Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
789/08.9TTOAZ.P1
Nº Convencional: JTRP00043788
Relator: ALBERTINA PEREIRA
Descritores: HORÁRIO DE TRABALHO
AFIXAÇÃO
Nº do Documento: RP20100412789/08.9TTOAZ.P1
Data do Acordão: 04/12/2010
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REC. PENAL.
Decisão: NEGADO PROVIMENTO.
Indicações Eventuais: 4ª SECÇÃO SOCIAL - LIVRO 100 - FLS. 288.
Área Temática: .
Sumário: I- Nos termos do art.º 179.º do Código do Trabalho, “em todos os locais de trabalho deve ser afixado, em lugar bem visível, um mapa de horário de trabalho, elaborado pelo empregador de harmonia com as disposições legais e com os instrumentos de regulamentação colectiva de trabalho aplicáveis”, sendo que “ As condições de publicidade dos horários de trabalho do pessoal afecto à exploração de veículos automóveis, propriedade de empresas de transportes ou privativos de outras entidades sujeitas às disposições deste Código, são estabelecidas em portaria dos Ministros responsáveis pela área laboral e pelo sector dos transportes, ouvidas as organizações sindicais e de empregadores interessadas.” (n.ºs 1 e 3)
II- Pese embora o art.º 21.º, n.º 1, alínea b), da Lei 99/2003, de 27 de Agosto, que aprovou o Código do Trabalho, refira que: “São revogados os diplomas respeitantes às matérias nele reguladas, designadamente (…) o Decreto-Lei n.º 409/71, de 27 de Dezembro”, da leitura conjugada dos citados dispositivos legais, apenas se pode retirar que o Despacho Normativo 22/87, de 4 de Março, a que se refere o art.º 44.º n.º 2 do DL 409/71, de 27 de Setembro, não foi revogado por aquele normativo legal, mas tão só, como ali expressamente se refere (revogado) o DL 409/71, de 27 de Setembro.
III- Acresce que, como vem sendo entendido, a regulação administrativa só caduca se for revogada a lei que ela se destinou a executar e não for substituída por nova lei, ou tendo sido substituída por nova lei, esta for de conteúdo contrário ao regulamento.
IV- No caso, porém, de a lei regulamentada ser revogada e substituída por outra, na falta de regulamentação expressa, o regulamento emitido mantém-se em vigor em tudo quanto não contrariar a lei nova, ou em tudo quanto for necessário para a execução da nova lei.
V- Deste modo, uma vez que os diplomas em causa assumem a mesma natureza, a sua redacção é semelhante e visam regular a mesma realidade, deve entender-se que o regulamento emitido ao abrigo da lei anterior se mantém actual, sendo aplicável ao presente caso.
VI- Como resulta do art.º 179.º do Código do Trabalho, a responsabilidade pela elaboração e afixação dos mapas de horário de trabalho cabe aos empregadores. O que significa que compete a estes a afixação dos mapas de horário de trabalho e a verificação da manutenção dessa afixação nos respectivos lugares.
VII- Para se observar o citado art.º 179.º do Código do Trabalho, não basta ao empregador dar informação aos seus trabalhadores no que concerne a fazerem-se acompanhar de horário de trabalho, nem tão pouco invocar que o motorista não recebeu qualquer específica instrução da arguida para não se fazer acompanhar do respectivo mapa de horário de trabalho.
Reclamações:
Decisão Texto Integral: Rec. CO 789.08.9TTOAZ.P1
(Rec. CO 789.08.9TTOAZ)

Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação do Porto

1. Relatório
B………….. LDA. não se conformando com a decisão do Mmo. Juiz do Tribunal de Oliveira de Azeméis que, reduzindo a coima que lhe havia sido aplicada pela autoridade administrativa, a sentenciou na coima de 6 UCs (euros 576), conclui do seguinte modo: pela prática de uma contra - ordenação prevista no art.º 179.º, n.º 3 do Código do Trabalho, dela recorre a arguida, concluindo em síntese que não lhe pode ser assacada qualquer responsabilidade pela prática da contra-ordenação que lhe é imputada; sendo que nenhum comportamento ilícito e censurável lhe pode ser imputado, pois o Código do Trabalho expressamente revogou o art.º 22.º, n.º 1, alínea aa), da Lei 99/2003, o constante da Lei 116/99, de 4 de Junho. Não consta da matéria de facto provada factos donde resulte a materialidade da infracção, seja em autoria, co-autoria ou cumplicidade. Nada permite concluir que a inobservância imputada nos autos seja devida à incorrecta organização do empregador ou a negligência sua no cumprimento do dever de fiscalização que a norma lhe impõe. A norma do art.º 179.º do Código do Trabalho, não pode ser aplicada através do Despacho Normativo 22/87, de 4 de Março que foi emitido em execução do n.º 2, do art.º 44.º do DL 409/71, entretanto revogado.

O MP respondeu ao recurso, pugnando pela manutenção do decidido.

Foi recebido o recurso e colhidos os vistos legais.

2. Os Factos
Na primeira instância foram considerados provados os seguintes factos:
1. No dia 16.05.2007, pelas 10,00 horas, na EN 227, Avenida …………, ……….., a arguida mantinha a circular a viatura ligeira de mercadorias, de matrícula ..-..-VQ, conduzida por C………….
2. No dia, hora e local referidos, o condutor da viatura não se fazia acompanhar de mapa de horário de trabalho.
3. A arguida deu informação aos seus trabalhadores no que concerne a fazerem-se acompanhar de horário de trabalho.
4. O motorista C……….. não recebeu qualquer específica instrução da arguida para não se fazer acompanhar do respectivo mapa de horário de trabalho.

3. O Direito
O recurso nas contra-ordenações em segunda instância é restrito à matéria de direito, como resulta do art. 75.º, do DL 433/82, de 27.10 (RGCO), por força do art.º 615.º do Código do Trabalho, salvo verificando-se a existência de vícios no julgamento da matéria de facto previstos no art.º 410.º, n.º 2, do Código de Processo Penal (CPP), caso em que, no recurso penal restrito à matéria de direito, a Relação pode e deve alterar a matéria de facto, se dispuser de todos os elementos probatórios necessários para o efeito; ou, não dispondo desses elementos, deverá a Relação reenviar os autos à 1.ª instância para sanação do vício de acordo com os artigos 426.º e 431.º, alínea a), do CPP - o que não sucede no presente caso.

As questões que importa apreciar - o objecto do recurso - consistem no seguinte:

1. Inaplicabilidade do art.º 179.º do Código do Trabalho, por não aplicabilidade do Despacho Normativo 22/87, de 4 de Março que foi emitido em execução do n.º 2 do art.º 44.º, do DL 409/71, entretanto revogado;

2. Inexistência de factos constitutivos da materialidade da infracção directamente imputada à arguida

3. 1 Da inaplicabilidade do art.º 179.º do Código do Trabalho, por não aplicabilidade do Despacho Normativo 22/87, de 4 de Março que foi emitido em execução do n.º 2 do art.º 44.º, do DL 409/71, entretanto revogado
Determina-se no art.º 179.º n.º 1, do Código do Trabalho, para o que aqui releva, o seguinte: “em todos os locais de trabalho deve ser afixado, em lugar bem visível, um mapa de horário de trabalho, elaborado pelo empregador de harmonia com as disposições legais e com os instrumentos de regulamentação colectiva de trabalho aplicáveis”.
E, no seu n.º 3, que “ As condições de publicidade dos horários de trabalho do pessoal afecto à exploração de veículos automóveis, propriedade de empresas de transportes ou privativos de outras entidades sujeitas às disposições deste Código, são estabelecidas em portaria dos Ministros responsáveis pela área laboral e pelo sector dos transportes, ouvidas as organizações sindicais e de empregadores interessadas.”
Por seu turno, consta do art.º 21.º, n.º 1, alínea b), da Lei 99/2003, de 27 de Agosto, “São revogados os diplomas respeitantes às matérias nele reguladas, designadamente (…) :
b) O Decreto-Lei n.º 409/71, de 27 de Dezembro.
Da leitura conjugada dos referidos dispositivos legais, apenas se pode retirar que o referido Despacho Normativo 22/87, de 4 de Março, não foi revogado por este art.º 21.º, n.º 1, alínea b), da Lei 99/2003.
Com efeito, pese embora aí se refira “diplomas respeitantes às matérias nele reguladas”, deve entender-se que o diploma que foi revogado por tal normativo, foi o DL 409/71, de 27 de Setembro, como expressamente aí é referido, e não o mencionado Despacho Normativo.
Na verdade, a matéria deste não está contemplada no Código do Trabalho, já que no n.º 3 do citado art.º 179.º, se prevê a emissão de uma portaria para regular a matéria a que se refere aquele Despacho Normativo, e que são as “ as condições de publicidade dos horários de trabalho do pessoal afecto à exploração de veículos automóveis, propriedade de empresas de transportes ou privativos de outras entidades sujeitas às disposições”, “deste Código”, na versão do n.º 3 do art.º 179.º, ou “do presente diploma”, na redacção do n.º 2, do art.º 44.º do DL 409/71.
Acresce que, como vem sendo entendido pela doutrina administrativa, a regulação administrativa só caduca se for revogada a lei que ela se destinou a executar e não for substituída por nova lei, ou tendo sido substituída por nova lei, ela for de conteúdo contrário ao regulamento. No caso, porém, de a lei regulamentada ser revogada e substituída por outra, na falta de regulamentação expressa, o regulamento emitido mantém-se em vigor em tudo quanto não contrariar a lei nova, ou em tudo quanto for necessário para a execução da nova lei. Neste sentido, Marcelo Caetano, “Direito Administrativo”, Volume I, pág. 180, Almedina, Afonso Queiró, “Teoria dos Regulamentos”, in Revista de Direito e Estudos Sociais, 1986, n.º 1, pág. 26.
Nesta medida, uma vez que os diplomas em causa assumem a mesma natureza, a sua redacção é semelhante, visando regular a mesma realidade, deve considerar-se que o regulamento emitido ao abrigo da lei anterior se mantém actual, sendo aplicável ao presente caso. Neste sentido, entre outros, o acórdão do TRC de 2.02.2006, processo 3.782/05, www.dgsi.pt.
Improcedem, assim, as conclusões de recurso.

3.2 Da inexistência de factos constitutivos da materialidade da infracção directamente imputada à arguida
Pretende a arguida que embora os factos tenham sido praticados pelo condutor, impunha-se constasse da matéria de facto a pertinente factualidade que nos permitisse concluir pela sua autoria, co-autoria ou cumplicidade na prática da infracção.
Não tem razão.
Como resulta do teor do art.º 179.º do Código do Trabalho, a responsabilidade pela elaboração e afixação dos mapas de horário de trabalho cabe aos empregadores. Pretende-se que a esse elemento possam ter acesso os respectivos trabalhadores e demais entidades inspectivas - numa actividade, em que os tempos de trabalho e respectivas pausas são essenciais em termos de segurança rodoviária e não só.
Compete, pois, ao empregador afixar os mapas de horário de trabalho, e verificar se essa afixação se mantém nos respectivos lugares. Não basta, por isso, ao empregador dar informação aos seus trabalhadores no que concerne a fazerem-se acompanhar de horário de trabalho, nem tão pouco invocar que o motorista não recebeu qualquer específica instrução da arguida para não se fazer acompanhar do respectivo mapa de horário de trabalho. O que importa, é que o empregador elabore e afixe (ou faça afixar) no local o mapa de horário de trabalho, dada a função reguladora e informativa deste documento, no que concerne aos tempos de trabalho dos trabalhadores em causa.
Se assim se não entendesse, seria praticamente impossível sancionar a omissão da sobredita conduta, pois, a entidade patronal, naturalmente, invocaria a desobediência do trabalhador às suas ordens e este sempre alegaria a não entrega do mapa por banda daquela.
A materialidade apurada é, assim, bastante para se imputar à arguida a sobredita infracção, termos em que improcedem, também quanto a este aspecto, as conclusões de recurso.

4. Decisão
Em face do exposto, nega-se provimento ao recurso, mantendo-se a decisão recorrida.

Custas pela arguida, com taxa de justiça em 4 UCs.

Porto, 2010.04.12
Albertina das Dores N. Aveiro Pereira
Paula A. P. G. Leal S. Mayor de Carvalho
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SUMÁRIO

I. Nos termos do art.º 179.º do Código do Trabalho, “em todos os locais de trabalho deve ser afixado, em lugar bem visível, um mapa de horário de trabalho, elaborado pelo empregador de harmonia com as disposições legais e com os instrumentos de regulamentação colectiva de trabalho aplicáveis”, sendo que “ As condições de publicidade dos horários de trabalho do pessoal afecto à exploração de veículos automóveis, propriedade de empresas de transportes ou privativos de outras entidades sujeitas às disposições deste Código, são estabelecidas em portaria dos Ministros responsáveis pela área laboral e pelo sector dos transportes, ouvidas as organizações sindicais e de empregadores interessadas.” (n.ºs 1 e 3)
II. Pese embora o art.º 21.º, n.º 1, alínea b), da Lei 99/2003, de 27 de Agosto, que aprovou o Código do Trabalho, refira que: “São revogados os diplomas respeitantes às matérias nele reguladas, designadamente (…) o Decreto-Lei n.º 409/71, de 27 de Dezembro”, da leitura conjugada dos citados dispositivos legais, apenas se pode retirar que o Despacho Normativo 22/87, de 4 de Março, a que se refere o art.º 44.º n.º 2 do DL 409/71, de 27 de Setembro, não foi revogado por aquele normativo legal, mas tão só, como ali expressamente se refere (revogado) o DL 409/71, de 27 de Setembro.
III. Acresce que, como vem sendo entendido, a regulação administrativa só caduca se for revogada a lei que ela se destinou a executar e não for substituída por nova lei, ou tendo sido substituída por nova lei, esta for de conteúdo contrário ao regulamento.
IV. No caso, porém, de a lei regulamentada ser revogada e substituída por outra, na falta de regulamentação expressa, o regulamento emitido mantém-se em vigor em tudo quanto não contrariar a lei nova, ou em tudo quanto for necessário para a execução da nova lei.
V. Deste modo, uma vez que os diplomas em causa assumem a mesma natureza, a sua redacção é semelhante e visam regular a mesma realidade, deve entender-se que o regulamento emitido ao abrigo da lei anterior se mantém actual, sendo aplicável ao presente caso.
VI. Como resulta do art.º 179.º do Código do Trabalho, a responsabilidade pela elaboração e afixação dos mapas de horário de trabalho cabe aos empregadores. O que significa que compete a estes a afixação dos mapas de horário de trabalho e a verificação da manutenção dessa afixação nos respectivos lugares.
VII. Para se observar o citado art.º 179.º do Código do Trabalho, não basta ao empregador dar informação aos seus trabalhadores no que concerne a fazerem-se acompanhar de horário de trabalho, nem tão pouco invocar que o motorista não recebeu qualquer específica instrução da arguida para não se fazer acompanhar do respectivo mapa de horário de trabalho.