Pareceres PGR

Parecer do Conselho Consultivo da PGR
Nº Convencional: PGRP00003414
Parecer: P000182017
Nº do Documento: PPA19072017001800
Descritores: ENFERMAGEM
CARREIRA
CATEGORIA
ENFERMEIRO
ENFERMEIRO PRINCIPAL
CONTEÚDO FUNCIONAL
CONTRATO INDIVIDUAL DE TRABALHO
CONTRATO DE TRABALHO EM FUNÇÕES PÚBLICAS
TÍTULO DE ENFERMEIRO ESPECIALISTA
PRINCÍPIO PARA TRABALHO IGUAL SALÁRIO IGUAL
DIFERENCIAÇÃO REMUNERATÓRIA
RECUSA DE PRESTAÇÃO DE SERVIÇO
GREVE
FALTAS INJUSTIFICADAS
RESPONSABILIDADE DISCIPLINAR
ORDEM DOS ENFERMEIROS
ASSOCIAÇÃO PÚBLICA PROFISSIONAL
TUTELA DE LEGALIDADE
Área Temática:DIR CONST / DIR ADM
Ref. Pareceres:P000542017
P000911982
P000411986
Legislação:CRP76 ART59 ART267 ; L 12-A/2008 DE 2008/02/27; DL 184/89 DE 1989/06/02; DL 248/2009 DE 2009/09/22; DL 437/91 DE 1991/11/08; DL 247/2009 DE 2009/09/22; COD TRAB ART23 ART530; DL 353/99 DE 1999/09/03; RCM 140/98 DE 1998/09/04; DL 122/2010; PORT 268/2002 DE 2002/03/13; DL 18/2017 DE 2017/02/10; LGTFP ART144 ART80 ART394 L 156/2015 ; L 2/2003; L 67/2007 DE 2007/12/31
Direito Comunitário:
Direito Internacional:
Direito Estrangeiro:
Jurisprudência:AC TRIB CONST 405/2003 ; AC TRIB CONST 313/89 ; AC TRIB CONST 405/2003
Documentos Internacionais:
Ref. Complementar:
Conclusões: 1.ª — O Decreto-Lei n.º 248/2009, de 22 de setembro, que define o regime da carreira especial de enfermagem, estruturou a carreira em duas categorias: enfermeiro e enfermeiro principal, reduzindo assim a duas as anteriores cinco categorias;

2.ª — Igualmente o Decreto-Lei n.º 247/2009, de 22 de setembro, que define o regime legal da carreira aplicável aos enfermeiros nas entidades públicas empresariais e nas parcerias em saúde, em regime de gestão e financiamento privados, integrados no Serviço Nacional de Saúde, estruturou a carreira de enfermagem em duas categorias: enfermeiro e enfermeiro principal (cfr. n.º 1 do artigo 7.º);

3.ª — Os conteúdos funcionais foram também desenhados em termos idênticos nos dois diplomas, incluindo-se no conteúdo funcional da categoria de enfermeiro funções que apenas podem ser desenvolvidas por enfermeiros detentores do título de enfermeiro especialista (cfr. artigo 9.º);

4.ª — A admissão à categoria de enfermeiro exige a titulação em cédula profissional definitiva atribuída pela Ordem dos Enfermeiros (cfr. n.º 2 do artigo 12.º do Decreto-Lei n.º 248/2009 e n.º 2 do artigo 11.º do Decreto-Lei n.º 247/2009) e a admissão à categoria de enfermeiro principal exige, cumulativamente, a detenção do título de enfermeiro especialista atribuído pela Ordem dos Enfermeiros e um minímo de cinco anos de experiência efetiva no exercício da profissão (cfr. n.º 3 do artigo 12.º do Decreto-Lei n.º 248/2009 e n.º 3 do artigo 11.º do Decreto-Lei n.º 247/2009);

5.ª — O ensino da enfermagem é assegurado através do curso de licenciatura em enfermagem e de cursos de pós-licenciatura de especialização em enfermagem não conferentes de grau académico (cfr. artigo 3.º do Decreto-Lei n.º 353/99, de 3 de setembro);

6.ª — O artigo 59.º, n.º 1, alínea a), da Constituição da República Portuguesa consagra o direito fundamental à retribuição do trabalho e estabelece o princípio de que para trabalho igual salário igual, que a Lei Geral do Trabalho em Funções Públicas (n.º 2 do artigo 144.º) e o Código do Trabalho (artigos 270.º e 23.º) concretizam;

7.ª — O princípio para trabalho igual salário igual proíbe diferenciações arbitrárias, pelo que o desempenho de trabalho da mesma quantidade, natureza e qualidade, não havendo fatores objetivos de diferenciação, deve ser igualmente remunerado;

8.ª — Todavia, o legislador no âmbito da liberdade de conformação que detém, ao definir o conteúdo funcional de uma categoria, e bem assim das categorias que integram uma carreira, está a estabelecer situações de paridade funcional, que, ressalvado o critério da antiguidade, não devem ter tratamento diferenciado;

9.ª — No caso vertente, o legislador estruturou a carreira especial de enfermagem e a carreira de enfermagem dos enfermeiros sujeitos ao regime de contrato individual de trabalho em apenas duas categorias, reservando o acesso à categoria de enfermeiro principal aos enfermeiros detentores do título de enfermeiro especialista;

10.ª — E, face ao conteúdo funcional da categoria de enfermeiro definido legalmente, tem de se considerar que existe uma situação de paridade funcional relativamente aos que a integram, pelo que a não diferenciação remuneratória dos enfermeiros detentores do título de especialista não implica violação do princípio constitucional de “para trabalho igual salário igual”;

11.ª — Só por si, a diferença de habilitações não obriga a diferenciação remuneratória;

12.ª — O legislador, naturalmente, não está impedido de redesenhar as categorias de enfermeiro, ponderando critérios objetivos relevantes e proporcionais;

13.ª — E os profissionais detentores do título de enfermeiro especialista têm legitimidade para defender os seus interesses remuneratórios, tendo, aliás, ao seu alcance a greve — direito fundamental consagrado no artigo 57.º da Constituição e cujo regime jurídico infraconstitucional consta da Lei Geral do Trabalho em Funções Públicas e do Código do Trabalho;

14.ª — Todavia, de acordo com os elementos disponíveis, a recusa de prestação de serviço por parte dos enfermeiros com título de especialista, em apreço, não é enquadrável numa greve ou, pelo menos, numa greve em conformidade com a lei, pelo que a não prestação de serviço conduz a faltas injustificadas;

15.ª — E, considerando a recusa individual de, no posto de trabalho respetivo, exercer as funções incluídas no conteúdo funcional estabelecido legalmente para a categoria de enfermeiro que integram, com o fundamento de não existir diferenciação remuneratória, os enfermeiros com título de especialista sempre podem/devem ser responsabilizados disciplinarmente;

16.ª — Acresce que também não é de afastar a responsabilidade civil dos enfermeiros pelos danos causados aos utentes, quando designadamente não seja salvaguardada a prestação de determinados serviços;

17.ª — A Ordem dos Enfermeiros é uma associação pública profissional, cabendo-lhe, em especial, regular o acesso e o exercício da profissão e atribuir o título profissional de enfermeiro e de enfermeiro especialista;

18.ª — A Ordem dos Enfermeiros não é uma associação sindical e, por força do disposto no n.º 5 do artigo 3.º do Estatuto da Ordem dos Enfermeiros, «está impedida de exercer ou de participar em atividades de natureza sindical ou que se relacionem com a regulação das relações económicas ou profissionais dos seus membros»;

19.ª — Assim, a Ordem dos Enfermeiros não pode, por exemplo, decidir o recurso a uma greve;

20.ª — No que ora releva, a Ordem dos Enfermeiros está sujeita a tutela de legalidade idêntica à exercida pelo Governo sobre a administração autónoma territorial, sendo-lhe aplicável, com as necessárias adaptações, o disposto na Lei n.º 27/96, de 1 de agosto (cfr. n.os 2 e 8 do artigo 45.º da Lei n.º 2/2013, de 10 de janeiro);

21.ª — A Ordem dos Enfermeiros pode, no âmbito da tutela administrativa, ser sujeita a uma ação inspetiva determinada pelo Ministro da Saúde (cfr. n.os 3 e 4 do artigo 45.º da Lei n.º 2/2013 e artigo 123.º do Estatuto da Ordem dos Enfermeiros), que, sendo caso disso, pode impugnar a legalidade de atos da Ordem nos tribunais administrativos ou fazer a competente comunicação ao Ministério Público para o efeito (cfr. artigo 46.º da Lei n.º 2/2013 e artigo 124.º do Estatuto da Ordem dos Enfermeiros).