Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
10205/05.2TBMTS.P1
Nº Convencional: JTRP000
Relator: VIEIRA E CUNHA
Descritores: EXPROPRIAÇÃO
CRITÉRIOS AVALIATIVOS
JUROS MORATÓRIOS
ATRASO NO DEPÓSITO A EFECTUAR NA FASE ADMINISTRATIVA
Nº do Documento: RP2013121010205/05.2TBMTS.P1
Data do Acordão: 12/10/2013
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: REVOGADA EM PARTE
Indicações Eventuais: 2ª SECÇÃO
Área Temática: .
Sumário: I – Os critérios avaliativos que decorrem do CIMI podem ser considerados na avaliação do prédio expropriado, mas apenas como um critério entre outros, como o inculcam as normas dos nºs 2 a 4 do artº 26º CExp.
II – A fixação de critérios orientadores da avaliação visa evitar disparidades não justificadas no valor dos bens, por recurso a critérios não uniformes, reduzindo, ao menos tendencialmente, a inevitável subjectividade dos avaliadores e garantindo, no possível, a igualdade entre expropriados; mas é a própria lei de expropriações que prevê a possibilidade de os critérios legais afectarem a justeza da indemnização, caso no qual se poderão atender a outras circunstâncias ou seguir outros critérios – artº 23º nº5 CExp.
III – A avaliação dos solos expropriados não deve considerar o valor da construção, para lá do seu “custo”, pois assim introduziria uma componente de valorização futura do bem, hipotética, a jusante do valor venal e do mercado do mesmo, à data da DUP.
IV - Uma parcela interior, sem frente para arruamento público justificaria um esforço de promoção imobiliária e, nessa medida, a dedução operada por força do disposto no artº 26º nº10 CExp.
V - Os itens valorativos arbitrais não constituem a questão propriamente dita levantada pelo recurso, que é a da valoração da parcela expropriada; mas já questões como a classificação do terreno, a desvalorização de parcelas sobrantes ou o montante da expropriação, essas sim, podem constituir os limites da reformatio in pejus a que está vinculada a instância de recurso no processo de expropriação.
VI - A referência nas diversas alíneas do nº7 do artº 26º CExp à existência das infra-estruturas junto da parcela, não implica a ideia de “ao lado da parcela”, como de resto esclarece significativamente a al.b) do citado nº7, por forma distinta das restantes alíneas; existe todavia uma ideia de aproveitamento económico normal, em face de uma contiguidade, que faz distinguir a ideia de “reforço de infra-estruturas”, da ideia de “realização de novas infra-estruturas”.
VII - A valorização do citado artº 26º nº7 al.a) CExp é dada ao “acesso rodoviário, com pavimentação em calçada, betuminoso ou equivalente”; este “equivalente” não pode ser um caminho em “terra batida”, de “servidão”.
VIII - Deduzir ao valor da indemnização os montantes previsivelmente necessários para realização de infra-estruturas seria valorar negativa e duplamente a falta da aludidas infra-estruturas, pois que a o valor da valoração do solo já tinha sido negativamente influenciado pela inexistência de infra-estruturas; diferente seria a hipótese de reforço de infra-estruturas – aí haveria uma dedução a fazer perante uma valorização previamente efectuada (nºs 7, 8 e 9 do artº 26º CExp).
IX - A quantia a que se refere o artº 10º nº4 CExp serve, somente, para garantir a responsabilidade da entidade expropriante pelo pagamento da expropriação; porque o respectivo montante não pode ser levantado pelo expropriado, nenhum dano se origina para este; daí que, na redacção originária do Código das Expropriações de 99, não houvesse lugar ao pagamento de juros, a cargo da expropriante, pelo atraso no depósito de tal quantia, na fase administrativa do processo.
X – A Lei nº 56/2008 de 4 de Setembro, que alterou a redacção do nº7 do artº 20º CExp, determinando o pagamento de juros moratórios pelo atraso no depósito a efectuar na fase administrativa, não constitui lei interpretativa.
Reclamações:
Decisão Texto Integral: ● Rec. 10205/05.2TBMTS.P1. Relator – Vieira e Cunha; decisão de 1ª Instância – 3/4/2013. Adjuntos – Des. Maria Eiró e Des. João Proença Costa.

Acórdão do Tribunal da Relação do Porto

Súmula do Processo
Recursos de apelação interpostos na acção com processo especial de expropriação por utilidade pública nº10205/05.2TBMTS, do 1º Juízo Cível da Comarca de Matosinhos.
Expropriante – EP, Estradas de Portugal, S.A.
Expropriados – B… e mulher C….

Por despacho do Sr. Secretário de Estado Adjunto e das Obras Públicas, publicado no D.R. nº205, IIs., de 31/8/04, foi declarada a utilidade pública e a urgência da expropriação de uma parcela de terreno, nº 98-A, destinada à obra de construção da Scut do Grande Porto – A4/IP4 – Sublanço Via Norte / Águas Santas (km 0 a km 3+297); a parcela em causa possui a área de 2.478 m2, de acordo com a descrição constante na Declaração de Utilidade Pública, constituindo parte de um prédio descrito na matriz predial rústica sob o artº 267º (freguesia de …) e descrito na Conservatória do Registo Predial com o nº 02294/190600; fica situada a Nascente da Rua … (120 m.), da citada freguesia do concelho de Matosinhos, confronta a Norte com caminho e fracção sobrante, a Sul com herdeiros de D…, a Nascente com a fracção sobrante e a Poente com caminho e B….
A parcela de terreno, de configuração trapezoidal, consoante a vistoria “ad perpetuam rei memoriam”, apresentava ocupação florestal e, no limite Sul, ruínas de uma antiga casa de habitação.
Na decisão arbitral, relativa à citada “parcela”, os árbitros classificaram-na como “solo apto para construção”, de acordo com a lei das expropriações aplicável, e atribuíram por unanimidade à referida parcela expropriada a quantia de € 274.735,86 (valor do terreno).
Por decisão judicial de 21/11/2005, foi adjudicada a parcela em questão à Expropriante.
Após recursos da decisão arbitral, promovidos pelos Expropriados e pela Expropriante, foi produzida prova pericial, concluindo com a apresentação de um laudo maioritário, subscrito pelos três peritos indicados pelo tribunal, que entendeu ser a parcela de valorizar como “solo apto para construção”, concluindo por um total indemnizatório de € 117.732,32 (neste valor se incluindo indemnização pelas benfeitorias existentes na parcela (muro), bem como pela desvalorização da parcela sobrante.
Em laudo à parte, o perito indicado pela expropriante indica como valor para a parcela expropriada, justificando-o, a quantia de € 157.474,70.
Novamente em laudo à parte, agora o perito dos Expropriados indica como valor para a parcela o montante de € 174.525,54, a que deve acrescer o valor das benfeitorias (€ 7.200), bem como a depreciação do sobrante (€ 105.486,53), tudo no total de € 287.211,97.
Pedidos e prestados esclarecimentos pelos peritos e promovidas alegações finais, foi proferida sentença, no Tribunal da Comarca de Matosinhos, na qual se julgou parcialmente procedente o recurso interposto pela Expropriante e improcedente o recurso dos Expropriados, assim se condenando a Expropriante a pagar aos Expropriados, no pressuposto da classificação do solo como “apto para construção”, a quantia de € 157.474,70, quantia a actualizar, desde a data da publicação da declaração de utilidade pública até à decisão final do processo, de acordo com os índices de preços ao consumidor, com exclusão de habitação, publicados pelo INE, levando em conta os levantamentos efectuados, nos termos do artº 24 nº1, do C. das Expropriações.
Por outro lado, não tendo sido efectuado, pela Expropriante, o depósito da quantia correspondente à previsão de encargos, nos termos do artº 10º nº4 CExp, determinada previamente em avaliação – artº 20º nº1 al.b) CExp – a decisão recorrida condenou ainda a referida Expropriante a pagar os juros de mora sobre a quantia de € 99.120, contados desde 90 dias sobre a data da publicação da DUP (30/11/2004, segundo consta do dispositivo da sentença), até à data do depósito efectuado nos autos, em 8/6/2005, à taxa legal supletiva.

De tal decisão vem interposto recurso de apelação, por parte da Expropriante e dos Expropriados.

Conclusões do Recurso dos Expropriados:
1 – A douta sentença é nula por não ter apreciado todas as questões colocadas no recurso da decisão arbitral, violando por isso o disposto no artº 668º CPCiv.
2 – O tribunal recorrido, violando, como violou, o disposto no artº 23º nº5 CExp e o requerimento que ao abrigo dele efectuámos cerceou-nos um direito essencial, o direito a pugnarmos pela fixação da justa indemnização.
3 – A norma do nº5 do artº 23º CExp preceitua que quer às partes, quer ao tribunal cabe o poder / dever de se recorrer a critérios referenciais alternativos, por forma a fixar-se nos autos o valor da justa indemnização, a qual deve corresponder ao valor de mercado fixado em condições de normalidade e prudência.
4 – A norma do nº5 do artº 23º não pode ser afastada e só a comparação entre resultados a que se chega pelos vários critérios permite a um Tribunal aferir da justeza do valor a atribuir.
5 – O Tribunal recorrido, não obstante ter admitido os quesitos relevantes para o efeito, não determinou aos peritos que avaliassem pelo método comparativo, método eleito pela Ordem dos Avaliadores e que respeita o princípio da igualdade.
6 – O Tribunal não determinou aos peritos que avaliassem pelo método do custo, critério aplicado pela Banca, não obstante ter admitido os quesitos relevantes para o efeito.
7 – O Tribunal não determinou aos peritos que avaliassem pelo critério do IMI, nem pelo critério do CExp91, como também requeremos, tendo apresentado quesitos que a tal permitiam responder.
8 – Todos estes critérios alternativos, os três primeiros são generalizadamente aplicados e o último foi critério legal, razão pela qual todos são fiáveis e merecedores de aceitação.
9 – Requerida a aplicação de critérios referenciais alternativos, impõe-se que a prova pericial contemple as várias hipóteses avaliativas, e só na comparação das mesmas se pode aferir a justa indemnização.
10 – Os critérios do IMI correspondem hoje ao critério previsto no nº2 do artº 26º CExp.
11 – O critério do nº2 do artº 26º recorre aos valores declarados e corrigidos pelas finanças nas compras e vendas entre privados, que, à data da vigência do CExp99, se fazia casuisticamente, e hoje se faz pela aplicação do IMI.
12 – O critério do nº4 do artº 26º CExp, quando aplicado interpretando o elemento custo de construção como o montante que custa edificar, e não como o valor de construção é inconstitucional, por violação do princípio da igualdade.
13 – Um não expropriado valoriza o seu terreno em função do valor venal da construção e não em função do que ela custa edificar nas diversas áreas de construção (conforme a localização, zonas há em que o terreno vale mais que o custo de construção).
14 – O custo de construção é um dos elementos que compõem o valor final, onde se incluem outros, o terreno, as taxas e licenças, os projectos, encargos financeiros, etc. O terreno representa uma parte do valor venal e não uma parte doutro componente do valor final.
15 – A limitação de 15% para a valorização do solo, nos termos do nº6 do artº 26º CExp, é inconstitucional, por violação do princípio da igualdade, sempre que se raciocina sobre o custo de construção em sentido estrito e pode sê-lo quando se raciocina com o valor de construção.
16 – Nos grandes centros, como é o caso que nos ocupa (…), o valor de 15% é limitativo de se atingir a justa indemnização. E a corroborar o que alegamos, está o facto do CIMI para a zona fixar índice superior aos 15%.
17 – A dedução pela inexistência do risco e esforço construtivo só se justifica e é entendível quando se raciocina com valor de construção. Só arrisca investir e se esforça a construir quem tem perspectiva séria de ganhar. Ora, a preços do custo que se paga ao empreiteiro não há hipótese de ganhar.
18 – Deduzida uma percentagem para infra-estruturas, os índices referentes às mesmas têm que ser aditados no cálculo, como se existissem, a título do nº7 do artº 26º, sob pena de haver dupla penalização e violação do princípio da igualdade.
19 – Enquanto o promotor privado custeia as infra-estruturas e se serve delas, já o expropriado, a interpretar-se o nº4 do artº 26º de modo diferente, custeava-as (com a dedução no custo da indemnização) e ficava sem o inerente proveito, o que tornaria também a norma, a ser assim interpretada, inconstitucional.
20 – Tendo a expropriante aceite expressamente no seu recurso da decisão arbitral o coeficiente de 20%, a título dos nºs 6 e 7 do artº 26º CExp, não podia o Tribunal, a este título, atribuir 10,75%.
21 – As infra-estruturas existentes para serem consideradas não têm que estar coladas á parcela.
22 – O índice de ocupação do solo de 1, adoptado pelos árbitros, que constitui o previsto no PDM, deve naturalmente prevalecer, a não ser que em sede de excepção a parte expropriante alegue e prove que tal implantação não era exequível, por razões concretas e específicas.
23 – Permitindo o PDM tal capacidade construtiva, a Administração tem que respeitar esta potencialidade, tendo de justificar sempre a sua eventual redução.
24 – Atendendo a que, para a parcela, tem de se atender à capacidade da envolvente, e estando-se no centro urbano de …, há que atender á densa capacidade construtiva da envolvente (resposta aos qq. 1, 7, 8, 12 e 14 a 17) e à vontade da Administração em ali consolidar o índice 1.
25 – A localização, a qualidade ambiental e o acesso aos equipamentos sociais é, tal qual resulta dos autos, francamente positiva.
26 – As benfeitorias (nomeadamente reposição de muros) têm de ser indemnizadas pelo custo da reposição.
27 – Estando a parcela sobrante, com excepção dos 270 m2, em área non aedificandi, toda a parcela fica desvalorizada, já que os 270 m2 seriam exíguos para construção.
28 – Considerar que a parcela sobrante, apesar da desvalorização, só fica desvalorizada em 40%, por permitir aparcamento e logradouro de construção, não faz sentido, quando se fica apenas com uma área de construção de 270 m2 (já que esta não carece de tanto aparcamento ou logradouro).
29 – Além de que não é permitido construir aparcamentos em área “non aedificandi”.
30 – O índice de 1,5 a título de acesso ou existe ou não existe, não podendo os peritos graduá-lo em função da sua qualidade.

Por contra-alegações, a Expropriante pugna pela improcedência das alegações dos Expropriados.

Conclusões do Recurso da Expropriante:
1 – A parcela expropriada é destacada de um prédio que ingressou na esfera jurídica dos expropriados por contrato de doação registado em 26/7/00.
2 – O expropriado adquiriu o prédio gratuitamente e fê-lo perante um quadro jurídico devidamente estabelecido e consolidado, não podendo – porque não é legítimo e fundado – ter qualquer pretensão a destinar o prédio a outro destino, para lá do admitido no Plano Director Municipal de Matosinhos (ratificado pelo Despacho nº 92/92).
3 – O prédio não permite uma classificação do solo como apto para construção, a não ser por força da al.c) do nº2 do artº 25º CExp.
4 – O prédio não é servido por qualquer infra-estrutura e é interior. O único acesso disponível era a partir de um caminho em terra batida, irregular e sem qualquer infra-estrutura.
5 – O artº 26º nº12 CExp não se aplica aos autos, uma vez que a aquisição foi posterior à aprovação do plano municipal de ordenamento do território.
6 – A ser reconhecida capacidade construtiva, a mesma resulta apenas e só do previsto no PDM e n os termos por ele admitidos.
7 – O tipo de classificação do solo da parcela apenas admite construções pontuais.
8 – As zonas que se encontram condicionadas no seu uso e ocupação não podem ser avaliadas como se solos urbanos fossem, imediatamente aptos para construção e muito menos equiparadas a solos classificados em zonas urbanas não condicionadas.
9 – Uma interpretação a favor da aplicação do artº 26º nº12 CExp à parcela que foi adquirida posteriormente à aprovação do PDM e que integra área verde de protecção ou parque é inconstitucional, por violação do princípio da justa indemnização, artº 62º nº2 CRP e princípio da igualdade, artº 13º nº1 CRP.
10 – O solo, porque adquirido posteriormente e porque não estava dotado de infra-estruturas, não tem idêntica aptidão construtiva aos prédios circundantes – a equivalência estabelece-se em função de terrenos com iguais condicionantes, pois só com estes é possível estabelecer um termo de comparação.
11 – A pretensão dos Expropriados e consequente indemnização terá de corresponder ao valor do bem conforme o destino económico reconhecido pelo Plano Director Municipal, uma vez que é à luz deste que seria aferida e reconhecida a pretensão dos expropriados.
12 – A capacidade construtiva do prédio terá de respeitar o PDM e por isso não pode ter um carácter tão só residual.
13 – Logo, o índice de 0,8m2/m2 afigura-se excessivo – manifestamente desproporcional e arbitrário – a pressupor a ocupação de 40% da área total da parcela.
14 – O índice adequado e proporcional, respeitando o regime previsto no PDM, para a parcela, fixa-se em 0,5 m2 / m2.
15 – Sem conceder, porque devidamente fundamentado e próximo dos parâmetros urbanísticos prescritos pelo PDM, o índice não poderá ser superior a 0,65 m2 / m2, como pugna o perito minoritário.
16 – O prédio era interior e apenas servido por um caminho em terra batida que em algumas zonas não tinha uma largura superior a 2 m (cf. vistoria, cuja descrição foi confirmada pelos peritos, nomeadamente a fls. 420) e que pelas medidas não permitia o cruzamento de dois veículos.
17 – O caminho que servia a parcela tinha uma largura variável, em partes com largura de 4 m e outras de 2 m, estando a parcela a 120 m da via pública.
18 – As percentagens, à luz do nº7 do artº 26º, pressupõem que as infra-estruturas valorizem e desempenham uma função conforme ao destino urbano.
19 – Ora, o caminho, pelas suas características, apenas permitia o acesso à parcela, era essa a sua função e, como vimos, qualquer destinação construtiva dependeria sempre da construção de um efectivo arruamento.
20 – O caminho não é uma infra-estrutura urbana, pelo que não permite a valorização do solo “per se”, não podendo ser contabilizada, mesmo que por um valor reduzido.
21 – A parcela estava a 120 m das infra-estruturas mais próximas, sendo que – como vimos – necessitava de um arruamento que a servisse, caso se pretendesse desenvolver um aproveitamento construtivo.
22 – O Tribunal, aderindo ao laudo maioritário, não considerou qualquer custo com infra-estruturas, mas estas eram necessárias e “sine qua non”.
23 – A expropriação elimina qualquer margem de risco a cargo do expropriado, pois este não tem de suportar as contingências de mercado e esforços com vista ao emparcelamento / aquisição dos prédios vizinhos à parcela, nem suportar os riscos com a construção de infra-estruturas.
24 – As infra-estruturas impõem-se, não como valor acrescentado à construção a edificar, mas como pressuposto jurídico-material para a sua existência, logo como factor de desvalorização e de correcção, em concreto, de discriminação positiva face à natureza e função da indemnização e respeito integral pelo princípio da igualdade que se impõe na sua essência fora da relação expropriativa e perante o proprietário não expropriado.
25 – Por força das características da parcela, deve ser contabilizado um factor correctivo, por causa das infra-estruturas, de 3%.
26 – Sem conceder, é indiscutível que a ausência de infra-estruturas e a distância a que estas se encontram aumentam exponencialmente o factor de risco/esforço, que, por isso, não poderá ficar abaixo de 10%.
27 – Não há desvalorização da parte sobrante, porque o tipo de destino económico previsto pelo PDM para a parte sobrante mantém intacto, proporcionalmente, o potencial económico da parte sobrante existente antes da expropriação.
28 – A respeito da questão dos juros de mora, a douta sentença em crise condenou a entidade expropriante no pagamento de juros de mora por atraso na realização do depósito prévio previsto no artº 20º nº1 al.b) CExp.
29 – Ao assim ter decidido, a douta sentença opõe-se inter alia ao Ac.TRP de 5/7/2010.
30 – Neste se julgou que o atraso na realização do depósito prévio não dá origem a juros de mora porque: (i) não resulta da lei – na versão de 99, aplicável também aos presentes autos, (ii) a omissão de tal depósito não impede o prosseguimento do processo expropriativo e (iii) não é um depósito que se deva realizar no processo litigioso.
31 – À luz do CExp99, na sua versão original, não são devidos quaisquer juros de mora, uma vez que o montante depositado não estava na disponibilidade dos expropriados, pelo que não há qualquer dano.
32 – Tanto mais que o prazo para a realização do referido depósito não é peremptório, uma vez que não contende com a validade dos actos praticados para além do seu “dies ad quem”.
33 – O atraso no depósito, a ter implicações procedimentais, diria somente respeito à regularidade da investidura da posse administrativa e não quanto ao direito dos expropriados; isto porque o depósito, entendido como pressuposto ou requisito da posse administrativa em nade bole ou influencia a indemnização devida ao expropriado, porque: (i) o depósito é tão só uma garantia financeira, não correspondendo o seu montante à justa indemnização devida pela expropriação por falta de acordo dos expropriados, (ii) a indemnização, por falta de acordo dos expropriados, só se torna exigível e liquidável com a fase litigiosa e após o acórdão da arbitragem, (iii) o acto condição de eficácia da expropriação só ocorre com o despacho de adjudicação, pelo que o direito de propriedade do expropriado só neste momento é irremediavelmente atingido (“a contrario” artº 88º CExp).

Os Expropriados/Apelados apresentaram contra-alegações, concluindo:
1. A decisão arbitral, que corresponde ao primeiro grau da jurisdição, é equiparada a uma verdadeira decisão judicial, razão pela qual tudo aquilo que não foi impugnado, transita em julgado.
2. Defendendo os 3 árbitros e 4 dos 5 peritos (onde se incluem todos os do Tribunal) o índice de 0,8 de ocupação do solo e o da EP 0,65, não tem qualquer chance de êxito defender 0,5 ou mesmo 0,65, já que se trata de questão técnica e nesta matéria deve prevalecer a posição dos peritos do Tribunal.
3. Os recursos não visam conhecer questões novas. Não tendo a expropriante defendido a dedução para infra-estruturas, no seu recurso da decisão arbitral, não o pode fazer em sede de recurso para o Tribunal da Relação.
4. Estando definido no cálculo da decisão arbitral as percentagens devidas pelos nºs 6 e 7 do artigo 26.º do C.E., e tendo-as a expropriante aceite expressamente não pode agora pô-las em causa.
5. A dedução para infraestruturas sem a atribuição da correspondente percentagem, devida pela sua existência, representa dupla penalização.
6. A lei premeia a existência de infraestruturas com determinada percentagem e pune a ausência com a não atribuição de percentagem. Ora, deduzindo-se o necessário para a sua construção, não pode deixar-se de atribuir as suas percentagens. E não deduzindo não se atribuem que foi o que a douta decisão fez.
7. A dedução pela inexistência do risco e esforço construtivo só é aplicável quando se raciocina com base em valores venais de venda de construção.
8. O risco e o esforço só se correm se houver hipótese de ter lucro. Com preços de custo na comercialização nunca se pode ganhar e por isso nenhum bonus pater familia assumiria este risco.
9. O prédio mãe, que foi condicionado pela construção da AE, é avaliado todo em função da capacidade construtiva da envolvente.
10. O seu fraccionamento retira às partes sobrantes grande parte do seu valor que tinha se fosse expropriado.
11. Os juros gerados pela não efetivação do depósito, o qual é imposto pelo artigo 20.º nº 5 do C.E., são devidos por diversas razões uma vez que se trata de obrigação de prazo certo e de depósito á ordem dos expropriados, que deles passam a poder dispor.
12. E a obrigação radica quer nas regras gerais do Código Civil, quer no nº1 do artigo 70.º, do C.E.

Factos Provados
1) A parcela de terreno a que foi atribuído o n.º 98-A, com a área de 2.478 m2, constitui parte do prédio rústico inscrito sob o artigo 267°, da freguesia de …, concelho de Matosinhos, descrito na Conservatória do Registo Predial, sob o n.º 02294/190600.
2) O solo daquela parcela insere-se num espaço que o Plano Director Municipal de Matosinhos classifica como "Zona Urbana e Urbanizável – Área Verde, de Parque e Cortina de Protecção Ambiental, envolvida por “Área Predominantemente Residencial".
3) A parcela tem configuração trapezoidal, plana, com ocupação florestal à data da “vistoria ad perpetuam rei memoriam”, com acesso por caminho em terra batida, sem infraestruturas, distando 150 m da …, a Poente (através do caminho de terra batida).
4) O referido imóvel de onde é destacada a parcela tinha a área de cerca de 4.475 m2.
5) A parcela tinha a seguinte benfeitoria: muro de vedação em alvenaria de pedra com 90 m de comprimento de 1,60 m de altura média.
6) Está localizada no aglomerado habitacional de …, e a sua envolvente, num raio de 300 m, caracteriza-se pela existência de moradias geminadas e isoladas de R/C e 1º andar, equipamento social, habitação multifamiliar de vários pisos, ocupação agrícola e florestal e actividade de horto.

Fundamentos
Em função das conclusões apresentadas pelos Recorrentes –Expropriante e Expropriados, as questões que os recursos suscitam são as seguintes:
Recurso dos Expropriados:
- Saber se a sentença é nula, por não ter apreciado todas as questões colocadas pelo recurso, designadamente a requerida comparação entre resultados avaliativos (métodos da Ordem dos Avaliadores, da Banca e critério do IMI), tal como decorre do disposto no artº 23º nº5 CExp.
- Saber se o critério do IMI corresponde ao previsto no artº 26º nº2 CExp, e afasta o critério do artº 26º nº4 CExp, critério este que deve interpretar-se como “valor da construção”, e não como “montante que custa edificar”, sob pena de violação do princípio constitucional da igualdade.
- Saber se a valorização do solo limitada a 15%, nos termos do artº 26º nº6 CExp, viola a igualdade constitucional, pois que até o IMI, na zona, fixa índice superior.
- Saber se a dedução a que se reporta o disposto no artº 26º nº10 CExp não se justifica quando se calculam valores indemnizatórios com base no custo de construção.
- Saber se, deduzida uma percentagem para infra-estruturas, os índices referentes à mesma têm que, após, ser aditados no cálculo, sob pena de dupla penalização (artº 26º nºs 7 e 9 CExp).
- Saber se, tendo a Expropriante aceite determinadas percentagens avaliativas, constantes do acórdão arbitral, não podia o Tribunal ter considerado percentagens inferiores (10,75% - artº 26º nºs 6 e 7 CExp).
- Saber se as infra-estruturas devem ser consideradas, independentemente de confrontarem directamente com a parcela.
- Saber se deve prevalecer o índice de ocupação do solo 1, adoptado pelos árbitros.
- Saber se as benfeitorias devem ser indemnizadas, nomeadamente no que contende com a reposição de muros.
- Saber se uma desvalorização da parcela sobrante em apenas 40%, por permitir aparcamento e logradouro de construção a um espaço de construção de 270 m2, não faz sentido, já que tal área não carece de tanto aparcamento ou logradouro), além de que não é permitido construir aparcamentos em área “non aedificandi”.
- Finalmente, saber se o índice de 1,5 a título de acesso não cabe ser graduado em função da qualidade.
Recurso da Expropriante:
- Saber se, por força do PDM de Matosinhos, não estamos perante um solo apto para construção, dado que a parcela é interior, não é servida por infra-estruturas, sendo ainda que o disposto no artº 26º nº12 CExp não é de aplicação ao caso, sob pena de violação dos princípios constitucionais da justa indemnização e da igualdade.
- Saber se, para respeitar o PDM, o índice construtivo na parcela de 0,8 m2/m2 é excessivo, devendo fixar-se antes em 0,5 m2/m2 ou em 0,65 m2/m2, como sustentado no laudo minoritário.
- Saber se o caminho que existia, e que dava acesso á parcela, não permitia a valorização do solo.
- Saber se o tribunal deveria ter considerado o custo das infra-estruturas, designadamente com um factor correctivo de 3%.
- Saber se, consideradas todas as condicionantes da parcela, o factor de risco/esforço não poderia ficar abaixo de 10%.
- Saber se inexiste desvalorização do sobrante, por se manter o respectivo potencial económico anterior.
- Saber se cabia a condenação da Expropriante no pagamento de juros de mora pelo atraso na realização do depósito prévio previsto no artº 20º nº1 al.b) CExp.
Vejamos então, ponto por ponto.
I
Começando por saber se a sentença é nula, por não ter apreciado todas as questões colocadas pelo recurso, designadamente a requerida comparação entre resultados avaliativos (métodos da Ordem dos Avaliadores, da Banca e critério do IMI), tal como decorre do disposto no artº 23º nº5 CExp.
Não parece, porém, que a matéria conduza a uma imputação à sentença recorrida dos vícios da nulidade. Na verdade, e na exegese do disposto no artº 668º nº1 al.d) C.P.Civ. (omissão de pronúncia), sustenta-se que o tribunal não tem de se pronunciar, a fim de se considerar a existência de omissão de pronúncia, sobre todas as considerações, razões ou argumentos, rectius provas, apresentados pelas partes, isto desde que tenha apreciado os problemas fundamentais e necessários à decisão da causa (Prof. M. Teixeira de Sousa, Estudos, pg. 220).
Sabe-se aliás, como ideia geral, que a justa indemnização a que se reportam os artºs 62º CRP, e 23º CExp representa a expressão particular da indemnização por actos lesivos de direitos e pelos danos causados a outrem – não visará, desta forma, compensar o benefício alcançado pelo expropriante, mas ressarcir o prejuízo que para o expropriado advém do acto expropriativo, que forçadamente o priva do uso e fruição de um bem.
O artº 23º nº1 C.Exp., na densificação do conceito de “justa indemnização”, estabelece o princípio da ressarcibilidade do prejuízo causado pela intervenção forçada na esfera patrimonial do expropriado, prejuízo que, no caso do proprietário e dos interessados sem direito a indemnização autónoma, não pode ser inferior ao valor real e corrente do bem, de acordo com o seu destino efectivo ou com o seu destino possível, numa utilização económica normal, à data da publicação da declaração de utilidade pública, atentas as circunstâncias e condições de facto nessa data existentes (Dr. Perestrelo de Oliveira, Código Anotado, Coimbra, 2ª ed., pg. 87). O artº 23º nº1, em conjugação com o nº5, remetem para o critério do valor venal do bem expropriado, mas temperado por uma situação não passada ou presente, mas simplesmente de normalidade económica de mercado.
Ora, é o indicado justo valor do bem que se procura atingir no processo expropriativo, vistos os seus sucessivos passos.
Como visto, o único critério que, a esse respeito, coloca os expropriados em condições de igualdade com os não expropriados, é o do valor de mercado do terreno, também denominado valor venal, valor comum ou valor de compra e venda do bem expropriado, entendido não em sentido estrito ou rigoroso, mas sim em sentido normativo (ut Prof. Alves Correia, Revista Decana, 134º/233). O valor de mercado em sentido normativo afasta-se de um mero valor resultante do jogo da oferta e da procura, para o corrigir em função de exigências de justiça, seja reduzindo aquele (pela especial ponderação do interesse público), seja majorando-o, devido à natureza dos danos provocados pelo acto expropriativo.
Outra interpretação, que não levasse em conta estas condicionantes seria inconstitucional, por violar o princípio da igualdade – artº 204º CRP.
Em face dos considerandos alinhados, nenhum método de avaliação em concreto, se rigidamente aplicado, deixa de ser limitador da indemnização (conduzindo à inconstitucionalidade interpretativa das normas) – mas, de outra banda, todos os métodos têm virtualidades para atingir o escopo constitucional e legal, se aplicados de forma flexível e aberta.
Por outro lado, o critério orientador da avaliação do solo apto para construção não pode deixar de ser o que dimana do disposto no artº 26º CExp, temperado pelas especiais circunstâncias do caso, sob pena de absoluta inutilidade da lei sobre expropriações.
É por isso que, como ponto de partida avaliativo, não podemos considerar os métodos propostos nas doutas alegações de recurso.
Em particular, no que diz respeito às avaliações fiscais urbanas, vê-las como critério orientador da fixação do montante indemnizatório não apenas se afasta dos critérios legais supra expostos, como também, à luz dos mesmos critérios, constituiria um condicionamento, para mais ou para menos, da avaliação que não se poderia aceitar. Fixado valor tributário do bem, estaria fechada a discussão sobre o valor do mesmo, designadamente para quaisquer outros fins de intervenção do Estado ou das entidades públicas.
Tal fixidez não é de aceitar - o CIMI, ou o que da sua aplicação resultou em concreto, pode ser, é certo, considerado na avaliação do prédio expropriado. Todavia, desde logo na avaliação do valor dos edifícios, trata-se apenas de um critério entre muitos outros, como o inculcam as normas dos nºs 2 a 4 do artº 26º CExp.
De resto, como se assinalou no Ac.R.C. 12/7/2011, in www.dgsi.pt, nº 1495/08.0YBCVL.C1, relatado pelo Desemb. Alberto Ruço, “os valores fiscais tendem a ser mais elevados que os resultantes do Código das Expropriações, pois no nº1 do artº 39º do Código do Imposto Municipal sobre Imóveis refere-se que “o valor base dos prédios edificados (Vc) corresponde ao custo médio de construção por metro quadrado, adicionado do valor do metro quadrado do terreno de implantação, fixado em 25% daquele custo”, esta aliás a percentagem máxima do Código das Expropriações, e que pode ser ou não ser atingida.
Não parece igualmente que se possa afirmar sem mais, salvo o merecido e devido respeito, que “os critérios do IMI correspondem hoje ao critério previsto no nº2 do artº 26º CExp”. A norma alude a médias aritméticas de avaliações fiscais, num período de três a cinco anos anterior à avaliação, o que não se basta, com o devido respeito, com a resultante de uma simulação electrónica do IMI.
Não deve olvidar-se igualmente que a lei impõe, no nº2 do artº 26º citado, que sejam fornecidos, pelos serviços competentes do Ministério das Finanças (a Repartição de Finanças da área do prédio), a lista das transacções efectuadas e das avaliações fiscais correctoras, dados que não existem, segundo a informação do laudo pericial.
II
Vejamos agora se o critério do artº 26º nº2 afasta o critério do artº 26º nº4 CExp, critério este que deve interpretar-se como “valor da construção”, e não como “montante que custa edificar”, sob pena de violação do princípio constitucional da igualdade.
Como atrás referenciámos, tudo depende da rigidez na adopção de critérios avaliativos – nenhum deles deve ser visto como solução única, aí sim, com violação eventual do princípio constitucional da igualdade.
Aliás, a fixação de critérios orientadores da avaliação, em si mesma considerada, tem o justificado objectivo de “evitar disparidades não justificadas no valor dos bens, por recurso a critérios não uniformes, reduzindo, ao menos tendencialmente, a inevitável subjectividade dos avaliadores e garantindo, no possível, uma maior igualdade no tratamento das várias situações” (cf. Ac.R.E. 1/3/2012 Col.II/246, relatado pela Desembª Eduarda Canas Mendes).
Todavia, é a própria lei de expropriações que prevê a possibilidade de os critérios legais afectarem a justeza da indemnização, caso no qual se poderão atender a outras circunstâncias ou seguir outros critérios – artº 23º nº5 CExp.
Ora, o ponto está em que não existem indícios no processo, ao menos decorrentes do laudo pericial maioritário unânime dos peritos do tribunal, que apontem para a necessária correcção dos valores achados pela aplicação dos critérios do artº 26º nº4 CExp.
Considerar-se-à também, de entre todos os três laudos apresentados nos autos, aquele que representa o maior denominador comum de peritos, todos eles não nomeados pelas partes, pelas superiores garantias de isenção que representam, sem prejuízo de correcções pontuais nos valores achados (afirma à saciedade a jurisprudência que, havendo um laudo uniforme dos três peritos indicados pelo Tribunal, é correcto basear a decisão judicial nesse laudo – ut, por todos, Ac.R.P. 24/12/89 Bol.392/512).
Cumpre finalmente salientar que o cerne do conceito de justo valor indemnizatório por expropriação, em sentido normativo, já antes considerado, é preenchido conceptualmente por elementos que, primacialmente, se encontram na posse dos peritos, quer pela observação que fazem do local, quer pelos conhecimentos técnicos que possuem e que não são próprios do jurista – neste sentido, A.R.P. 4/11/04 Col.V/165, relatado pelo Consº João Bernardo, e Dr. Goucha Soares e Consº Sá Pereira, Código das Expropriações, 1982, pg. 90.
Pelo exposto, entendemos que considerar o custo de construção para achar o valor do terreno a expropriar, ao invés de considerar os demais itens de custos que fazem atingir o “valor de construção”, como explanam as doutas alegações, não ofende, ao menos no caso concreto dos autos, o princípio constitucional da igualdade.
Da mesma forma, saber se a valorização do solo limitada a 15%, nos termos do artº 26º nº6 CExp, viola a igualdade constitucional, é uma observação que se não mostra justificada na avaliação efectuada pelo laudo seguido na douta sentença recorrida, avaliação que fundamenta adequada e exaustivamente as respectivas conclusões (vejam-se o elevado número de quesitos formulados e respondidos, bem como os posteriores esclarecimentos prestados).
Nomeadamente a localização da parcela, a sua qualidade ambiental e a qualidade do núcleo habitacional envolvente é considerado, pelos peritos, como “normal”; os mesmos peritos pronunciaram-se directamente sobre a percentagem de 11,5% do custo de construção para a valorização do solo, negando que tal percentagem compense indevidamente os Expropriados.
III
Saber se a dedução a que se reporta o disposto no artº 26º nº10 CExp não se justifica quando se calculam valores indemnizatórios com base no custo de construção.
Como alude L. Perestrelo de Oliveira, Código das Expropriações, 2ª ed., pg. 102, para o nº10 do artº 26º estão em causa os custos de organização, marketing, impostos, etc., que o expropriado suportaria se tivesse de realizar o empreendimento, admitido como possível na avaliação.
Não se trata assim, objectivamente, de um factor idêntico aos outros factores de valorização do terreno não levados em consideração no caso concreto, e aludidos no nº7 do artº 26º CExp.
Uma coisa é uma parcela não ser servida por passeios, acessos, ou redes de abastecimento de água e esgotos; outra coisa, diferente, é, nessa parcela que assim não é servida, ter de promover a construção.
Trata-se inegavelmente, a nosso ver, de um custo que diminui o valor da “justa indemnização” – sendo certo que a diminuição não pode ter por base um terreno que, na realidade material, não existe (servido por passeios, acessos, etc.).
São realidades diferentes.
Diferenciar os “preços de custo que se pagam ao empreiteiro”, dos preços pelos quais, na realidade, os edifícios construídos são comercializados, para utilizar a expressão elucidativa das doutas alegações, significa voltar a introduzir, agora pela aplicação em concreto do nº10 do artº 26º a discussão sobre a diferença entre o valor de mercado e o valor de mercado moderado, normativamente considerado.
Afirmar sem mais que “ninguém constrói para não obter lucro, para lá do valor de construção”, podendo ser verdade, é, todavia, mera hipótese – o contrário, a ausência de “lucro”, pode ocorrer também, designadamente em períodos de moderação dos valores imobiliários e da forma como a sociedade passa a considerar a economia.
Mas sobretudo, há que constatar que existe no douto considerando recursório uma componente de valorização futura do bem, hipotética, que aparece até a jusante do valor venal e do mercado do mesmo, à data da DUP – neste sentido, cf. Ac.R.G. 20/4/05 Col.II/295, relatado pelo Desemb. Manso Raínho.
Decorre dos autos que nos encontramos perante uma parcela interior, sem frente para qualquer arruamento público – justificava-se desde logo um esforço de promoção imobiliária e, nessa medida, justifica-se a aplicação da norma ao caso concreto.
Portanto, em resumo, a dedução operada por força do disposto no artº 26º nº10 CExp encontra-se justificada, mais a mais se considerarmos a moderada dedução de 5%..
O mesmo raciocínio é, a nosso ver, aplicável a saber se, deduzida uma percentagem para infra-estruturas, os índices referentes à mesma têm que, após, ser aditados no cálculo, sob pena de dupla penalização (artº 26º nºs 7 e 9 CExp).
Tal seria considerar a projecção do valor do terreno para futuro, que não à data da DUP. Se nessa data não existem infra-estruturas, não há que as considerar, no acréscimo a que se referem as alíneas do nº7 do artº 26º CExp.
IV
Saber agora se, tendo a Expropriante aceite determinadas percentagens avaliativas, constantes do acórdão arbitral, não podia o Tribunal ter considerado percentagens inferiores (10,75% - artº 26º nºs 6 e 7 CExp).
Diga-se que as doutas alegações da Expropriante, no recurso para a comarca, expressamente aludem a que “a percentagem relativa ao factor localização e qualidade ambiental não poderá ser superior a 7%”, embora, no cálculo final que fazem para achar um valor de fixação de indemnização pedido, entrem em linha de conta com a valorização do acórdão arbitral da parcela – 0,20.
Mesmo assim, pensamos que existe uma impugnação expressa da percentagem avaliativa, sendo o cálculo meramente secundário, para o efeito, ou até resultar de lapso.
Poderia afirmar-se que, na parte em que o acórdão arbitral considerou determinados índices de valorização da parcela como terreno apto para construção (percentagem do valor do solo, em função do custo de construção, ou índices de ocupação do solo) o dito acórdão transitou em julgado (por todos, Ac.R.P. 1/6/09, in www.dgsi.pt, pº 4451/06.9TBMTS.P1, relatado pelo Desemb. Pinto Ferreira).
Todavia, assim não entendemos, tal como já expressámos, mutatis mutandis, num outro acórdão, do mesmo presente relator, publicado na base de dados oficial – Ac.R.P. 6/10/09, in www.dgsi.pt, pº 3659/06.1TBVCD.P1.
Igualmente o presente relator escreveu no Acórdão proferido no processo nº 851/08.8TBPVZ.P1:
“Os argumentos valorativos arbitrais são meros argumentos e não a questão propriamente dita levantada pelo recurso, que é a da valoração da parcela expropriada.”
“Os argumentos constituem a liberdade do julgador – artº 664º CPCiv, traduzida no brocardo jura novit curia; já questões, como sejam a classificação do terreno, a desvalorização de parcelas sobrantes ou o montante da expropriação, essas sim, podem constituir os limites da reformatio in pejus a que está vinculada a instância de recurso”.
Isto é – existem antecedentes lógicos imediatos do julgado, premissas do mesmo, que, quando não impugnadas pela via do recurso, transitam, mesmo que não transite a parte decisória da sentença, nos termos do artº 684º nº4 CPCiv95.
Estes antecedentes lógicos são aqueles que não contendem directamente com a prova ou o munus dos peritos, que devem ser livres na avaliação, postas porém determinadas premissas, que podem resultar do facto de dessas premissas não ter existido recurso, designadamente do acórdão arbitral.
Já questões de âmbito directamente jusconclusivo, que se podem impor à prova produzida ou a produzir, designadamente ao acórdão arbitral e à prova pericial na fase do recurso para a comarca, tais questões podem transitar em julgado, não podendo a parte que delas não recorreu vir a beneficiar das mesmas.
Permitimo-nos assim divergir da doutrina do douto Ac.S.T.J. 13/7/2010, in www.dgsi.pt, 4210/06.9TBGMR.S1, relatado pelo Consº Hélder Roque, considerando que, em geral, na expropriação, impugnado o valor da expropriação, não transitam quaisquer dos pressupostos em que a decisão se baseou. Pensamos, sempre com o devido respeito, que esta corrente doutrinal acaba por esvaziar completamente de conteúdo a proibição da reformatio in pejus, fazendo o recurso depender apenas de uma impugnação genérica da sentença, o que não se nos afigura poder conduzir a um resultado prático aceitável.
É precisamente pela razão de que o processo expropriativo deve ser entendido com a natureza mista de recurso-acção, na fase jurisdicional, que se inicia com o recurso do acórdão arbitral, que também se julga que a liberdade dos peritos e da avaliação deve ser apenas atenuada em função de grandes itens de impugnação, até porque entre a prova pericial (englobando, enquanto prova também a considerar, na fase de recurso, o acórdão arbitral) e o recurso das partes, obviamente impugnando os itens directamente jusconclusivos (não entrando em pormenores de natureza técnico-avaliativa, mais aptos a serem atribuídos aos peritos) existem esferas de intervenção diversas, que justificam uma margem de apreciação livre.
Tudo para concluir finalmente que, ao contrário do que defendem as doutas alegações, não se nos afigura que os peritos pudessem encontrar-se vinculados a pressupostos mais específicos e depurados, longe das questões jusconclusivas acima aludidas, como o são as percentagens de valorização do solo apto para construção.
V
Saber se as infra-estruturas devem ser consideradas, independentemente de confrontarem directamente com a parcela.
Neste particular, entendemos que a perícia maioritária justificou adequadamente a respectiva opção de não considerar as infra-estruturas na parcela.
Pese embora a contiguidade entre as parcelas dos autos e a nº 92, ambas pertencentes aos mesmos donos, o aproveitamento edificativo dos dois prédios implicaria operação de loteamento – ora, para que as infra-estruturas que aproveitam à parcela nº 92 também aproveitassem à parcela dos autos seria necessário que a continuidade entre os dois prédios se materializasse numa extensão superior a 2 metros, que é a efectivamente existente.
Nos termos da contiguidade existente, está prejudicado o perfil mínimo para arruamentos e assim, em resumo, não se pode falar de um reforço das infra-estruturas existentes na via pública contígua à parcela nº 92, mas da realização de infra-estruturas e cedências decorrentes de uma operação de loteamento, que se não pode hipotizar nos autos.
Note-se, de resto, que a referência nas diversas alíneas do nº7 do artº 26º CExp à existência das infra-estruturas junto da parcela, não implica a ideia de “ao lado da parcela”, como de resto esclarece significativamente a al.b) do citado nº7, por forma distinta das restantes alíneas; existe todavia uma ideia de aproveitamento económico normal, em face de uma contiguidade, que faz distinguir a ideia de “reforço de infra-estruturas”, de uma outra ideia de “realização de novas infra-estruturas”.
Quanto ao índice de ocupação do solo 1, adoptado pelos árbitros, há que salientar que o acórdão partiu da capacidade construtiva; os peritos, porém, utilizaram um critério correspondente ao edificado, num perímetro que consideraram à luz do disposto no artº 26º nº12 CExp, mas critério esse que, em todo o caso, melhor se adaptaria ao critério da “justa indemnização”, que, na definição do artº 23º nº1 CExp, não atende à maximização de benefícios permitidos pelas leis ou regulamentos, mas antes às “circunstâncias e condições de facto existentes”, à data da DUP.
Quanto às benfeitorias - saber se devem ser indemnizadas, nomeadamente no que contende com a reposição de muros.
Com o devido respeito, não podemos concordar com a reposição de um muro que a expropriação abrange, pois dessa forma não assumiríamos o “valor real e corrente do bem” (artº 23º nº1), mas o valor real e corrente desse mesmo bem, com a respectiva reconstrução – uma coisa é o aproveitamento do existente, que poderia ser feito no terreno, destinando-se a parcela à construção; outra coisa é a reposição do existente, que não se justifica, face ao destino actual da parcela.
A perda de um muro de vedação, enquanto benfeitoria existente (e que não tem a ver com uma vedação futura da parcela sobrante), foi ponderado e somado o respectivo valor na quantia final apurada pela sentença recorrida, pelo que nada existe que alterar ou acrescentar neste campo.
VI
Saber depois se uma desvalorização da parcela sobrante em apenas 40%, por permitir aparcamento e logradouro de construção a um espaço de construção de 270 m2, não faz sentido, já que tal área não carece de tanto aparcamento ou logradouro, além de que não é permitido construir aparcamentos em área “non aedificandi”.
Dir-se-á que, para o laudo maioritário, não está tanto em causa o aproveitamento do sobrante como área de aparcamento, mas antes como logradouro de prédios vizinhos, cedências ao domínio público, ou outros.
Utilizações algo indefinidas, em todo o caso.
Numa avaliação equitativa, os peritos do tribunal (maioritários) começaram por atribuir ao sobrante uma desvalorização, por força da incapacidade de edificação, numa área total que calcularam em 1.400 m2 – essa desvalorização fixaram-na em 40%.
Considerando o valor do metro quadrado para edificação, encontrado para a valorização da parcela expropriada (€ 50,65), multiplicando pois os três números, afirmaram uma desvalorização da parte sobrante em € 28.364,00.
Ao invés, porém, nos primeiros esclarecimentos de fls. 417ss. dos autos, os peritos afirmam que esse parâmetro de 40% é, não o equivalente à desvalorização do sobrante, mas antes o verdadeiro valor do sobrante.
Escrevem, a fls. 417: “Ao atribuírem à fracção sobrante (após a DUP) 40% deste valor (€ 50,65/m2), os peritos consideraram que o terreno sobrante ficou prejudicado pela servidão “non aedificandi” que sobre ele passou a recair, devido à construção da via que deu origem à expropriação; os 40% de € 50,65 correspondem a € 20,26 que, na opinião dos signatários, configura à data da DUP o valor unitário do terreno desprovido de capacidade edificativa, mas que potencialmente poderá ser utilizado como aparcamento, logradouro de prédios adjacentes, ou outro tipo de utilização que não implique a realização de qualquer edificação”.
Nos esclarecimentos de fls. 475, os peritos em causa, voltam porém a reafirmar que a percentagem de 40% se refere tão só à desvalorização, que não ao valor do terreno do sobrante, sem capacidade edificativa.
Este esclarecimento revelou-se deveras útil, eliminando a obscuridade de que o laudo pudesse padecer.
Mais uma vez nos encontramos perante matéria de apreciação pericial, em que a prova produzida pelo laudo que dá mais garantias de isenção, aponta no sentido que foi adoptado pela douta sentença recorrida.
Há que salientar que, encontrando-se afectada pela impossibilidade de construir uma área de 1.400 m2 (laudo maioritário), sobrará uma área com aptidão construtiva de cerca de 1/3 da parte sobrante, sendo a diferença entre esse 1/3 e o restante (ou seja, 2/3 do sobrante) aquilo que estaria em causa nos 40% de desvalorização; ou seja, e por uma regra de três simples, a afectação considerada no total do prédio ascende, em termos práticos, a 60%.
Improcede assim este segmento recursório, pelo que consideramos tão só uma desvalorização de 40% para o solo da parte sobrante.
Quanto à questão da graduação das percentagens ao valor inicial do solo para construção – previstas nas diversas alíneas do nº7 do artº 26º CExp – deve dizer-se que, também aqui decaem os Expropriados, pois que a doutrina unanimemente afirma que tais percentagens constituem meros limites máximos – cf., nesse sentido, Dr. Osvaldo Gomes, Expropriações por Utilidade Pública, pg. 197, Consº Salvador da Costa, Código Anotado, 2010, pg. 183, e Drs. P. Cansado Paes, Ana Isabel Pacheco e Luís Alvarez Barbosa, Código, 2ª ed., pg. 176.
VII
Consideremos agora a apelação da Expropriante.
Num primeiro tópico, questiona-se se, por força do PDM de Matosinhos, não estamos perante um solo apto para construção, dado que a parcela é interior, não é servida por infra-estruturas, sendo ainda que o disposto no artº 26º nº12 CExp não é de aplicação ao caso.
Já atrás explicitámos a nossa posição sobre a questão do caso julgado em processo expropriativo – ponto IV desta fundamentação de direito.
Acontece que esta matéria, a da classificação do solo, é daquelas que julgamos ser abrangida pela proibição da reformatio in pejus, do artº 684º nº4 CPCiv95.
O Expropriante não recorreu expressa ou implicitamente dessa classificação no recurso que interpôs para a Comarca (afirma aliás expressamente que concorda com a classificação do solo), pelo que entendemos que, quer à Comarca, quer agora a esta Relação, se encontraria vedado conhecer da matéria.
Para além das razões legais e interpretativas que já expusemos, sem necessidade de aqui as repetir, resultaria chocante, sempre com o merecido e devido respeito, que o valor da indemnização pudesse drasticamente baixar por força de uma classificação do solo, da qual, por força do livre arbítrio da parte, se abdicou de litigar em determinada fase do processo.
Improcede este segmento do recurso.
Saber, após, se, para respeitar o PDM, o índice construtivo na parcela de 0,8 m2/m2 é excessivo, devendo fixar-se antes em 0,5 m2/m2 ou em 0,65 m2/m2, como sustentado no laudo minoritário.
Pese embora o maior detalhe explicativo do inicial laudo pericial minoritário do perito da Expropriante, haveremos mais uma vez de conceder que, encontrando-se o laudo dos peritos maioritários do tribunal, fundamentado na sua conclusão, designadamente face à configuração do terreno, localização e tipo de construções existentes na envolvente de 300 m, oferece maiores garantias de isenção que os demais laudos produzidos no processo; ou seja, como se explicitou após, a fls. 483 dos autos, admitiu-se que, no terreno expropriado, “seria possível uma construção que, no máximo, tivesse dois pisos e uma área mínima disponível de 60%, ou seja, uma área coberta de 40%, com dois pisos, ou seja, 0,8m2/m2”.
Nada se pode objectar ao detalhe explicativo, que acabou igualmente por ser subscrito pelo perito indicado pela Expropriante.
VIII
Saber também se o caminho que existia, e que dava acesso á parcela, não permitia a valorização do solo.
Foi aliás valorizado o “acesso rodoviário junto da parcela” em 0,75%, num máximo de 1,5% (artº 26º nº7 al.a) CExp).
Ora, sabemos que os peritos atribuíram uma tal percentagem a um acesso rodoviário em terra batida, com largura variável entre 2 e 4 metros, conforme esclarecimentos ao laudo maioritário, a fls. 420 dos autos, ou o constante da vistoria “aprm”.
A valorização do citado artº 26º nº7 al.a) CExp é dada ao “acesso rodoviário, com pavimentação em calçada, betuminoso ou equivalente”.
Não nos parece, porém que o “equivalente” a que se refere a lei seja a “terra batida” em “caminho de servidão”. Tem que ser o equivalente a uma “pavimentação”, como consta da norma.
Desta forma, neste particular, procede o recurso da Expropriante, sendo que a valorização do solo da parcela, seguindo o raciocínio da sentença recorrida e do laudo maioritário, de que até agora nos não desviámos, deve ficar reduzida a 10%.
Saber agora se o tribunal deveria ter considerado o custo das infra-estruturas, designadamente com um factor correctivo de 3%.
O artº 25º nº7 CExp, nas suas diversas alíneas, fixa percentagens de acréscimo à valorização do solo apto para construção, tendo por norte, em cada uma dessas alíneas, a existência (ou inexistência) de infra-estruturas “junto da parcela”.
Na verdade, a parcela expropriada encontra-se desprovida de quaisquer infra-estruturas que acompanham, em geral, a construção de edifícios.
Tal implicaria, a seguirem-se à letra as doutas alegações, que a desvalorização do terreno deveria ser considerada para todas as infra-estruturas em falta, não só para algumas delas.
Entendemos, porém, que assim não é, designadamente com o Ac.R.P. 3/7/2003, in www.dgsi.pt, pº 0332821, relatado pelo Desemb. Saleiro de Abreu, no qual se ponderou: “Ao considerar-se um determinado custo de construção por m2, tal valor tem implícito todo um conjunto de despesas que levam à obtenção desse valor. Por outro lado, a existência, ou falta, de determinadas infra-estruturas tem repercussão na determinação do valor do solo, através dos critérios legalmente fixados no art. 25º do CE. Com efeito, o valor do solo apto para construção varia conforme a quantidade e espécie de infra-estruturas que servem o terreno expropriado (vd. nº 2 e 3 daquele preceito). Como se escreveu no Ac. da RC, de 2.3.99, CJ, 1999, II, 7, “deduzir ao valor da indemnização os montantes previsivelmente necessários (...) para realização das indispensáveis infra-estruturas (...) seria ... valorar negativa e duplamente a falta da aludidas infra-estruturas”, pois que a um valor já negativamente influenciado pela inexistência de determinadas infra-estruturas, ir-se-ia deduzir o custo provável da sua feitura (no mesmo sentido, Acs. da RP, de 27-2-2003, proc. 631/03-3ª secção, e de 9.1.2001, proc. 1510/00-2ª secção).”
Diferente seria a hipótese de reforço de infra-estruturas – aí haveria uma dedução a fazer perante uma valorização já previamente efectuada, por aplicação do disposto nos nºs 7, 8 e 9 do artº 26º CExp, valorização que inexiste, no caso concreto.
E assim, suportados por esta jurisprudência, entendemos que nada há a deduzir para eventuais despesas de infra-estruturação do terreno.
A questão seguinte propõe-se saber se, consideradas todas as condicionantes da parcela, o factor de risco/esforço não poderia ficar abaixo de 10%.
Mais uma vez, não vemos razões para nos afastarmos do juízo técnico-pericial. Se é verdade que a parcela não possuía acessos pavimentados, também é verdade que possuía, na zona de si mais perto, na …, “habitação multi-familiar de vários pisos”, para além de centro social e moradias isoladas ou geminadas.
Tudo ponderado, a percentagem de 5%, a título da dedução prevista no nº10 do artº 26º CExp afigura-se-nos equilibrada.
Quanto à invocada inexistência de desvalorização do sobrante, é óbvio que a mesma existe, pois que se não discute a servidão “non aedificandi” criada pela construção da auto-estrada e que a questão da avaliação do terreno, em geral, como “apto para construção” ficou fixada pelo caso julgado oportunamente formado pela proibição da “reformatio in pejus”.
De todo o modo, ainda que se pudesse efectuar a destrinça entre a parcela expropriada e a parte sobrante, quanto ao respectivo destino económico, é necessário salientar que o aproveitamento para construção não foi efectuado, ao contrário do que consta das doutas alegações de recurso, por força dos regulamentos em vigor para o aproveitamento urbanístico do prédio, designadamente o PDM, mas antes por força da aplicação do disposto no artº 26º nº12 CExp, norma expressamente citada na douta sentença recorrida.
Improcede também este segmento do recurso.
IX
Finalmente, saber se cabia a condenação da Expropriante no pagamento de juros de mora pelo atraso na realização do depósito prévio previsto no artº 20º nº1 al.b) CExp.
Este depósito cabia ter acontecido na fase administrativa do processo, nos 90 dias posteriores à publicação da DUP, à ordem dos interessados e por força da avaliação prévia a que obriga o artº 10º nº4 CExp – artº 20º nº5 al.a) CExp.
Note-se que a fase administrativa do processo antecede a fase litigiosa, que se inicia com a realização da arbitragem, conforme capítulo II, do título IV, do Código de 99.
Basicamente, a Recorrente invoca que o atraso na realização do depósito prévio não dá origem a juros de mora porque: (i) não resulta da lei – na versão de 99, aplicável também aos presentes autos, (ii) a omissão de tal depósito não impede o prosseguimento do processo expropriativo e (iii) não é um depósito que se deva realizar no processo litigioso; o atraso no depósito, a ter implicações procedimentais, diria somente respeito à regularidade da investidura da posse administrativa.
Diga-se que as normas citadas, dos artºs 10º e 20º CExp99, acrescendo a norma do artº 70 nº1 CExp99 (“os expropriados e demais interessados têm o direito de ser indemnizados pelos atrasos imputáveis à entidade expropriante no andamento do procedimento ou do processo expropriativo ou na realização de qualquer depósito no processo litigioso”), actualmente vigentes, não sofreram alterações.
Alterado apenas foi, através do D-L nº 56/2008 de 4 de Setembro, o nº7 do artº 20º, do qual passou a constar: “(…) caso o depósito da quantia mencionada no n.º 4 do artigo 10.º não seja efectuado no prazo fixado, são devidos juros moratórios ao expropriado, os quais incidem sobre o montante do depósito”.
Portanto, a questão colocada é mesmo a de saber se a referência a “depósito efectuado no processo litigioso”, do artº 70º nº1 CExp, pode afectar a exigência de juros sobre o depósito que deveria ter sido efectuado, a favor dos Expropriados, e não se efectuou.
A questão está amplamente tratada na doutrina e na base de dados oficial de jurisprudência e cabe-nos conhecer do que aí se escreveu e fundamentou.
Um Autor como o Consº Salvador da Costa, op. cit., pg. 417, em comentário ao artº 70º, refere que esta norma está conexionada com o disposto no artº 20º nº1 al.b), pois que também deve ter por presumido o dano, nos termos do artº 342º nº2 CCiv.
O Dr. Luís Perestrelo de Oliveira, op. cit., pg. 84, refere: “O artigo 20º não fixa as consequências da omissão ou do atraso na realização do depósito previsto na al.a) do nº4 do preceito; atento o princípio da indemnização constante no nº4 do artº 19º, parece ser de aplicar por analogia o que dispõe o nº1 do artº 70º para a fase litigiosa da expropriação”.
Sem preocupação de exaustividade, encontramos os seguintes acórdãos dimanados desta Relação do Porto, na base de dados www.dgsi.pt – todos eles defendendo a aplicação de juros moratórios em análise, no regime anterior à alteração do Código das Expropriações, ocorrida em 2007:
- Ac.R.P. 10/10/2013, pº 10033/06.8TBMTS.P1, relatado pelo Desemb. J. M. Araújo Barros – defende-se aí que se impunha, já na redacção de 99, a interpretação extensiva do referido nº1 do artº70º, pois que o legislador não tinha simplesmente atentado no facto de que, também na fase pré-litigiosa, recaía sobre o expropriante a obrigação de depósito, omissão que a Lei nº 56/2008 pretendeu corrigir; pensamos difícil sufragar este entendimento, pese o merecido e devido respeito, face à previsão expressa de que a indemnização apenas seria devida “no processo litigioso”, o qual, como se sabe, apenas se inicia com a remessa do processo a tribunal;
- Ac.R.P. 1/10/2013, pº 4620/08.7TBMTS.P1, relatado pelo Desemb. Rodrigues Pires – com apoio na obra de Luís Perestrelo de Oliveira, op. e loc. cits., acrescenta: “A situação aqui em apreço é muito semelhante à prevista no dito art. 70º, sendo que para ela procedem as mesmas razões que estão subjacentes a este normativo, ou seja, a de proporcionar aos expropriados uma indemnização não só justa, como sobretudo actualizada, sancionando-se a entidade expropriante por atrasos exclusivamente a si imputáveis no andamento do processo ou na realização de qualquer depósito no seu âmbito”.
- Ac.R.P. 11/10/2012, pº 9748/06.5TBMTS.P1, relatado pela Desembª Judite Pires (apoiada na citação supra do Sr. Consº Salvador da Costa);
- Ac.R.P. 24/3/2011, pº 3897/06.7TBMAI-A.P1, relatado pelo Desemb. Teles de Menezes, apoiado na obra do Dr. Pedro Elias da Costa, Guia das Expropriações por Utilidade Pública, 2ª ed., pg. 371, afirmando que, no caso, o dever de pagar juros moratórios se encontra em harmonia com os princípios gerais do Código Civil sobre mora do devedor;
- da mesma forma, com idêntica fundamentação, o Ac.R.P. 27/5/08, pº 0726243, relatado pelo Desemb. Marques Castilho.
Tais acórdãos, pese embora o seu fundamento não negligenciável, deixam de fora uma matéria que foi muito adequadamente observada no Ac.S.T.J. 13/9/2011, pº 3898/06.5TBMAI.P1.S1, relatado pelo Consº Garcia Calejo – a de que “entrado o processo na fase litigiosa já o expropriado poderá levantar os montantes depositados, como decorre designadamente do art. 71º nº 3, o que não sucede com a quantia a que se refere o dito art. 10º nº 4 que servirá, somente, para garantir a responsabilidade da entidade expropriante pelo pagamento da expropriação; ou seja, se além a omissão do depósito poderá gerar prejuízos para o expropriado (daí a incidência de juros moratórios sobre o montante em falta), aqui, porque o montante não pode ser levantado pelo expropriado, nenhum dano se origina para este”.
Tal impossibilidade de levantamento do depósito, por parte dos expropriados, e inexistência de dano foi afirmada, v.g., pelos Drs. P. Cansado Paes, Ana Isabel Pacheco e Luís Alvarez Barbosa, op. cit., pg. 129, e pelo Consº Salvador da Costa, op. cit., pg. 126, e conexiona-se com a natureza do depósito, precedendo uma simples previsão de encargos, e, daí, não aspirando a mais que uma garantia do montante a depositar futuramente, após o acórdão arbitral, nos termos do disposto no artº 51º nº1 CExp, montante que, esse sim (ou parte dele – artº 52º nº3 CExp) poderá ser disponibilizado aos expropriados.
Claro que, hoje em dia, legem habemus – a norma do artº 20º nº7 CExp, introduzida pela Lei nº 56/2008 de 4 de Setembro, determina o pagamento de juros moratórios pelo atraso no depósito a efectuar na fase administrativa.
Estaremos perante lei interpretativa?
Não se nos afigura, em boa verdade.
E isto afirmamos mesmo levando em consideração o que escreveram autores como os Drs. Luís Perestrelo de Oliveira e Pedro Elias da Costa, sabendo ainda que vozes já se pronunciavam na jurisprudência, e aplicando a redacção original do Código, favoravelmente ao pagamento de juros relativos ao depósito devido pela expropriante, mas não efectuado, na fase administrativa (cf., para além dos já citados, Ac.R.P. 7/9/2010 Col.IV/163, relatado pelo Desemb. Pinto dos Santos, ou Ac.R.C. 5/6/07, pº 2818/06.1TBVIS-B.C1, relatado pelo Desemb. Isaías Pádua).
A questão está em que a lei interpretativa (a que realiza a interpretação da lei autêntica), decorre de três factores indiciadores (ut Prof. Oliveira Ascensão, O Direito – Introdução, 2ª ed., pg. 198):
- pela declaração expressa do legislador (que é inexistente, no caso concreto);
- pela afirmação expressa no preâmbulo (que inexiste, no diploma em causa);
- pelo texto, quando for flagrante a tácita referência da nova fonte a um a situação normativa duvidosa preexistente.
Se a dúvida se colocasse na interpretação do artº 70º nº1 CExp, então o legislador que quisesse interpretar a lei de pregresso teria obviamente que ter alterado a redacção do referido artº 70º nº1, e não, ao invés, como efectuado, alterar a redacção do artº 20º nº7, por forma perfeitamente inovadora, face à redacção da norma na versão inicial do Código.
Não nos encontramos perante lei interpretativa, pelo que, em suma, procede a douta alegação recursória neste campo.
X
Em resumo, o valor do solo da parcela deverá ser fixado em função dos seguintes parâmetros:
- 0,8 m2/m2 x € 620/m2 x 10% x 0,95 = € 47,12/m2
- € 47,12/m2 x 2478 m2 = 116 763,36.
A desvalorização da parte sobrante deve ser fixada em:
- 1400 m2 x € 47,12/m2 x 40% = € 26.387,20.
Finalmente, a indemnização a atribuir pela expropriação dos autos deverá fixar-se na soma dos seguintes três valores:
- € 116.763,36 + € 26.387,20 + € 3.600 = 146.750,56.

Resumindo a fundamentação:
I – Os critérios avaliativos que decorrem do CIMI podem ser considerados na avaliação do prédio expropriado, mas apenas como um critério entre outros, como o inculcam as normas dos nºs 2 a 4 do artº 26º CExp.
II – A fixação de critérios orientadores da avaliação visa evitar disparidades não justificadas no valor dos bens, por recurso a critérios não uniformes, reduzindo, ao menos tendencialmente, a inevitável subjectividade dos avaliadores e garantindo, no possível, a igualdade entre expropriados; mas é a própria lei de expropriações que prevê a possibilidade de os critérios legais afectarem a justeza da indemnização, caso no qual se poderão atender a outras circunstâncias ou seguir outros critérios – artº 23º nº5 CExp.
III – A avaliação dos solos expropriados não deve considerar o valor da construção, para lá do seu “custo”, pois assim introduziria uma componente de valorização futura do bem, hipotética, a jusante do valor venal e do mercado do mesmo, à data da DUP.
IV - Uma parcela interior, sem frente para arruamento público justificaria um esforço de promoção imobiliária e, nessa medida, a dedução operada por força do disposto no artº 26º nº10 CExp.
V - Os itens valorativos arbitrais não constituem a questão propriamente dita levantada pelo recurso, que é a da valoração da parcela expropriada; mas já questões como a classificação do terreno, a desvalorização de parcelas sobrantes ou o montante da expropriação, essas sim, podem constituir os limites da reformatio in pejus a que está vinculada a instância de recurso no processo de expropriação.
VI - A referência nas diversas alíneas do nº7 do artº 26º CExp à existência das infra-estruturas junto da parcela, não implica a ideia de “ao lado da parcela”, como de resto esclarece significativamente a al.b) do citado nº7, por forma distinta das restantes alíneas; existe todavia uma ideia de aproveitamento económico normal, em face de uma contiguidade, que faz distinguir a ideia de “reforço de infra-estruturas”, da ideia de “realização de novas infra-estruturas”.
VII - A valorização do citado artº 26º nº7 al.a) CExp é dada ao “acesso rodoviário, com pavimentação em calçada, betuminoso ou equivalente”; este “equivalente” não pode ser um caminho em “terra batida”, de “servidão”.
VIII - Deduzir ao valor da indemnização os montantes previsivelmente necessários para realização de infra-estruturas seria valorar negativa e duplamente a falta da aludidas infra-estruturas, pois que a o valor da valoração do solo já tinha sido negativamente influenciado pela inexistência de infra-estruturas; diferente seria a hipótese de reforço de infra-estruturas – aí haveria uma dedução a fazer perante uma valorização previamente efectuada (nºs 7, 8 e 9 do artº 26º CExp).
IX - A quantia a que se refere o artº 10º nº4 CExp serve, somente, para garantir a responsabilidade da entidade expropriante pelo pagamento da expropriação; porque o respectivo montante não pode ser levantado pelo expropriado, nenhum dano se origina para este; daí que, na redacção originária do Código das Expropriações de 99, não houvesse lugar ao pagamento de juros, a cargo da expropriante, pelo atraso no depósito de tal quantia, na fase administrativa do processo.
X – A Lei nº 56/2008 de 4 de Setembro, que alterou a redacção do nº7 do artº 20º CExp, determinando o pagamento de juros moratórios pelo atraso no depósito a efectuar na fase administrativa, não constitui lei interpretativa.

Decisão que se toma neste Tribunal da Relação, ao abrigo dos poderes conferidos pelo disposto no artº 202º nº1 da Constituição da República:
Julgar parcialmente procedente, por provado, o recurso de apelação da Expropriante e improcedente, por não provado, o recurso de apelação dos Expropriados, e, em consequência, revogar em parte a douta sentença recorrida, fixando agora a quantia indemnizatória, a pagar pela Expropriante aos Expropriados, em € 146.750,56.
Revogar ainda a douta sentença recorrida na parte em que determinou a condenação da Expropriante no pagamento de juros de mora, desde 30/11/04, sobre o montante de € 99.120, até 8/6/2005, sem prejuízo do demais decidido na douta sentença.
Custas pela Expropriante e pelos Expropriados, na proporção de vencido.

Porto, 10/XII/2013
Vieira e Cunha
Maria Eiró
João Proença