Pareceres PGR

Parecer do Conselho Consultivo da PGR
Nº Convencional: PGRP00002312
Parecer: P000902003
Nº do Documento: PPA16122004009000
Descritores: INSTITUTO NACIONAL DE HABITAÇÃO
INSTITUTO PÚBLICO
SERVIÇO PERSONALIZADO
REGIME DE PESSOAL
REGIME DE DIREITO PRIVADO
REGULAMENTO INTERNO
CONVENÇÃO COLECTIVA DE TRABALHO
ACTIVIDADE BANCÁRIA
ACTIVIDADE PARABANCÁRIA
PORTARIA DE EXTENSÃO
RETRIBUIÇÃO
REMUNERAÇÃO COMPLEMENTAR
DESPESAS COM TELEFONES
CRÉDITO À HABITAÇÃO
SUBSÍDIO INFANTIL
SUBSÍDIO DE ESTUDO
SEGURO DE SAÚDE
SEGURO DE COMPLEMENTO DE REFORMA
PRESTAÇÕES SOCIAIS
CESSAÇÃO
DIREITOS ADQUIRIDOS
PRINCÍPIO DA PROTECÇÃO DA CONFIANÇA
Livro: 00
Numero Oficio: 2635
Data Oficio: 07/29/2003
Pedido: 07/30/2003
Data de Distribuição: 09/26/2003
Relator: FÁTIMA CARVALHO
Sessões: 01
Data da Votação: 12/16/2004
Tipo de Votação: UNANIMIDADE
Sigla do Departamento 1: MFIN
Entidades do Departamento 1: MIN DE ESTADO E DAS FINANÇAS
Posição 1: HOMOLOGADO
Data da Posição 1: 08/04/2005
Privacidade: [01]
Data do Jornal Oficial: 05-09-2005
Nº do Jornal Oficial: 170
Nº da Página do Jornal Oficial: 12954
Indicação 2: ASSESSOR:TERESA BREIA
Área Temática:DIR ADM * ADM PUBL * FUNÇÃO PUBL / DIR CONST * DIR FUND / DIR TRAB
Ref. Pareceres:P000411984Parecer: P000411984
P000291987Parecer: P000291987
P000161992Parecer: P000161992
P000051993Parecer: P000051993
P000771993Parecer: P000771993
P000321994Parecer: P000321994
P000191995Parecer: P000191995
P000361998Parecer: P000361998
P000972002Parecer: P000972002
Legislação:DL 177/84 DE 1984/05/25; DL 202-B/86 DE 1986/07/22 ART2 ART3 N2 ART18 ART20 N6 N7 ART22; DL 243/2002 DE 2002/11/05; DL 305/91 DE 1991/08/16; L 3/2004 DE 2004/01/15 ART34; L 91/2001 DE 2001/08/20 ART2 N3 A B ; RCM 112/2002 DE 2002/08/24; DL 14/2003 DE 2003/01/30 ART2 ART3 N1 N2 ART6 ART7; PORT 180/97 DE 1997/03/12 ART5 N4 ART15; PORT 57/87 DE 1987/01/23; DL 46302 DE 1965/04/27 ART1; DL 298/92 DE 1992/12/31 ART2 ART3 ART4 ART5 ART6; ACT DE 1990/07/26 BTE N31 I SÉRIE DE 1990/08/22 CLÁUSULA 151; RGU DO CRÉDITO À HABITAÇÃO ANEXO AO ACT; CIRCULAR 35/88 DE 1988/09/01; ORDEM DE SERVIÇO 20/92 DE 1992/10/29; DL 519-C1/79 DE 1979/12/29; L 45-A/84 DE 1984/02/03; L 23/98 DE 1998/05/26; L 99/2003 DE 2003/08/27 ART122 ART153 ART249 N1 ART575; L 23/2004 DE 2004/06/22 ART11 ART22 N4; DL 49408 DE 1969/11/24 ART21 ART82; DL 184/89 DE 1989/06/02 ART13 ART15; CONST76 ART2 ART56 ART59 N1 A ART65
Direito Comunitário:
Direito Internacional:
Direito Estrangeiro:
Jurisprudência:AC TC 517/98 DE 1998/11/14
AC TC 141/2002 DE 2002/04/09 IN DR I SÉRIE DE 2002/05/09
AC TC 556/2003 DE 2003/11/12 IN DR I SÉRIE DE 2004/01/07
AC STJ DE 2003/10/15 INTERNET
Documentos Internacionais:
Ref. Complementar:
Conclusões: - O Instituto Nacional de Habitação - instituto público com autonomia administrativa e financeira e património próprio, dotado de instrumentos de gestão flexibilizada e de um quadro de pessoal sujeito ao regime do contrato individual de trabalho - prossegue a política do Estado para o sector de habitação, exercendo competências nos domínios da administração habitacional e apoio técnico, do financiamento, e da gestão habitacional, com vista à satisfação de interesses sociais e sem escopo lucrativo;
- O Acordo Colectivo de Trabalho Vertical do sector bancário não é aplicável às relações jurídico-laborais constituídas no âmbito daquele Instituto, quer por falta de correspondência material entre os respectivos sectores de actividade económica quer por não ter sido alargado a este organismo, pela via administrativa adequada, o seu âmbito de aplicação;
- Com a entrada em vigor do Decreto-Lei nº 14/2003, de 30 de Janeiro, foram revogadas as deliberações do conselho directivo daquele instituto público e as decisões do respectivo membro do governo que instituíram prestações sociais, bem como benefícios ou regalias suplementares ao sistema remuneratório, e foi determinada a cessação dos benefícios e regalias já atribuídos, com ressalva dos direitos adquiridos;
- A revogação daqueles actos obsta a que qualquer das vantagens por eles concedidas seja atribuída ao pessoal a admitir;
- As prestações já atribuídas face à verificação das respectivas eventualidades, enquanto direitos que se constituíram na esfera jurídica dos destinatários, merecem a protecção da confiança e devem manter-se enquanto perdurarem os pressupostos da atribuição;
- Nos demais casos, as meras expectativas de obtenção de futuras prestações, benefícios e regalias, face à verificação das respectivas eventualidades, não beneficiam de protecção por aplicação do princípio da confiança nem a sua afectação ofende de forma inadmissível, arbitrária ou desproporcionada aquele princípio;
- Devem manter-se os subsídios infantil e de estudo, que já tenham sido atribuídos, nos termos e nas condições referidas na conclusão 5ª;
- Os contratos de mútuo destinados à aquisição ou construção de habitação bem como os contratos de seguro, já celebrados, devem ser cumpridos nos termos do regime legal e contratual aplicável;
- A cessação ou não renovação dos contratos de seguro, nas circunstâncias permitidas, não ofende direitos adquiridos dos beneficiários nos termos referidos na conclusão 6ª.

Texto Integral:
Senhor Ministro das Finanças e da Administração Pública,
Excelência:



I

A Inspecção-Geral de Finanças (IGF)[1] suscitou dúvidas acerca de algumas das medidas adoptadas pelo conselho directivo do Instituto Nacional de Habitação (INH) em cumprimento do disposto no artigo 6º, nº 2, do Decreto-Lei nº 14/2003, de 30 de Janeiro[2], que disciplina a atribuição de benefícios e regalias suplementares ao sistema remuneratório dos titulares de órgãos de administração ou gestão, e do restante pessoal, dos serviços e fundos autónomos.

Representando o melindre das questões que se colocavam - concernentes à manutenção de subsídios infantil e de estudo, de crédito para aquisição e contrução de habitação, e de seguros de saúde e de complemento de reforma, nuns casos apenas para o pessoal já admitido, noutros casos abrangendo também o pessoal a admitir - e atendendo ainda à necessidade de «uniformizar entendimentos» nos diversos organismos abrangidos por aquela determinação legal, a referida entidade inspectiva sugeriu a audição deste corpo consultivo.

Acolhendo a proposta formulada dignou-se a antecessora de Vossa Excelência solicitar o presente parecer, que cumpre, assim, emitir.

2. A compreensão do objecto da consulta exige que se conheça, desde já e ainda que em linhas gerais, a normação em causa.

Reconhecendo que a matéria respeitante a regalias e benefícios suplementares ao sistema remuneratório atribuídos pelos serviços e fundos autónomos aos seus dirigentes e funcionários, se traduzia «numa realidade marcada pela ausência de um modelo coerente e sistematizado e, como tal, assente em situações heterogéneas e potenciadoras de regimes profundamente diferenciados», que as lacunas e desajustamentos verificados justificavam a «definição urgente de regras claras e inequívocas de forma a garantir o respeito por critérios de legalidade, exigência e moralização que assegurem uma uniformidade de procedimentos neste universo e promovam a boa gestão financeira na utilização de fundos públicos», e invocando ainda a necessidade urgente de adopção de medidas com vista à redução da despesa pública[3], o Conselho de Ministros aprovou o Decreto-Lei nº 14/2003, cujo objecto consiste em «disciplinar a atribuição de regalias e benefícios suplementares ao sistema remuneratório, directos ou indirectos, em dinheiro ou em espécie, que acresçam à remuneração principal dos titulares de órgão de administração ou gestão e de todos os trabalhadores das entidades abrangidas por este diploma, independentemente do seu vínculo contratual ou da natureza da relação jurídica de emprego».

Nos termos do artigo 2º, os fundos e serviços autónomos que integram o âmbito de aplicação institucional do diploma correspondem às entidades que preencham cumulativamente os requisitos previstos nas alíneas a) e b) do n.º 3 do artigo 2.º da Lei 91/2001, de 20 de Agosto[4] - lei de enquadramento orçamental - incluindo as que, nos termos das suas leis orgânicas, estejam subsidiariamente submetidas ao regime das empresas públicas, em qualquer das suas modalidades. O conceito adoptado tem, pois, o sentido com que é utilizado no direito financeiro, que exclui algumas entidades da administração indirecta do Estado mas não os institutos públicos[5].

Importa conhecer, na íntegra, o conteúdo das normas mais relevantes para a presente consulta.

Dispõe o artigo 3º:
«Artigo 3.º
Sistema remuneratório
1- O sistema remuneratório dos titulares de órgãos de administração ou de gestão e restante pessoal das entidades referidas no artigo anterior é composto pela remuneração principal, respectivos suplementos, prestações sociais e subsídio de refeição, desde que previstos na lei ou em instrumentos de regulamentação colectiva do trabalho.
2- É proibida a atribuição aos titulares de órgãos de administração ou gestão e restante pessoal das entidades referidas no artigo anterior de quaisquer regalias e benefícios suplementares ao sistema remuneratório, em dinheiro ou espécie, directos ou indirectos, que acresçam às componentes remuneratórias referidas no número anterior, designadamente os seguintes:
a) Cartões de crédito para pagamento de despesas pessoais;
b) Subsídios para formação e educação;
c) Seguros dos ramos “Vida” e “Não Vida”, exceptuando os obrigatórios por lei;
d) Opção de compra de viaturas;
e) Pagamento de combustíveis;
f) Empréstimos em dinheiro;
g) Pagamento de despesas com telecomunicações que excedam os limites aprovados pelo Governo.»

Nos artigos seguintes remete-se a matéria referente a comparticipação nos encargos com telefones para regulamentação específica[6], prevê-se a responsabilidade civil, disciplinar e financeira, bem como a possibilidade de cessação do cargo, relativamente aos titulares de órgãos de administração ou gestão e demais dirigentes que atribuam benefícios ou regalias em violação do disposto no diploma e impõe-se a obrigação de reposição das quantias indevidamente pagas. Dispõe o artigo 6º, preceito particularmente em foco neste parecer:
«Artigo 6.º
Situações existentes
1- Ficam revogadas todas as disposições gerais e especiais não constantes de lei ou de instrumento de regulamentação colectiva de trabalho, bem como todos os regulamentos e actos, que contrariem o disposto no presente diploma.
2- Cessam imediata e automaticamente com a entrada em vigor do presente diploma todas as regalias e benefícios suplementares ao sistema remuneratório previstos no nº 2 do artigo 3º que já tenham sido atribuídos, com excepção dos que correspondam a direitos legitimamente adquiridos.
3- São proibidos o aumento ou a renovação das regalias e benefícios suplementares, constantes de instrumentos de regulamentação colectiva do trabalho ou de contrato escrito, que correspondam a direitos legitimamente adquiridos.
4- Presume-se não existir direito a regalias e benefícios suplementares ao sistema remuneratório quando os mesmos, devendo sê-lo, não tenham sido declarados para efeitos de tributação de rendimentos da última declaração fiscal daquele que os reivindique.»

Por fim, o artigo 7º impõe aos órgãos de direcção ou gestão o dever de comunicar aos Ministros das Finanças e da tutela os benefícios e regalias existentes, bem como aqueles que estiveram em vigor nos últimos quatro anos, com indicação dos respectivos beneficiários.

3. Na data da publicação do diploma em apreço o conselho directivo do INH havia já adoptado algumas medidas, com vista à cessação de determinadas vantagens que vinham sendo atribuídas, designadamente, quanto à utilização de cartões de crédito (fazendo cessar a sua utilização «para pagamento de qualquer tipo de despesas, sendo as despesas inerentes ao desempenho das respectivas funções desde então reembolsadas perante a apresentação do respectivo documento de despesa») e quanto à utilização dos telefones móveis disponibilizados ao pessoal dirigente, fixando determinados limites e sujeitando os telemóveis existentes nas viaturas a controlo mensal «mediante listagem discriminativa dos montantes pagos»[7].

Com a publicação do Decreto-Lei nº 14/2003 foi fixado, «em definitivo»[8], o regime a aplicar em matéria de regalias e benefícios suplementares. Sendo sobre esta última deliberação do conselho directivo do INH, baseada em parecer jurídico elaborado pelos respectivos serviços, que se suscitam as dúvidas que deram origem à presente consulta, importa transcrever o respectivo texto:

«(...)
a) Dever-se-ão considerar abrangidas pela determinação da cessação imediata as regalias e os benefícios existentes no INH que caibam na previsão do nº 2 do artigo 3º do D.L. nº 14/2003, à excepção dos que o Conselho Directivo considere constituírem direitos adquiridos dos trabalhadores e a cujo cumprimento o Instituto se considere, como tal, vinculado, sendo de cessar, em qualquer caso, as regalias e benefícios que, devendo ser declarados para efeito de tributação de rendimentos nos termos legais, o não foram. Assim:
a.1) Foram eliminados por se considerar constituírem meras liberalidades e/ou não terem carácter regular e periódico, nem, como tal, vinculativo, o prémio anual de mérito e desempenho, o subsídio complementar de doença, o subsídio de funeral e o crédito pessoal aos empregados;
a.2) São de manter para os empregados actuais e para os a contratar, por constituírem direitos adquiridos e enquanto parte integrante do ACTV[9] do sector bancário, o subsídio infantil e o subsídio de estudo, este último apenas na parte relativa aos descendentes directos dos empregados, bem como o crédito à aquisição e construção de habitação própria permanente;
a.3) São de manter para os empregados actuais, por constituírem direitos adquiridos destes, o seguro de saúde, o seguro complementar de reforma e o subsídio de estudo na parte relativa a despesas com a educação do empregado.
b) No âmbito do nº 3 do artigo 6.º do D.L. n.º 14/2003, são proibidos o alargamento do âmbito de incidência, o acréscimo ou actualização extraordinários dos valores das prestações ou dos “plafonds” máximos e alterações das condições de atribuição ou de cumprimento das regalias existentes no INH que constituam direitos adquiridos, ainda que integrados no contrato de trabalho ou previstas no ACTV do sector bancário, não ficando prejudicados, porém, os aumentos ordinários que, por serem inerentes à fruição da própria regalia são, eles próprios, de considerar no âmbito da salvaguarda do n.º 2 do artigo 6º, como no caso de actualização de prestações pecuniárias indexadas ao aumento anual da remuneração principal.»

Analisadas as deliberações e a documentação de suporte, concluiu a Inspecção-Geral de Finanças:

«a) As deliberações do Conselho Directivo do INH que fixam os limites mensais para os telemóveis distribuídos e que procederam à eliminação do prémio anual de mérito e desempenho, do subsídio complementar de doença, do subsídio de funeral e do crédito pessoal aos empregados, afiguram-se-nos adequadas, na medida em que vão de encontro ao definido na RCM nº 112/2002 e respeitam o regime instituído pelo Decreto-Lei nº 14/2003.
b) Afigura-se-nos que se deve entender que a actividade principal do INH se desenvolve mais no domínio da administração habitacional e menos no do financiamento, mas mesmo que se viesse a confirmar o contrário, não se pode alegar que o ACTV do sector bancário se aplica ao Instituto por força do disposto na parte final do nº 2 do artigo 22º dos respectivos Estatutos. Essa aplicação sempre teria de ser objecto de extensão por Portaria, o que, como se demonstrou, nunca veio a suceder.
Consequentemente, não parece defensável o reconhecimento e extensão aos trabalhadores do INH das regalias específicas do sector bancário, sendo que, actualmente, só podem ser conferidas outras regalias, na sequência de apreciação prévia da tutela e, obviamente, com as limitações decorrentes do regime instituído pelo Decreto-Lei nº 14/2003.
c) A análise de regalias ou benefícios que possam eventualmente configurar “direitos adquiridos”, nos termos e para os efeitos do supracitado Decreto-Lei, só pode ser efectuada casuisticamente e, ainda que se conclua pela existência desse direito, na sequência de apreciação pela respectiva tutela, deve ser condicionado o seu reconhecimento ao cumprimento das obrigações fiscais por parte do trabalhador que as reivindique.»

4. As questões controvertidas respeitam, pois, à manutenção das prestações, benefícios e regalias elencados nos pontos a.2) e a.3) da deliberação do órgão directivo do INH, atrás transcrita, e decorrem de entendimentos divergentes sobre a aplicabilidade do Acordo Colectivo de Trabalho Vertical (ACVT) do sector bancário às relações laborais constituídas no âmbito daquele Instituto, bem como sobre a extensão e regime dos “direitos adquiridos”.

O parecer jurídico interno em que se baseou a deliberação do conselho directivo do INH considera que o principal ramo de actividade desenvolvida por aquele Instituto tem natureza parabancária, consistindo na concessão de crédito à promoção habitacional de interesse social, inserindo-se no mesmo sector económico e no mesmo âmbito territorial do ACTV do sector bancário. Em consequência, e ainda segundo o entendimento exposto no mesmo parecer, este acordo colectivo seria aplicável ao pessoal do INH, por força do disposto no artigo 22º da respectiva lei orgânica que, por se tratar de preceito inserido em instrumento normativo com força superior à da portaria (exigida pelo artigo 29º do Decreto-Lei nº 519-C1/79, de 29 de Dezembro, diploma que regulamentava as relações colectivas de trabalho), teria consagrado a «extensão» do âmbito de aplicação daquele instrumento de regulamentação colectiva.

Por seu turno, a IGF considera que a principal actividade do INH é a da “administração habitacional” sendo a actividade desenvolvida no domínio financeiro meramente instrumental da primeira, questionando, assim, a pretendida identificação com a actividade desenvolvida pelo sector bancário; considera ainda que, de qualquer modo, o dispositivo contido no artigo 22º, nº 2, não permite, materialmente, a aplicação directa daquele ACTV e que também não foi observada a forma exigível para a sua aplicação por via administrativa.

5. A resposta à presente consulta exige a prévia caracterização do INH e a definição das actividades que desenvolve, tendo em vista a eventual identificação com o sector bancário e consequente aplicabilidade da respectiva regulamentação colectiva de trabalho, quer em função dessa eventual correspondência material, quer em razão da observância de exigências legais de forma. Caso se conclua pela inaplicabilidade daquele instrumento de regulamentação colectiva, colocar-se-ão, ainda, as questões suscitadas com eventuais direitos adquiridos pelos beneficiários das referidas atribuições.


II

1. O direito à habitação constitui um dos direitos sociais consagrados pela Constituição. Na sua dimensão positiva traduz-se no direito à obtenção de habitação condigna mas também na «exigência das medidas e prestações estaduais adequadas a realizar tal objectivo»[10].

Assim é que, estabelecendo o nº 1 do artigo 65º da Lei Fundamental o princípio de que «todos têm direito, para si e para a sua família, a uma habitação de dimensão adequada, em condições de higiene e conforto e que preserve a intimidade pessoal e a privacidade familiar», o nº 2 impõe que o Estado assegure a satisfação desse direito, através de uma política de habitação em que se destacam, entre outras incumbências, a promoção, em colaboração com as regiões autónomas e com as autarquias, da construção de habitações económicas e sociais, o incentivo à construção privada subordinada ao interesse geral, o apoio à autoconstrução e às cooperativas de habitação.

2. Um dos pilares fundamentais da execução da política de habitação foi o Fundo de Fomento de Habitação (FFH), criado pelo Decreto-Lei nº 49033, de 28 de Maio de 1969, na dependência da Secretaria de Estado do Urbanismo e Habitação, e que integrava a administração indirecta do Estado na categoria de serviço personalizado [11]. O FFH foi extinto pelo Decreto-lei nº 214/82, de 29 de Maio, por se ter considerado que se encontrava numa situação «insusceptível de reconversão para a prossecução dos objectivos da política habitacional do Estado».

3. Com vista a preencher o vazio orgânico que a extinção do Fundo de Fomento da Habitação provocou, em matéria de administração habitacional estadual[12], foi criado, pelo Decreto-Lei nº 177/84, de 25 de Maio, o Instituto Nacional de Habitação.

Na nota preambular registou-se a necessidade de «(...) criar na administração central a estrutura orgânica que realize as tarefas que, observando o princípio da descentralização, lhe continuarão a competir como instrumento da política de habitação e de apoio financeiro aos programas destinados aos estratos sociais menos solventes».

A nova estrutura criada foi configurada como instituto público, dotado de autonomia administrativa e financeira, com património próprio, cabendo-lhe, em geral, a administração habitacional e as intervenções de natureza financeira no sector de habitação da competência do Estado.

Decorrido o período de instalação, e considerando a dinâmica do sector bem como o desenvolvimento das actividades empreendidas, o Decreto-Lei nº 202-B/86, de 22 de Julho, aprovou a lei orgânica do INH, revogando o Decreto-Lei nº 177/84, mas reiterando a natureza jurídica bem como as atribuições e competências atribuídas no domínio da administração habitacional e no domínio do financiamento.

Para além de outras alterações introduzidas[13], o diploma seria revisto pelo Decreto-Lei nº 243/2002, de 5 de Novembro, que definiu e regulou a fusão do Instituto de Gestão e Alienação do Património do Estado (IGAPHE) com o INH e a consequente extinção do primeiro[14], operando a transferência para este Instituto da quase totalidade das atribuições, competências e património, bem como dos funcionários afectos aos serviços extintos, com salvaguarda dos respectivos direitos e estatuto e com a possibilidade de optarem pelo regime do contrato individual de trabalho. Esta fusão implicou o alargamento das competências do INH aos domínios da reconstrução e reabilitação do parque habitacional de interesse social, do desenvolvimento do mercado de arrendamento, em especial de habitações destinadas aos jovens e à população mais carenciada, e da intervenção no mercado de solos.

3.1. As atribuições do INH passaram a ser definidas pela seguinte forma:

«Artigo 2.º
Atribuições
São atribuições do INH assegurar a gestão e administração habitacional e as intervenções de natureza financeira no sector de habitação da competência do Estado, incumbindo-lhe em especial:
a) Preparar o Plano Nacional de Habitação e os planos anuais e plurianuais de investimento no sector;
b) Estudar a situação habitacional com vista à formulação de propostas de medidas de política, legislativas e regulamentares, apoiando o Governo na definição das políticas de arrendamento;
c) Coordenar e preparar as medidas de política financeira do sector e contribuir para o financiamento de programas habitacionais de interesse social, promovidos pelos sectores público, cooperativo e privado, através da concessão de comparticipações a fundo perdido, empréstimos e bonificação de juros;
d) Acompanhar a execução das medidas de política e os programas de promoção habitacional, de acordo com os planos e normativos aprovados, e prestar apoio técnico aos promotores antes referidos;
e) Desenvolver acções conducentes à conservação e reabilitação do património habitacional, visando o desenvolvimento do mercado do arrendamento urbano, através da sua intervenção directa ou da participação em sociedades, fundos de investimento imobiliário ou outras formas de associação;
f) Promover, directamente ou em associações com outras entidades, projectos habitacionais de interesse social dirigidos, designadamente, à população jovem;
g) Gerir programas específicos de apoio à população mais carenciada, em especial a população jovem, na obtenção de habitação no mercado de arrendamento;
h) Intervir no mercado de solos, como instrumento da política do Governo, com vista à regulação da oferta de terrenos urbanizados para a construção de habitação;
i) Conceder apoio técnico a autarquias locais e a outras instituições promotoras de habitação social no domínio da gestão e conservação do parque habitacional;
j) Gerir, conservar e alienar o parque habitacional, equipamentos e solos que constituem o seu património, no cumprimento da política definida para a habitação de interesse social.»

O artigo 3º estabeleceu o elenco de competências nos domínios da administração habitacional e apoio técnico, do financiamento e da gestão habitacional.

Quanto ao financiamento - domínio que particularmente releva no âmbito deste parecer - a esfera de competências do INH compreende, nos termos do nº 2 daquele preceito:

a) Conceder empréstimos e comparticipações destinados ao financiamento de programas de interesse social de construção, reconstrução e reabilitação de habitações;
b) Conceder bonificações de juros a pessoas colectivas e particulares e prestar garantias, quando necessário, às instituições de crédito que pratiquem operações de financiamento à construção, reconstrução e reabilitação de habitações;
c) Contrair empréstimos em moeda nacional ou estrangeira, emitir obrigações e realizar outras operações no domínio dos mercados monetário e financeiro directamente relacionadas com a sua actividade;
d) Celebrar contratos de desenvolvimento ou contratos-programa no domínio habitacional;
e) Participar em sociedades, fundos de investimento imobiliário, consórcios ou outras formas de associação que tenham como objecto a promoção habitacional, a construção, reconstrução e reabilitação habitacional ou a urbanização, ou ainda a gestão de património habitacional de interesse social;
f) Gerir programas específicos, particularmente no domínio do apoio ao arrendamento, que lhe sejam cometidos,
g) Desempenhar outras funções que lhe sejam atribuídas por lei.»

3.2. Com vista à caracterização deste organismo, afigura-se de interesse assinalar alguns aspectos referentes à estrutura orgânica, gestão financeira, regime do pessoal e estatuto dos dirigentes.

São órgãos do INH o conselho directivo, o conselho consultivo e a comissão de fiscalização; os membros do conselho directivo estão sujeitos ao Estatuto do Gestor Público[15] sendo aquele instituto, para este efeito, equiparado a uma empresa do tipo A.

Em matéria de gestão o INH dispõe de um capital inicial cujo valor se mostra fixado pelo artigo 18º. De acordo com um modelo introduzido pelo Decreto-Lei nº 305/91, de 16 de Agosto, que teve em vista o reforço da estrutura financeira, com o aumento dos recursos permanentes, foi previsto que, em representação daquele capital, o INH emitisse títulos de participação[16], nominativos, que podem ser subscritos pela Direcção-Geral do Tesouro, por instituições financeiras, públicas ou privadas, ou outras entidades autorizadas por despacho conjunto dos Ministros das Finanças e da tutela, sendo transmissíveis entre estas entidades mas devendo, em cada momento, a maioria dos títulos estar nas mãos de entidades públicas. Prevê-se ainda a possibilidade de aumento do capital inicial com emissão de novos títulos, sendo as condições de remuneração estabelecidas por despacho do Ministro das Finanças.

O INH dispõe de património e de receitas próprias; assim, para além das receitas provenientes do orçamento do Estado, dispõe, entre outras, das que resultam da cobrança de rendas, taxas e comissões por serviços prestados, do reembolso de bonificações concedidas, dos recursos obtidos pela contracção de empréstimos incluindo, desde a última alteração à lei orgânica, a emissão de obrigações hipotecárias autorizadas pelo Ministro das Finanças.

O artigo 20º - “Instrumentos de previsão e controlo” - veio, pelo nº 6, determinar a aplicação do Plano Oficial de Contabilidade Pública à contabilização das respectivas operações e, pelo nº 7, excluir os actos e contratos realizados do visto prévio do Tribunal de Contas.

Nos termos do artigo 22º, e conforme desenvolveremos adiante neste parecer, o pessoal rege-se, na generalidade, pelas normas do contrato individual de trabalho e, na especialidade, pelo disposto em regulamento interno, subsistindo um quadro transitório de pessoal abrangido pelo regime jurídico da função pública no qual estão integrados os funcionários provenientes do IGAPHE.

4. Do exposto resulta que o INH, mantendo a classificação legal e a matriz orgânica de instituto público ao qual incumbe a prossecução de tarefas atribuídas ao Estado, integrando a modalidade de serviço personalizado[17], se encontra dotado de instrumentos de gestão financeira e de um estatuto do pessoal e dos dirigentes, próprios de uma estrutura empresarial, que lhe conferem uma natureza híbrida.

Essa tendência, que se foi acentuando, manifestava-se já na redacção originária da lei orgânica e foi então objecto de apreciação em parecer deste Conselho[18], no qual se constatou que o legislador tinha recorrido ao regime jurídico das empresas públicas naquilo em que este era susceptível de «ajudar na desburocratização e na não funcionalização do trabalho e na melhoria das remunerações ao pessoal». Atendendo, além do mais, à finalidade prosseguida, que consistia em assegurar a administração habitacional e em executar a política habitacional do Estado, concluiu-se que o INH, sendo um instituto público em sentido lato entendido, fazia parte do sector público administrativo e não do sector público empresarial[19].

A evolução registada acompanha a actual tendência de «fuga de entidades públicas para o direito privado ou de mais um caso em que, mantendo o invólucro público do ente criado, o legislador submete a disciplina da sua actividade, pessoal, etc., a normas de direito privado»[20].

5. Refira-se, a este propósito, que, no que ao regime laboral concerne, a actual lei-quadro dos institutos públicos - Lei nº 3/2004, de 15 de Janeiro - permite a aplicabilidade quer do regime jurídico da função pública quer do regime do contrato individual de trabalho ao respectivo pessoal, estabelecendo, no artigo 34º - inserido no Título referente ao “regime comum”[21] - que os institutos públicos «podem adoptar o regime do contrato individual de trabalho em relação à totalidade ou a parte do pessoal, sem prejuízo de, quando tal se justificar, adoptarem o regime jurídico da função pública». Assim - contrariamente ao que se previa no projecto do diploma[22] - foi adoptada, como regra, a adopção do contrato individual de trabalho, e, sintomaticamente, a norma referente ao regime jurídico da função pública foi inserida no Título respeitante aos “regimes especiais”.


III

1. A presente consulta incide sobre aspectos atinentes ao estatuto e regalias do pessoal do INH. Sobre esta matéria dispõe o artigo 22º da sua lei orgânica:
«Artigo 22º
Estatuto
1- O pessoal do INH rege-se, na generalidade, pelas normas aplicáveis ao contrato individual de trabalho e, na especialidade, pelo disposto em regulamento interno, aprovado pelo conselho directivo e homologado por portaria conjunta dos Ministros das Finanças e das Obras Públicas, Transportes e Habitação.
2- No regulamento interno a que se refere o número anterior ter-se-ão em conta as modificações exigidas pela natureza específica do INH e das suas actividades e pelas características da composição do quadro próprio e os condicionalismos da regulamentação colectiva de trabalho do seu ramo de actividade principal.
3- O pessoal referido no n.º 2 do artigo 21º rege-se pelo regime jurídico da função pública[23].
4- Os funcionários do Estado, de institutos públicos e de autarquias locais, bem como os trabalhadores das empresas públicas, poderão ser chamados a desempenhar funções no INH em regime de requisição ou de comissão de serviço, com garantia do seu lugar de origem e dos direitos nele adquiridos.
5- Os trabalhadores do quadro do INH poderão ser chamados a desempenhar funções no Estado, em institutos públicos ou em autarquias locais, bem como em empresas públicas, em regime de requisição ou de comissão de serviço, com garantia do seu lugar de origem e dos direitos nele adquiridos.»

O reenvio da regulação das situações jurídicas laborais para regulamentos internos insere-se numa «opção legislativa tradicional» no âmbito das leis orgânicas dos institutos públicos[24].

O actual Regulamento Interno do INH foi homologado pela Portaria nº 180/97, de 12 de Março, dos Ministros das Finanças e do Equipamento, do Planeamento e do Território[25], e o seu universo de aplicação pessoal é constituído pelos trabalhadores do respectivo quadro, pelo pessoal contratado ou a contratar, bem como por aquele que desempenha ou venha a desempenhar funções em regime de requisição ou de comissão de serviço (sem prejuízo do disposto no nº 3 do artigo 22º relativamente aos funcionários sujeitos ao regime jurídico da função pública).

A respectiva normação incide sobre diversos domínios, tais como, categorias e funções, regimes de requisição ou comissão de serviço, exercício de cargos de direcção e chefia, admissão e evolução profissional, celebração de contratos de tarefa e prestação de serviços, duração do trabalho, competências regulamentar e disciplinar. Em matéria de doença, abono de família e segurança social, em geral, prevê-se a aplicação «ao seu pessoal» do regime dos trabalhadores subordinados ao contrato individual de trabalho; já quanto a acidentes de serviço se prevê a celebração de contrato de seguro que abranja «a totalidade do pessoal». Por outro lado, o artigo 5º, nº 4, sobre “Cargos dirigentes”, prevê que o empregado que exerça funções de direcção ou de chefia receberá «um suplemento à sua remuneração, a definir em ordem interna ouvida a tutela sectorial».

Particular destaque merece o artigo 15º[26], que dispõe:
«Artigo 15º
Regalias sociais
Poderão vir a ser conferidas ao pessoal do INH, por deliberação do conselho directivo, quaisquer outras regalias sociais, permanentes ou temporárias, para além das previstas no presente Regulamento, após apreciação prévia da tutela.»

2. As prestações, benefícios e regalias que estão em causa no presente parecer foram atribuídos ao pessoal do INH por deliberação do conselho directivo, ora com despacho concordante, ora sem qualquer intervenção da tutela.

Os elementos fornecidos por informação interna junta permitem sintetizar, pela seguinte forma, as respectivas decisões ou deliberações e seus fundamentos, bem como as condições e regime de cada uma das atribuições:

2.1. Crédito à aquisição ou construção de habitação própria:

Aprovado pelo Secretário de Estado da Habitação por despacho exarado sobre proposta fundamentada na «intenção do Instituto seguir de perto as disposições aplicadas no sector bancário em matéria de pessoal», proposta que havia obtido a concordância do conselho directivo através de deliberação de 28 de Dezembro de 1989. A decisão proferida pelo membro do Governo tinha o seguinte teor: «Concordo. Aplique-se o regime de crédito vigente nas instituições de crédito para os respectivos funcionários.»
São as seguintes as “características básicas” deste regime de crédito[27] [28]:
« - Têm acesso os trabalhadores do INH contratados em regime de contrato de trabalho sem termo;
- (...) até 2 de Julho de 2002, os empréstimos destinavam-se a financiar a aquisição, construção ou realização de obras em habitação própria, destinando-se, agora, a habitação própria e permanente;
- A taxa de juro praticada é de 65% da anteriormente designada “taxa básica do Banco de Portugal”, actualmente a taxa de referência definida no nº 2 do artigo 10º do Decreto-Lei nº 138/98, de 16 de Maio;
- Cada empregado está sujeito a um limite máximo de financiamento anualmente actualizado em função da actualização praticada na regulamentação colectiva de trabalho do sector bancário, bem como a um limite de endividamento aferido em função do rendimento anual bruto do respectivo agregado familiar;
- Nenhum empregado pode ter em curso mais de um empréstimo destinado à aquisição e construção de habitação».

2.2. Seguro de saúde:

Instituído por deliberação do conselho directivo divulgada pela circular nº 035/88, de 1 de Setembro de 1988. Consiste num sistema de assistência à saúde através de um seguro de grupo de que beneficiam os trabalhadores, seus cônjuges e filhos, que visa suportar despesas com assistência médica e medicamentosa complementar à que é prestada pela segurança social. O prémio de seguro é suportado pelo INH e pelos trabalhadores abrangidos, inicialmente, e até 27 de Maio de 1993, em proporções iguais e, a partir desta última data, na proporção de 75% pelo primeiro e de 25% pelos segundos.

2.3. Seguro de complemento-reforma:

Instituído por deliberação do conselho directivo, divulgada pela ordem de serviço nº 20/92, de 29 de Outubro, e “regulamentada” por deliberação do mesmo órgão, de 7 de Maio de 1998. Trata-se de um seguro de grupo que tem como beneficiários os trabalhadores do INH e que visa complementar a pensão de reforma a atribuir pela segurança social; o prémio de seguro é suportado, na íntegra, pelo empregador.

São as seguintes as suas “condições essenciais”:
«a) São abrangidos todos os empregados do INH;
b) A regalia é devida ao trabalhador que, à data da entrada em situação de reforma, se encontre a exercer funções no Instituto e cujo início de funções tenha tido lugar há mais de dez anos;
c) O benefício é atribuído sob a forma de prestação mensal e corresponde a 15% do “salário pensionável”, calculado com ou sem determinados subsídios ou abonos conforme estes fossem ou não auferidos há mais de dez anos.»

2.4. Subsídio infantil e subsídio de estudo:

Instituídos por deliberação do conselho directivo do INH, de 24 de Outubro de 1991, com base nas correspondentes cláusulas do ACTV do sector bancário, mas com alguns aspectos diferenciadores, designadamente no que respeita ao subsídio de estudo de que é beneficiário o próprio trabalhador.

Trata-se, em ambos os casos, de prestações pecuniárias, pagas mensalmente, destinando-se o subsídio infantil a fazer face a despesas com alimentação, educação e ocupação dos filhos dos trabalhadores menores de seis anos, e o subsídio de estudo a fazer face a despesas com a educação escolar do trabalhador e/ou dos seus descendentes directos.

São as seguintes as “condições básicas comuns” destes subsídios:
«a) Têm acesso automático os trabalhadores do INH que estudem ou tenham filhos nas idades elegíveis ou a estudar, conforme for o caso;
b) Os benefícios são atribuídos sob a forma de prestações pecuniárias mensais de valor fixo, em número de doze e pagas conjuntamente com o vencimento dos trabalhadores;
c) Os valores das prestações são actualizadas anualmente de acordo com a percentagem de aumento da remuneração de base.»


De referir que no ACTV do sector bancário se dispõe, expressamente, que estes subsídios não são considerados como retribuição, para os efeitos nele previstos, e que o subsídio de estudo não abrange o próprio trabalhador mas apenas os filhos com direito a abono de família e que frequentem o ensino “oficial ou oficializado”.

IV

1. A primeira questão que se coloca com vista à apreciação do fundamento material destas atribuições prende-se com a caracterização da actividade desenvolvida pelo INH em ordem a estabelecer uma eventual correspondência com a actividade bancária.

Conforme referimos, as competências atribuídas ao INH repartem-se em três domínios: administração habitacional e apoio técnico, financiamento e gestão habitacional.

A actividade bancária tem, tradicionalmente, por essência a realização de operações consistentes na recepção de depósitos e na concessão de créditos[29].

O Regime Geral das Instituições de Crédito e Instituições Financeiras (RGIC), aprovado pelo Decreto-Lei nº 298/92, de 31 de Dezembro[30], define como instituições de crédito «as empresas cuja actividade consiste em receber do público depósitos ou outros fundos reembolsáveis, a fim de os aplicarem por conta própria mediante a concessão de crédito». O artigo 3º contém o elenco das instituições de crédito[31].

Conforme evidenciam ANTÓNIO CARLOS DOS SANTOS, MARIA EDUARDA GONÇALVES e MARIA MANUEL MARQUES[32], a lei portuguesa optou pela aplicação cumulativa dos critérios de recepção de depósitos ou outros fundos e da concessão de crédito. Referem os mesmos Autores que este diploma consagrou o modelo do banco universal, caracterizado por «poder exercer na generalidade, a título profissional, todas as operações que, por lei, se integram na noção de actividade financeira, embora algumas delas possam ser excluídas estatutariamente».

Entre as diversas operações que os bancos estão autorizados a efectuar, de acordo com o elenco constante do artigo 4º, incluem-se, para além das “clássicas operações creditícias passivas e activas” - recepção de depósitos e de outros fundos reembolsáveis e concessão de crédito, incluindo a concessão de garantias, as operações de leasing, de factoring e de emissão de cartões de crédito - outras operações, situadas no domínio cambial, na intermediação de valores mobiliários, na prestação de serviços ou noutras operações conexas ou acessórias das restantes[33].

As sociedades financeiras são definidas pelo artigo 5º do RGIC como «empresas que não sejam instituições de crédito e cuja actividade principal consista em exercer uma ou mais das actividades referidas nas alíneas b) a i)[34] do nº 1 do artigo anterior, excepto locação financeira e factoring

Ainda segundo os Autores citados[35], as sociedades financeiras são «empresas do tipo societário que, não sendo instituições de crédito e portanto não podendo receber depósitos ou outros fundos reembolsáveis, têm por principal actividade exercer, a título profissional, alguma ou algumas das actividades financeiras e creditícias possibilitadas às instituições de crédito, especificamente, aquelas que são previstas pelos diplomas que regem, em concreto, cada uma destas empresas», frisando que a esfera das actividades possibilitadas a estas sociedades é «bem mais restrita do que a das instituições de crédito», estando cada sociedade financeira vinculada a um «acentuado princípio de especialização».

O artigo 6º do RGIC, que tipifica as instituições qualificadas como sociedades financeiras, não incluiu nesse elenco taxativo determinadas instituições financeiras que aqueles Autores qualificam como “periféricas ou na fronteira do sistema”: as seguradoras, as sociedades gestoras de fundos de pensões, as sociedades gestoras de participações sociais (SGPS), as sociedades mediadoras de empréstimos com garantia hipotecária e «certas instituições financeiras não societárias, como o IAPMEI, o INGA, o INH e o IFADAP»[36].

Também ANTÓNIO DE JESUS PEDRO[37], em anotação ao mesmo dispositivo, alude à exclusão de algumas instituições que desenvolvem funções financeiras, entre elas o INH. E refere:

«A qualificação destas entidades no âmbito do sistema financeiro já era questão controversa face à legislação anterior à Lei-Quadro.
Dadas as funções que lhes estavam cometidas, chegou-se a propor a sua qualificação como instituições especiais de crédito, como instituições financeiras especializadas e mesmo como instituições parabancárias. Esta última tese baseava-se na letra do artigo 1º do revogado DL nº 46302[38], e na sua natureza não taxativa; efectivamente, segundo este preceito eram “(...) instituições parabancárias as que, não compreendidas na enumeração dos artigos 3º e 4º do Decreto-
-Lei nº 41403, de 27 de Novembro de 1957, exerçam alguma função de crédito ou qualquer actividade que possa afectar de forma especial o funcionamento do mercado monetário ou do financeiro, tais como: (...)”.

Face à enumeração taxativa a que se procede no art. 6º da Lei--Quadro, porém, não parece que esta tese seja agora defensável. Assim, as entidades em causa só deverão ser qualificadas como sociedades financeiras na medida em que, concretizando a previsão da alínea l) daquele artigo, os diplomas legais reguladores da sua actividade venham a ser alterados no sentido de as qualificar expressamente como tal.»

De tudo resulta que o INH não se insere na tipologia das sociedades financeiras e que a actividade de financiamento que desenvolve não se caracteriza como actividade bancária ou parabancária.

2. Tal actividade insere-se na prossecução das atribuições que lhe são cometidas e que têm em vista a realização de um fim de interesse público a que é alheio o escopo lucrativo característico da actividade bancária; trata-se de conceder comparticipações a fundo perdido, empréstimos, bonificações de juros, prestar garantias, relativamente a programas habitacionais de interesse social, bem como celebrar contratos de desenvolvimento e contratos-programas, contrair empréstimos, participar em sociedades, gerir programas, etc., sempre com vista a apoiar e dinamizar programas de interesse público ou social no domínio da habitação.

Acresce que a actividade de financiamento, no quadro da promoção do direito à habitação, não esgota a actividade daquele Instituto nem é seguro que seja a sua actividade principal; de facto, para além daquelas competências, cabe-lhe também, no domínio da administração habitacional, o estudo, a programação e a avaliação necessários à prossecução da política de habitação, bem como a dinamização e acompanhamento de programas e projectos de interesse social, ou ainda um importante papel no apoio técnico, na formação, ou na prestação de informação aos promotores. Com a extinção do IGAPHE, o INH passou a deter competências acrescidas, nos domínios de intervenção no mercado de solos (com vista à realização de programas de urbanização para construção de habitação), na gestão, conservação e alienação do parque habitacional do Estado, no desenvolvimento do mercado de arrendamento (visando, em especial, as camadas mais jovens e mais desfavorecidas da população).

Conforme se referiu em anterior parecer deste Conselho, já citado[39], «o INH foi concebido e vocacionado para dar satisfação ao dever do Estado de bem gerir, em nome do interesse colectivo, a delicada área da política habitacional - por natureza avessa ao fim lucrativo dos bens ou serviços prestados - desse modo programando e dando execução ao que por imperativo constitucional (...) ao Estado pertence».

A natureza das atribuições prosseguidas e o escopo social que lhes preside, bem como a materialidade das actividades em que se desdobra a sua prossecução, não permitem estabelecer correspondência com o exercício da actividade bancária nem permitem identificar os respectivos sectores económicos. A concessão de crédito pelo INH constitui um dos instrumentos de intervenção no sector de habitação, mas não a finalidade que prossegue, mostrando-se insuficiente para com base nela se estabelecer a necessária identificação com aquele sector.

3. É certo que o legislador aludiu, no artigo 22º da lei orgânica, aos «condicionalismos da regulamentação colectiva de trabalho do ramo de actividade principal» - sem a identificar - como um dos referentes a ter em conta na previsão, na especialidade, do regime do pessoal. Não nos repugna aceitar que o legislador tivesse em mente a actividade financeira e os instrumentos de regulamentação colectiva de trabalho aplicáveis no sector bancário.

De facto, a origem daquele preceito remonta à redacção originária da lei orgânica, aprovada pelo Decreto-Lei nº 202-A/86; nessa ocasião, eram apenas dois os domínios de intervenção do INH (administração habitacional e financiamento, não estando ainda atribuídas as competências em matéria de gestão habitacional), assumindo o financiamento um relevo justificado pela situação de grande carência que se fazia sentir em matéria de habitação. Em alterações subsequentes foi, aliás, reforçada a vertente financeira, conforme se pode constatar pela leitura do preâmbulo do Decreto-Lei nº 305/91, de 16 de Agosto, que introduziu um novo modelo de gestão financeira, bem como pela alteração introduzida pelo Decreto-Lei nº 460/88, na parte em que determinou a aplicação à contabilização das respectivas operações do Plano Oficial de Contabilidade vigente no sector bancário (com as necessárias adaptações). Nessa ocasião, recorde-se, o INH era susceptível de ser caracterizado como instituição parabancária, nos termos do artigo 1º, do Decreto nº 46302, de 27 de Abril de 1965.

Este quadro viria porém a alterar-se. Não só com a aprovação do RGIC o INH foi excluído do elenco das instituições que podiam realizar operações bancárias, como as suas novas atribuições em outros domínios atenuaram o peso e a proeminência das competências em matéria de financiamento; sintomática desta evolução é a alteração do preceito que mandava aplicar o Plano Oficial de Contabilidade do sector bancário, passando a aplicar-se, em sua substituição, o Plano Oficial de Contabilidade Pública.

4. A aplicabilidade dos instrumentos de regulamentação colectiva de trabalho do sector bancário ao pessoal do INH suscita, para além da identidade de sectores de intervenção económica, e da correspondência material de actividades, outras questões que se prendem com a adequação dos instrumentos normativos utilizados e com a observância de formalismos estabelecidos pela lei.

Recordemos que, nos termos do artigo 22º da lei orgânica do INH, o pessoal deste Instituto se rege, na generalidade, pelo regime do contrato individual de trabalho, remetendo-se para regulamento interno aprovado pelo conselho directivo e homologado por portaria conjunta dos Ministros das Finanças e das Obras Públicas, Transportes e Comunicações, a previsão de aspectos específicos do regime do pessoal, no qual se tomarão em conta «as modificações exigidas pela natureza específica do INH e das suas actividades e pelas características da composição do quadro próprio e os condicionalismos da regulamentação colectiva de trabalho do seu ramo de actividade principal».

Mesmo que se aceite que o legislador credenciou a aplicabilidade de cláusulas da convenção colectiva de trabalho para o sector bancário, seria necessário que o regulamento aprovado ao abrigo dessa credencial concretizasse, no seu clausulado, os aspectos e a forma da sua aplicação específica ao pessoal do INH, ou seja, que previsse expressamente as modificações ao regime geral decorrentes dos referidos condicionalismos daquele instrumento de regulamentação colectiva.

Ora, nem o anterior Regulamento Interno, homologado pela Portaria nº 57/87, nem o actual, homologado pela Portaria nº 180/97, contêm estipulações ou consagram expressamente direitos ou regalias dos trabalhadores tendo por fonte aquela convenção colectiva de trabalho, limitando-se a remeter para deliberação do conselho directivo a atribuição de prestações e de regalias sociais suplementares, sem qualquer alusão àquela ou a outra fonte.

Vejamos, então, quais as exigências legais em matéria de aplicação por via administrativa dos instrumentos de regulamentação colectiva de trabalho e quais as consequências da referida omissão.

V

1. O direito à contratação colectiva é reconhecido pela Constituição no capítulo referente a “Direitos, liberdades e garantias dos trabalhadores” (artigo 56º), sob reserva de lei. Sendo um direito de que são titulares os trabalhadores é exercido pelas associações sindicais, permitindo-lhes «regularem colectivamente as relações de trabalho, substituindo o poder contratual do trabalhador individual pelo poder colectivo organizado no sindicato»[40].

O direito à contratação colectiva abrange todos os trabalhadores incluindo os trabalhadores da Administração Pública[41].

O Decreto-Lei nº 519-C1/79, de 29 de Dezembro, diploma que até à entrada em vigor do Código do Trabalho[42] regulamentava as relações colectivas de trabalho, previa a possibilidade de o âmbito de aplicação definido nas convenções colectivas ser estendido a outras entidades e trabalhadores, por acordo de adesão ou por portaria de extensão emitida pelo Ministro do Emprego e da Segurança Social (conjuntamente, pelo ministro responsável do respectivo sector de actividade no caso de ter sido deduzida oposição pelos interessados); a extensão poderia abranger outras entidades patronais do mesmo sector e trabalhadores da mesma profissão ou de profissão análoga, exercendo actividade na mesma área e âmbito e não filiados nas respectivas associações, ou empresas e trabalhadores do sector económico e profissional regulado que exercessem actividade em área diversa daquela em que a convenção se aplicava, quando não existissem associações sindicais ou patronais e se verificasse identidade ou semelhança económica e social.

Contudo, de início, estavam excluídos do universo de aplicação deste diploma os funcionários e agentes do Estado, autarquias locais e serviços municipalizados, bem como os institutos públicos, relativamente aos quais se previa a edição de lei especial.

O Decreto-Lei nº 45-A/84, de 3 de Fevereiro, veio regular o “direito à negociação” no âmbito da Administração Pública em moldes que ficavam muito aquém da dimensão material que assumia no campo das relações colectivas de direito privado[43]. Este diploma foi revogado pela Lei nº 23/98, de 26 de Maio, que regula o exercício dos direitos de negociação colectiva e de participação dos trabalhadores da Administração Pública em regime de direito público, e que, relativamente aos trabalhadores da Administração Pública em regime de direito privado, determina expressamente a aplicação da legislação geral sobre regulamentação colectiva das relações de trabalho (ao tempo, o Decreto-Lei nº 519-C1/79; actualmente, o Código do Trabalho).

O Código do Trabalho, aprovado pela Lei nº 99/2003, de 27 de Agosto (que abrange no seu universo pessoal de aplicação os trabalhadores de pessoas colectivas públicas que não tenham a qualidade de funcionários ou agentes da Administração Pública «nos termos previstos em legislação especial»), contempla, no artigo 575º, a admissibilidade de emissão de regulamentos de extensão em condições similares às que eram estabelecidas no Decreto-Lei nº 519-
-C1/79, exigindo, ainda, que estejam em causa circunstâncias sociais e económicas que a justifiquem.

Por fim, a Lei nº 23/2004, de 22 de Junho, que consagra o regime jurídico dos contratos individuais de trabalho celebrados por pessoas colectivas públicas, contém a regulamentação especial do processo de negociação das convenções colectivas em que intervenham pessoas colectivas públicas [44] e atribui aos Ministros das Finanças e ao ministro responsável pela área laboral a competência conjunta para a emissão de regulamentos de extensão para tais entidades.

2. Constata-se assim que, à semelhança do regime estabelecido pelo Decreto-Lei nº 519-C1/79, também o actual regime legal permite, em determinado circunstancialismo, a extensão por via administrativa de uma convenção colectiva a outras entidades e trabalhadores do respectivo sector económico e profissional.

Através do mecanismo de extensão é alargado o âmbito originário da eficácia normativa das convenções colectivas, como forma de prossecução do princípio da igualdade e do interesse económico de uniformização das condições de trabalho no interior das empresas[45]. Como se evidenciou em anterior parecer deste Conselho[46], a portaria de extensão tem uma «função normalizadora do mercado», atribuindo ao contrato colectivo a mais ampla eficácia, generalizando, através de um acto normativo, o seu âmbito de aplicação.

Por outro lado, a lei - quer a anterior quer a actual - impõe exigências de forma para a via administrativa da regulamentação das relações colectivas de trabalho, exigindo a emissão de um instrumento normativo por um ou mais membros do Governo, bem como a observância de determinadas formalidades.

Atendendo aos condicionalismos de ordem material e de ordem formal a que obedece o mecanismo de extensão não se afigura que a simples menção contida no artigo 22º da lei orgânica do INH aos «condicionalismos da regulamentação colectiva de trabalho do seu ramo de actividade principal» como factor a ter em conta na elaboração do regulamento interno, corporize, por si só e validamente, o alargamento da aplicação subjectiva de determinada convenção colectiva. Não obstante a superioridade hierárquica daquele diploma legislativo, a não identificação do instrumento de regulamentação colectiva cuja aplicação se pretenderia alargar e do respectivo sector económico e profissional, bem como a falta de correspondência mínima no texto da norma de eventual vontade do legislador nesse sentido, não permitem que através dele se opere o mecanismo de extensão.

Vejamos, porém, se na falta desse instrumento normativo, a mesma finalidade terá sido validamente prosseguida através da emissão do regulamento interno homologado pelo Ministro das Finanças e da tutela.

3. Analisemos, pois, o Regulamento Interno para o qual aquela norma legal remeteu a previsão, na especialidade, do estatuto do pessoal do INH.

Trata-se de um conjunto de normas emitidas pela direcção de um instituto público, que disciplinam as relações jurídico-laborais estabelecidas com os seus trabalhadores. Estamos perante um regulamento de âmbito institucional, em matéria laboral, que, apesar de classificado como regulamento interno, possui, segundo diversos Autores, eficácia externa[47] [48].

Apesar de ter sido homologado pelo Ministro das Finanças (e das Obras Públicas, Transportes e Comunicações) e de, através desse acto, se ter realizado uma “função de apropriação”[49], o regulamento não contém qualquer menção à referida convenção colectiva de trabalho nem consagra expressamente quaisquer prestações, benefícios ou regalias nela contemplados, remetendo essa matéria para deliberação do conselho directivo.

O procedimento adoptado não permite considerar que as respectivas deliberações tenham por fonte juridicamente válida um instrumento de regulamentação colectiva de trabalho. Se algumas das prestações ou regalias que vieram a ser estabelecidas, nos termos atrás descritos, correspondem ao que estava previsto no ACTV do sector bancário, apenas se pode considerar que se trata de uma fonte ou referência factual.

4. Estas prestações, benefícios e regalias, por não se encontrarem previstos na lei nem em instrumento de regulamentação colectiva de trabalho, nem mesmo em regulamento credenciado pela lei e a ela conforme, estão abrangidos pela previsão normativa do artigo 6º, nº 1, do Decreto-Lei nº 14/2003, que determina a revogação dos actos que os instituíram.

Não é, pois, de sufragar a possibilidade de serem atribuídos ao pessoal a admitir.

Vejamos então se, e em que medida, poderão ser atribuídos ou mantidos relativamente ao pessoal já admitido.

VI

1. A relação jurídico-laboral assenta num sinalagma, sendo que à prestação da actividade pelo trabalhador ou à disponibilidade da sua força de trabalho corresponde a obrigação do empregador lhe prestar uma retribuição. O estatuto do trabalhador e a tutela retributiva assumem particular acuidade no regime do contrato de trabalho, constituindo a retribuição um elemento essencial do contrato.

O direito à retribuição está consagrado no artigo 59º, nº 1, alínea a), da Constituição, no elenco dos direitos dos trabalhadores; a norma constitucional define, desde logo, alguns princípios a que deve obedecer a retribuição: a correspondência com a quantidade, natureza e qualidade do trabalho prestado, a observância da igualdade e equidade expressa no princípio “para trabalho igual salário igual”[50] e a garantia de uma existência condigna.

Com base no conceito acolhido pelo artigo 82º do Decreto-Lei nº 49408, de 24 de Novembro de 1969[51], que aprovou o regime jurídico do contrato individual de trabalho (LCT), MONTEIRO FERNANDES[52] definia retribuição como «conjunto de valores (pecuniários ou não) que a entidade patronal está obrigada a pagar regular e periodicamente ao trabalhador em razão da actividade por ele desempenhada (ou, mais rigorosamente, da disponibilidade da força de trabalho por ele oferecida)».

Com poucas modificações, o Código do Trabalho dispõe, no artigo 249º, nº 1, que «Só se considera retribuição aquilo a que, nos termos do contrato, das normas que o regem ou dos usos, o trabalhador tem direito como contrapartida do seu trabalho». O nº 2 inclui na contrapartida do trabalho «a retribuição-base e todas as prestações regulares e periódicas feitas, directa ou indirectamente, em dinheiro ou em espécie».

À semelhança do nº 3 do artigo 82º da LCT, também o nº 3 do artigo 249º do Código do Trabalho estabelece que, até prova em contrário, se presume que constitui retribuição «toda e qualquer prestação do empregador ao trabalhador».

O conceito de retribuição decompõe-se, pois, nos seguintes elementos essenciais[53]:
- a natureza de prestação patrimonial;
- o carácter de regularidade e periodicidade;
- a correspectividade entre a obrigação da entidade empregadora e a prestação de trabalho pelo trabalhador (embora nem sempre se exija a prestação efectiva do trabalho, evidenciando-se com frequência a disponibilidade do trabalhador).
Na caracterização da retribuição a doutrina assinala a não arbitrariedade, que sugere a constância, a continuidade da prestação de trabalho - que, por seu turno, invocam a necessária previsibilidade de rendimentos pelo trabalhador -, a exclusão da mera liberalidade que contrapõe ao animus donandi a obrigatoriedade da realização da prestação pelo empregador, a correspectividade com a prestação de trabalho já que assenta numa relação sinalagmática. Quanto à correspectividade esclarece MONTEIRO FERNANDES que é necessário que se encontre outra “causa específica e individualizável”, que não a disponibilidade do trabalhador, para que a prestação do empregador seja “colocada à margem do salário global”.

De tudo resulta que à retribuição preside uma ideia de normalidade, compreendendo os valores com que o trabalhador pode contar como contrapartida da sua actividade, ficando excluídas do conceito quaisquer prestações efectuadas a título de liberalidade, recompensa ou mera compensação de despesas efectuadas[54], ou de «atribuições anormais com as quais o trabalhador não pode contar e que não constituem contrapartida da prestação do trabalho contratualmente prometida»[55].

2. No conceito de retribuição o legislador inclui, para além da retribuição-base e diuturnidades, os subsídios de férias e de Natal; outros suplementos, designadamente, os que são atribuídos face a condições específicas em que o trabalho é prestado, integrarão esse conceito se as respectivas prestações tiverem natureza regular e periódica.

Também a jurisprudência tem evidenciado que as prestações complementares integram o conceito de retribuição quando, tendo carácter regular e periódico, criam no espírito do trabalhador a convicção de que constituem complemento normal do salário.

MENEZES CORDEIRO[56] distribui os elementos que integram a remuneração pelas seguintes categorias: retribuição-base («valor mínimo implicado pela categoria-estatuto equivalente à categoria-função que compita ao trabalhador») e seus complementos regulares (diuturnidades e progressões salariais); subsídios anuais (de férias e de Natal); pagamento de despesas[57] (se forem devidas por força do contrato de trabalho); retribuição por maior trabalho (incluindo, trabalho suplementar, nocturno, por turnos, etc.); outros complementos não regulares; outras prestações a cargo do empregador. Quanto aos dois últimos elementos refere o Autor que, no primeiro se incluem as «iniciativas remuneratórias directas tomadas pelo empregador ou por ele devidas, sem qualquer ligação a despesas feitas pelo trabalhador ou a maiores esforços que lhe sejam exigidos», incluindo aqui certos subsídios e vantagens de tipo familiar que, sendo regulares, devem ser reconduzidos a componentes da remuneração. No segundo e último caso incluem-se as vantagens do trabalhador que correspondam a deveres acessórios do empregador e que se integram no “dever de assistência”.

3. Paralelamente, o sistema retributivo da função pública compreende, nos termos do artigo 13º do Decreto-Lei nº 184/89, de 2 de Junho[58], o «conjunto formado por todos os elementos de natureza pecuniária ou outra que são ou podem ser percebidos, periodica ou ocasionalmente, pelos funcionários e agentes por motivos da prestação de trabalho». Nos termos do artigo 15º, são componentes do sistema retributivo: a remuneração-base; as prestações sociais e o subsídio de refeição; os suplementos.

As prestações sociais[59] são constituídas pelo abono de família e prestações complementares[60], subsídio de refeição e prestações de natureza social atribuídas no âmbito da acção social complementar[61]. Os suplementos são atribuídos em função de particularidades específicas da prestação de trabalho de acordo com um elenco taxativo.

PAULO VEIGA E MOURA[62] inclui as prestações sociais como segunda componente do sistema retributivo da função pública enquanto “decorrência” do direito à segurança social consagrado na Constituição. Embora constituam «abonos que espelham a solidariedade social devida ao acréscimo de encargos suportados pelo agregado familiar do funcionário ou agente com a satisfação de algumas necessidades básicas», refere o Autor que os mesmos funcionam também como «medidas de prevenção e protecção de algumas necessidades decorrentes da relação jurídica de emprego com a Administração Pública», ou seja, «resultam directamente da existência de uma relação de emprego com a Administração Pública, sem embargo de não pressuporem uma efectiva prestação de serviço nem constituírem contrapartida da mesma».

Segundo JOÃO ALFAIA[63] a expressão vencimentos (em sentido lato) era utilizada como «sinónimo das importâncias monetárias que o funcionário ou agente aufere ou recebe como titular da relação jurídica de emprego público e que, em maior ou menor medida, constituem contrapartida da prestação de serviço» e incluía entre os proventos auferidos os que eram recebidos a título de ajuda social - “subsídios sociais”. Quanto a estes, considerava que constituíam contrapartida da Administração Pública na satisfação de necessidades básicas do funcionário ou agente e, em certos casos, dos respectivos familiares e referia que «(...) embora consistindo fundamentalmente numa ajuda social, não deixam em alguma medida de constituir contrapartida de tal serviço e ónus respectivos, uma vez que se integram no objecto da relação jurídica de emprego público»[64].

4. A caracterização das diversas componentes remuneratórias releva para efeitos da sua sujeição ao princípio da irredutibilidade.

De facto, entre as garantias do trabalhador, estabelecida pelo artigo 21º, da LCT, e mantida pelo artigo 122º do Código do Trabalho, inclui-se a “irredutibilidade da retribuição”, que se traduz na proibição do empregador diminuir unilateralmente a retribuição, salvo nos casos expressamente previstos na lei (actualmente, no Código do Trabalho) ou nos instrumentos de regulamentação colectiva de trabalho[65].

MONTEIRO FERNANDES[66] refere que este princípio respeita ao «conjunto de valores que compõem o salário global, isto é a contrapartida do trabalho efectuado ao longo do ano», implicando que se analise a sua composição, distinguindo as parcelas de retribuição das atribuições patrimoniais de outra natureza. O mesmo Autor evidencia a relevância da caracterização das diversas parcelas, considerando o seu “perfil funcional”, já que uma atribuição patrimonial pode qualificar-se como elemento da retribuição, nos termos legalmente definidos e, no entanto, «merecer o reconhecimento de uma pendularidade diferente da que caracteriza os restantes elementos, nomeadamente a chamada retribuição base», entre outros efeitos, para o de aplicação do princípio da irredutibilidade.
MARIO PINTO, FURTADO MARTINS E NUNES DE CARVALHO[67] consideram que o princípio da irredutibilidade respeita ao salário na sua globalidade, visando proibir o “equilíbrio” entre a prestação de trabalho e a atribuição patronal que lhe serve de contrapartida, em sentido menos favorável ao trabalhador; evidenciam, contudo, que determinadas atribuições patrimoniais - que estão para além do núcleo central - e que correspondem a formas específicas de prestação do trabalho podem ser retiradas face à supressão dessas causas específicas.

Também o Supremo Tribunal de Justiça tem afirmado que o princípio da irredutibilidade da retribuição não incide sobre a globalidade da retribuição mas apenas sobre a retribuição estrita, ficando afastadas as parcelas correspondentes a maior esforço ou penosidade do trabalho, a situações de desempenho específicas ou a maior trabalho, as quais podem ser suprimidas quando deixar de subsistir a situação que lhes serve de fundamento[68].

Em anteriores pareceres emitidos em matérias relacionadas com o sistema remuneratório do funcionalismo público, este Conselho[69] considerou que apenas o núcleo mais restrito da retribuição auferida pelo funcionário está garantida pelo princípio da irredutibilidade e que as reduções que abranjam prestações complementares ou acessórias não constituem ofensas inadmissíveis, arbitrárias ou demasiado onerosas das expectativas dos seus titulares. Refira-se, contudo, que esta tese não mereceu acolhimento do Tribunal Constitucional[70].

E, mais concretamente, no parecer nº 5/93, de 14 de Julho de 1993[71], concluiu-se que certos benefícios sociais que vinham sendo concedidos aos funcionários do Centro de Identificação Civil e Criminal por despacho do respectivo director, consistindo no pagamento de passe social e na comparticipação em despesas médicas, assumiam, não obstante o tempo de duração, natureza precária ou transitória, «não constituindo os princípios dos “direitos adquiridos”, da “confiança “ e da “igualdade” obstáculo à declaração unilateral da sua cessação».

VII

1. Os elementos expostos permitem-nos caracterizar as prestações, benefícios e regalias que estão em causa no presente parecer, ou seja, o subsídio infantil e o subsídio de estudo (este último, quer na modalidade destinada aos descendentes do trabalhador, quer destinado ao próprio trabalhador), o crédito à habitação, os seguros de saúde e de complemento-reforma.

Cumpre distinguir, em primeiro lugar, as prestações que podem integrar o sistema remuneratório, nos termos do artigo 3º, nº 1, do Decreto-Lei nº 14/2003, dos benefícios e regalias que lhe são suplementares, aos quais se refere o nº 2 da mesma disposição.

De facto, uma leitura atenta do Decreto-Lei nº 14/2003 revela que o escopo prosseguido pelo legislador se concretiza na proibição das vantagens do segundo tipo e consequente cessação no caso de já se encontrarem atribuídas, com ressalva apenas dos direitos adquiridos.

Por outro lado, é patente que o legislador adoptou a fórmula utilizada no diploma que contém as bases do sistema remuneratório da função pública para descrever as componentes que integram a remuneração dos dirigentes e do restante pessoal das entidades a que se aplica: remuneração-base, respectivos suplementos, prestações sociais, subsídio de refeição, exigindo que estejam previstas na lei ou em instrumentos de regulamentação colectiva de trabalho.

2. Revertendo às situações que nos ocupam, verificamos que o subsídio infantil e o subsídio de estudo (este na modalidade destinada aos filhos do beneficiário) visam compensar o acréscimo de despesas do agregado familiar quando existam filhos menores de seis anos ou a estudar, traduzindo-se em prestações que acrescem às que são atribuídas pelo regime assistencial geral, na eventualidade “encargos familiares”[72].

Os subsídios para filhos menores assumem natureza de prestação social.

Contudo, conforme já constatámos, estes subsídios não foram atribuídos por lei nem por convenção colectiva aplicável, nem mesmo pelo regulamento interno legalmente habilitado e sujeito a homologação, mas apenas por deliberação do conselho directivo do INH. Embora, enquanto prestações sociais, não estejam sujeitas a uma regra de proibição absoluta, a inobservância das exigências quanto à forma de criação, insere-as no campo de aplicação da norma revogatória contida no nº 1 do artigo 6º.

Assim, relativamente às relações de trabalho que se venham a constituir estes subsídios não deverão ser atribuídos por falta de suporte normativo.

No que concerne aos trabalhadores já admitidos poder-se-á considerar que a atribuição destes subsídios, através de uma declaração de vontade expressa do empregador e traduzida em práticas sucessivas estabilizadas nas relações de trabalho, integraram o conteúdo dos respectivos contratos individuais de trabalho, vinculando o empregador[73].

Enquanto prestações sociais, atribuídas com carácter periódico e regular, integram o estatuto remuneratório dos respectivos trabalhadores que confiam na continuidade do seu pagamento enquanto se mantiver a eventualidade em que se fundamenta a atribuição. Resultando de uma vinculação da entidade empregadora essas prestações consolidaram-se na esfera jurídica desses trabalhadores e tornaram-se exigíveis.

A sua supressão, por força do disposto no Decreto-Lei nº 14/2003, ofenderia situações jurídicas já constituídas e que se projectam no tempo, representando uma desproporcionada ofensa da confiança colocada pelo beneficiário quanto à sua continuidade.

O mesmo não se passa já no caso dos trabalhadores a que não estavam atribuídas prestações da mesma natureza. Quanto a estes, para além de não ocorrer qualquer redução do respectivo montante remuneratório, não se pode afirmar que existam expectativas dignas de tutela através da aplicação do princípio da confiança, já que apenas podiam contar com uma eventual atribuição desses subsídios.

3. O subsídio de estudo, destinado a compensar os encargos com os estudos do próprio trabalhador, elege uma eventualidade diversa, não contemplada na lei (nem na convenção colectiva de trabalho do sector bancário) e integra uma das hipóteses de benefícios ou regalias suplementares ao sistema remuneratório abrangidos pela norma proibitiva contida no nº 2 do artigo 3º do Decreto-lei nº 14/2003, com ressalva apenas dos direitos já adquiridos.

Ora, também nos casos em que este subsídio tenha sido já atribuído, e enquanto perdurar a eventualidade ou o período de tempo por que foi atribuído, se deve considerar que existe um direito constituído e que, em nome da confiança colocada pelo beneficiário na atribuição a que a entidade empregadora se vinculou, da certeza e da segurança, o mesmo se deve manter.

Do mesmo modo, a cessação desta vantagem relativamente aos trabalhadores aos quais não estava atribuída, não se mostra susceptível de ofender expectativas dignas de tutela.

Estas asserções remetem-nos, porém, para o tema dos direitos adquiridos.

4. A temática dos direitos adquiridos, que apela ao princípio da confiança ínsita na ideia de Estado de direito democrático expressa no artigo 2º da Constituição, tem sido frequentemente analisada por este corpo consultivo[74] que se pronunciou já nos seguintes termos:

«O conceito de direitos adquiridos tem sido construído como instrumento de garantia da esfera jurídica dos destinatários dos ordenamentos jurídicos face à sucessão de normas no tempo ou à concorrência de normas no espaço (...).
Grosso modo, tem como subjacente a ideia de que tudo aquilo que se radicou na esfera jurídica com um certo grau de firmeza à sombra de certo ordenamento, deve ser respeitado por ordenamento diferente.
Tem sido, porém, acentuada a controvérsia na dogmática jurídica quanto à densificação do conceito, abundando a diversidade de critérios para o distinguir de outras realidades, nomeadamente no que se designa por simples expectativas jurídicas (...).
De todo o modo, construindo o conceito como instrumento de garantia nos casos de sucessão de regimes legais, para temperar, no plano subjectivo, os efeitos da retroactividade (autêntica ou imprópria) do regime legal posterior, o plano da confiança, ou da protecção da confiança constitui um elemento permanente de referência na concretização e integração do conceito (...).
Rigorosamente, na técnica jurídica, quando se fala em direito adquirido tem-se em vista o título aquisitivo desse direito e não o seu próprio conteúdo (...).
O conteúdo do direito desdobra-se em situações jurídicas objectivas ou poderes legais, criados imediatamente pela lei e que, consequentemente, acompanham todas as modificações da lei criadora sem que haja ofensa do princípio da não retroactividade.
Tratando-se, porém, do título aquisitivo do direito, poder-se-á dizer que se subjectivizou uma determinada situação jurídica (situação jurídica subjectiva) no uso dos poderes legais, dizendo-se, em consequência disso, adquirido um direito.
O que interessa para a subjectividade é o título aquisitivo e não o conteúdo do direito (...): são as situações jurídicas que se constituíram (definitivamente), e não as situações jurídicas objectivas não derivadas de actos de vontade ou poderes legais previstas e criadas imediatamente pela lei (...)».

Por seu turno, o Tribunal Constitucional tem considerado que só a afectação inadmissível, arbitrária ou demasiadamente onerosa de expectativas jurídicas é susceptível de ofender o princípio da confiança, pronunciando-se nos termos assim sintetizados em recente acórdão[75] :

«O Tribunal Constitucional tem reiteradamente afirmado, em inúmeros acórdãos (...) que o princípio do Estado de direito democrático (consagrado no artigo 2º da Constituição) postula “uma ideia de protecção da confiança dos cidadãos e da comunidade na ordem jurídica e na actuação do Estado, o que implica um mínimo de certeza e de segurança no direito das pessoas e nas expectativas que a elas são juridicamente criadas” razão pela qual “a normação que, por sua natureza, obvie de forma intolerável, arbitrária ou demasiado opressiva àqueles mínimos de certeza e segurança que as pessoas, a comunidade e o direito têm de respeitar, como dimensões essenciais do Estado de direito democrático, terá de ser entendida como não consentida pela lei básica”.
E, no Acórdão nº 287/90, o Tribunal Constitucional procurou concretizar quando ocorria uma afectação inadmissível, arbitrária ou demasiadamente onerosa, de expectativas jurídicas, apontando dois critérios:
“a) A afectação de expectativas, em sentido desfavorável, será inadmissível quando constitua uma mutação da ordem jurídica com que, razoavelmente, os destinatários das normas dele constantes não possam contar; e ainda;
b) Quando não for ditada pela necessidade de salvaguardar direitos ou interesses constitucionalmente protegidos que devam considerar-se prevalecentes (...).
Mais recentemente no Acórdão nº 24/98 (Diário da República, 2ª Série, de 19 de Fevereiro de 1998) acrescentou-se ainda que “(...) aqueles dois critérios, atinentes à existência de uma afectação de expectativas constitucionalmente inadmissível, por ser arbitrária ou demasiadamente onerosa, assentam justamente num pressuposto: o pressuposto da consistência das expectativas sobre que incide a controvertida alteração legislativa. Sem expectativas consistentes desqualifica-se o problema da protecção da confiança. Então impõe-
-se a liberdade do legislador e a auto-revisibilidade que lhe vai ligada”.

(...)
Em suma: da anterior jurisprudência do Tribunal Constitucional decorre (...) que não é suficiente que se demonstre que um novo regime legal vem afectar expectativas dos seus destinatários para que, automaticamente, se conclua pela sua inconstitucionalidade por violação do referido princípio da confiança jurídica. Essencial é ainda que “essas expectativas sejam consistentes de modo a justificar a protecção da confiança e, por outro, que na ponderação dos interesses público e particular em confronto, aquele tenha de ceder perante o interesse individual sacrificado, o que acontecerá sempre que as alterações não forem motivadas por interesse público suficientemente relevante face à Constituição (cf. o artigo 18º, nº 2 e 3), caso em que deve considerar-se arbitrário o sacrifício excessivo da frustração de expectativas».

A consistência ou validade das expectativas assume, nas situações em apreço, particular relevância.

De facto, se no caso das situações já constituídas e consolidadas na esfera jurídica dos beneficiários - relativamente às quais era legítimo e razoável que estes contassem com a sua continuidade enquanto se verificassem os pressupostos em que se fundamentaram - se afigura que a não manutenção seria susceptível de ofender os valores da confiança, da certeza e da segurança, já as expectativas quanto a futuras e eventuais atribuições não revelam a mesma consistência nem reclamam a protecção por aplicação desses mesmos princípios.

5. O último grupo de situações em análise respeita aos benefícios ou regalias que se traduzem na concessão de crédito para aquisição e construção de habitação, nos seguros de saúde e de complemento-reforma.
Cabe referir que todas estas situações estão incluídas no elenco dos benefícios e regalias que, nos termos do artigo 6º, nº 2, do Decreto-Lei nº 14/2003, devem cessar, ressalvados apenas os direitos adquiridos e, ainda assim, com proibição de aumento e de renovação.

5.1. Temos por assente que nenhum destes benefícios tem natureza retributiva, embora resultem ou possam resultar em vantagens de ordem patrimonial.

No que respeita ao crédito à habitação com taxa de juro bonificada, este Conselho considerou já, relativamente a idêntico direito de que são titulares os trabalhadores da Caixa Geral de Depósitos, que não constitui um complemento remuneratório mas sim um benefício social inerente à qualidade ou estatuto de trabalhador bancário[76]; também a jurisprudência[77] tem negado àquele direito a natureza de retribuição.

Os seguros para atribuição de prestações complementares em caso de doença e de reforma inserem-se em esquemas complementares que visam completar os benefícios atribuídos ou a conceder prestações não garantidas no âmbito dos regimes públicos obrigatórios[78] [79].

O seguro de complemento/reforma teve origem numa iniciativa da entidade empregadora, que transferiu a responsabilidade para uma entidade seguradora, através de um contrato a favor de terceiros, in casu, um seguro por conta dos trabalhadores (beneficiários) assumindo a primeira a responsabilidade pelo pagamento integral do respectivo prémio[80].

No seguro de saúde terá havido uma iniciativa conjunta da entidade empregadora e dos trabalhadores, conformada num contrato de seguro em que uns e outros assumiram a posição de tomadores, com responsabilidade pelo pagamento do prémio em proporções estabelecidas, sendo designados como beneficiários os mesmos trabalhadores.

5.2. Excluída a caracterização destes benefícios como atribuições remuneratórias, há no entanto que reconhecer que apenas foram concedidos em face da relação laboral existente e da qualidade dos respectivos beneficiários, existindo assim um nexo com o contrato de trabalho. As obrigações constituídas têm por fonte contratos autónomos embora com conexão com o contrato de trabalho – o contrato de mútuo e os contratos de seguro.

BERNARDO XAVIER aponta diversos exemplos de “conexões contratuais na relação de trabalho” (conexão do contrato de trabalho com o contrato de mútuo, de comodato, de compra e venda, de transporte, etc.) referindo que por vezes se tem em vista a “fidelização” do trabalhador à empresa através de um expediente já designado por “algemas douradas”[81]. E acrescenta que «a circunstância de estes contratos envolverem substancialmente uma vantagem para os trabalhadores permitiu uma tentativa de concepção inteiramente laboralística do próprio sistema negocial e, no limite, a concepção como retribuição dos benefícios assim obtidos», para concluir que se trata de uma «posição imediatista e carecida de fundamento».

Entre as vinculações que supõem um “elevado grau de integração negocial” o Autor aponta precisamente o da complementaridade da segurança social em termos de seguro em que «as entidades empregadoras como que se vinculam a celebrar com instituições seguradoras contratos a favor de terceiros (os trabalhadores) ou acordar na constituição desses complexos regimes de complementação».

5.3. As questões que se suscitam com a cessação destes benefícios colocam-se em sede de cumprimento contratual, nos casos dos contratos já celebrados e cujos efeitos se constituíram na esfera jurídica das partes outorgantes.

Afigura-se, contudo, que as expectativas dos trabalhadores na obtenção das prestações complementares em caso de doença e de reforma, nos casos em que estas eventualidades ainda não ocorreram, não reclamam a protecção por aplicação do princípio da confiança. A eventual desvinculação da entidade empregadora da realização destes esquemas complementares por força daquela determinação legal, nos termos permitidos pelo regime legal e contratual aplicáveis, não ofende de forma desproporcionada, arbitrária e injustificada as expectativas dos beneficiários quanto à futura obtenção daqueles complementos.

Refira-se que, relativamente às expectativas dos trabalhadores no recebimento dos complementos de reforma - que apenas com a aquisição deste estatuto se constituirão em direitos - o Supremo Tribunal de Justiça[82], caracterizando-os como benefícios ou regalias sociais a que não são aplicáveis o estatuto legal e as garantias de irredutibilidade da retribuição, tem considerado que, até à aquisição daquele estatuto, existe uma mera expectativa jurídica do trabalhador, podendo ser revogado pela entidade patronal o negócio jurídico unilateral que o instituiu.

As mesmas considerações e conclusões se nos afiguram aplicáveis às prestações complementares em caso de doença.

Assim, em relação a estes benefícios estabelecidos através de um contrato de seguro, afigura-se-nos que, ressalvadas as prestações já efectuadas e as eventualidades já verificadas, não se perfilam outros direitos adquiridos a salvaguardar. O cumprimento da determinação do artigo 6º, nº 2, do Decreto-Lei nº 14/2003, há-se ser ponderado em face dos termos dos respectivos contratos celebrados e do regime legal que lhes é aplicável, podendo a proibição de renovação dos benefícios imposta pelo nº 3 da mesma disposição, ter incidência nos contratos de seguro que estejam sujeitos a renovações periódicas[83].

5.4. Quanto aos contratos de mútuo para aquisição ou construção de habitação, já celebrados, não se vislumbra que aquela norma possa ter outro alcance para além da proibição de alteração de cláusulas que importem um acréscimo de vantagens financeiras para os mutuários. Relativamente aos trabalhadores que ainda não hajam beneficiado desse crédito mostram-se aplicáveis as anteriores considerações quanto à inexistência de expectativas merecedoras de tutela.



VIII

Face ao exposto formulam-se as seguintes conclusões:

- O Instituto Nacional de Habitação - instituto público com autonomia administrativa e financeira e património próprio, dotado de instrumentos de gestão flexibilizada e de um quadro de pessoal sujeito ao regime do contrato individual de trabalho - prossegue a política do Estado para o sector de habitação, exercendo competências nos domínios da administração habitacional e apoio técnico, do financiamento, e da gestão habitacional, com vista à satisfação de interesses sociais e sem escopo lucrativo;

- O Acordo Colectivo de Trabalho Vertical do sector bancário não é aplicável às relações jurídico-laborais constituídas no âmbito daquele Instituto, quer por falta de correspondência material entre os respectivos sectores de actividade económica quer por não ter sido alargado a este organismo, pela via administrativa adequada, o seu âmbito de aplicação;

- Com a entrada em vigor do Decreto-Lei nº 14/2003, de 30 de Janeiro, foram revogadas as deliberações do conselho directivo daquele instituto público e as decisões do respectivo membro do governo que instituíram prestações sociais, bem como benefícios ou regalias suplementares ao sistema remuneratório, e foi determinada a cessação dos benefícios e regalias já atribuídos, com ressalva dos direitos adquiridos;

- A revogação daqueles actos obsta a que qualquer das vantagens por eles concedidas seja atribuída ao pessoal a admitir;

- As prestações já atribuídas face à verificação das respectivas eventualidades, enquanto direitos que se constituíram na esfera jurídica dos destinatários, merecem a protecção da confiança e devem manter-se enquanto perdurarem os pressupostos da atribuição;

- Nos demais casos, as meras expectativas de obtenção de futuras prestações, benefícios e regalias, face à verificação das respectivas eventualidades, não beneficiam de protecção por aplicação do princípio da confiança nem a sua afectação ofende de forma inadmissível, arbitrária ou desproporcionada aquele princípio;

- Devem manter-se os subsídios infantil e de estudo, que já tenham sido atribuídos, nos termos e nas condições referidas na conclusão 5ª;

- Os contratos de mútuo destinados à aquisição ou construção de habitação bem como os contratos de seguro, já celebrados, devem ser cumpridos nos termos do regime legal e contratual aplicável;

- A cessação ou não renovação dos contratos de seguro, nas circunstâncias permitidas, não ofende direitos adquiridos dos beneficiários nos termos referidos na conclusão 6ª.








[1] Por informação nº 616/2003, processo nº 2003/18/91/MI/360, elaborada a solicitação do gabinete do Secretário de Estado do Tesouro e das Finanças.
[2] Rectificado por Declaração nº 1-D/2003, de 30 de Janeiro, publicada no Diário da República, I Série-A, de 31 de Janeiro de 2003.
[3] Do preâmbulo do diploma.
[4] O artigo 2º da Lei nº 91/2001 - lei de enquadramento orçamental - define o âmbito de aplicação, incluindo os serviços e fundos autónomos. O nº 3 qualifica como tais os serviços e fundos autónomos que satisfaçam cumulativamente os seguintes requisitos: a) Não tenham natureza e forma de empresa, fundação ou associação públicas, mesmo se submetidos ao regime de qualquer destas por outro diploma; b) Tenham autonomia administrativa e financeira; c) Disponham de receitas próprias para cobertura das suas despesas, nos termos da lei.
[5] O artigo 105º, nº 1, a), da Constituição - sobre “Orçamento” - prevê que o Orçamento do Estado discrimine as receitas e despesas do Estado, incluindo as dos fundos e serviços autónomos. A inclusão dos serviços e fundos autónomos foi introduzida na revisão constitucional de 1989 e sobre ela referem GOMES CANOTILHO e VITAL MOREIRA (Constituição da República Anotada, 3ª edição, Coimbra Editora, 1993, página 466, em anotação ao artigo 108º): «Torna-se claro a contrario que o Orçamento do Estado não abrange o orçamento de certas entidades da administração indirecta do Estado, nomeadamente as empresas públicas nem o de entidades da administração autónoma corporativa, nomeadamente as associações públicas, as quais só relevam para efeitos do Orçamento do Estado, na medida em que afectem as despesas ou receitas deste».
[6] Resolução do Conselho de Ministros nº 112/2002, de 1 de Agosto de 2002, publicada no Diário da República, I Série-B, de 24 de Agosto de 2002.
[7] Deliberações, de 24 de Maio de 2002, e de 23 de Setembro de 2002, respectivamente.
[8] Com base no texto do projecto do diploma aquele conselho directivo havia também adoptado algumas medidas relativamente aos demais subsídios e regalias, através de deliberação provisória, que seria rectificada, nos termos transcritos, após a aprovação e publicação do diploma.
[9] Acordo Colectivo de Trabalho Vertical, publicado no Boletim de Trabalho e Emprego, nº 31, I Série, de 20 de Agosto de 1990 e sucessivas alterações, in ACTV do sector bancário, Sindicato dos Bancários do Sul e Ilhas, Lisboa, 2001.
[10] GOMES CANOTILHO e VITAL MOREIRA, obra citada, página 345.
[11] Cfr. parecer do Conselho Consultivo nº 41/84, de 23 de Maio de 1984, publicado no Diário da República, II Série, de 23 de Maio de 1984.
[12] Cfr. parecer deste Conselho nº 29/87, de 29 de Julho de 1987, publicado no Diário da República, II Série, de 10 de Dezembro de 1987, que se segue, por vezes textualmente, nesta parte.
[13] Pelo Decreto-Lei nº 305/91, de 16 de Agosto (que reforçou a vertente de apoio financeiro e introduziu novas regras de gestão), e pelo Decreto-Lei nº 30/97, de 28 de Janeiro (que transferiu para o INH as competências cometidas ao Instituto de Gestão e Alienação do Património Habitacional do Estado no âmbito do Programa Especial de Realojamento nas áreas metropolitanas de Lisboa e Porto e dos programas municipais de realojamento).
[14] O IGAPHE prosseguiu, contudo, com atribuições reduzidas e serviços extintos, de modo a proceder à regularização do activo e passivo e à transmissão do parque habitacional edificado e equipamentos que o integravam.
[15] Aprovado pelo Decreto-Lei nº 464/82, de 9 de Dezembro.
[16] Nos termos do Decreto-Lei nº 321/85, de 5 de Agosto (alterado pelos Decretos-Leis nº 407/86, de 6 de Dezembro, nº 229-A/88, de 4 de Julho, nº 213/91, de 17 de Junho) , que estabelece o regime de emissão de títulos de participação por empresas públicas ou sociedades anónimas pertencentes maioritariamente ao Estado, estes consistem em títulos de crédito representativos de empréstimos contraídos.
[17] Cfr. Relatório e proposta de lei-quadro sobre os institutos públicos, com coordenação de VITAL MOREIRA, Ministério da Reforma do Estado e da Administração Pública, Lisboa, 2001, folhas 143. Na classificação dos institutos públicos em função do substracto, considera-se que os serviços personalizados constituem «um fenómeno de personificação pública de serviços administrativos mais ou menos vastos, adstritos a uma certa tarefa administrativa».
Cfr. o parecer deste Conselho nº 32/94, de 13 de Outubro, publicado no Diário da República, II Série, de 20 de Junho de 1995, que, relativamente ao Instituto Nacional de Engenharia e Tecnologia Industrial (INETI) concluiu que se tratava de um instituto público da espécie serviço personalizado do Estado e de natureza empresarial, utilizando um sistema de contabilidade enquadrado no Plano Oficial de Contabilidade (POC) e dotado de uma comissão de fiscalização.
[18] Cfr. nota 12.
[19] Em consequência concluiu, no que respeitava ao objecto específico da respectiva consulta, que os membros do seu conselho directivo estavam obrigados a apresentar a declaração do património e rendimentos prevista no artigo 1º, do Decreto-Lei nº 4/83, de 2 de Abril.
[20] Cfr. Relatório citado na nota 16, página 27.
[21] De facto, o modelo adoptado por este diploma assenta na consagração de um regime jurídico típico, ou regime padrão, que se aplica à generalidade dos institutos públicos, aceitando a coexistência de regimes especiais que, face às especificidades em que se fundamentam, podem derrogar um ou mais aspectos do regime comum.
[22] No projecto, de autoria de VITAL MOREIRA, a adopção do regime do contrato individual de trabalho tinha carácter excepcional, sendo a regra a adopção do regime do funcionalismo público, referindo o Autor em anotação ao respectivo artigo 45º: «Enquanto o regime da função pública permanecer como regra da administração pública portuguesa (aliás por força da Constituição) a adopção do regime do contrato individual de trabalho deve ser considerada excepcional, pelo que exige justificação caso a caso» (Relatório citado, página 435).
[23] O artigo 21º, nº 2, respeita ao quadro transitório de pessoal abrangido pelo regime jurídico da função pública, integrando os funcionários que transitaram do IGAPHE ou que foram colocados de acordo com o artigo 6º do diploma que operou a fusão dos dois organismos e que, por opção, se mantiveram sujeitos àquele regime, cujos lugares serão extintos quando vagarem.
[24] Cfr. MARIA DO ROSÁRIO RAMALHO, Contrato de Trabalho na Administração Pública, Almedina, Coimbra, página 62.
[25] Esta portaria revogou a Portaria nº 57/87, de 23 de Janeiro, que havia homologado o anterior Regulamento Interno, invocando que «volvidos quase dez anos (...) constata-se a necessidade de introduzir algumas alterações, designadamente no que toca à definição de categorias profissionais, a níveis de exercício de funções, por forma a adequá-la à evolução entretanto havida, quer a nível da legislação produzida neste domínio, quer a nível das naturais aspirações e expectativas do pessoal do Instituto, e ainda às exigências de natureza funcional que o desenvolvimento da actividade do Instituto Nacional de Habitação veio evidenciar».
[26] O regulamento interno anteriormente em vigor continha uma norma de idêntico teor - artigo 10º - mas não exigia a prévia apreciação da tutela.
[27] De acordo com a informação interna em que nos baseamos, este regime ter-se-á “inspirado” no projecto de regulamento do crédito à habitação publicado por anexo ao ACTV do sector bancário.
[28] No ACTV do sector bancário os empréstimos para habitação estão previstos nos artigos 151º e seguintes, tendo por finalidade a aquisição de habitação, a aquisição de terreno para construção de habitação, a construção de habitação em terreno próprio, a ampliação ou beneficiação de habitação própria. Os empréstimos são concedidos a trabalhadores no activo ou reformados, até perfazerem 65 anos de idade, têm a duração máxima de 30 anos e devem ser liquidados até que o mutuário perfaça aquela mesma idade; está fixado um limite máximo do capital mutuável que não poderá em qualquer caso ser superior a 90% do valor total da habitação e o juro corresponde ao que se refere a propósito dos contratos celebrados pelo INH.
[29] O conceito de concessão de crédito é, segundo ANTÓNIO CARLOS DOS SANTOS; MARIA EDUARDA GONÇALVES e MARIA MANUEL MARQUES (obra citada), entendido de forma ampla, «abrangendo todas as operações em que alguém, a título habitual, entrega a outrém ou coloca à sua disposição fundos, com obrigação de o receptor os restituir com pagamento de juros ou mediante uma comissão».
[30] Alterado pelos Decretos-Leis nº 246/95, de 14 de Setembro, nº 232/96, de 5 de Dezembro, nº 222/99, de 22 de Junho, nº 250/2000, de 13 de Outubro, nº 319/2002, de 17 de Outubro, e nº 252/2003, de 17 de Outubro.
[31] O elenco das instituições de crédito compreende: bancos, Caixa Geral de Depósitos, caixas económicas, Caixa Central de Crédito Agrícola, caixas de crédito agrícola mútuo, sociedades de investimento, sociedades de locação financeira, sociedades de factoring, sociedades financeiras para aquisições a crédito, outras empresas que, correspondendo à definição do artigo anterior (instituições de crédito) como tal sejam qualificadas pela lei.
[32] Direito Económico, 4ª edição, Almedina, Coimbra, 2001, página 397 e seguintes.
[33] Autores, obra e local citados na nota 32.
[34] São as seguintes as operações previstas nesses dispositivos: «b) Operações de crédito, incluindo concessão de garantias e outros compromissos; c) Operações de pagamento; d) Emissão e gestão de meios de pagamento, tais como cartões de crédito, cheques de viagem e cartas de crédito; e) Transações, por conta própria ou da clientela, sobre instrumentos do mercado monetário e cambial, instrumentos financeiros a prazo e opções e operações sobre divisas ou sobre taxas de juro e valores mobiliários; f) Participação em emissões e colocações de valores mobiliários e prestações de serviços correlativos; g) Actuação nos mercados interbancários; h) Consultoria, guarda, administração e gestão de carteiras de valores mobiliários; i) Gestão e consultoria em gestão de outros patrimónios.»
[35] Obra citada, página 406.
[36] Mesmos Autores, obra citada, página 407.
[37] Instituições de Crédito e Sociedades Financeiras – Regime Geral Anotado, Ediforum, Edições Jurídicas Lda, Lisboa, 1994, página 31 e seguintes.
[38] Diploma que estabelecia as normas básicas para o exercício da actividade das instituições parabancárias não enumeradas nos artigos 3º e 4º, do Decreto-lei nº 41403, de 27 de Novembro de 1957.
[39] Cfr. nota 12.
[40] GOMES CANOTILHO e VITAL MOREIRA, obra citada, página 307.
[41] Cfr. Autores, obra e local citados na nota anterior.
[42] Aprovado pela Lei nº 99/2003, de 27 de Agosto.
[43] Dispunha o artigo 5º, nº 3, que «o acordo obtido vale como recomendação e não tem a natureza de convenção colectiva, contrato ou acordo colectivo, nem produz por si só quaisquer efeitos jurídicos» e, o nº 4, que «o acordo entre as entidades competentes da Administração e as associações sindicais só produzirá efeitos com a adopção pelo Governo e mediante a integração dos respectivos resultados na lei ou nos regulamentos adequados».
[44] São previstos quatro níveis de convenções colectivas: contratos colectivos nacionais, contratos colectivos sectoriais, acordos colectivos sectoriais e acordos de pessoa colectiva pública.
[45] Cfr. JOSÉ BARROS MOURA, A Convenção colectiva entre as fontes do direito do trabalho, Almedina, Coimbra, 1984, página 218.
[46] Parecer nº 19/95, de 28 de Novembro de 1995.
[47] Os regulamentos em matéria laboral limitam-se, nalguns casos, a dispor sobre aspectos organizacionais ou de disciplina interna, caso em que não produzem efeitos fora da esfera jurídica da pessoa colectiva de que emanam; noutros casos dispõem sobre o conteúdo das relações jurídico-laborais produzindo efeitos na esfera jurídica dos trabalhadores, sujeitos de uma relação jurídica de emprego com a Administração. É neste caso, em que se está no âmbito das relações especiais de poder, que a doutrina tende a reconhecer-lhes eficácia jurídica externa.
Cfr. FREITAS DO AMARAL, Curso de Direito Administrativo, Almedina, Coimbra, 2002, volume II, página 163 e seguintes, e ESTEVES DE OLIVEIRA, PEDRO GONÇALVES e PACHECO AMORIM, Código do Procedimento Administrativo Comentado, 2ª edição, Almedina, Coimbra, 2001, página 514.
[48] Resulta das disposições conjugadas do artigo 153º do Código do Trabalho, e do artigo 11º da Lei nº 23/2004 - diploma que rege os contratos de trabalho no âmbito da Administração Pública - que os denominados “regulamentos internos” não podem dispor sobre o conteúdo das relações laborais mas apenas sobre aspectos organizacionais. Neste sentido, cfr. MARIA DO ROSÁRIO RAMALHO, obra e local citados.
[49] Segundo JOSÉ GABRIEL QUEIRÓ (Dicionário Jurídico da Administração Pública, Coimbra Editora, Lisboa, 1993, volume V, página 90 e seguintes) a homologação é o «acto duma autoridade administrativa ou judicial cujos efeitos são determinados pela incorporação do conteúdo de um acto alheio, nomeadamente através da absorção dos fundamentos e das conclusões duma deliberação, proposta ou parecer emitidos por outro órgão ou das cláusulas de um acordo estabelecido entre outros sujeitos sobre o mesmo objecto».
[50] O princípio “trabalho igual, salário igual” comporta, segundo GOMES CANOTILHO e VITAL MOREIRA - obra citada, página 319 - uma determinante positiva que impõe a existência de critérios objectivos na caracterização de trabalho igual e de trabalho de valor igual, e não apenas uma proibição de discriminação.
[51] Com inúmeras alterações e legislação complementar; revogado pelo Código do Trabalho.
[52] Direito do Trabalho, Almedina, Coimbra,10ª edição, 1998, página 398.
[53] Sobre a matéria, entre outros: ANTÓNIO MENEZES CORDEIRO, Manual de Direito do Trabalho, Almedina, Coimbra, 1997, página 718 e seguintes; MOTTA VEIGA, Lições do Direito do Trabalho, 7ª edição, SPB, Lisboa, 1996, página 470 e seguintes; MÁRIO PINTO, PEDRO FURTADO e ANTÓNIO NUNES DE CARVALHO, Comentário às Leis do Trabalho, Lex, Lisboa, 1994, página 97 e seguintes; PEDRO ROMANO MARTINEZ, Direito do Trabalho, Almedina, Coimbra, 2002, página 531 e seguintes e Código do Trabalho Anotado, 3ª edição, Almedina, Coimbra, 2004, página 449 e seguintes; BERNARDO XAVIER, “Introdução ao estudo da retribuição no direito do trabalho português”, in Revista de Direito e de Estudos Sociais, ano XXVIII, 2ª série, nº 1, Janeiro/Março, 1986, página 65 e seguintes; MONTEIRO FERNANDES, Direito do Trabalho, 12ª edição, Almedina, Coimbra, 2004, página 433 e seguintes.
[54] MOTTA VEIGA, obra citada, página 473.
[55] BERNARDO XAVIER, obra citada, página 383.
[56] Obra citada, página 723
[57] O Autor evidencia a evolução registada nas empresas no que concerne à atribuição de prestações não pecuniárias que, frequentemente «por razões sociais ou até sócio-psicológicas», remuneram os seus trabalhadores, e particularmente os seus dirigentes, através de subsídios não pecuniários, dando como exemplo as despesas de representação, o automóvel, o cartão de crédito, a habitação, o pagamento de certas despesas, as viagens, etc.
[58] Diploma que estabelece os princípios gerais em matéria de emprego público, remunerações e gestão de pessoal.
[59] Sobre a matéria cfr. parecer nº 5/93, de 14 de Julho de 2003, publicado no Diário da República, II Série, de 28 de Janeiro de 1995.
[60] As prestações complementares do abono de família incluíam, nos termos do artigo 9º, nº 2, do Decreto-Lei nº 353-A/89, de 16 de Outubro, o subsídio de casamento, o subsídio de nascimento, o subsídio de aleitação, o abono complementar a crianças e jovens deficientes, o subsídio de educação especial, o subsídio mensal vitalício e o subsidio de funeral e outras prestações que viessem a ser criadas por lei. Esta matéria foi entretanto alterada nos termos que se referem na nota 72.
[61] Nos termos da lei-quadro do sistema de acção social complementar (Decreto-Lei nº 194/91, de 25 de Maio, alterado pelo Decreto-lei nº 212/96, de 20 de Novembro) esta integra «o conjunto de esquemas complementares de protecção social dos funcionários e agentes da Administração Pública que se destinem à prevenção, redução ou resolução de problemas decorrentes da sua situação laboral, pessoal ou familiar, que não sejam atendíveis através dos regimes gerais de protecção social».
[62] Função Pública, 2ª edição, Coimbra Editora, 2001, página 276.
[63] Conceitos Fundamentais do Regime do Funcionalismo Público, Almedina, Coimbra, 1988, II volume, página 737, em anotação. Sobre a matéria cfr. parecer deste Conselho nº 36/98, de 1 de Março de 2001.
[64] Mesma obra e volume, página 875.
[65] A LCT admitia ainda a redução da retribuição com acordo do trabalhador e autorização do Instituto Nacional do Trabalho e Previdência.
[66] Obra citada, 12ª edição, página 454.
[67] Obra citada, páginas 99 e 100.
[68] Acórdão de 13 de Outubro de 2004, processo 13S2169, disponível no sítio da Internet- www.itij.mj.pt.
[69] Parecer nº 16/92, de 23 de Abril de 1992; parecer nº 47/93, de 7 de Outubro de 1993, publicado no Boletim do Ministério da Justiça, nº 429, página 74 e seguintes.
[70] Acórdão nº 141/2002, de 9 de Abril de 2002, publicado no Diário da República, II Série, de 9 de Maio de 2002, que considerou que, não obstante estar em causa uma remuneração acessória (com um regime especial que lhe conferia uma particular estabilidade e consistência que justificava a expectativa do seu integral recebimento pelos funcionários afectados) se verificou uma redução da remuneração global auferida, tendo sido violado o princípio da confiança.
[71] Publicado no Diário da República, II Série, de 28 de Janeiro de 1995.
[72] O Decreto-Lei nº 133/B/97, de 30 de Maio, consagrava o regime jurídico das prestações por encargos familiares quer no âmbito da função pública quer no âmbito do regime geral da segurança social. Este sistema de protecção compreendia: o subsídio familiar a crianças e jovens (substituindo o abono de família e os subsídios de nascimento e de aleitação) visava compensar os encargos com o sustento e educação dos descendentes até aos 16 anos de idade, podendo, no caso de prosseguirem os estudos em determinados níveis ou de serem portadores de determinadas deficiências, ser concedido até aos 24 anos; o subsídio por frequência de estabelecimento de educação especial; o subsídio mensal vitalício; o subsídio por assistência de terceira pessoa; o subsídio de funeral.
O Decreto-Lei nº 176/2003, de 2 de Agosto, alterou o regime de protecção de encargos familiares, que, nos termos preambulares, deixou de integrar o «elenco material da protecção conferida aos trabalhadores em regime de protecção social de natureza laboralista» e passou a constituir direito próprio das crianças e jovens residentes em Portugal, subordinado a parâmetros de isolamento ou de integração em agregados familiares de menores rendimentos. Este regime concretiza-se através do abono de família para crianças e jovens, e do subsídio de funeral, estando previsto o pagamento de um montante adicional anual para fazer face a despesas com encargos escolares dos titulares com idades compreendidas entre os seis e os dezasseis anos que frequentem estabelecimentos de ensino.
[73] O conteúdo destes contratos é integrado - conforme refere MONTEIRO FERNANDES, obra citada, página 788 - pelas estipulações iniciais ou supervenientes das partes, pela prática das relações de trabalho enquanto “manifestações tácitas de vontade”, e pelas condições normativas definidas pela lei ou por instrumentos de regulamentação colectiva de trabalho.
[74] Parecer nº 77/93, de 16 de Agosto de 1994, publicado no Diário da República, II Série, de 12 de Novembro de 1994; entre outros, cfr. parecer nº 6/88, de 12 de Abril de 1989; nº 84/93, de 10 de Março de 1994, publicado no Boletim do Ministério da Justiça, nº 434, página 6 e seguintes; nº 38/98, de 30 de Setembro de 1999. Na doutrina, entre outros, JOSÉ DE OLIVEIRA ASCENSÃO, O Direito - Introdução e Teoria Geral, 11ª edição, Almedina, Coimbra, 2001, página 546; PIRES DE LIMA E ANTUNES VARELA, Noções Fundamentais de Direito Civil, 6ª edição, Coimbra Editora, 1965, página 200 e seguintes.
[75] Acórdão nº 556/2003, de 12 de Novembro de 2003, publicado no Diário da República, II Série, de 7 de Janeiro de 2004.
[76] Parecer nº 97/2002, de 5 de Dezembro de 2002, publicado no Diário da República, II Série, de 8 de Março de 2003.
[77] Cfr. MENEZES CORDEIRO, Manual citado, página 726, em anotação.
[78] ILÍDIO DAS NEVES, Dicionário Técnico e Jurídico de Protecção Social, Coimbra Editora, 2001, página 593. Sobre o tema, MARIA LEONOR GUIMARÃES, “Esquemas complementares de segurança social”, in Cadernos Sindicais, 1987, página 67 e seguintes.
[79] Na vigência do Decreto-Lei nº 519/C1/79, a consagração de benefícios complementares dos assegurados pelas instituições de segurança social estava excluída da contratação colectiva. Com a alteração introduzida pelo Decreto-Lei nº 209/92, de 2 de Outubro, foi permitido que esses esquemas complementares fossem estabelecidos através das convenções colectivas mas apenas ao abrigo dos regimes profissionais complementares de segurança social previstos na lei ou sendo a responsabilidade transferida para entidades seguradoras. O legislador teve em conta não só os elevados custos que a assunção desta responsabilidade implicava para as empresas mas também a falta de garantia do seu efectivo cumprimento, sobretudo em caso de falta de solvência das empresas, e optou por reservar a gestão destes fundos a entidades vocacionadas para o efeito.
[80] MOITINHO DE ALMEIDA (O Contrato de Seguro no Direito Português e Comparado, 1ª edição, Livraria Sá da Costa Editora, Lisboa, 1971, página 23 e 24) define o contrato de seguro pela seguinte forma: «contrato em que uma das partes, o segurador, compensando segundo as leis da estatística um conjunto de riscos por ele assumidos, se obriga, mediante o pagamento de uma soma determinada, a, no caso de realização do risco, indemnizar o segurado pelos prejuízos sofridos, ou, tratando-se de evento relativo à vida humana, entregar um capital ou renda, ao segurado ou a terceiro, dentro dos limites convencionalmente estabelecidos, ou a dispensar o pagamento dos prémios tratando-se de prestação a realizar em data determinada». Cfr. JOSÉ VASQUES, Contrato de Seguro, notas para uma teoria geral, Coimbra Editora, 1999.
[81] BERNARDO XAVIER, “Alguns problemas das chamadas obras sociais e outras vantagens – conexões contratuais na relação de trabalho”, in Estudos dedicados ao Professor Doutor Mário Júlio de Almeida Costa, Universidade Católica, Lisboa, 2002, página 337.
[82] Cfr. fundamentação do acórdão de 15 de Outubro de 2003, no processo 03S281, disponível no sítio da Internet www.dgsi.mj.pt. Cfr. também o acórdão do tribunal Constitucional nº 517/98, de 14 de Novembro de 1998, in “Revista de Direitos e Estudos Sociais”, ano XXXX, Outubro/Dezembro, 1999, nº 4, página 405.
[83] Sobre o tema cfr. JOSÉ VASQUES, obra citada, página 399.