Pareceres PGR

Parecer do Conselho Consultivo da PGR
Nº Convencional: PGRP00003365
Parecer: P000122016
Nº do Documento: PPA06062016001200
Descritores: PESQUISA DE PETROLEO
FORMAÇÃO DO CONTRATO
CONTRATO DE CONCESSÃO
NEGOCIAÇÃO DIRETA
IDONEIDADE TÉCNICA
RELATÓRIO TECNICO E FINANCEIRO
CAUÇÃO BANCÁRIA
AVALIAÇÃO DO IMPACTO AMBIENTAL
RESERVA ECOLÓGICA NACIONAL
RESERVA AGRÍCOLA NACIONAL
REDE NATURA 2000
ÁREA PROTEGIDA
AGÊNCIA PORTUGUESA DO AMBIENTE
VALIDADE
ANULABILIDADE
NULIDADE
NORMA GERAL
NORMA ESPECIAL
DISCRICIONARIDADE ADMINISTRATIVA
CLÁUSULA ARBITRAL
IMPUGNAÇÃO CONTENCIOSA
Livro: 00
Numero Oficio: 1381
Data Oficio: 04/19/2016
Pedido: 04/20/2016
Data de Distribuição: 04/21/2016
Relator: ANDRÉ FOLQUE
Sessões: 01
Data da Votação: 06/06/2016
Tipo de Votação: MAIORIA COM 1 VOT VENC
Sigla do Departamento 1: SEE
Entidades do Departamento 1: SECRETÁRIO DE ESTADO E DE ENERGIA
Posição 1: HOMOLOGADO
Data da Posição 1: 12/07/2016
Privacidade: [01]
Data do Jornal Oficial: 04-01-2017
Nº do Jornal Oficial: 3
Nº da Página do Jornal Oficial: 333
Indicação 1:
ASSESSORA: MARIA JOSÉ RODRIGUES
Área Temática:DIR ADM * DIR AMB /DIR CIV * DIR OBG * CONTRATOS / DIR ECON * DIR CONC / DIR URB
Ref. Pareceres:P000722008Parecer: P000722008
Legislação:DL 109/94 DE 1994/04/26 ART71 ART59 ; DL 165/2013 DE 2013/ 12/29 ; L 7-A/2016 DE 2016/03/30; DL 18/2008 DE 2008/01/29; L 54/2015 DE 2015/06/22; DL 90/90 DE 1990/03/16; DL 13/2016 DE 2016/03/09; DL 165/2013/12/16; DECRETO 18713 DE 1930/08/01; L 1947 DE 1937/02/12; lEI 2080 DE 1956/03/21; DL 47973 DE 1967/09/30; DL 49369 DE 1969/11/11; DL 96/74 DE 1974/03/13; DL 543/74 DE 1974/10/16; DL 168/77 DE 1977/04/23; DL 245/82 DE 1982/06/22; DL 141/90 DE 1990/05/02; DL 280/2007 DE 2007/08/07; DL 166/2008 DE 2008/08/22; DL 239/2012 DE 2012/11/02; PORT 419/2012 DE 2012/12/20; DL 151-B/2013 DE 2013/10/31; DL 323/2007 DE 2007/06/15; DL 58/2011 DE 2011/05/04; DL 142/2008 DE 2008/07/24 ; RCM 11-B/2011 DE 2011/02/04; L 15/2002 DE 22/02/2002; L 63/2011 DE 2011/12/14; DL 214-G/2015 DE 2015/10/02 ART39 ART58 ART41 ART77-B N 2
Direito Comunitário:DEC DE EXECUÇÃO 2015/2177 IN JO DE 2015/11/25 , l 307/27 ; DIRECTIVA 2013/30/ue DO PE E CONSELHO DE 2013/06/12 RELATIVA À SEGURANÇA DAS OPERAÇÕES "OFFSHORE" DE PETRÓLEO E GÁS
Direito Internacional:
Direito Estrangeiro:
Jurisprudência:
Documentos Internacionais:
Ref. Complementar:
Conclusões: 1ª. – Os contratos outorgados pelo Estado em 25/9/2015 à Portfuel – Petróleo e Gás de Portugal, Lda., são contratos administrativos de concessão do uso privativo, constituindo na esfera jurídica da cocontratante, por um lado, o direito a empreender pesquisas e sondagens de hidrocarbonetos em duas áreas que se encontravam sob oferta permanente desde 21/7/1994, e, por outro lado, o interesse legalmente protegido de, na hipótese de descoberta de petróleo a extrair de forma economicamente viável, obter o exclusivo da exploração, desenvolvimento e produção nas áreas delimitadas. Isto, mediante contrapartidas patrimoniais várias para o Estado.

2ª. – Não obstante a revogação pelo artigo 14.º, n.º 2, do Decreto-Lei n.º 18/2008, de 29 de janeiro, «de toda a legislação relativa às matérias reguladas pelo Código dos Contratos Públicos, seja ou não com ele incompatível», aos contratos administrativos referidos na Conclusão 1ª aplica-se o Decreto-Lei n.º 109/94, de 26 de abril, incluindo o procedimento da sua formação, e neste, o despacho do Senhor Ministro do Ambiente, do Ordenamento do Território e da Energia que atribuiu as concessões em 19/6/2015.

3ª. – Pese embora este corpo consultivo, no parecer n.º 72/2008, votado em 16/1/2009 (inédito), tenha concluído pela revogação das normas do Decreto-Lei n.º 109/94, de 26 de abril, sobre formação dos contratos, o certo é que, entretanto, a ordem jurídica recuou no alcance revogatório do Código dos Contratos Públicos.

4ª – Com efeito, o legislador veio determinar a novação do Decreto-Lei n.º 109/94, de 26 de abril, ou mesmo até confessar – em interpretação autêntica – não ter tido intenção de o revogar globalmente, nem sequer de eliminar as normas sobre formação dos contratos e adjudicação. Fê-lo de modo particularmente inequívoco através do artigo 1.º, n.º 4, da Lei n.º 54/2015, de 22 de junho, mas também por via do artigo 35.º, n.º 4, do Decreto-Lei n.º 13/2016, de 9 de março.

5ª. – Por seu turno, a Comissão Europeia reconheceu a isenção prevista no artigo 13.º, n.º 1, alínea b), do Código dos Contratos Públicos, permitindo não se aplicar aos contratos de prospeção de petróleo, em Portugal, a Parte II do referido Código.

6ª. – O ato que deferiu as duas concessões integra-se num procedimento de negociação direta, previsto no artigo 17.º do Decreto-Lei n.º 109/94, de 26 de abril, iniciado por uma manifestação de interesse da parte da candidata.

7ª. – A aferição da idoneidade técnica e económica das candidatas em procedimento de concurso ou de negociação direta opera-se nos termos do artigo 11.º, cujos n.ºs 3 e 4, ao serem contrapostos, deixam entrever um poder discricionário do órgão competente para dispensar a apresentação de determinados elementos sem poder proceder de igual modo quanto a outros.

8ª. – Ao serem enunciados os requisitos a cumprir pelo interessado desdobrados por duas disposições normativas ordenadas consecutivamente sob o mesmo artigo (artigo 11.º) e em um deles se integra o advérbio sempre (n.º4) está a admitir-se a contrario que o cumprimento dos outros requisitos (n.º3) é desejável, mas nem sempre necessário, por considerações de oportunidade e conveniência para o interesse público.

9ª. – A consagração de um poder discricionário não se encontra vinculada ao uso de fórmulas típicas ou convencionais, sendo passível de identificação a partir da conjugação dos elementos literal e sistemático de normas diferentes, sobretudo quando é possível discernir sem demasiada ambiguidade o fim em vista.

10ª. – Os atos preparatórios do procedimento de formação dos dois contratos administrativos permitem identificar como motivo principalmente determinante da dispensa de apresentação de alguns elementos o interesse público no conhecimento dos recursos energéticos jacentes no subsolo. Valoriza elementos que indiciam qualificações técnico-científicas disponíveis no presente, em detrimento da experiência pretérita do concessionário ou candidato a concessionário. Num território como o português em que a produção de petróleo é nula e em que a investigação das potenciais jazidas de hidrocarbonetos no subsolo revela um estado embrionário, parece justificado o interesse público em valorizar as atividades de pesquisa e prospeção.

11ª. – Porque se trata do exercício de um poder discricionário de dispensa e sem se descortinar nenhum dos vícios próprios que podem comprometer a validade dos atos a partir do seu lastro de autonomia pública, não se confirma a preterição das formalidades essenciais enunciadas no artigo 11.º, n.º 3, do Decreto-Lei n.º 109/94, de 26 de abril, motivo por que se conclui que o ato não é inválido por infração deste comando jurídico.

12ª. – Em face da precedente conclusão, também não há motivo para apontar invalidade derivada à aprovação das minutas, em 9/9/2015, nem à outorga dos contratos, em 25/9/2015.

13ª. – Sobre a relevância da existência de outros interessados na concessão do uso privativo das mesmas áreas, só a formalização de um requerimento com inequívoca e tempestiva manifestação de interesse obrigaria a administração pública a ponderar a abertura de um concurso público. Mas, não mais do que a ponderar. A única previsão legal de concurso público necessário é a de serem disputadas áreas contíguas a outras zonas anteriormente concessionadas.

14ª. – As restrições de interesse público e servidões administrativas decorrentes da proteção e valorização de bens ambientais, nomeadamente a Reserva Agrícola Nacional e a Reserva Ecológica Nacional podem condicionar a exata localização das pesquisas, sondagens e eventual extração de petróleo, mas o meio adequado de controlo é o da aprovação dos planos anuais de trabalhos ou de desenvolvimento (se a concessão chegar a esse ponto) e dos projetos de trabalhos de campo. Isto se vier a confirmar‑se o uso de solos classificados na Reserva Agrícola Nacional ou a afetação de bens salvaguardados pela Reserva Ecológica Nacional.

15ª. – O mesmo vale com as devidas adaptações para as limitações que possam justificar-se por via do Plano de Ordenamento do Parque Natural do Sudoeste Alentejano e Costa Vicentina, diretamente ou por incorporação em plano municipal, assim como as restrições justificadas pela Zona de Proteção Especial Costa Sudoeste (PTZPE0015) ou pelo Sítio Costa Sudoeste (PTCON0012), no âmbito da Rede Natura 2000.

16ª. – Em certas áreas de proteção integral e de proteção parcial do Parque Natural do Sudoeste Alentejano e Costa Vicentina, as atividades em causa encontram-se absolutamente interditas.

17ª - Seja por analogia, seja por maioria de razão, nas áreas de proteção complementar do Parque Natural do Sudoeste Alentejano e Costa Vicentina devem, no mínimo, aplicar-se as limitações impostas às perfurações para captação de águas subterrâneas.

18ª. – Nos demais casos, os impedimentos previstos na lei, em programas e planos territoriais ou em outros regulamentos raramente são absolutos ou dirimentes, admitindo comunicações prévias, pareceres vinculativos ou declarações de excecional interesse público em cujo teor se podem harmonizar interesses públicos conflituantes.

19ª. – É na apreciação de cada um dos programas anuais de trabalhos e dos projetos de trabalho de campo, em especial a partir do momento em que se já prevejam perfurações (quarto ano) que se oferecem à administração pública – em especial, à Entidade Nacional para o Mercado dos Combustíveis, E.P.E., ao Instituto de Conservação da Natureza e das Florestas, I.P., à Agência Portuguesa do Ambiente, I.P. e à Entidade Regional da Reserva Agrícola Nacional – os meios e os tempos próprios para impedir operações nas áreas interditas e para ajustar a localização dos furos à conservação da natureza, à segurança ambiental e à valorização dos solos com especiais aptidões agrícolas.

20ª. – A concessão do uso privativo constitui apenas um direito de gozo sobre bens dominiais públicos, pelo que não isenta o concessionário, como também não isentaria o concedente, do cumprimento das prescrições legais e regulamentares de ordenamento do território e conservação da natureza.

21ª. – O princípio de relatividade do objeto da concessão do uso privativo de bens do domínio público é corolário do princípio da competência, que é de ordem pública, de sorte que o órgão adjudicatário invadiria os poderes e atribuições alheios, caso atribuísse a concessão sem reserva do cumprimento de prescrições legais e regulamentares cujo controlo é incumbido a outros órgãos, porventura de outras pessoas coletivas públicas.

22ª. – Conquanto a localização em área sensível possa justificar uma avaliação de impacto ambiental, este procedimento já se encontra previsto nos contratos, segundo os exatos termos que resultam da lei, ou seja, se houver necessidade de perfurações por meios não convencionais, designadamente fraturação hidráulica.

23ª. – A avaliação de impacto ambiental, a ter lugar, precisa de um projeto e não se basta simplesmente com uma conceção, uma ideia ou uma eventualidade, de modo que a condição resolutiva estipulada no despacho ministerial de 19/6/2015 mostra-se adequada ao cumprimento do regime jurídico da avaliação de impacto ambiental.

24ª. – A publicação do Decreto-Lei n.º 13/2016, de 9 de março, transpondo a Diretiva n.º 2013/30/UE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 12 de junho de 2013, embora privilegiando as atividades petrolíferas a partir do mar (offshore), contém normas que reforçam substancialmente a segurança ambiental das atividades de pesquisa e sondagem onshore (em terra emersa ou nas águas interiores), normas essas que se aplicam de imediato às concessões já outorgadas. Sobressai a intervenção de um verificador independente. Este diploma traz consigo, bem assim, a introdução de meios participativos das populações por meio de consultas públicas a promover antes de cada pesquisa ou sondagem serem aprovadas.

25ª. – Ainda que, por hipótese, o despacho de 19/6/2015 fosse inválido e, por consequência, inválidos os contratos de concessão outorgados, ter-se-ia já esgotado o prazo de seis meses para o Governo dar início à impugnação contenciosa, de acordo com o que se dispunha no artigo 41.º, n.º 2, in fine, do Código do Processo nos Tribunais Administrativos, na redação anterior ao Decreto-Lei n.º 214 ‑G/2015, de 2 de outubro, e depois deste ter entrado em vigor, no artigo 77.º-B, n.º 2.

26ª. – Sem prejuízo de o termo a quo do mesmo prazo, relativamente ao Ministério Público, ser contado apenas da tomada de conhecimento dos contratos administrativos não é intentada ação administrativa pública por não se confirmarem as invalidades apontadas.

27ª. – Este facto em nada impede a ulterior impugnação pelo Ministério Público dos atos administrativos que ilegalmente aprovem programas de trabalhos ou projetos de campo da iniciativa da concessionária com atropelo das restrições de utilidade pública, das servidões administrativas, dos programas e planos territoriais ou de alguma outra prescrição legal ou regulamentar cuja esfera de proteção conceda abrigo a valores ambientais, culturais ou de ordenamento do território.

28ª. – Embora o Governo, através do Ministro ou do Secretário de Estado com atribuições no sector, disponha de poderes próprios ou delegados para resolver unilateralmente os contratos administrativos por violação grave de deveres contratuais, por alteração anormal e imprevisível das circunstâncias, por incumprimento ou por razões de superior interesse público, não pode anular graciosamente os contratos administrativos, de acordo com o artigo 307.º, n.º 1, do Código dos Contratos Públicos, nem sequer anular os atos do procedimento de formação e adjudicação, pelo menos, depois de celebrados os contratos.

29ª. – Por imperativo do artigo 80.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 109/94, de 26 de abril, foi convencionado um meio arbitral que, a despeito de não vincular o Ministério Público e apesar de restrito «à interpretação ou aplicação das disposições legais e contratuais que regulam as relações entre as partes na qualidade de contratantes» terá de ser tomado em linha de conta pelo Governo e pela concessionária.