Pareceres PGR

Parecer do Conselho Consultivo da PGR
Nº Convencional: PGRP00003386
Parecer: P000312016
Nº do Documento: PPA23032017003100
Descritores: DIREITOS DE AUTOR
OBRA PROTEGIDA
EXAME
PROVA DE CLASSIFICAÇÃO
AVALIAÇÃO EXTERNA DOS ALUNOS
OBRA INTELECTUAL
DOCUMENTO ADMINISTRATIVO
ACESSO A DOCUMENTOS
MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO
INSTITUTO PÚBLICO
Conclusões: 1. A avaliação externa de alunos dos ensinos básico e secundário constitui uma função pública associada ao exercício de poderes públicos.
2. Os enunciados das provas de aferição e provas finais de ciclo do ensino básico e dos exames nacionais do ensino secundário integram decisões administrativas no âmbito de um procedimento complexo de avaliação externa de alunos que constitui uma função «da responsabilidade dos serviços ou entidades do Ministério da Educação designados para o efeito» nos termos, respetivamente, do disposto nos artigos 24.º, n.º 2, alínea b), e 29.º, n.º 2, alínea b), do Decreto-Lei n.º 139/2012, de 5 de julho (na sua redação atual, após a terceira revisão operada pelo Decreto-Lei n.º 17/2016, de 4 de abril).
3. Procedimento complexo de avaliação externa que compreende várias etapas em que os textos dos enunciados das provas e exames nacionais integram decisões com eficácia plurisubjetiva conformadoras de subsequentes atos administrativos decisórios de classificação, reapreciação de provas e julgamento de reclamações.
4. O interesse público da função de avaliação externa de alunos dos ensinos básico e secundário, em que a elaboração e difusão dos enunciados das provas e exames nacionais constituem etapas fundamentais, revela-se, nomeadamente, nas componentes de classificação e certificação dos alunos abrangidos.
5. Os enunciados das provas e exames nacionais de avaliação externa na medida em que constituem o resultado do esforço intelectual desenvolvido pelas equipas de professores designadas para a sua elaboração preenchem o conceito amplo de obra literária consagrado no artigo 2.º, n.º 1, da Convenção de Berna para a Proteção das Obras Literárias e Artísticas, concluída a 9 de setembro de 1886, na versão revista em Paris a 24 de julho de 1971 aprovada para adesão pelo Decreto n.º 73/78, de 26 de julho (Convenção de Berna), e no artigo 1.º, n.º 1, do Código do Direito de Autor e dos Direitos Conexos (CDADC).
6. A Convenção de Berna remeteu para as legislações dos países da União a determinação da proteção a conceder aos textos oficiais de carácter administrativo (nos termos do artigo 2.º, n.º 4, do texto desse tratado).
7. O artigo 8.º, n.º 1, do CDADC determina que os textos de relatórios ou decisões administrativas de quaisquer órgãos ou autoridades do Estado ou da Administração estão excluídos da proteção dos direitos patrimoniais de autor regulada por esse código.
8. Consequentemente, os textos dos enunciados das provas e exames nacionais relativos à avaliação externa de alunos dos ensinos básico e secundário da responsabilidade de serviços ou entidades do Ministério da Educação designados para o efeito não beneficiam da proteção jusautoral conferida pelo CDADC.
9. A circunstância de os enunciados das provas e exames nacionais relativos à avaliação externa de alunos dos ensinos básico e secundário estarem excluídos da proteção de direitos de autor regulada pelo CDADC não obsta a que as compilações sistemáticas ou anotadas desses textos recebam tutela, ao abrigo do disposto no artigo 3.º, n.º 1, alínea c), já que a proteção dessas obras derivadas não depende da recusada para as respetivas obras preexistentes.
10. Sendo os enunciados das provas e exames nacionais produzidos para utilização oficial por ente público no procedimento de avaliação externa dos alunos dos ensinos básico e secundário, o artigo 8.º, n.º 2, do CDADC exclui qualquer direito jusautoral suscetível de condicionar a subsequente reprodução bem como qualquer direito patrimonial dos autores ou titulares das obras preexistentes relativamente a obras derivadas (protegidas ao abrigo do artigo 3.º, n.º 1, alínea c), do CDADC) que utilizem aquelas em compilações sistematizadas ou anotadas.
11. Os enunciados das provas e exames nacionais relativos à avaliação externa de alunos dos ensinos básico e secundário integram o conceito de documentos na posse de organismos do setor público do Estado português estando, nessa medida, abrangidos pelo conjunto mínimo de regras aplicáveis à reutilização de documentos estabelecidas na Diretiva 2003/98/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 17 de novembro de 2003, revista pela Diretiva 2013/37/UE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 26 de junho de 2013.
12. As provas e exames nacionais relativos à avaliação externa de alunos dos ensinos básico e secundário que estejam na posse do Instituto de Avaliação Educativa, I.P. (IAVE) integram o conceito de documento administrativo cuja reutilização se encontra regulada no regime de acesso à informação administrativa e ambiental e de reutilização dos documentos administrativos aprovado pela Lei n.º 26/2016, de 22 de agosto, atentas as disposições conjugadas dos artigos 3.º, n.º 1, alíneas a) e g), e 4.º, n.º 1, desse diploma.

Texto Integral:

Senhor Secretário de Estado da Educação,
Excelência:

I. Relatório
A consulta foi determinada por despacho de Sua Excelência o Senhor Secretário de Estado da Educação com indicação do seguinte assunto: A integração dos enunciados das provas e exames nacionais no conceito de obra coletiva suscetível de proteção jusautoral e respetiva titularidade[1].
O processo foi distribuído com a natureza de urgente à primitiva relatora em 3 de novembro 2016.
Na sequência de discussão e não aprovação do projeto apresentado pela relatora originária, na sessão ordinária do Conselho Consultivo de 3 de março de 2017[2], o projeto foi redistribuído a novo relator.
Cumpre emitir parecer.

II. Fundamentação
§ II.1 Objeto do parecer e enquadramento metodológico
A questão objeto de consulta foi colocada pelo membro do Governo competente ao abrigo do disposto no artigo 37.º, alínea a), do Estatuto do Ministério Público (EMP).
A consulta visa a pronúncia sobre uma questão jurídico-prática no quadro funcional da Administração Pública.
A entidade consulente identifica as dúvidas objeto da consulta, depois de apresentação do tema, nos seguintes termos:
«Neste quadro, por se tratar de questão de relevância económica para as instituições envolvidas, com amplo interesse objetivo constituindo um caso "tipo" que se repete anualmente e previsivelmente continuará a repetir-se no futuro e porque não se conhece pronúncia do conselho consultivo sobre a matéria, solicita-se a V. Ex.ª urgência na emissão do parecer, no sentido de permitir responder às seguintes questões:
«(i) Os enunciados das provas e dos exames nacionais são suscetíveis de integrarem o conceito de obra coletiva previsto na alínea b), do n.º 1 do artigo 16.º do Código dos Direitos de Autor e Direitos Conexos, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 63/85, de 14 de março, na redação vigente, beneficiando de proteção jus-autoral?
«(ii) Em caso afirmativo, a quem cabe a titularidade dos direitos de autor? Ao Ministério da Educação ou ao IAVE, l.P.?
«(iii) Constitui violação dos direitos de autor previstos no Código dos Direitos de Autor e Direitos Conexos, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 63/85, de 14 de março, na redação vigente, a publicação e comercialização de coletâneas de enunciados de exames nacionais com as correspondentes resoluções por entidade distinta do titular dos direitos de autor?»[3].
A única documentação de suporte da consulta foi a fundamentação da consulta subscrita por Sua Excelência o Senhor Secretário de Estado da Educação, texto que se apresenta como elemento nuclear na delimitação do objeto da consulta, orientada pelo princípio de que o enquadramento jurídico das questões suscitadas constitui responsabilidade do Conselho Consultivo, de acordo com uma matriz vinculada aos princípios da legalidade e objetividade.
Sendo o parecer conformado pela teleologia e balizas das dúvidas suscitadas pela entidade consulente, a ponderação necessária para as respostas deve ser objeto de análise própria pelo Conselho Consultivo na fundamentação que se segue. Plano em que se deve realçar um outro aspeto: A consulta que originou este parecer visa um comando relativo a condições de ação e não a objetivos, o que obrigatoriamente determina o trabalho a empreender pelo Conselho Consultivo, na medida em que se deve, em sintonia com a vocação técnica deste ente consultivo, cingir às pautas de interpretação do direito positivo.
A estrutura do parecer vai ser determinada pelo escopo da consulta e pautas acabadas de expor, desdobrando-se pelas seguintes duas partes:
§ II.2 Provas de aferição, provas finais de ciclo e exames nacionais no âmbito do procedimento complexo de avaliação externa de alunos;
§ II.3 Os textos dos enunciados das provas de aferição, provas finais de ciclo e exames nacionais dos ensinos básico e secundário e a proteção dos direitos de autor;
§ II.4 Enunciados das provas e exames nacionais como documentos administrativos e suscetibilidade de reutilização.
Depois da fundamentação serão enunciadas as conclusões do parecer visando responder às questões colocadas na consulta.

§ II.2 Provas de aferição, provas finais de ciclo e exames nacionais no âmbito do procedimento complexo de avaliação externa de alunos
§ II.2.1 A consulta tem como objeto um problema específico sobre hipotética proteção jusautoral dos «enunciados das provas e dos exames nacionais».
As provas e exames objeto da consulta integram o sistema de «avaliação externa» dos alunos dos ensinos básico e secundário, o qual já foi objeto de apreciação por este ente consultivo no parecer n.º 23/2015, de 11-9-2015[4], sobre a «atribuição de poder disciplinar ao Estado quanto à atividade desenvolvida por docentes do ensino particular e cooperativo não superior “no âmbito da avaliação externa dos alunos”».
Como então se destacou, existe um procedimento complexo de avaliação externa de alunos que constitui uma função «da responsabilidade dos serviços ou entidades do Ministério da Educação e Ciência designados para o efeito». Matéria regulada pelo diploma que estabelece os princípios orientadores da organização e da gestão dos currículos dos ensinos básico e secundário, da avaliação dos conhecimentos a adquirir e das capacidades a desenvolver pelos alunos e do processo de desenvolvimento do currículo dos ensinos básico e secundário, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 139/2012, de 5 de julho[5].
Em 2016 foram operadas alterações na avaliação externa ao nível do ensino básico que não modificaram as coordenadas centrais do sistema relevantes para o tema da consulta, preservando a responsabilidade dos serviços ou entidades do Ministério da Educação e Ciência designados para a avaliação externa[6].
Ao nível global, de acordo com as regras atualmente vigentes, o sistema de avaliação externa envolve três tipologias de provas: a) Provas de aferição; b) Provas finais de ciclo; c) Exames finais nacionais.
Tipologias de provas de avaliação externa de alunos que atualmente se repartem da seguinte forma pelos dois níveis de ensino não superior:
1) No ensino básico a avaliação externa compreende atualmente:
1.1) Provas de aferição, de aplicação universal e obrigatória, a realizar no final do 2.º, do 5.º e do 8.º anos de escolaridade[7];
1.2) Provas finais de ciclo, a realizar no final do 9.º ano de escolaridade[8].
2) No ensino secundário a avaliação externa é «concretizada através da realização de provas e de exames finais nacionais»[9].
§ II.2.2 No parecer n.º 23/2015 a análise do sistema de avaliação externa de alunos dos ensinos básico e secundário foi enquadrada pela necessidade de, relativamente ao poder disciplinar sobre os docentes das escolas do Ensino Particular e Cooperativo (EPC) de nível não superior, empreender a compreensão sistemático-teleológica da reserva estadual de um núcleo limitado à «matéria relativa à avaliação externa dos alunos» que compete à Inspeção-Geral da Educação e Ciência (IGEC).
Importará relembrar a análise então empreendida, sem olvidar que o tema da presente consulta não compreende entes privados antes se reporta a uma atividade desenvolvida pelo Instituto de Avaliação Educativa, I.P. (IAVE) que constitui um instituto público com competências legais próprias no âmbito da avaliação externa de alunos.
Refira-se que o IAVE sendo «um instituto público de regime especial, integrado na administração indireta do Estado, dotado de autonomia pedagógica, científica, administrativa e financeira e de património próprio» (nos termos do artigo 1.º do Decreto-Lei n.º 102/2013, de 25 de julho), veio invocar como argumento de alegados direitos jusautorais sobre os enunciados das provas e exames nacionais que é uma «pessoa jurídica distinta do Estado» e que os respetivos trabalhadores estão «vinculados» ao IAVE «e não ao Estado».
Na fundamentação da consulta apresentada pela entidade consulente é contraposto à leitura apresentada pelo IAVE, nomeadamente, que «uma larga maioria dos trabalhadores que exercem funções no lAVE, I.P., possuem vínculo de emprego público titulado por contrato de trabalho por tempo indeterminado com o Estado, ou seja, trata-se de docentes de carreira pertencentes aos quadros dos Agrupamentos de Escola ou de Escola não agrupada ou dos Quadros de Zona Pedagógica do Ministério da Educação, os quais exercem funções no IAVE, I.P., em regime de mobilidade, a tempo inteiro ou a tempo parcial, cujos vencimentos são pagos com dotações provenientes do orçamento de Estado (cf. n.º 2 e 3 do artigos 18.º e 20.º ambos do Decreto-Lei n.º 102/2013)». Sublinhando-se, ainda, que «cabe ao membro do Governo definir os instrumentos de avaliação que pretende aplicar e as especificações técnicas a que os mesmos devem obedecer».
Para as questões objeto da consulta, como se verá de seguida, a natureza do vínculo laboral dos trabalhadores do IAVE não se apresenta relevante. Nessa medida, apenas se justifica deixar referido que mesmo aqueles trabalhadores do IAVE que não têm contrato com o Estado pessoa coletiva, enquanto trabalhadores de instituto público têm o estatuto de trabalhadores em funções públicas com a consequente aproximação estatutária à maioria dos anteriormente designados como funcionários e agentes da administração central e local, desde o terramoto legislativo operado em 1 de janeiro de 2009 pelos novos diplomas sobre os regimes de vinculação, de carreiras e de remunerações dos trabalhadores que exercem funções públicas, e o regime do contrato de trabalho em funções públicas aprovados, respetivamente, pela Lei n.º 12-A/2008, de 27 de fevereiro, e pela Lei n.º 59/2008, de 11 de setembro — a transição de estatutos nos institutos públicos determinada pela reforma de 2008 foi objeto de apreciação pelo Conselho Consultivo, nomeadamente, no recente parecer n.º 14/2016, de 14-7-2016[10]. Posteriormente, os dois diplomas de 2008 foram revogados pela Lei Geral do Trabalho em Funções Públicas (LGT) aprovada pela Lei n.º 35/2014, de 20 de junho, que não alterou (apenas reforçou) a dimensão unitária dos estatutos dos trabalhadores em funções públicas de institutos públicos e dos trabalhadores de serviços da administração direta do Estado, concentrados num único diploma.
§ II.2.3 Fundamental para a matéria objeto da consulta apresenta-se o enquadramento dos enunciados de provas e exames nacionais no procedimento de avaliação externa de alunos. Plano em que se reitera o que se destacou no parecer n.º 23/2015: Constitui um procedimento complexo de avaliação externa conformado pelo interesse público da referida função que resulta evidente tanto na componente de certificação como de classificação.
No parecer n.º 23/2015 concluiu-se, nomeadamente, que «a intervenção dos docentes do ensino particular e cooperativo no procedimento de avaliação externa de alunos dos ensinos básico e secundário foi ponderada pelo legislador como um campo em que a deflação de poderes disciplinares estaduais sobre os referidos professores devia ser contida por força da especificidade dessa função pública associada ao exercício de poderes públicos»[11].
Relativamente à componente orgânica do procedimento de avaliação externa, retomando as palavras do parecer n.º 23/2015, «emerge a importância da Direcção-Geral da Educação (DGE), que é o serviço central de execução das políticas relativas às componentes pedagógica e didática da educação pré-escolar, dos ensinos básico e secundário e da educação extraescolar e de apoio técnico à sua formulação, incindindo, sobretudo, nas áreas do desenvolvimento curricular, dos instrumentos de ensino e avaliação e dos apoios e complementos educativos»[12].
Continuando a seguir os destaques do parecer n.º 23/2015, a DGE atualmente tem uma estrutura interna mista e integra o Júri Nacional de Exames (JNE), sem prejuízo da autonomia técnica desta entidade[13].
A Direção de Serviços do JNE constitui, por seu turno, uma «unidade orgânica nuclear da DGE» com competência central em matéria de avaliação externa de alunos dos ensinos básico e secundário[14].
A concretização do exercício das competências do JNE em matéria de avaliação externa revela-se nos desenvolvimentos regulamentares sobre essa entidade e as provas de avaliação externa.
Para ilustrar as dinâmicas e interações da law in action neste domínio podem referir-se o Regulamento do JNE aprovado pelo Despacho normativo n.º 1-D/2016, de 4 de março (e que constitui o respetivo anexo I) e o Regulamento das provas de avaliação externa e das provas de equivalência à frequência dos ensinos básico e secundário aprovado pelo Despacho normativo n.º 1-A/2017, de 10 de fevereiro (que referiremos de seguida como Regulamento das Provas de Avaliação Externa), os quais se encontram atualmente em vigor e, no plano das dinâmicas procedimentais, são similares aos que os precederam no quadro do atual regime legal de avaliação externa[15].
No plano orgânico, o JNE é composto pela Comissão Permanente, pelos coordenadores das delegações regionais e pelos responsáveis dos agrupamentos de exames (artigo 2.º, n.º 1, do Regulamento do JNE de 2016).
JNE cujas competências envolvem múltiplas interações e articulações com o IAVE, nomeadamente quanto aos procedimentos adequados para garantir a segurança, a confidencialidade e a equidade das provas e para responder à ocorrência de circunstâncias excecionais durante o processo de provas e exames, para garantir a equidade nas provas de avaliação externa, sempre que tal se justifique (artigo 5.º, n.º 1, alínea k), e n.º 2, do Regulamento do JNE). Dimensões operativas que podem incidir na alteração de elementos das próprias provas, máxime a necessidade de anulação de alguma questão ou item constante do enunciado das provas de avaliação externa durante o processo de realização e de classificação das provas, em que o Presidente do JNE determinará, em articulação com o IAVE «a medida considerada mais adequada, nomeadamente a aplicação de um fator de majoração» (artigo 5.º, n.º 4, do Regulamento do JNE).
Interpenetração funcional das etapas do procedimento de avaliação relativas à elaboração dos enunciados e critérios das provas e à respetiva realização e classificação que determina também envolvimentos do IAVE com o JNE nessa segunda vertente. Prescrevendo-se que para a distribuição do serviço de classificação de provas, o JNE solicita aos diretores de escolas do ensino público e do ensino particular e cooperativo a indicação de professores classificadores, por cada disciplina com provas de avaliação externa, de acordo com critérios definidos pelo JNE, em articulação com o IAVE e que os agrupamentos do JNE constituem bolsas de professores classificadores de provas de avaliação externa com base nos docentes indicados pelos diretores de escolas, de acordo com critérios fixados pelo JNE, em articulação com o IAVE — artigo 6.º, n.os 4 e 5, do Regulamento do JNE.
A missão legal do IAVE relativa à elaboração das provas de avaliação externa deve, assim, ser compreendida e encadeada no quadro de etapas do procedimento complexo de avaliação externa de alunos[16].
Procedimento complexo em que o exercício da função pública de avaliação externa compreende o exercício de poderes públicos, nomeadamente, na calendarização das provas[17] e, na etapa que se segue, a elaboração das provas pelo IAVE[18].
Interação de etapas em que os enunciados das provas de avaliação externa integram, de forma inequívoca, decisões administrativas com eficácia intersubjetiva que vão conformar de forma estrita a realização das provas pelos alunos (cujas respostas aos itens e questões dos enunciados das provas vão determinar a respetiva avaliação externa) e os subsequentes atos administrativos de classificação (que podem envolver, depois da primeira classificação[19], subprocedimentos sucessivos de reapreciação[20] e reclamação[21]). Deve referir-se que o procedimento normativamente regulado de avaliação externa não compreende uma decomposição analítica de etapas relativas à elaboração e aprovação de enunciados e a fórmula adotada no sentido de que os enunciados integram decisões administrativas visa, exclusivamente, sublinhar a dimensão conceptual fundamental, e suficiente na economia do parecer, para a matéria objeto de consulta (supra § II.1 e infra § II.3.3), sem aprofundar os problemas definitórios e de qualificação dos enunciados como corporização de decisões administrativas.
Elaboração de provas que compreende uma pluralidade de vertentes em conexão funcional com os enunciados, em particular a Informação-Prova[22], e «os critérios de classificação das provas, os quais são vinculativos e devem ser obrigatoriamente seguidos na classificação das provas de avaliação externa e na reapreciação e reclamação das provas finais e dos exames finais nacionais»[23].
Critérios de classificação cujo sentido e valor prescritivo se apresenta indissociável da força e valor prescritivo dos enunciados das provas.
Na avaliação externa de alunos dos ensinos básico e secundário um dos principais poderes públicos cujo exercício vai conformar os atos subsequentes de classificação e certificação é, assim, a elaboração dos enunciados.
No quadro da função pública de avaliação externa de alunos, o relevo das decisões administrativas com eficácia plurisubjetiva relativas à elaboração e aprovação das provas determinou a «criação de um organismo com a necessária capacidade técnica e acrescida autonomia e independência do poder político», como se destaca no preâmbulo do Decreto-Lei n.º 102/2013 que criou o IAVE como «um organismo central com jurisdição sobre todo o território nacional» (artigo 2.º, n.º 1).
Pelo que, a atribuição ao IAVE da missão de elaborar as provas de avaliação externa é indissociável da respetiva natureza de poder público, sendo mesmo o resultado do relevo acrescido reconhecido pelo ordenamento jurídico à função pública de avaliação externa de alunos no âmbito da qual as elaborações das provas integram decisões administrativas fundamentais[24].
Os poderes públicos atribuídos ao IAVE integram a elaboração de provas no processo complexo de avaliação externa com etapas a jusante e a montante. Daí que, entre as atribuições legais do IAVE, além do planeamento, conceção e validação dos instrumentos de avaliação externa de alunos, nomeadamente, provas finais e exames nacionais, definindo os respetivos critérios de classificação (alínea a) do n.º 2 do artigo 3.º do Decreto-Lei n.º 102/2013) se destaque, ainda, o acompanhamento do processo de aplicação e de classificação dos instrumentos de avaliação externa, no âmbito da missão que lhe está atribuída, em articulação «com os demais serviços e organismos» do Ministério da Educação (alínea d) do n.º 2 do artigo 3.º do Decreto-Lei n.º 102/2013).
Marca funcional relativa a poderes públicos que sustenta a independência pedagógica, cientifica, técnica e profissional do IAVE no exercício das suas atividades (artigo 4.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 102/2013), uma independência que tem de ser exercida «nos termos da lei» e «com respeito pela política de educação fixada pelo membro do Governo responsável pela área da educação» (artigo 4.º, n.º 4 do Decreto-Lei n.º 102/2013).
Valores relativos à função pública de avaliação externa que determinam que o desenvolvimento da missão do IAVE de «planeamento, conceção e validação dos instrumentos de avaliação que lhe forem solicitados pelo membro do Governo responsável pela área da educação» seja realizada de acordo com cartas de solicitação objeto de publicitação na página eletrónica do IAVE, nos termos do artigo 5.º do Decreto-Lei n.º 102/2013[25].
Importa, ainda, referir que na articulação do IAVE «com os demais serviços e organismos do Ministério da Educação», de acordo com a fórmula do artigo 3.º, n.º 2, alínea d), do Decreto-Lei n.º 102/2013, nas primeiras etapas do procedimento de avaliação externa dos alunos existe também uma interação com a Editorial do Ministério da Educação enquanto entidade responsável pela impressão dos enunciados das provas[26]. Editorial que, como se concluiu no parecer n.º 18/2012, de 26-11-2012[27], «constitui um organismo da Administração Pública integrado no Ministério da Educação sem personalidade jurídica»[28].
Procedimento de avaliação externa em que os atores ao nível das escolas interagem com a Editorial do Ministério da Educação nomeadamente para efeitos do cálculo do número de cópias de enunciados necessárias[29].
§ II.2.4 Em resumo, o sistema de avaliação externa compreende um conjunto de etapas e atores sendo todos eles participantes na respetiva função pública[30].
Relativamente aos enunciados das provas de aferição e provas finais de ciclo do ensino básico e dos exames nacionais do ensino secundário os mesmos integram decisões administrativas no âmbito de um procedimento complexo de avaliação externa de alunos. A elaboração dos enunciados das provas pelo IAVE constitui o exercício de um poder público outorgado por lei integrado no processo complexo de avaliação externa, em que aquele ente público se tem de articular com os demais serviços e organismos do Ministério da Educação responsáveis legalmente.

§ II.3 Os textos dos enunciados das provas de aferição, provas finais de ciclo e exames nacionais dos ensinos básico e secundário e a proteção dos direitos de autor
§ II.3.1 O direito português em matéria de proteção de direitos de autor é conformado pelo Ato de Paris da Convenção de Berna para a Proteção das Obras Literárias e Artísticas, concluída a 9 de setembro de 1886, completada em Paris a 4 de Maio de 1896, revista em Berlim a 13 de novembro de 1908, completada em Berna a 20 de março de 1914 e revista em Roma a 2 de Junho de 1928, em Bruxelas a 26 de Junho de 1948, em Estocolmo a 14 de Julho de 1967 e em Paris a 24 de Julho de 1971 (referida de ora em diante por Convenção de Berna) aprovada para adesão pelo Decreto n.º 73/78, de 26 de julho[31].
As normas da Convenção de Berna são normas de direito internacional convencional «regularmente ratificadas ou aprovadas» por Portugal. Consequentemente, a Convenção vigora na ordem interna enquanto vincular internacionalmente o Estado Português (artigo 8.º, n.º 2, da Constituição). Vigência com primado sobre o direito interno infraconstitucional, conforme defende de forma quase unânime a doutrina[32], em posição igualmente acolhida na jurisprudência do Tribunal Constitucional (cf. acórdão n.º 494/99).
No sentido da consagração constitucional do monismo com primado do Direito Internacional convencional sobre o direito infraconstitucional português também já se pronunciou o Conselho Consultivo da Procuradoria-Geral da República, em particular no parecer n.º 2/2016, de 17-3-2016[33], que constitui doutrina obrigatória para o Ministério Público, com lastro em várias pronúncias anteriores no mesmo sentido, nomeadamente, no parecer n.º 70/94, de 16-2-1995[34], no parecer n.º 36/1999, de 30-8-2002[35], no segundo parecer complementar n.º 2/93 de 20-4-2005[36], no parecer n.º 4/2008, de 1-6-2011[37], no parecer n.º 32/2008, de 11-6-2011[38], no parecer n.º 10/2014, de 4-6-2014[39].
§ II.3.2 Conceptualizar o direito de autor sempre se apresentou controverso pela natureza necessariamente incorpórea da obra e os pesos relativos e historicamente condicionados dos interesses em colisão.
Direito de autor que constitui uma disciplina atingida pela controvérsia conceptual e ideológica desde a emergência da categoria jurídica propriedade intelectual no século XVIII a qual, como lembra José de Oliveira Ascensão, foi marcada pelo contexto da revolução francesa, «uma revolução proprietarista por excelência» que determinou que o «interesse dos autores ficasse acautelado sob um novo nome»[40].
Complexidade e contingência histórica acentuada pela interpenetração de conceções nacionais (nomeadamente entre as perspetivas que colocam enfoque no direito de autor ou no copyright) nos instrumentos de direito internacional público, aprofundada nas última décadas pelo impacto da desmaterialização através do digital que, como Michael Madison destaca, gerou desafios para o direito que ultrapassam as «fronteiras das disciplinas e envolvem perspectivas teóricas múltiplas»[41], num quadro em que as «coisas “reais” e as coisas “jurídicas” estão cada vez mais misturadas»[42].
Na economia da presente consulta, impõe-se ter presente que as questões suscitadas (supra § II.1) se reportam à tutela dos direitos autorais de natureza patrimonial regulados no CDADC, enquanto limites jurídicos à reprodução de enunciados de provas e exames nacionais.
Consequentemente, a consulta não integra a dimensão moral do direito de autor com expressão no artigo 6.º bis da Convenção de Berna: «Independentemente dos direitos patrimoniais de autor, e mesmo após a cessão dos referidos direitos, o autor conserva o direito de reivindicar a paternidade da obra e de se opor a qualquer deformação, mutilação ou outra modificação da obra ou a qualquer outro atentado contra a mesma obra, prejudicial à sua honra ou à sua reputação».
Tendo por referência o objeto do presente parecer, a Convenção de Berna compreende um conceito amplo de obra literária suscetível de proteção pelos direitos de autor, estabelecido no artigo 2.º, n.º 1: «Os termos “obras literárias e artísticas” compreendem todas as produções do domínio literário, científico e artístico, qualquer que seja o seu modo ou forma de expressão, tais como: os livros, folhetos e outros escritos».
Relativamente aos textos oficiais de carácter administrativo que preencham o conceito de obra, o artigo 2.º, n.º 4, da Convenção de Berna remeteu para as legislações dos países da União a determinação da proteção que lhes deve ser concedida[43].
Pelo que, sendo os enunciados das provas nacionais de avaliação externa dos alunos dos ensinos básico e secundário português textos oficiais no âmbito de um procedimento administrativo da responsabilidade dos serviços ou entidades do Ministério da Educação designados para o efeito, a matéria da eventual proteção por direitos de autor foi remetida pela Convenção de Berna para a legislação nacional[44].
§ II.3.3 O atual Código do Direito de Autor e dos Direitos Conexos (CDADC) aprovado pelo Decreto-Lei n.º 63/85, de 14 de março[45], tal como os dois diplomas que o precederam[46], foi conformado pela adesão de Portugal à Convenção de Berna.
O conceito de obra suscetível de proteção é abrangente sendo, nos termos do artigo 1.º, n.º 1, do CDADC, integrado por criações intelectuais do domínio literário, científico e artístico, por qualquer modo exteriorizadas.
Amplitude do conceito legal de obra literária em sintonia com o artigo 2.º, n.º 1, da Convenção de Berna que implica que os enunciados das provas e exames nacionais de avaliação externa na medida em que constituem o resultado do esforço intelectual desenvolvido pelas equipas de professores designadas para a sua elaboração são suscetíveis de preencher a categoria obra literária.
Reportando-nos à dimensão patrimonial do direito de autor, e tendo presente o enquadramento jurídico-administrativo dos enunciados de provas e exames nacionais relativos à avaliação externa de alunos dos ensinos básico e secundário, importará identificar a regulação nacional estabelecida no CDADC sobre textos oficiais e, em particular, relatórios e decisões administrativas produzidos por entes públicos.
No caso português, a regulação sobre textos oficiais, remetida de forma expressa pelo artigo 2.º, n.º 4, da Convenção de Berna para os direitos nacionais, consta do artigo 8.º, n.º 1 do CDADC[47] com a seguinte prescrição: Os relatórios e decisões administrativas «de quaisquer órgãos ou autoridades do Estado ou da Administração» são excluídos da proteção estabelecida pelo CDADC.
Embora numa primeira leitura a epígrafe do preceito[48] e a técnica adotada na indicação do âmbito da previsão (por remissão para uma norma com estatuição autónoma[49]), pudessem suscitar dúvidas, a teleologia e a estatuição do n.º 1 do artigo 8.º do CDADC não deixam margem para equívocos: As obras constituídas por textos de convenções, de leis, de regulamentos e de relatórios ou de decisões administrativas, judiciais ou de quaisquer órgãos ou autoridades do Estado ou da Administração «não beneficiam de protecção» jusautoral[50].
Isto é, como sintetiza José de Oliveira Ascensão, a exclusão «equivale, muito simplesmente, às obras de caráter legislativo, administrativo ou judiciário a que se refere a Convenção»[51].
Passando à aplicação da referida regra aos textos objeto da consulta a mesma tem de se articular com duas premissas verificadas acima (supra § II.2) sobre os enunciados das provas e exames nacionais relativos à avaliação externa de alunos dos ensinos básico e secundário:
(1) Integram decisões administrativas no âmbito de procedimento complexo de avaliação externa de alunos;
(2) Proferidas no âmbito de um processo complexo de avaliação externa de alunos do ensino secundário da responsabilidade dos serviços ou entidades do Ministério da Educação designados para o efeito.
Premissas que impõem a conclusão de que a proteção jusautoral dos textos relativos aos enunciados de provas e exames nacionais relativos à avaliação externa de alunos se encontra excluída por força da prescrição do artigo 8.º, n.º 1, do CDADC.
Estabelecida a referida exclusão de proteção jusautoral importará referir que a mesma se reporta aos enunciados que podem constituir uma obra preexistente de futuras obras derivadas. Relativamente a eventuais obras derivadas opera a proteção conferida pelo artigo 3.º, n.º 1, alínea c), do CDADC, a qual prescreve que são obras equiparadas a originais as compilações sistemáticas ou anotadas de textos de relatórios ou decisões administrativas de quaisquer órgãos ou autoridades do Estado ou da Administração.
Isto é, no caso de compilações sistematizadas ou anotadas de provas e exames nacionais relativos à avaliação externa de alunos dos ensinos básico e secundário, embora os textos compilados não beneficiem da proteção conferida pelo CDADC, as compilações que compreendem uma determinada organização sistemática e, eventualmente, textos adicionais já podem beneficiar da proteção (por via do artigo 3.º, n.º 1, alínea c), do CDADC)[52], e essa proteção não confere qualquer direito patrimonial ao autor ou titular da obra constituída pelos textos oficiais (por força do disposto no artigo 8.º, n.º 2, do CDADC[53]).
Refira-se que o n.º 2 do artigo 8.º do CDADC acentua o sentido preconizado sobre a exclusão de direitos de autor relativamente à reutilização por terceiros de textos oficiais. Plano em que o principal relevo da norma, como destaca José de Oliveira Ascensão, é a exclusão abrangente de terceiros que constituam entidades estranhas ao Estado. Exclusão coerente com o sentido da referência a «relatórios», os quais, ainda que ao serem produzidos possam não constituir atos administrativos decisórios por via da integração superveniente de atos ou regulamentos administrativos, passam a ser abrangidos pelo regime dos textos oficiais e excluídos da proteção jusautoral[54].
Desta forma, a legislação portuguesa relativamente a textos de convenções, de leis, de regulamentos e de relatórios ou de decisões administrativas, judiciais ou de quaisquer órgãos ou autoridades do Estado ou da Administração faz prevalecer o interesse público do acesso à informação e conhecimento em detrimento de um hipotético interesse estadual de obter receitas adicionais relativas a obras cujo fim não é conformado pela produção de atividades criativas mas o desenvolvimento de funções estaduais como, no caso das provas e exames nacionais de avaliação externa de alunos, responsabilidades executivas da política de educação.
Interesse público de promover atividades criativas combinado com o interesse público de acesso à informação e conhecimento que legitima a suscetibilidade de proteção patrimonial de direitos jusautorais de obras que compreendam compilações sistematizadas, na medida em que se verifique seleção ou organização criativa dos elementos que se compilam[55], isto é, «quando a seleção ou arranjo das matérias constituam criações intelectuais»[56].
§ II.3.4 A natureza de texto oficial dos enunciados das provas e exames nacionais objeto de consulta por si só limita a tutela de eventuais direitos patrimoniais de autor das pessoas (singulares e coletivas) que as produziram ou podem ser considerados seus titulares.
Exclusão de tutela de direitos jusautorais independente da qualificação do contrato de encomenda de criação intelectual (v.g. como prestação de serviços inominado ou empreitada), bem como da perspetiva sobre a existência ou não de diferenciação entre os direitos dos produtores das obras, consoante a encomenda da obra seja para o Estado ou um ente privado. Quando a obra encomendada se reporte a relatório ou decisão administrativa prevalece a exclusão determinada pelo n.º 1 do artigo 8.º do CDADC[57], sendo metodologicamente infundado desenvolver uma análise sobre a natureza do contrato envolvido como fator determinante da tutela de direitos jusautorais.
Reportando-se a consulta exclusivamente à proteção de direitos patrimoniais de autor dos enunciados de provas e exames nacionais dos ensinos básico e secundário, constatada a exclusão determinada pelo artigo 8.º, n.º 1, do CDADC, não se justifica empreender qualquer desenvolvimento subsequente sobre a natureza coletiva da obra corporizada nesses enunciados ou a ausência de tutela jurídico-penal da respetiva reprodução[58].
Refira-se, ainda, que extravasa o objeto do parecer (supra § II.1) a ponderação dos direitos do autor de explorar a obra naquilo que for compatível com a utilização oficial, direito que se reconhece e que não contende com a resposta formulada às questões da consulta[59].

§ II.4 Enunciados das provas e exames nacionais como documentos administrativos e suscetibilidade de reutilização
§ II.4.1 Estabelecido que os enunciados das provas relativas à avaliação externa dos alunos dos ensinos básico e secundário não estão abrangidos pela proteção dos direitos patrimoniais de autor conferida pelo CDADC, importarão uma nota adicional sobre a tutela da sua reutilização enquanto documentos administrativos.
A reutilização de documentos administrativos encontra-se atualmente regulada pelo regime de acesso à informação administrativa e ambiental e de reutilização dos documentos administrativos (LADA) aprovado pela Lei n.º 26/2016, de 22 de agosto.
Esse diploma visou, nomeadamente, a transposição para o direito nacional da Diretiva 2003/98/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 17 de novembro de 2003, revista pela Diretiva 2013/37/UE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 26 de junho de 2013.
Para efeitos da referida Diretiva, os enunciados das provas e exames nacionais relativos à avaliação externa de alunos dos ensinos básico e secundário integram o conceito de documentos[60] na posse de organismos do setor público do Estado português[61].
Passando à análise da LADA, o conceito de documento administrativo adotado em sintonia com o direito comunitário transposto, apresenta-se significativamente amplo compreendendo qualquer conteúdo, ou parte desse conteúdo, que esteja na posse ou seja detido em nome dos órgãos e entidades referidos no artigo 4.º, n.º 1, da LADA independentemente do suporte de informação se encontrar «sob forma escrita, visual, sonora, eletrónica ou outra forma material», designadamente, se os conteúdos forem relativos «a procedimentos de emissão de atos e regulamentos administrativos» (nos termos do artigo 3.º, n.º 1, alínea a), da LADA).
Por seu turno, o artigo 4.º, n.º 1, sobre o âmbito subjetivo, determina que a LADA se aplica, nomeadamente, aos seguintes órgãos e entidades:
a) Órgãos de soberania e os órgãos do Estado e das regiões autónomas que integrem a Administração Pública;
b) Demais órgãos do Estado e das regiões autónomas, na medida em que exerçam funções materialmente administrativas;
c) Órgãos dos institutos públicos, das entidades administrativas independentes e das associações e fundações públicas;
d) Órgãos das empresas públicas;
e) Órgãos das autarquias locais, das entidades intermunicipais e de quaisquer outras associações e federações públicas locais;
f) Órgãos das empresas regionais, municipais, intermunicipais ou metropolitanas, bem como de quaisquer outras empresas locais ou serviços municipalizados públicos;
g) Associações ou fundações de direito privado nas quais os órgãos e entidades previstas no presente número exerçam poderes de controlo de gestão ou designem, direta ou indiretamente, a maioria dos titulares do órgão de administração, de direção ou de fiscalização;
h) Outras entidades responsáveis pela gestão de arquivos com caráter público;
i) Outras entidades no exercício de funções materialmente administrativas ou de poderes públicos, nomeadamente as que são titulares de concessões ou de delegações de serviços públicos.
Pelo que, o IAVE é abrangido pelo âmbito subjetivo da LADA (supra § II.2.2) e os enunciados das provas e exames nacionais pelo respetivo âmbito objetivo (supra §§ II.2.1, II.2.3 e II.2.4).
Por outro lado, a reutilização para efeitos da LADA integra as modalidades de reprodução referidas na consulta, pois compreende «a utilização, por pessoas singulares ou coletivas, de documentos administrativos, para fins comerciais ou não comerciais diferentes do fim inicial de serviço público para o qual os documentos foram produzidos» (artigo 3.º, n.º 1, alínea g), da LADA).
Nessa medida a reutilização de enunciados das provas e exames nacionais é conformada pelo princípio geral da administração aberta (artigo 2.º da LADA[62]), e pelo princípio específico de que os documentos administrativos cujo acesso seja autorizado, nos termos da LADA, podem ser reutilizados (artigo 19.º, n.º 1, da LADA).
Acrescente-se que na exposição de motivos da Diretiva 2013/37/EU a exclusão de direitos jusautorais dos documentos que constituam obras da titularidade de «organismo do setor público» foi ponderada[63], e, em sintonia com os parâmetros estabelecidos na diretiva apenas são excluídos dos princípios sobre reutilização documentos cujos direitos de autor ou direitos conexos pertençam a entidades terceiras que não sejam abrangidas pela LADA (artigo 20.º, alínea b), da LADA), que, já constatámos não ser o caso dos enunciados das provas e exames nacionais (supra §§ II.3.3 e II.3.4).
§ II.4.2 Por último, uma breve referência sobre alguns dados factuais relativos à difusão pelo IAVE na rede eletrónica (em linha com a prática precedente do GAVE) do que designa como «Banco de Exames e Provas»[64], o qual compreende, nomeadamente, «todos os instrumentos de avaliação concebidos no âmbito da missão do GAVE, desde 1997»[65].
Nesse banco de dados é prestada informação no sentido de que «podem ser consultados e descarregados os ficheiros relativos às provas de aferição, às provas finais e às provas de exame nacional (ensino básico e ensino secundário) e aos testes intermédios». Indicando-se o procedimento que pode ser adotado[66], sem estabelecer qualquer limite à reutilização subsequente.
Banco de dados que complementa a informação, que também consta da página do IAVE na rede eletrónica[67], sobre as provas e exames nacionais do ano letivo em curso que compreende a discriminação das datas das várias chamadas de cada uma das provas, sendo adicionadas as ligações eletrónicas (links, aditados pela gestão da página por via de colocação sucessiva em função da evolução do procedimento de avaliação externa de alunos) para a informação-prova, enunciados e critérios específicos de correção. Trata-se de uma via de difusão desses documentos, nomeadamente, para todos os interessados nos subprocedimentos administrativos de classificação, reapreciação e reclamação (supra § II.2).
Disponibilização na rede eletrónica que deve ser articulada com o disposto no artigo 21.º, n.º 1, da LADA no sentido de que a reutilização de documentos disponibilizados através da rede eletrónica «não depende de autorização da entidade que os detenha, exceto quando exista indicação contrária ou se for claro para qualquer destinatário que o documento se encontra protegido por direitos de autor ou direitos conexos».
Desta forma, a difusão na rede eletrónica atualmente verificada implica que a reutilização dos enunciados das provas e exames nacionais não carece de qualquer pedido de autorização.

III. Conclusões
Em face do exposto, formulam-se as seguintes conclusões:
1. A avaliação externa de alunos dos ensinos básico e secundário constitui uma função pública associada ao exercício de poderes públicos.
2. Os enunciados das provas de aferição e provas finais de ciclo do ensino básico e dos exames nacionais do ensino secundário integram decisões administrativas no âmbito de um procedimento complexo de avaliação externa de alunos que constitui uma função «da responsabilidade dos serviços ou entidades do Ministério da Educação designados para o efeito» nos termos, respetivamente, do disposto nos artigos 24.º, n.º 2, alínea b), e 29.º, n.º 2, alínea b), do Decreto-Lei n.º 139/2012, de 5 de julho (na sua redação atual, após a terceira revisão operada pelo Decreto-Lei n.º 17/2016, de 4 de abril).
3. Procedimento complexo de avaliação externa que compreende várias etapas em que os textos dos enunciados das provas e exames nacionais integram decisões com eficácia plurisubjetiva conformadoras de subsequentes atos administrativos decisórios de classificação, reapreciação de provas e julgamento de reclamações.
4. O interesse público da função de avaliação externa de alunos dos ensinos básico e secundário, em que a elaboração e difusão dos enunciados das provas e exames nacionais constituem etapas fundamentais, revela-se, nomeadamente, nas componentes de classificação e certificação dos alunos abrangidos.
5. Os enunciados das provas e exames nacionais de avaliação externa na medida em que constituem o resultado do esforço intelectual desenvolvido pelas equipas de professores designadas para a sua elaboração preenchem o conceito amplo de obra literária consagrado no artigo 2.º, n.º 1, da Convenção de Berna para a Proteção das Obras Literárias e Artísticas, concluída a 9 de setembro de 1886, na versão revista em Paris a 24 de julho de 1971 aprovada para adesão pelo Decreto n.º 73/78, de 26 de julho (Convenção de Berna), e no artigo 1.º, n.º 1, do Código do Direito de Autor e dos Direitos Conexos (CDADC).
6. A Convenção de Berna remeteu para as legislações dos países da União a determinação da proteção a conceder aos textos oficiais de carácter administrativo (nos termos do artigo 2.º, n.º 4, do texto desse tratado).
7. O artigo 8.º, n.º 1, do CDADC determina que os textos de relatórios ou decisões administrativas de quaisquer órgãos ou autoridades do Estado ou da Administração estão excluídos da proteção dos direitos patrimoniais de autor regulada por esse código.
8. Consequentemente, os textos dos enunciados das provas e exames nacionais relativos à avaliação externa de alunos dos ensinos básico e secundário da responsabilidade de serviços ou entidades do Ministério da Educação designados para o efeito não beneficiam da proteção jusautoral conferida pelo CDADC.
9. A circunstância de os enunciados das provas e exames nacionais relativos à avaliação externa de alunos dos ensinos básico e secundário estarem excluídos da proteção de direitos de autor regulada pelo CDADC não obsta a que as compilações sistemáticas ou anotadas desses textos recebam tutela, ao abrigo do disposto no artigo 3.º, n.º 1, alínea c), já que a proteção dessas obras derivadas não depende da recusada para as respetivas obras preexistentes.
10. Sendo os enunciados das provas e exames nacionais produzidos para utilização oficial por ente público no procedimento de avaliação externa dos alunos dos ensinos básico e secundário, o artigo 8.º, n.º 2, do CDADC exclui qualquer direito jusautoral suscetível de condicionar a subsequente reprodução bem como qualquer direito patrimonial dos autores ou titulares das obras preexistentes relativamente a obras derivadas (protegidas ao abrigo do artigo 3.º, n.º 1, alínea c), do CDADC) que utilizem aquelas em compilações sistematizadas ou anotadas.
11. Os enunciados das provas e exames nacionais relativos à avaliação externa de alunos dos ensinos básico e secundário integram o conceito de documentos na posse de organismos do setor público do Estado português estando, nessa medida, abrangidos pelo conjunto mínimo de regras aplicáveis à reutilização de documentos estabelecidas na Diretiva 2003/98/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 17 de novembro de 2003, revista pela Diretiva 2013/37/UE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 26 de junho de 2013.
12. As provas e exames nacionais relativos à avaliação externa de alunos dos ensinos básico e secundário que estejam na posse do Instituto de Avaliação Educativa, I.P. (IAVE) integram o conceito de documento administrativo cuja reutilização se encontra regulada no regime de acesso à informação administrativa e ambiental e de reutilização dos documentos administrativos aprovado pela Lei n.º 26/2016, de 22 de agosto, atentas as disposições conjugadas dos artigos 3.º, n.º 1, alíneas a) e g), e 4.º, n.º 1, desse diploma.

ESTE PARECER FOI VOTADO NA SESSÃO DO CONSELHO CONULTIVO DA PROCURADORIA-GERAL DA REPÚBLICA, DE 23 DE MARÇO DE 2017.
Adriano Fraxenet de Chuquere Gonçalves da Cunha – Paulo Joaquim da Mota Osório Dá Mesquita (Relator) – Eduardo André Folque da Costa Ferreira – João Eduardo Cura Mariano Esteves – Vinício Augusto Pereira Ribeiro – Maria Isabel Fernandes da Costa – Fernando Bento – Maria Manuela Flores Ferreira (Com voto de vencida anexo)
VOTO DE VENCIDA

Maria Manuela Flores Ferreira – votei vencida face à matéria das conclusões 2, 3, 8, 10 e 12, de acordo com o projeto de parecer que apresentei na sessão de 2 de março de 2017 deste Conselho Consultivo e que em parte se retomará, quando tal se revelar indispensável à presente fundamentação.

Impõe-se também, desde já, esclarecer que, em meu entender, no pedido de consulta não está em causa a função pública de análise externa de alunos mas tão somente a criação dos enunciados das provas dos exames nacionais.

Assim, o objeto da consulta conduz-nos, incontornavelmente, à temática do direito de autor.

Temática que, após enquadramento legal dos serviços e organismos referidos pela entidade consulente, se apresenta, metodologicamente, como imediata, na perspetiva da caracterização dos ditos enunciados, mas também com vista à definição das relações interinstitucionais daquelas entidades.


1. Antes do mais, será, porventura, esclarecedor, convocar as conclusões[68] a que chegámos no projeto apresentado:

1.ª – As provas e exames nacionais – provas de aferição, provas finais de ciclo e exames finais nacionais – integram a avaliação externa das aprendizagens dos alunos dos ensinos básico e secundário (cfr. artigos 24.º, n.º 2, e 24.º-B do Decreto-Lei n.º 139/2012, de 5 de julho, na redação dada pelo Decreto-Lei n.º 17/2016, de 4 de abril);

2.ª – Ao Instituto de Avaliação Educativa, I.P., abreviadamente IAVE – instituto público de regime especial, integrado na administração indireta do Estado –, cabe planear, conceber e validar os instrumentos de avaliação externa de alunos, nomeadamente, provas finais e exames nacionais, definindo os repectivos critérios de classificação [cfr. alínea a) do n.º 2 do artigo 3.º do Decreto-Lei n.º 102/2013, de 25 de julho, que criou o IAVE];

3.ª – Todavia, o IAVE desenvolve a sua missão de planeamento, conceção e validação dos instrumentos de avaliação externa que lhe forem solicitados pelo membro do Governo responsável pela área da educação e de acordo com cartas de solicitação (cfr. n.º 1 do artigo 5.º do Decreto-Lei n.º 102/2013), onde, designadamente, são fixados os requisitos para a elaboração dos enunciados das provas e exames nacionais;

4.ª – A elaboração dos referidos enunciados deva ser considerada obra nos termos do artigo 1.º do Código do Direito de Autor e dos Direitos Conexos (CDA) e como tal protegida;

5.ª – As obras protegidas no âmbito do CDA caracterizam-se pela exteriorização de criações intelectuais, envolvendo necessariamente originalidade, mas não relevando o facto de a obra apresentar um interesse cultural ou ser essencialmente utilitária;

6.ª – E o titular do direito de autor é, em princípio, o criador da obra (cfr. artigos 11.º e 27.º do CDA);

7.ª – Porém, esta regra comporta alguns desvios, sendo um deles o caso das obras coletivas – obra organizada por iniciativa de entidade singular ou coletiva e divulgada ou publicada em seu nome [cfr. alínea b) do n.º 1 do artigo 16.º do CDA];

8.ª – Obra coletiva é, pois, aquela que é realizada no âmbito da atividade de uma entidade singular ou coletiva, a quem caberá a titularidade dos direitos de autor, salvo se for possível discriminar a produção pessoal de algum ou alguns colaboradores (cfr. artigo 19.º do CDA);

9.ª – De acordo com os elementos disponíveis, os referidos enunciados das provas e exames finais podem ser considerados obras coletivas, não se destacando a contribuição individual de quem os elaborou;

10.ª – Outrossim, tem de se considerar que o IAVE, no âmbito das suas atribuições, providencia pela elaboração dos enunciados e atinentes resoluções, de acordo com o que lhe é pedido pelo membro do Governo responsável pela área da educação através das cartas de solicitação;

11.ª – Desta forma, o IAVE presta um serviço ao Estado (Ministério da Educação), sendo que recebe dotação do Orçamento do Estado para o exercício das suas atribuições;

12.ª – É, portanto, o Estado o titular dos direitos de autor relativamente aos citados enunciados e atinentes resoluções, cabendo-lhe a respetiva exploração económica;

13.ª – Assim, a publicação e comercialização de coletâneas de enunciados e das correspondentes resoluções sem autorização do Estado constitui violação dos direitos de autor;

14.ª – Tal violação é suscetível de integrar o crime previsto no artigo 195.º, n.º 1, do CDA – crime de usurpação;

15.ª – E, pode, designadamente, fundamentar também o acionamento de responsabilidade civil.


2. Cabe, portanto, abordar a temática do direito de autor.

Impõe-se, aqui, naturalmente, considerar o sentido objetivo e o sentido subjetivo da expressão.

Como distingue Menezes Leitão, em sentido objetivo, «o Direito de Autor regula a proteção das obras intelectuais, enquanto realizações culturais do espírito humano», e, em sentido subjetivo, «o direito de autor consiste na permissão normativa de aproveitamento da obra intelectual que a lei atribui ao titular do mesmo»[69].

2.1.1. Enquanto área do direito, a sua especificidade no nosso ordenamento jurídico tem, hoje, a ver com o seu objeto – o caráter imaterial dos bens (a obra)[70].

E, justamente, relacionado com esse objeto, importa atender aos normativos que tutelam a criação intelectual, desde logo, o Código do Direito de Autor e dos Direitos Conexos (CDA), aprovado pelo Decreto-Lei n.º 63/85, de 14 de março[71], que revogou o Código do Direito de Autor, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 46 980, de 27 de abril de 1966[72].

Mas no plano nacional, conquanto o lugar do Direito de Autor venha sendo objeto de discussão[73], temos ainda de considerar como principal fonte o Código Civil, conforme realça Pedro Romano Martinez, «seja nas regras da formação dos negócios jurídicos (arts. 217.º e ss. do CC), dos contratos em especial (mormente arts. 1154.º e ss. do CC)»[74]. E acrescenta aquele Autor «[a] estas regras, dependendo das circunstâncias, pode ainda ser necessário acrescentar as previsões relativas ao contrato de trabalho em geral constantes do Código do Trabalho»[75].

O Direito de Autor apresenta-se como um ramo do direito de cariz transversal, havendo também que atentar nos textos internacionais, sejam de âmbito geral sejam da União Europeia, que, aliás, de um modo geral, estiveram na base da elaboração ou da alteração de diplomas nacionais.


2.1.2. Ora, no que concerne à tutela dos direitos de autor, cabe antes do mais olhar para a Constituição da República Portuguesa (CRP), em especial para o n.º 2 do artigo 42.º [76].

Segundo Jorge Miranda, a cultura stricto ou strictissimo sensu (considerada à margem da educação e da ciência) aparece no texto constitucional, entre outros preceitos, no artigo 42.º, ao garantir a liberdade de criação cultural e os direitos de autor[77].

Aquele Autor, ao estabelecer um quadro dos direitos culturais, afastando da análise a liberdade de aprender e ensinar e o direito à educação, encontra três categorias básicas:

«a) Direitos relativos à identidade cultural;
b) Liberdades culturais;
c) Direitos de acesso aos bens culturais.»[78]

E no domínio das liberdades culturais elenca justamente a liberdade de criação cultural, que não sofre condicionamentos ou restrições[79].

Sobre os direitos de autor, salienta Jorge Miranda que a atual Constituição vai mais longe que os textos anteriores que consagravam a propriedade intelectual (a Carta Constitucional e a Constituição de 1938):

«– Em primeiro lugar, porque alude, em geral, a "proteção legal dos direitos de autor, abrangendo, portanto, como consta do artigo 9.º do Código de Direitos de Autor, quer os direitos morais (os respeitantes à paternidade, à genuinidade e à integridade das obras), quer os patrimoniais (os respeitantes à sua disposição, à sua fruição e à sua utilização);

– Em segundo lugar, porque essa proteção legal aparece como decorrência imediata do direito à invenção, à produção e à divulgação da obra científica, literária ou artística e, mais amplamente, da liberdade de criação»[80].

E precisamente da decorrência dos direitos de autor da liberdade de criação retira Jorge Miranda a sujeição plena quer dos direitos morais quer dos direitos materiais de autor a todo o regime dos direitos, liberdades e garantias[81].

Conforme explicita Jorge Miranda, «[a] liberdade de criação cultural ou de criação artística, intelectual e científica é, antes de mais, uma manifestação do próprio desenvolvimento da personalidade (cfr. artigo 26.º, n.º 1)»[82] e «não sofre condicionamentos ou restrições stricto sensu»[83].

A Constituição não permite medidas ablativas de direitos de autor. «Todavia, se os direitos morais, além de inalienáveis, irrenunciáveis e imprescritíveis, são perpétuos, assegurando-se a sua proteção até depois da morte do autor (artigos 56.º e 57.º do Código do Direito de Autor), já os direitos patrimoniais caducam, em geral, no prazo de 70 anos (artigo 31.º)»[84].

A propósito da liberdade de criação cultural, Gomes Canotilho/Vital Moreira[85] realçam qua a cultura é um conceito aberto e assinalam que se está «perante uma criação cultural quando um ato, conduta ou o seu resultado possa ser reconhecido ou ser recognoscível como uma forma possível de criação humana. O ponto de partida para qualquer criação cultural – intelectual, artística ou científica – é sempre: (1) a dimensão de criatividade humana assente (2) na iniciativa humana capaz (3) de dar forma a diferentes meios de expressão e de compreensão da realidade humana e material».

Sublinham, ainda, estes Autores que o n.º 2 do artigo 42.º, conjugado com o n.º 1, torna mais clara a densificação semântica do conceito de «criação intelectual, artística e científica». Assim, ela abrange: «(a) o processo de criação ou conformação; (b) a obra, concebida como objetivação da criação cultural; (c) a divulgação, o conhecimento e a comunicação do «produto» da criação cultural na qual se inclui, por ex., o «ensino científico», o «ensino das artes». Estas dimensões justificam a extensão da garantia constitucional, quer à atividade cultural em si ( «invenção e produção»), quer à irradiação do produto cultural («divulgação»)»[86].

E acrescentam:

«A liberdade de criação cultural sugere, desde logo, um âmbito de proteção pessoal constitucionalmente garantido. A proteção dos direitos de autor (n.º 2, in fine) tem um duplo significado: (a) o produto da criação cultural (obra de arte, invenção científica) é considerado como “propriedade espiritual” do autor; (b) a liberdade de criação cultural protege, nas vestes de direito de comunicação fundamental, todas as formas de “mediação comunicativa” (livros, filmes, discos, etc.); (c) o autor dispõe de direitos de propriedade intelectual incluindo o direito de cobrar retribuição pela utilização da sua obra. Daqui não resulta imediatamente uma “valorização económica” e um direito à publicação do produto da criação cultural, mas é evidente que a sua utilização (para fins comerciais, industriais, publicitários, pedagógicos, etc.) cria um valor económico que cai também no âmbito de proteção do direito à criação cultural. De resto, o direito de propriedade intelectual, diretamente protegido pelo regime dos direitos, liberdades e garantias, goza de uma proteção constitucional mais intensa do que o direito de propriedade sobre as coisas (art. 62.º)»[87].

Assim, também, segundo Gomes Canotilho/Vital Moreira, «[a] liberdade de criação cultural é constitucionalmente positivada como direito não sujeito à reserva de lei restritiva. Os limites a considerar são apenas os limites resultantes da sua colisão com outros direitos fundamentais ou bens constitucionalmente protegidos. Estes limites referem-se, na maior parte das vezes, ao domínio da comunicação e irradiação da criação cultural e não propriamente ao domínio da atividade de criação»[88].

Orlando de Carvalho reconhece que, em matéria de criação pessoal, direito inato que existe e se efetiva mesmo antes de a criação se produzir, é em vista da produção da obra que a tutela fundamentalmente se encaminha[89]. Mas explicitava este Autor a obra é produto do espírito e embora a razão da tutela jurídica seja «a obra enquanto suscetível de exploração económica, como potencial res in commercio, tal tutela é indissociável da personalidade criadora, pelo que a obra nunca é vista como puro bem do mundo externo, como pura e simples res, mas antes como a concretização por excelência da ontogenia do espírito, e, nesta medida, como expressão qualificada da plenitude desse espírito»[90].

Daí que, segundo Orlando de Carvalho, a obra nunca seja apenas objeto de um direito de propriedade, «mas sempre também de um direito de personalidade, de um jus in se ipsum, que visa proteger a obra enquanto emanação e expressão do espírito que a criou»[91]. Trata-se, assim, de um direito absoluto, que deve ser visto «à luz do direito geral de personalidade do artigo 70.º do Código Civil»[92]. E como todos os direitos sujectivos, o direito de personalidade de autor tem um próprio conteúdo, «um próprio licere, que é o conjunto de faculdades (faculdades jurídicas secundárias) que se englobam nesse direito. São fundamentalmente seis e designam-se por direitos, por aquele uso de linguagem que frequentemente confunde direitos e faculdades»[93].

São o direito à autoria, o direito à paternidade da obra, o direito ao inédito, o direito à intangibilidade da obra, o direito à dignidade da obra e o direito de sequência.


2.2. Feito o enquadramento dos direitos de autor como direitos fundamentais nos termos discriminados, importa agora atentar na pertinente normação do CDA.


2.2.1. De acordo com o artigo 1.º, são obras as criações intelectuais do domínio literário, científico e artístico, por qualquer modo exteriorizadas, que, como tais, são protegidas nos termos do CDA, incluindo-se nessa proteção os direitos dos respetivos autores (cfr. n.º 1), sendo a obra independente da sua divulgação, publicação, utilização ou exploração (cfr. n.º 3).

As obras protegidas caracterizam-se, pois, pela exteriorização de criações intelectuais no domínio literário, científico ou artístico[94].

E, nos termos do n.º 2 do artigo 1.º, as ideias, os processos, os sistemas, os métodos operacionais, os conceitos, os princípios ou as descobertas não são, por si só e enquanto tais, protegidos.

Tal já resultaria, aliás, do n.º 1 enquanto define a obra como criação intelectual exteriorizada.

O conceito de criação intelectual envolve originalidade, novidade, criatividade[95], mas necessariamente originalidade[96].

E como decorre do n.º 1 do artigo 2.º[97], «pouco importa o facto de a obra apresentar um interesse cultural ou ser essencialmente utilitária»[98] [99].

A elencagem constante desta norma é meramente exemplificativa, conquanto seja mais vasta que a contida no Código anterior[100].

Conforme observa Luiz Francisco Rebello[101], «[n]o tocante à alínea b), que alude a «conferências, lições, alocuções e sermões», convém notar que ela não se aplica às alegações orais apresentadas perante autoridades ou serviços públicos [artigo 7.º-1, da alínea b)]; quanto aos discursos proferidos perante assembleias ou outros órgãos colegiais, políticos ou administrativos, de âmbito nacional, regional ou local, ou em debates públicos sobre assuntos de interesse comum [alínea c) do n.º 1 do mesmo artigo] e aos discursos políticos [alínea d)], também excluídos da proteção legal, a sua reprodução integral, em separata, em coletânea ou noutra utilização conjunta, só pode ser feita pelo próprio autor ou com o seu consentimento (artigo 7.º-2). Todavia, a sua reprodução parcial ou sob a forma de resumo, quando para fins de informação, é lícita nos termos da alínea a) do artigo 75.º, mas deve ser acompanhada do nome do autor e não pode ser tão extensa que prejudique o interesse pela obra (artigo 76.º)»[102].

No artigo 3.º do CDA equiparam-se às obras originais, ou, porventura, mais rigorosamente às obras originárias, as que derivam de uma obra preexistente[103] e, por isso, designadas usualmente por “obras derivadas”.

A obra derivada é, assim, sempre protegida ainda que o não seja a obra originária.

Todavia, de acordo com o disposto no n.º 2 do artigo 3.º a proteção conferida às obras equiparadas «não prejudica os direitos reconhecidos aos autores da correspondente obra original».


2.2.2. Ao conteúdo do direito de autor reporta-se o artigo 9.º do CDA[104].

No n.º 1 estabelece-se que o direito de autor abrange direitos de caráter patrimonial e direito de natureza pessoal, denominados direitos morais[105].

Trata-se, pois, de um direito de natureza complexa estruturado com base na conformação de que a obra intelectual se traduz na emanação da personalidade do seu autor e que é suscetível de lhe proporcionar rendimento patrimonial[106].

Nos dizeres de Alberto de Sá e Mello, «[a] situação jus autoral nasce – sempre e só – da criação exteriorizada de uma obra pela qual se constitui um direito relativo quer à conservação (de índole pessoal) quer ao aproveitamento (patrimonial) exclusivo desse bem imaterial. É este direito – o “direito de autor”, que compreende um conjunto complexo de faculdades pessoais e de faculdades patrimoniais de exploração económica da obra intelectual – que pode ser objeto de atribuição patrimonial em cumprimento de obrigação civil de origem contratual»[107].

A vertente patrimonial do direito de autor consubstancia, nos termos do n.º 2 do artigo 9.º, «o direito exclusivo de dispor da sua obra e de fruí-la e utilizá-la, ou autorizar a sua fruição ou utilização por terceiros, total ou parcialmente».

E no direito de fruição e utilização da obra por parte do autor inserem-se, nomeadamente, as faculdades de a divulgar, publicar e explorar economicamente por qualquer forma, direta ou indiretamente, nos limites da lei (cfr. n.º 1 do artigo 67.º do CDA).

Convém aproximar do n.º 2 do artigo 9.º também o n.º 2 do artigo 67.º, onde se prescreve que «[a] garantia das vantagens patrimoniais resultantes dessa exploração [económica] constitui, do ponto de vista económico, o objeto fundamental da proteção legal»[108].

E, de acordo com o n.º 3 do artigo 9.º, na vertente pessoal, o autor goza sobre a sua obra, designadamente, das faculdades de reivindicar a respetiva paternidade e assegurar a sua genuinidade e integridade, a que, aliás, já se fez alusão.

Como também já se mencionou, os direitos de natureza pessoal[109] são inalienáveis, irrenunciáveis e imprescritíveis (cfr. n.º 2 do artigo 56.º).

Cabe realçar aqui que autor é, salvo disposição expressa em contrário, o criador intelectual da obra (cfr. artigo 11.º do CDA[110])[111].

Titular do direito de autor é, assim, em princípio, o criador da obra, mas, como escreve Luiz Francisco Rebello, «esta regra comporta alguns desvios. Uma vez que os direitos de caráter patrimonial compreendidos no direito de autor são transmissíveis, o autor pode dispor deles, total ou parcialmente, a favor de terceiro, o qual ficará assim investido na respetiva titularidade. E, por morte do autor, esses direitos, assim como também o exercício dos direitos morais, transmitem-se para os seus sucessores, que passam a ser os seus titulares enquanto a proteção legal não caducar. Mesmo após a queda da obra no domínio público, o direito moral a ela relativo é exercido pelo Estado, nos termos do artigo 57.º-2»[112].

E acrescenta aquele Autor:

«Serão estes os casos normais em que a titularidade do direito de autor se transfere do criador para outrem. Contudo, a par destes, há ainda outros a própria lei admite, e a esses se quer referir a parte final do artigo. São os casos relativos às obras feitas por encomenda ou por conta alheia, em cumprimento de um dever funcional ou em execução de um contrato de trabalho, quando for convencionado entre o criador da obra e a entidade para quem foi realizada que a esta pertence a respetiva titularidade, ou assim dever presumir-se em determinadas circunstâncias que o Código define no n.º 3 do artigo 14.º e no n.º 2 do artigo 165.º, e ainda as obras coletivas, de que são paradigma os jornais e as publicações periódicas (artigos 19.º, 173.º e 174.º)»[113].

O direito de autor é reconhecido independentemente de registo, depósito ou qualquer outra formalidade (artigo 12.º).

De acordo com o disposto no artigo 13.º, com a epígrafe “Obra subsidiada”, aquele que subside ou financie por qualquer forma, total ou parcialmente, a preparação, conclusão, publicação ou divulgação de uma obra não adquire por esse facto sobre esta qualquer dos poderes incluídos no direito de autor, mas admite-se um desvio a esta regra quando houver convenção escrita em contrário[114].


2.2.3. Impõe-se, agora, face à economia do presente parecer, determo-‑nos um pouco mais nos casos excecionais de titularidade do direito de autor a que já aludimos.

Assim, cabe atentar no artigo 14.º do CDA que, na redação dada pela Lei n.º 45/85, de 17 de setembro, estabelece:
«Artigo 14.º

(Determinação da titularidade em casos excecionais)
1 – Sem prejuízo do disposto no artigo 174.º [[115]], a titularidade do direito de autor relativo a obra feita por encomenda ou por conta de outrem, quer em cumprimento de dever funcional quer de contrato de trabalho, determina-se de harmonia com o que tiver sido convencionado.
2 – Na falta de convenção, presume-se que a titularidade do direito de autor relativo a obra feita por conta de outrem pertence ao seu criador intelectual.
3 – A circunstância de o nome do criador da obra não vir mencionado nesta ou não figurar no local destinado para o efeito segundo o uso universal constitui presunção de que o direito de autor fica a pertencer à entidade por conta de quem a obra é feita.
4 – Ainda quando a titularidade do conteúdo patrimonial do direito de autor pertença àquele para quem a obra é realizada, o seu criador intelectual pode exigir, para além da remuneração ajustada e independentemente do próprio facto da divulgação ou publicação, uma remuneração especial:

a) Quando a criação intelectual exceda claramente o desempenho, ainda que zeloso, da função ou tarefa que lhe estava confiada;
b) Quando da obra vierem a fazer-se utilizações ou a retirar-se vantagens não incluídas nem previstas na fixação da remuneração ajustada.»

E deve, desde logo, observar-se que, no texto originário, o n.º 2 estabelecia uma presunção a favor da entidade que custeia ou publica a obra realizada no desempenho de um dever funcional ou de um contrato de trabalho[116].

Esta solução foi alterada pela Lei n.º 45/85, que, como se vê do texto acima reproduzido, estabeleceu, ao invés, que, na falta de convenção, se presume que a titularidade do direito de autor relativo a obra feita por conta de outrem pertence ao seu criador intelectual.

A criação de obra intelectual é objeto de contrato quando o criador se obriga a produzir a obra para outrem e, nos termos do n.º 1 do artigo 14.º, o tipo contratual pode ser um de dois: o contrato de encomenda de criação intelectual e o contrato de trabalho (seja público, seja privado).

Ainda segundo aquele preceito, naqueles casos a titularidade do direito de autor determina-se de harmonia com o que tiver sido convencionado.

Todavia, conforme se assinalou, na falta de convenção, presume-se a titularidade do criador intelectual quando a obra é realizada no desempenho de um dever funcional ou de um contrato de trabalho, isto é, por conta de outrem (cfr. n.º 2 do artigo 14.º), exceto se for omitido o seu nome, situação em que se presume que o direito de autor pertence à entidade por conta de quem a obra é feita (cfr. n.º 3 do artigo 14.º).

No que concerne ao contrato de encomenda de criação intelectual, tem sido discutida, na doutrina e bem assim na jurisprudência, a sua natureza jurídica.

Refere Pedro Romano Martinez que, por via de regra, se alguém encomenda a outrem a realização de uma obra intelectual terá sido ajustado um contrato de prestação de serviço[117].

O Supremo Tribunal de Justiça no Acórdão, amplamente referenciado, de 8 de novembro de 1983[118], proferido no Processo n.º 70 604, considerou que o contrato de empreitada pode ter por objeto uma obra eminentemente intelectual ou artística, nomeadamente a produção de filmes para uma empresa de televisão[119].

Antunes Varela, em anotação àquele acórdão, escrevia a dado passo[120]:

«A relação umbilical que liga a obra literária, artística ou científica à personalidade do autor, por força da qual ela reflete a liberdade (de criação, divulgação, modificação ou comunicação) inerente a todo o ser humano, é como tal tutelada por lei, como se verifica através do regime especial de que gozam os direitos de autor (que não se confunde com o regime típico da empreitada, nem sequer, no seu aspeto estático, com o regime jurídico da propriedade).
E é essa ligação profunda da obra literária, artística ou científica à personalidade moral do autor, reconhecida e tutelada por lei, que não encontra a mínima ressonância no regime legal que o Código de 66 traçou para a empreitada»[121].

E, um pouco mais à frente, precisava:

«Não quer isto significar que a esses contratos de realização duma obra literária, científica ou artística não possam ou não devam ser aplicadas, por analogia, algumas das disposições reguladoras da empreitada.
Mas quer dizer que, não sendo o literato, o artista ou o cientista um mero empreiteiro da entidade que lhe encomendou a obra, aos direitos e obrigações emergentes do seu contrato só serão aplicáveis as normas da empreitada reguladora de situações em que haja perfeita analogia com as verificadas naqueles contratos»[122].

O Supremo Tribunal de Justiça viria, porém, no Acórdão, de 2 de fevereiro de 1988[123], proferido no Processo 75 672, a rejeitar a tese do contrato de empreitada que tem por objeto uma obra material, não abrangendo, por isso, uma criação intelectual do domínio artístico, exteriorizado pela pintura em tela, e a considerar um contrato de prestação de serviços inominado.

Com efeito, o contrato através do qual se encomenda uma criação intelectual pode revestir a modalidade atípica de prestação de serviços.

Neste sentido, escreve Pedro Romano Martinez «se alguém encomenda um quadro a um pintor, um romance a um escritor ou um estudo económico a um técnico, em princípio o criador da obra não foi mandatado para praticar atos jurídicos por conta do ordenante (art. 1156.º do CC), não recebeu uma coisa para a guardar e depois restituir (art. 1185.º do CC) e é controverso que venha a realizar uma obra no sentido previsto no art. 1207.º do CC. Ora, não se tratando de mandato, depósito ou empreitada, a prestação de serviço celebrada será atípica. Para as modalidades de prestação de serviço não reguladas especialmente na lei – dispõe o art. 1156.º do CC que são extensíveis as regras relativas ao mandato»[124].

De todo o modo, aquele Autor, conquanto apresente argumentos no sentido de que o contrato de empreitada só pode ter por objeto coisas corpóreas, excluindo-se, assim, as criações intelectuais, defende que «[a]os negócios pelos quais alguém se obriga a realizar uma obra intelectual aplicam-se, em primeiro lugar, as disposições respeitantes ao direito de autor, e em tudo o que não estiver nestas regulado, poderão, em casos delimitados e por via analógica, aplicar-se as regras de contrato de empreitada»[125].

Também na linha de um contrato de prestação de serviços inominado se pronunciou Luiz Francisco Rebello[126], que, aliás, menciona o debate sobre a matéria[127].

Deve referir-se, porém, que ainda que o direito de autor pertença ao criador intelectual há que ter em consideração as restrições constantes do artigo 15.º [128].


2.2.4. Face à colocação da presente consulta, merece-nos particular atenção o normativo dos artigos 16.º a 19.º atinentes às obras feitas em colaboração e coletivas.

Assim, nos termos do n.º 1 do artigo 16.º, a obra que for criação de uma pluralidade de pessoas denomina-se obra feita em colaboração, quando divulgada ou publicada em nome dos colaboradores ou de algum deles, quer possam discriminar-se, quer não os contributos individuais [cfr. alínea a)]; e obra coletiva, quando organizada por iniciativa de entidade singular ou coletiva e divulgada ou publicada em seu nome [cfr. alínea b)].

O regime geral das obras feitas em colaboração consta dos artigos 17.º [129] e 18.º [130] e das obras coletivas do artigo 19.º [131].

Destarte, o direito de autor de obra feita em colaboração pertence a todos os que nela tiverem colaborado, seguindo o seu exercício o regime da compropriedade (cfr. n.º 1 do artigo 17.º).

Todavia, «[s]e a obra feita em colaboração for divulgada ou publicada apenas em nome de algum ou alguns dos colaboradores, presume-se, na falta de designação explícita dos demais em qualquer parte da obra, que os não designados cederam os seus direitos àquele ou àqueles em nome de quem a divulgação ou publicação é feita» (n.º 3 do artigo 17.º).

E, segundo o n.º 2 do artigo 18.º, com a epígrafe “Direitos individuais dos autores de obra feita em colaboração”, «[q]ualquer dos autores pode, sem prejuízo da exploração em comum de obra feita em colaboração, exercer individualmente os direitos relativos à sua contribuição pessoal, quando esta possa discriminar-se».

Quanto à obra coletiva, o direito de autor é atribuído à entidade singular ou coletiva que tiver organizado e dirigido a sua criação e em nome de quem tiver sido divulgada ou publicada (cfr. n.º 1 do artigo 19.º).

Os jornais são apresentados como paradigma de obras coletivas, estabelecendo, aliás, essa presunção o n.º 3 do artigo 19.º e constando o regime específico dos artigos 173.º e 174.º.

Como refere Menezes Leitão, «[c]om mais precisão se pode dizer que a obra coletiva é aquela que é realizada no âmbito de uma empresa, cabendo assim o direito de autor ao respetivo empresário, seja ele uma entidade individual ou coletiva»[132].

No entanto, se no conjunto da obra coletiva for possível discriminar a produção pessoal de algum ou alguns colaboradores, aplicar-se-á, relativamente aos direitos sobre essa produção pessoal, o preceituado quanto à obra feita em colaboração (cfr. n.º 2 do artigo 19.º).

A obra coletiva pode, portanto, ser também realizada no âmbito de relações laborais: os vários autores (trabalhadores), sob a iniciativa e organização de uma empresa (empregador), contribuem para a realização da obra que vem a ser divulgada ou publicada, sendo o direito de autor atribuído a esta, desde que não se possa discriminar a contribuição pessoal de cada um dos colaboradores[133].

Conforme assinala José João Abrantes[134], «[a] obra coletiva representa, deste modo, uma aproximação ao direito industrial, com o afastamento da ideia de proteção da criação em favor da tutela do investimento. O empregador será o titular do direito de autor relativamente à obra realizada pelos seus trabalhadores, mas não lhe são atribuídos direitos pessoais de autor, que só tutelam o criador intelectual»[135].

Não pode, contudo, deixar-se de mencionar que a obra coletiva tem sido uma figura controversa. Por exemplo, para António Delgado, na análise que faz das legislações que utilizam a expressão obra coletiva, nem as noções de obra coletiva propostas são totalmente rigorosas nem a posição jurídica de que goza o seu promotor contribui para um desenvolvimento do sistema do Direito de Autor, e se tal fosse pouco, esta posição não parece justificar-se na prática e nenhum obstáculo parece existir para não se colocar no âmbito contratual[136].

No nosso caso, face ao estatuído nos artigos 16.º, n.º 1, alínea b), e 19.º, n.os 1 e 2, do CDA, nas obras coletivas, a empresa – mais rigorosamente, a entidade promotora – surge como titular originário do direito de autor, apenas sendo atribuídos direitos de autor autónomos sobre certos componentes da obra se, em relação a eles, for possível discriminar as contribuições individuais de pessoas determinadas[137].

Mas justamente uma questão que tem suscitado controvérsia na doutrina é a da titularidade dos direitos pessoais quando não é possível discriminar as criações individuais.

Assim, alguns Autores consideram que quando não for possível discriminar as contribuições individuais a obra coletiva não gera direitos pessoais.

Neste sentido, Oliveira Ascensão, considerando embora que a empresa é o verdadeiro titular do direito de autor, e titular originário, defende que a empresa não tem direitos pessoais, acrescentando que «[o]s efeitos práticos na exploração da obra não são prejudicados pela ausência de direito pessoal»[138].

Já Maria Vitória Rocha opta por uma posição menos radical, admitindo que «a pessoa coletiva tem, pelo menos, alguns direitos pessoais de autor (não terá o direito ao inédito, nem o direito ao anonimato, por exemplo, por força do próprio conceito de obra coletiva, mas será razoável ter atributos do direito de paternidade ou o direito de integridade e genuinidade)»[139]. Assim, entende «que a empresa (na maior parte dos casos, uma pessoa jurídica), titular dos direitos patrimoniais sobre a obra coletiva, deverá também poder defender-se contra atos violadores da integridade da obra, atos que coloquem em causa a paternidade da mesma e outros do mesmo tipo […]. Há, no entanto, que admitir que os direitos pessoais da entidade coletiva não terão a mesma amplitude e força dos direitos pessoais do autor, pessoa física, pelo que tenderão a ser secundarizados pelo intérprete […]»[140].


3. É chegado o momento de nos dirigirmos diretamente à situação sob consulta e ensaiarmos as respostas que a nosso ver deveriam ser dadas às questões colocadas.


3.1. A primeira pergunta formulada pela entidade consulente, recorde-se, é a seguinte:

«Os enunciados das provas e dos exames nacionais são suscetíveis de integrarem o conceito de obra coletiva previsto na alínea b) do n.º 1 do artigo 16.º do Código dos Direitos de Autor e Direitos Conexos, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 63/85, de 14 de março, na redação vigente, beneficiando de proteção jus-autoral?»

Estão, portanto, em causa os enunciados das provas e exames nacionais, importando referir, de acordo com os elementos disponíveis, desde logo, os termos em que se processa a sua feitura.

Aqueles instrumentos de avaliação externa das aprendizagens são elaborados no âmbito do IAVE.
O IAVE, criado pelo Decreto-Lei n.º 102/2013, é um instituto público de regime especial, integrado na administração indireta do Estado (cfr. artigo 1.º)

E, para o exercício de funções relativas à conceção dos instrumentos de avaliação externa e da organização de sistemas de informação necessários à produção dos mesmos, os serviços e organismos do MEC devem assegurar a mobilidade de trabalhadores dos respetivos serviços e organismos e dos estabelecimentos de ensino básico e secundário nominalmente solicitados pelo IAVE (cfr. n.º 2 do artigo 18.º do Decreto-Lei n.º 102/2013, de 25 de julho).

Assim, quem elabora os referidos enunciados atuará em cumprimento de dever funcional.

Mas tal acontece, repete-se, no âmbito do IAVE que tem por missão o planeamento, a conceção e validação dos instrumentos de avaliação externa de conhecimentos e capacidades dos alunos dos ensinos básico e secundário (cfr. n.º 1 do artigo 3.º do Decreto-Lei n.º 102/2013).

E dos enunciados das provas e exames não é possível destacar a contribuição individual de quem os elaborou.

Parece, pois, e de acordo com o estatuído nos artigos 16.º, n.º 1, alínea b), e 19.º do CDA, conforme acima se explanou, ser de considerar os enunciados em apreço como obras coletivas.

Porém, saber se tal implica que o direito de autor cabe ao IAVE remete-nos já para a outra pergunta apresentada na consulta.


3.2. A pergunta a seguir é assim recortada:

«Em caso afirmativo, a quem cabe a titularidade dos direitos de autor? Ao Ministério da Educação ou ao IAVE, l.P.?»

É certo que, sendo os enunciados elaborados sob a direção e supervisão do IAVE, pessoa jurídica distinta do Estado, se poderia concluir ser aquele Instituto o titular do direito de autor, como aliás, parece reivindicar.

Todavia, há outras vertentes que têm de ser consideradas.

Desde logo, é o membro do Governo responsável pela área da educação que solicita os instrumentos de avaliação através de cartas de solicitação onde são explicitadas as especificações técnicas a que aqueles devem obedecer (cfr. n.os 1 e 2 do artigo 5.º do Decreto-Lei n.o 102/2013).

Assim, a elaboração dos enunciados além de ter de respeitar o estabelecido noutros normativos, como é o caso dos artigos 24.º e 24.º-B do Decreto-Lei n.º 139/2012, tem de satisfazer o pedido nas cartas de solicitação.

E, como se pode ver das cartas de solicitação emitidas no ano de 2016, é o membro do Governo respetivo que indica quais as provas a realizar, com a atinente definição de objetivos, e estabelece os prazos de entrega dos originais dos enunciados e bem assim os requisitos que na sua elaboração têm de ser respeitados.

Será, pois, pertinente convocar aqui os dizeres de Pedro Romano Martinez a propósito da obra por encomenda, referindo, por exemplo, que a obra publicitária [artigo 2.º, n.º 1, alínea m), do CDA] normalmente depende de uma encomenda[141]. E explicitava aquele Autor:

«Mas, neste caso, há que distinguir: a encomenda de publicidade a uma agência; a relação contratual entre a agência de publicidade e aquele que idealiza a mensagem publicitária»[142].

Ora, justamente, no caso em apreciação, temos que, conquanto a elaboração dos enunciados seja de considerar como obra coletiva, há também que considerar que se está perante uma encomenda do Governo ao IAVE.

Com efeito, não se trata aqui de financiar ou subsidiar uma obra, nos termos do artigo 13.º do CDA, a que já nos referimos, mas sim de uma obra por encomenda do Estado, cujo pagamento ao IAVE se haverá de considerar feito através das dotações que lhe são atribuídas no Orçamento do Estado.

Destarte, face ao que se vem de dizer, parece ser de concluir que a atinente titularidade dos direitos de autor cabe ao Estado.

Na verdade, observa-se que também no domínio dos direitos de autor o legislador consagrou fórmulas, como no caso das obras por encomenda e das obras coletivas, em que, à semelhança do que acontece em matéria de propriedade industrial, se acentua a proteção do investimento[143].

Como sintetiza Carlos Ferreira de Almeida, «[a]final, na prática, o titular da obra produzida para outrem será normalmente a pessoa que a pagou»[144].

Em suma, na situação sob consulta, a elaboração dos enunciados é, atualmente, nos termos legais referenciados, solicitada pelo Ministro da Educação ao IAVE, de acordo com as suas atribuições.

Acresce que do diploma que criou o IAVE – o Decreto-Lei n.º 102/2013 – não se retira que lhe seja concedida a titularidade dos direitos de autor no que respeita aos enunciados cuja elaboração lhe é solicitada pelo membro do Governo responsável pela área da educação.


3.3. Aqui chegados, importa atentar na última pergunta formulada na presente consulta:

«Constitui violação dos direitos de autor previstos no Código dos Direitos de Autor e Direitos Conexos, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 63/85, de 14 de março, na redação vigente, a publicação e comercialização de coletâneas de enunciados de exames nacionais com as correspondentes resoluções por entidade distinta do titular dos direitos de autor?»

O CDA no seu Título IV, com a epígrafe “Da violação e defesa do direito de autor e dos direitos conexos”, regula a tutela penal, civil e contraordenacional.

No âmbito da tutela penal, o Código prevê quatro crimes: o crime de usurpação (artigo 195.º), o crime de contrafação (artigo 196.º), o crime de violação do direito moral (artigo 198.º) e o crime de aproveitamento de obra contrafeita ou usurpada (artigo 199.º).

Conforme salienta Menezes Leitão, «o tipo criminal de usurpação encontra-se constituído de forma bastante mais ampla do que ou outros crimes aqui tipificados, tendendo esta a ser a forma de incriminação mais comum da violação dos direitos de autor e dos direitos conexos»[145].

E a primeira previsão do crime de usurpação é a constante do n.º 1 do artigo 195.º, segundo a qual comete o crime de usurpação quem, sem autorização do autor ou do artista, do produtor de fonograma e videograma ou do organismo de radiofusão, utilizar uma obra ou prestação por qualquer das formas previstas no Código.

Como refere Luiz Francisco Rebello «[f]ace aos artigos 195.º e 196.º do Código atual, usurpação é toda a utilização não autorizada de uma obra (e agora, também de uma prestação de artista intérprete ou executante, de um fonograma ou videograma, de uma emissão de radiodifusão) ou que exceda os limites da autorização concedida, e contrafação a utilização como própria de uma criação ou prestação alheias, no todo ou em parte (mas neste último caso, restritamente nessa parte). Assim, o que vulgarmente se designa por plágio constitui o caso mais flagrante de contrafação»[146].

Os direitos autorais são ainda tutelados através da aplicação das contraordenações previstas no artigo 205.º do CDA.

E, entre os meios de tutela civil, prevê-se o direito a indemnização nos termos do artigo 211.º, não se esquecendo, designadamente, as providências cautelares a que se refere o artigo 210.º-G.

De acordo com o disposto no artigo 203.º, a responsabilidade civil emergente da violação dos direitos previstos no Código é independente do procedimento criminal a que esta dê origem, podendo, contudo, ser exercida em conjunto com a ação criminal.

Posto isto, e respondendo à última pergunta formulada na presente consulta, a publicação e comercialização de coletâneas de enunciados com as correspondentes resoluções sem autorização do titular dos direitos de autor pode constituir violação dos direitos de autor suscetivel de integrar o crime previsto no artigo 195.º, n.º 1, do CDA e bem assim de fundamentar responsabilidade civil.

E não será despiciendo sublinhar que, no caso vertente, não se pode considerar que se está perante uma utilização lícita nos termos do artigo 75.º do CDA[147].

Outrossim, subjaz ao nosso entendimento que a criação dos enunciados não se trata de uma obra não protegida nos termos do n.º 1 do artigo 8.º do CDA.

Com efeito, não estamos perante decisões administrativas.

É certo que do parecer ficou a constar que os enunciados integram decisões administrativas. Porém, a meu ver, não foi feita qualquer interpretação hermenêutica que sustente a interpretação daquela norma com semelhante latitude.

Bastará pensarmos em outras situações, como, por exemplo, a elaboração de um projeto de arquitetura para a construção de um tribunal.

Impõe-se, ainda, uma breve nota no que concerne ao IAVE, no sentido de que se afigura adequado que a matéria da titularidade dos direitos de autor relativos aos enunciados de exames solicitados pelo Governo e respetivas resoluções seja objeto de explicitação no diploma que aprova a sua orgânica.

De todo o modo, face ao que se vem de explanar, entendo que é ao Ministério da Educação (Estado) que cabe a exploração económica dos enunciados em apreço.

Isto, naturalmente, não afeta o acesso do público àqueles documentos, de acordo com o regime, hoje, constante da Lei n.º 26/2016, de 22 de agosto.

Mas implica que é o Ministério da Educação, e não o IAVE, que deve definir as condições de reutilização dos enunciados, cabendo-lhe, desde logo, determinar os moldes em que se deve processar a sua disponibilização através da Internet e, em caso de se estabelecer a necessidade de autorização, emiti-la nos termos daquela Lei[148].

Dito de outro jeito, é o CDA que regula a titularidade dos direitos de autor, regulando a Lei n.º 26/2016 o consentimento para a utilização de documentos quando tal é necessário.

Acresce que se o conceito de decisões administrativas tivesse a amplitude dada no Parecer, a que atrás já se aludiu, face ao disposto no n.º 2 do artigo 19.º da Lei n.º 26/2016, ficariam particularmente esvaziadas as disposições seguintes daquela Lei atinentes ao pedido de reutilização de documentos.


4. Em suma, entendo que a elaboração dos enunciados das provas e exames nacionais deve ser considerada obra protegida nos termos do Código do Direito de Autor e dos Direitos Conexos – no caso obra coletiva –, sendo o Estado (Ministério da Educação) o titular dos respetivos direitos de autor e cabendo-lhe a respetiva exploração económica e bem assim, consequentemente, definir as condições da sua reutilização de acordo com o disposto, atualmente, na Lei n.º 26/2016.








[1] Ofício entrado na Procuradoria-Geral da República em 25-10-2016.
[2] O referido projeto vencido encontra-se junto ao processo, conforme determina o artigo 22.º, n.º 3, do Regimento do Conselho Consultivo da Procuradoria-Geral da República.
[3] Foi o seguinte o teor do texto que precedeu a colocação das questões transcritas:
«Importa desde logo referir que a avaliação externa das aprendizagens dos alunos integra a realização de provas de aferição, de provas finais de ciclo e de exames finais nacionais (cfr. artigo 24.º-B do Decreto-Lei n.º 139/2012, de 5 de julho).
«Ora, a atribuição de planear, conceber e validar os instrumentos de avaliação externa dos alunos, nomeadamente, as provas finais e exames nacionais e definir os respetivos critérios de classificação, foi conferida ao lnstituto da Avaliação Educativa, l.P., doravante designado por IAVE, l.P. [cfr. alínea a) do n.º 2 do artigo 3.º do Decreto-Lei n.º 102/2013, de 25 de junho].
«Sublinhe-se que o IAVE, I.P., elabora os sobreditos instrumentos de avaliação mediante solicitação do membro do Governo responsável pela área da educação de acordo com cartas de solicitação, as quais especificam as provas e os exames a aplicar, bem como as especificações técnicas a que os mesmos devem obedecer (cfr. n.os 1 e 2 do artigo 5.º do Decreto-Lei n.º 102/2013).
«A este propósito, cabe ainda referir que o IAVE, I.P., procede à entrega dos enunciados das provas e dos exames nacionais nos prazos fixados na Editorial do Ministério da Educação, com vista à sua impressão e ulterior distribuição pelos respetivos estabelecimentos de ensino.
«Todavia, os encargos com a impressão e distribuição dos enunciados das provas e exames nacionais são suportados pelo orçamento da Direção-Geral da Educação – e não pelo IAVE, I.P.
«Sucede que um organismo pertencente ao Ministério da Educação e alguns livreiros privados têm vindo a publicar e comercializar coletâneas de enunciados de exames nacionais com as respetivas resoluções.
«Recentemente, o IAVE, I.P., veio referir que os enunciados das provas e exames nacionais beneficiam da proteção da lei jus-autoral e reivindicar a titularidade do direito de autor relativo a tais enunciados, em síntese, com os seguintes fundamentos:
«(i) Os enunciados são elaborados sob a direção e supervisão do instituto, numa lógica de obra coletiva;
«(ii) O direito de autor moldar-se (objetiva e subjetivamente) no momento e no contexto em que a obra em questão é criada;
«(iii) O IAVE, l.P., é uma pessoa jurídica distinta do Estado, atenta a sua natureza jurídica de lnstituto Público de regime especial, integrado na administração indireta do Estado, dotado de autonomia pedagógica, científica, administrativa e financeira e de património próprio (cfr. artigo 1.º do Decreto-Lei n.º 102/2013);
«(iv) Os trabalhadores que desenvolvem a sua atividade no IAVE, I.P., acham-se vinculados a este e não ao Estado e, nessa medida, qualquer obra coletiva que seja desenvolvida no seio do IAVE, I.P. é uma obra concebida sob a direção e supervisão do IAVE, I.P., e não do Estado (Ministério da Educação).
«(v) Sendo o IAVE, I.P., titular dos direitos de autor sobre tais provas, nenhuma outra entidade, ainda que do Ministério da Educação, poderá apropriar-se de tais direitos e, sobretudo, explorá-los economicamente sem expressa autorização prévia do IAVE, I.P.
«Todavia, importa notar que, conforme supra se expôs, cabe ao membro do Governo definir os instrumentos de avaliação que pretende aplicar e as especificações técnicas a que os mesmos devem obedecer (cfr. n.º 2 do artigo 5.º do Decreto-Lei n.º 102/2013).
«E, por outro lado, uma larga maioria dos trabalhadores que exercem funções no lAVE, I.P., possuem vínculo de emprego público titulado por contrato de trabalho por tempo indeterminado com Estado, ou seja, trata-se de docentes de carreira pertencentes aos quadros dos Agrupamentos de Escola ou de Escola não agrupada ou dos Quadros de Zona Pedagógica do Ministério da Educação, os quais exercem funções no IAVE, I.P., em regime de mobilidade, a tempo inteiro ou a tempo parcial, cujos vencimentos são pagos com dotações provenientes do orçamento de Estado (cfr. n.º 2 e 3 do artigos 18.º e 20.º ambos do Decreto-Lei n.º 102/2013).
«Em suma, segundo a perspetiva defendida pelo IAVE, I.P., o Ministério da Educação que faz a encomenda das provas, suporta os encargos da sua produção, ao garantir o orçamento do IAVE e ao destacar professores para o exercício dessas funções, assume as despesas com a impressão, distribuição e correção das mesmas, mas é o IAVE, l.P. que dispõe da exclusividade dos direitos autorais atinentes à obra criada.»
[4] Publicado no Diário da República II.ª Série, de 16-12-2015 (também acessível na base de dados aberta ao público sita em http://www.dgsi.pt/pgrp.nsf).
[5] Alterado pelos Decretos-Leis n.os 91/2013, de 10 de julho, e 176/2014, de 12 de dezembro, e alterado e aditado pelo Decreto-Lei n.º 17/2016, de 4 de abril.
[6] Relativamente ao ensino básico na redação originária do Decreto-Lei n.º 139/2012 encontrava-se prevista no artigo 24.º, n.º 4, alínea b), e passou a constar do artigo 24.º, n.º 2, alínea b), após a revisão operada pelo Decreto-Lei n.º 17/2016. Quanto ao ensino secundário subsiste consagrada no artigo 29.º, n.º 2, alínea b) do Decreto-Lei n.º 139/2012.
[7] As quais visam, de acordo com o disposto no artigo 24.º-B, n.º 1: a) Acompanhar o desenvolvimento do currículo, nas diferentes áreas, providenciando informação regular ao sistema educativo; b) Fornecer informações detalhadas acerca do desempenho dos alunos à escola, aos professores, aos encarregados de educação e aos próprios alunos; c) Potenciar uma intervenção pedagógica atempada, dirigida às dificuldades identificadas para cada aluno.
[8] Estas visam, segundo o disposto no atual artigo 24.º-B, n.º 2, avaliar o desempenho dos alunos, certificar a conclusão do ensino básico e criar a possibilidade de prosseguimento de diferentes percursos escolares. Na versão originária de 2012, a avaliação externa no ensino básico compreendia a realização de provas finais nos 4.º, 6.º e 9.º anos de escolaridade, incidentes, respetivamente, sobre os conteúdos dos 1.º, 2.º e 3.º ciclos nas disciplinas de Português, Matemática e na disciplina de Português língua não materna (artigos 24.º, n.º 4, alínea b) e 26.º, n.º 1, alínea b) da redação originária do Decreto-Lei n.º 139/2012).
[9] Artigo 29.º, n.º 2, alínea b) do Decreto-Lei n.º 139/2012. O n.º 3 do artigo 24.º-B, na redação introduzida pelo Decreto-Lei n.º 17/2016, apesar de a norma estar integrada na secção II relativa ao Ensino básico, refere-se aos exames finais indicando que têm como objetivo «avaliar o desempenho dos alunos e certificar a conclusão do ensino secundário nas ofertas formativas que prevejam avaliação externa das aprendizagens, podendo ainda ser considerados para efeitos de acesso ao ensino superior».
[10] O qual à data do presente parecer não se encontra acessível na base de dados aberta ao público sita em http://www.dgsi.pt/pgrp.nsf, subsistindo apenas na «área reservada».
[11] Refira-se que nesse parecer, aprovado por maioria após procedimento de redistribuição similar ao do presente parecer, se rejeitou a tese de projeto de relatora originária que veio a ser mantida na respetiva declaração de voto de vencida no sentido de que «não é possível efetivar a responsabilidade disciplinar dos docentes do ensino particular e cooperativo não superior no âmbito da avaliação externa de alunos».
[12] Cf. Decreto-Lei n.º 125/2011, de 29 de dezembro, com as alterações introduzidas pelo Decreto-Lei n.º 266-G/2012, de 31 de dezembro.
[13] Cf. preâmbulo do Decreto-Lei n.º 14/2012, de 20 de janeiro (diploma alterado pelo alterado pelo Decreto-Lei n.º 266-F/2012, de 31 de dezembro)
[14] O que compreende designadamente, nos termos do artigo 2.º, n.º 1, da Portaria n.º 258/2012, de 28 de agosto (alterada pela Portaria n.º 32/2013, de 29 de janeiro):
«a) Coordenar e planificar a realização das provas finais, dos exames finais nacionais, dos exames a nível de escola equivalentes aos nacionais e das provas de exame de equivalência à frequência dos 2.º e 3.º ciclos do ensino básico e provas de equivalência à frequência do ensino secundário e organizar a respetiva logística;
«b) Estabelecer as normas técnicas para correção e classificação das provas finais, dos exames nacionais, dos exames a nível de escola equivalentes aos nacionais e das provas de exame de equivalência à frequência dos 2.º e 3.º ciclos do ensino básico e do ensino secundário, bem como as referentes à reapreciação e reclamação das mesmas provas;
«c) Promover os mecanismos de apoio à prestação de provas finais de ciclo e de exames finais nacionais por parte dos alunos com necessidades educativas especiais;
«d) Definir os procedimentos relativos à realização das provas finais de ciclo, dos exames finais nacionais e à respetiva classificação;
«e) Elaborar as orientações adequadas por forma a garantir a qualidade do processo de avaliação externa da aprendizagem;
«f) Determinar a afixação das pautas nas escolas;
«g) Disponibilizar os dados estatísticos e respetiva análise referentes à avaliação externa da aprendizagem;
«h) Propor os normativos legais de suporte à realização das provas de avaliação externa;
«i) Emitir parecer sobre as questões relativas ao processo de avaliação externa;
«j) Validar as condições de acesso dos alunos à realização de provas finais de ciclo e de exames finais nacionais e consequente certificação dos seus currículos;
«k) Decidir sobre situações imprevistas ocorridas em qualquer das chamadas ou fases dos exames;
«l) Elaborar um relatório no final de cada ano escolar de apreciação do processo de inscrição, realização, classificação, reapreciação e reclamação de exames, bem como do respetivo sistema de informação;
«m) Desenvolver durante o processo de realização de provas de avaliação externa os procedimentos adequados para garantir a segurança, a confidencialidade e a equidade nas provas, quando necessário em articulação com o Gabinete de Avaliação Educacional;
«n) Colaborar com o Gabinete de Avaliação Educacional na definição de critérios relativos à formação de professores no domínio da avaliação das aprendizagens;
«o) Assegurar a colaboração com o Gabinete de Avaliação Educacional no processo da avaliação das aprendizagens, garantindo a coerência entre currículo e avaliação.»
[15] No parecer n.º 23/2015 analisaram os dois últimos regulamentos até então aprovados Regulamento do JNE e Regulamento das Provas e dos Exames do Ensino Básico e do Ensino Secundário), ambos aprovados pelo Despacho Normativo n.º 6-A/2015, de 5 de março.
[16] O artigo 3.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 102/2013 prescreve que o IAVE «tem por missão o planeamento, a conceção e validação dos instrumentos de avaliação externa de conhecimentos e capacidades dos alunos dos ensinos básico e secundário, o tratamento e a divulgação de informação relevante para a tomada de decisões que concorram para incrementar a qualidade, eficácia e eficiência do sistema educativo nacional, assegurar a coordenação da participação nacional em estudos internacionais de avaliação externa de alunos, bem como a elaboração de provas de certificação de conhecimentos e capacidades específicas para outros fins e outros graus de ensino, quando solicitado».
[17] Artigo 21.º do Regulamento das Provas de Avaliação Externa.
[18] Artigo 22.º, n.º 1, do Regulamento das Provas de Avaliação Externa.
[19] Artigo 24.º, n.º 1, do Regulamento das Provas de Avaliação Externa.
[20] Artigo 42.º do Regulamento das Provas de Avaliação Externa.
[21] Artigo 46.º do Regulamento das Provas de Avaliação Externa.
[22] Artigo 22.º, n.º 2, do Regulamento das Provas de Avaliação Externa.
[23] Artigo 22.º, n.º 3, do Regulamento das Provas de Avaliação Externa.
[24] Dimensão fundamental que já tinha estado presente na reorganização do Gabinete de Avaliação Educacional (GAVE), que precedeu o IAVE, destacando-se no preâmbulo do Decreto-Lei n.º 125/2011, de 29 de dezembro (alterado pelos Decretos-Leis n.os 266-G/2012, de 31 de dezembro, 102/2013, de 25 julho, e 96/2015, de 29 de maio).
[25] A redação do artigo 5.º, com a epígrafe Instrumentos de avaliação e especificações técnicas, do Decreto-Lei n.º 102/2013 é a seguinte:
«1. O IAVE, I.P., desenvolve a sua missão de planeamento, conceção e validação dos instrumentos de avaliação que lhe forem solicitados pelo membro do Governo responsável pela área da educação de acordo com cartas de solicitação, as quais são objeto de publicitação na página eletrónica do IAVE, I.P.
«2. As cartas de solicitação referidas no número anterior explicitam os instrumentos que o membro do Governo responsável pela área da educação pretende aplicar e as especificações técnicas a que os mesmos devem obedecer.
«3. A elaboração dos instrumentos de avaliação externa dos alunos dos ensinos básico e secundário pelo IAVE, I.P., tem obrigatoriamente como referência os programas das disciplinas, bem como as metas curriculares a atingir por ano de escolaridade e ciclo de ensino homologadas pelo membro do Governo responsável pela área da educação, e deve respeitar o calendário de realização de provas e exames aprovado pelo mesmo.
«4. A elaboração de instrumentos de avaliação para comprovação de conhecimentos e capacidades específicos pelo IAVE, I.P., tem obrigatoriamente como referência as orientações e o cronograma de realização desses instrumentos definidos pelo membro do Governo responsável pela área da educação.»
[26] Tendo sido destacado pela entidade consulente que o IAVE «procede à entrega dos enunciados das provas e dos exames nacionais nos prazos fixados na Editorial do Ministério da Educação, com vista à sua impressão e ulterior distribuição pelos respetivos estabelecimentos de ensino». Sublinhando, ainda, que «os encargos com a impressão e distribuição dos enunciados das provas e exames nacionais são suportados pelo orçamento da Direção-Geral da Educação – e não pelo IAVE».
[27] Publicado no Diário da República, II Série, de 16-1-2013.
[28] A orientação estabelecida no parecer n.º 18/2012 sobre a natureza da Editorial do Ministério da Educação atendeu, nomeadamente, a que essa entidade «apresenta características que exigem uma atenção cautelosa que não obnubile o essencial: Trata-se de uma entidade integrada na pessoa coletiva Estado que tem autonomia administrativa e financeira e beneficia de receitas próprias que podem não ser oriundas do orçamento de Estado». Tendo por base a doutrina estabelecida no parecer n.º 18/2012, o estatuto dos trabalhadores da Editorial após a transição de 2008 (supra § II.2.2) foi analisado no parecer n.º 6/2013, de 18-4-2013 (publicado no Diário da República, II Série, de 7-6-2013).
[29] Cf. artigo 6.º, n.º 3, do Regulamento das Provas de Avaliação Externa.
[30] E, como se destacou na doutrina aprovada no parecer n.º 23/2015, a ausência de vínculo de emprego público de alguns atores, no caso professores de escolas do EPC «não é por si só impeditiva do estabelecimento por via legislativa de poderes sancionatórios do Estado relativamente aos referidos agentes na medida em que a participação de docentes de escolas do EPC na atividade de avaliação externa de alunos se configura como um caso particular de exercício de funções públicas por particulares».
[31] Antes da adesão à convenção de Berna na versão de Paris de 1971, Portugal já tinha aderido em 1911 à referida convenção na versão completada em Paris em 1896.
[32] V.g. André Gonçalves Pereira / Fausto de Quadros, Manual de Direito Internacional Público, Almedina, Coimbra (3ª ed.), 2005, p. 121; Jorge Miranda in Jorge Miranda / Rui Medeiros (eds), Constituição Portuguesa Anotada, tomo II, Coimbra Editora, Coimbra, 2005,, p. 94; Jorge Miranda, Curso de Direito Internacional Público, Principia, Parede, 2009, p. 171; Jorge Bacelar Gouveia, Manual de Direito Internacional Público, Almedina, Coimbra (3ª ed.), 2008, p. 456, em sentido distinto J. J. Gomes Canotilho / Vital Moreira colocam em causa a prevalência das normas de Direito Internacional convencional sobre o direito legal ordinário, apontando para a necessidade de distinguir entre leis simples e leis reforçadas (Constituição da República Portuguesa Anotada, Coimbra Editora, Coimbra (4.ª ed.), 2007, pp. 259 e ss.).
[33] Publicado no Diário da República II Série, de 18-4-2016 (também acessível na base de dados aberta ao público sita em http://www.dgsi.pt/pgrp.nsf).
[34] Informação-parecer disponível para consulta em www.dgsi.pt/pgrp.nsf?OpenDatabase.
[35] Informação-parecer disponível para consulta em www.dgsi.pt/pgrp.nsf?OpenDatabase.
[36] Informação-parecer disponível para consulta em www.dgsi.pt/pgrp.nsf?OpenDatabase.
[37] Informação-parecer disponível para consulta em www.dgsi.pt/pgrp.nsf?OpenDatabase.
[38] Esta informação-parecer não se apresenta disponível para consulta em www.dgsi.pt/pgrp.nsf?OpenDatabase, estando, apenas, na «área reservada» da base de dados.
[39] Esta informação-parecer não se apresenta disponível para consulta em www.dgsi.pt/pgrp.nsf?OpenDatabase, estando, apenas, na «área reservada» da base de dados.
[40] «Direito de autor sem autor e sem obra», in José de Oliveira Ascensão (ed.) Direito da Sociedade de Informação, vol. VII, Coimbra, Coimbra Editora, 2008, p. 28.
[41] «Law as Design: Objects, Concepts, and Digital Things», Case Western Reserve L. Rev., v. 56, n. 2, 2005, p. 382.
[42] Op. cit., p. 384.
[43] «Fica reservada às legislações dos países da União a determinação da proteção a conceder aos textos oficiais de carácter legislativo, administrativo ou judiciário, bem como às traduções oficiais desses textos.»
[44] Cf. no mesmo sentido Patrícia Akester, Direito de autor em Portugal, nos PALOP, na União Europeia e nos tratados internacionais, Coimbra, Almedina, 2013, p. 385.
[45] Alterado pelas Leis n.os 45/85, de 17 de setembro, e 114/91, de 3 de setembro, pelos Decretos-Leis n.os 332/97 e 334/97, ambos de 27 de novembro, e pelas Leis n.os 50/2004, de 24 de agosto, 24/2006, de 30 de junho, 16/2008, de 1 de abril, 65/2012, de 20 de dezembro, 82/2013, de 6 de dezembro, 32/2015, de 24 de abril, e 49/2015, de 5 de junho.
[46] Embora na versão de 1896 da Convenção de Berna (supra nota 31 do § II.3.1). O Código de Direito de Autor de 1966 (CDA de 1966) aprovado pelo Decreto-Lei n.º 46980, de 27-4-1966, ressalta a consagração do «direito de autor sobre a obra intelectual como coisa incorpórea» (artigo 7.º). Refira-se que nesse código, os entes públicos não eram abrangidos pela respetiva proteção. O código de 1966 tinha sido precedido pelo Decreto n.º 13725, de 3-6-1927, que substituira a anterior regulação que constava apenas do Código Civil de 1867.
[47] «Os textos compilados ou anotados, a que se refere a alínea c) do n.º 1 do artigo 3.º, bem como as suas traduções oficiais, não beneficiam de protecção.»
O âmbito da disposição do artigo 8.º, n.º 1, tem assim de de ser preenchido por conjugação com o disposto no artigo 3.º, n.º 1, alínea c): «São obras equiparadas a originais: […] As compilações sistemáticas ou anotadas de textos de convenções, de leis, de regulamentos e de relatórios ou de decisões administrativas, judiciais ou de quaisquer órgãos ou autoridades do Estado ou da Administração».
[48] Compilações e anotações de textos oficiais.
[49] ««Os textos compilados ou anotados, a que se refere a alínea c) do n.º 1 do artigo 3.º, bem como as suas traduções oficiais».
[50] V.g. neste sentido Luiz Francisco Rebello, Código do Direito de Autor e Direitos Conexos, Lisboa, Âncora Lda., 1998, pp. 39, 48 e 473; Alberto de Sá e Mello, Contrato de direito de autor — A autonomia contratual na formação do direito de autor, Coimbra, Almedina, 2008, pp. 400-402. No enquadramento da norma, José de Oliveira Ascensão destaca que o CDA preservou a distinção entre entes públicos e entes privados reconhecida no CDA de 1966 (Direito Civil — Direito de Autor e Direitos Conexos, Coimbra, Coimbra Editora, 1992, pp. 114-116, 147). Na mesma linha sentido Patrícia Akester destaca a diferença da opção do legislador português relativamente ao do Reino Unido (op. cit., p. 66 n133).
[51] Op. cit., p. 115.
[52] Na mesma linha de análise, embora em termos gerais e sem se reportar a provas ou exames nacionais, cf. Luiz Francisco Rebello, op. cit, p. 48.
[53] «Se os textos referidos no número anterior incorporarem obras protegidas, estas poderão ser introduzidas sem o consentimento do autor e sem que tal lhe confira qualquer direito no âmbito da actividade do serviço público de que se trate.» José de Oliveira Ascensão explana da seguinte forma a ratio do encadeamento normativo do artigo 8.º do CDA: «O artigo 8.º/1 refere-se a textos compilados ou anotados de convenções, leis, regulamentos, relatórios ou decisões administrativas, judiciais ou de quaisquer outros órgãos ou autoridades do Estado ou da Administração. E o n.º 2 prevê que esses textos incorporem obras protegidas, para admitir que essas possam ser reproduzidas sem consentimento do autor e sem que tal lhe confira qualquer direito no âmbito da atividade do serviço público de que se trata» (op. cit., p. 147).
[54] Nas palavras de José de Oliveira Ascensão, «Em qualquer caso, ela é atraída para obra oficial e sofre as consequências no regime, como nota a doutrina alemã» (op. cit., p. 116).
[55] Alberto de Sá e Mello, op. cit., pp. 400-401.
[56] Patrícia Akester, op. cit., p. 273 e, ainda, p. 79. Relativamente às compilações que compreendam textos ou anotações adicionais que não constam dos textos oficiais a respetiva tutela jusautoral derivará, ainda, da proteção dessas obras.
[57] Partindo de um objeto de reflexão distinto Alberto de Sá e Mello chega à mesma conclusão: «A conformação originária de situações jusautorais pela criação de obras intelectuais em execução e contratos de “avença” ou de “tarefa” celebrados com órgãos da Administração Pública não revela qualquer especialidade — que não alguma que se descubra resultar ou da característica das funções assim exercidas ou “género” das obras criadas (como veremos acontecer em exame do estatuto jusautoral dos denominados “textos oficiais”) — op. cit., pp. 392-393.
[58] O projeto vencido referido supra na nota 2 do § I do presente parecer compreendia neste plano uma perspetiva antagónica da aprovada, defendendo-se em sede conclusiva, nomeadamente, que:
«4.ª – A elaboração dos referidos enunciados deva ser considerada obra nos termos do artigo 1.º do Código do Direito de Autor e dos Direitos Conexos (CDA) e como tal protegida; […]
«12.ª – É, portanto, o Estado o titular dos direitos de autor relativamente aos citados enunciados e atinentes resoluções, cabendo-lhe a respetiva exploração económica;
«13.ª – Assim, a publicação e comercialização de coletâneas de enunciados e das correspondentes resoluções sem autorização do Estado constitui violação dos direitos de autor;
«14.ª – Tal violação é susceptivel de integrar o crime previsto no artigo 195.º, n.º 1, do CDA – crime de usurpação;
«15.ª – E, pode, designadamente, fundamentar também o acionamento de responsabilidade civil.»
Em face dos pressupostos do presente parecer, entende-se que tais teses não merecem ser especificamente rebatidas, na medida em que são incompatíveis com os fundamentos já expendidos neste parecer no § II.2, colidindo, ainda, com o entendimento defendido infra no § II.4 sobre os imperativos estabelecidos no direito comunitário e português em matéria de acesso e reutilização e documentos adminsitrativos.
[59] Como sublinha José de Oliveira Ascensão, o autor «mantém a possibilidade de explorar a obra, no que não for incompatível com a utilização oficial; e mantém o direito pessoal, embora este deva ser conciliado com a utilização para aquelas finalidades» (op. cit., p. 116).
Embora num outro contexto, de relação laboral com entes privados conexa com uma atividade regulada, no parecer n.º 35/2012, de 25-2-2013 (que à data do presente parecer não se encontra acessível na base de dados aberta ao público sita em http://www.dgsi.pt/pgrp.nsf, subsistindo apenas na «área reservada») este conselho defendeu a seguinte perspetiva:
«Relativamente às relações jurídicas do médico do trabalho com outros sujeitos envolvidos no serviço de saúde no trabalho, os direitos patrimoniais e morais (ou de personalidade) do médico enquanto autor não colidem com a transmissão da ficha clínica entre médicos do trabalho que se sucedem na prestação do serviço de saúde no trabalho, já que as mesmas integram o objeto do contrato de prestação de serviços ou de trabalho celebrado como médico do trabalho e os deveres legais relativos ao exercício dessa função.
«Com efeito, a preservação e transmissão integral da ficha clínica decorre das regras legais sobre o produto do labor intelectual do médico do trabalho previstas no regime jurídico da promoção da segurança e saúde no trabalho e, consequentemente, deve ser considerada abrangida nos termos do n.º 1 do artigo 15.º do CDA.
Em contraponto, o direito de autor do médico obsta a utilizações que já não podem ser deduzidas do contrato de prestação de serviços ou do contrato de trabalho celebrado como médico do trabalho.
«Acrescente-se que, em qualquer uma das tipologias possíveis de contratos celebrados pelo médico, os direitos pessoais relacionados com a obra continuam a pertencer ao autor originário, no caso médico.
«Refira-se quanto à paternidade da obra o artigo 27.º, n.º 1, do CDA que prescreve: “Salvo disposição em contrário, autor é o criador intelectual da obra». Estatuindo-se no n.º 2 do mesmo artigo a presunção de que é autor «aquele cujo nome tiver sido indicado como tal na obra, conforme o uso consagrado, ou anunciado em qualquer forma de utilização ou comunicação ao público”.
«Existindo um conjunto de direitos de personalidade especificamente previstos e diretamente tutelados pela lei neste domínio, em que ressaltam os princípios consagrados no artigo 56.º do CDA. […]
«Direitos pessoais relativos à obra que, embora possam sofrer algumas limitações em função do contrato (de trabalho ou prestação de serviços) celebrado, devem permanecer na esfera do autor, vertente em que se destacam os já referidos direitos de paternidade e de defesa da genuinidade e integridade da obra [Cf. Maria Vitória Rocha «A titularidade das criações intelectuais no âmbito da relação e trabalho», Nos 20 anos do Código das Sociedades Comerciais — Homenagem aos Profs. Doutores A. Ferrer Correia, Orlando Carvalho e Vasco Lobo Xavier, Coimbra Editora, Coimbra, p. 170. Podem ainda ver-se, na mesma linha, quanto à componente do direito autoral, José João Abrantes / Rita Canas da Silva, «Contratos de propriedade intelectual e contrato de trabalho», Contratos de Direito de Autor e de Direito Industrial, cit., 2011, pp. 80, 82, 86 e 88; Pedro Romano Martinez, Contratos de encomenda de criação intelectual», Contratos de Direito de Autor e de Direito Industrial, cit., 2011, pp.69-71.]
«Sublinhado que não olvida que a delimitação dos direitos exclusivos do autor, por via de critérios normativos e doutrinários, constitui um dos pontos nucleares do direito autoral e dos vetores mais complexos dos cruzamentos entre a tradição dos direitos continentais ou «sistemas romanísticos» e o modelo anglo-americano, em particular o direito dos Estados Unidos da América [Cf. José de Oliveira Ascensão, «O “fair use” no direito Autoral», AAVV, Direito da Sociedade de Informação, volume IV, Coimbra Editora, Coimbra, 2003, pp. 93-101].»
[60] «Documento» para efeitos da Diretiva 2003/98/CE significa, nos termos do respetivo artigo 2.º, n.º 3:
«a) Qualquer conteúdo, seja qual for o seu suporte (documento escrito em suporte papel ou eletrónico, registo sonoro, visual ou audiovisual);
«b) Qualquer parte desse conteúdo.»
[61] Sobre a definição de «organismo do setor público» prescreve o artigo 2.º, n.º 1, da Diretiva 2003/98/CE: «significa o Estado, as autoridades regionais ou locais, os organismos de direito público e as associações formadas por uma ou mais autoridades ou por um ou mais organismos de direito público».
Por seu turno, o conceito de «organismo de direito público» consta do artigo 2.º, n.º 2: «Qualquer organismo:
«a) Criado para satisfazer especificamente necessidades de interesse geral, sem carácter industrial ou comercial;
«b) Dotado de personalidade jurídica; e
«c) Financiado maioritariamente pelo Estado, por autoridades regionais ou locais ou por outros organismos de direito público, ou cuja gestão esteja sujeita a um controlo por parte de tais organismos, ou cujos órgãos de administração, de direção ou de fiscalização sejam compostos maioritariamente por membros designados pelo Estado, por autoridades regionais ou locais ou por outros organismos de direito público.»
[62] O que implica que «na disponibilização de informação para reutilização através da Internet» se deva assegurar «a sua compreensibilidade, o acesso livre e universal, bem como a acessibilidade, a interoperabilidade, a qualidade, a integridade e a autenticidade dos dados publicados e ainda a sua identificação e localização» (artigo 2.º, n.º 3, da LADA), sendo as atividades das entidades públicas conformadas pelo dever de divulgação ativa de informação (artigo 10.º, n.º 1, da LADA).
[63] Referindo-se no ponto 9) dessa exposição de motivos: «Tendo em conta a legislação da União e as obrigações internacionais dos Estados-Membros e da União, nomeadamente no âmbito da Convenção de Berna para a proteção de obras literárias e artísticas e do Acordo sobre os aspetos dos direitos de propriedade intelectual relacionados com o comércio, deverão ser excluídos do âmbito de aplicação da Diretiva 2003/98/CE os documentos sujeitos a direitos de propriedade intelectual na posse de terceiros. Os documentos que se encontrem na posse de bibliotecas (nomeadamente universitárias), museus e arquivos e sobre os quais terceiros detenham direitos de propriedade intelectual cujo prazo de validade da proteção não tenha terminado, deverão ser considerados, para efeitos da presente diretiva, como documentos sujeitos a direitos de propriedade intelectual na posse de terceiros».
[64] No endereço http://bi.gave.min-edu.pt/exames/ (consulta realizada pela última vez em 8-3-2017).
[65] Factos apurados diretamente pelo relator, cuja notoriedade (e suscetibilidade de comprovação) permite que sejam dados como assentes na presente sede.
[66] «Ao selecionar o separador com o tipo de prova pretendido e uma das opções apresentadas (por exemplo, ciclo de ensino), terá acesso aos enunciados e respetivos critérios de classificação (ou de codificação, no caso das provas de aferição), para cada uma das fases/chamadas. Para algumas disciplinas, terá ainda acesso às propostas de resolução dos itens.»
[67] http://iave.pt/np4/home (consultada pela última vez em 9-3-32017).
[68] Reproduzidas parcialmente no Parecer.
[69] Direito de Autor, Almedina, novembro, 2011, pág. 11.
[70] Sobre a evolução histórica do Direito de Autor, veja-se, por exemplo, o Parecer n.º 4/92, de 28 de maio de 1992, deste Conselho Consultivo, publicado no Diário da República, II Série, n.º 63, de 16 de março de 1993; Menezes Leitão, ob. cit., págs. 17 e ss.; e Alberto de Sá e Mello, Manual de Direito de Autor e Direitos Conexos, Almedina, 2016, 2.ª Edição Atualizada e Ampliada, págs. 31 e ss.
[71] Retificado pela Declaração publicada no Diário da República, Série I, n.º 99, 2.º Suplemento, de 30 de abril de 1985, e alterado pelas Leis n.os 45/85, de 17 de setembro, e 114/91, de 3 de setembro, pelos Decretos-Leis n.os 332/97 e 334/97, ambos de 27 de novembro, e pelas Leis n.os 50/2004, de 24 de agosto, 24/2006, de 30 de junho, 16/2008, de 1 de abril, 65/2012, de 20 de dezembro, 82/2013, de 6 de dezembro, 32/2015, de 24 de abril, e 49/2015, de 5 de junho.
[72] Conforme se extrai do respetivo preâmbulo, o Decreto-Lei n.º 63/85 tinha como desiderato atualizar o Código do Direito de Autor em função da realidade portuguesa, decorrente da institucionalização da democracia, dos aperfeiçoamentos deste direito no plano internacional, das convenções internacionais a que se vinha aderindo e das necessidades criadas pelo progresso da comunicação e da reprodução.
[73] Veja-se, por exemplo, Menezes Leitão, ob. cit., págs. 13 e ss., referindo que a posição que lhe parece preferível é a que o Direito de Autor reveste natureza privada, ainda que possa abranger matérias de Direito Público, como a relativa à tutela penal do direito de autor, ou às formas processuais de proteção da propriedade intelectual.
[74] “Contratos de Encomenda de Criação Intelectual”, in Contratos de Direito de Autor e de Direito Industrial, org. Carlos Ferreira de Almeida, Luís Couto Gonçalves, Cláudia Trabuco, Almedina, 2011, pág. 56.
[75] Ibidem.
[76] Recorde-se o teor integral do artigo 42.º:
«Artigo 42.º

(Liberdade de criação cultural)
1. É livre a criação intelectual, artística e científica.
2. Esta liberdade compreende o direito à invenção, produção e divulgação da obra científica, literária ou artística, incluindo a proteção legal dos direitos de autor.»
[77] “Direitos fundamentais culturais e direitos de autor – breve nota”, in Estudos de Direito Intelectual, Em Homenagem ao Prof. Doutor José de Oliveira Ascensão, Almedina, 2015, pág. 311.
[78] Ob. cit., pág. 312.
[79] Ob. cit., págs. 314 e 315.
[80] Ob. cit., pág. 316.
[81] Ob. cit., págs. 317 e ss., especialmente, pág. 319.
[82] In Constituição Portuguesa Anotada, Jorge Miranda/Rui Medeiros, Tomo I, Coimbra Editora, 2005, pág. 452.
[83] Ob. cit., pág. 454.
[84] Ob. cit., pág. 455.
[85] Constituição da República Portuguesa Anotada, Volume I, 4.ª edição revista, Coimbra Editora, 2007, pág. 620.
[86] Ob. cit., pág. 621.
[87] Ob. cit., pág. 622.
[88] Ob. cit., págs. 622/623.
[89] Vide “Os direitos de personalidade de autor”, in Num Novo Mundo do Direito de Autor?, II Congresso Ibero-Americano de Direito de Autor e Direitos Conexos, Lisboa, 15-18 de novembro de 1994, Tomo II, pág. 540.
[90] Cfr. ob. cit., pág. 541.
[91] Ibidem.
[92] Ob. cit., pág. 542.
[93] Ibidem.
[94] O n.º 1 do artigo 2.º elenca como criações intelectuais do domínio literário, científico e artístico, nomeadamente:

«a) Livros, folhetos, revistas, jornais e outros escritos;
b) Conferências, lições, alocuções e sermões;
c) Obras dramáticas e dramático-musicais e a sua encenação;
d) Obras coreográficas e pantomimas, cuja expressão se fixa por escrito ou por qualquer outra forma;
e) Composições musicais, com ou sem palavras;
f) Obras cinematográficas, televisivas, fonográficas, videográficas e radiofónicas;
g) Obras de desenho, tapeçaria, pintura, escultura, cerâmica, azulejo, gravura, litografia e arquitetura;
h) Obras fotográficas ou produzidas por quaisquer processos análogos aos da fotografia;
i) Obras de artes aplicadas, desenhos ou modelos industriais e obras de design que constituam criação artística, independentemente da proteção relativa à propriedade industrial;
j) Ilustrações e cartas geográficas;
l) Projetos, esboços e obras plásticas respeitantes à arquitetura, ao urbanismo, à geografia ou às outras ciências;
m) Lemas ou divisas, ainda que de caráter publicitário, se se revestirem de originalidade;
n) Paródias e outras composições literárias ou musicais, ainda que inspiradas num tema ou motivo de outra obra.»
[95] Vide, por exemplo, Gomes Canotilho/Vital Moreira, ob. cit., pág. 620 e o citado Parecer n.º 4/92.
[96] Como sublinha Luiz Francisco Rebello, Código do Direito de Autor e dos Direitos Conexos, 2.ª edição, novembro de 1998, Âncora editora, pág. 30, diferentemente do que se verifica em relação à propriedade industrial, a “novidade” da obra literária, artística ou científica não é requisito obrigatório da proteção que a lei lhe concede, devendo antes falar-se em “originalidade”.
Também no sentido de a obra dever ser original, veja-se o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 5 de julho de 2012, proferido no Processo n.º 855/07 (disponível em www.dgsi.pt).
[97] O corpo do n.º 1 do artigo 2.º, atrás reproduzido aproximava-se do disposto no artigo 2.º da lei francesa de 1957 sofre direito de autor (Lei n.º 57/298, de 11 de março).
[98] Luiz Francisco Rebello, ob. cit., pág. 33.
[99] Menezes Leitão sublinha que «[a] doutrina tem entendido que a proteção existe mesmo em relação a obras banais, consideradas como “pequenas moedas” (Kleine Münze) no Direito de Autor, como os livros de cozinha, os almanaques, as explicações de jogos de cartas e de sociedade, os catálogos, listas de preços, e outras publicações modestas» (ob. cit., pág. 80).
[100] Que reproduzia quase textualmente a Convenção de Berna para a proteção das obras literárias e artísticas.
[101] Ob. cit., págs. 35/36.
[102] A redação, na íntegra, do artigo 7.º do CDA é a seguinte:
«Artigo 7.º

(Exclusão de Proteção)
1 – Não constituem objeto de proteção:

a) As notícias do dia e os relatos de acontecimentos diversos com caráter de simples informações de qualquer modo divulgados;
b) Os requerimentos, alegações, queixas e outros textos apresentados por escrito ou oralmente perante autoridades ou serviços públicos;
c) Os textos propostos e os discursos proferidos perante assembleias ou outros órgãos colegiais, políticos e administrativos, de âmbito nacional, regional ou local, ou em debates públicos sobre assuntos de interesse comum;
d) Os discursos políticos.

2 – A reprodução integral, em separata, em coletânea ou noutra utilização conjunta, de discursos, peças oratórias e demais textos referidos nas alíneas c) e d) do n.º 1 só pode ser feita pelo autor ou com o seu consentimento.
3 – A utilização por terceiro de obra referida no n.º 1, quando livre, deve limitar-se ao exigido pelo fim a atingir com a sua divulgação.
4 – Não é permitida a comunicação dos textos a que se refere a alínea b) do n.º 1 quando esses textos forem por natureza confidenciais ou dela possa resultar prejuízo para a honra ou reputação do autor ou de qualquer outra pessoa, salvo decisão judicial em contrário proferida em face de prova da existência de interesse legítimo superior ao subjacente à proibição.»
[103] São elas, nos termos do n.º 1:

«a) As traduções, arranjos, instrumentações, dramatizações, cinematizações e outras transformações de qualquer obra, ainda que esta não seja objeto de proteção;
b) Os sumários e as compilações de obras protegidas ou não, tais como seletas, enciclopédias e antologias que, pela escolha ou disposição das matérias, constituam criações intelectuais;
c) As compilações sistemáticas ou anotadas de textos de convenções, de leis de regulamentos e de relatórios ou de decisões administrativas, judiciais ou de quaisquer órgãos ou autoridades do Estado ou da Administração.»
[104] A redação atual, na íntegra, é a seguinte:
«Artigo 9.º

(Conteúdo do direito de autor)
1 – O direito de autor abrange direitos de caráter patrimonial e direitos de natureza pessoal, denominados direitos morais.
2 – No exercício dos direitos de caráter patrimonial o autor tem o direito exclusivo de dispor da sua obra e de fruí-la e utilizá-la, ou autorizar a sua fruição ou utilização por terceiro, total ou parcialmente.
3 – Independentemente dos direitos patrimoniais, e mesmo depois da transmissão ou extinção destes, o autor goza de direitos morais sobre a sua obra, designadamente o direito de reivindicar a respetiva paternidade e assegurar a sua genuinidade e integridade.»
[105] A expressão “direito moral”, como refere Luiz Francisco Rebello, é «pouco apropriada e suscetível de induzir em erro, na medida em que parece deslocar a proteção do direito de autor do campo jurídico para o da ética» (ob. cit., pág. 50).
Recorde-se, porém, que a expressão teve origem em França, onde, na primeira metade do século XIX, foram reconhecidos os direitos morais (cfr. L’ABC du droit d’auteur, UNESCO, 2010, secteur de la culture, pág. 32).
[106] Sobre a natureza jurídica do direito de autor, várias são as conceções que, ao longo dos tempos, se vêm formulando (veja-se, a esse propósito, a título de exemplo, Luiz Francisco Rebello, ob. cit., pág. 49).
[107] Ob. cit., pág. 45.
[108] As principais modalidades de utilização e exploração económica encontram-se reguladas no Título II do CDA (merece particular atenção o artigo 68.º com a epígrafe “Formas de utilização”).
[109] São objeto de regulamentação no Capítulo VII do Título I (artigos 56.º a 62.º).
[110]
«Artigo 11º

Titularidade
O direito de autor pertence ao criador intelectual da obra, salvo disposição expressa em contrário.»
[111] Vide também o artigo 27.º:
«Artigo 27.º

Paternidade da obra
1 – Salvo disposição em contrário, autor é o criador intelectual da obra.
2 – Presume-se autor aquele cujo nome tiver sido indicado como tal na obra, conforme o uso consagrado, ou anunciado em qualquer forma de utilização ou comunicação ao público.
3 – Salvo disposição em contrário, a referência ao autor abrange o sucessor e o transmissário dos respetivos direitos.»
[112] Ob. cit., págs. n.º 51/52.
[113] Ob. cit., pág. 52.
[114] A correspondente norma do Código anterior – o n.º 2 do artigo 8.º – estabelecia:

«2. A entidade que apenas subsidia a publicação, reprodução ou conclusão de uma obra, ainda que por motivos de interesse público, não adquire direito algum sobre esta.»
[115] O artigo 174.º, referente a trabalhos jornalísticos, prescreve:
«Artigo 174.º

(Trabalhos jornalísticos por conta de outrem)

1 – O direito de autor sobre trabalho jornalístico produzido em cumprimento de um contrato de trabalho que comporte identificação de autoria, por assinatura ou outro meio, pertencente ao autor.
2 – Salvo autorização da empresa proprietária do jornal ou publicação congénere, o autor não pode publicar em separado o trabalho referido no número anterior antes de decorridos três meses sobre a data em que tiver sido posta a circular a publicação em que haja sido inserido.
3 – Tratando-se de trabalho publicado em série, o prazo referido no número anterior tem início na data da distribuição do número da publicação em que tiver sido inserido o último trabalho da série.
4 – Se os trabalhos referidos não estiverem assinados ou não contiverem identificação do autor, o direito de autor sobre os mesmos será atribuído à empresa a que pertencer o jornal ou a publicação em que tiverem sido inseridos, e só com autorização desta poderão ser publicados em separado por aqueles que os escreveram.»
[116] A redação originária, na íntegra, do artigo 14.º era a seguinte:
«Artigo 14.º

(Determinação da titularidade em casos excecionais)
1 – Sem prejuízo do disposto no artigo 179.º, a titularidade do conteúdo patrimonial do direito de autor relativo à obra feita por encomenda ou por conta de outrem, no cumprimento de dever funcional ou de contrato de trabalho, determina-se de harmonia com o que for tácita ou expressamente convencionado.
2 – Presume-se que a obra pertence à entidade que a custeia ou publica se é realizada no desempenho de um dever funcional ou de um contrato de trabalho e que pertence ao criador intelectual no caso contrário.
3 – A circunstância de o nome do criador da obra não vir mencionado nesta ou não figurar no local destinado para o efeito segundo o uso universal constitui presunção de que o direito de autor fica realmente a pertencer à aludida entidade.
4 – Ainda quando a titularidade do conteúdo patrimonial do direito de autor pertença àquele para quem a obra é realizada, o seu criador intelectual poderá exigir, para além da remuneração ajustada e independentemente do próprio facto da publicação, uma remuneração especial:

a) Quando a criação intelectual exceda claramente o desempenho, ainda que zeloso, da função ou tarefa que lhe estava confiada;
b) Quando da obra vierem a fazer-se utilizações ou a retirar-se vantagens não incluídas ou previstas na fixação da remuneração ajustada.»
[117] “Contratos de Encomenda…”, cit., pág. 57.
[118] Publicado no Boletim do Ministério da Justiça n.º 331, pág. 489; e na Revista de Legislação e de Jurisprudência, ano 121, n.os 3771, págs. 173-192, e 3772, págs. 216-224, com Anotação de Antunes Varela.
[119] A decisão foi tomada por maioria, com dois votos de vencido no sentido de que se tratava de «um contrato de prestação de serviços inominado de produção e realização de obra intelectual, criação de natureza artística ou espiritual e não de construção de coisa corpórea…».
No processo tinham sido apresentados pareceres dos Professores Ferrer Correia (no sentido de se tratar de um contrato de empreitada) e Antunes Varela (no sentido de um contrato inominado).
[120] Local citado, pág.189.
[121] E citava, aliás, no mesmo sentido, Calvão da Silva, que, em anotação ao mesmo acórdão, afirmava que «as obras intelectuais têm uma disciplina jurídica própria e especial que se sobrepõe à regulação das modalidades (típicas ou nominadas) do contrato de prestação de serviços» (Revista da Ordem dos Advogados, 47, 1987, pág. 142).
[122] Local citado, pág. 191.
[123] Publicado no Boletim do Ministério da Justiça, n.º 374, pág. 449.
[124] “Contratos de Encomenda…”, cit., pág. 58.
Aquele Autor assinala, porém, outras opções no direito estrangeiro.
[125] “Contratos de Encomenda…”, cit., págs. 63 e 64.
E explicita «[e]m resumo, o contrato de empreitada, ainda que não se encontre naturalmente direcionado para regular as relações jurídicas em que se encomenda uma obra intelectual – mormente por que a criação intelectual pode não corresponder à noção legal de obra – o seu regime jurídico adapta-se melhor a esta realidade do que a regulamentação estabelecida em sede de mandato. Dito de outro modo, o regime jurídico da empreitada está mais vocacionado para disciplinar os contratos de prestação de serviço atípico, em que se encomenda uma obra intelectual, do que regime jurídico do mandato» (ob. cit., pág. 65).
[126] Ob. cit., págs. 55 e 56.
[127] Debate que também merece análise a Alberto de Sá e Mello, ob. cit., págs. 253 e ss.
[128]
«Artigo 15.º

(Limites à utilização)
1 – Nos casos dos artigos 13.º e 14.º, quando o direito de autor pertença ao criador intelectual, a obra apenas pode ser utilizada para os fins previstos na respetiva convenção.
2 – A faculdade de introduzir modificações na obra depende do acordo expresso do seu criador e só pode exercer-se nos termos convencionados.
3 – O criador intelectual não pode fazer utilização da obra que prejudique a obtenção dos fins para que foi produzida.»
[129]
«Artigo 17.º
(Obra feita em colaboração)

1 – O direito de autor de obra feita em colaboração, na sua unidade, pertence a todos os que nela tiverem colaborado, aplicando-se ao exercício comum desse direito as regras da compropriedade.
2 – Salvo estipulação em contrário, que deve ser sempre reduzida a escrito, consideram-se de valor igual as partes indivisas dos autores na obra feita em colaboração.
3 – Se a obra feita em colaboração for divulgada ou publicada apenas em nome de algum ou alguns dos colaboradores, presume-se, na falta de designação explícita dos demais em qualquer parte da obra, que os não designados cederam os seus direitos àquele ou àqueles em nome de quem a divulgação ou publicação é feita.
4 – Não se consideram colaboradores e não participam, portanto, dos direitos de autor sobre a obra aqueles que tiverem simplesmente auxiliado o autor na produção e divulgação ou publicação desta, seja qual for o modo por que o tiverem feito.»
[130]
«Artigo 18.º

(Direitos individuais dos autores de obra feita em colaboração)

1 – Qualquer dos autores pode solicitar a divulgação, a publicação, a exploração ou a modificação de obra feita em colaboração, sendo, em caso de divergência, a questão resolvida segundo as regras da boa fé,
2 – Qualquer dos autores pode, sem prejuízo da exploração em comum de obra feita em colaboração, exercer individualmente os direitos relativos à sua contribuição pessoal, quando esta possa discriminar-se.»
[131]
«Artigo 19.º
(Obra coletiva)
1 – O direito de autor sobre obra coletiva é atribuído à entidade singular ou coletiva que tiver organizado e dirigido a sua criação e em nome de quem tiver sido divulgada ou publicada.
2 – Se, porém, no conjunto da obra coletiva for possível discriminar a produção pessoal de algum ou alguns colaboradores, aplicar-se-á, relativamente aos direitos sobre essa produção pessoal o preceituado quanto à obra feita em colaboração.
3 – Os jornais e outras publicações periódicas presumem-se obras coletivas, pertencendo às respetivas empresas o direito de autor sobre as mesmas.»
[132] Ob. cit., pág. 112.
Vide também Oliveira Ascensão, Direito de Autor e Direitos Conexos, Coimbra Editora, 1992, pág. 126.
[133] Veja-se, ainda, Pedro Romano Martinez, “Contratos de Encomenda…”, cit., pág. 71 e “Relações Empregador Empregado”, Direito da Sociedade da Informação, Volume I, Coimbra Editora, 1999, pág. 196.
[134] Com a colaboração de Rita Canas da Silva.
[135] “Contratos da Propriedade Intelectual e Contrato de Trabalho”, in Contratos de Direito de Autor e de Direito Industrial, cit., pág. 87.
[136] “La obra coletiva: un hallazgo o un pretexto?”, in Num Novo Mundo do Direito de Autor?, Tomo I, 1994, págs. 121 e ss., em especial págs. 166/167.
[137] Cfr. Menezes Leitão, ob. cit., pág. 113.
[138] Ob. cit., pág. 127.
Também no sentido de que o empregador não tem direitos pessoais José João Abrantes, há pouco citado, e Pedro Romano Martinez, “Contratos de Encomenda …”, cit., pág. 71.
[139] “A Titularidade das Criações Intelectuais no âmbito da Relação de Trabalho”, in Nos 20 anos do Código das Sociedades Comerciais, Homenagem aos Profs. Doutores A. Ferrer Correia, Orlando de Carvalho e Vasco Lobo Xavier, Volume I, Coimbra Editora, 2007, pág. 186.
[140] Ob. cit., pág. 187.
[141] Vide “Os grandes tipos de contratos de direito de autor”, in Num Novo Mundo do Direito de Autor?, II Congresso Ibero-Americano de Direito de Autor e Direitos Conexos, Lisboa, 15-18 de novembro de 1994, Tomo I, pág. 399.
[142] Ibidem.
[143] Veja-se, por exemplo, Maria Victória Rocha, ob. cit., pág. 183; e bem assim José João Abrantes, ob. cit., pág. 81, já atrás referido.
[144] “Contratos da Propriedade Intelectual. Uma Síntese”, in Contratos de Direito de Autor e de Direito Industrial, citado, pág. 13.
[145] Ob. cit., pág. 298.
[146] Ob. cit., pág. 249.
[147]
«Artigo 75.º

Âmbito
1 – São excluídos do direito de reprodução os atos de reprodução temporária que sejam transitórios, episódicos ou acessórios, que constituam parte integrante e essencial de um processo tecnológico e cujo único objetivo seja permitir uma transmissão numa rede entre terceiros por parte de um intermediário, ou uma utilização legítima de uma obra protegida e que não tenham, em si, significado económico, incluindo, na medida em que cumpram as condições expostas, os atos que possibilitam a navegação em redes e a armazenagem temporária, bem como os que permitem o funcionamento eficaz dos sistemas de transmissão, desde que o intermediário não altere o conteúdo da transmissão e não interfira com a legítima utilização da tecnologia conforme os bons usos reconhecidos pelo mercado, para obter dados sobre a utilização da informação, e em geral os processos meramente tecnológicos de transmissão.
2 – São lícitas, sem o consentimento do autor, as seguintes utilizações da obra:

a) A reprodução de obra, para fins exclusivamente privados, em papel ou suporte similar, realizada através de qualquer tipo de técnica fotográfica ou processo com resultados semelhantes, com exceção das partituras, bem como a reprodução em qualquer meio realizada por pessoa singular para uso privado e sem fins comerciais diretos ou indiretos;
b) A reprodução e a colocação à disposição do público, pelos meios de comunicação social, para fins de informação, de discursos, alocuções e conferências pronunciadas em público que não entrem nas categorias previstas no artigo 7.º, por extrato ou em forma de resumo;
c) A seleção regular de artigos de imprensa periódica, sob forma de revista de imprensa;
d) A fixação, reprodução e comunicação pública, por quaisquer meios, de fragmentos de obras literárias ou artísticas, quando a sua inclusão em relatos de acontecimentos de atualidade for justificada pelo fim de informação prosseguido;
e) A reprodução, no todo ou em parte, de uma obra que tenha sido previamente tornada acessível ao público, desde que tal reprodução seja realizada por uma biblioteca pública, um arquivo público, um museu público, um centro de documentação não comercial ou uma instituição científica ou de ensino, e que essa reprodução e o respetivo número de exemplares se não destinem ao público, se limitem às necessidades das atividades próprias dessas instituições e não tenham por objetivo a obtenção de uma vantagem económica ou comercial, direta ou indireta, incluindo os atos de reprodução necessários à preservação e arquivo de quaisquer obras;
f) A reprodução, distribuição e disponibilização pública para fins de ensino e educação, de partes de uma obra publicada, contando que se destinem exclusivamente aos objetivos do ensino nesses estabelecimentos e não tenham por objetivo a obtenção de uma vantagem económica ou comercial, direta ou indireta;
g) A inserção de citações ou resumos de obras alheias, quaisquer que sejam o seu género e natureza, em apoio das próprias doutrinas ou com fins de crítica, discussão ou ensino, e na medida justificada pelo objetivo a atingir;
h) A inclusão de peças curtas ou fragmentos de obras alheias em obras próprias destinadas ao ensino;
i) A reprodução, a comunicação pública e a colocação à disposição do público a favor de pessoas com deficiência de obra que esteja diretamente relacionada e na medida estritamente exigida por essas específicas deficiências e desde que não tenham, direta ou indiretamente, fins lucrativos;
j) A execução e comunicação públicas de hinos ou de cantos patrióticos oficialmente adotados e de obras de caráter exclusivamente religioso durante os atos de culto ou as práticas religiosas;
l) A utilização de obra para efeitos de publicidade relacionada com a exibição pública ou venda de obras artísticas, na medida em que tal seja necessário para promover o acontecimento, com exclusão de qualquer outra utilização comercial;
m) A reprodução, comunicação ao público ou colocação à disposição do público, de artigos de atualidade, de discussão económica, política ou religiosa, de obras radiodifundidas ou de outros materiais da mesma natureza, se não tiver sido expressamente reservada;
n) A utilização de obra para efeitos de segurança pública ou para assegurar o bom desenrolar ou o relato de processos administrativos, parlamentares ou judiciais;
o) A comunicação ou colocação à disposição de público, para efeitos de investigação ou estudos pessoais, a membros individuais do público por terminais destinados para o efeito nas instalações de bibliotecas, museus, arquivos públicos e escolas, de obras protegidas não sujeitas a condições de compra ou licenciamento, e que integrem as suas coleções ou acervos de bens;
p) A reprodução de obra, efetuada por instituições sociais sem fins lucrativos, tais como hospitais e prisões, quando a mesma seja transmitida por radiodifusão;
q) A utilização de obras, como, por exemplo, obras de arquitetura ou escultura, feitas para serem mantidas permanentemente em locais públicos;
r) A inclusão episódica de uma obra ou outro material protegido noutro material;
s) A utilização de obra relacionada com a demonstração ou reparação de equipamentos;
t) A utilização de uma obra artística sob a forma de um edifício, de um desenho ou planta de um edifício para efeitos da sua reconstrução ou reparação.
u) A reprodução e a colocação à disposição do público de obras órfãs, para fins de digitalização, indexação, catalogação, preservação ou restauro e ainda os atos funcionalmente conexos com as referidas faculdades, por parte de bibliotecas, estabelecimentos de ensino, museus, arquivos, instituições responsáveis pelo património cinematográfico ou sonoro e organismos de radiodifusão de serviço público, no âmbito dos seus objetivos de interesse público, nomeadamente o direito de acesso à informação, à educação e à cultura, incluindo a fruição de bens intelectuais.

3 – É também lícita a distribuição dos exemplares licitamente reproduzidos, na medida justificada pelo objetivo do ato de reprodução.
4 – Os modos de exercício das utilizações previstas nos números anteriores não devem atingir a exploração normal da obra, nem causar prejuízo injustificado dos interesses legítimos do autor.
5 – É nula toda e qualquer cláusula contratual que vise eliminar ou impedir o exercício normal pelos beneficiários das utilizações enunciadas nos n.os 1, 2 e 3 deste artigo, sem prejuízo da possibilidade de as partes acordarem livremente nas respetivas formas de exercício, designadamente no respeitante aos montantes das remunerações equitativas.»
[148] Cfr. artigos 21.º e ss.