Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
125/05.6FAVNG.P1
Nº Convencional: JTRP00043014
Relator: JOSÉ CARRETO
Descritores: CRIME CONTINUADO
Nº do Documento: RP20091014125/05.6FAVNG.P1
Data do Acordão: 10/14/2009
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REC PENAL.
Decisão: CONFIRMADA A DECISÃO.
Indicações Eventuais: 1ª SECÇÃO - LIVRO 595 - FLS 48.
Área Temática: .
Sumário: I - É, ente outros, pressuposto do crime continuado que o agente actue a solicitação de uma mesma situação exterior que lhe facilite ou o arraste para a renovação da sua vontade e do acto criminoso.
II - Inexiste tal pressuposto se é o próprio arguido que procura a situação de reiteração da prática dos crimes.
Reclamações:
Decisão Texto Integral: Rec. nº 125.05.6FAVNG.P1
TRP 1ª secção criminal



Acordam em conferência os juízes no Tribunal da Relação do Porto

No Proc.C.Singular nº 125.05.6FAVNG do .º Juízo Criminal do Tribunal Judicial de Gondomar, foi julgado o arguido

B………., solteiro, gerente comercial, nascido a 01/04/1969, natural de Penafiel, filho de C………. e de D………., residente na Rua ………., …, ………, Gondomar

E a final em 14/4/09 foi por sentença proferida a seguinte decisão:

“Nestes termos e pelos fundamentos aduzidos, o tribunal decide:
A) Absolver o arguido B………. da prática das quatro contra-ordenações p. e p. pelo art. 65.º do DL n.º 28/84, de 20.01, pelas quais vinha pronunciado;
b) Condenar o arguido B………. como autor material de quatro crimes de exploração ilícita de jogo, p. e p. pelo disposto no art. 108.º, n.º 1, do DL n.º 422/89, de 02.12, na redacção do DL n.º 10/95, de 19.01, por referência aos arts. 1.º, 3.º, n.º 1, e 4.º, n.º 1, al. g), do mesmo diploma, nas seguintes penas parcelares:
a. na pena de 3 (três) meses de prisão e 80 (oitenta) dias de multa, pelo crime referente aos factos de 03.10.2005;
b. na pena de 6 (seis) meses de prisão e 110 (cento e dez) dias de multa, por cada um dos três crimes referentes aos factos de 16.01.2006, 10.04.2007 e 17.04.2007.
c) As penas aplicadas ao arguido encontram-se em situação de concurso real, pelo que, efectuando o cúmulo jurídico das mesmas, condena-se o arguido B………. na pena única de
a. 11 (onze) meses de prisão, substituída pela pena de prestação de 330 (trezentas e trinta) horas de trabalho a favor da comunidade, mediante plano de execução a homologar posteriormente pelo Tribunal; e
b. 260 (duzentos e sessenta) dias de multa, à taxa diária de € 5,00 (cinco euro), perfazendo a quantia global de € 1 300,00 (mil e trezentos euro).”

Inconformado recorre o arguido o qual no final da sua motivação apresenta as seguintes conclusões:


A. A condenação do aqui Recorrente vem na decorrência de em audiência de julgamento ter ficado provada toda a factualidade constante na douta acusação, pelo menos no que concerne aos crimes que lhe eram imputados, e nessa sequência, entendeu o Meritíssimo Tribunal “a quo” que a mesma culminava na condenação do arguido B………. «por quatro vezes, correspondentes a outras tantas apreensões separadas no tempo», «tendo o arguido, pelas quatro vezes, actuado com dolo directo, pois quis explorar jogos de fortuna e azar sem autorização para tal, renovando sucessivamente a resolução criminosa».

B. Ora, assim sendo, e salvo o devido respeito, parece-nos que o Tribunal “a quo” não se pronunciou, pelo menos fundamentadamente, sobre se seriam tais factos enquadráveis no âmbito de um concurso de crimes (art. 30º, nº 1 do C.Penal), ou em crime continuado (art.º 30.º, n.º 2 do C.Penal), assumindo como ponto de partida que o arguido teria praticado quatro crimes de exploração ilícita de jogo.

C. Efectivamente, a prova produzida em audiência de julgamento, que permitiu analisar a conduta do arguido, autoriza precisamente a conclusão de estarmos perante um caso de continuidade ou unidade criminosa, facto que se revela de extrema importância para aferir da questão da culpabilidade e da questão da determinação da sanção a aplicar.

D. Os pressupostos para verificação do crime continuado verificam-se, pois, no caso sub judice, sendo certo que, o arguido, actuou no quadro de uma situação exterior que diminui consideravelmente a sua culpa, desiderato que foi possível alcançar em sede de julgamento e decorre do texto da própria sentença quando diz que esta refere que «O arguido colocou os aparelhos supra referidos com a intenção de obter rendimento que lhe permitisse fazer face às dificuldades económicas por que, na altura, começou a passar.».

E. Com efeito, os factos constantes da acusação apreciada em julgamento, nomeadamente o facto de terem resultado de quatro acções de fiscalização distintas, consubstanciam a realização plúrima do mesmo tipo de crime (exploração ilícita de jogo), o qual protege fundamentalmente o mesmo bem jurídico,

F. Bem assim, pelo modus operandi (exploração de jogos da mesma natureza em regime de comissão), afinidade nos jogos descritos nos autos, isto é, as descrições apresentadas quanto às várias máquinas expositoras apreendidas nas quatro acções de fiscalização e o desenvolvimento dos vários jogos, ocorre certa homogeneidade da forma de execução da lesão do mesmo bem jurídico, tal como se afere da exposição supra por referência aos factos dado como provados.

G. Assim, atendendo aos elementos probatórios constantes nos autos, pode concluir-se com a máxima segurança e de forma inabalável que ressalta a figura jurídica do crime continuado, à luz da qual deveria operar-se a subsunção dos factos ao direito, designadamente, para determinação da escolha e da medida da pena.

H. Donde, insurge dizer que, o facto do arguido enquanto explorador do estabelecimento em questão, que passava por dificuldades económicas, aliada ao facto de lhe ter sido proporcionado a exploração de variados jogos mediante uma aliciante divisão de lucros (em regime de comissão) e boa receptividade aos mesmos, consubstanciam factores externos impulsionadores da prática de factos de natureza semelhante, projectando assim uma continuidade criminosa.

I. Efectivamente, verificando-se que os factos em causa nos presentes autos se encontram numa situação de continuidade criminosa em virtude de se constatar identidade do modus operandi, bem como do mesmo tipo de máquinas e de jogos, indubitavelmente ressalta a figura do crime continuado prevista no art. 30º, nº 2 do C. Penal, norma que o Tribunal “a quo” deveria ter aplicado.

J. Assim, feito o enquadramento jurídico e afigurando-se correcto aplicar a norma relativa ao crime continuado (art. 30º, nº 2 C. Penal), por obediência ao disposto no art. 79º do C. Penal, que dita que “o crime continuado é punível com a pena aplicável à conduta mais grave que integra a continuação”, deveria o Tribunal “a quo”, em concreto, aplicar ao arguido penas inferiores àquelas que foram aplicadas.

K. De facto, se é certo que é muito difícil “medir” a culpa de quem pratica factos criminalmente puníveis, não o é menos que, para a determinação judicial da pena, a nossa lei penal oferece ao julgador um quadro ou moldura em cujos limites aquela deverá ser fixada e dentro dos quais o julgador deverá ter em consideração, em conjunto, as particularidades do crime e do seu autor, orientando-se por critérios valorativos objectivos.

L. Tanto que, é a própria lei que, atendendo à delicadeza da determinação das penas, fixa regras ou critérios pelos quais se deverá orientar o julgador - artigo 71.º, n.ºs 1 e 2, do nosso Código Penal – desde logo, a primeira, impõe uma retribuição justa

M. Ora, é precisamente no ponto da retribuição justa que radica a discordância do recorrente em relação à medida da pena fixada pelo Meritíssimo Tribunal “a quo” que deveria ter sido determinada nos termos previstos para a punição do crime continuado.

N. Descurou o Meritíssimo Juiz “a quo” a ponderação de “todas as circunstâncias que, não fazendo parte do tipo de crime, depuserem a favor do agente ou contra ele, (...)”, na medida em que não relevou suficientemente o facto do arguido ter realizado uma confissão integral e sem reservas.

O. Pelo supra exposto, não se vê que as exigências de prevenção geral, ditas de integração, não fiquem perfeitamente prosseguidas com a condenação do recorrente numa pena menos grave, realizando-se, por este meio, de forma adequada e suficiente as finalidades da punição.

P. De sorte que, em obediência aos imperativos consignados no n.º 2 do artigo 71.º do nosso Código Penal, o Meritíssimo Tribunal a quo deveria ter considerado adequado aplicar ao ora Recorrente uma pena mais leve, não o tendo feito, o Tribunal a quo violou, mais uma vez, o disposto no artigo 71.º, n.º 2 e 79º do nosso Código Penal.

OUTROSSIM, SEM PRESCINDIR,

Q. Acresce que, ainda que não proceda tudo quanto supra exposto no que concerne ao crime continuado, o que não se concede mas por mero dever legal de patrocínio se equaciona, sempre o aqui Recorrente, e salvo o devido respeito, se permite discordar da medida concreta da pena única que lhe foi aplicada e da sua substituição por trabalho a favor da comunidade na medida de 330 dias.

R. Revelando-se esta demasiado excessiva e onerosa para o aqui Recorrente, porquanto, tal medida se revela muito próxima do seu limite máximo de 380 (trezentas e oitenta horas) horas.

S. Com efeito, pese embora o Dign.º Tribunal “a quo” tivesse considerado a aplicação da redacção do n.º 3 do artigo 58.º do C.Penal em vigor à data dos factos, porquanto, mais favorável ao arguido, parece-nos que, em concreto, a sua decisão se aproxima mais da nova versão daquele preceito legal, cujo limite máximo é de 480 (quatrocentas e oitenta) horas.

T. O que, aliás, não se compreende até pela medida concreta da pena de multa aplicada ao aqui Recorrente, pois que, se dentro da moldura de cúmulo de 110 a 410 dias de multa julgou o Dign.º Tribunal “a quo” adequado aplicar a pena única de 260 dias de multa, por certo, dentro da moldura de 26 a 380 horas seria equitativo aplicar-se, quanto muito, igual medida, ou seja, 260 horas.

U. Acresce que, por outro lado, as mesmas razões de discordância se apontam no que concerne ao quantitativo diário aplicado ao arguido, aqui Recorrente, pois, na verdade, pese embora o Dign.º Tribunal “a quo” tenha doutamente decidido pela aplicação “in casu” da taxa diária vigente à data da prática dos factos, ainda assim, fixou tal taxa diária na razão de €: 5,00, o que se revela desproporcional às condições económicas do aqui Recorrente, melhor plasmadas nos factos dados como provados na douta sentença ora recorrida.

V. Pelo exposto, a douta sentença sob recurso violou os artigos 30.º, 41.º, 47.º, 58.º, 71.º e 79.º, todos do Código Penal.”

O MºPublico respondeu pugnando pela manutenção da decisão
Nesta Relação o ilustre PGA é de igual parecer
Cumprido o artº 417º2 CPP, não houve resposta.

Colhidos os vistos, procedeu-se á conferência com observância do formalismo legal
Cumpre conhecer.

Consta da decisão recorrida (transcrição):

II. Fundamentação.
I. Factos provados.
Discutida a causa, resultaram provados, com interesse para a decisão da causa e com exclusão de conclusões e conceitos jurídicos, os seguintes factos:


1. No dia 03 de Outubro de 2005, pelas 15,35 horas, uma força policial composta por E………., cabo chefe, e F………., cabo, ambos da GNR-BF, dirigiu-se ao estabelecimento comercial denominado “G……….”, situado na Rua ………., n° .., ………., Gondomar, que se encontrava aberto ao público, em serviço de fiscalização,
2. Onde se encontrava o arguido B………. no atendimento ao público.
3. O estabelecimento comercial em causa encontrava-se licenciado para as modalidades de “café e snack-bar”, através do alvará de licença sanitária n° …., emitida em nome de “H………., Lda.”, mas em que a exploração é exercida pelo arguido B………. .
4. No interior do dito estabelecimento, mais precisamente em cima do balcão, encontrava-se uma máquina electrónica, tipo roleta, de cor castanha, com os dizeres “Distribuidora de Berlindes” ligada à corrente eléctrica, pronta a ser utilizada, a qual foi apreendida.
5. Trata-se de uma máquina com designação “DISTRIBUIDORA DE BERLINDES”, sem qualquer referência exterior quanto à origem, fabricante, número de fabrico ou série, constituída por um móvel de pequenas dimensões, de cor escura e estrutura em madeira e metal. Funciona ligada directamente à corrente eléctrica e após a introdução de, no mínimo, € 0,50, automaticamente é disparado um ponto luminoso que percorre os vários pontos de luz existentes no mostrador circular, iluminando-os à sua passagem. O ponto luminoso inicia o seu movimento giratório animado de grande velocidade que vai perdendo gradualmente até parar ao fim de algumas voltas, fixando-se aleatoriamente num dos diversos pontos de luz já referidos. Após fixado num dos diversos pontos de luz, duas situações podem acontecer:
5.1. O ponto de luz em que parou o ponto luminoso corresponde a um dos oito identificados pelos números já referidos e, neste caso, o jogador terá direito aos pontos correspondentes, que oscilam entre 1 BERLINDE (equivalente a € 1,00) e 200 BERLINDES (equivalente a € 200,00);
5.2. O ponto de luz em que parou o ponto luminoso corresponde a um dos restantes pontos sem qualquer referência e, neste caso, o jogador não terá direito a qualquer prémio, restando-lhe a hipótese de tentar novamente a sua sorte, introduzindo mais moedas;
6. Os pontos que o jogador vai ganhando são acumulados no mostrador rectangular central, os quais podem ser jogados novamente, utilizando para o efeito o botão vermelho, ou, caso o jogador pretenda, pagos, sendo os mesmos limpos através do botão preto.
7. Quando o jogador opta por jogar os créditos e após a utilização do botão preto, resulta a seguinte situação: 1 PONTO/BERLINDE = 2 JOGADAS = 1 EURO.
8. Por cada jogada efectuada e de forma automática o jogador recebe um pequeno brinde, que, neste tipo de máquinas, normalmente são berlindes que se encontram armazenados no depósito de objectos anteriormente mencionado.
9. O objectivo do jogo é o de conseguir números premiados, ou seja, que o ponto luminoso se imobilize num dos oito pontos de luz com direito a prémio, com base, exclusivamente, na sorte, de nada valendo, para a obtenção do resultado final, a perícia e destreza do jogador.
10. No interior da máquina “Distribuidora de pastilhas” encontrava-se a quantia de € 44,00 (quarenta e quatro euro), que era proveniente da exploração do referido jogo.
11. Este material não se encontrava licenciado, nem registado.
12. E o arguido B………. não possuía recibo ou factura que comprovasse a aquisição desse material, nem permitiu, de qualquer forma, que fosse identificada a pessoa ou entidade que lhe forneceu a máquina “tipo roleta”.
13. O arguido B………. tinha perfeito conhecimento das características das máquinas apreendidas e do tipo de jogo que desenvolviam, bem sabendo que as mesmas não poderiam estar instaladas no seu estabelecimento para utilização pelo público, estando vedado o exercício nelas de qualquer jogo, uma vez que a sua exploração se encontra confinada aos lugares expressamente determinados por lei.
14. O equipamento apreendido não se encontrava licenciado, nem registado, sendo certo que o arguido B………. também não dispunha de recibo, ou de factura que comprovasse a sua aquisição, nem identificou a pessoa que lhe vendeu as máquinas em causa.
15. O arguido B………. agiu livre e conscientemente e com perfeito conhecimento que a sua conduta era proibida e punida por lei.

16. No dia 16 de Janeiro de 2006, pelas 22,30 horas, uma força policial composta por I………., Tenente de Infantaria, J………. e K………., ambos soldados da GNR, dirigiu-se ao estabelecimento comercial denominado “G……….”, situado na Rua ………., no .., ………., Gondomar que se encontrava aberto ao público, em serviço de fiscalização,
17. Onde se encontrava o arguido B………. no atendimento ao público.
18. O estabelecimento comercial em causa encontrava-se licenciado para as modalidades de “café e snack-bar”, através do alvará de licença sanitária n° …., emitida em nome de “H………., Lda.”, mas em que a exploração é exercida pelo arguido B………. .
19. No interior do dito estabelecimento, encontravam-se duas máquinas ligadas à corrente eléctrica e prontas a ser utilizadas, as quais foram apreendidas.
20. Uma das máquinas possui um moedeiro e dispositivo de inserção de moedas e uma placa de jogo com um tema de Vídeo Poker,
21. Enquanto que a outra máquina não possui qualquer numeração, tem as inscrições “DISTRIBUIDOR DE BERLINDES” e funciona com introdução de moedas de 50 cêntimos, 1 euro e 2 euros, fornecendo ao utilizador um berlinde através da fixação de um ponto luminoso num mostrador onde constam lateralmente os números 1, 50, 2, 100, 20 e 200. Se a Luz coincidir com um destes números aparece no centro a importância que o utilizador tem direito a receber, que é entregue pelo responsável do estabelecimento.
22. O objectivo do jogo baseia-se exclusivamente, na sorte, de nada valendo, para a obtenção do resultado final, a perícia e destreza do jogador.
23. Todo este material não se encontrava licenciado, nem registado,
24. E o arguido B………. não possuía recibo ou factura que comprovasse a aquisição desse material, nem permitiu, de qualquer forma, que fosse identificada a pessoa ou entidade que lhe forneceu a máquina “tipo roleta”.
25. O arguido B………. tinha perfeito conhecimento das características das máquinas apreendidas e do tipo de jogo que desenvolviam, bem sabendo que as mesmas não poderiam estar instaladas no seu estabelecimento para utilização pelo público, estando vedado o exercício nelas de qualquer jogo, uma vez que a sua exploração se encontra confinada aos lugares expressamente determinados por lei.
26. O equipamento apreendido não se encontrava licenciado, nem registado, sendo certo que o arguido B………. também não dispunha de recibo, ou de factura que comprovasse a sua aquisição, nem identificou a pessoa que lhe vendeu as máquinas em causa.
27. O arguido B………. agiu livre e conscientemente e com perfeito conhecimento que a sua conduta era proibida e punida por lei.

28. No dia 10 de Abril de 2007, pelas 16,30 horas, uma força policial composta por E………., Cabo Chefe, e F………., Cabo, dirigiu-se ao estabelecimento comercial denominado “G……….”, situado na Rua ………., n° .., ………., Gondomar que se encontrava aberto ao público, em serviço de fiscalização,
29. Onde se encontrava o arguido B………. no atendimento ao público.
30. O estabelecimento comercial em causa encontrava-se licenciado para as modalidades de “café e snack-bar”, através do alvará de licença sanitária no …., emitida em nome de “H………., Lda.”, mas em que a exploração é exercida pelo arguido B………. .
31. No interior do dito estabelecimento, mais precisamente em cima do balcão, encontrava-se uma máquina electrónica, tipo roleta, tamanho mini, com os dizeres “Berlindes” de cor cinzenta, ligada à corrente eléctrica e pronta a ser utilizada.
32. No salão de jogos do estabelecimento, encontravam-se em cima de uma mesa uma “máquina de vídeo tipo balcão”, de cor preta, ligada à corrente eléctrica, exibindo no ecrã um jogo de “poker de cartas” designado por “Jolly Card”
33. Este material foi apreendido.
34. Uma das máquinas tem a designação “BERLINDES”, sem qualquer referência exterior quanto à origem, fabricante, número de fabrico ou de série. É portátil, de estrutura metálica, tendo na parte frontal um painel em vidro acrílico no qual se desenvolve o jogo. No painel lateral direito encontra-se o mecanismo de introdução de moedas e um botão preto. No painel frontal situam-se os elementos para o desenvolvimento do jogo, constituídos por um mostrador circular formado por:
34.1. 64 emissores de luz vermelha (LED’s), em que apenas 8 dos quais se encontram marcados com as designações 1 berlinde, 2 berlindes, 5 berlindes, 10 berlindes, 20 berlindes, 50 berlindes, 100 berlindes e 200 berlindes.
34.2. Um visor ao centro, para assinalar os pontos ganhos. Após a introdução de uma moeda, automaticamente é accionada uma roleta electrónica no mostrador circular anteriormente referido. Esta roleta produz-se pela iluminação sequencial, no sentido dos ponteiros do relógio, dos LED’s existentes no mostrador, dando a sensação de um movimento giratório de um ponto vermelho.
35. De modo semelhante ao que se passa com a bola das roletas tradicionais dos casinos, o ponto luminoso inicia o seu movimento giratório a grande velocidade, a qual vai perdendo gradualmente até parar ao fim de algumas voltas, detendo-se aleatoriamente num dos LED’s. Neste ponto duas situações podem acontecer:
35.1. O LED em que se deteve o ponto luminoso corresponde a um dos oito identificados pelas designações já referidas e, neste caso, o jogador ganhará os pontos correspondentes. Os pontos serão posteriormente convertidos em dinheiro (normalmente 1 ponto = 1 moeda de 1€), ou em qualquer outro prémio que o explorador da máquina convencione. Se o jogador pretender jogar os pontos ganhos, pode fazê-lo através do accionamento do botão preto situado no painel lateral direito da máquina. Cada ponto ganho proporciona 2 jogadas.
35.2. O LED em que se deteve o ponto luminoso não tem qualquer referência, pelo que o jogador não ganha quaisquer pontos, restando-lhe a hipótese de tentar novamente a sua sorte, introduzindo novas moedas.
36. A outra máquina é do tipo vídeo, não possuindo qualquer referência exterior quanto à origem, fabricante, número de fabrico ou de série. Não possui qualquer documento identificativo. É de formato de balcão, de cor preta, com estrutura em madeira. À frente possui um ecrã de vídeo ladeado por um aceitador de notas de euro. Abaixo do ecrã situa-se uma consola de jogo com 7 botões.
37. O sistema de funcionamento é do tipo vídeo, desenvolvendo um jogo designado “JOLLY CARD”, sendo este em tudo semelhante aos jogos de VIDEO-POKER de cartas jogados nos Casinos.
38. Ligando a máquina à corrente, nada aparece no écran até que seja introduzido um código secreto através dos botões das consolas de jogo. Só após a introdução do código surge a apresentação do jogo acima referido.
39. Após a introdução de notas de euro e marcado o valor da aposta pretendido, dá-se início ao jogo do Vídeo-Poker de cartas, através dos respectivos botões nas consolas de jogo.
40. Este é jogado da seguinte forma:
40.1. Depois de marcada a quantidade de créditos que se pretende apostar (nesta máquina — de 5 a 40 créditos), como já mencionado, o jogador dispõe de duas tentativas para obter alguma das sequências premiadas. Para tal, aparecem no ecrã, de modo aleatório, 5 cartas dispostas em linha, assim como a tabela com a pontuação das sequências premiadas, pontuação esta que é automaticamente multiplicada pelo n° de créditos apostados.
40.2. Após a 1 tentativa, duas situações podem ocorrer:
40.2.1 1ª situação: as cartas que apareceram não constituem uma das sequências premiadas. O jogador poderá optar por “fixar” as que entender, na expectativa de que, na segunda tentativa as que não fixou sejam substituídas por outras que, juntamente com as já fixadas, venham a constituir uma das sequências premiadas. O jogador também poderá optar por não “fixar” nenhuma das cartas, sendo estas todas substituídas na 2 tentativa.
40.3. 2ª situação: as cartas que apareceram constituem uma das sequências premiadas. O jogador deverá “fixar” as cartas que constituem a sequência premiada, para que na segunda tentativa estas não sejam substituídas. Serão apenas substituídas as que, eventualmente, não tenham sido fixadas, havendo assim a hipótese de, nalguns casos, vir a obter uma sequência de maior pontuação.
40.4. Após a 2ª tentativa, também duas situações podem ocorrer:
40.4.1. 1ª situação: não se obteve uma sequência premiada. O jogo termina.
40.5. 2ª situação: obteve-se uma sequência premiada. O jogador poderá optar, ou por somar (recolher) os créditos ganhos na jogada aos que já tem, ou por tentar dobrar esses mesmos créditos.
40.6. A dobra dos créditos é a etapa final que o jogo proporciona, apresentando-se ao jogador a possibilidade de escolher entre uma carta de valor baixo (de 1 a 6), e uma de valor alto (de 8 a 13 (Rei)), sendo o 7 uma carta neutra (não se perde, nem se ganha).
40.7. Se o jogador escolher uma delas e sair a oposta (Ex: se escolher Baixa (Bassa) e sair uma carta de valor alto (Alta)), perde todos os créditos que tinha ganho na jogada.
40.8. Se acertou na escolha, os créditos são dobrados e poderá optar por tentar efectuar dobras sucessivas dos créditos ganhos até decidir somar ou perder, terminando assim, o jogo.
41. A primeira máquina desenvolve um jogo em que a expectativa de se obter um prémio depende exclusivamente da sorte, não podendo o jogador, com a sua perícia ou por qualquer outra forma, influenciar o resultado do mesmo.
42. A segunda máquina desenvolve um jogo de Poker, que depende da sorte, estando o jogador limitado apenas ao lançamento das cartas nas duas tentativas de que dispõe, à escolha dos que pretende “fixar” e à escolha entre Baixa (Bassa) e Alta (Alta), no caso de querer arriscar na dobra. Tanto o lançamento das cartas, como a substituição das não “fixadas” pelo jogador, como ainda o sorteio da carta alta ou baixa, são processos totalmente aleatórios executados pela placa de jogo.
43. No interior da máquina de vídeo encontrava-se a quantia de € 15,00 (quinze euros), que era proveniente da exploração do referido jogo.
44. Todo este material não se encontrava licenciado, nem registado.
45. E o arguido B………. não possuía recibo ou factura que comprovasse a aquisição desse material,
46. Que ali foi colocado por um indivíduo cuja identidade não se logrou apurar e em termos contratuais não especificados, mas em que o lucro que advinha do uso dessas máquinas por quem nela jogasse revertia para o arguido B………. e para essa pessoa, em proporção de 50% para cada.
47. O arguido B………. tinha perfeito conhecimento das características das máquinas apreendidas e do tipo de jogo que desenvolviam, bem sabendo que as mesmas não poderiam estar instaladas no estabelecimento em que se encontrava para utilização pelo público, estando vedado o exercício nelas de qualquer jogo, uma vez que a sua exploração se encontra confinada aos lugares expressamente determinados por lei.
48. O equipamento apreendido não se encontrava licenciado, nem registado, sendo certo que o arguido também não dispunha de recibo ou de factura que comprovassem a sua aquisição.
49. O arguido agiu sempre livre e conscientemente e com perfeito conhecimento que a sua conduta era proibida e punida por lei.

50. No dia 17 de Abril de 2007, pelas 16,45 horas, uma força policial composta por F………., Cabo Chefe, e L…………., soldado, dirigiu-se ao estabelecimento comercial denominado “G……….”, situado na Rua ………., n° .., ………., Gondomar que se encontrava aberto ao público, em serviço de fiscalização,
51. Onde se encontrava o arguido B………. no atendimento ao público.
52. O estabelecimento comercial em causa encontrava-se licenciado para as modalidades de “café e snack-bar”, através do alvará de licença sanitária n° …., emitida em nome de “H………., Lda.”, mas em que a exploração é exercida pelo arguido B………. .
53. No interior do dito estabelecimento, mais precisamente em cima do balcão, encontrava-se uma máquina electrónica, tipo roleta, tamanho mini, com os dizeres “Berlindes” de cor cinzenta e outras, ligada à corrente eléctrica e pronta a ser utilizada.
54. No salão de jogos do estabelecimento, encontrava-se uma máquina de tamanho médio, de cor preta, ligada à corrente eléctrica, com ecrã ligado e a exibir o “jogo de POKER de Cartas, designado por “JOLLY CARD”.
55. Uma das máquinas tem a designação “BERLINDES”, sem qualquer referência exterior quanto à origem, fabricante, número de fabrico ou de série. É de estrutura metálica, tendo na parte frontal um painel em vidro acrílico, no qual se desenvolve o jogo.
56. No painel lateral direito encontra-se o mecanismo de introdução de moedas e um botão preto.
57. No painel frontal situam-se os elementos para o desenvolvimento do jogo, constituídos por um mostrador circular formado por:
57.1. 64 emissores de luz vermelha (LED’s), em que apenas 8 dos quais se encontram marcados com as designações 1 berlinde, 2 berlindes, 5 berlindes, 10 berlindes, 20 berlindes, 50 berlindes, 100 berlindes e 200 berlindes.
57.2. Um visor ao centro, para assinalar os pontos ganhos.
58. Após a introdução de uma moeda, automaticamente é accionada uma roleta electrónica no mostrador circular anteriormente referido. Esta roleta produz-se pela iluminação sequencial, no sentido dos ponteiros do relógio, dos LED’s existentes no mostrador, dando a sensação de um movimento giratório de um ponto vermelho.
59. De modo semelhante ao que se passa com a bola das roletas tradicionais dos casinos, o ponto luminoso inicia o seu movimento giratório a grande velocidade, a qual vai perdendo gradualmente até parar ao fim de algumas voltas, detendo-se aleatoriamente num dos LED’s. Neste ponto duas situações podem acontecer:
59.1. O LED em que se deteve o ponto luminoso corresponde a um dos oito identificados pelas designações já referidas e, neste caso, o jogador ganhará os pontos correspondentes. Os pontos serão posteriormente convertidos em dinheiro (normalmente 1 ponto = 1 moeda de 1€), ou em qualquer outro prémio que o explorador da máquina convencione. Se o jogador pretender jogar os pontos ganhos, pode fazê-lo através do accionamento do botão preto situado no painel lateral direito da máquina. Cada ponto ganho proporciona 2 jogadas.
59.2. O LED em que se deteve o ponto luminoso não tem qualquer referência, pelo que o jogador não ganha quaisquer pontos, restando-lhe a hipótese de tentar novamente a sua sorte, introduzindo novas moedas.
60. A outra máquina é do tipo vídeo, não possuindo qualquer referência exterior quanto à origem, fabricante, número de fabrico ou de série. Não possui qualquer documento identificativo. Possui um ecrã de vídeo seguido de uma consola de jogo com 2 manípulos e 8 botões. Na parte frontal inferior situa-se um aceitador de notas de euro e o respectivo cofre. O sistema de funcionamento da máquina é do tipo vídeo e possui uma placa de jogo alterada como suporte do jogo que desenvolve, que, por meio de um código introduzido através dos botões da consola, apresenta um jogo designado “JOLLY CARD“, sendo este em tudo semelhante aos jogos de VIDEO-POKER de cartas.
61. Após a introdução de notas de euro e marcado o valor da aposta pretendido, dá-se início ao jogo do Vídeo-Poker de cartas, através dos respectivos botões nas consolas de jogo.
62. Este é jogado da seguinte forma:
62.1. Depois de marcada a quantidade de créditos que se pretende apostar (nesta máquina — de 5 a 40 créditos), como já mencionado, o jogador dispõe de duas tentativas para obter alguma das sequências premiadas. Para tal, aparecem no ecrã, de modo aleatório, 5 cartas dispostas em linha, assim como a tabela com a pontuação das sequências premiadas, pontuação esta que é automaticamente multiplicada pelo n° de créditos apostados.
62.2. Após a primeira tentativa, duas situações podem ocorrer:
62.2.1. 1ª situação: as cartas que apareceram não constituem uma das sequências premiadas. O jogador poderá optar por “fixar” as que entender, na expectativa de que, na segunda tentativa, as que não fixou sejam substituídas por outras que, juntamente com as já fixadas, venham a constituir uma das sequências premiadas. O jogador também poderá optar por não “fixar” nenhuma das cartas, sendo estas todas substituídas na segunda tentativa.
62.2.2. 2ª situação: as cartas que apareceram constituem uma das sequências premiadas. O jogador deverá “fixar” as cartas que constituem a sequência premiada, para que na segunda tentativa estas não sejam substituídas. Serão apenas substituídas as que, eventualmente, não tenham sido fixadas, havendo assim a hipótese de, nalguns casos, vir a obter uma sequência de maior pontuação.
62.3. Após a segunda tentativa, também duas situações podem ocorrer:
62.3.1.1ª situação: não se obteve uma sequência premiada. O jogo termina.
62.3.2. 2ª situação: obteve-se uma sequência premiada. O jogador poderá optar, ou por somar (recolher) os créditos ganhos na jogada aos que já tem, ou por tentar dobrar esses mesmos créditos.
62.4. A dobra dos créditos é a etapa final que o jogo proporciona, apresentando-se ao jogador a possibilidade de escolher entre uma carta de valor baixo (de 1 a 6), e uma de valor alto (de 8 a 13 (Rei)), sendo o 7 uma carta neutra (não se perde, nem se ganha).
62.5. Se o jogador escolher uma delas e sair a oposta (Ex: se escolher Baixa (Bassa) e sair uma carta de valor alto (Alta)), perde todos os créditos que tinha ganho na jogada.
62.6. Se acertou na escolha, os créditos são dobrados e poderá optar por tentar efectuar dobras sucessivas dos créditos ganhos até decidir somá-los, ou perder, terminando assim, o jogo.
63. A primeira máquina desenvolve um jogo em que a expectativa de se obter um prémio depende exclusivamente da sorte, não podendo o jogador, com a sua perícia ou por qualquer outra forma, influenciar o resultado do mesmo.
64. A segunda máquina desenvolve um jogo de Poker que depende da sorte, estando o jogador limitado apenas ao lançamento das cartas nas duas tentativas de que dispõe, à escolha dos que pretende “fixar” e à escolha entre Baixa (Bassa) e Alta (Alta), no caso de querer arriscar na dobra. Tanto o lançamento das cartas, como a substituição das não “fixadas” pelo jogador, como ainda o sorteio da carta alta ou baixa, são processos totalmente aleatórios executados pela placa de jogo.
65. No interior das máquinas de vídeo encontravam-se as quantias de € 2,50 (dois euro e cinquenta cent) e € 10,00 (dez euro), que era proveniente da exploração dos referidos jogos.
66. Todo este material não se encontrava licenciado, nem registado.
67. E o arguido B………. não possuía recibo ou factura que comprovasse a aquisição desse material,
68 Que ali foi colocado por um indivíduo cuja identidade não se logrou apurar, em termos contratuais não especificados, mas em que o lucro que advinha do uso dessas máquinas por quem nela jogasse revertia para o arguido B………. e para esse indivíduo, em proporção de 50% para cada.
69. O arguido tinha perfeito conhecimento das características das máquinas apreendidas e do tipo de jogo que desenvolviam, bem sabendo que as mesmas não poderiam estar instaladas no estabelecimento em que se encontravam para utilização pelo público, estando vedado o exercício nelas de qualquer jogo, uma vez que a sua exploração se encontra confinada aos lugares expressamente determinados por lei.
70. O equipamento apreendido não se encontrava licenciado, nem registado, sendo certo que o arguido também não dispunha de recibo ou de factura que comprovassem a sua aquisição.
71. O arguido agiu sempre livre e conscientemente e com perfeito conhecimento que as respectivas condutas eram proibidas e punidas por lei.
Outros factos provados
131 Os aparelhos supra referidos foram sempre sucessivamente apreendidos nas datas aludidas, com o conhecimento do arguido.
132 O arguido colocou os aparelhos supra referidos com a intenção de obter rendimento que lhe permitisse fazer face às dificuldades económicas por que, na altura, começou a passar.
133 O arguido deixou de explorar o estabelecimento supra referido em Maio de 2008, estando actualmente desempregado.
134 A companheira do arguido trabalha como empregada de balcão, auferindo cerca de € 450,00 mensais.
135 O arguido tem um filho de 3 anos de idade.
136 O arguido vive em casa própria, pagando cerca de € 800,00 de prestação mensal do empréstimo contraído para a sua aquisição.
137 O arguido sofreu as seguintes condenações crime:
a. condenado, por sentença do ..º juízo criminal de Gondomar, no processo n.º ../00.5FAVNG, datada de 30.11.2005 e com trânsito de 15.12.2005, pela prática do crime de exploração ilícita de jogo, em 05.04.2000, na pena de 60 dias de prisão, substituídos por 60 dias de multa e 50 dias de multa, entretanto extinta pelo pagamento;
b. condenado, por sentença do ..º juízo criminal de Gondomar, no processo n.º …/05.7TAGDM, datada de 22.02.2008 e com trânsito de 31.03.2008, pela prática do crime de exploração ilícita de jogo, em 23.04.2005, na pena de 4 meses de prisão, substituídos por 120 dias de multa e 80 dias de multa;
*
ii. Factos não provados.
- Inexistem.
***
iii. Motivação de facto.
O tribunal formou a sua convicção quanto aos factos provados da acusação com base na confissão integral e sem reservas do arguido.
Os factos provados atinentes às condições pessoais do arguido e antecedentes criminais resultaram das declarações do próprio arguido e do CRC junto a fls. 681 a 683.”
+
As questões a analisar são as seguintes:
Se ocorre omissão de pronuncia sobre a integração dos factos no existência de crime continuado, ou na unidade criminosa,
Se se verificam os requisitos do crime continuado;
E se deve a pena ser substancialmente reduzida como crime continuado por não ter valorado devidamente a confissão do arguido;

Se a pena única é excessiva e sua substituição por trabalho a favor da comunidade também o é pois se aproxima do seu máximo,
e taxa diária de 5.00€ da multa é desproporcional ás condições económicas do arguido.
+
No recurso apesar de delimitado pelas conclusões extraídas da motivação que constituem as questões suscitadas pelo recorrente e que o tribunal de recurso tem de apreciar (artºs 412º, nº1, e 424º, nº2 CPP, Ac. do STJ de 19/6/1996, in BMJ n.º 458, pág. 98 e Prof. Germano Marques da Silva, in “Curso de Processo Penal” III, 2.ª Ed., pág. 335), há que ponderar também os vícios e nulidades de conhecimento oficioso ainda que não invocados pelos sujeitos processuais – artºs 410º, 412º1 e 403º1 CPP e Jurisp dos Acs STJ 1/94 de 2/12 in DR I-A de 11/12/94 e 7/95 de 19/10 in Dr. I-A de 28/12, Ac. Pleno STJ nº 7/95 de 19/10/95 in DR., I-A Série de 28/12/95), mas que, terão de resultar “do texto da decisão recorrida, por si só ou conjugada com as regras da experiência comum” – artº 410º2 CPP, “não podendo o tribunal socorrer-se de quaisquer outros elementos constantes do processo” in G. Marques da Silva, “Curso de Processo Penal”, III vol. pág. 367, e Simas Santos e Leal Henriques, “C.P.Penal Anotado”, II vol., pág. 742.
Vistos os autos e analisadas tais questões, constata-se que não ocorrem, pelo que passaremos á análise das questões suscitas.

No que respeita á omissão de pronúncia, ela não ocorre, pois que o tribunal tem de se pronunciar sobre factos e circunstâncias que aconteceram e sobre regras ou normas aplicáveis, e não sobre factos não ocorridos (ou não provados) ou sobre normas não aplicáveis.
Deve subsumir os factos apurados ao direito aplicável, mas não precisa de fazer uma grande explanação jurídico - dogmática, sobre determinado assunto ou matéria.
Assim é que o tribunal logo no inicio da sua fundamentação jurídica explana que:
- “A factualidade provada traduz a exploração de vários (sete) aparelhos de jogo por parte do arguido, em quatro situações distintas (03.10.2005, 16.01.2006, 10.04.2007 e 17.04.2007) e delimitadas, quanto à resolução criminosa, pelas sucessivas apreensões.” e mais adiante
- a conduta provada do arguido integra, por quatro vezes, correspondentes a outras tantas apreensões separadas no tempo, os elementos objectivos do tipo de crime por que vem acusado, bem como o elemento subjectivo, que exige o dolo (em qualquer das modalidades previstas no art. 14.º do CP), tendo o arguido, pelas quatro vezes, actuado com dolo directo, pois quis explorar jogos de fortuna e azar sem autorização para tal, renovando sucessivamente a resolução criminosa.
Deve, deste modo, o arguido ser condenado pela prática dos quatro crimes por que vem pronunciado.” e ainda, em sede da medida da pena, ponderou:
- a dispersão temporal dos mesmos e a sucessiva renovação da resolução criminosa, mesmo depois das apreensões e até da condenação crime que entretanto sofreu;

Daqui decorre que o tribunal analisou e ponderou outras questões e a aplicação das regras jurídicas quanto ao número de crimes praticados, sendo certo que o arguido em lado algum dos autos, suscita essa questão, caso em que expressamente o tribunal a devia ponderar, sendo no caso suficiente a análise que fez, pelo que improcede essa questão.
+

A matéria de facto não foi impugnada pelo que se tem como assente, e vista esta e em face da mesma, não é possível concluir que o arguido ao actuar o fez submetido á mesma e única resolução criminosa, pelo que nunca seria a sua actuação subsumível á figura de um único crime.

Mas vejamos se estamos perante a figura de um crime continuado, como alega o recorrente.
Para a aplicação do instituto do crime continuado - que “… é constituído, de um ponto de vista real, por hipóteses que conformam um concurso de crimes efectivo que, todavia, a lei transforma numa unidade jurídico-normativa” in F. Dias Direito Penal, Parte Geral Tomo I, 2ª ed. pág. 1038, e que “é punível á conduta com a pena mais grave que integra a continuação.” – artº 79º1 CP, e Ac. STJ 30/10/91 Proc. 42260, in Jurisp. Penal, pág 225, (hoje em absoluto regulamentado na nossa lei penal – artºs 30º2 e 79º CP 2007, consagrando a “Teoria da Diferença” Ac. R.P. 2/4/03 proc. 0210755 www.dgsi.pt/jtrp), - importa que ele se verifique, e do artº 30º nºs 1 e 2 do Código Penal, resulta que “o número de crimes determina-se pelo número de tipos de crime efectivamente cometidos, ou pelo número de vezes que o mesmo tipo de crime for preenchido pela conduta do agente”. mas “constitui um só crime continuado a realização plurima do mesmo tipo de crime ou de vários tipos de crime que fundamentalmente protejam o mesmo bem jurídico, executada por forma essencialmente homogénea e no quadro da solicitação de uma mesma situação exterior que diminua consideravelmente a culpa do agente.”. nº2

Assim necessário é:
- a realização plurrima do mesmo tipo de crime: o que ocorreu pois o arguido por 4 vezes infringiu a norma incriminadora
- a execução dos crimes de forma essencialmente homogénea: o que ocorreu através da instalação de máquinas com pequenas divergências (primeiro uma máquina e depois duas máquinas de cada vez), no mesmo local;
- a norma violada vise a protecção do mesmo bem jurídico (o que ocorre, pois a norma é a mesma);
- actue sob a solicitação de uma mesma situação exterior, que no caso não ocorre, pois não é relatada nenhuma situação que arraste o arguido para o crime, traduzida na existência de um conjunto de factos exteriores (exógenos) ao arguido que o ajudem a repetir a conduta (ou seja “no quadro da solicitação de uma mesma situação exterior” (e relativos á determinação e formação da vontade), pois que não é relatada qualquer situação exterior ao arguido que o levasse á pratica dos crimes após o primeiro, pois apenas se demonstrou que “Os aparelhos supra referidos foram sempre sucessivamente apreendidos nas datas aludidas, com o conhecimento do arguido.” e “arguido colocou os aparelhos supra referidos com a intenção de obter rendimento que lhe permitisse fazer face às dificuldades económicas por que, na altura, começou a passar.”, pois é necessária uma facilitação externa, uma quase provocação que arrasta o agente para a renovação da sua vontade e do acto criminoso - cf. Teresa Beleza, Dto Penal, 2º vol. 1996, pág. 613.
E não ocorre porque ao arguido é retirado / apreendido de cada vez o objecto do seu crime (as máquinas que detêm) e apesar disso coloca outras máquinas que instala no seu café e explora (e até com mais determinação pois após a 1ª apreensão de uma máquina, passa a usar duas máquinas) e reitera este comportamento 3 vezes. Donde é ele próprio arguido que busca e procura a situação de reiteração da prática dos crimes e não qualquer situação exterior a si que os propicia.
Situação que está ligada a “ uma diminuição considerável da sua culpa” o que não só não ocorre, como “reinstalando repetidamente novas máquinas …após as sucessivas intervenções … com apreensão das mesmas, o recorrente evidencia … não uma atenuação da culpa resultante de qualquer factor externo mas antes uma notória agravação do dolo em cada repetição da conduta ilícita, comprovadamente retomada após e apesar de cada intervenção da autoridade “- apud Parecer a fls. 872, pois que a apreensão das máquinas corta qualquer veleidade de uma continuação criminosa, que através de uma consciente e querida reinstalação de novas máquinas, manifesta uma maior vontade criminosa e uma maior culpa em cada actuação posterior, - sendo que aquando da 2ª actuação já havia sofrido condenação por idêntico crime, e
por outro lado, não ocorre a conexão temporal exigível para o crime continuado, pois entre os crimes ocorre um espaço temporal acentuado (cerca de 3 meses entre eles, há excepção do último) pois que “Da fórmula legal não deixa de decorrer a necessidade de existência de uma conexão temporal entre as diversas condutas. “O crime continuado, segundo se percebe do que consta do art. 30º, n.º 2, do C. Penal, não deixa de consagrar (ou espelhar) o entendimento de Eduardo Correia, in Unidade e Pluralidade de Infracções, Caso Julgado e Poderes de Cognição do Juiz, 1983, pág. 337, segundo o qual, «… verificado que entre as actividades do agente existe uma conexão no tempo tal que, de harmonia com a experiência comum e as leis psicológicas conhecidas, se deva presumir tê-las executado a todas sem renovar o respectivo processo de motivação, estamos em presença de uma unidade jurídica, de uma só infracção»”, cfr. Acórdão do Tribunal da Relação do Porto datado de 07/03/2007, proferido no processo n.º 0646249, in www.dgsi.pt.,o que impede de considerar o dolo como genérico ou unitário resultante de uma linha psicológica unitária, e por outro lado se a conexão temporal constitui um indicador ou elemento indiciário da continuação criminosa (Ac. STJ 23/1/08 www.dgsi.pr/jstj proc. 07P4830) no sentido de estando presente ser de indagar a verificação dos demais requisitos, sem essa conexão a continuação não existe.
Ora só quando ocorrerem todos aqueles factores é possível a unificação num crime continuado (que constitui uma excepção á pluralidade de crimes), pelo que a falta de qualquer um daqueles itens impede a mesma unificação - Ac.STJ 4/11/92 BMJ 421, pág.195;
Assim dado que não estamos perante um “… preenchimento plurimo do mesmo tipo de crime (…) através de uma execução homogénea (…) violadora dos mesmos bens jurídicos, no quadro de uma situação exterior que permaneceu igual e lhe facilitou a execução decorrendo daí uma considerável diminuição da culpa que actuou na execução de um desígnio criminoso sucessivamente renovado” Ac.STJ 4/11/92 cit. não é possível unificar as diversas condutas do arguido num crime continuado.

Assim improcede esta questão.
+
No que á redução da pena respeita, ela é pretendida, em 1ª linha porque ocorreu errada valoração da confissão do arguido.
Cremos que sem razão, pois ali se ponderou “a favor do arguido a confissão integral e sem reservas, reconhecendo e assumindo o erro,” o que tendo em conta a intervenção das autoridades policiais na apreensão das máquinas, presenciando os crimes, demonstra quiçá uma valoração superior á que devia.

Por outro lado, atentas as molduras penais do ilícito em causa, e as penas parcelares aplicadas, foram observadas as regras legais relativas á determinação das penas, pois foi ponderado: o dolo directo, o grau de ilicitude mediano e diverso quanto ao uso de uma ou de duas máquinas de cada vez, as exigências de prevenção especial que se fazem sentir pela reiteração das condutas do arguido e por 3 dos crimes o terem sido depois de ter sido condenado pelo mesmo ilícito, revelando “lacunas do ponto de vista da adesão aos valores e regras da sociedade, para além da desconsideração pelas possíveis sanções”, a sua integração social, familiar e profissional, e estar desempregado, e as necessidades de prevenção geral positiva, que não sendo elevadas torna-se necessário reforçar perante a comunidade a validade da norma jurídica violada, por estar a revelar uma prática crescente, pelo que as penas parcelares aplicadas se mostram adequadas e justas,
e tendo em conta como teve a sentença recorrida “… as circunstâncias em que o arguido praticou os factos, nomeadamente, como agravante, a dispersão temporal dos mesmos e a sucessiva renovação da resolução criminosa, mesmo depois das apreensões e até da condenação crime que entretanto sofreu; como atenuante, a personalidade do arguido, que ainda assim não revela tendência criminosa grave, pois “apenas” tem antecedentes criminais na área da criminalidade sob censura e mostra-se integrado profissional, social e familiarmente.” cremos que a pena única aplicada se padece de algum vicio é de benevolência, pois a personalidade que o arguido revela, e lhe é censurável, não é apenas de desrespeito á Ordem Jurídica, mas de afrontamento da mesma, reiteradamente assumido nas suas condutas;

E no que aos dias de trabalho a favor da comunidade se refere, o único argumento utilizado pelo arguido, é o de a sua duração se aproximar do seu limite máximo (actual: 480 horas).
Mas cremos que sem razão, quer em face da lei anterior quer da actual, sendo que em face da lei anterior a fixação em 330 horas se mostra inferior á proporcionalidade (380 horas para 12 meses ou 365 dias) da pena de prisão aplicada (11 meses de prisão) mas apesar disso equitativa e justa na ausência de qualquer outro critério legalmente imposto (artº 58º1 e 3 CP), e no regime actual - artº 58º3 CP 2007 - face ao critério imposto legalmente (uma hora de trabalho equivale a um dia de prisão sendo o limite máximo de 480 horas) as horas de trabalho a favor da comunidade não seriam em numero inferior.
Não ocorre qualquer razão ou fundamento para fazer diminuir a duração da pena de substituição e por isso, improcede esta questão.

Quanto ao quantitativo diário da multa, manda a lei atender a situação económica e financeira do condenado e os seus encargos pessoais – artº 47º CP - entre o mínimo de 1,00€ (á data dos factos) ou 5,00€ actual.
O que se conseguiu provar em termos de situação económica do arguido (com base nas suas declarações) consta da sentença, que se é elucidativo da situação económica do arguido actual “ … deixou de explorar o estabelecimento supra referido em Maio de 2008, estando actualmente desempregado, a companheira … auferindo cerca de € 450,00 mensais. … tem um filho de 3 anos de idade… vive em casa própria, pagando cerca de € 800,00 de prestação mensal do empréstimo contraído para a sua aquisição.” mas não é elucidativo da sua situação financeira, que parece ser melhor, dadas as despesas a suportar – o que implica réditos para o efeito (e quiçá também a económica).
Daí a necessidade de nos socorrermos de indicadores sociais, para o efeito em face da determinação legal. Por isso e tendo em conta os mínimos fixados na lei – que prescindem da ponderação da situação económica (pois como mínimos são sempre aplicáveis seja qual for a situação económica posto que condenados em pena de multa) aquela situação económica só ganha relevo, quando a taxa diária a aplicar for superior ao limite mínimo.
Assim tendo em conta a taxa mínima á data e a nova ponderação legal da taxa mínima (5.00€) e da situação económica que os factos revelam criticamente ponderada tendo o arguido exercido uma actividade comercial, e que o salário mínimo nacional corresponde a um ganho diário superior a 20,00€, o facto de ao arguido ter sido fixada a taxa diária de 5,00€ (correspondente a ¼ daquele salário diário), não pode considerar-se excessiva, sob pena de inútil e não cumprir a sua função e finalidade (artº 40º1 CP: proteger os bens jurídicos e reintegrar o arguido na sociedade de modo a não voltar a delinquir) ao não representar qualquer sacrifício para o condenado, pois é comummente aceite que deve ser fixada de forma a que represente e constitua um sacrifício real para o arguido para que mantenha a característica de verdadeira pena - como modo de evitar um “efeito dessocializador” – cfr. J. Fig. Dias, As Cons. Jur. Crime, 2005, pág 157.
Improcede por isso esta questão, e com ela o recurso.
+

Pelo exposto, o Tribunal da Relação do Porto, decide:
Negar provimento ao recurso interposto pelo arguido e em consequência confirma a sentença recorrida.
Condenar o arguido no pagamento da taxa de justiça de 04 Uc´s, e nas demais custas.
Notifique.
Dn
+

Porto, 14/10/09
José Alberto Vaz Carreto
Joaquim Arménio Correia Gomes