Pareceres PGR

Parecer do Conselho Consultivo da PGR
Nº Convencional: PGRP00002688
Parecer: P000932005
Nº do Documento: PPA16122005009300
Descritores: INSTITUTO NACIONAL DE AVIAÇÃO CIVIL
AVIAÇÃO CIVIL
AERONAVE
PESSOAL DE VOO
TRIPULAÇÃO MÍNIMA DE CABINA
ACUMULAÇÃO DE FUNÇÕES
ASSISTÊNCIA A BORDO
COMANDANTE DE AERONAVE
SEGURANÇA DA NAVEGAÇÃO AÉREA
SEGURANÇA ACTIVA
SEGURANÇA PASSIVA
INTERPRETAÇÃO DA LEI
Livro: 00
Numero Oficio: 2639
Data Oficio: 08/01/2005
Pedido: 08/03/2005
Data de Distribuição: 09/22/2005
Relator: ESTEVES REMÉDIO
Sessões: 01
Data da Votação: 12/16/2005
Tipo de Votação: UNANIMIDADE
Sigla do Departamento 1: MOPTC
Entidades do Departamento 1: SEA DAS OBRAS PÚBLICAS
Posição 1: HOMOLOGADO
Data da Posição 1: 03/03/2006
Privacidade: [01]
Data do Jornal Oficial: 29-03-2006
Nº do Jornal Oficial: 63
Nº da Página do Jornal Oficial: 4683
Indicação 2: ASSESSOR:MARTA PATRÍCIO
Área Temática:DIR CIV * TEORIA GERAL
Ref. Pareceres:P000312005Parecer: P000312005
Legislação:PORT 133/03 DE 2003/02/05 - N2-1-2-3 N8-1 N14; DL 289/03 DE 2003/11/14 - ART1 ART3 C)C)C)C) ART70 N1 ART76 N1 A) B) H) N2 ART80 ART81 N1 N2 ART82 ART83 N1 N3 ART84 ART86; DL 71/84 DE 1984/02/27 - ART3 N1 A) ART4 N1; DL 139/04 DE 2004/06/05 - ART2 F)F) G)G) H)H) I I) J)J) L)L); PORT 238-A/98 DE 1998/04/15; PORT 407/87 DE 1987/05/14 - ART1 ART2 ART3 N1 ART4 ART7 ART9; CCIV66 - ART9 N1 N2 N3
Direito Comunitário:
Direito Internacional:
Direito Estrangeiro:
Jurisprudência:
Documentos Internacionais:
Ref. Complementar:
Conclusões: 1.ª – Numa aeronave, a tripulação de cabina tem como funções prevenir a segurança de pessoas e bens, prestar assistência aos passageiros e actuar em situações de emergência [cf. artigos 3.º, alínea cccc), e 81.º do Decreto-Lei n.º 289/2003, de 14 de Novembro, artigo 2.º, alínea ff), do Decreto-Lei n.º 139/2004, de 5 de Junho, e n.º 2.º-1 da Portaria n.º 133/2003, de 5 de Fevereiro];
2.ª – A tripulação mínima de cabina – prevista no artigo 81.º, n.os 1 e 2, do Decreto-Lei n.º 289/2003 e no Regulamento sobre Pessoal Tripulante Mínimo de Cabina, aprovado pela Portaria n.º 407/87, de 14 de Maio – tem como função primordial «salvaguardar a segurança dos passageiros» (artigo 81.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 289/2003), «garantir a segurança do voo» [artigo 2.º, alínea gg), do Decreto-Lei n.º 139/2004] ou «garantir a evacuação dos passageiros em caso de emergência» (artigo 9.º do Regulamento);
3.ª – As disposições referidas na conclusão anterior não proíbem que a tripulação mínima de cabina desenvolva a bordo tarefas de apoio e assistência aos passageiros;
4.ª – Todavia, a prestação de apoio e assistência aos passageiros, nos casos de tripulação de cabina a operar com número mínimo de elementos está condicionada por esta circunstância e não pode, em caso algum, prejudicar ou interferir com o exercício da função prioritária e principal de salvaguarda e garantia da segurança do voo e dos passageiros.

Texto Integral:
Senhor Secretário de Estado Adjunto,
das Obras Públicas e das Comunicações,
Excelência:

1

Correspondendo a sugestão do Instituto Nacional de Aviação Civil (INAC), dignou-se Vossa Excelência solicitar a emissão de parecer ([1]) sobre a questão de saber se, «estando apenas a bordo a tripulação mínima de cabina exigida nos termos da lei», esta pode «prestar serviço a bordo em acumulação com as suas funções de segurança».

Cumpre emitir parecer.

2

Uma classificação clássica do direito aeronáutico distingue entre pessoal de terra e pessoal de voo: o pessoal de terra é o conjunto de pessoas que, em pontos determinados, desempenha tarefas de preparação e apoio da navegação aérea; o pessoal de voo (ou tripulação) é aquele cujas funções se desenvolvem a bordo de uma aeronave durante o período de voo ou nas actividades preparatórias ou imediatamente posteriores ao voo.

Dentro do pessoal de voo, distingue-se entre tripulação técnica e tripulação de cabina: a tripulação técnica abrange o conjunto de pessoas, providas de adequadas licenças ou habilitações, encarregadas da condução da aeronave (comandante, pilotos, mecânicos ou outros técnicos); a tripulação de cabina compreende os tripulantes que desempenham a bordo tarefas auxiliares em apoio dos passageiros ([2]).

No regime jurídico do pessoal de voo é, assim, possível distinguir quatro tipos de relações laborais: a do comandante da aeronave, a dos pilotos em geral, a do restante pessoal da tripulação técnica e a da tripulação de cabina ([3]).

2.1. Na figura do comandante confluem aspectos técnicos derivados da sua condição de piloto e vinculações para com a empresa aeronáutica provenientes da sua designação como delegado desta na execução do contrato de transporte aéreo e da atribuição da chefia do pessoal embarcado na aeronave; o comandante está investido de funções públicas e ostenta a auctoritas derivada da soberania do Estado que lhe confere mesmo poderes coercivos no caso de infracções cometidas a bordo ([4]) ([5]).

Os poderes e responsabilidades do comandante de aeronave foram já sistematizados do modo seguinte ([6]): é responsável pela aeronave, pelo bem-estar da tripulação e pela preparação e completamento bem sucedido do voo; pode emitir ordens estritas à tripulação e aos passageiros, o que reveste especial importância no caso da prática de infracções a bordo ([7]); o comandante deve tomar todas as medidas necessárias para assegurar o desenvolvimento e completamento do voo em segurança; os deveres administrativos do comandante incluem o registo de nascimentos e óbitos a bordo, a autorização para celebrar casamentos, bem como a efectivação de testamentos.


2.2. O surgimento dos tripulantes de cabina e a sua evolução enquanto grupo ocupacional «verificou-se através do reconhecimento público e empresarial da sua utilidade». A Boeing Air Transport foi, em Agosto de 1928, a primeira companhia aérea a introduzir o conceito de assistência de bordo: o modelo Boeing 80A «acomodava 18 passageiros e uma hospedeira». O serviço de assistência a bordo – a cargo da «hospedeira» – alargou-se a outras companhias e tinha como objectivo principal «cuidar dos passageiros que se sentiam mal nas viagens, ainda atribuladas, dos voos em baixa altitude» ([8]).

Com o decurso do tempo, o serviço generalizou-se e, por força do incremento do transporte aéreo e do número de passageiros, o efectivo a bordo dos tripulantes de cabina foi aumentando, quer pela circunstância de o serviço e a assistência a bordo durante o voo, ligados ao acolhimento e bem estar a bordo, constituírem factores de atracção de passageiros, quer para acatamento de legislação entretanto publicada sobre tripulação mínima de cabina ([9]). Ao serviço de assistência junta-se o exercício de funções ligadas ao respeito de regras de segurança dos passageiros e do próprio voo.

Com o aumento do número de tripulantes de cabina surge a necessidade de coordenação do serviço, o que vai originar o aparecimento de categorias profissionais: «o escalão de ‘chefe de cabina’ (C/C) surge quando, entre os vários tripulantes de cabina, se tornou necessário uma coordenação do serviço e a atribuição de responsabilidades partilhadas. Do mesmo modo, a categoria de ‘supervisor de cabina’ (S/C) teve lugar a partir da operacionalidade dos primeiros aviões wide body ou aviões com dois corredores na cabina – os Boeing 747-200B», mantendo-se nos aviões da série Airbus. «Nestes aviões manteve-se o nível hierárquico de ‘supervisor de cabina’ (S/C). Na frota de narrow body, ou de médio curso, deve-se referir que também existe um acréscimo do número de tripulantes de cabina (-), apesar desses aparelhos terem um(a) ‘chefe de cabina’ (C/C) como nível hierárquico máximo, sendo os restantes tripulantes assistentes (A/Bs) ou comissários de bordo (C/Bs) designados no seu conjunto por CABs e ocuparem os lugares de acordo com a sua antiguidade» ([10]) ([11]).

Os tripulantes de cabina devem ter as aptidões exigidas pelas provas de acesso à profissão.

Têm como missão genérica realizar as operações auxiliares da aeronave que lhes sejam solicitadas e atender, auxiliar e procurar o maior conforto dos passageiros ([12]).

O objectivo global da actividade do tripulante de cabina, de acordo com o que está consignado no perfil profissional, definido em documento elaborado pelo Instituto do Emprego e Formação Profissional (I.E.F.P.), é o de «acolher e prestar assistência aos passageiros a bordo de aviões e assegurar o cumprimento de normas de segurança durante o voo» ([13]). As competências requeridas aos tripulantes de cabina, definidas nesse perfil profissional estão ligadas ao saber-saber, ao saber-fazer e ao saber-ser, conceitos assim explicitados ([14]):

«No ‘saber-saber’ é necessário a compreensão e expressão da língua portuguesa, condição que foi requerida pelo sindicato e a fluência de inglês e francês; noções de meteorologia, de comunicações, de controlo e de tráfego aéreo; normas e procedimentos de segurança de passageiros e de emergência no cockpit; procedimentos de salvamento e de sobrevivência; noções básicas de serviço de refeições e bar; comunicação e relações públicas; turismo e património histórico-geográfico e gastronómico, e primeiros socorros.

«No ‘saber-fazer’, que está directamente ligado aos saberes e ao modo como se executam as tarefas, é fundamental dominar as técnicas e o equipamento de segurança e de salvamento em situação de emergência e de sobrevivência, se for caso disso; usar de uma permanente vigilância como medida de prevenção de incidentes; aplicar técnicas de comunicação, de serviço de refeição e de bar e os primeiros socorros; utilizar as técnicas de comunicação na transmissão de informação e as línguas, quando necessário.

«Relativamente ao ‘saber-ser’, onde o ‘saber-estar’ é também importante, torna-se necessário: a adopção de comportamentos assertivos no cumprimento das normas de segurança; a demonstração de resistência ao stress e de estabilidade emocional; ter iniciativa para o encontro de soluções adequadas face aos problemas que se possam apresentar; organizar o posto de trabalho e estar pronto para a colaboração em equipa; e estabelecer uma boa relação interpessoal com colegas e passageiros.»

O processo de certificação profissional do tripulante de cabina culminou com a edição da Portaria n.º 133/2003, de 5 de Fevereiro, a que adiante aludiremos ([15]).

A certificação profissional visa contribuir para a melhoria contínua dos trabalhadores e permite assegurar que um profissional detém as competências necessárias ao exercício de uma profissão por referência a um descritivo de actividades fixadas no âmbito do Sistema Nacional de Certificação Profissional.

No que se refere aos tripulantes de cabina, o «descritivo» actual é o seguinte:

«5.1.1.1.05 – Comissário de Bordo (Assistente de Bordo)
Acolhe e presta assistência aos passageiros a bordo de aviões e assegura o cumprimento das normas de segurança, a fim de lhes garantir conforto e segurança durante o voo: efectua as verificações necessárias, nomeadamente a existência e localização dos equipamentos de salvamento e a limpeza e arrumação nos lavabos e nas cabines; acolhe os passageiros à entrada do avião e indica-‑lhes os lugares que lhes são destinados, verificando se as bagagens são devidamente acondicionadas; efectua a contagem dos passageiros embarcados, a fim de se certificar da correspondência com a documentação do voo; fecha as portas do avião, assegurando-se de que estão cumpridas as condições de segurança regulamentadas; transmite aos passageiros as saudações da tripulação e da empresa e presta-lhes informações diversas, nomeadamente sobre o voo, horários e ligações existentes; verifica e zela pela observância das normas de segurança e dá instruções sobre os procedimentos a serem adoptados em caso de emergência, indicando a utilização de salva-‑vidas, máscaras de oxigénio e outros equipamentos de segurança; serve refeições e bebidas aos tripulantes e passageiros, de acordo com as rotinas previstas; efectua serviço de vendas de artigos vários; presta os primeiros socorros, sempre que necessário; regista e comunica as actividades, irregularidades e outros dados relativos ao seu sector; acompanha crianças não acompanhadas ou doentes aos locais onde poderão ser atendidos ou encaminhados.
Pode ser responsável pelo serviço de cabine e respectivo pessoal e ser designado em conformidade, como:
Chefe de Cabine
Supervisor de Cabine».

Neste conteúdo funcional é possível agrupar dois núcleos essenciais: um tem a ver com o apoio e assistência aos passageiros (acolhimento e acomodação, serviço de refeições e bebidas, prestação de socorros); outro diz respeito a matéria de segurança (divulgação de procedimentos a adoptar em situações de emergência, verificação do cumprimento de normas e condições de segurança durante o voo).

3

Importa agora, no plano do direito constituído, fazer o enquadramento actual do tema da consulta.

O Decreto-Lei n.º 289/2003, de 14 de Novembro – segundo o sumário oficial – «[d]efine os requisitos para a emissão do certificado de operador aéreo e regula os requisitos relativos à exploração de aeronaves civis utilizadas em transporte aéreo comercial»

A abrir o curto preâmbulo diz-se:

«A Joint Aviation Authorities (JAA), organismo associado à Conferência Europeia da Aviação Civil (CEAC) integra as autoridades nacionais de aviação civil dos Estados europeus, subscritoras dos convénios relativos à elaboração, adopção e aplicação das normas comuns de aviação (códigos JAR), celebrados no Chipre em 11 de Setembro de 1990, no âmbito dos quais se determinou que as normas JAR fossem adoptadas e aplicadas por todas as autoridades aeronáuticas subscritoras.
«As normas e os procedimentos administrativos comuns que têm vindo a ser acordados no âmbito da JAA são normativos detalhados de natureza técnica, que estão substancialmente de acordo com as regras emanadas da Organização de Aviação Civil Internacional (OACI), mais concretamente, e no que respeita às matérias abrangidas no presente diploma, com o anexo n.º 6 à Convenção Internacional sobre Aviação Civil (Convenção de Chicago).
«Importa, no entanto, estabelecer desde já um quadro normativo com vista a melhorar a competitividade dos operadores aéreos portugueses, tendo em conta a globalização da actividade de transporte aéreo, e a necessidade de Portugal acompanhar a contínua evolução e a harmonização do sistema da aviação civil internacional.» ([16])

São, a seguir, identificadas as áreas reguladas, por ex., a definição dos requisitos (formais e materiais) para a emissão do certificado de operador aéreo e fixação das competências do respectivo titular, a regulação dos requisitos relativos à exploração de aeronaves civis utilizadas em transporte aéreo comercial e o estabelecimento dos requisitos de formação e treino do pessoal de voo.

O Decreto-Lei n.º 289/2003 apresenta a seguinte sistematização:

– Capítulo I (Disposições gerais) – artigos 1.º a 4.º;
– Capítulo II (Procedimentos operacionais) – artigos 5.º a 29.º;
– Capítulo III (Limitações operacionais) – artigos 30.º e 33.º;
– Capítulo IV (Manutenção) – artigos 34.º a 39.º;
– Capítulo V (Instrumentos e equipamentos) – artigos 40.º a 59.º;
– Capítulo VI (Manuais, cadernetas, registos e outros documentos) – artigos 60.º a 68.º;
– Capítulo VII (Pessoal) – artigos 69.º a 87.º;
– Capítulo VIII (Operações específicas de helicópteros) – artigos 88.º e 89.º;
– Capítulo IX (Operações em quaisquer condições atmosféricas) – artigos 90.º a 96.º;
– Capítulo X (Transporte aéreo de mercadorias perigosas) – artigos 97.º a 103.º;
– Capítulo XI (Disposições contra-ordenacionais e medidas cautelares) – artigos 104.º a 106.º;
– Capítulo XII (Disposições finais) – artigos 107.º e 108.º

À economia do parecer interessa sobretudo o conhecimento de disposições do capítulo VII. Antes, porém, importa explicitar alguns conceitos constantes do capítulo I.

O artigo 1.º, ao definir o âmbito do diploma, precisa que o mesmo «adopta as normas constantes das partes I e III do anexo n.º 6 e as do anexo n.º 18 da Convenção Internacional sobre a Aviação Civil, bem com as normas técnicas comuns JAR-OPS 1 e 3, relativas a operadores de aeronaves civis com sede em território nacional que efectuem transporte aéreo comercial» ([17]).

Do universo de definições constantes do artigo 3.º convém conhecer as seguintes:

Manual de operações de voo (MOV): «o manual elaborado pelo operador e aprovado pelo INAC, que contém todas as instruções e informações necessárias para orientação do pessoal de operações no desempenho das suas funções [alínea sss)]»;

Membro da tripulação: «a pessoa designada por um operador para desempenhar funções numa aeronave durante o período de serviço de voo» [alínea bbbb)];

Membro da tripulação de cabina: «a pessoa não pertencente à tripulação técnica de voo, qualificada para exercer funções de segurança a bordo de uma aeronave utilizada em transporte comercial de passageiros» [alínea cccc)];

Membro da tripulação técnica de voo: «o membro da tripulação titular de uma licença e responsável pelas tarefas essenciais à condução de uma aeronave durante o período de serviço de voo» [alínea dddd)];

O capítulo VII é, como dissemos, dedicado ao pessoal. Começa com disposições de carácter geral, como a do n.º 1 do artigo 70.º, onde se estabelece que compete «ao membro da tripulação exercer de forma adequada as suas funções relacionadas com a segurança da aeronave e seus ocupantes, especificadas nas instruções e procedimentos contidos no MOV, nos termos das normas JAR-OPS 1.085 e 3.085 e regulamentação complementar».

Contém, a seguir, três secções dedicadas, sucessivamente, à tripulação técnica de voo, à tripulação de cabina e aos oficiais de operações de voo.

A secção I, depois de dispor sobre a composição da tripulação técnica de voo e sobre formação, confere no artigo 76.º alguma ênfase aos deveres do comandante:
«Artigo 76.º
Deveres do comandante

1 – Sem prejuízo das competências previstas no Estatuto do Comandante de Aeronave, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 71/84, de 27 de Fevereiro, o membro da tripulação técnica de voo nomeado para desempenhar a função de comandante da aeronave tem os seguintes deveres, nos termos das normas JAR-OPS 1.085 e 3.085:
a) Ser responsável tanto pela segurança da operação da aeronave como pela segurança dos seus ocupantes durante o período de voo;
b) Ter autoridade para dar todas as ordens que considerar necessárias para salvaguardar a segurança da aeronave, dos seus ocupantes e da carga transportada;
c) (...);
d) (...);
e) (...);
f) (...);
g) (...);
h) Não permitir que qualquer membro da tripulação execute tarefas durante a descolagem, subida, aproximação final e aterragem, excepto aquelas da sua responsabilidade necessárias para a operação segura da aeronave;
i) (...);
j) (...);
l) (...);
m) (...);
o) (...).
2 – Os deveres do piloto comandante previstos no número anterior têm início no momento em que as portas da aeronave se fecham para iniciar um voo e terminam quando as portas se abrem, após o voo.»

O referido Estatuto do Comandante de Aeronave, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 71/84, de 27 de Fevereiro, realça já os deveres ora destacados, ao atribuir ao comandante competência para «[c]onduzir a aeronave executando ou mandando executar todas as medidas necessárias à segurança e à regularidade da operação e tendo em vista a eficácia e economia da mesma» [artigo 3.º, n.º 1, alínea a)] e ao considerá-lo como «a autoridade máxima a bordo, sendo responsável pela aeronave, tripulação, passageiros, carga e correio» (artigo 4.º, n.º 1).

A secção II do capítulo VII do Decreto-Lei n.º 289/2003 é dedicada à tripulação de cabina e abrange os artigos 80.º a 86.º, disposições que, em aspectos relevantes, importa conhecer.

Depois de o artigo 80.º dizer que a secção em causa «aplica-se a todos os membros da tripulação de cabina, com excepção dos tripulantes adicionais com funções especiais», o artigo subsequente prescreve:
«Artigo 81.º
Composição

1 – Para operar um avião de versão de tipo máxima aprovada superior a 19 e inferior a 50 lugares de passageiros, a tripulação de cabina deve ser composta no mínimo por um tripulante, a fim de desempenhar as funções especificadas no MOV para salvaguarda da segurança dos passageiros, de acordo com as normas JAR-OPS 1.990.
2 – Sem prejuízo do disposto no número anterior, a tripulação de cabina deve ser composta por um tripulante adicional por cada fracção de 50 lugares de passageiros.
3 – (...)»

As normas JAR-OPS 1 a que se refere o n.º 1 constam do n.º 41 do anexo a este decreto-lei:

«41 – Normas técnicas JAR-OPS a que se refere o artigo 81.º
JAR-OPS 1.990
Tripulação de cabina – Composição
a) Para operar uma aeronave de versão máxima aprovada superior a 19 lugares de passageiros, transportando um ou mais passageiros, a tripulação de cabina deve ser constituída, no mínimo, por um tripulante, a fim de desempenhar as funções especificadas no MOV para salvaguarda da segurança dos passageiros.
b) Sem prejuízo do disposto no número anterior, o operador deve garantir que:
1) A tripulação de cabina seja composta por um tripulante de cabina por cada 50 lugares de passageiros ou fracção de 50 lugares de passageiros; ou
2) No caso de o número de tripulantes que tenham estado presentes durante a demonstração de evacuação de emergência ou que se presuma que tenham participado de forma relevante, a menos que a versão máxima aprovada de lugares para passageiros seja inferior, pelo menos em 50 lugares, ao número evacuado durante demonstração, pode haver uma redução de um tripulante de cabina por cada 50 lugares de passageiros, sendo assim a versão aprovada inferior à capacidade máxima certificada.
c) Em circunstâncias excepcionais, a autoridade pode exigir ao operador que aumente o número de tripulantes de cabina.
d) Em circunstâncias imprevistas, pode haver uma redução no número de tripulantes de cabina, desde que:
1) O número de passageiros tenha sido reduzido, de acordo com os procedimentos especificados no MOV; e
2) No final do voo, seja apresentado um relatório à autoridade.
e) O operador deve assegurar que, ao admitir tripulantes de cabina que trabalham por conta própria e ou como profissionais liberais ou a tempo parcial são cumpridos os requisitos constantes da subparte O. Neste âmbito, deve ser tido em conta o número total de tipos de aeronaves ou variantes em que o tripulante de cabina pode exercer as suas funções, que não deve exceder os requisitos determinados na norma JAR-OPS 1.1030, mesmo quando estes tripulantes são contratados por outro operador.»

Cada tripulante de cabina deve preencher os requisitos mínimos enunciados no artigo 82.º: ser maior de 18 anos de idade; ter sido considerado (e permanecer) medicamente apto para o desempenho das funções especificadas no MOV; ter demonstrado possuir habilitações para o exercício das suas funções, nos termos da legislação aplicável, de acordo com os procedimentos especificados no MOV.

De acordo com o artigo 83.º, sempre que for designado mais de um tripulante de cabina, o operador deve nomear um chefe de cabina (n.º 1), o qual «é responsável perante o piloto comandante pela observância e coordenação dos procedimentos de segurança e de emergência especificados no MOV» (n.º 3) ([18]).

O artigo 84.º dispõe sobre formação: cada tripulante de cabina deve concluir com aproveitamento a formação inicial aprovada pelo INAC e constante do MOV e, bem assim, será avaliado, tudo nos termos das normas JAR-OPS e legislação aplicáveis.

4

Um outro diploma, ainda de carácter abrangente, utiliza definições e conceitos, alguns acima referidos, relacionados com a matéria do parecer.

Trata-se do Decreto-Lei n.º 139/2004, de 5 de Junho – «Transpõe para a ordem jurídica nacional a Directiva n.º 2000/79/CE, do Conselho, de 27 de Novembro, que define e regula o tempo de trabalho do pessoal móvel da aviação civil, designadamente no que respeita aos limites dos tempos de serviço de voo e de repouso» ([19]).

Visa-se «o estabelecimento de normas mínimas de protecção da saúde e da segurança dos trabalhadores, com vista a garantir a própria segurança de voo. A limitação do tempo de voo e do período de serviço de voo estabelecida no presente diploma visa, assim, assegurar aos tripulantes, no início e durante cada período de serviço de voo, o domínio e a utilização de todas as suas capacidades físicas e psíquicas.

«Tendo em conta que o sistema jurídico nacional já continha normas relativas às condições de repouso e de trabalho do pessoal móvel da aviação civil, estabelecidas na Portaria n.º 238-A/98, de 15 de Abril, baseadas num princípio geral de adaptação do trabalho ao homem, considerando as condicionantes específicas da actividade em causa, o presente diploma acolhe as normas da referida portaria, adequando-as à actual realidade, nomeadamente às condições concorrenciais existentes relacionadas com as situações diferenciadas de cada operador» ([20]).

Atentemos em algumas das aludidas definições, integradas no artigo 2.º:

Tripulação de cabina: «conjunto de tripulantes que, não fazendo parte da tripulação técnica, são nomeados pelo operador para executar, nomeadamente, tarefas de assistência e segurança aos passageiros [alínea ff)];

Tripulação mínima: «tripulação que estiver definida para cada equipamento de voo pela autoridade aeronáutica competente com o fim de garantir a segurança do voo» [alínea gg)];

Tripulação reforçada: tripulação que compreende mais do que a tripulação mínima e na qual cada membro da tripulação pode deixar o seu posto e ser substituído por outro membro da tripulação devidamente qualificado [alínea hh)];

Tripulação técnica: «conjunto de tripulantes, com funções específicas resultantes das suas licenças e qualificações, envolvidos na condução da aeronave [alínea ii)];

Tripulante: «indivíduo que desempenha funções específicas a bordo de uma aeronave, de acordo com as suas licenças, qualificações ou autorizações [alínea jj)];

Tripulante em funções: «tripulante actuando de acordo com as suas competências numa aeronave durante um voo ou parte de um voo [alínea ll)].

Estas noções constavam já, em termos idênticos ou próximos, da referida Portaria n.º 238-A/98, de 15 de Abril, que definia tripulação de cabina como o «conjunto de tripulantes que não fazem parte da tripulação técnica designados pelo operador para executar tarefas incluindo assistência e segurança de passageiros» e tripulação mínima como «aquela que estiver definida para cada equipamento de voo pela autoridade aeronáutica competente» ([21]).

5

Atento o objecto do parecer, interessa desenvolver o quadro legal relativo à tripulação de cabina.

5.1. Merece, em primeiro lugar, menção a Portaria n.º 407/87, de 14 de Maio, que aprova o Regulamento sobre Pessoal Tripulante Mínimo de Cabina.

São as seguintes as disposições mais salientes do Regulamento:

«Artigo 1.º Quando uma aeronave registada em Portugal com o propósito de transporte público de passageiros possua uma capacidade de lugares superior a dezanove passageiros, a sua tripulação deve incluir pessoal de cabina com a finalidade de actuar no interesse da segurança dos passageiros transportados.
Art. 2.º O número de pessoal de cabina destinado a satisfazer o disposto no artigo anterior será de 1 por cada 50 ou fracção de 50 passageiros a bordo.
Art. 3.º – 1 – O número mínimo de pessoal de cabina não deverá ser inferior a metade do número total de saídas principais utilizáveis.
2 – (...).
Art. 4.º No caso de ser diferente o número mínimo de pessoal de cabina de bordo, apurado de acordo com as regras dos artigos 2.º e 3.º, será aplicável aquele de que resultar um número mais elevado desse pessoal.
Art. 5.º (...).
Art. 6.º (...).
Art. 7.º Durante a descolagem e aterragem, o pessoal de cabina deve estar localizado o mais perto possível das saídas principais operativas, de modo a dar assistência aos passageiros no caso de se verificar uma evacuação de emergência.
Art. 8.º (...).
Art. 9.º O número de pessoal de cabina indicado deve entender-‑se como mínimo e tem por finalidade garantir a evacuação dos passageiros em caso de emergência, podendo o operador aumentar o seu número, se assim o entender, por razões de serviço a bordo.»

Registe-se que este último artigo assume, na óptica da questão colocada, relevo não despiciendo.

5.2. Um outro aspecto diz respeito à formação profissional, matéria regulada pela Portaria n.º 133/2003, de 5 de Fevereiro, que estabelece «as normas relativas às condições de emissão dos certificados de aptidão profissional (CAP) e de homologação dos respectivos cursos de formação profissional relativas ao perfil profissional de tripulante de cabina (m/f)» ([22]).

Até então o exercício da actividade dos tripulantes de cabina não estava condicionado à posse de qualquer título profissional, ficando ao critério das empresas a definição das competências de que os profissionais deviam ser detentores para desenvolver, com os padrões de segurança e qualidade necessários, as respectivas actividades.

A Portaria n.º 133/2003 enquadra a actividade em causa no quadro do Sistema Nacional de Certificação Profissional (SNCP) ([23]), o que é considerado uma exigência premente face ao «crescimento exponencial do transporte aéreo» e à «introdução sistemática de novas tecnologias neste sector», factores que originam a necessidade de formação permanente dos respectivos profissionais.

O enquadramento da certificação do tripulante de cabina no SNCP «permite assegurar e promover a qualidade do processo, disponibilizando para o mercado referenciais de competências e de formação profissional que se encontram ao nível das exigências impostas pela realidade do sector» ([24]).

Nos termos da Portaria n.º 133/2003, «entende-se por tripulante de cabina (m/f) o profissional que, integrado na tripulação de uma aeronave, previne a segurança de pessoas e bens, presta assistência a passageiros e actua em situações de emergência» (n.º 2.º-1).

O n.º 2.º-2 caracteriza, nas suas alíneas, três tipos de formação: a formação de qualificação inicial, a formação complementar específica e a formação contínua de actualização.

O INAC é a entidade certificadora competente para emitir os CAP dos tripulantes de cabina e para homologar os cursos de formação profissional respectivos (n.º 3.º).

Para efeitos de homologação, o curso de formação de qualificação inicial de tripulante de cabina (m/f) deve ser organizado de forma a permitir a obtenção das competências definidas no perfil profissional (n.º 8.º-1); deve integrar uma componente teórica e uma componente prática a desenvolver em contexto de formação e em contexto real de trabalho, ter em conta a modalidade e o contexto formativo e utilizar como orientação dois domínios de referência: o domínio sócio-cultural e o domínio científico-tecnológico (onde destacamos matérias como comunicação e atendimento, motivação, gestão de conflitos, liderança e tomada de decisões, prevenção e segurança a bordo, salvamento e sobrevivência, assistência a passageiros bagagem, primeiros socorros e serviço geral a bordo) ([25]).

A renovação do CAP está dependente da manutenção das competências através da actualização científica e técnica, nos termos do n.º 14 da Portaria n.º 133/2003, de 5 de Fevereiro.

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Um outro aspecto essencial do parecer (para além da tripulação de cabina) diz respeito à segurança.

Em geral, a segurança dos sistemas ([26]) tem duas vertentes principais: as especificações sobre os componentes e sub-sistemas que estejam directamente relacionados com a minimização dos riscos humanos e ambientais; e a gestão das situações de perigo eminente ou emergência, resultantes de incidentes ou acidentes, com vista à minimização das suas consequências.

A primeira vertente aponta, em primeiro lugar, para mecanismos que tentam garantir a funcionalidade regular dos sistemas e que, pelo seu papel crítico, são normalmente referidos no âmbito da segurança (sistema de freios, sistema de alarme e iluminação do veículo são alguns exemplos); em segundo lugar, inclui a segurança activa dos veículos, ou seja, sistemas comandados electronicamente que proporcionam o aumento da segurança na operação/condução dos veículos (sistema automático de controlo de velocidade, sistema de travagem automática e sistemas de actuação automática mediante análise de condição, por ex., referente a temperatura).

A segunda vertente refere-se também a dois aspectos principais: por um lado, abrange a segurança passiva dos veículos, isto é, características físicas destes, que, sem necessidade de comando, actuam ou são postas em evidência em caso de acidente ([27]); adicionalmente, abarca a definição e estabelecimento de planos de segurança, manuais de procedimentos de emergência e normas de segurança, ferramentas essenciais à optimização do factor segurança ([28]).

No caso da segurança aérea, a prevenção dos riscos de acidentes (e de incidentes) tem constituído uma preocupação nuclear de toda a aviação. Os riscos diminuem com a adopção de medidas adequadas de antecipação e com uma actuação correcta por parte da tripulação em situações anómalas.

Não se estranha, por isso, que a legislação do sector seja dominada por uma dupla preocupação: por um lado, colmatar ou complementar espaços carecidos de regulação; por outro, garantir e promover a segurança.

A segurança aérea «tem importantes componentes que se encontram interligadas» e que se repartem pelos conceitos indicados de segurança activa e passiva: em primeiro lugar, as boas condições do aparelho e do seu equipamento, o que implica uma manutenção eficaz (nos planos preventivo e correctivo); em segundo lugar, as boas condições físicas e psíquicas do pessoal de voo; depois, «é necessário que seja dado, periodicamente, um treino apropriado às tripulações e que a comunicação entre os tripulantes do cockpit e da cabina se faça adequadamente, interligando as ‘duas culturas’»; por último, «torna-se indispensável uma preparação para a actuação eficaz da tripulação em caso de incidente ou de acidente» ([29]).

Neste campo, o papel dos tripulantes de cabina apresenta-se cada vez mais crucial, sendo certo que as dificuldades no trabalho aumentam com o incremento de tráfego e com situações de emergência médica e de passageiros difíceis ou indisciplinados.

Em caso de acidente, «o desempenho e número de tripulantes de cabina influencia significativamente o comportamento dos passageiros e a taxa de evacuação de uma aeronave em emergência».

No caso dos incidentes, uma vez que a tripulação técnica é normalmente constituída por dois elementos, os tripulantes de cabina «são totalmente responsáveis pela cabina e pelos passageiros, e é exigido que controlem todas as situações de emergência, incluindo actos de terrorismo, sem qualquer assistência directa da tripulação técnica».

Nestas circunstâncias, «qualquer emergência em voo exigirá que os tripulantes de cabina imediatamente se transformem, eles próprios, de profissionais de relações públicas no avião, afáveis e prontos a agradar, em condutores agressivos, responsáveis pela segurança de toda e qualquer pessoa a bordo de uma aeronave».

«Embora o seu principal papel seja o da segurança, a prioridade dada pelas companhias aéreas de passageiros às exigências comerciais sobre os tripulantes de cabina são cada vez maiores e prejudicam a sua capacidade no cumprimento das suas funções primárias de segurança» ([30]).

Importa, todavia, contrariar esta tendência e reconduzir as funções do tripulante de cabina ao seu conteúdo originário ou, pelo menos, acautelar que as exigências resultantes de uma concorrência cada vez maior não prejudiquem o desempenho do seu «principal papel» ao nível da segurança.

As funções de segurança a cargo dos tripulantes de cabina assumem natureza diversa e são levadas a cabo em momentos variados.

Em condições normais, desenvolvem um conjunto e procedimentos tabelares, como por ex., a verificação da existência e localização dos equipamentos de salvação e emergência, bem como a divulgação do respectivo modo de utilização. Neste caso, exige-se sempre do tripulante de cabina uma dada actuação concreta, o desenvolvimento de uma concreta actividade.

Em situações de emergência, resultantes de incidentes ou acidentes, compete-lhes gerir e controlar a situação, com vista à sua superação e/ou à minimização das suas consequências, no âmbito dos planos ou procedimentos previstos. Neste caso, a gestão da situação de perigo requer do tripulante de cabina uma actuação eficaz no sentido de a debelar, mas antes de ela surgir requer-se «tão-só» disponibilidade para a enfrentar.
7

Na formulação da questão objecto do parecer – saber se, «estando apenas a bordo a tripulação mínima de cabina exigida nos termos da lei», esta pode «prestar serviço a bordo em acumulação com as suas funções de segurança» – apresenta-se como referente normativo imediato o artigo 9.º do Regulamento sobre Pessoal Tripulante Mínimo de Cabina, aprovado pela Portaria n.º 407/87, de 14 de Maio, já conhecido:

«O número de pessoal de cabina indicado deve entender-se como mínimo e tem por finalidade garantir a evacuação dos passageiros em caso de emergência, podendo o operador aumentar o seu número, se assim o entender, por razões de serviço a bordo.»

A resolução da questão há-de, pois, passar pela interpretação desta (e de outras) disposições legais.

O artigo 9.º do Código Civil consagra os princípios a que deve obedecer a interpretação da lei, «o problema central da metodologia jurídica» ([31]): o intérprete não deve cingir-se à letra da lei. mas reconstituir a partir dos textos o pensamento legislativo, tendo sobretudo em conta a unidade do sistema jurídico, as circunstâncias em que a lei foi elaborada e as condições específicas do tempo em que é aplicada (n.º 1); a letra da lei constitui o ponto de partida da interpretação, mas exerce também a função de um limite, pois não pode ser considerado pelo intérprete «o pensamento legislativo que não tenha na letra da lei um mínimo de correspondência verbal, ainda que imperfeitamente expresso» (n.º 2); na fixação do sentido e alcance da lei, «o intérprete presumirá que o legislador consagrou as soluções mais acertadas e soube exprimir o seu pensamento em termos adequados» (n.º 3).

Neste contexto, fala-se em elementos da interpretação da lei: o elemento gramatical é constituído pelo texto ou letra da lei; o elemento histórico abrange todos os materiais relacionados com a história do preceito ou diploma; o elemento racional ou teleológico consiste na razão de ser da lei (ratio legis), no fim visado pelo legislador ao elaborar a norma; e o elemento sistemático, que «compreende a consideração das outras disposições que formam o complexo normativo do instituto em que se integra a norma interpretanda, isto é, que regulam a mesma matéria (contexto da lei), assim como a consideração de disposições legais que regulam problemas normativos paralelos ou institutos afins (lugares paralelos). Compreende ainda o “lugar sistemático” que compete à norma interpretanda no ordenamento global, assim como a sua consonância com o espírito ou unidade intrínseca de todo o ordenamento jurídico» ([32]).

8

O INAC colocou às suas congéneres europeias e a instâncias internacionais ligadas à aviação civil questão similar à que foi submetida à apreciação do Conselho Consultivo ([33]).

As respostas obtidas – acentuando a necessidade de acatamento do disposto na JAR-OPS 1.990 – foram no sentido de que a tripulação de cabina, operando com o número mínimo de elementos, pode levar a cabo tarefas não relacionadas com a segurança desde que as mesmas não prejudiquem a própria segurança.

Na resposta do representante da Flight Safety Foundation ([34]) afirma-se que «a prioridade número um da tripulação de cabina é a segurança dos passageiros», podendo ser levadas a cabo outras tarefas «desde que as mesmas não interfiram com obrigação principal de garantir a segurança dos passageiros».

O interesse heurístico destas tomadas de posição prende-se com a circunstância de o direito aeronáutico assentar largamente numa matriz convencional comummente aceite pela generalidade dos Estados, com destaque, no caso presente, para a JAR-OPS 1.990, para que remete o artigo 81.º do Decreto-Lei n.º 289/2003, de 14 de Novembro.

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O conteúdo funcional do tripulante de cabina está, na origem desta figura e da aviação comercial, ligado à prestação de apoio e assistência aos passageiros; a etimologia da designação inicialmente utilizada – «hospedeira» ([35]) de bordo – sugere este cariz assistencial.

Com o decorrer do tempo, acentua-se a valência ligada ao exercício de funções relacionadas com a segurança (dos passageiros, dos tripulantes, do voo) e permanece, ainda que num plano secundário, o apoio aos passageiros.

O desempenho deste conjunto não homogéneo de funções está reflectido nas disposições jurídicas relativas aos tripulantes de cabina atrás citadas.

O artigo 81.º do Decreto-Lei n.º 289/2003, de 14 de Novembro, estabelece que para operar um avião «de versão de tipo máxima aprovada superior a 19 e inferior a 50 lugares de passageiros», transportando um ou mais passageiros ([36]), a tripulação de cabina deve ser composta no mínimo por um tripulante, «a fim de desempenhar as funções especificadas no MOV para salvaguarda da segurança dos passageiros» (n.º 1); sem prejuízo do disposto neste número, «a tripulação de cabina deve ser composta por um tripulante adicional por cada fracção de 50 lugares de passageiros» (n.º 2).

O mesmo diploma define o membro da tripulação de cabina como «a pessoa não pertencente à tripulação técnica de voo, qualificada para exercer funções de segurança a bordo de uma aeronave utilizada em transporte comercial de passageiros» [artigo 3.º, alínea cccc)].

O artigo 2.º, alínea gg), do Decreto-Lei n.º 139/2004, de 5 de Junho, define a tripulação mínima (de cabina) como a «tripulação que estiver definida para cada equipamento de voo pela autoridade aeronáutica competente com o fim de garantir a segurança do voo».

Estas disposições referem-se tão-só ao exercício de funções de segurança por parte dos tripulantes de cabina, omitindo qualquer referência a tarefas de outra natureza.

Mas é preciso frisar que o Decreto-Lei n.º 289/2003 tem um cariz regulador do acesso à exploração de aeronaves civis, sendo, por isso, natural que defina os requisitos considerados indispensáveis para o exercício de tal actividade. Donde, o estabelecimento da obrigação de existência de uma tripulação mínima de cabina, destinada à «salvaguarda da segurança dos passageiros» ou, em diferente expressão, «a garantir a segurança do voo».

O Regulamento sobre Pessoal Tripulante Mínimo de Cabina é, em relação a esta matéria (a única sobre que versa), porventura mais impressivo: depois de estabelecer que numa aeronave dedicada ao transporte público de passageiros com capacidade superior a dezanove passageiros a sua tripulação «deve incluir pessoal de cabina com a finalidade de actuar no interesse da segurança dos passageiros transportados» (artigo 1.º), em número «de 1 por cada 50 ou fracção de 50 passageiros a bordo» (artigo 2.º), acrescenta que «[o] número de pessoal de cabina indicado deve entender-se como mínimo e tem por finalidade garantir a evacuação dos passageiros em caso de emergência, podendo o operador aumentar o seu número, se assim o entender, por razões de serviço a bordo» (artigo 9.º).

Todas estas disposições acentuam a obrigatoriedade de existência de tripulação de cabina mínima e salientam a finalidade precípua da sua existência: garantir a segurança do voo e dos passageiros. Não vedam, porém, o desenvolvimento de tarefas de apoio e assistência aos passageiros.

A «salvaguarda da segurança dos passageiros», a «garantia da segurança do voo» ou a «garantia da evacuação dos passageiros em caso de emergência», constituindo as tarefas prioritárias da tripulação mínima de cabina, podem não esgotar o respectivo conteúdo funcional, podem não ser incompatíveis com o exercício de outras tarefas.

Por outras palavras, a salvaguarda da segurança (dos passageiros, do voo) pode não ser incompatível com o exercício de tarefas de assistência aos passageiros, função que o legislador insistentemente enuncia entre aquelas que (também) competem à tripulação de cabina – cf., por ex., o Decreto-Lei n.º 139/2004, de 5 de Junho, que define a tripulação de cabina como o «conjunto de tripulantes que, não fazendo parte da tripulação técnica, são nomeados pelo operador para executar, nomeadamente, tarefas de assistência e segurança aos passageiros» [artigo 2.º, alínea ff)] ou a Portaria n.º 133/2003, de 5 de Fevereiro, que define o tripulante de cabina como «o profissional que, integrado na tripulação de uma aeronave, previne a segurança de pessoas e bens, presta assistência a passageiros e actua em situações de emergência» (n.º 2.º-1).

Entre os dois referidos blocos normativos – o que comete à tripulação mínima de cabina um conteúdo funcional mínimo traduzido na garantia da segurança do voo e dos passageiros e o que, mais abrangentemente, atribui aos tripulantes de cabina o exercício de funções de segurança e assistência aos passageiros – não existe forçosamente uma relação de exclusão, podendo antes existir alguma margem de compatibilização.

Na verdade, o entendimento segundo o qual, face ao disposto no Regulamento sobre Pessoal Tripulante Mínimo de Cabina, «a tripulação mínima de cabina não pode efectuar qualquer tipo de serviço a bordo» ([37]) sobrevaloriza a letra do artigo 9.º deste diploma, desvaloriza a sua teleologia e ignora o lugar sistemático do preceito e do respectivo diploma.

Quanto ao primeiro aspecto, afigura-se-nos, por um lado, que o segmento final do artigo 9.º do Regulamento – «podendo o operador aumentar o seu número, se assim o entender, por razões de serviço a bordo» – assume carácter expletivo, uma vez que, na falta de limite máximo para a tripulação de cabina, o operador, nos limites da racionalidade económica, poderá sempre aumentar o seu número; por outro, uma interpretação estritamente gramatical e descontextualizada da parte restante daquela disposição levar-nos-ia a afirmar que o pessoal mínimo de cabina apenas poderia «garantir a evacuação dos passageiros em caso de emergência», mas já não desenvolver outras tarefas, ainda relacionadas com a segurança do voo e dos passageiros. Seria, esta, uma conclusão redutora e absurda. Ora, devendo o intérprete presumir que o legislador consagrou as soluções mais acertadas (cf. artigo 9.º, n.º 3, do Código Civil), não será razoável restringir as funções da tripulação mínima de cabina à «evacuação dos passageiros em caso de emergência»; nesta parte, a letra do texto do artigo 9.º do Regulamento fica aquém do espírito da lei, pelo que, em extensão teleológica ([38]), esta disposição deve igualmente abarcar tarefas destinadas a garantir a segurança do voo e dos passageiros para além da evacuação em caso de emergência. É o que resulta já, expressamente, das recentes disposições sobre tripulação mínima de cabina, designadamente do n.º 1 do artigo 81.º do Decreto-Lei n.º 289/2003, onde se fala da «salvaguarda da segurança dos passageiros».

O artigo 9.º do Regulamento sobre Pessoal Tripulante Mínimo de Cabina há-de, portanto, ser interpretado tendo na devida consideração a sua teleologia e as respectivas inserção e conexão sistemáticas.

A fixação de uma tripulação mínima de cabina – objectivo comum ao Regulamento e ao artigo 81.º (e JAR-OPS 1.990 anexa) do Decreto-Lei n.º 289/2003 – tem como fundamento a salvaguarda da segurança dos passageiros ou a garantia da segurança do voo [cf. artigo 2.º, alínea gg), do Decreto-Lei n.º 139/2004].

Esta razão de ser da lei (ratio legis), a garantia da segurança do voo e dos passageiros, constitui a primeira prioridade desta tripulação.

Salvaguardar a segurança dos passageiros ou garantir a segurança do voo significa assegurar que o voo decorra em normalidade e estar preparado para responder a situações de emergência. A garantia da segurança do voo reparte-se por tarefas de natureza preventiva e pela actuação em situações de emergência (que não apenas, como vimos, na de evacuação de passageiros). No primeiro caso, cumpridos os procedimentos e accionados os mecanismos especificados no MOV, a tripulação de cabina fica numa posição passiva e expectante, embora atenta; no segundo, as situações de emergência são, por natureza, situações incertas e imprevistas.

A «salvaguarda da segurança dos passageiros», a «garantia da segurança do voo» ou a «garantia de evacuação dos passageiros em caso de emergência» podem obstar a que a tripulação de cabina, operando com o número mínimo de elementos, preste a bordo tarefas de apoio e assistência aos passageiros. Se e quando tal acontecer, a garantia da segurança do voo e dos passageiros impede, de todo, a prestação de assistência.

Pode, porém, suceder que o desenrolar do voo em condições de completa normalidade permita o desenvolvimento de tarefas de apoio e assistência aos passageiros.

Neste caso importa, desde logo, acentuar que não é exigível que a tripulação de cabina, operando com o número mínimo de elementos, leve a cabo o conjunto integral de tarefas cometidas à tripulação de cabina no campo do apoio e assistência aos passageiros (mal se compreenderia nestes casos, por exemplo, a efectivação de serviço de vendas de artigos a bordo).

Quanto ao mais, a definição de cada uma daquelas situações e das tarefas a realizar pela tripulação mínima de cabina depende das circunstâncias concretas do voo.

Tal definição há-de sempre pressupor alguma flexibilidade e assentar na conjugação de vários factores: por um lado, na concertação entre operadores e organismos representativos dos tripulantes de cabina (com eventual expressão nos instrumentos de regulação colectiva de trabalho); por outro na acção do INAC, a quem compete, entre o mais, promover a segurança aeronáutica e fiscalizar o cumprimento das leis, regulamentos, normas e requisitos técnicos aplicáveis no âmbito das suas atribuições ([39]); por último, na mediação concretizadora por parte do supervisor de cabina e/ou do chefe de cabina ([40]) e, num outro plano, por parte do comandante da aeronave, responsável tanto pela segurança da operação da aeronave como pela segurança dos seus ocupantes durante o período do voo ([41]).
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Em face do exposto, formulam-se as seguintes conclusões:

1.ª – Numa aeronave, a tripulação de cabina tem como funções prevenir a segurança de pessoas e bens, prestar assistência aos passageiros e actuar em situações de emergência [cf. artigos 3.º, alínea cccc), e 81.º do Decreto-Lei n.º 289/2003, de 14 de Novembro, artigo 2.º, alínea ff), do Decreto-Lei n.º 139/2004, de 5 de Junho, e n.º 2.º-1 da Portaria n.º 133/2003, de 5 de Fevereiro];

2.ª – A tripulação mínima de cabina – prevista no artigo 81.º, n.os 1 e 2, do Decreto-Lei n.º 289/2003 e no Regulamento sobre Pessoal Tripulante Mínimo de Cabina, aprovado pela Portaria n.º 407/87, de 14 de Maio – tem como função primordial «salvaguardar a segurança dos passageiros» (artigo 81.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 289/2003), «garantir a segurança do voo» [artigo 2.º, alínea gg), do Decreto-Lei n.º 139/2004] ou «garantir a evacuação dos passageiros em caso de emergência» (artigo 9.º do Regulamento);

3.ª – As disposições referidas na conclusão anterior não proíbem que a tripulação mínima de cabina desenvolva a bordo tarefas de apoio e assistência aos passageiros;

4.ª – Todavia, a prestação de apoio e assistência aos passageiros, nos casos de tripulação de cabina a operar com número mínimo de elementos está condicionada por esta circunstância e não pode, em caso algum, prejudicar ou interferir com o exercício da função prioritária e principal de salvaguarda e garantia da segurança do voo e dos passageiros.






([1]) Ofício n.º 2639, de 1 de Agosto de 2005, com entrada na Procuradoria-Geral da República no dia 3 de Agosto de 2005. No processo foi incorporado o ofício n.º 730/05, de 18 de Julho de 2005 – sobre «Tripulação mínima de cabina – Interpretação do artigo 9.º da Portaria n.º 407/87, de 14 de Maio. Possibilidade de execução de serviço a bordo» – que o Sindicato Nacional do Pessoal de Voo da Aviação Civil, conhecedor da proposta de solicitação do parecer, havia remetido ao Senhor Procurador-Geral da República.
([2]) Cf., sobre os conceitos referidos, Luis Tapia Salinas, Derecho Aeronáutico, Bosch, Casa Editorial, S.A., Barcelona, p. 213 e ss.; J. C. Sampaio de Lacerda, Curso de Direito Privado de Navegação, vol. II, “Direito Aeronáutico”, Livraria Freitas Bastos S/A, Rio de Janeiro/São Paulo, pp. 63-71; Michel de Juglart, Traité de Droit Aérien, tomo I, 2.ª edição, por Emmanuel du Pontavice/Jacqueline Dutheil de la Rochère/Georgette M. Miller, Paris, 1989, p. 490 e ss.; e I. H. Ph. Diederiks-Verschoor, An Introduction to Air Law, 6.ª edição, 1997, The Hague/London/Boston, pp. 27-32.
([3]) Cf. José Daniel Parada Vázquez, “Régimen jurídico del personal de vuelo”, Revista de la Facultad de Derecho Universidad Complutense, Curso 1001-1992, Madrid, 1992, p. 249.
([4]) Quanto a este último aspecto, v. os artigos 5.º a 10.º da Convenção referente às infracções e a certos outros actos cometidos a bordo de aeronaves, assinada em Tóquio a 14 de Setembro de 1963, aprovada para ratificação pelo Decreto-Lei n.º 45 904, de 5 de Setembro de 1964.
([5]) Parada Vázquez, loc. cit., pp. 249-250, e “El Comandante de Aeronave: aspectos jurídicos aeronáuticos, civiles y laborales”, Poder Judicial, 2.ª época, n.º 31, Setembro 1993, p. 123 e ss.
([6]) Diederiks-Verschoor, ob. cit., pp. 28-29.
([7]) Segundo E. Ruhwedel (“Die Rechtsstellung des Flugzeugkommandanten im zivilen Luftverkehr”, Schriften zum Deutschen und Europäischen Zivil-, Handels- und Prozessrecht, n.º 27 (1964), p. 109 e s., apud Diederiks-Verschoor, ob. e loc. cits.), esta autoridade radica, quanto aos passageiros, num acordo tácito entre eles e a companhia aérea, e, quanto à tripulação, em delegação de poderes da companhia no comandante, que, assim, fica constituído numa posição de autoridade sobre a tripulação.
([8]) Manuel Serafim Fontes Santos Pinto, Tripulantes de cabina da T.A.P.-Air Portugal, inscritos no S.N.P.V.A.C., Instituto Mediterrânico/Universidade Nova de Lisboa, pp. 231-233.
([9]) Manuel Serafim Pinto, Tripulantes de cabina..., cit., , pp. 74-75. Ao invés, o efectivo de tripulantes técnicos necessários para o serviço de voo tem decrescido «com as novas criações e as inovações tecnológicas aplicadas no avião, onde a ‘automação’ (da gestão dos sistemas de bordo e da navegação) (-) facilitou o desempenho do trabalho na condução do aparelho» (ibidem, p. 76).
([10]) Os aviões Wide body (W.B.) são aviões com dois corredores, normalmente utilizados no longo curso; os aviões Narrow body (N.B.) são aviões de um corredor na cabina, utilizados nas viagens de pequeno e médio-curso (Manuel Serafim Pinto, Tripulantes de cabina ..., cit., p. 43).
([11]) Manuel Serafim Pinto, Tripulantes de cabina ..., cit., pp. 74-75.
([12]) Cf. Parada Vázquez, “Régimen jurídico del personal de vuelo”, cit., p. 247.
([13]) Cf. Perfil Profissional; I.E.F.P – Departamento de Certificação – Comissão Técnica Especializada da Aviação Civil. 1998. Documento incluído no ‘Projecto de Portaria’, relativo às Normas Específicas de Certificação da Aptidão Profissional – Tripulante de Cabina, apud Manuel Serafim Pinto, Tripulantes de cabina ..., cit., pp. 75-76 e 69.
([14]) Manuel Serafim Pinto, Tripulantes de cabina ..., cit., pp. 143-144.
([15]) Infra, n.º 5.2.
([16]) A Convenção Internacional sobre Aviação Civil, assinada em Chicago, a 7 de Dezembro de 1944, foi aprovada, para ser ratificada, pelo Decreto-Lei n.º 36 158, de 17 de Fevereiro de 1947, e entrou em vigor a 4 de Abril de 1947. Criou a Organização de Aviação Civil Internacional (OACI ou IATA), um organismo internacional ao qual compete desenvolver a aviação civil em todos os seus aspectos. Para mais desenvolvimentos, v. Gualdino Rodrigues, As Fontes Internacionais do Direito Aéreo, Dislivro, Lisboa, pp. 31 e ss.
([17]) As normas JAR-OPS 1 «são normas técnicas comuns da aviação, elaboradas pela Organização das Autoridades Comuns da Aviação (JAA), utilizadas em transporte aéreo»; as normas JAR-OPS 3 «são normas técnicas comuns da aviação, elaboradas pela Organização das Autoridades Comuns da Aviação (JAA), utilizadas em transporte aéreo, em operações das aeronaves de asa rotativa» [artigo 4.º, alíneas oo) e pp), do Decreto-Lei n.º 289/2003]. As JAR-OPS 2, referentes a trabalho aéreo, ainda se encontram em fase de projecto. Sobre o regime jurídico das JAA e as normas JAR, v. Gualdino Rodrigues, As Fontes Internacionais do Direito Aéreo, cit., pp. 190 e ss.
([18]) O artigo 83.º do Decreto-Lei n.º 289/2003 remete para as normas JAR-OPS 1.100 (Chefes de cabina), transcritas no anexo 42 daquele diploma.
([19]) Sumário oficial.
([20]) Do preâmbulo. A Portaria n.º 238-A/98 foi revogada pelo artigo 22.º do Decreto-Lei n.º 139/2004.
([21]) A Portaria n.º 408/87, de 14 de Maio, não definia a tripulação de cabina, mas continha a mesma noção de tripulação mínima.
([22]) Do sumário oficial.
([23]) Na sequência dos princípios relativos ao enquadramento legal da formação profissional consagrados no Decreto-Lei n.º 401/91, de 16 de Outubro, o Decreto-Lei n.º 95/92, de 23 de Maio (diploma habilitante da Portaria n.º 133/2003), definiu o regime jurídico da certificação profissional relativa à formação inserida no mercado de emprego. Por sua vez, o Decreto Regulamentar n.º 68/94, de 26 de Novembro (com idêntica habilitação), instituiu as normas gerais para a obtenção de certificados de aptidão profissional (CAP).
([24]) Do preâmbulo da Portaria n.º 133/2003, que estivemos a seguir.
([25]) É o seguinte o texto completo destes quadros de referência, constante do n.º 8.º-2 da Portaria n.º 133/2003:
«Domínio sócio-cultural:
Inglês;
Francês;
Desenvolvimento pessoal, profissional e social;
Ambiente, prevenção, higiene e segurança;
Domínio científico-tecnológico:
Inglês técnico;
Comunicação e atendimento;
Motivação;
Gestão de conflitos;
Liderança e tomada de decisões;
Prevenção e segurança a bordo;
Salvamento e sobrevivência;
Assistência a passageiros e bagagem;
Transporte aéreo – Legislação, normas e procedimentos;
Turismo e património histórico-geográfico e gastronómico;
Tipos e características de aeronaves;
Primeiros socorros;
Serviço geral a bordo;
Equipamentos e comunicações aeronáuticas;
Meteorologia;
Tráfego aéreo;
A empresa e sua organização.»
([26]) Aqui com o sentido de componentes com complexidade tecnológica significativa, equipamentos específicos ou grupos tecnológicos.
([27]) A segurança passiva distingue as colisões primárias das secundárias, influenciando as características físicas dos veículos segundo essas duas direcções, de forma a minimizar os efeitos sobre a integridade humana resultantes de acidente: assim, a segurança passiva inclui a absorção de energia por deformação plástica da estrutura do veículo em caso de colisão com outra estrutura (colisões primárias) e a anulação ou suavização de arestas ou pontos de contacto no interior dos veículos, potencialmente perigosos para os passageiros e tripulação, uma vez que os mesmos ganham movimento em caso de colisão (colisões secundárias).
([28]) Cf., para o desenvolvimento dos conceitos precedentes, Miguel Nuno da Silva Leocádio, Sobre a Incorporação RAMS no Desenvolvimento de Produtos de Base Tecnológica: Uma Abordagem Holística a Veículos Ferroviários, Dissertação para obtenção do Grau de Mestre em Engenharia e Gestão de Tecnologia, Instituto Superior Técnico, Maio 2004, pp. 8, 21-23 e 67-68 (a tese está disponível em http://in3.dem.ist.utl.pt/master/thesis/02files/01thesis.pd); cf. também o preâmbulo do Decreto-Lei n.º 186/2004, de 2 de Agosto (Transpõe para a ordem jurídica nacional a Directiva n.º 2003/102/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 17 de Novembro, na parte que se refere à protecção dos peões, aprovando o Regulamento Relativo à Protecção dos Peões e Outros Utentes Vulneráveis da Estrada em Caso de Colisão com Um Automóvel), e o acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 9 de Abril de 2002, disponível na respectiva base de dados em www.sta.pt.
([29]) Manuel Serafim Pinto, Tripulantes de cabina ..., cit., pp. 130-136 e 236-241, Autor que neste ponto estamos a seguir.
([30]) Cf. Manuel Serafim Pinto, Tripulantes de cabina ..., cit., pp. 132 e 135, aqui com o apoio de textos técnicos especializados.
([31]) Karl Engisch, Introdução ao Pensamento Jurídico, Fundação Calouste Gulbenkian, Lisboa, p. 99.
([32]) J. Baptista Machado, Introdução ao Direito e ao Discurso Legitimador, Almedina, Coimbra, 1990, pp. 181-185). Sobre a matéria, cf. também José de Oliveira Ascensão, O Direito – Introdução e Teoria Geral, 10.ª edição, Almedina, Coimbra, 1997, pp. 400-409. Do Conselho Consultivo, v., sobre interpretação da lei, por exemplo, os Pareceres n.os 10/91, de 21 de Março de 1991 (Diário da República, II Série, n.º 172, de 28 de Julho de 1992), 61/91, de 14 de Maio de 1992 (Diário da República, II Série, n.º 274, de 26 de Novembro de 1992), 50/96, de 16 de Dezembro de 1997 (Diário da República, II Série, n.º 166, de 21 de Julho de 1998), 26/98, de 24 de Setembro de 1998 (Diário da República, II Série, n.º 279, de 3 de Dezembro de 1998), 357/2000, de 17 de Janeiro de 2002 (Diário da República, II Série, n.º 244, de 22 de Outubro de 2002), 1/2003, de 13 de Fevereiro de 2003 (Diário da República, II Série, n.º 132, de 7 de Junho de 2003), e 31/2005, de 30 de Junho de 2005 (Diário da República, II Série, n.º 228, de 28 de Novembro de 2005).
([33]) A questão foi assim enunciada:
«We are dealing with a diferendum with our operators concerning the minimum cabin crew required by JAR-OPS 1.990.
In the cases where an operator designates, for a flight, only the minimum cabin crew, required by JAR-OPS for the purpose of performing duties in the interest of safety and at the same time to provide commercial services on boards (meals, duty free, etc.), what is your understanding / national practice about the share of these two duties (safety and commercial)?
Must the operator designate additional crew members to share the duties?»
([34]) A Flight Safety Foundation é uma organização internacional independente não lucrativa, cuja missão consiste em prosseguir a contínua melhoria da segurança aérea global e a prevenção de acidentes.
([35]) Do latim hospes, aquele que recebe o estrangeiro (hostis) (cf. Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa, tomo XV, Temas e Debates, Lisboa, 2005, p. 4457.
([36]) Cf. a alínea a) da JAR-OPS 1.990 sobre a composição da tripulação de cabina, para que remete o artigo citado.
([37]) Nestes termos, a exposição do Sindicato Nacional do Pessoal de Voo da Aviação Civil referida na nota (1).
([38]) Cf. Baptista Machado, ob. cit., pp. 185-186.
([39]) Cf. os artigos 6.º, alínea c), e 10.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 133/98, de 15 de Maio (Cria o Instituto Nacional de Aviação Civil).
([40]) Cf. o artigo 83.º do Decreto-Lei n.º 289/2003, de 14 de Novembro.
([41]) Artigo 76.º, n.º 1, alínea a), do Decreto-Lei n.º 289/2003.