Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
287/09.3PBMTS-A.P1
Nº Convencional: JTRP00042757
Relator: MARIA ELISA MARQUES
Descritores: SUSPENSÃO PROVISÓRIA DO PROCESSO
INQUÉRITO
JUIZ DE INSTRUÇÃO CRIMINAL
Nº do Documento: RP20090701287/09.3PBMTS-A.P1
Data do Acordão: 07/01/2009
Votação: MAIORIA COM 1 VOT VENC
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REC PENAL.
Decisão: PROVIDO.
Indicações Eventuais: 4ª SECÇÃO - LIVRO 377 - FLS 292.
Área Temática: .
Sumário: No âmbito do art. 281º do Código de Processo Penal, o juiz de instrução pode negar a sua concordância à suspensão provisória do processo com o fundamento de que as injunções e regras de conduta propostas pelo Ministério Público não são suficientes para satisfazer as exigências de prevenção que no caso se fazem sentir.
Reclamações:
Decisão Texto Integral: Proc. n.º 287/09.3PBMTS-A.P1
4ª secção – 2ª secção Criminal


Acordam os Juízes, na Secção Criminal do Tribunal da Relação do Porto

I. Relatório:
1. Nos autos de inquérito acima mencionado, a correr termos no tribunal Judicial de Matosinhos, o Magistrado do Ministério Público, considerando integrarem os factos indiciariamente a prática, pelo arguido B………., de um crime de condução de veículo em estado de embriagues, previsto nos art.º 292 nº 1 e 69º, nº 1, al. a) do Código Penal, punível com prisão até 1 ano ou com pena de multa até 120 dias e com inibição de conduzir de 3 meses a 3 anos e entendendo estar verificado todo o condicionalismo do instituto da suspensão provisória do processo, determinou a apresentação do processo ao Mmº Juiz para os efeitos do nº 1 do cit. art. 281º do Código de Processo Penal[1], dar ou não a sua concordância à referida suspensão provisória do processo.
O auto de suspensão tem o seguinte teor (fls. 31-32 destes autos):
“Confessa que no dia, hora e local referido nos autos tripulava o veiculo em referencia.
Tendo sido fiscalizado por agente policial, foi submetido a exame para pesquisa de álcool no sangue tendo acusado uma TAS de 1,93 g/l.
Está arrependido e aceita uma eventual suspensão provisor/a do processo por seis meses, mediante:
- a injunção da entrega, à instituição C………., situada na localidade da ………., Matosinhos, da quantia de 30 € (trinta euros), por cada mês de suspensão, perfazendo a quantia total de 180 € (cento e oitenta euros), devendo juntar aos autos, mensalmente e até ao dia 8 de cada mês a que respeitar, prova de haver efectuado cada entrega da correspondente e referida prestação mensal;
- a obrigação de não praticar, durante o período de suspensão do processo, qualquer crime doloso, nomeadamente no domínio estradal;
- a entrega da sua carta de condução neste Tribunal, no prazo de 10 dias a contar da data da decisão de concordância pelo período de 15 dias, sendo que, conforme previsto no art. 69.º, n.º 1, al. a), do C. Penal, é de três meses o mínimo da sanção acessória que lhe seria aplicada caso fosse julgado e condenado;
- frequentar durante o período de suspensão o curso de condução segura, dinamizado pela prevenção rodoviária portuguesa, suportando os respectivos custos que ascendem a cerca de 200,00 €.”
O arguido aceitou as condições propostas.
2. O Mmº Juiz de Instrução consignou nos autos o seguinte despacho:
“Pelas razões que agora enuncio, não concordo com a proposta suspensão provisória do processo.
O arguido B………. vem indiciado do cometimento de um crime de condução de veículo em estado de embriaguez, por ter conduzido, na via pública, veículo automóvel com uma apurada TAS de 1.93 g/l.
Sabia que se encontrava sob a influência do álcool e que nesse estado não podia conduzir o referido veículo, mas apesar disso, não se absteve de o fazer. Conhecia a proibição da sua conduta.
O arguido não tem antecedentes criminais, mostra-se arrependido e consciente da gravidade da sua conduta.
Aceitou as injunções propostas pelo Digno Magistrado do M°P° e que são a entrega da quantia de 180 euros à C………. em 6 prestações mensais, a não condução de veículos motorizados pelo período de 15 dias seguidos e não praticar qualquer crime doloso no período da suspensão de 4 meses, correspondente ao da suspensão provisória proposta.
Ora, se é certo que abstractamente estão reunidas as condições para que o presente processo fosse provisoriamente suspenso, a verdade é que no nosso entendimento, não só os factos indiciados não são reveladores de um grau de culpa diminuto, como o cumprimento das injunções propostas, no caso, não responde suficientemente às exigências de prevenção que se fazem sentir (art. 281° als, e) e f), “a contrario”).
É que por um lado, entendemos que a condução de veículo automóvel com a consideravelmente elevada TAS de 1,93g/l é reveladora de um grau de culpa algo elevado, que obsta, por si só, ao decretamento da suspensão provisória do processo. Além do que é demonstrativa de um elevado grau de ilicitude.
Por outro lado, e como é do conhecimento comum, a condução de veículo em estado de embriaguez constitui uma das conhecidas e identificadas causas da elevada sinistralidade rodoviária nas estradas portuguesas, à qual se impõe uma especialmente enérgica reacção.
E é, além do mais, através da aplicação da pena acessória de proibição de conduzir, associada à pena principal aplicada que, as mais das vezes, as exigências de prevenção geral encontram satisfação. E tendo-se presente que as injunções previstas no art. 281° do CPP não correspondem a penas, a verdade é que até a injunção proposta pelo Digno Magistrado do M°P° nesta parte — não condução de veículos pelo período de 15 dias — apresenta-se como muito inferior ao mínimo previsto no art. 69° do CP para a pena acessória de proibição de conduzir aplicável ao crime de condução de veículo em estado de embriaguez, pena esta aplicada a todos aqueles que, não beneficiando da suspensão provisória do processo, são submetidos a julgamento pelo cometimento de idêntico ilícito.
Assim, entendemos que as injunções propostas não respondem, de forma suficiente, às exigências de prevenção que no caso, e pelas razões expostas, se fazem sentir, pelo que, nos termos previstos nos arts. 384° e 281°, todos do CPP, não concordo com a suspensão provisória do processo nos presentes autos,
Notifique, aguarde-se prazo para eventual interposição de recurso e após, remeta os autos aos serviços do Ministério Público.
3. Deste despacho interpôs o MP recurso, formulando na respectiva motivação as seguintes (transcritas) conclusões:
“1. O consentimento judicial à suspensão provisória do processo justifica-se pela necessidade de evitar a aplicação de injunções ou regras de conduta arbitrárias ou desproporcionadas;
2. Num processo de estrutura acusatória, o poder judicial está, sob pena de perder à sua imparcialidade e de «agir em causa própria», vinculado pelo pedido do Ministério Público/assistente;
3. Assim, ao discordar da suspensão provisória do processo por entender que, em concreto, a culpa do arguido é elevada e as injunções e regras de conduta insuficientes, a Mª juíza excedeu os seus poderes, substituiu-se ao Ministério Público e violou o princípio do acusatório, consagrado no artigo 32.°, n.º 5, da CRP;
4. A referida decisão violou, ainda, os artigos 11.° e 12.0 da Lei n.º 51/2007, de 31 de Agosto (que definiu os objectivos, prioridades e orientações de política-criminal para o biénio de 2007-2009) que preconizam a aplicação da suspensão provisória do processo ao crime de condução de veículo em estado de embriaguês ou sob a influência de estupefacientes ou substâncias psicotrópicas;
5. Ainda que, porventura, assim não seja, sempre se dirá que, no caso concreto nem a culpa do arguido é elevada, nem as injunções e regras de conduta propostas insuficientes para satisfazer as necessidades preventivas;
6. Por isso mesmo, a discordância judicial com a suspensão provisória do processo viola o disposto nos artigos 384.° e 281.° do Código de Processo Penal;
7. Assim, a referida decisão deverá ser revogada e substituída por outra que concorde com a suspensão provisória do processo, dessa forma se fazendo justiça.

4. O arguido não respondeu.

5. Subidos os autos a este Tribunal da Relação, o Ex.mo Procurador Geral Adjunto, não emitiu parecer.
6. Foram colhidos os vistos legais.
Procedeu-se a conferencia, com observância do formalismo legal, cumprindo, agora, apreciar e decidir.
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II. Fundamentação:
7. A questão que o recorrente submete à apreciação deste Tribunal ad quem consiste em saber se se verificam os pressupostos consignados no art.º 281.º do Código de Processo Penal – suspensão provisória do processo.
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8. Dispõe o art. 281.º do CPP (no que ao caso interessa):
«1 - Se o crime for punível com pena de prisão não superior a 5 anos ou com sanção diferente da prisão, o Ministério Público, oficiosamente ou a requerimento do arguido ou do assistente, determina, com a concordância do juiz de instrução, a suspensão do processo, mediante a imposição ao arguido de injunções e regras de conduta, sempre que se verificarem os seguintes pressupostos:
a) Concordância do arguido e do assistente;
b) Ausência de condenação anterior por crime da mesma natureza;
c) Ausência de aplicação anterior de suspensão provisória de processo por crime da mesma natureza;
d) Não haver lugar a medida de segurança de internamento;
e) Ausência de um grau de culpa elevado; e
f) Ser de prever que o cumprimento das injunções e regras de conduta responda suficientemente às exigências de prevenção que no caso se façam sentir.
2 - São oponíveis ao arguido, cumulativa ou separadamente, as seguintes injunções e regras de conduta:
a) Indemnizar o lesado;
b) Dar ao lesado satisfação moral adequada;
c) Entregar ao Estado ou a instituições privadas de solidariedade social certa quantia ou efectuar prestação de serviço de interesse público;
d) Residir em determinado lugar;
e) Frequentar certos programas ou actividades;
f) Não exercer determinadas profissões;
g) Não frequentar certos meios ou lugares;
h) Não residir em certos lugares ou regiões;
i) Não acompanhar, alojar ou receber certas pessoas;
j) Não frequentar certas associações ou participar em determinadas reuniões;
l) Não ter em seu poder determinados objectos capazes de facilitar a prática de outro crime;
m) Qualquer outro comportamento especialmente exigido pelo caso.
3 - Não são oponíveis injunções e regras de conduta que possam ofender a dignidade do arguido.
4 – (…)”.
9. Assim, nos casos em que se verifiquem os pressupostos legais e nomeadamente depois de obtido o acordo do arguido e do assistente sobre as injunções e regras de conduta, compete ao Ministério Público determinar com a concordância do juiz de instrução, a suspensão do processo.

Por sua vez ao Juiz de Instrução incumbe verificar a existência dos pressupostos da suspensão do processo e entre eles necessariamente formular um juízo sobre a adequação das injunções e regras de conduta às necessidades de prevenção que se fazem sentir no caso. É essa única interpretação que o normativo no segmento “ser de prever que o cumprimento das injunções e regras de conduta responda suficientemente às exigências de prevenção que no caso se façam sentir” consente.
Por conseguinte, não tem apoio na letra da lei o entendimento restritivo expresso na conclusão 1) de que: “O consentimento judicial à suspensão provisória do processo justifica-se pela necessidade de evitar a aplicação de injunções ou regras de conduta arbitrárias ou desproporcionadas”.

10. Na perspectiva do Ministério Público o juiz ao “discordar da suspensão provisória do processo, por entender que a culpa é elevada e que as injunções e regras de conduta aplicadas são insuficientes, (…) excedeu os seus poderes e violou o principio do acusatório”, e parte do pressuposto que a competência do juiz de instrução, durante o inquérito, é "apenas autorizar ou mesmo praticar os actos que directamente se prendam com a esfera de direitos e liberdades da pessoas. Se ultrapassar essas funções está a usurpar um poder que não é seu, passando de mero árbitro imparcial a juiz algoz”, como se escreve na motivação.
10.1. Porém, no actual figurino processual penal a intervenção do juiz de instrução não se queda apenas pela prática de actos ou autorização para a pratica de actos que podem colidir com direitos, liberdades e garantias está também prevista nomeadamente em actos que exigem operações que “na essência se aproxima muito do trabalho próprio do juiz” como assinala José Souto Moura [2], em que “o Ministério Público pode ser chamado a decidir-se por uma determinação concreta da competência, por uma suspensão, ou por um arquivamento do processo em caso de isenção ou dispensa da pena.” [3], tendo sido justamente por isso que se introduziu na versão final do Código[4] a concordância do juiz de instrução que assim exerce um controle jurisdicional imediato dessa actividade do Ministério Público.[5] Neste quadro está fora de cogitação a invocada usurpação de poderes.

10.2. Violação do principio do acusatório.
A matriz acusatória do processo caracteriza-se, no plano da estrutura e articulação das fases do processo, pela separação de poderes entre o órgão acusador e órgão que julga os factos o que co-determina por sua vez o principio da acusação. Ou seja, quem investiga e acusa não julga e quem julga não investiga previamente os factos nem tem intervenção na acusação – acusação formal prévia (art.º 283º e 285º do CPP).
Ora, nessa medida o mecanismo previsto no art.º 281º, representa uma excepção ou pelo menos um limite a esse principio de acusação uma vez que está delineado justamente como alternativa à acusação. No entanto, o núcleo essencial do principio permanece respeitado na medida em que o MP investiga e imputa factos e propõe verificados os requisitos a suspensão provisória do processo, dependendo a mesma da concordância de outra entidade diferente (juiz), que não intervêm na investigação e muito menos na imputação de factos.

10.3. Argumenta o recorrente com a violação dos art. 11º e 12º da Lei n.º 51/2007, de 31 de Agosto.

A referida Lei define os objectivos, prioridades e orientações de política-criminal para o biénio de 2007-2009, tem como destinatários as policiais e o MP e não os tribunais. É por isso que esta argumentação do recorrente, não tem pertinência.

Improcedem assim estes fundamentos do recurso.

11. Como vimos, o M. mo Juiz a quo, tendo embora reconhecido estarem, em abstracto, reunidas as condições para a suspensão provisória do processo, afastou a aplicação do instituto por considerar que “os factos indiciados não são reveladores de um grau de culpa não elevado, como ainda o cumprimento das injunções propostas, no caso, não responde suficientemente às exigências de prevenção.
Em causa estão pois, a eventual verificação dos pressupostos “ausência de um grau de culpa elevado” e “ ser de prever que o cumprimento das injunções e regras de conduta responda suficientemente às exigências de prevenção que no caso se façam sentir”- al.e) e f) respectivamente do nº 1 do art.º 281.
11.1. Vejamos, o pressuposto “ausência de um grau de culpa elevado”.
Ao emitir o juízo da culpa o aplicador dispõe de uma margem relativamente ampla, e não pode furtar-se, como afirma o Prof. Figueiredo Dias “ a uma compreensão da personalidade do delinquente, a fim de determinar o seu desvalor ético-jurídico e a sua desconformação em face da personalidade suposta pela ordem jurídico-legal. A medida desta desconformação constituirá a medida da censura pessoal que ao delinquente deve ser feita, e, assim, o critério essencial da medida da pena. - “(cf.,. Liberdade; Culpa, Direito penal”, pag. 184).
Ora, no que toca à personalidade do arguido destaca-se o arrependimento demonstrado, que revela capacidade de auto censura e sensibilidade perante o dever ser jurídico-legal o que aliado ao grau de alcoolemia (1,93 g/) com que o arguido conduzia (ainda que se trate de conduta já com alguma gravidade porque potenciadora da sinistralidade rodoviária, não resultaram consequências da mesma) consideramos ser a culpa do arguido de grau médio, o mesmo é dizer não elevado.
Donde neste particular afigura-se assistir razão ao recorrente.
11.2. Também a suspensão do processo pelo período de 6 meses mediante as injunções e regras de conduta propostas de que se destaca a frequência durante o período de suspensão, do curso de condução segura dinamizado pela prevenção rodoviária portuguesa, suportando os respectivos custos respondem adequadamente às necessidades de prevenção que se fazem sentir, com o que se verifica o pressuposto “ser de prever que o cumprimento das injunções e regras de conduta responda suficientemente às exigências de prevenção que no caso se façam sentir” (al. f).
Donde se conclui pela procedência do recurso.
III – DECISÃO:
Visto o que precede, acordam os Juízes desta Relação, em julgar procedente o recurso pelo que em consequência revogam a decisão recorrida, substituindo-a por decisão de concordância com a suspensão provisória do processo.
Sem custas.
*
(Processado e revisto pela 1ª adjunta - relatora por vencimento).

Porto, 1 de Julho de 2009
Maria Elisa da Silva Marques Matos Silva
Arlindo Manuel Teixeira Pinto
Artur Manuel da Silva Oliveira (votei vencido conforme declaração que junto)

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[1] Diploma a que se reportam também as demais disposições legais citadas sem menção de origem.
[2] Cf. José Souto Moura, in “Apontamentos de direito processual penal, III Vol. - Aulas teóricas dadas ao 5º ano, 1994/1995”, coordenadas por Teresa Pizarro Beleza, pag. 83.
[3] ibidem
[4] Como refere o recorrente na versão original do Código a suspensão provisória do processo não dependia do consentimento do juiz, tendo sido motivada pelo Acórdão do TC nº 7/87, de 9 de Janeiro de 1987, que em sede de fiscalização preventiva se pronunciou pela inconstitucionalidade do preceito por entender não ser de aceitar «a atribuição ao M. P. da competência para a suspensão do processo e imposição das injunções e regras de conduta previstas na lei, sem a intervenção de um juiz, naturalmente o juiz de instrução e daí a inconstitucionalidade, nessa medida, dos n.º 1 e 2 do art. 281.º, por violação dos art. 206.º e 32.º, n.º 4 da CRP”, sendo que o referido artº 206º tinha por epígrafe “função jurisdicional”,
[5] Note-se que “Se o arguido cumprir as injunções e regras de conduta, o Ministério Público arquiva o processo, não podendo ser reaberto” – nº 3 do art.º 282º do CPP, quer isto dizer que forma caso decidido.

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Voto vencido no que se refere aos fundamentos do acórdão.
A minha discordância prende-se não com uma eventual limitação do âmbito da apreciação do juiz de instrução – quando é chamado a pronunciar-se sobre a suspensão provisória do processo –, mas com o estatuto e o conteúdo jurisdicional que informam essa sua intervenção. Apresento as seguintes razões [extraídas do projecto de acórdão que apresentei como primeiro relator]:
1. – A suspensão provisória do processo é uma modalidade de arquivamento do inquérito. A par do arquivamento tout court [apoiado na falta de indícios da prática de um crime, da identidade do seu autor ou de condições legais de procedimento], o Ministério Público tem duas outras modalidades de arquivamento: o Arquivamento em caso de dispensa da pena [artigo 280.º, do Código de Processo Penal] e a Suspensão provisória do processo [artigo 281.º, do Código de Processo Penal].
Esta última traduz-se numa medida de consenso e de diversão na solução do conflito penal, especialmente vocacionada para situações de pequena e média criminalidade. Constitui um ténue afloramento do princípio da oportunidade, todo ele regido por critérios legais e objectivos de funcionamento [oportunidade regulada?]: no fundo, perante indícios da prática de um crime e do seu autor o Ministério Público determina, uma vez verificados os requisitos estabelecidos pela Lei, a suspensão provisória do processo, por certo prazo, mediante a imposição ao arguido de injunções e regras de conduta. Se observadas e respeitadas as medidas, segue-se o arquivamento do processo; se incumpridas ou se o arguido vier a cometer, durante o prazo de suspensão, crime da mesma natureza pelo qual venha a ser condenado, então o processo prosseguirá [artigo 282.º, n.º 3 e 4, do Código de Processo Penal].
Na suspensão provisória do processo o Ministério Público decide não exercer a acção penal. São casos em que as circunstâncias justificam – e nessa medida impõem – a cessação do dever de acusar, ou seja, a renúncia à pretensão punitiva do Estado pela não submissão do caso a julgamento. Fundamenta-se em razões de dignificação e de funcionalidade do sistema de justiça penal para casos em que as exigências de prevenção não justificam os custos do prosseguimento formal típico do processo – reserva de intervenção mínima do direito penal, desobstrução da máquina judicial, promoção da economia e celeridade processuais, prossecução de objectivos do programa político-criminal, evita a estigmatização e o efeito dissocializador relativamente a delinquentes ocasionais com prognóstico favorável, etc. [ver Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 67/2006, de 24 de Maio de 2006 (D.R. II série de 9 de Março de 2006)].
A suspensão provisória do processo é, assim, um arquivamento contra injunções e regras de conduta [Manuel da Costa Andrade, in “Consenso e oportunidade – Reflexões a propósito da suspensão provisória do processo e do processo sumaríssimo”, Jornadas de Direito Processual Penal – O novo Código de Processo Penal, p. 319], isto é, um arquivamento condicionado ao prévio cumprimento de injunções e regras de conduta. Claramente, as injunções e regras de conduta não são penas [Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 144/06]. Nem a suspensão provisória do processo é um despacho condenatório, ou sequer uma decisão assente num propósito de censura ético-jurídica. É, isso sim, uma espécie de transacção segundo a qual o arguido aceita respeitar determinadas injunções e regras de conduta e o Ministério Público se compromete a, caso elas sejam cumpridas, desistir da pretensão punitiva e a arquivar o processo [“justiça penal negociada”, como lhe chama Figueiredo Dias, in “Autonomia do Ministério Público e seu dever de prestar contas à comunidade: um equilíbrio difícil”, Revista Portuguesa de Ciência Criminal, Ano 17, n.º 2, pág. 204].
2. – O Ministério Público é um órgão do poder judicial, dotado de autonomia, a quem cabe, além do mais, «exercer a acção penal orientada pelo princípio da legalidade e defender a legalidade democrática» [artigo 219.º, n.º 1 e 2, da Constituição da República Portuguesa e artigos 1.º e 3.º, alínea c), do Estatuto do Ministério Público (Lei n.º 47/86, de 15 de Outubro)]. Toda a sua intervenção processual obedece a critérios de legalidade e de estrita objectividade [artigo 53.º, n.º 1, do Código de Processo Penal], pelos quais responde perante a sociedade [Figueiredo Dias, artigo citado, pág. 181 e ss.].
No âmbito específico do processo penal compete-lhe dirigir o inquérito [artigos 53.º, n.º 2, alínea b), 263.º e 264.º, do Código de Processo Penal], o que pressupõe não só o poder de orientar a investigação criminal [artigo 56.º, do Código de Processo Penal] mas também o de decidir, a final, pelo arquivamento [nas suas diversas modalidades] ou pela acusação [artigos 277.º, 279.º, 280.º e 283.º, do Código de Processo Penal].
Actualmente, a decisão final do inquérito não prevê um controlo judicial. Só em casos de discordância relativamente à decisão do Ministério Público e mediante pedido específico, formulado de forma motivada e circunscrita, pode o juiz de instrução iniciar a fase de Instrução, com vista a comprovar judicialmente tal decisão [artigo 286.º, n.º 1: “A instrução visa a comprovação judicial da decisão de deduzir acusação ou de arquivar o inquérito…”; e artigo 287.º, ambos do Código de Processo Penal].
De facto, o princípio do acusatório [artigo 32.º, n.º 5, da Constituição da República Portuguesa] pressupõe, além do mais, que as entidades que investigam sejam distintas das que julgam. Esta separação envolve não só a correspondente responsabilização de cada um dos órgãos pela fase processual que dirige, mas, sobretudo, a manutenção de duas matrizes funcionais complementares mas independentes, em que a jurisdicional não exerce atribuições de fiscalização e de primazia sobre as decisões do Ministério Público no âmbito do inquérito.
3. – De facto, quando o Tribunal Constitucional se pronunciou pela inconstitucionalidade do artigo 281.º, da versão inicial do Código de Processo Penal [Acórdão n.º 7/87], recusou tanto a ideia de que a actuação do Ministério Público correspondia a uma usurpação do exercício da função jurisdicional, como a ideia de que a decisão de suspensão provisória do processo tomada pelo Ministério Público se pudesse tornar efectiva sem a intervenção do “juiz de instrução” [ver votos de vencido]. E assim, reclamando apenas a apreciação do juiz de instrução acabou por não prescrever uma especial dimensão a essa sua intervenção, que a tornasse diferente daquele que é o seu padrão de competência funcional no âmbito do inquérito.
É que todas as intervenções do juiz de instrução na fase do inquérito ocorrem, unicamente, para assegurar a tutela dos direitos fundamentais do arguido [ver artigos 268.º e 269.º, do Código de Processo Penal]. Isso mesmo tem vindo a ser reconhecido, de modo uniforme, pelo Tribunal Constitucional:
«(...)III - A intervenção do juiz só vale no âmbito do núcleo da garantia constitucional. Assim ocorre em toda a fase de inquérito ao Ministério Publico confiada pelo Código de Processo Penal actual, compreendendo o conjunto de diligencias que visam investigar a existência de um crime, determinar os seus agentes e a responsabilidade deles, descobrir e recolher provas em ordem a decisão sobre acusação (artigo 262º, n. 1), justificando-se a intervenção do juiz-garante sempre que afectado aquele núcleo, consoante o elenco de situações descritas nos artigos 268º e 269º» [acórdão de 31-1-1990 (Tavares da Costa), processo 90-0180, in http://www.dgsi.pt].
«(…) sendo as intervenções do juiz meramente circunstanciais, e sempre com a finalidade de acautelar a rigorosa observância das normas e procedimentos que possam contender com os direitos fundamentais dos cidadãos» – Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 583/2008, que cita o acórdão da Relação de Lisboa, processo n.º 10547/07.9 do TRL, Relator Almeida Cabral).
«(…) justificando-se a intervenção do juiz para salvaguardar a liberdade e a segurança dos cidadãos no decurso do processo-crime e para garantir que a prova canalizada para o processo foi obtida com respeito pelos direitos fundamentais» [acórdão de 9-1-1987, processo 86-0302, in http://www.dgsi.pt/atco];
«(…) Força é que essa concordância [relativa à suspensão provisória do processo] resulte de uma vontade esclarecida e livre. Mas é sobretudo por isso, porque as medidas comportam o risco de contender com direitos, liberdades e garantias e para assegurar que, pelo conteúdo e pelo modo dos comportamentos a que o arguido se compromete, não é afectada a zona de indisponibilidade de direitos fundamentais, que se faz intervir o juiz das garantias. O juiz fiscalizará, com base na ordem jurídico-constitucional dos direitos fundamentais a adequação, necessidade e proporcionalidade da (auto)limitação, bem como a sua racionalidade» [acórdão n.º 144/2006, de 22-2-2006, in http://www.tribunalconstitucional.pt/, todos acedidos em Junho de 2009].
No mesmo sentido vão os seguintes acórdãos da Relação de Lisboa:
«I - A competência do Juiz de Instrução durante a fase de inquérito – presidida pelo Ministério Público – está reservada para actos que interferem com direitos fundamentais e outras matérias que a lei reserva ao juiz, obedecendo a um quadro de intervenção tipificada, em que o Juiz é completamente alheio à estratégia investigatória delineada pelo MP, não exercendo qualquer controlo sobre o exercício da acção penal. Este é o reflexo da estrutura acusatória do nosso sistema processual penal. II - Durante o Inquérito, o Juiz só pode realizar diligências probatórias relativamente a matérias em que seja admitida a intervenção ex officio (arts. 212° e 213°, do CPP), incidindo apenas sobre factos susceptíveis de alterar as medidas coactivas, de modo a obter os elementos julgados necessários para tomar a decisão, não podendo, como em última análise pretendia o recorrente, deferir a realização de diligências que nada têm que ver directamente com a tomada desta decisão, e que bem poderiam conduzir a uma investigação paralela ou ao arrastar da investigação» [acórdão de 17.10.2007 (Conceição Gonçalves), processo 6918/2007-3, in http://www.dgsi.pt]; e
«I - Está excluída da esfera de atribuições do juiz, sempre que a instrução não for requerida, a apreciação dos indícios recolhidos no inquérito. II - Com efeito, não compete ao juiz a indicação e definição dos indícios verificados nem a designação de qual o crime pelo qual deverá ser exercida a acção penal, matéria da exclusiva competência do detentor da acção penal. III - Também se tem entendido uniformemente que só a omissão total de inquérito ou a omissão de diligências reputadas de obrigatórias se pode considerar susceptível de integrar omissão de diligências integradora da nulidade prevista no art.119º., al.d) do C.P.P. que não é confundível com a mera insuficiência de inquérito, nulidade sanável cuja apreciação pelo tribunal pressupõe a sua arguição tempestiva pelo interessado (art.120º., nº.2 al.d) do C.P.P.). IV - Deve, assim, proceder o recurso interposto pelo Ministério Público da decisão que, perante a acusação deduzida pelo crime de condução de veículo em estado de embriaguês, declarou a nulidade do inquérito, decorrente da falta de promoção pelo crime de condução perigosa de veículo rodoviário. V - É que o Ministério Público, a quem compete a direcção do inquérito, realizou os actos que reputou essenciais para a descoberta dos factos imputados ao arguido e que, no seu critério, seriam susceptíveis de integrar o crime de condução em estado de embriaguez, não se vislumbrando que se impusesse a realização de outras diligências, nem que a factualidade apurada levasse necessariamente a configurar a possível incriminação de condução perigosa de veículo rodoviário, p. e p. pelo art. 291º. do Código Penal» [acórdão de 18.09.2007 (Filomena Clemente Lima), Processo 5984/07 5ª Secção, in http://www.pgdlisboa.pt/pgdl/jurel/jur_mostra_doc.php?nid=4204&codarea=57, ambos acedidos em Junho de 2009].
Assim, resulta claro, por um lado, que as funções jurisdicionais do juiz de instrução, no inquérito, se prendem com a prática ou a autorização de actos que se traduzam em ataques a direitos, liberdade e garantias das pessoas: não lhe são reconhecidas competências para sindicar a actividade e a diligência do Ministério Público na investigação, nem para ajuizar da decisão final do inquérito promovida por este. E por outro lado, que o legislador, na esteira do determinado pelo Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 7/87, não divergiu desse plano funcional quando estipulou a intervenção do juiz de instrução na suspensão provisória do processo.
4. – Conjugando os quadros de competências assim definidos, concluo que é ilegal a intromissão do juiz de instrução na decisão de suspensão provisória do processo quando ela se não inscreva na defesa de factores garantísticos. É uma intromissão ilegal na esfera de competências do órgão responsável pelo inquérito, desde logo, porque não é requerida. Mas também porque actua fora do seu próprio contexto de competência jurisdicional no inquérito, que é o núcleo das garantias constitucionais do arguido — surgindo, aqui, a reivindicar uma mais vincada pretensão punitiva do Estado [!], indiferente ao consenso gerado e à definição das responsabilidades atribuídas ao Ministério Público.
Como refere Souto Moura: “(…) a iniciativa de suspensão e correlativas injunções e regras de conduta cabe ao Mº Pº. Qualquer intervenção do juiz à revelia do Mº Pº para se pronunciar sobre a justiça do caso e antes mesmo do exercício da acção penal seria inadmissível” [“Inquérito e instrução”, Jornadas de Direito Processual Penal – O novo Código de Processo Penal, 1988, pág. 115].
Também o Prof. Figueiredo Dias, referindo-se especificamente à suspensão provisória do processo é claro ao afirmar: «(...) a sua [do Ministério Público] decisão de promover ou não promover um processo não pode em caso algum (…) ser comandada pela sua discricionariedade livre (…); mas pode e deve ser comandada pela sua discricionariedade vinculada, isto é ainda, pela sua obediência à lei, aos juízos de valor legais e sobretudo aos programas político-criminais democraticamente definidos e aos quais o Ministério Público deve obediência estrita e pelos quais tem de prestar contas. (…) Uma legalidade que, deste modo, abarca a própria oportunidade discricionariamente vinculada, geradora de uma autonomia que não deve ser ensombrada ou, ainda menos, limitada por interferência de outros órgãos de administração da justiça penal» [escrito antes citado, pág. 205, com sublinhados nossos].
Tal como o juiz de instrução não aprecia, no inquérito, os indícios quando o Ministério Público decide arquivá-lo, nem pode agravar as medidas de coacção por ele propostas [artigos 278.º e 194.º, n.º 2, do Código de Processo Penal]; tal como o juiz de julgamento, no momento em que recebe a acusação, não profere um juízo crítico sobre os indícios dos autos e a sua conformidade à acusação formulada [artigo 311.º, n.º 1 e 2, do Código de Processo Penal; mesmo no caso de notória insuficiência de prova indiciária, como realça o Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 101/01]; assim também, nos casos de suspensão provisória do processo, o juiz de instrução não avalia os indícios do inquérito com vista a determinar que o grau de culpa do arguido é elevado ou que as injunções e deveres de conduta decididas pelo Ministério Público são insuficientes. Intervém, isso sim, para verificar se, na decisão proposta há questões que contendem com direitos fundamentais do arguido.
Deste modo, cabe-lhe:
Verificar se os indícios recolhidos apontam para a existência de um crime e para a identificação do seu autor; e se são suficientes para poder levar o caso a julgamento;
Verificar se a concordância do arguido e do assistente são livres e esclarecidas;
Confirmar a ausência de condenação anterior por crime da mesma natureza e a ausência da aplicação anterior de suspensão provisória do processo por crime da mesma natureza;
Certificar-se que não é caso de aplicação de medida de segurança de internamento;
Verificar se as injunções e regras de conduta aplicadas ofendem a dignidade do arguido e se são desproporcionadas, revelando uma restrição excessiva e injustificada [seguindo de perto João Conde Correia, in “Concordância judicial à suspensão provisória do processo: equívocos que persistem”, Revista do Ministério Público, Ano 30º, Jan-Março 2009, n.º 117, pág. 43 a 83].
Essas são, em minha opinião, as funções que respeitam o quadro específico [genético] de competências do juiz de instrução no inquérito, o juiz das liberdades [Raul Soares da Veiga, “O Juiz de instrução e a tutela de direitos Fundamentais”, Jornadas de Direito Processual Penal e Direitos Fundamentais, pág. 197]. E as que respeitam a competência material exclusiva do Ministério Público para dirigir, realizar e decidir o inquérito.
Por outro lado, esta é a leitura que se harmoniza com o disposto no artigo 307.º, n.º 2, do Código de Processo Penal [se o juiz de instrução sindica, avalia e “julga”, ele próprio, o grau de culpa do arguido e a adequação das medidas, para quê exigir-se a “concordância do Ministério Público”?], distinguindo-se, claramente, da rejeição do requerimento para aplicação de sanção em processo sumaríssimo [artigo 395.º, do Código de Processo Penal – aqui, a Lei concede ao juiz de instrução o poder de rejeitar a “sanção” proposta por se revelar insusceptível de realizar de forma adequada e suficiente as finalidades da punição, e até de ele fixar sanção diferente, na sua espécie ou medida].
Por fim, esta é também a solução que se coaduna com o facto de a lei não prever, no inquérito, qualquer intervenção do juiz de instrução no arquivamento simples [Cui licet quod est plus, licet utique quod est minus – quem pode o mais, pode o menos], pelo que menos sentido faz esperar uma sindicância judicial à bonomia da decisão do Ministério Público nos casos em que o arquivamento impõe o cumprimento de certas medidas e resulta de um consenso entre a acusação e o arguido.
5. – Em suma: o juiz de instrução não julga o inquérito. Como a investigação criminal está entregue ao Ministério Público e aos órgãos de polícia criminal que o coadjuvam, cabe ao juiz de instrução assegurar que a defesa beneficia das garantias constitucionais e infra-constitucionais estabelecidas. Tal é a razão de ser da sua intervenção no âmbito do inquérito e, como nada o excepciona, também no caso da suspensão provisória do processo: é para garantir que o processo cumpre os pressupostos exigidos por lei e que as medidas propostas e aceites não contendem com direitos, liberdades e garantias do arguido, não para exercer revista sobre a decisão do órgão acusador, propondo a agravação das medidas ou eliminando a possibilidade desta forma de arquivamento por considerar que o grau de culpa o não consente. É essa a sua atribuição funcional – e a sua grandeza.
Sobre a convergência, no essencial, da competência exclusiva do Ministério Público para dirigir o inquérito e do controlo das garantias jurisdicionais em beneficio da defesa pelo juiz de instrução, ver “Actes du 6 ème Congrés de l’Association syndicale des magistrats”, Revue de Droit Penal et de Criminologie, 1990, pp. 809 e ss. Alinhamento de princípios – não de modelos de práticas concretas – que muito deve à Recomendação do Comité de Ministros do Conselho da Europa, R.(87) 18, sobre a “simplificação da justiça penal”, adoptada em 17 de Setembro de 1987.]
Daí que, em meu entender é inconstitucional a interpretação dada ao artigo 281.º, do Código de Processo Penal, na medida em que admite a discordância do juiz de instrução com base na consideração de um mais gravoso índice de culpa do agente e [ou] da insuficiência das medidas propostas pelo Ministério Público – por violação do artigo 32.º, n.º 5, da Constituição, que fixa a estrutura acusatória do processo criminal. Com o que o despacho recorrido extravasou as suas competências. Assim, defendi que tal despacho é nulo [artigo 119.º, alínea e), do Código de Processo Penal] e que deveria ser substituído por outro que procedesse à avaliação dos autos nos termos acima definidos.
Naturalmente, com esta interpretação não formulo opinião sobre o modelo político-criminal que nos governa. Apenas dou expressão àquela que me parece ser a leitura integrada que respeita o quadro legal vigente.

Artur Oliveira