Pareceres PGR

Parecer do Conselho Consultivo da PGR
Nº Convencional: PGRP00002049
Parecer: P000032002
Nº do Documento: PPA0205200200302
Descritores: MILITAR
RECLASSIFICAÇÃO
CARREIRA TÉCNICA SUPERIOR
CARREIRA MILITAR
CHEFE DE DIVISÃO
NOMEAÇÃO EM SUBSTITUIÇÃO
REQUISITOS
CARGO DIRIGENTE
CARREIRA DA FUNÇÃO PÚBLICA
CATEGORIA
FORÇAS ARMADAS
ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA
INTERPRETAÇÃO
Livro: 00
Numero Oficio: 8
Data Oficio: 01/17/2002
Pedido: 01/18/2002
Data de Distribuição: 01/31/2002
Relator: HENRIQUES GASPAR
Sessões: 01
Data da Votação: 05/02/2002
Tipo de Votação: MAIORIA COM 1 VOT VENC
Sigla do Departamento 1: MJ
Entidades do Departamento 1: SEA DA MIN DA JUSTIÇA
Posição 1: HOMOLOGADO
Data da Posição 1: 06/26/2002
Privacidade: [01]
Data do Jornal Oficial: 22-08-2002
Nº do Jornal Oficial: 193
Nº da Página do Jornal Oficial: 14226
Indicação 2: ASSESSOR:MARTA PATRÍCIO
Conclusões:
- As Forças Armadas fazem parte da Administração estadual, e os militares integram a função pública, estando sujeitos, nos limites da Constituição, às regras e princípios aplicáveis, em geral, aos funcionários públicos;

- A carreira militar, regulada pelo Decreto-Lei nº 236/99, de 25 de Junho, integra-se nas carreiras próprias da Administração Central como carreira especial, constituindo os militares um corpo especial;

- A reclassificação profissional, prevista no artigo 4º do Decreto-Lei nº 497/99, de 19 de Novembro, constitui um instrumento de mobilidade colocado ao dispor da Administração para a melhor gestão dos recursos humanos, e depende, nos termos dos artigos 6º e 7º deste diploma, da verificação de condições subjectivas do funcionário ou agente, da existência de interesse para o serviço, e, em caso de reclassificação para serviço diferente, da concordância do serviço originário do funcionário a reclassificar;

- É admissível a reclassificação de um militar, integrado na categoria de sargentos da carreira militar, para a carreira técnica superior da função pública, desde que se verifiquem os requisitos subjectivos -licenciatura, e os pressupostos objectivos - interesse para o serviço e a concordância dos serviços de origem do militar, previstos no artigos 6º e 7º do Decreto-Lei nº 497/99, de 19 de Novembro;

- A designação em substituição para cargo dirigente, prevista no artigo 21º da Lei nº 49/99, de 22 de Junho, é por natureza precária e temporária, tendo por finalidade assegurar o princípio da continuidade dos serviços;

- Para a designação em regime de substituição não é necessário que o funcionário a designar possua as condições exigidas para o provimento, como titular, de cargo dirigente, devendo, contudo, reunir condições e capacidade adequadas ao exercício das respectivas funções.

Texto Integral:
Senhor Secretário de Estado Adjunto da
Ministra da Justiça,
Excelência:

I

O Auditor Jurídico no Ministério da Justiça, invocando o artigo 45º, nº 2, do Estatuto do Ministério Público, solicitou a distribuição pelo Conselho Consultivo do expediente relativo a um parecer emitido pela Auditoria, que se pronunciou sobre uma situação de reclassificação de um militar para a carreira técnica superior e nomeação para cargo dirigente (chefe de divisão), relativamente à qual expressamente manifesta a existência de dúvidas relevantes.

Vossa Excelência, posteriormente, concordou com a conveniência de pronúncia por parte deste Conselho, cumprindo, assim, emitir parecer.

II

1. Dos termos em que a situação vem descrita e equacionada, verifica-se que, embora em relativa conexão, são duas as questões objecto de controvérsia, sobre as quais não existe posição coincidente dos vários departamentos da Administração chamados a intervir e a emitir pronúncia.

Está em causa, primeiramente, a possibilidade ou a admissibilidade de reclassificação para carreira diversa - a carreira técnica superior - de um interessado que integra a carreira militar, e, em seguida (ou sob outra perspectiva) a designação da pessoa em causa para o cargo de chefe de divisão em regime de substituição.
É, pois, metodologicamente conveniente analisar, por si, cada uma das questões implicadas.


2. A primeira das questões consiste em saber se o interessado (expressão que se usa por facilidade de designação e sem compromisso significante), que integra a carreira militar, pode ser reclassificado para a carreira técnica superior[1].

Pronunciaram-se em sentido afirmativo a Direcção-Geral da Administração Pública[2] e a Auditoria Jurídica[3], e em sentido negativo a Secção de Assuntos Gerais do Gabinete do CEME[4].

A Direcção-Geral da Administração Pública justificou a sua posição sobre a questão que lhe foi submetida, em resumo, nos seguintes termos.

"1. O Decreto-Lei nº 497/99, de 19 de Novembro, estabelece o regime da reclassificarão e da reconversão profissionais nos serviços e organismos da Administração Pública (cfr. artigo 1º).
2. O regime previsto no referido Decreto-Lei nº 497/99, de 19 de Novembro, é aplicável aos «funcionários dos serviços e organismos da administração central, bem como dos institutos públicos nas modalidades de serviços personalizados do Estado e de fundos públicos» (cfr. alínea a) do nº 1 do artigo 2º).
(...)
4. A reclassificação profissional consiste na atribuição de categoria e carreira diferente da que o funcionário é titular, implicando o ingresso naquela sem concurso, desde que estejam preenchidos os requisitos legalmente exigidos para a nova carreira (cfr. nº 1 do artigo 3º).
5. O Decreto-Lei nº 497/99, de 19 de Novembro, fixa os pressupostos da reclassificação profissional entre os quais se incluem a "aquisição de novas habilitações académicas ou profissionais, desde que relevantes para as áreas de especialidade enquadráveis nas atribuições e competências dos organismos e serviços da Administração Pública" e o "desajustamento funcional caracterizado pela não coincidência entre o conteúdo funcional da carreira que o funcionário é titular e as funções efectivamente exercidas" (cfr. as alíneas d) e e), respectivamente).
6. De acordo com o disposto no nº 1 do artigo 6º do Decreto-Lei nº 497/99, de 19 de Novembro, a reclassificação profissional depende da iniciativa da Administração, mediante despacho do dirigente máximo do serviço ou ainda de requerimento fundamentado do funcionário que detenha mais de três anos na categoria e se verifique o interesse e a conveniência do serviço.
(...)
8. A reclassificação profissional pode ser feita em outros serviços ou organismos, obtida a concordância do funcionário e do serviço ou organismo de origem, de acordo com a previsão do nº 4 do mencionado artigo 6º.
(...)
12. Na situação objecto de análise, o Ministério da Justiça pretende operar a reclassificação de um militar das Forças Armadas (cujo posto na categoria de sargento é o de sargento-chefe), que aí se encontra requisitado, para a carreira técnica superior.
(...)
14. O artigo 35º da Lei de Defesa Nacional e das Forças Armadas (Lei nº 29/82, de 11 de Dezembro) refere que as Forças Armadas se inserem na "administração directa do Estado através do Ministério da Defesa Nacional" (no mesmo sentido o nº 1 do artigo 1º da Lei nº 11/91, de 29 de Agosto - Lei Orgânica de Bases da Organização das Forças Armadas).
15. Daqui resulta que as funções desempenhadas pelas Forças Armadas, seus órgãos e serviços se integram no âmbito da Administração Pública do Estado.
(...)".

A Direcção-Geral, concluindo que os militares se inscrevem no conceito amplo de funcionário público, embora com um regime público especial, entendeu que apesar do Decreto-Lei nº 497/99, de 19 de Novembro, não referir expressamente a sua aplicação ao pessoal das Forças Armadas, este se deve considerar incluído no respectivo âmbito de aplicação.

A Auditoria Jurídica, por seu lado, acolhe-se no essencial na posição da Direcção-Geral da Administração Pública, admitindo a possibilidade de reclassificação do militar em causa para a carreira técnica superior da função pública.

Por sua vez, o Gabinete do CEME manifestou sobre a questão entendimento diverso, considerando que o âmbito de aplicação do diploma que estabelece o regime da reclassificação e reconversão profissionais nos serviços e organismos da Administração Pública não abrange o pessoal militar das Forças Armadas, visto que, por força do regime consagrado no Estatuto dos Militares das Forças Armadas, os militares do QP só podem ser objecto de reclassificação nos termos previstos neste Estatuto[5].


3. A segunda questão - nomeação do interessado para chefe de divisão[6] - foi também objecto de posições diversas dos departamentos que se pronunciaram sobre a matéria.
Trata-se essencialmente de saber se para a nomeação em regime de substituição de cargos dirigentes são exigíveis todos os requisitos fixados para o provimento normal do referido cargo.

A Auditoria Jurídica[7] defendeu a legalidade da referida nomeação, por entender que «no caso de substituição interessa sobretudo garantir que a regularidade do exercício da função pública não seja afectada por falta de qualquer dos seus agentes», destinando-se este modo de nomeação a garantir a organização do trabalho «de modo a que todo o funcionário em situação de ausência ou impedimento seja substituído por outro capaz de assegurar a continuidade das respectivas funções»; a nomeação em substituição assume-se como «providência-remédio e esta característica exige soluções que não sejam, em absoluto, bloqueadoras do normal funcionamento dos serviços». Neste contexto, a Auditoria entendeu que não podem exigir-se para o substituto os requisitos que se exigem para o provimento normal de cargo, dado que o regime de substituição se não traduz em provimento, nem sequer interino.

A Direcção-Geral do Orçamento[8], diversamente, considerou que por o nomeado em causa, embora possuidor de licenciatura, estar integrado na carreira de Sargentos, com a categoria de Sargento-Ajudante, prevista e regulada no artigo 131º do Decreto-Lei nº 236/99, de 25 de Junho, para cujo ingresso é exigido o ensino secundário complementado por formação militar adequada, não reúne os requisitos legalmente exigidos para ser nomeado chefe de divisão, um vez que não se encontra integrado numa carreira do grupo de pessoal técnico superior, nem a esta equiparada, acrescendo que também nos casos de nomeação em regime de substituição, ou de nomeação por escolha, o legislador não afastou a necessidade de os nomeados reunirem os requisitos referidos na lei para a nomeação em cargos dirigentes.

Por seu lado, a Direcção-Geral da Administração Pública[9], admitindo que no rigor dos princípios a exigência dos requisitos legalmente previstos para o provimento em cargos dirigentes será a solução «que mais se aproxima do texto legal», aceita que a «consideração de razões de funcionalidade da Administração» e «da prática que (...) se vem implantando», permita que «à luz dos princípios estruturantes do nosso sistema de enquadramento profissional, o requisito de habilitações literárias não pode ser dispensado, podendo, contudo, tal dispensa ser aplicada, com a devida justificação, ao factor experiência profissional uma vez que a nomeação em regime de substituição se assume como uma providência-remédio e esta característica exige soluções que não sejam, em absoluto, bloqueadoras do normal funcionamento dos serviços»[10].


4. São, pois, as seguintes as questões suscitadas:

- Determinar se é possível a reclassificação profissional de militar
para a carreira técnica superior da função pública;
- Saber se para a designação em regime de substituição para cargo dirigente são exigíveis os requisitos fixados para o provimento normal do cargo dirigente.

III

1. O regime jurídico da função pública está, hoje, estruturado segundo um modelo funcional de organização na base de carreiras e categorias.

A configuração do modelo não resulta de um único impulso legislativo, antes se foi construindo e aperfeiçoando, no tempo, através de vários diplomas que, entre si, se completam[11].

Os princípios básicos em matéria de carreiras da função pública constam, actualmente, do Decreto-Lei nº 248/85, de 15 de Julho (diploma de reestruturação das carreiras)[12].

O princípio fundamental da estruturação, dispõe o artigo 3º, nº 1, é o de que as funções públicas podem ser asseguradas em regime de carreira ou em regime de emprego, assinalando-se que, por regra, é o pessoal em regime de carreira que deve assegurar o desempenho de funções que correspondem a necessidades permanentes e próprias dos serviços.

As noções essenciais (carreira e categorias em que se desdobra) estão definidas no artigo 4º, que dispõe:

"1. A carreira é o conjunto hierarquizado de categorias às quais correspondem funções da mesma natureza a que os funcionários terão acesso de acordo com a antiguidade e o mérito evidenciado no desempenho profissional.
2. Categoria é a posição que os funcionários ocupam no âmbito de uma carreira, fixada de acordo com o conteúdo e qualificação da função ou funções, referida à escala salarial da função pública."

Por sua vez - determina o artigo 5º - as carreiras, diferenciadas segundo o modo por que se estruturam, podem ser horizontais e verticais: verticais, quando integram categorias com o mesmo conteúdo funcional, diferenciadas em exigências, complexidade e responsabilidade, e horizontais, quando integram categorias com o conteúdo e qualificação de função ou funções referido à escala salarial da função pública[13].

2. As carreiras são, na classificação legal, de regime geral e de regime especial.

Segundo dispõe o artigo 8º, nº 1 do Decreto-Lei nº 248/85, de 15 de Julho, as carreiras de regime geral constituem a regra (estruturação de acordo com os princípios e o desenvolvimento geral previsto no diploma), só podendo a estruturação seguir uma ordenação própria quando, precedendo as adequadas acções de análise, descrição e qualificação de conteúdos funcionais, se conclua pela necessidade de um regime especial.

Daí que - determina o nº 2 do artigo 8º - no âmbito das carreiras de regime especial se integre tão-só o pessoal a quem compete assegurar funções que, atenta a sua natureza e especificidade, devam ser prosseguidas por um agrupamento de pessoal especializado e inserido numa carreira criada para o efeito.

Ao lado da classificação de carreiras, a lei prevê também a existência de tipos de organização dos efectivos de pessoal. Neste modelo de qualificação e organização pode prever-se e existência de corpos de pessoal submetidos a estatuto específico (corpos especiais), quando o exercício de uma função no âmbito da Administração requeira a constituição de um grande agrupamento de pessoal unido por um laço de natureza funcional submetido a um estatuto específico - artigo 13º, nº 3.

No artigo 16º, nº 2, do Decreto-Lei nº 184/89, de 2 de Junho, consideram-se integradas em corpo especial, entre outras, as carreiras dos militares dos três ramos das Forças Armadas - alínea b).

IV

1. A caracterização jurídica da relação estabelecida entre o Estado e os militares, não obstante algumas hesitações da doutrina e mesmo da jurisprudência constitucional[14], de algum modo datadas, tem-se, hoje, por assumida no quadro de uma relação administrativa, que considera as Forças Armadas integradas na Administração Pública, qualificando-se os militares como trabalhadores da Estado, integrando a função pública.

A inserção constitucional das normas especificamente respeitantes a militares e uma série de disposições da lei ordinária permitem sustentar esta conclusão.

O artigo 269º da Constituição, com efeito, inserido no título respeitante à Administração Pública, enuncia os princípios gerais do regime relativo aos trabalhadores do Estado e demais agentes do Estado e outras entidades públicas.

É neste contexto que surge o artigo 270º que, prevendo restrições ao exercício de certos direitos por parte dos militares (bem como dos agentes militarizados e dos serviços e forças de segurança), os considera como elementos ao serviço da Administração Pública; o enquadramento sistemático do preceito constitucional revela-se, pois, como consubstanciando certos limites ou restrições ao regime do pessoal abrangido pelo artigo anterior - a generalidade dos trabalhadores e agentes da Administração.

E o artigo 271º, na contextualização sistemática da matéria, contém regras gerais para os "funcionários e agentes do Estado e demais entidades públicas", em matéria de responsabilidade civil, criminal e disciplinar.

A revisão constitucional de 1997 veio reforçar este entendimento, incluindo na previsão do artigo 270º um conjunto de pessoal - agentes dos serviços e forças de segurança - sobre cuja caracterização como trabalhadores da Administração Pública não se suscitam dúvidas.

A lei ordinária pressupõe e aceita semelhante caracterização jurídica desta relação.

O Decreto-Lei nº 184/89, de 2 de Junho, que estabelece os princípios gerais em matéria de emprego público, remuneração e gestão de pessoal na função pública (artigo 1º), define, no artigo 3º, o âmbito pessoal de aplicação de modo a expressamente abranger as Forças Armadas. Dispondo no nº 1 que o diploma abrange "o pessoal que exercendo funções nos serviços e organismos do Estado, sob a direcção dos respectivos órgãos, se encontra sujeito a um regime de direito público", determina, no nº 2, a sua aplicabilidade "às forças armadas e às forças de segurança, com as adaptações decorrentes dos seus estatutos específicos".

Isto significa que a lei geral básica em matéria de emprego público, remunerações e gestão da função pública é directamente aplicável (e não por extensão ou remissão) ao pessoal das forças armadas e forças de segurança, naturalmente com as adaptações exigidas pela natureza específica das instituições respectivas.


2. A inclusão dos militares no conceito de trabalhadores da Administração Pública tem sido sustentada por este Conselho[15], fundamentando-se nas bases constitucionais e legais referidas.

Esta posição corresponde à opinião que tem tido mais aceitação na doutrina nacional[16].

Pode dar-se por assente na doutrina, como ponto de partida, que o conceito constitucional de trabalhadores abrange os trabalhadores da função pública[17].

Da conjugação desta asserção com o facto de a administração militar fazer parte da Administração Pública, extrai a doutrina a ilação de que os militares devem considerar-se integrados no conceito de trabalhadores da Administração Pública, ou na ampla expressão de "funcionalismo público"[18].

«Neste contexto, as Forças Armadas são parte integrante da Administração, constituindo, por isso, um serviço público administrativo; este enquadramento faz com que a disciplina das relações profissionais dos seus agentes não possa ser concebida separadamente do regime do emprego público em geral, como aconteceria se a administração civil e a militar constituíssem compartimentos estanques»[19].

As Forças Armadas integram-se na Administração directa do Estado, através do Ministério da Defesa Nacional. Deste modo, parece «indiscutível que os militares sejam verdadeiros funcionários públicos, no sentido de "profissionais da Administração Pública" vinculados a esta por uma relação jurídica de emprego público disciplinado pelo direito administrativo». Entendida «a função pública como "a actividade desenvolvida pelos órgãos e agentes das pessoas colectivas de direito público no sentido de assegurar a satisfação das necessidades colectivas", é lógico que os militares como agentes da pessoa colectiva de direito público - Estado, exercem uma actividade para satisfação de uma necessidade colectiva, como seja a defesa nacional, integrando-se assim a sua acção no conceito de função pública»[20].

A jurisprudência constitucional, por seu lado, considera também que tanto o domínio civil como o militar se encontram inseridos na administração estadual, com a consequente integração dos militares na mais ampla expressão de funcionalismo público[21].

Esta perspectiva é, aliás, comum em termos comparados[22].


3. Neste sentido se deve compreender a componente funcional do Estatuto dos Militares das Forças Armadas, aprovado pelo Decreto-Lei nº 236/99, de 25 de Junho, que define a carreira militar em termos estruturais típicos e próprios de uma carreira integrada em corpo especial, na denominação categorial das carreiras da função pública[23].

A carreira militar - dispõe o artigo 27º do Estatuto - "é o conjunto hierarquizado de postos, desenvolvidos por categorias, que se concretiza em quadros especiais e a que corresponde o desempenho de cargos e o exercício de funções diferenciadas entre si". Todos, pois, elementos referenciais que pela configuração, semântica e estrutural, própria dos conceitos e noções utilizados na estruturação da função pública (carreira; categorias; quadros), assumem um significado que não pode deixar de ser compreendido no interior da função pública.

Na carreira militar, os militares agrupam-se, por ordem decrescente de hierarquia, nas categorias de oficiais, sargentos e praças, e dentro destas em postos, que são a posição que na respectiva categoria o militar ocupa no âmbito da carreira militar, fixada de acordo com o conteúdo e qualificação da função ou funções - artigo 28º, nºs. 1 a 3.

O acesso em cada categoria da carreira militar faz-se por promoção, que consiste, em regra, na mudança para o posto seguinte da respectiva categoria - artigo 48º, sendo direito do militar o acesso aos postos imediatos dentro da respectiva categoria, segundo as aptidões, competência profissional e tempo de serviço que possui, de acordo com as modalidades de promoção e as vagas existentes nos respectivos quadros especiais - artigo 116º.

O desenvolvimento da carreira orienta-se pelos princípios estabelecidos no artigo 126º, e traduz-se, em cada categoria, segundo dispõe o artigo 127º, na promoção dos militares aos diferentes postos, de acordo com as respectivas condições gerais e especiais, tendo em conta as qualificações, a antiguidade e o mérito revelado no desempenho profissional, e as necessidades estruturais das Forças Armadas.

As regras de ingresso e de promoção, gerais e especiais, são fixadas para cada uma das categorias, que constituem categorias fechadas: a promoção não é um meio de acesso a outra categoria, mas apenas o modo de desenvolvimento pelos diversos postos de cada categoria. .


4. Os funcionários militares, integrados na Administração Pública e, por isso, no amplo conceito de funcionários públicos, devem usufruir do tratamento em geral reconhecido a todos os funcionários tendo em conta a sua inserção profissional, não podendo sofrer qualquer restrição de direitos ou diferenciação de tratamento que não esteja directamente fixada e seja determinada, nos termos constitucionalmente admissíveis, pela especificidade da natureza militar das suas funções e qualidade[24].

A restrição ao exercício de direitos por parte dos militares, ou diferenciações de tratamento, não têm credencial constitucional senão quanto ao direito de expressão, reunião, manifestação e petição colectiva e à capacidade eleitoral passiva. Este elenco não permite por si, e as especificidades próprias da condição militar também não justificam, nem se apresentam ponderosas razões de interesse público que impeçam os militares, enquanto funcionários, de ser considerados sujeitos da aplicabilidade dos instrumentos de mobilidade (no caso, a reclassificação profissional), desde que se verifiquem os pressupostos objectivos nos termos definidos no Decreto-Lei nº 497/99, de 19 de Novembro[25].

V

1. O ingresso na função pública faz-se na categoria de base de determinada carreira (de um grupo de pessoal), à qual corresponde determinado conteúdo funcional, legalmente fixado, que define, enumera e explicita o conjunto de funções e responsabilidades exigidas[26].

Com a inserção na carreira e respectiva categoria, o funcionário obtém um determinado posicionamento na 'organização', de que decorrem os direitos de exercer as funções correspondentes (e não outras) e de irreversibilidade (impossibilidade de lhe ser atribuída categoria inferior à que detiver em determinado momento). É o princípio da irreversibilidade da carreira e da categoria, ou a "tutela da profissionalidade", que se refere à protecção da carreira, com tudo o que pressupõe: "a protecção da capacidade profissional, dos conhecimentos profissionais e experiência adquiridos, das perspectivas de carreira e de promoção e da própria formação profissional"[27].

Há, porém, na conjugação de interesses, que considerar exigências da organização e funcionalidade que podem condicionar as instituições, com reflexos na realidade das relações funcionais, as quais impõem uma utilização ágil e racional dos recursos de pessoal (v. g., interesse na disposição funcional de determinadas capacidades; acréscimo de saber-fazer; ajustamento dos enriquecimentos funcionais; produtividade do trabalho)[28].

As necessidades da organização impõem, pois, que se encontrem modos e formas de compatibilizar a importância da mobilidade funcional com os interesses dos trabalhadores.

Os instrumentos de mobilidade definidos na lei pretendem responder à realização da concordância prática entre exigências justapostas - a dinâmica da organização e os interesses públicos que podem impor recomposições funcionais ou afectações organizatórias, e os interesses próprios dos trabalhadores da função pública.

As figuras típicas da mobilidade (típicas, porque o regime relativo a cada uma deve estar, e está, definido na lei nos seus pressupostos e condições) constituem, com efeito, «uma forma indirecta de racionalização distributiva do pessoal, cujo uso pelos funcionários e agentes administrativos as sucessivas alterações legislativas vão mais ou menos constringindo. São, noutra face, um meio de gestão profissional [pelos funcionários] da sua própria carreira, em demanda de enriquecimento, aperfeiçoamento, realização profissional e outros»[29].

Foi o Decreto-Lei nº 41/84, de 3 de Fevereiro, o diploma que, de modo ordenado e geral, reformulou e criou várias figuras de mobilidade, colocando à disposição da Administração uma larga gama de instrumentos a utilizar de acordo com critérios gestionários[30].

O Decreto-Lei nº 184/89, de 2 de Junho, que estabeleceu princípios gerais de salários e gestão de pessoal da função pública, revogou, entre outras (artigo 45º), as disposições do Decreto-Lei nº 41/84 relativas à definição de instrumentos de mobilidade. Em substituição, fixou os princípios gerais a que deveriam obedecer os instrumentos de mobilidade, remetendo o respectivo regime (mobilidade geográfica, interdepartamental e intersectorial) para diplomas próprios - artigo 23º, nºs. 1 a 3.

A mobilidade dos recursos humanos visa - segundo determina o diploma - o aproveitamento racional dos efectivos e o descongestionamento sectorial ou global da Administração, admitindo mesmo que, em casos excepcionais, fundamentados em razões de interesse público, os instrumentos de mobilidade devam facultar a mobilidade com o sector empresarial e as organizações internacionais.

2. Entre os instrumentos de mobilidade previstos no Decreto-Lei nº 41/84 incluiam-se já a reclassificação profissional e a reconversão profissional - artigo 20º, alíneas i) e j).

No artigo 30º fixavam-se os pressupostos e definiam-se os conteúdos dos referidos instrumentos de mobilidade.

A reclassificação e a reconversão profissional dos funcionários e agentes poderia ocorrer, por iniciativa da Administração, em situações de reorganização ou de reestruturação de serviços e em ordem a facilitar a redistribuição de efectivos, respeitando a adequação entre o conteúdo funcional dos postos de trabalho e a capacidade e aptidões dos funcionários e agentes.

"A reclassificação - dispunha o artigo 30º, nº 2 - consiste na atribuição da categoria diferente da que o funcionário ou agente é titular, de outra carreira, e exige que aqueles reúnam os requisitos legalmente exigidos para a nova categoria".

Por seu lado, segundo o nº 3, "a reconversão consiste igualmente na mudança de categoria, da mesma ou de outra carreira, precedida da frequência com aprovação de um curso de formação profissional, prescindindo-se neste caso das habilitações literárias exigidas".

O Decreto-Lei nº 184/89, de 2 de Junho, não redefiniu a função ou o conteúdo dos referidos instrumentos, referindo apenas, no artigo 32º, que "a reclassificação e a reconversão profissional obedecem ao disposto na lei, fazendo-se por iniciativa da Administração, e mediante despacho do dirigente máximo dos serviços ou deliberação do respectivo órgão executivo".

Tendo por pressuposto o descrito quadro legal, com o que previa quanto a condições, finalidades e conteúdos, poder-se-ia construir um ensaio de aproximada teorização das figuras da reclassificação e reconversão profissional.

A reclassificação profissional constituiria um instrumento de mobilidade ao dispor da Administração, que esta podia utilizar por sua iniciativa e no intuito de assegurar um aproveitamento racional de efectivos, atribuindo a um funcionário ou agente categoria de carreira diferente da que fosse titular. «Trata-se de uma mudança de carreira coactivamete imposta aos funcionários e agentes, na medida em que, por único e exclusivo interesse dos serviços públicos, são aqueles obrigados a ingressar noutra carreira e a passar a exercer funções diferentes daquelas que até aí lhe competiam»[31].

Por isso, os objectivos a que estava determinada a reclassificação profissional impediam que a figura pudesse ser entendida ou utilizada como um meio de os funcionários ou agentes melhorarem a sua situação, ou ingressarem em nova carreira sem ser por concurso. A reclassificação profisssional não era (então) pensada como instrumento que pudesse significar uma alternativa ao concurso enquanto modo normal de ingresso numa carreira. A legalidade da reclassificação profissional estava condicionada à verificação cumulativa de uma ordem plural de pressupostos: situação de organização, reorganização ou reestruturação, parcial ou total, de serviços[32]; existência de adequação entre o conteúdo funcional da carreira para a qual seria feita a reclassificação e as aptidões profissionais dos funcionários ou agentes a reclassificar; o respeito pelos requisitos legalmente exigidos para o ingresso na nova carreira; e ser facilitada, pela mudança de carreira, a redistribuição e o aproveitamento dos efectivos[33].


3. Os pressupostos da utilização pela Administração da figura da reclassificação profissional como instrumento de mobilidade foram objecto de reformulação através do Decreto-Lei nº 497/99, de 19 de Novembro, que "estabelece o regime da reclassificação e da reconversão profissionais nos serviços e organismos da Administração Pública".

A intenção do legislador na redefinição dos critérios foi, assumidamente, «a reanimação das acções de reclassificação e de reconversão profissionais, na perspectiva do estímulo à mobilidade intercarreiras»[34]. Assim, e embora dando como assente que o «concurso constitua a forma normal de ingresso em lugares dos quadros da Administração Pública», impõe-se, no tocante à mobilidade intercarreiras, «o desenvolvimento dos mecanismos de reconversão e de reclassificação como instrumentos privilegiados de gestão, optimização e motivação do capital de recursos humanos» de que a administração dispõe. «Nesta perspectiva, redefinem-se os critérios e alarga-se o âmbito de aplicação de tais instrumentos de gestão, introduzindo-se, concomitantemente, meios de controlo que se centram no exercício de novas funções em regime probatório e na aquisição de novos conhecimentos e competências obtidos em processo de formação sujeito a avaliação final».

O regime instituído no Decreto-Lei nº 497/99 aplica-se - dispõe o artigo 2º - à generalidade da Administração Pública: aos funcionários dos serviços e organismos da administração central, bem como dos institutos públicos nas modalidades de serviços personalizados do Estado e de fundos públicos (nº 1, alínea a)); aos funcionários dos serviços na dependência orgânica e funcional da Presidência da República, da Assembleia da República e das instituições judiciárias (alínea b)); e aos agentes, em caso de reabilitação profissional (alínea c)).

O diploma define as figuras, integrando por via legal os respectivos conteúdos. Segundo o artigo 3º, nº 1, "a reclassificação profissional consiste na atribuição de categoria e carreira diferente daquela que o funcionário é titular, reunidos que estejam os requisitos legalmente exigidos para a nova carreira"; a reconversão profissional, dispõe o nº 2, "consiste na atribuição de categoria e carreira diferente daquela que o funcionário é titular, sendo a falta de habilitações literárias ou qualificação profissional supridas pela aprovação em curso ou cursos de formação profissional".
Os pressupostos (condições de utilização dos instrumentos de mobilidade referidos, gerais e objectivas; e requisitos, individuais e subjectivos) vêm enunciados nos artigos 4º e 5º (condições objectivas e limites), e 7º e 8º (requisitos da reclassificação e da reconversão profissionais, respectivamente).

Dispõe o artigo 4º, sob a epígrafe "Condições de aplicação":

"1- Podem dar lugar à reclassificação ou reconversão profissionais as seguintes situações:
a) A alteração das atribuições e competências dos organismos e serviços da Administração Pública;
b) A alteração de funções ou a extinção de postos de trabalho, originadas, designadamente, pela introdução de novas tecnologias e métodos ou processos de trabalho;
c) A desadaptação ou a inaptidão profissional do funcionário para o exercício das funções inerentes à carreira e categoria que detém;
d) A aquisição de novas habilitações académicas e ou profissionais, desde que relevantes para as áreas de especialidade enquadráveis nas atribuições e competências dos organismos e serviços da Administração Pública;
e) O desajustamento funcional, caracterizado pela não coincidência entre o conteúdo funcional da carreira que o funcionário é titular e as funções efectivamente exercidas;
f) Outras situações legalmente previstas."

Porém, mesmo verificada alguma das condições enumeradas (umas, estreitamente organizacionais e objectivas - alíneas a) e b); outras, integrando elementos subjectivos enquanto próprios ou radicados nos funcionários ou agentes - alíneas c) a e)), a lei estabelece limites à operatividade dos referidos instrumentos de mobilidade. O artigo 5º, com efeito, determina, por um lado, que a reclassificação e a reconversão não podem dar origem à atribuição de cargos e categorias de chefia (nº 1), e, por outro, que a reconversão não pode dar origem à atribuição de cargos em corpos especiais ou em carreiras em cujo ingresso seja exigida licenciatura, ou curso superior, salvo no caso de alteração das atribuições e competências dos organismos e serviços, quando ocorra no âmbito do mesmo organismo ou serviço (nº 2).

No que respeita a outra ordem de pressupostos (dir-se-ia subjectivos e processuais - requisitos), e relativamente à reclassificação profissional, o artigo 7º dispõe:

"1- São requisitos da reclassificação profissional:
a) A titularidade das habilitações literárias e das qualificações profissionais legalmente exigidas para o ingresso e ou acesso na nova carreira;
b) O exercício efectivo das funções correspondentes a nova carreira nos termos do nº 2 do artigo anterior;
c) O parecer prévio favorável da secretaria-geral ou de departamento responsável pela gestão dos recursos humanos do ministério da tutela.
2- O requisito previsto na alínea b) do número anterior pode ser dispensado quando seja comprovado com informação favorável do respectivo superior hierárquico o exercício, no mesmo serviço ou organismo, das funções correspondentes à nova carreira por período não inferior a um ano ou à duração do estágio de ingresso, se este for superior".


4. A reclassificação e a reconversão profissionais constituíam, no regime do Decreto-Lei nº 41/84, como se salientou, instrumentos de mobilidade a usar por exclusiva iniciativa da Administração, em função da reorganização de serviços e da melhor gestão dos recursos humanos.

O regime instituído pelo Decreto-Lei nº 497/99, de 19 de Novembro, mantendo a iniciativa da Administração, permitiu também aos interessados solicitarem a actuação dos referidos mecanismos através de requerimento fundamentado. Dispõe, a este respeito, o artigo 6º, nº 1: "a reclassificação e reconversão profissionais dependem de iniciativa da Administração, mediante despacho do dirigente máximo de serviço ou deliberação do respectivo órgão executivo ou ainda de requerimento fundamentado do funcionário que detenha mais de três anos na categoria e se verifique o interesse e a conveniência do serviço".

Deste modo, no regime actual, a reclassificação (e a reconversão) profissional depende da iniciativa da Administração, mas também pode ser requerida pelo interessado, desde que se verifique, além de um requisito de tempo, o interesse e a conveniência do serviço. Mas, por isso mesmo, esta faculdade do interessado não constitui um direito à reclassificação, não sendo mais do que uma mera possibilidade de iniciativa; a reclassificação não constitui um direito subjectivo do funcionário, dependendo da verificação, objectiva, da existência de interesse público e conveniência para o serviço. Os interesses que o instrumento de mobilidade salvaguarda são, assim, os interesses próprios, objectivos e públicos, da racionalização e gestão de recursos humanos, mais do que um direito ou interesse subjectivo dos funcionários.

De sublinhar que a reclassificação ou a reconversão, se for efectuada para outros serviços ou organismos (e não dentro do próprio serviço), depende, a um tempo, da concordância do funcionário e do serviço ou organismo de origem - artigo 6º, nº 4.

Poder-se-á, assim, concluir, no que respeita às finalidades a cuja realização estão adstritos os referidos instrumentos de mobilidade, que está essencialmente em causa o interesse público: a reclassificação e a reconversão constituem modelos de reordenamento e gestão dos recursos humanos ao dispor da Administração, que, todavia, não poderão ser usados sem a vontade dos funcionários, e não um direito dos funcionários que estes possam impor ou fazer valer quando se verifiquem as condições de natureza subjectiva previstas.

VI

1. A continuidade dos serviços públicos deve ser assegurada em todas as circunstâncias - princípio da continuidade dos serviços públicos.

Para assegurar a continuidade, evitando rupturas decorrentes de incidências ocasionais ou acidentais (v. g., falta, ausência ou impedimento do titular de um cargo), a lei deve instituir mecanismos que prevejam a possibilidade de designar um substituto que exerça temporariamente a competência que normalmente é exercida pelo titular do órgão ou cargo.

O princípio da continuidade, como princípio geral do exercício da actividade administrativa, teve expressão directa no Decreto-Lei nº 42800, de 11 de Janeiro de 1960, em cujo preâmbulo, com tradução no respectivo artigo 16º, se afirmava ser «princípio de que a regularidade e a continuidade do exercício da função pública não devem ser afectadas por qualquer situação de afastamento temporário dos seus agentes», devendo os chefes dos serviços tomar as providências necessárias para que «exista sempre um funcionário apto a responder pelos assuntos normalmente confiados a outros»[35].

Actualmente a norma geral com idêntica dimensão pode encontrar-se no artigo 41º do Código do Procedimento Administrativo, significando que o princípio da substituição, em termos gerais, deve continuar a considerar-se implícito no ordenamento jurídico-administrativo - para além de situações específicas de determinado tipo de funções e de pessoal, e de directas referências próprias, relativas a determinadas estruturas funcionais, como por exemplo o pessoal colocado em cargos dirigentes.


2. Dispõe o artigo 21º da Lei nº 49/99, de 22 de Junho[36], sobre "substituição" dos cargos dirigentes:

"1- Os cargos dirigentes podem ser exercidos em regime de substituição enquanto durar a vacatura do lugar ou a ausência ou impedimento do respectivo titular.
2- A substituição só poderá ser autorizada quando se preveja que os condicionalismos referidos no número anterior persistam por mais de 60 dias, sem prejuízo de, em todos os casos, deverem ser asseguradas as funções atribuídas aos dirigentes ausentes.
3- No caso de vacatura do lugar, a substituição tem a duração máxima de seis meses, improrrogáveis, salvo se estiver a decorrer o procedimento de concurso.
4- A substituição cessará na data em que o titular da cargo dirigente inicie ou retome funções ou, a qualquer momento, por decisão do membro do Governo que a determinou ou a pedido do substituto, logo que deferido.
5- A substituição deferir-se-á pela seguinte ordem:
a) Substituto designado na lei;
b) Substituto designado por despacho do membro do Governo competente.
6- A substituição considera-se sempre feita por urgente conveniência de serviço.
7- O período de substituição conta, para todos os efeitos legais, como tempo de serviço prestado no cargo ou lugar anteriormente ocupado pelo substituto, bem como no lugar de origem.
8- O substituto terá direito à totalidade dos vencimentos e demais abonos e regalias atribuídos pelo exercício do cargo do substituído, independentemente da libertação das respectivas verbas por este, sendo os encargos suportados pelas correspondentes dotações orçamentais."

O regime relativo à substituição de cargos dirigentes acolhido no diploma retoma, no essencial, as soluções já anteriormente consagradas. À substituição de cargos de direcção e chefia da Administração central referia-se o artigo 11º do Decreto-Lei nº 191-F/79, de 26 de Junho, e o artigo 8º do Decreto-Lei nº 327/89, de 26 de Setembro, em termos em tudo idênticos[37].
A lei prevê, pois, em caso de vacatura do cargo ou de impedimento do titular para além de um certo período de tempo, um duplo modo de substituição, que opera sucessivamente: pelo substituto designado na lei (na lei que estabeleça a organização e funcionamento da estrutura orgânica onde se verifique a situação), ou, não havendo substituto legal, pelo substituto designado por despacho do membro de Governo competente; a substituição ocorrerá sempre por urgente conveniência de serviço[38].


3. O nomen usado na lei para delimitar e enquadrar num tipo normativo a situação que se pretende regular (a 'substituição') pode, porém, assumir uma significação pluriconceptual. Será, por isso, conveniente, como elemento de afinação de sentido, apreender-lhe o conteúdo contextual significante.

Numa acepção dogmático-conceitualmente trabalhada, a substituição em direito administrativo poderá definir-se como uma «permissão conferida pela ordem jurídica de um órgão da Administração (substituto) agir em vez de outro órgão administrativo (substituído), praticando actos sobre matérias cuja competência primária ou normal pertence a este último»[39]. A substituição analisar-se-ia, assim, pelo resultado da conjugação de três elementos: estrutural (sub-rogação entre dois órgãos da Administração; um órgão em vez de outro); funcional (possibilidade de o órgão substituto praticar actos sobre matérias cuja competência primária ou normal pertence ao órgão substituído); legitimador (dependência de permissão conferida pela ordem jurídica ao órgão substituto)[40].

No Código de Procedimento Administrativo (CPA), e sob a utilização textual da fórmula 'substituição' no artigo 41º[41], acolhem-se realidades plurisignificativas, e na doutrina, sem unanimidade de integração conceitual[42]. A referida expressão poderia abranger situações de suplência e ter subjacentes situações de interinidade, subsumíveis ou não ao conceito de substituição.

Como quer que seja, porém, a substituição prevista no CPA, com projecções específicas em diversos diplomas, apresenta-se como um modo de suplência, fixada ex lege, uma vez que resulta directa e automaticamente da lei a determinação quer das concretas circunstâncias que lhe servem de fundamento, quer a determinação do substituto[43].

A referida expressão, no contexto em que se inscreve em texto de lei, e desde logo no CPA, pode também abranger situações que alguma doutrina designa por 'interinidade'.

Numa caracterização doutrinal, «a interinidade resulta de a lei conferir a um órgão da Administração a faculdade de designar um substituto que exerça temporariamente a competência que em termos normais é exercida pelo órgão cujo titular sofre uma vicissitude [em casos de ausência, falta ou impedimento] que o impossibilita de assegurar a (...) continuidade dos serviços públicos»[44].

A escolha do interino, para exercer temporariamente as competências do titular impossibilitado, depende da vontade da Administração, limitada por duas circunstâncias[45]: «por um lado a escolha do interino está condicionada pelo quadro legal de possíveis interinos que a lei põe à disposição do decisor; por outro lado, o perigo de paralisia dos serviços por circunstâncias relacionadas com o titular do órgão normalmente competente, impõe ao decisor que escolha sempre um interino, retirando-lhe a liberdade de não escolher».

Não obstante a ausência na lei de referências as situações designadas como interinidade, pode considerar-se que a espécie conceitual se encontra subjacente ao artigo 41º, nº 2, do CPA[46], e, porventura directamente, nas disposições legislativas que adoptem este modelo teórico de referência, como será o caso, implicado na consulta, do artigo 21º, nº 5, alínea b), da Lei nº 49/99, de 22 de Junho.


4. A aproximação dogmática e a descoberta do modelo conceptual subjacente à noção inscrita no artigo 21º do Decreto-Lei nº 49/99, não são, porém, e por si mesmas, de excessiva utilidade na resolução da concreta questão suscitada.

A qualificação da 'substituição' ali prevista (através da designação de um substituto), seja aproximada de uma verdadeira interinidade, seja como espécie integrada na categoria dogmática da substituição, ou autonomamente modelada, não auxilia, por si, na delimitação do círculo pessoal onde possa ser encontrada a escolha do substituto. Quando muito, dir-se-á que a escolha do substituto deve estar condicionada pelo círculo definido de possíveis substitutos que a lei põe à disposição do órgão com competência para a designação. O que, na hipótese concreta, deixa o intérprete no ponto de partida.

O artigo 21º, nº 5, da Lei nº 49/99 carece, pois, de interpretação no aludido segmento.
5. Interpretar uma norma é fixar o sentido e alcance com que há-de valer, determinando a sua significação decisiva[47].

A letra ou o texto da norma é, naturalmente, o ponto de partida da interpretação, cabendo-lhe, desde logo, uma função negativa: eliminar tudo quanto não tenha qualquer apoio ou correspondência no texto. Pode ter então de se proceder a uma interpretação extensiva ou restritiva, ou até correctiva, se o texto não tiver sido suficientemente esclarecedor ou permitir mais do que uma leitura; a letra é o ponto de partida, mas é também um elemento irremovível da interpretação na procura do sentido com que a norma deve valer, de acordo com os elementos de apreensão sistemáticos, históricos, racionais e teleológicos[48].

O elemento sistemático compreende a consideração de outras disposições que formam o complexo normativo do instituto em que se integra a norma interpretada, isto é, que regulam a mesma matéria (contexto da lei), assim como a consideração de disposições legais que regulam questões paralelas; compreende ainda o lugar sistemático que compete à norma interpretada no ordenamento geral, assim como a sua concordância com o espírito ou a unidade intrínseca do sistema.

O elemento racional ou teleológico consiste na razão de ser da norma (ratio legis), no fim visado pela edição da norma, nas soluções que tem em vista e que pretende realizar.

Na tarefa de interpretação, socorrendo-se dos instrumentos dogmáticos referidos, o intérprete não se deve restringir a uma leitura imediatista do texto da norma, mas deve conjugar e combinar todos os elementos numa leitura integrada de conjunto de modo a descobrir o sentido decisivo da norma.


6. O artigo 21º da Lei nº 49/99, de 22 de Junho, prevê as condições em que os cargos dirigentes podem ser exercidos em regime de substituição, e o modo de substituição, com a possibilidade de designação do substituto para cargo dirigente, mas não contém qualquer indicação sobre os requisitos pessoais que devam radicar-se na pessoa do substituto, exigíveis para poder ter lugar a designação.

Os requisitos, pessoais e funcionais, para o recrutamento para cargos dirigentes, apenas estão previstos directamente para a designação titular nos artigos 3º (directores-gerais e subdirectores-gerais) e 4º (directores de serviços e chefes de divisão)[49]. Tais requisitos podem não ser, necessariamente, como tais, aplicáveis à designação em substituição. Numa perspectiva mais imediata (a um tempo literal e a contrario), poder-se-ia mesmo supor que tais requisitos, fixados para a nomeação e não também para a designação em substituição, não se aplicariam a esta, que, como se referiu, por natureza transitória e temporalmente muito limitada, não confere ao substituto qualquer direito adicional, salvo a remuneração correspondente, nem constitui qualquer forma de acesso.

As referências intra-sistemáticas e contextuais (requisitos fixados para a nomeação para o cargo e ausência de qualquer previsão no que respeita à designação em substituição) não constituem, de igual modo, auxílio interpretativo relevante.

A aproximação sistemática pode também ser tentada no conjunto dos espaços normativos de referências semelhantes - lugares paralelos. Neste aspecto, o diploma que adapta o regime dos cargos dirigentes à administração local, com a disciplina que contém sobre idêntica questão, poderá transmitir elementos auxiliares.

O artigo 8º do Decreto-Lei nº 514/99, de 24 de Novembro[50], referindo-se à substituição de cargos dirigentes, dispõe que a substituição a que se refere o artigo 21º da Lei nº 49/99, de 22 de Junho, se defere pela ordem que indica: primeiramente ao titular de cargo dirigente de nível imediatamente inferior na escala hierárquica - alínea a); e, se não puder ser o caso, a funcionário que reúna as condições legais para recrutamento para o cargo dirigente a substituir, independentemente dos módulos de experiência profissional possuídos.

Dever o substituto reunir as condições legais para recrutamento para o cargo dirigente a substituir, significa, necessariamente, uma aproximação, quando não uma identidade, às condições que seriam exigíveis para uma nomeação como titular do cargo dirigente que estiver em causa.

Tal lugar paralelo poderia fazer induzir que o regime legal dos cargos dirigentes da administração central, sistematicamente integrado, pressupõe que o substituto deva possuir os requisitos que seriam exigíveis para a nomeação como titular.

Semelhante possibilidade dedutivo-sistemática enfrenta, porém, algumas dificuldades provenientes de uma leitura histórica e evolutiva do regime relativo aos cargos dirigentes, no que respeita às regras sobre substituição.

No Decreto-Lei nº 76/77, de 1 de Março, relativo às categorias de pessoal da administração local e regional, a substituição dos cargos de direcção e chefia (artigo 15º) recaía no trabalhador de maior categoria existente nos serviços ou, no caso de existir mais do que um da mesma categoria, no mais antigo. Por seu lado, o Decreto-Lei nº 191-F/79, de 26 de Junho, que estabeleceu o regime jurídico e condições de exercício das funções de direcção e chefia, previa no artigo 11º, nº 5, que a substituição, quando não recaísse em substituto previamente designado na lei, seria deferida a funcionário exercendo funções dirigentes de nível inferior na escala hierárquica ou técnico superior de categoria mais elevada que exerça funções compatíveis com o cargo.

Tanto num como noutro dos regimes, a substituição seria deferida a funcionário dos próprios serviços, de nível inferior ao substituído na escala hierárquica, mas, na administração central, também poderia ser designado técnico superior que exercesse funções compatíveis com o cargo. A designação exigia, assim, uma avaliação objectiva das condições do substituto, não estritamente vinculada a requisitos inteiramente predeterminados, mas orientada por critérios de compatibilidade entre as funções do substituto e o cargo.

O Decreto-Lei nº 323/89, de 26 de Setembro, que procedeu à revisão do Estatuto do Pessoal Dirigente, estabeleceu no artigo 8º os pressupostos do regime de substituição, determinando que esta, quando não houvesse substituto designado por lei, seria deferida a substituto designado por despacho do membro do Governo competente. Tal como no regime vigente, a lei não dispunha directamente sobre requisitos para a designação,

Mas, diversamente, para a administração local, o Decreto-Lei nº 198/91, de 29 de Maio, que procedeu à adaptação do regime dos cargos dirigentes, estabeleceu (artigo 8º) que a substituição, quando não recaísse em titular de cargo dirigente de nível imediatamente inferior na escala hierárquica, seria deferida a funcionário recrutável para o cargo dirigente a substituir, independentemente dos módulos de experiência profissional possuídos. Previa-se, assim, uma condição de designação que a aproximaria das exigências requeridas no recrutamento para cargo dirigente.

O actual regime é, pois, inteiramente semelhante ao anterior para cada uma das administrações, e, pelo menos na fórmula legislativa, não coincidente numa e noutra.

Uma tal diferença, mantida nos mesmos precisos termos na sucessão de regimes, é mais consentânea com uma ideia de assumida previsão de soluções diversas, do que com uma eventual ausência de coordenação normativa, repetida em momentos temporais sucessivos de intervenção legislativa. E, assim, aponta mais relevantemente para a interpretação no sentido de que não são exigidos para a designação em substituição os requisitos próprios para a nomeação como titular de cargo dirigente.

Por último, a projecção teleológica do regime de substituição pode apontar também, de modo porventura mais razoável, no sentido de uma leitura ampla das condições de designação do substituto de cargo dirigente.

A finalidade tida em vista é o respeito pelo princípio da continuidade dos serviços públicos, evitando situações de ruptura, em casos de impossibilidade do titular para além de um certo período. E como medida inteiramente transitória, tanto pelo regime, como no apertado termo final de duração da situação de substituição. Mas, assim, a necessidade, conjugada com a sublinhada transitoriedade, pode exigir, ou ser melhor assegurada, se o órgão decisor puder dispor de uma mais ampla margem de intervenção e escolha, permitindo-lhe a designação em substituição mesmo quando o âmbito pessoal de escolha não ofereça (absoluta ou relativamente) elementos que reúnam as condições que seriam exigíveis para a nomeação como titular.

Mas, naturalmente, mesmo em tais condições, sempre respeitando os princípios da adequação, da necessidade, da imparcialidade e da prossecução do interesse público, que impõem à Administração, na designação para cargo dirigente em substituição, que apenas possa escolher substituto possuindo formação e a capacidade adequadas ao exercício daquelas funções.


7. A questão é, como se salientou, bem duvidosa, e os elementos que apontam no sentido encontrado não têm, há que reconhecê-lo, uma força tão determinante que permita afastar todas as dúvidas.

As condições do problema aconselhariam, por isso, uma intervenção legislativa esclarecedora[51].

VII

1. Os elementos recolhidos, na expressão necessária ao objecto da consulta, permitem, em síntese de resolução, oferecer resposta às questões suscitadas.

Relativamente à primeira.

Aceite que os militares se integram no conceito amplo de funcionários para efeitos de aplicabilidade das regras e princípios que regem os instrumentos de mobilidade, um interessado, como no caso concreto, que integra a categoria de sargentos da carreira militar, e que obteve o grau de licenciatura (artigo 4º, alínea b) do Decreto-Lei nº 497/99), pode ser reclassificado para a carreira técnica superior da função pública, desde que se verifiquem os restantes pressupostos objectivos de que depende a possibilidade de reclassificação: interesse público, conveniência do serviço, concordância do funcionário e dos serviços de origem e daquele para o qual é feita a reclassificação.


2. Segunda questão.

Admitida a reclassificação, e integrado o funcionário na carreira técnica superior, e interpretado, como se interpretou, o artigo 21º, nº 5, alínea b), da Lei nº 49/99, de 22 de Junho, no sentido de não serem exigíveis para a designação em substituição de cargo dirigente os requisitos impostos pela lei para a nomeação como titular, não haverá obstáculo à designação para o cargo de chefe de divisão, em regime de substituição, desde que seja considerado que reúne condições e capacidade adequadas ao exercício das referidas funções.
VIII

Em face do exposto, formulam-se as seguintes conclusões:

- As Forças Armadas fazem parte da Administração estadual, e os militares integram a função pública, estando sujeitos, nos limites da Constituição, às regras e princípios aplicáveis, em geral, aos funcionários públicos;

- A carreira militar, regulada pelo Decreto-Lei nº 236/99, de 25 de Junho, integra-se nas carreiras próprias da Administração Central como carreira especial, constituindo os militares um corpo especial;

- A reclassificação profissional, prevista no artigo 4º do Decreto-Lei nº 497/99, de 19 de Novembro, constitui um instrumento de mobilidade colocado ao dispor da Administração para a melhor gestão dos recursos humanos, e depende, nos termos dos artigos 6º e 7º deste diploma, da verificação de condições subjectivas do funcionário ou agente, da existência de interesse para o serviço, e, em caso de reclassificação para serviço diferente, da concordância do serviço originário do funcionário a reclassificar;

- É admissível a reclassificação de um militar, integrado na categoria de sargentos da carreira militar, para a carreira técnica superior da função pública, desde que se verifiquem os requisitos subjectivos -licenciatura, e os pressupostos objectivos - interesse para o serviço e a concordância dos serviços de origem do militar, previstos no artigos 6º e 7º do Decreto-Lei nº 497/99, de 19 de Novembro;

- A designação em substituição para cargo dirigente, prevista no artigo 21º da Lei nº 49/99, de 22 de Junho, é por natureza precária e temporária, tendo por finalidade assegurar o princípio da continuidade dos serviços;

- Para a designação em regime de substituição não é necessário que o funcionário a designar possua as condições exigidas para o provimento, como titular, de cargo dirigente, devendo, contudo, reunir condições e capacidade adequadas ao exercício das respectivas funções.


VOTO


(Alberto Augusto Andrade de Oliveira) Votei contra a conclusão 6.ª, pelas seguintes razões, muito em síntese:

1.1. No seu ponto VI.6., o parecer assenta em que o artigo 21.º da Lei n.º 49/99, de 22 de Junho, “não contém qualquer indicação sobre os requisitos pessoais que devam radicar-se na pessoa do substituto, exigíveis para poder ter lugar a designação”, e em que os “requisitos, pessoais e funcionais, para a recrutamento para cargos vigentes, apenas estão previstos directamente para a designação titular”.
Refere, depois, e aí começa a sua sustentação, que numa “perspectiva mais imediata (a um tempo literal e a contrario), poder-se-ia mesmo supor que tais requisitos, fixados para a nomeação e não também para a designação em substituição, não se aplicariam a esta, que, como se referiu, por natureza transitória e temporalmente muito limitada, não confere ao substituto qualquer direito adicional, salvo a remuneração correspondente, nem constitui qualquer forma de acesso”.

1.2. Em seguida, detectando lugares paralelos, verifica o parecer a diferente previsão no diploma que adapta a Lei 49/99 à administração local, o Decreto-Lei n.º 514/99, de 24 de Novembro, nomeadamente no artigo 9.º, onde se consagra que a substituição a que se refere o artigo 21.º da Lei 49/99 se defere pela seguinte ordem:
"a) Titular de cargo dirigente de nível imediatamente inferior na escala hierárquica; b)Funcionário que reuna as condições legais para recrutamento para o cargo dirigente a substituir, independentemente dos módulos de experiência profissional possuídos.”
O parecer admite que este lugar paralelo “poderia fazer induzir que o regime legal dos cargos vigentes da administração central, sistematicamente integrado, pressupõe que o substituto deva possuir os requisitos que seriam exigíveis para a nomeação como titular”.
Só que, afasta esta conclusão por verificar que a diferença gramatical registada “é inteiramente semelhante" à que já se verificava no regime anterior para cada uma das administrações. E remata:
“Uma tal diferença, mantida nos mesmo precisos termos na sucessão de regimes, é mais consentânea com uma ideia de assumida previsão de soluções diversas, do que com uma eventual ausência de coordenação normativa, repetida em momentos temporais sucessivos de intervenção legislativa. E, assim, aponta mais relevantemente para a interpretação no sentido de que não são exigidos para a designação em substituição os requisitos próprios para a nomeação como titular de cargo dirigente”.

1.3. Finalmente, carreia a favor da solução alcançada que "a projecção teleológica do regime de substituição pode apontar também, de modo porventura mais razoável, no sentido de uma leitura ampla das condições de designação do substituto de cargo dirigente.”
"A finalidade tida em vista é o respeito pelo princípio da continuidade dos serviços públicos, evitando situações de ruptura, em casos de impossibilidade do titular para além de um certo período. E como medida inteiramente transitória, tanto pelo regime, como no apertado termo final de duração da situação de substituição. Mas, assim, a necessidade, conjugada com a sublinhada transitoriedade, pode exigir, ou ser melhor assegurada, se o órgão decisor puder dispor de uma mais ampla margem de intervenção e escolha, permitindo-lhe a designação em substituição mesmo quando o âmbito pessoal de escolha não ofereça (absoluta ou relativamente) elementos que reunam as condições que seriam exigíveis para a nomeação como titular”.

2. Não concordo nem com as ilações parcelares, ao longo do percurso argumentativo, nem com a solução final.

2.1. Comecemos pela suscitada possibilidade de, face a ausência de previsão expressa no artigo 21.º sobre os requisitos pessoais e funcionais, se poder supor, com base numa perspectiva, "a um tempo literal e a contrario", que não há determinação de requisitos para a nomeação em substituição.
Por mim, qualquer inferência imediata seria exactamente a oposta. Vejamos.
Em primeiro lugar, não será de utilizar o argumento a contrario numa situação destas. Como se sabe, a “utilização do argumento a contrario tem como pressuposto a demonstração do carácter excepcional do preceito em causa (...). Se, para determinado caso, se estabelece uma disposição excepcional, dela pode inferir-se a regra que funciona para todos os outros casos.”
Ora, no presente problema, a regra geral é conhecida e encontra-se expressamente estabelecida nos artigos 3.º e 4.º da Lei n.º 49/99. O argumento a contrario utiliza-se para descobrir uma regra geral não contida em nenhum preceito, mas é imprestável numa situação como a presente em que a regra geral está claramente definida. Note-se, aliás, que onde não há previsão expressa é, exactamente, no artigo 21.º. Tudo nos reconduz, facilmente, à impossibilidade de nele descortinar uma regra excepcional, e, por isso, à exigência do respeito da regra geral.
Em segundo lugar, a omissão gramatical terá uma explicação muito simples.
Os artigos 3.º e 4.º tratam do recrutamento dos cargos dirigentes contemplando em cada um deles quer a modalidade pela qual opera - a escolha, para director-geral e subdirector, o concurso (em geral, o concurso), para directores de serviços e chefes de divisão – quer os requisitos pessoais - seja para se ser escolhido, seja para a submissão a concurso e posterior nomeação.
Pois bem, o artigo 21.º cuida apenas daquilo que é especial do regime de substituição. A vertente dos requisitos subjectivos não é tratada porque o é antes nas regras gerais dos cargos a que se reporta - artigos 3.º, 4.º. Na omissão de especialidade, ou novidade, impõe-se a regra geral.

2.2. A diferença de regime na administração central e na local.
Assente a diversa previsão legal, o parecer não lhe intenta descobrir qualquer razão substancial. Avança que essa diferença foi querida, mas não procura o seu fundamento, e acaba, sem justificação substancial declarada, por extrair desse diverso regime uma conclusão, no mínimo, imprevisível.
Com efeito, não dispensando uma linha sobre as razões da diversidade, a conclusão a que o parecer chega significa que o legislador pretendeu dar maior flexibilidade e abertura na designação do substituto na administração central que na local.
Mais uma vez, afigura-se-me que estaria correcto o oposto.
Ao adaptar o estatuto do pessoal dirigente dos serviços e organismos da administração central e local do Estado à administração local, o legislador reflectiu a dificuldade que para esta última se poderia registar, atento o seu muito menor espaço de recrutamento - basta pensar-se nas inúmeras autarquias de pequena dimensão -, se se exigisse sempre para a designação do substituto todos os requisitos necessários para a nomeação em comissão "normal”. Por isso se compreende que, não prescindindo, embora, dos requisitos habilitacionais, dispensasse os restantes.
Ora, é inverosímil, com todo o respeito pela opinião contrária, que na administração central a ausência expressa de indicação signifique, afinal, uma liberdade de escolha superior à que existe na administração local. Dir-se-ia que se equivocou o legislador quando pretendendo alargar a área de escolha na administração local acabou, se for correcto o entendimento que obteve vencimento, por restringi-lo.
E diga-se, desviando-nos um pouco da mera contraposição à exposição do parecer, que a solução para que propendo tem forte apoio em situações paralelas, também de nomeação transitória, como as do n.º 8 e 9 do artigo 4.º da Lei n.º 49/99 - nomeação em comissão de serviço por um ano de director de serviços e chefe de divisão nos casos em que os concursos fiquem desertos ou em que não haja candidatos aprovados, ou no caso de criação de serviços. Nessas situações, o recrutamento pode fazer-se por escolha, e também não diz expressamente a lei quais os requisitos pessoais do escolhido. Mas logo o n.º 10 do artigo 4.º dispõe que é aberto concurso até 120 dias antes do termo dessa comissão, e que nesses concursos os nomeados ao abrigo dos n.º 8 e 9 gozam de preferência em caso de igualdade de classificação. Quer dizer, os nomeados reúnem as condições gerais para o recrutamento, por isso que vão ao concurso e aí gozam de preferência. Também aqui a lei não voltou a falar dos requisitos pessoais, pois que deles se ocupara no articulado precedente.

2.3. Enfim, arvora o parecer, como fim da norma, o respeito do princípio da continuidade dos serviços públicos.
Diga-se, desde já, que essa continuidade nunca está em causa. Ela efectiva-se independentemente da activação do regime de substituição (cfr. o artigo 21.º, n.º 2, parte final), o que afasta a aparente força do argumento.
Acresce ser óbvio que o legislador ao dispor sobre requisitos pessoais para o desempenho de um qualquer cargo limita o âmbito de recrutamento. Se exige licenciatura adequada, integração em carreira do grupo pessoal técnico, certa experiência, coloca de fora todo o espectro muito mais numeroso da população onde, numa ordem hipotética de pensamento, sempre se poderia encontrar melhor serventuário. Mas o legislador conhece a realidade sobre que se debruça. Por isso, não é indiferente que hoje exija a licenciatura, podendo exigir, simplesmente, o 12.º ano de escolaridade, ou, mais, o doutoramento. É neste contexto que se explica, por exemplo, que para os cargos de director de serviços e chefe de divisão exija a integração em carreira do grupo de pessoal técnico superior, ou em carreiras equiparadas – artigo 4.º, n.º 2 e n.º 4. O legislador restringe porque sabe que é possível manter a continuidade do serviço público e porque pretende prosseguir melhor esse serviço. Não basta, portanto, afirmar que a Administração deve respeitar os princípios da adequação, da necessidade, da imparcialidade e da prossecução do interesse público, princípios que se impõem em toda a actividade da Administração.
No que respeita à designação do substituto a resposta não será, pois, aquela para que aponta o parecer, que chega a uma solução singular no panorama de designação para cargos na administração central directa, que é a da inexistência de qualquer requisito legal de formação e experiência profissional, integração em carreira e, até, de habilitações académicas.



[1] O interessado é Sargento-Chefe de Artilharia do Exército Português; possui Licenciatura em Direito e foi requisitado para o desempenho de funções de técnico superior na Secretaria-Geral do Ministério da Justiça em finais de 2000. Por despacho de 23 de Março de 2001, do Secretário de Estado Adjunto, foi nomeado chefe de divisão, nos termos do nº 9 do artigo 4º do Decreto-Lei nº 49/99, de 22 de Junho.
[2] Em ofício de 26 de Junho de 2001.
[3] Informação de 7 de Junho de 2001 (proc. 624/2000 AJ), que mereceu a concordância do Auditor Jurídico.
[4] Ofício de 26 de Abril de 2001.
[5] O ofício de 26 de Abril de 2001 do Gabinete do CEME informa também sobre o Despacho proferido relativamente à reclassificação solicitada (Despacho do TGEN AGE, de 10.04.01), do seguinte teor: "a. As Forças Armadas não são enquadráveis no conceito de Administração Pública com o sentido e alcance expressos no Dec.Lei nº 497/99, de 19Nov. b. Detendo um regime próprio e previsto no EMFAR, os militares do QP podem ser objecto de reclassificação no âmbito das Forças Armadas. c. Apesar disso, não está vedado aos militares o acesso a lugares da Administração Pública por via de concurso com, à data da eventual tomada de posse, o consequente abate aos QP ou, estando na situação de reserva, ocupar lugares na mesma Administração com as restrições legais impostas e decorrentes do seu estatuto. e. Nos termos em que é solicitada, não é possível a reclassificação do SCH ART SALVADO ALVES , atendendo a que o abate aos QP tem como efeito imediato a quebra definitiva do seu vínculo ao Estado, deixando de ser militar, e, por outro lado, só ser possível a reclassificação a funcionários que implica a prévia existência de vínculo ao estatuto jurídico do funcionalismo público."
[6] Chefe de divisão de Economato e Património da Secretaria-Geral do Ministério da Justiça. A nomeação foi feita por um ano, nos termos do disposto no nº 9 do artigo 4º da Lei nº 49/99, de 22 de Junho, por despacho do Secretário de Estado Adjunto do Ministro da Justiça. Informação constante dos elementos enviados dá conta, porém, de ter sido alterado o fundamento da nomeação, que se refere ter sido em substituição.
[7] Parecer de 7 de Setembro de 2001, cit.
[8] Parecer nº 143/01, de 21 de Maio de 2001, da Consultadoria Jurídica, que teve a concordância do Subdirector-Geral e do Senhor Secretário de Estado Adjunto e do Orçamento.
[9] Informação de 6 de Julho de 2001.
[10] A Direcção-Geral da Administração Pública assinala que, face às dificuldades de interpretação referidas, «não deixará de, oportunamente, procurar a clarificação de regime pela via normativa».
[11] Cfr. v. g., parecer deste Conselho nº 99/98, de 25 de Fevereiro de 1999.
[12] Alterado pelos Decretos-Leis nºs 265/88, de 28 de Julho e 404-A/98, de 18 de Dezembro.
[13] Esta distinção já fora delineada no Decreto-Lei nº 191-C/79, de 25 de Junho, tendo então sido criticada, em termos de nomenclatura, por JOÃO ALFAIA, salientando que, em rigor, todas as carreiras são verticais, porque ascencionais ("Conceitos Fundamentais do Regime Jurídico do Funcionalismo Público", I vol. Coimbra, 1965, pág. 58-59).
[14] Cfr. o parecer deste Conselho nº 6/97, de 9 de Junho de 1999.
[15] Designadamente nos pareceres nºs. 64/92, de 14 de Janeiro de 1993 e 6/97, cit.
[16] Acompanha-se, de perto, por vezes textualmente, o parecer nº 6/97, cit.
[17] Cfr., por todos, BARROS MOURA, "A Constituição Portuguesa - da revolução à integração na CEE", in "Portugal - O sistema político e constitucional- 1974/87", Lisboa, 1989, págs. 820-821.
[18] Cfr., FREITAS DO AMARAL, "Curso de Direito Administrativo", I, 2ª ed., pág. 222.
[19] Cfr. LIBERAL FERNANDES, "As Forças Armadas e a PSP perante a liberdade sindical", in "estudos em Homenagem ao Prof. Doutor Ferrer Correia", Coimbra, 1991, págs. 931-932.
[20] Cfr. JOSÉ MIGUEL SARDINHA, "As Forças Armadas e as autarquias locais na ordem jurídica portuguesa", Coimbra, 1991, pág. 25.
[21] Cfr., v. g., Acórdão do Tribunal Constitucional nº 662/99, de 7 de Dezembro de 1999, publicado no "Diário da República", II Série, nº 46, de 24 de Fevereiro de 2000.
[22] Cfr., v. g., no que respeita ao regime espanhol, com enquadramento constitucional semelhante, PARADA VASQUEZ, "Modelos de función publica y función publica militar", in "La función publica militar en el actual Ordenamiento constitucional español", Madrid, 1995, pág. 52 e NEVADO MORENO, "La función publica militar", Madrid, 1997, pág. 150-151.
[23] Cfr. o já referido artigo 16º, nº 2, alínea b), do Decreto-Lei nº 184/89, de 2 de Junho.
[24] Cfr. acórdão do Tribunal Constitucional nº 662/99, cit., nota (21), que considera inconstitucional, por violação do princípio da igualdade, a interpretação de uma norma no sentido de afastar um militar do conceito de funcionário para efeito de admissão como opositor a concursos internos gerais para provimento de lugares dos quadros da administração pública civil do Estado.
[25] O conceito geral de reclassificação profissional, como instrumento de mobilidade, é distinto da reclassificação prevista no artigo 170º, nº 2 alínea b), do Estatuto dos Militares das Forças Armadas, como pressuposto ou modo de transferência de quadro especial.
[26] Decreto-Lei nº 248/85, de 15 de Julho, artigo 9º, nº 2, e artigo 10º. Cfr. ANA FERNANDA NEVES, "Relação Jurídica de Emprego Público", Coimbra, 1999, pág. 132.
[27] Cfr. idem, pág. 132-3.
[28] Cfr. idem, pág. 135.
[29] Cfr. idem, pág. 134, nota (412). «Os instrumentos de mobilidade ou de modificação da relação jurídica de emprego de natureza transitória são realidade diversa do jus variandi e, obviamente, das modificações definitivas»: a transferência e a permuta.
[30] O artigo 20º considerava instrumentos de mobilidade o concurso; a permuta; a transferência; o destacamento; a requisição; a deslocação; a rotação; a afectação colectiva; a reclassificação profissional; a reconversão profissional e a constituição de excedentes.
[31] Deste modo se expressava PAULO VEIGA E MOURA, "Função Pública. Regime Jurídico, Direitos e Deveres dos Funcionários e Agentes", Coimbra, 1999, pág. 426. Ver, também, ANA FERNANDA NEVES, op. cit., pág. 132 e segs. O parecer deste Conselho nº 47/99, de 13 de Julho de 2000, aceitava este compromisso sobre a natureza do referido instrumento de mobilidade, ao dispor da Administração e no exclusivo interesse desta.
[32] Cfr. PAULO VEIGA E MOURA, op. cit., pág. 427.
[33] Cfr, idem, pág. 428; parecer nº 47/99, cit.
[34] As expressões assinaladas constam do preâmbulo do diploma.
[35] Cfr. parecer deste Conselho nº 61/93, de 27 de Janeiro de 1994. O Decreto-Lei nº 42800 foi objecto de revogações parcelares - os Decretos-Leis nºs 187/88, de 27 de Maio, 497/88, de 30 de Dezembro (cujo artigo 108º revogou o referido artigo 16º), e 155/92, de 28 de Julho. O princípio da continuidade tinha também tradução expressa no Estatuto do Funcionalismo Ultramarino, que previa provimentos transitórios (artigo 55º) "enquanto durar a vacatura de qualquer cargo ou estiver ausente ou impedido o seu titular por licença, doença, cumprimento de pena ou comissão que não abra vaga". No artigo 56º dispunha sobre os modos de "substituição".
[36] Estabelece o Estatuto do pessoal dirigente dos serviços e organismos da Administração central e local do Estado e da administração regional, bem como, com as necessárias adaptações, dos institutos públicos que revistam a natureza de serviços personalizados ou de fundos públicos.
[37] Para a Administração local regia o artigo 7º do Decreto-Lei nº 198/91, de 29 de Maio e, antes, para a administração local e regional, o artigo 15º do Decreto-Lei nº 76/77, de 1 de Março.
[38] Para a administração local dispõe, hoje, o artigo 9º do Decreto-Lei nº 514/99, de 24 de Novembro.
[39] É a posição de PAULO OTERO, "O Poder de Substituição em Direito Administrativo. Enquadramento Dogmático-Constitucional", vol. II, Lisboa, 1995, pág. 391.
[40] Cfr. idem, ibidem.
[41] Artigo 41º, com a epígrafe "Substituição": "1. Nos casos de ausência, falta ou impedimento do titular do cargo, a sua substituição cabe ao substituto designado por lei. 2. Na falta de designação pela lei, a substituição cabe ao inferior hierárquico imediato, mais antigo, do titular a substituir."
[42] Cfr. PAULO OTERO, op. cit., pág. 476-7 e 483.
[43] «No que respeita à doutrina [sobre se a suplência será uma espécie de substituição], esta encontra-se dividida - escreve PAULO OTERO, op. cit, pág. 477 - entre três grupos de autores: (i) segundo uns, configurada a suplência como fenómeno de sub-rogação de pessoas físicas, esta nunca seria subsumível no conceito de substituição, enquanto fenómeno interorgânico; (ii) para outros, entendida a substituição como realidade entre duas entidades públicas, a suplência, qualquer que seja a sua configuração jurídica, está liminarmente afastada da figura da substituição; (iii) finalmente, existem autores que reconduzem a suplência à figura da substituição, funcionando aquela como uma sua espécie.»
[44] Cfr PAULO OTERO, op. cit., pág. 479.
[45] Cfr idem, pág. 480.
[46] Cfr, idem, págs. 482-483: «No respeitante ao Código do Procedimento Administrativo, apesar de não existir nenhuma referência expressa a situações de interinidade, deve entender-se que a mesma se encontra subjacente ao artigo 41º, nº 1. Com efeito, (...), a regra de suplência prevista no número dois da citada disposição legal só intervém se não existir substituto designado na lei para o órgão cujo titular está ausente, impedido ou falta. Quer isto dizer o seguinte: a regra da suplência prevista no Código assume natureza subsidiária. Somente em caso de inexistência de outras formas de designação do substituto previstas na lei se aplica a regra geral de que a substituição compete ao inferior hierárquico imediato, mais antigo, do titular a substituir (CPA, artigo 41º, nº 1). Ora, entre tais mecanismos legais podem bem encontrar-se casos de interinidade que terão, por isso mesmo, uma aplicação preferencial em relação à regra subsidiária de suplência prevista no Código do Procedimento Administrativo.»
[47] A questão de interpretação da lei tem ocupado com frequência a atenção deste Conselho. Cfr., v. g., o parecer nº 328/2000, de 16 de Agosto de 2000, que refere variados pareceres anteriores sobre a matéria.
[48] Cfr. BAPTISTA MACHADO, "Introdução ao Direito e ao Discurso Legitimador", Coimbra, 1987, 2ª reimpressão, pág. 182; OLIVEIRA ASCENSÃO, "O Direito, Introdução e Teoria Geral", 4ª edição, 1987, págs. 345 e segs.
[49] Relativamente ao recrutamento de chefes de divisão, que interessa à economia da parecer, dispõe o artigo 4º, nº 1, que "é feito, por concurso, de entre funcionários que reúnam cumulativamente os seguintes requisitos"; a) licenciatura adequada; b) integração em carreira do grupo de pessoal técnico superior; c) quatro anos de experiência profissional em cargos inseridos em carreiras do grupo de pessoal técnico superior. Para este efeito, consideram-se integradas no grupo de pessoal técnico superior as carreiras para cujo provimento seja exigível uma licenciatura, nomeadamente as denominadas carreiras técnicas superiores, independentemente da sua designação específica, e as carreiras da magistratura judicial e do Ministério Público, investigação, docentes e médicas - artigo 4º, nº 4. De acordo com o nº 5 desta disposição, e ainda para os mesmos efeitos, considera-se equiparado ao grupo de pessoal técnico superior o pessoal das Forças Armadas e das forças de segurança integrado em carreiras para cujo ingresso seja exigível a posse de licenciatura.
[50] Procede à adaptação à administração local da Lei nº 49/99, de 22 de Junho.
[51] Intervenção legislativa que a Direcção-Geral da Administração Pública referiu ter intenção de promover. Cfr. a Informação referida na nota (3).