Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
1006/07.4TTGMR.P1
Nº Convencional: JTRP00043544
Relator: FERREIRA DA COSTA
Descritores: CONTRATO DE TRABALHO
CATEGORIA PROFISSIONAL
Nº do Documento: RP201002081006/07.4TTGMR.P1
Data do Acordão: 02/08/2010
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO.
Decisão: NEGADO PROVIMENTO.
Indicações Eventuais: 4ª SECÇÃO (SOCIAL) - LIVRO 96 - FLS 76.
Área Temática: .
Sumário: I - Nos termos do art. 151º, 1, do CT (2003), o trabalhador deve, em princípio, exercer funções correspondentes à actividade para que foi contratado.
II - Daí que, se for atribuída pelo empregador uma categoria que não corresponda ao real objecto da prestação do trabalhador, tal atitude é juridicamente irrelevante, tendo o trabalhador direito a ser reclassificado na categoria devida.
III - De igual modo, se a retribuição auferida for inferior à categoria atribuída – ou que devia ser atribuída – pelo empregador, o trabalhador tem direito à retribuição prevista para tal categoria.
IV - Não tendo sido dadas como provadas as funções concretamente desempenhadas pelo autor, não tem o mesmo direito a que lhe seja atribuída a categoria profissional de electricista, com definição do tipo de actividade desempenhado.
Reclamações:
Decisão Texto Integral: Reg. N.º 643
Proc. N.º 1006/07.4TTGMR.P1



Acordam no Tribunal da Relação do Porto:


B………. deduziu em 2007-11-22 contra C………., S.A. a presente acção declarativa, emergente de contrato individual de trabalho, com processo comum, pedindo que se condene a R. a:
I – Classificar o A. na categoria profissional de electricista de exploração com efeitos desde Maio de 2007, com todos os direitos inerentes e
II – Pagar ao A.:
a) A quantia de € 27.876,27, relativa a diferenças salariais, acrescida dos juros vencidos, no montante de € 11.760,37, para além dos vincendos e
b) A quantia que se vier a liquidar referente ao pagamento de todas as diferenças salariais que se forem vencendo na pendência da acção e respectivos juros.
Alega o A., para tanto e em síntese, que tendo sido admitido ao serviço da Junta de Freguesia ………., concelho de Guimarães, como electricista, na distribuição de energia eléctrica, veio a ser integrado na antecessora da R. após a respectiva concessão ter sido transferida daquela para esta e depois de o Tribunal do Trabalho de Guimarães, por sentença de 1991-12-02, transitada em julgado, ter condenado esta a integrar o A. nos seus quadros de pessoal efectivo, com efeitos reportados a 1990-05-02, como electricista de exploração e com todos os direitos inerentes. Porém, foi o A. integrado na categoria de electricista de redes I pelo que veio pedir as correspondentes diferenças salariais, face ao disposto no Acordo de Empresa aplicável e juros de mora vencidos e vincendos.
Contestou a R., alegando em síntese que a sentença de 1991-12-02 do Tribunal do Trabalho de Guimarães, a condenou a integrar o A. nos seus quadros de pessoal efectivo, como electricista, sendo certo que este, tanto antes como depois de tal integração, sempre exerceu concretamente funções enquadráveis na categoria profissional, atento o ACT/C………., de electricista de redes II, nível 6B pelo que assim tendo sido, por si, classificado e feito progredir na carreira, com a inerente retribuição, deve ser absolvida do pedido.
O A. respondeu à contestação.
Procedeu-se a julgamento com gravação da prova pessoal, tendo-se assentado os factos considerados provados e não provados pela forma constante do despacho de fls. 445 a 449, sem reclamações.
Proferida sentença, foi a acção julgada improcedente.
Inconformado com o assim decidido, veio o A. interpôr recurso de apelação, pedindo a revogação da sentença, tendo formulado a final as seguintes conclusões:

A. Vem o presente recurso da sentença que julgou não provada e improcedente a presente acção, e consequentemente absolveu a ré da totalidade do pedido formulado pelo autor.
B. O recorrente discorda dessa decisão por duas razões: interpretação da sentença proferida pelo Tribunal de Trabalho de Guimarães, em 02/12/91 e impugnação da matéria de facto e reapreciação da prova gravada.
C. Quanto à primeira razão, conforme foi alegado na petição inicial, por sentença proferida pelo Tribunal de Trabalho de Guimarães, em 02/12/91, já transitada em julgado, foram dados como provados, e são verdadeiros entre outros, os seguintes factos: XVIII) Os autores encontravam-se ao serviço da Junta de Freguesia de ………., no dia 02 de Maio de 1990, quando a C………. assumiu os mesmos serviços, com a categoria de electricista de exploração e motorista, respectivamente, auferindo o vencimento ilíquido de 83.100$00 e subsídio de alimentação;
D. Alegou-se ainda que, atenta a matéria de facto dada como provada, o Tribunal julgou procedente a acção intentada pelo autor e em consequência condenou a então D………., EP a integrá-lo nos seus quadros de pessoal efectivo, com efeitos a partir de 2 de Maio de 1990, como electricista de exploração, com todos os direitos inerentes, designadamente remunerações vencidas desde aquela data e as regalias inseridas nos artigos 52, 53 e 54 do contrato de concessão celebrado com a Câmara Municipal de ………. .
E. Foi junta aos autos (com a pi) cópia da referida sentença e durante a 1.ª sessão de audiência de discussão e julgamento cópia da respectiva petição inicial e das duas contestações, destinadas a provar o alegado nos artigos 5° e 6º da petição inicial, ou seja, demonstrativos de que nessa acção foi discutida não só a reintegração do recorrente (electricista de exploração) como a categoria a reintegrar.
F. Deste modo, cabia à recorrida reintegrar o recorrente na categoria profissional de electricista de exploração, já que por um lado nessa sentença foi discutida a reintegração e categoria a reintegrar e por outra porque conforme escreve Miguel Teixeira de Sousa (in "Estudos sobre o Novo Processo Civil", 1997, págs. 578/9) "como toda a decisão é a conclusão de certos pressupostos (de facto ou de direito) o respectivo caso julgado encontra-se sempre referenciado a certos fundamentos. Assim, reconhecer que a decisão está abrangida pelo caso julgado não significa que ela valha, com esse valor, por si mesma e independentemente dos respectivos fundamentos. Não é a decisão, enquanto conclusão do silogismo judiciário, que adquire o valor de caso julgado, mas o próprio silogismo considerado no seu todo: o caso julgado incide sobre a decisão como conclusão de certos fundamentos e atinge esses fundamentos enquanto pressupostos daquela decisão.
G. No mesmo sentido vide ainda Rodrigues Bastos (in ob. cit., pág. 200) e Ac. RP 09/09/08 (n.º conv. JTRP00041642), in www.dgsi.pt.
H. Face ao exposto, o Tribunal a quo deveria ter dado como provados os factos constantes dos artigos 5° e 6° da petição inicial, e em consequência reintegrado o autor na categoria profissional de electricista de exploração, condenando a ré no respectivo pedido.
I. Quanto à questão da impugnação da matéria de facto e reapreciação da prova gravada, diga-se que independentemente do teor da sentença acima referida, na presente acção, foi ainda alegado, no art.º 17° da pi. que o autor já quando se encontrava ao serviço da Junta de Freguesia de ………. exercia as tarefas correspondentes à categoria profissional de electricista de exploração.
J. Isso mesmo ficou inequivocamente demonstrado pelo depoimento de parte prestado pelo próprio autor assim como pelas testemunhas E………. e F………., cujas passagens mais relevantes adiante se transcrevem - depoimentos gravados no sistema habilus (módulo Habilus Media Studio) - no dia 09/10/08 respectivamente entre as 10:09:18H e as 12:16:37h, as 14:41:02H e as 15:25:26h e as 16:09:12H e as 16:45:33h.
K. Com efeito, do depoimento das testemunhas supra, decorre inequivocamente que o autor, durante o período em que trabalhou na junta de freguesia exerceu as tarefas correspondentes à categoria profissional de electricista de exploração, nomeadamente efectuava, em colaboração com o despacho, manobras de rotina ou emergência, em subestações, PT e PS, substituía os automatismos, conduzia, controlava e actuava para a manutenção das condições de exploração; efectuava manobras de aparelhagem e preparava painéis para trabalhos, efectuava pesquisas, localizava e reparava avarias em redes e instalações; efectuava ou colaborava na conservação de redes, instalações e equipamentos; efectuava leituras, cálculos e registava os resultados; lia e interpretava mapas, esquemas, plantas e instruções técnicas e de serviço; efectuava relatórios dos trabalhos efectuados. Note-se que a testemunha E………. era juntamente com o autor trabalhador da Junta de Freguesia de ………., pelo que tem conhecimento pessoal e directo dos factos.
L. Atendendo ao acima referido, o Tribunal a quo devia ter dado com provados os factos constantes dos artigos 6°, 9° e 17° da petição inicial e consequentemente provada a matéria de facto correspondente ao estatuto remuneratório com as alegadas diferenças pecuniárias, constante dos artigos 10°, 11°, 12°, 13°, 14°, 15°, 16°, 18°, 19°,20°,21°, 22°, 23°, 24°, 25°, 26°, 27°, 28°, 29°, 30°, 31°, 32°, 33°, 34°, 35°, 36°, 37º, 38°, 39°, 40°, 41°, 42°, 43°, 44°, 45°,46°,47°,48°,49°,50°,51°,52°, 53°, 54°, 55°, 56°, 57°, 58°, 59°, 60°, 61°, 62°, 63°, 64°, 65°, 66°, 67°, 68°, 69°, 70°, 71°, 72°, 73°, 74°, 75°, 76°, 77°, 78°, 79°, 80°, 81°, 82°, 83°, 84°, 85°, 86°, 87°, 88°, 89°, 90°, 91°, 92°, 93°, 94°, 95°, 96°, 97º, 98°, 99°, 100°, 101°, 102°, 103°, 104°, 105°, 106°, 107º, 108º, 109°, 110°, 111°, 112°, 113°, 114°, 115°, 116°, 117°, 118º, 119°, 120°, 121°, 122°, 123°, 124°, 125°, 126°, 127º, 128º, 129°, 130°, 134° e 135° da petição inicial.
Em contrapartida a matéria de facto assente nos pontos 7°, 8°, 9°, 10°, 11° e 12° da sentença recorrida deveria ter sido dada como "não provada".
M. Pelo exposto, deve a decisão recorrida ser alterada também nesta parte.

A R. apresentou a sua contra-alegação, pedindo a confirmação da sentença.
A Exm.ª Sr.ª Procuradora-Geral Adjunta, nesta Relação, emitiu douto parecer no sentido de que a apelação não merece provimento.
Admitido o recurso, foram colhidos os vistos legais.

Cumpre decidir.

São os seguintes os factos dados como provados pelo Tribunal a quo:
1 - A ré é urna empresa que se dedica ao estabelecimento e exploração do serviço público de produção, transporte e distribuição de energia eléctrica no continente.
2 - Ao suceder à antiga empresa "D………., E.P." transmitiu-se, também, para a ré a posição de empregadora nos contratos de trabalho dos respectivos trabalhadores, entre os quais o autor.
3 - Na .ª secção deste Tribunal havia corrido termos a acção nº …/90, sob a forma de processo comum, no âmbito da qual foi proferida sentença transitada em julgado, condenando a "D………., EP" a integrar nos seus quadros de pessoal efectivo, com efeitos a partir de 2 de Maio de 1990, o B………., como electricista e com todos os direitos inerentes, designadamente remunerações vencidas desde essa data - conforme resulta do teor de fls. 13 a 18 destes autos e aqui dado, integralmente, por reproduzido.
4 - Neste contexto, o autor foi integrado nos quadros da ré para trabalhar, corno trabalhou, sob as ordens e direcção desta e mediante uma retribuição.
5 - Inicialmente, a ré atribuiu-lhe a categoria profissional de electricista de redes I (6A) e pagou-lhe a retribuição mensal ilíquida de 83.100$00 (que corresponde a € 414,50), acrescida de subsídio de alimentação. Sendo essa retribuição decomposta por: 68.950$00 a título de remuneração-base, 4.398$00 a título de anuidades (contadas desde 2 de Maio de 1985) e 9.752$00 a título de remanescente da remuneração normal (constituída por aqueles dois primeiros valores).
6 - Depois, na sequência de uma reclamação do autor, a ré atribuiu-lhe a categoria profissional de electricista de redes II (6B), reportada à data da sua integração e pagou-lhe a retribuição mensal ilíquida de 83.364$00 (que corresponde a € 415,82) acrescida de subsídio de alimentação. Sendo essa retribuição decomposta por: 73.400$00 a título de remuneração-base, 4.398$00 a título de anuidades e 5.566$00 a título de remanescente da remuneração normal (constituída por aqueles dois primeiros valores).
7 - Neste contexto, a ré pagou ao autor as respectivas diferenças salariais reportadas àquela primeira data (2/5/1990) - nos termos constantes de fIs. 139 a 145 e 426 a 436 dos autos e cujo teor aqui se dá por reproduzido.
8 - Aquando da sua integração na ré, o autor continuou a desempenhar as seguintes tarefas, no domínio da distribuição de energia eléctrica em baixa tensão:
- efectuar a detecção e reparação de avarias em instalações de alimentação a consumidores de baixa tensão;
- ligar baixadas, ramais e contadores simples directos;
- fazer cortes e dar assistência a consumidores;
- recolher elementos para a elaboração de orçamentos e chegadas;
- montar, ampliar e conservar redes e instalações eléctricas de baixa tensão;
- montar e regular comandos de iluminação pública.
9 - E passou a efectuar, sob orientação, manobras com seccionadores e disjuntores (no domínio da baixa tensão).
10 - Desde o dia 1 de Maio de 1985 até ao dia 2 de Maio de 1990, o autor esteve ao serviço da Junta de Freguesia de ………., durante o qual passou a estar adstrito à rede eléctrica com a designação profissional de electricista e a auferir o vencimento mensal ilíquido de 83.100$0 (que corresponde a € 414,50) acrescido de subsídio de alimentação.
11 - A Junta de Freguesia de ………. tinha a concessão da distribuição de energia eléctrica, em baixa tensão, nas freguesias de ………. e ………., até que no dia 2 de Maio de 1990, a D………. tomou a exploração dessa mesma rede de distribuição.
12 - Enquanto esteve ao serviço daquela Junta de Freguesia, o autor desempenhava tarefas, totalmente, idênticas às aludidas no item 8 e, em casos de necessidade (tais como mudar o transformador ou substituir fusíveis), entrava no primário dos respectivos postos de transformação (nos quais a energia eléctrica recebida em média tensão era, automaticamente, transformada em baixa tensão).
13 - Desde a sua integração na ré, o autor teve a progressão profissional e remuneratória descritas a fls. 131, 137, 138 e 146 destes autos e cujo teor aqui se dá por, totalmente, reproduzido.
14 - O autor, em 1992, concluiu o ciclo preparatório sem língua estrangeira e um curso de electricidade na área profissional de electricidade e electrónica e, entre 1995 e 2007, frequentou na ré várias acções de formação - tudo nos termos descritos a fls.132 e 136 dos autos e cujo teor aqui se dá por reproduzido.

Fundamentação.
Sendo pelas conclusões do recurso que se delimita o respectivo objecto[1], como decorre das disposições conjugadas dos Art.ºs 684.º, n.º 3 e 690.º, n.º 1, ambos do Cód. Proc. Civil, ex vi do disposto no Art.º 87.º, n.º 1 do Cód. Proc. do Trabalho de 2000, salvo tratando-se de matérias de conhecimento oficioso de que o Tribunal ad quem pode conhecer por sua iniciativa, o que não ocorre in casu, são duas as questões a decidir nesta apelação, a saber:
I – Alteração da matéria de facto.
II – Categoria profissional: electricista de exploração.

Matéria de facto.
A 1.ª questão.
Trata-se de saber se deve ser alterada a matéria de facto, dando como provados os factos constantes dos artigos 6°, 9° e 17° da petição inicial e como não provados os pontos 7°, 8°, 9°, 10°, 11° e 12° da sentença. Refere o A. também que deve ser dada como “…consequentemente provada [para além dos factos constantes dos artigos 6°, 9° e 17° da petição inicial] a matéria de facto correspondente ao estatuto remuneratório com as alegadas diferenças pecuniárias, constante dos artigos 10°, 11°, 12°, 13°, 14°, 15°, 16°, 18°, 19°,20°,21°, 22°, 23°, 24°, 25°, 26°, 27°, 28°, 29°, 30°, 31°, 32°, 33°, 34°, 35°, 36°, 37º, 38°, 39°, 40°, 41°, 42°, 43°, 44°, 45°,46°,47°,48°, 49°,50°, 51°,52°, 53°, 54°, 55°, 56°, 57°, 58°, 59°, 60°, 61°, 62°, 63°, 64°, 65°, 66°, 67°, 68°, 69°, 70°, 71°, 72°, 73°, 74°, 75°, 76°, 77°, 78°, 79°,80°,81°,82°,83°,84°, 85°, 86°, 87°, 88°, 89°, 90°, 91°, 92°, 93°, 94°, 95°, 96°, 97º, 98°, 99°, 100°, 101°, 102°, 103°, 104°, 105°, 106°, 107º, 108º, 109°, 110°, 111°, 112°, 113°, 114°, 115°, 116°, 117°, 118º, 119°, 120°, 121°, 122°, 123°, 124°, 125°, 126°, 127º, 128º, 129°, 130°, 134° e 135° da petição inicial.”.
Ora, dispõe o Art.º 690.º-A, n.ºs 1 e 2 do Cód. Proc. Civil, o seguinte:
1. Quando se impugne a decisão proferida sobre a matéria de facto, deve o recorrente obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição:
a) Quais os concretos pontos de facto que considera incorrectamente julgados;
b) Quais os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida.
2 - No caso previsto na alínea b) do número anterior, quando os meios probatórios invocados como fundamento do erro na apreciação das provas tenham sido gravados, incumbe ainda ao recorrente, sob pena de rejeição do recurso, indicar os depoimentos em que se funda, por referência ao assinalado na acta, nos termos do disposto no n.º 2 do artigo 522.º-C[2].

Por sua vez, estabelece o n.º 2 do Art.º 522.º-C do mesmo diploma, o seguinte:
2 - Quando haja lugar a registo áudio ou vídeo, deve ser assinalado na acta o início e o termo da gravação de cada depoimento, informação ou esclarecimento[3].

In casu, o A., ora apelante, indicou quais os concretos pontos de facto que considera incorrectamente julgados, que ora se transcrevem:
I – Da petição inicial:
6. Competia à D………. integrar o autor na categoria de electricista de exploração.
9. Desrespeitando a sentença que havia sido proferida pelo Tribunal do Trabalho de Guimarães, a Ré reintegrou o autor não na categoria profissional de electricista de exploração II, mas de electricista de redes I.
17. Naquela altura, as funções do autor … consistiam em efectuar, em colaboração com o despacho, manobras de rotina ou emergência, em subestações, PT e PS, substituir os automatismos, conduzindo, controlando e actuando para manutenção das condições de exploração; efectuar manobras de aparelhagem e preparar painéis para trabalhos, efectuar a pesquisa, localização e reparação de avarias em redes e instalações; efectuar ou colaborar na conservação de redes, instalações e equipamentos; efectuar leituras, cálculos e registar os resultados; ler e interpretar mapas, esquemas, plantas e instruções técnicas e de serviço; efectuar relatórios dos trabalhos efectuados.
II – Da lista dos factos provados, constantes da sentença:
7 - Neste contexto, a ré pagou ao autor as respectivas diferenças salariais reportadas àquela primeira data (2/5/1990) - nos termos constantes de fIs. 139 a 145 e 426 a 436 dos autos e cujo teor aqui se dá por reproduzido.
8 - Aquando da sua integração na ré, o autor continuou a desempenhar as seguintes tarefas, no domínio da distribuição de energia eléctrica em baixa tensão:
- efectuar a detecção e reparação de avarias em instalações de alimentação a consumidores de baixa tensão;
- ligar baixadas, ramais e contadores simples directos;
- fazer cortes e dar assistência a consumidores;
- recolher elementos para a elaboração de orçamentos e chegadas;
- montar, ampliar e conservar redes e instalações eléctricas de baixa tensão;
- montar e regular comandos de iluminação pública.
9 - E passou a efectuar, sob orientação, manobras com seccionadores e disjuntores (no domínio da baixa tensão).
10 - Desde o dia 1 de Maio de 1985 até ao dia 2 de Maio de 1990, o autor esteve ao serviço da Junta de Freguesia de ………., durante o qual passou a estar adstrito à rede eléctrica com a designação profissional de electricista e a auferir o vencimento mensal ilíquido de 83.100$0 (que corresponde a € 414,50) acrescido de subsídio de alimentação.
11 - A Junta de Freguesia de ………. tinha a concessão da distribuição de energia eléctrica, em baixa tensão, nas freguesias de ………. e ………., até que no dia 2 de Maio de 1990, a D………. tomou a exploração dessa mesma rede de distribuição.
12 - Enquanto esteve ao serviço daquela Junta de Freguesia, o autor desempenhava tarefas, totalmente, idênticas às aludidas no item 8 e, em casos de necessidade (tais como mudar o transformador ou substituir fusíveis), entrava no primário dos respectivos postos de transformação (nos quais a energia eléctrica recebida em média tensão era, automaticamente, transformada em baixa tensão).
Por outro lado, o recorrente indicou quais os concretos meios probatórios que impõem decisão diversa da recorrida, que são, quer o depoimento de parte do A., quer os depoimentos das testemunhas E………. e F………., que se encontram gravados em CD.
Acresce que a recorrida indicou como meios de prova os depoimentos das testemunhas F………., G………. e H………., que se encontram também gravados em CD.
Por último, apelante e apelada transcreveram, em grande parte, os depoimentos invocados.
Ora, tendo o apelante dado cumprimento aos ónus legais acima assinalados, a Relação pode alterar a matéria de facto, nos termos do disposto no Art.º 712.º, n.ºs 1 e 2 do Cód. Proc. Civil.
Importa, no entanto, que o faça com a parcimónia devida.
Na verdade, o contacto directo com os depoentes em audiência permite colher impressões do comportamento de cada um deles que habilitam o Juiz a concluir pela veracidade ou não dos respectivos depoimentos, o que é impossível de transmitir através da reprodução dos registos sonoros. E, mesmo relativamente ao registo vídeo, a sua reprodução não possibilita a interacção da pergunta-resposta, típica do diálogo da audiência, ficando os Juízes numa posição passiva ou estática, tendo de se conformar com o material que lhes é dado, pois não podem pedir esclarecimentos, por exemplo. De qualquer forma, sendo os nossos registos apenas sonoros, a sua falibilidade é muito maior.
É por isso que se tem entendido que o Tribunal da Relação só deve alterar a matéria de facto nos casos de manifesta e clamorosa desconformidade dos factos assentes com os meios de prova disponibilizados nos autos, dando assim prevalência ao principío da oralidade, da prova livre e da imediação[4].
In casu, procedemos à audição de todos os depoimentos produzidos em audiência de julgamento, não apenas os indicados pelo apelante e pela apelada, isto é, ouvimos também os depoimentos produzidos pelas testemunhas I.........., J.......... e K.........., a fim de ficarmos com uma ideia global do conjunto da discussão e julgamento.
Efectuada tal audição, com atenção, verificamos que os depoimentos elencados pelas partes são os mais importantes em vista da tese por cada uma defendida, sendo que os três restantes respeitam mais a conhecimento mediato da matéria em discussão ou a outras matérias.
Por outro lado, as transcrições dos depoimentos efectuadas pelas partes nas alegações do recurso correspondem aos depoimentos prestados, embora sejam parciais.
Deve referir-se, noutra vertente, que salvaguardada a experiência de vida, subjectividade, ponto de vista e até interesse, inerente a cada um dos depoentes, afigura-se-nos que o A. e as testemunhas depuseram em conformidade com a realidade dos factos.
Analisados criticamente tais depoimentos, cremos poder afirmar que o A. na Junta de Freguesia de .........., de ora em diante, apenas, JF.........., exercia a actividade de electricista desde o posto de transformação, PT, inclusive, até ao consumidor final, particulares ou pequenas empresas. Nos trabalhos a efectuar no PT actuava depois de desligar a corrente, portanto, trabalhava sem tensão, embora na rede que ligava o PT ao consumidor final, rede de baixa tensão, pudesse trabalhar em tensão, envergando luvas adequadas. Acresce que a JF.......... comprava à D.......... energia em média tensão, 15.000 volts, que era transformada automaticamente, isto é, sem intervenção humana, [como expressamente foi referido em julgamento pela testemunha G..........], no PT em energia de baixa tensão, de 220-400 volts, pelo que na rede onde o A. trabalhava apenas circulava esta última. Destes factos resulta que o A. não actuava a montante dos PT, mas apenas a jusante, pelo que não exercia qualquer actividade em alta – 60.000 volts – ou média tensão – 15.000 volts – mas apenas trabalhava em baixa tensão - 220-400 volts.
O A. e a testemunha E.......... entendem que, sendo aquele quem intervem no PT, nomeadamente, para fazer a respectiva manutenção e reparar avarias, sem intervenção da D.......... ou de outrem e entrando a energia a 15.000 volts, média tensão, o apelante trabalha também em média tensão, pelo que lhe deveria ser atribuída categoria superior. No entanto, como foi bem explicado pelas testemunhas F.........., comum a ambas as partes e G.........., arrolada pela R., aquela engenheiro e responsável pelas redes norte da D.......... e esta técnico de manutenção em média e alta tensão, o A. apenas trabalhava em baixa tensão na JF.......... e também na D.........., depois da sua integração. Pois, não trabalhando nas redes de alta e média tensão, apenas trabalha em baixa tensão e a intervenção nos PT é feita com a corrente desligada, pelo que a sua relação com a média tensão consiste em desligar a corrente, accionando uma alavanca. Tal significa que quando o A. se prepara para reparar uma avaria no PT, por exemplo, a primeira tarefa consiste em desligar a corrente, isto é, neutralizar a média tensão e depois procede à reparação, sem tensão. Daí que se nos afigure que o depoimento destas duas testemunhas, aliás de todas com excepção do E.........., no sentido de que o A. trabalhava na JF.......... em baixa tensão e continuou de igual forma na D.........., depois da inserção, esteja correcto, correspondendo à realidade. A conclusão diferente daquele E.......... deve-se certamente à circunstância de ele ter sido colega do A., de o ter acompanhado e saído da JF.......... no mesmo dia, de ter proposto, como o A., acção que os levou à inserção na D.........., de aqui terem começado a trabalhar no mesmo dia e de ele ter uma grande admiração pelo saber do A., como o seu depoimento bem documenta. No entanto, trata-se basicamente de divergência ao nível da conclusão que extrai dos factos que relatou, pois quanto a estes a sua versão é essencialmente idêntica à das restantes testemunhas.
Operada a integração na D.........., o A. sempre trabalhou, salvo um ou outro caso excepcional, como electricista em baixa tensão. Aliás, para trabalhar em média ou alta tensão na época em que se verifica a integração, a D.......... exigia mais do que a 4.ª classe do ensino básico ou o 6.º ano, única habilitação académica detida pelo A., bem como formação técnica que pressupunha conhecimentos de matemática e de física que o A. não possuía, nem veio a adquirir até hoje.
Assim, pretendendo o A. que se dê como provado o alegado nos artigos 6, 9 e 17 da petição inicial, deve referir-se que não lhe assiste razão.
Em primeiro lugar porque tem natureza conclusiva o alegado nos artigos 6 e 9 e em segundo lugar porque não se provou o alegado no artigo 17. Na verdade, efectuar, em colaboração com o despacho, manobras de rotina ou emergência, em subestações, corresponde a actividade que só existe em média e alta tensão, pois subestações são os locais onde a energia é transformada de 60.000 volts em 15.000 volts, por exemplo, sendo certo que a JF......... não tinha subestações e a rede de baixa tensão tem, a montante, apenas PTs. Por outro lado, a restante matéria constante do artigo 17 poderia ser dada como provada, desde que restringida à baixa tensão, mas não é esse o desiderato do recurso.
O objecto do recurso consiste também em considerar como não provados os pontos 7°, 8°, 9°, 10°, 11° e 12° da sentença.
Também aqui não assiste razão ao apelante. Na verdade, nestes pontos o Tribunal a quo deu como provado aquilo que efectivamente se provou, pois todas as tarefas desempenhadas pelo A., tanto na JF.......... como na D..........., respeitavam e respeitam ao trabalho em linhas de baixa tensão e a sua intervenção nos PT não altera esta realidade, pois aí ele trabalha sem tensão, portanto, não actua em média tensão.
Quanto às alterações consequenciais do constante nos artigos 10 a 135 da petição inicial, a pretensão do apelante não pode ser atendida, uma vez que a sua procedência estava dependente do sucesso da restante parte do recurso em sede de matéria de facto; como tal não ocorre, tal alteração não poderá também ser atendida, por prejudicada. De qualquer modo, mesmo que assim não fosse, tal pretensão não podia ser atendida relativamente à maior parte da matéria constantes dos referidos artigos, por ser de direito ou conclusiva.
Assim, considerados os depoimentos de todas as testemunhas, bem como o do A., registados no CD, concluímos que o Tribunal a quo julgou de acordo com a prova efectuada em audiência, portanto, não julgou sem prova ou contra a prova produzida, não revestindo o caso dos autos qualquer desconformidade, muito menos excepcional, que justifique a alteração, pela Relação, da decisão de facto proferida pelo Tribunal a quo, pelo que a mesma é de confirmar.
Improcedem, destarte, as pertinentes conclusões da apelação.
De qualquer modo, podendo ter interesse para a decisão de mérito, há que proceder a aditamento da matéria de facto, nos seguintes termos:
15 – Na sentença proferida no Proc. n.º …/90, da [antiga] ..ª secção do Tribunal de Trabalho de Guimarães, de 1991-12-02, foi dado como provado o seguinte facto:
“XVIII) Os autores [o ora A. e a testemunha E……….] encontravam-se ao serviço da Junta de Freguesia de ………., no dia 02 de Maio de 1990, quando a D………. assumiu os mesmos serviços, com a categoria de electricista de exploração e motorista, respectivamente, auferindo o vencimento ilíquido de 83.100$00 e subsídio de alimentação;”.
16 – No pedido formulado na petição inicial do Proc. n.º …/90, da [antiga] ..ª secção do Tribunal de Trabalho de Guimarães o A. peticiona que se condene a R. a “b) Reconhecer que o A. é seu trabalhador efectivo e faz parte dos seus quadros de pessoal, com a categoria e demais regalias a que tem direito;” – cfr. fls. 378.

O Direito.
A 2.ª questão.
Trata-se de saber se a R. devia ter atribuído ao A. a categoria profissional de electricista de exploração.
Na verdade, entende o A., ora apelante, que sendo electricista de exploração na JF………., pois geria toda a rede de distribuição de energia eléctrica a clientes domésticos e a pequenas empresas, nas freguesias de ………. e ………., ambas do concelho de Guimarães, tendo a sentença referida em 15 e 16, supra, dado como provado e ordenado a integração do A. na R. como electricista de exploração, esta deveria tê-lo classificado e remunerado como tal e não como electricista de redes.
Vejamos.
A procedência desta questão pressupunha o sucesso do apelante na questão anterior. Porém, como tal não aconteceu, esta questão também estará votada ao fracasso.
Aliás, apesar de o A. alegar na petição inicial que foi integrado na D………. como electricista de exploração, o que reafirma no recurso, tal não corresponde à verdade, como se vê do facto provado em 3 da respectiva lista, onde se refere apenas electricista, tendo-se somente provado na acção referida que o A. estava classificado na JF………. como electricista de exploração.
Apesar disso, não deixaremos de tecer algumas considerações sobre a matéria.
Aquando da integração do apelante na R., estava em vigor a LCT[5], em cujo Art.º 22.º, nº 1 se dispunha:
O trabalhador deve, em princípio, exercer uma actividade correspondente à categoria para que foi contratado.
Por seu turno, estabelece o Cód. do Trabalho de 2003:
Artigo 151º
Funções desempenhadas
1 — O trabalhador deve, em princípio, exercer funções correspondentes à actividade para que foi contratado.
Ora, a doutrina e a jurisprudência foram desde sempre uniformes no sentido de que deve haver correspondência entre as funções efectivamente desempenhadas pelo trabalhador, o seu estatuto profissional e o seu estatuto económico: verificando-se em concreto que o trabalhador exerce um leque de funções enquadrável numa determinada categoria prevista em instrumento colectivo de trabalho, o empregador deve atribuir-lha – também formalmente – e retribuí-lo em consonância. Isto é, deve haver correspondência entre a categoria função e a normativa e a retribuição prevista para esta.
Daí que, se for atribuída pelo empregador uma categoria que não corresponda ao real objecto da prestação do trabalhador, tal atitude é juridicamente irrelevante, tendo o trabalhador direito a ser reclassificado na categoria devida. De igual modo, se a retribuição auferida for inferior à categoria atribuída - ou que devia ser atribuída - pelo empregador, o trabalhador tem direito à retribuição presvista para tal categoria. Em suma, deve existir correspondência entre as funções desempenhadas, a categoria atribuída e a retribuição auferida.
A lei sempre protegeu a alteração da categoria profissional e da retribuição, ad minus.
Na verdade, atento o princípio da irreversibilidade da carreira profissional e da retribuição, a lei, a doutrina e a jurisprudência são claras em proibir a diminuição dos estatutos do trabalhador[6].
In casu, o apelante esteve ao serviço da JF………. de 1985-05-01 a 1990-05-02, com a designação profissional de electricista e exercendo funções nas linhas de baixa tensão, bem como nos PT, sem tensão, com a corrente desligada, consistindo o único contacto com a média tensão o acto de desligar a corrente.
Inexistindo qualquer instrumento de regulamentação colectiva, de ora em diante, apenas, IRC, aplicável às relações profissionais entre o A. e a JF………., pelo menos nenhum foi invocado ou é conhecido, não se colocava a questão de saber que tipo de electricista correspondia à actividade efectivamente exercida pelo A.
Integrado este na R., a questão assume diferentes contornos uma vez que na D………. vigorava um IRC, Acordo de Empresa, de ora em diante designado apenas por AE, in Boletim do Trabalho e Emprego, 1.ª série, n.º 11, de 1990-03-22, que define Electricista de exploração II, a categoria em que o A. entende dever ser classificado[7], do seguinte modo:
É o profissional que efectua, em colaboração com o despacho, manobras de rotina ou emergência, em subestações, PT e PS, ou substitui os automatismos, conduzindo, controlando e actuando para manutenção das condições de exploração; efectua manobras de aparelhagem e prepara painéis para trabalhos, efectua a pesquisa, localização e reparação de avarias em redes e instalações; efectua ou colabora na conservação de redes, instalações e equipamentos; efectua leituras, cálculos e regista os resultados; lê e interpreta mapas, esquemas, plantas e instruções técnicas e de serviço; efectua relatórios dos trabalhos efectuados.
Esta categoria profissional corresponde à actividade que um electricista desempenha em média e alta tensão, como abundantemente ficou demonstrado na questão anterior e corresponde, sem qualquer dúvida, ao provado em julgamento, conforme pudemos ouvir com atenção no registo constante do respectivo CD. Na verdade, o despacho é uma central que dirige as redes de média e alta tensão, não se colocando tal direcção nas outras redes, sendo certo que não há subestações na rede de baixa tensão. Depois, todas as restantes tarefas, podendo ser comuns a todo o tipo de redes, como seja a elaboração de relatórios, por exemplo, na definição da categoria de electricista de exploração elas respeitam apenas a tarefas executadas em linhas de média e de alta tensão.
Por outro lado, tendo o A. continuado a trabalhar ordinária e concretamente, no dia a dia, como electricista em redes de baixa tensão, depois de ter sido inserido na D………., não passou a trabalhar em média ou alta tensão.
Ora, sendo de atender às tarefas concretamente desempenhadas e só isso podemos considerar, como se referiu anteriormente, o A. não tinha direito a ser classificado na categoria profissional a que se arroga.
Nem deve impressionar a circunstância de a sentença proferida no Proc. n.º …/90, da [antiga] ..ª secção do Tribunal de Trabalho de Guimarães, de 1991-12-02, ter dado como provado que o ora A. se encontrava “… ao serviço da Junta de Freguesia de ………., no dia 02 de Maio de 1990, quando a D………. assumiu os mesmos serviços, com a categoria de electricista de exploração”.
Na verdade, tal circunstância deve ser relativizada, quer porque não teve correspondência ao nível do dispositivo, onde apenas se refere electricista e não electricista de exploração e sobretudo porque o nomen juris electricista de exploração não possui qualquer significado na relação do A. com a JF………., na medida em que aí não existia qualquer IRC a aplicar e onde pudesse constar a definição de tal categoria profissional e respectiva classificação, mas decisivamente porque sendo de atender ao princípio da materialidade subjacente e apenas considerar as funções efectivamente desempenhadas, naquela JF………. não existia rede de média e alta tensão, mas apenas de baixa tensão, quando a categoria reclamada se reporta apenas a actividade em linhas de média e alta tensão.
Aliás, nem o caso julgado bole com as considerações agora tecidas, uma vez que o dispositivo da sentença referida não indicou qualquer tipo de electricista que deveria ser observado na classificação do A. na D………, após a integração, sendo certo que a força do caso julgado não se estende aos pressupostos, quer relativos aos factos provados, quer de direito, embora os fundamentos da acção possam ser utilizados para interpretar o sentido do dispositivo, como se tem entendido[8].
No entanto, não tendo a sentença em causa analisado as funções concretamente exercidas pelo A., porque elas não foram dadas como provadas, mas apenas o respectivo nomen juris, electricista de exploração, nem tendo aferido da correcção da atribuição de tal categoria frente a qualquer IRC, porque inexistente na JF………., ordenou a integração do A. na D………. como electricista, sem mais, pois outros elementos não possuía. Na verdade, não tendo sido dadas como provadas em tal sentença as funções concretamente desempenhadas pelo A. ao serviço da JF………., não seria prudente atribuir-lhe uma categoria profissional de electricista com definição do tipo de actividade desempenhado. Aliás, nem seria de esperar outro resultado, pois no pedido formulado na petição inicial de tal processo - Proc. n.º …/90, da [antiga] ..ª secção do Tribunal de Trabalho de Guimarães - apenas se peticiona que se condene a R. a b) Reconhecer que o A. é seu trabalhador efectivo e faz parte dos seus quadros de pessoal, com a categoria e demais regalias a que tem direito, como consta de fls. 378 dos autos, isto é, não se pede o reconhecimento da categoria de electricista e muito menos, da categoria de electricista de exploração. Assim, em vista do constante do dispositivo da referida decisão, a que não se pode atribuir um sentido que extravase a sua literalidade, somos forçados a concluir que ao A. não tinha de ser atribuída pela R., por força do caso julgado formado naqueles autos, a categoria de electricista de exploração.
Nestes termos, podemos concluir e face a toda a argumentação até agora expendida, que o A. não tinha, nem tem, direito a que lhe seja atribuída a categoria profissional de electricista de exploração, com o conteúdo normativo constante da definição inserta no anexo A do AE da D………, conforme decidiu a sentença ora impugnada, que deve ser confirmada.
Improcedem, assim, as restantes conclusões da apelação.

Decisão.
Termos em que se acorda em negar provimento à apelação, assim confirmando a douta sentença recorrida.
Custas pelo A.

Porto, 2010-02-08
Manuel Joaquim Ferreira da Costa
António José Fernandes Isidoro
Paula Alexandra Pinheiro Gaspar Leal Sotto Mayor de Carvalho

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[1] Cfr. Alberto dos Reis, in Código de Processo Civil Anotado, volume V, reimpressão, 1981, págs. 308 a 310 e os Acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 1986-07-25 e de 1986-10-14, in Boletim do Ministério da Justiça, respectivamente, n.º 359, págs. 522 a 531 e n.º 360, págs. 526 a 532.
[2] Redacção introduzida pelo Decreto-Lei n.º 183/2000, de 10 de Agosto.
[3] Redacção introduzida pelo diploma referido na nota anterior.
[4] Cfr. António Santos Abrantes Geraldes, in TEMAS DA REFORMA DO PROCESSO CIVIL, II VOLUME, 4.ª EDIÇÃO, 2004, págs. 266 e 267 e o Acórdão da Relação do Porto, de 2003-01-09, in www.dgsi.pt, JTRP00035485 e o Acórdão da Relação de Lisboa, de 2001-03-27, in Colectânea de Jurisprudência, Ano XXVI-2001, Tomo II, págs. 86 a 88.
[5] Abreviatura de Lei do Contrato de Trabalho, vulgo do regime jurídico do contrato individual de trabalho, aprovado pelo Decreto-lei n.º 49 408, de 1969-11-24.
[6] Cfr., a mero título de exemplo:
a) Na doutrina: Maria do Rosário Palma Ramalho, in Direito do Trabalho Parte II – Situações Laborais Individuais, Almedina, 2006, págs. 391 e segs., nomeadamente, págs. 398 a 400, Pedro Romano Martinez, in Direito do Trabalho, 2.ª edição, Almedina, 2005, págs. 389 e 390 e António Menezes Cordeiro, in Manual de Direito do Trabalho, Almedina, 1991, págs. 665 a 671, nomeadamente, págs. 671.
b) Na jurisprudência: Acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 1989-09-22, 1990-10-17, 1990-10-25, 1991-02-06 e 2001-01-17, in, respectivamente, Boletim do Ministério da Justiça, n.º 389, págs. 456 a 464, n.º 400, págs. 473 a 479 e 493 a 497, n.º 404, págs. 293 a 302 e Colectânea de Jurisprudência, Acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça, Ano IX-2001, Tomo I, págs. 275 a 277.
[7] Cfr. a coincidência entre a definição da categoria de electricista de exploração, ora transcrita em texto e o alegado no artigo 17.º da petição inicial, transcrito na questão anterior.
[8] Cfr. Manuel A. Domingues de Andrade, in Noções Elementares de Processo Civil, 1976, págs. 302 a 335, João de Castro Mendes, in Direito Processual Civil III, 1980, págs. 282 ss., Antunes Varela, J. Miguel Bezerra e Sampaio e Nora, in Manual de Processo Civil, 1985, págs. 710 ss., Fernando Luso Soares, in Direito Processual Civil, 1980, págs. 492 ss. e Artur Anselmo de Castro, in Direito Processual Civil Declaratório, vol. III, 1982, págs. 396 ss.