pré-contratuais se suscita exclusivamente quanto a relações intersubjetivas:
«[A] auto-satisfação de necessidades por parte da Administração não suscita, em princípio, objeções nem dúvidas sempre que é levada a cabo por serviços nela integrados, dela não distintos no plano jurídico. Quando tal satisfação passa a ser efetuada por entidades dotadas de personalidade jurídica autónoma, as dúvidas avolumam-se, dando lugar à controvérsia.»[46]

No contexto normativo do direito português sobre contratação pública, os pontos principais de controvérsia explorados pela doutrina e suscitados jurisdicionalmente reportam-se às condicionantes impostas pelo CCP aos contratos interadministrativos e intersubjetivos, no fundo, à definição do espaço deixado em aberto pelo CCP para a cooperação intersubjetiva liberta das obrigações estabelecidas pelo código[47].


§ II.3.6 Estabelecidas a premissa maior, no sentido de que o CCP não se aplica a relações intra-orgânicas no seio da pessoa coletiva Estado (§ II.3.5), e a premissa menor, a EMEC integra a pessoa jurídica Estado (§ II.2.2), a resposta à pergunta formulada pela entidade consulente pode apresentar-se como a conclusão de um silogismo categórico: O CCP não se aplica ao fornecimento pela EMEC do «estacionário» dos Ministérios.

Inferência lógico-analítica que culmina numa conclusão similar à que se logra se se atender, para empregar as palavras de Larenz, ao contexto significativo da lei e respetiva sistemática conceptual. Eixos axiológicos em que sobressai o princípio comunitário da concorrência como condicionante da discricionariedade administrativa na seleção do adjudicatário da prestação de serviços ou aquisição de bens enquanto princípio limitado a relações intersubjetivas, que não interfere com as margens de livre decisão, ao abrigo dos princípios do direito administrativo, no âmbito de relações interorgânicas e intra-subjetivas.

Refira-se, por fim, que um eventual expansionismo da obrigatoriedade de aplicação dos procedimentos pré-contratuais do CCP a estritas relações interorgânicas que, como se defendeu acima, não foi empreendido pelo legislador nacional, teria sempre de ser objeto de uma interpretação restritiva na medida em que pudesse afetar a operatividade de princípios constitucionais como a eficácia, unidade da ação e coordenação administrativas, que coenvolvem as regras da adequação, da economicidade, do rendimento, da simplicidade, da prontidão e da racionalização, atentos em particular os n.ºs 2 e 5 do artigo 267.º da Constituição. Esses imperativos combinados com o da prossecução do interesse público afiguram-se incompatíveis com espartilhos imperativos que, em nome de interesses privados exógenos, condicionem a obtenção de serviços e bens através dos meios próprios da administração direta do Estado e à luz de parâmetros de eficácia e racionalização de recursos (que abrangendo a eficiência estão para além do estrito eficientismo).


III. Conclusões

Em face do exposto, formulam-se as seguintes conclusões:

1.ª A contratação imperativamente sujeita ao Código de Contratos Públicos é apenas a que envolve pessoas jurídicas distintas, pelo que as relações interorgânicas de fornecimento de serviços e bens no âmbito da pessoa coletiva Estado não têm de se submeter aos procedimentos pré-contratuais previstos no Código de Contratos Públicos.

2.ª A Editorial do Ministério da Educação e Ciência (EMEC) constitui um organismo da Administração Pública integrado no Ministério da Educação e Ciência e sem personalidade jurídica.

3.ª Os acordos de fornecimento de material gráfico (nomeadamente folhas, capas e sobrescritos impressos) pela EMEC a ministérios distintos do Ministério da Educação e Ciência integram-se na liberdade de auto-organização administrativa e não estão sujeitos às regras do Código de Contratos Públicos.


ESTE PARECER FOI VOTADO NA SESSÃO DO CONSELHO CONSULTIVO DA PROCURADORIA-GERAL DA REPÚBLICA, DE 25 DE OUTUBRO DE 2012.

Maria Joana Raposo Marques Vidal – Paulo Joaquim da Mota Osório Dá Mesquita (Relator) – Alexandra Ludomila Ribeiro Fernandes Leitão – Maria de Fátima da Graça Carvalho – Manuel Pereira Augusto de Matos – Fernando Bento – Maria Manuela Flores Ferreira.









[1] Ofício n.º 3078 (proc. 124/10.306) entrado na Procuradoria-Geral da República em 11-5-2012 e distribuído ao ora relator em 18-5-2012.
[2] Aliás, no pedido foi identificada uma questão prévia, cf. infra § II.2.2.
[3] Em 1976 o Ministério era denominado de Ministério da Educação e Investigação Científica e teve outras designações nos últimos 36 anos. No parecer, por simplificação irá sempre ser referido por MEC.
[4] Prescrevendo-se, no n.º 1 do artigo 28.º, integrado nas disposições finais e transitórias, que a EMEC «continua a reger-se pelas disposições normativas que lhe são aplicáveis até à redefinição do respetivo estatuto jurídico», a qual não tinha ocorrido à data da prolação do presente parecer. Esse diploma fundiu a «Secretaria-Geral do Ministério da Educação» e a «Secretaria-Geral do Ministério da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior», sem consequências ao nível da EMEC (artigo 31.º, n.º 2, al. a), e n.º 3, al. a), do Decreto-Lei n.º 125/2011).
[5] No artigo 3.º do Decreto-Lei n.º 648/76 prescreve-se que constituem receitas próprias da EMEC:
«a) O produto da venda de publicações editadas e dos serviços prestados na execução de trabalhos gráficos que lhe forem confiados pelos serviços centrais;
«b) As comparticipações ou subsídios concedidos por entidades públicas ou privadas;
«c) As heranças, legados, doações atribuídas por entidades oficiais ou particulares e legalmente aceites;
«d) Os rendimentos de bens próprios, incluindo os proventos da venda de material considerado dispensável ou incapaz;
«e) Os saldos da gerência dos anos anteriores;
«f) Quaisquer outras receitas permitidas por lei.»
[6] Artigo 5.º do Decreto-Lei n.º 648/76.
[7] Cf. supra § II.1.
[8] O Ministério em 1972 era denominado Ministério da Educação Nacional e em 1976 era designado como Ministério da Educação e Investigação Científica.
[9] Artigo 4.º, alínea a), do Decreto-Lei n.º 125/2011.
[10] O Decreto-Lei n.º 201/72 veio a ser revogado pelo Decreto-Lei n.º 134/93, de 26 de Abril, que deixou de compreender qualquer referência à EMEC. Por seu turno, no Decreto-Lei n.º 143/96, de 26 de agosto, que revogou o Decreto-Lei n.º 134/93 passaram a constar várias regras sobre a EMEC (em particular nos artigos 6.º, 21.º e 32.º), bem como no Decreto-Lei n.º 208/2002, de 17 de outubro, que ao aprovar a nova lei orgânica do Ministério revogou a anterior lei orgânica da Secretaria-Geral (art. 7.º) e ainda na penúltima lei orgânica do ministério aprovada pelo Decreto-Lei n.º 213/2006, de 27 de outubro – cujo artigo 24.º já prescrevia que «até à redefinição do respetivo estatuto jurídico, a Editorial do Ministério da Educação continua a reger-se pelas disposições normativas que lhe são aplicáveis». Merece, ainda, ser assinalado que, atualmente a EMEC se apresenta como entidade sujeita à tutela e superintendência do Ministro respetivo, pois, embora as duas últimas leis orgânicas do Ministério (de 2006 e de 2011) nada prescrevam em termos especificados, esse perfil foi estabelecido na lei orgânica de 2002, artigo 7.º, al. c), do Decreto-Lei n.º 208/2002, cuja vigência subsiste por força do disposto nos artigos 24.º do Decreto-Lei n.º 213/2006 e 28.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 125/2011. Pelo despacho n.º 4503/2012, de 21 de março (publicado no Diário da República, II.ª Série, de 29 de março), o Ministro delegou, com faculdade de subdelegação, na Secretária de Estado do Ensino Básico e Secundário, os atos relacionados com a área do ensino básico e secundário relativos à EMEC e a competência para designação dos titulares dos cargos de direção superior de 2.º grau da EMEC.
[11] Cf. artigo 28.º, n.º 2, do Decreto-Lei n.º 125/2011. Vd., ainda o disposto nos artigos 6.º, n.º 4, e 32.º, n.º 2, do revogado Decreto-Lei n.º 143/96, no artigo 4.º, n.º 2, do Decreto Regulamentar n.º 18/2012, de 31 de janeiro, reiterou-se a solução de o secretário-geral do MEC ser por inerência o presidente do Conselho de Administração da EMEC.
[12] Curso de Direito Administrativo, vol. I, Almedina, Coimbra, 3.ª ed., 2006, p. 222.
[13] Designadamente os rendimentos de bens próprios, incluindo os proventos da venda de material. Refira-se que a Secretaria-Geral do MEC também beneficia da suscetibilidade de receitas próprias que não lhe sejam atribuídas pelo Orçamento de Estado, cf. artigo 6.º, n.º 2, do Decreto Regulamentar n.º 18/2012.
[14] Op. cit., p. 385.
[15] Cf. supra nota 10.
[16] Cf. supra § II.1. Recorde-se que o Governo além da função administrativa tem a função legislativa e na lei orgânica do MEC aprovada em 2011, embora ressalve que subsistem em vigor as disposições normativas aplicáveis à EMEC também refere que a mesmo só se manterá «até à redefinição do respetivo estatuto jurídico [da EMEC]».
[17] Este padrão fixado no estatuto de 1978 vigorava à data da constitucionalização do princípio em 1989 e subsiste até hoje. A formulação inicialmente consagrada na Lei nº 39/78, de 5-7 foi mantida nas Leis nº 46/86, de 15-10 e nº 60/98 de 27-8, com a única precisão verificada nesta última que passou a mencionar apenas os magistrados do Ministério Público deixando de referir os agentes do Ministério Público.
[18] Cf. listagem enunciada no sítio eletrónico da EMEC (que consta de http://www.eme.pt/gca/?id=91 e foi consultada pelo relator em 21-9-1012).
[19] Para empregar a terminologia de Alexandra Leitão, Contratos interadministrativos, Almedina, Coimbra, 2011, p. 21. Não tendo o Conselho Consultivo sido convocado nesta sede para, caso conclua que não se aplica o CCP, desenvolver quaisquer considerandos sobre o tema relativo às «regras aplicáveis à execução, à validade, à modificação e à extinção dos contratos interadministrativos» que, de acordo com a mesma autora: «Têm de ser construídas a partir do regime jurídico dos contratos celebrados com particulares, tendo em atenção, contudo, as várias derrogações e adaptações que, no seu conjunto, contribuem para a autonomização dogmática da figura dos contratos interadministrativos relativamente aos restantes contratos celebrados pela Administração» (idem, ibidem) – cf. supra § II.2.3.
[20] À data da elaboração deste parecer aqueles pareceres não se encontram acessíveis na base de dados aberta ao público sita em http://www.dgsi.pt/pgrp.nsf.
[21] Direito Constitucional e Teoria da Constituição, Almedina, Coimbra, 7.ª ed., 2003, p. 640.
[22] Concursos e outros procedimentos de contratação pública, Almedina, Coimbra, 2011, p. 91.
[23] Constituição da República Portuguesa – Anotada, vol. II, Coimbra, Coimbra Editora, 2010 (4ª ed.), p. 316
[24] Op. cit., pp. 813-814.
[25] As diversas vertentes jurídicas que podem ser suscitadas neste domínio para além da aplicabilidade do CCP não integram, contudo, o objeto deste parecer (cf. supra § II.1 e, fundamentalmente, § II.2.3).
[26] Parecer que ainda não se encontra acessível na base de dados aberta ao público sita em http://www.dgsi.pt/pgrp.nsf (estando, apenas, na «área reservada»).
[27] Mark Kirkby, «Aplicabilidade objetiva e subjetiva das novas regras da contratação pública», Revista da Faculdade de Direito de Lisboa, vol. 49, n.ºs 1/2 (2008), p. 163.
[28] Cf. sobre o tema, com amplas referências bibliográficas, Alexandra Leitão, op. cit., pp. 173-184.
[29] Cf. Gonçalo Guerra Tavares / Nuno Monteiro Dente, Código Contratos Públicos, vol. I, Coimbra, Almedina, 2009, pp. 809-810. Com mais desenvolvimento sobre este ponto e os nódulos problemáticos suscitados pela opção legislativa, cf. ainda J. C. Vieira de Andrade, «A propósito do regime do contrato administrativo no “Código dos Contratos Públicos”», Estudos de contratação pública, vol. II, Coimbra Editora, Coimbra, 2010, pp. 7-14, para quem «é desarmónica e imprópria a distinção cortante do Código entre dois mundos» (op. cit., p. 13).
[30] Assim Rui Medeiros, «Âmbito do novo Regime da Contratação Pública à luz do Princípio da Concorrência», Cadernos de Justiça Administrativa, n.º 69 (2008), p. 3.
[31] «Âmbito de Aplicação Subjetiva do Código dos Contratos Públicos», Cadernos de Justiça Administrativa, n.º 64 (2007), p.10.
[32] Cf. §§ 53 e 54 das conclusões do advogado-geral no processo n.º C-107/98.
[33] § 51 do acórdão.
[34] § 48 do acórdão.
[35] § 49 das conclusões da advogada-geral.
[36] § 42 das referidas alegações.
[37] § 57 do acórdão proferido em 13 de outubro de 2005 no processo n.º C458/03.
[38] «Appalti in house, concessioni in house ed esternalizzazione», Rivista Italiana di Diritto Pubblico Comunitario, ano XI, n. 3/4 (2001), p. 496.
[39] Idem, ibidem.
[40] Esse autor considera que a «sujeição às exigências postas pela necessária construção de um mercado concorrencial […] só subsiste nas hipóteses em que aquela não opte, discricionariamente, pelo recurso aos seus próprios serviços para, em regime de auto-produção, satisfazer, por si própria, as respetivas necessidades» - «Contratação in house: Entre a liberdade de auto-organização administrativa e a liberdade de mercado», in AAVV, Estudos de contratação pública, vol. I, Coimbra Editora, Coimbra, 2008, pp. 119-120. Autor que, depois de invocar doutrina italiana e francesa no mesmo sentido (op. cit., pp. 120-122) resume: «A existência de personalidade jurídica oferece-se assim como o limiar crítico a partir do qual faz sentido aferir se o ente em questão atua (ou não) como um sujeito terceiro em relação à administração pública adjudicante. A montante, isto é, perante a ausência de personalidade jurídica, o que temos são simples unidades funcionais que devem ser assimiladas a partes integrantes da estrutura interna da organização pública» (op. cit., p. 123).
[41] Mark Kirkby relativamente aos «acordos celebrados entre dois ou mais órgãos, estruturas ou serviços que comungam da mesma personalidade jurídica, i.e., da personalidade jurídica da pessoa coletiva pública em que se integram» conclui: «Sendo relativamente frequente a ocorrência destes fenómenos de concertação administrativa interna, por vezes amparados em previsão normativa específica, por vezes decorrendo do exercício corrente de competências administrativas de natureza dispositiva, é pacífico que não consubstanciam verdadeiros contratos e, consequentemente, não são “contratos públicos” sujeitos às regras da contratação pública» (op. cit., p. 163).
[42] «A outra condição para que uma relação se possa qualificar como contratual é a existência de duas entidades distintas, ambas com personalidade jurídica. Por isso, uma relação jurídica que tenha por objeto a prestação de bens e serviços só não terá natureza contratual se a entidade prestadora não tiver personalidade jurídica» («Contratos de prestação de bens e serviços celebrados entre o Estado e as empresas públicas e relações ‘in house’», Cadernos de Justiça Administrativa, n.º 65 (2007), p. 13. Mais à frente essa autora refere: «Ora, uma relação que tenha por objeto a prestação de bens e serviços só não assume natureza contratual quando se trate de uma relação “in house providing” em sentido estrito, isto é, uma operação meramente interna, que se estabelece entre um organismo de direito público e um dos seus serviços sem personalidade jurídica. Pelo contrário, as operações “quase-internas”, ou relações “in house” em sentido amplo são, na minha opinião, verdadeiros contratos administrativos, mesmo que estejam subtraídas às regras da contratação pública» (op. cit., p. 14).
[43] Que considerou o legislador português «não ousa» «forjar novas soluções não testadas na jurisprudência comunitária ou dificilmente compatíveis com o seu estado atual» (op. cit., p. 12).
[44] Embora não se refiram diretamente às relações interorgânicas, na sua interpretação do artigo 6.º, n.º 1, do CCP destacam o respetivo carácter intersubjetivo: «Sendo uma norma inclusiva (e objetiva), ela tem simultaneamente carácter restritivo, como já o inculca, aliás, a respetiva epígrafe – porquanto o regime do Código só se aplica a contratos com esse objeto (não a quaisquer outros) entre essas entidades – e carácter intersubjetivo, valendo exclusivamente para os contratos celebrados entre elas, não já quando se trate de contratos entre elas e terceiros, entre elas e outras entidades adjudicantes (as do art. 2.º/2 ou do art. 7.º/1) ou de contratos só entre estas últimas» (op. cit., p. 136).
[45] Os princípios comunitários na contratação pública, Coimbra Editora, Coimbra, 2007, p. 477 (louvando-se das conclusões do advogado-geral Cosmas em Teckal como voltou a fazer em «Contratos públicos ‘in house’ – em especial as relações contratuais entre municípios e empresas municipais e intermunicipais», Direito Regional e Local, Outubro / Dezembro, 2007, p. 36., sobre a conformação do então projeto de CCP com a jurisprudência do TJCE, cf. op. cit., p. 41).
[46] Cf. § 4.4 do referido parecer que foi solicitado pelo Procurador-Geral da República e ainda não se encontra acessível na base de dados aberta ao público sita em http://www.dgsi.pt/pgrp.nsf (estando, apenas, na designada «área reservada»).
[47] Alexandra Leitão no seu estudo sobre contratos interadministrativos, em que adota um conceito abrangente de relações intersubjetivas e de algumas tipologias de relações interorgânicas, preconiza, nomeadamente, que: «Os contratos entre entidades administrativas são, da perspetiva da Ciência da Administração, uma alternativa ao outsourcing, permitindo encontrar dentro da própria Administração Pública formas contratualizadas de prossecução de interesses públicos, através dos quais não só se evita a duplicação de tarefas, como se obtém uma economia de escala ao nível dos recursos humanos e financeiros. […] [Os] testes de eficácia não podem centrar-se apenas numa perspetiva economicista, devendo ser ponderados outros fatores: a natureza da ação desenvolvida; a necessidade de evitar a “descapitalização” dos serviços públicos pela sistemática redução dos meios técnicos, materiais e humanos; bem como a introdução de elementos de ordem política, social e valorativa, designadamente, o nível de qualidade e de satisfação proporcionados pelos serviços prestados. A apreciação de todos estes aspetos não pode deixar de conduzir a uma decisão político-administrativa essencialmente discricionária, ainda que com alguns elementos vinculados» (Contratos interadministrativos, cit., p. 589).