Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
450/08.4TBVPA.P1
Nº Convencional: JTRP000
Relator: RITA ROMEIRA
Descritores: EXPROPRIAÇÃO
PERÍCIA
FORÇA PROBATÓRIA
SUBSTITUIÇÃO DOS PERITOS PELO JUIZ
Nº do Documento: RP20131218450/08.4TBVPA.P1
Data do Acordão: 12/18/2013
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: CONFIRMADA A DECISÃO
Indicações Eventuais: 5ª SECÇÃO
Área Temática: .
Legislação Nacional: ARTº 655º, 691º DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL
ARTº 389º DO CÓDIGO CIVIL
ARTº 61º DO C. EXPROPRIAÇÕES
Sumário: I - Sem prejuízo da força probatória da perícia ser fixada livremente pelo tribunal – art. 389º do Código Civil -, no processo de expropriação a perícia assume uma particular importância – evidenciada até pela circunstância de se tratar de diligência obrigatória, nos termos do art. 61º, nº 2, do C. Expropriações.
II – De modo que, as conclusões apresentadas pelos peritos – unanimemente ou por maioria, preferindo-se as que provêm dos peritos nomeados pelo tribunal, pela maior equidistância relativamente às partes – só devem ser afastadas se o julgador, nos seus poderes de livre apreciação da prova, decorrentes dos art.º 655º e 591º do Código de Processo Civil, constata que foram elaboradas com base em critérios legalmente inadmissíveis ou desadequados, ou quando se lhe deparam erros ou lapsos evidentes, que importem correcção.
III - E se é certo que o tribunal não deve aceitar acriticamente os elementos fornecidos pelos Srs. Peritos, é também certo que os Srs. Juízes não devem substituir-se aos peritos, cedendo à tentação de emitir juízos valorativos de carácter eminentemente técnico, para o qual não estão – nem têm de estar – vocacionados.
Reclamações:
Decisão Texto Integral: Proc.Nº 450/08.4TBVPA.P1
Tribunal recorrido - Secção Única do Tribunal Judicial de Vila Pouca de Aguiar
Recorrente: EP – Estradas de Portugal, SA.
Recorridos: B… e outros.

Acordam no Tribunal da Relação do Porto

I – RELATÓRIO
Nos presentes autos de expropriação por utilidade pública em que é expropriante a EP – Estradas de Portugal, S.A. e são expropriados C…, D…, B… e E… e outros, discute-se a expropriação da parcela de terreno nº 98, com a área total de 7500 m2, a destacar de um prédio sito na freguesia e concelho de Vila Pouca de Aguiar, inscrito na matriz predial rústica sob o artigo 2158 e descrito na Conservatória do Registo Predial de Vila Pouca de Aguiar com o número 243/19880915, que confronta do norte com F…, a Sul com baldio, Nascente com herdeiros de G… e Poente com baldio.

A declaração de utilidade pública da expropriação teve lugar através de despacho do Secretário de Estado Adjunto das Obras Públicas e das Comunicações de 25/05/2005, publicado no Diário da República n.º 115, II Série, de 17/06/2005, sendo, no mesmo despacho, a expropriante autorizada a tomar posse administrativa da referida parcela.

Foi realizada a vistoria "ad perpetuam rei memoriam", datada de 14.7.2005, cujo relatório consta a fls. 40 e 41, complementado a fls. 33.

A decisão arbitral, por unanimidade, (cfr. fls. 5 e ss.) atribuiu à parcela expropriada o valor de € 19.275,00. Este valor resultou da avaliação dessa parcela segundo os critérios estabelecidos no artigo 27º, do Código das Expropriações, tendo em atenção o que dispõe o seu nº 3. Os árbitros consideraram que o terreno da parcela se situa em área classificada como sendo de “Espaços Florestais – Áreas Submetidas a regime florestal” e terá de ser classificado como “solo para outros fins”, acrescendo que a parte sobrante florestal do prédio (17.350m2) não sofre qualquer depreciação, apresentando as mesmas características e potencialidades florestais da parcela.

A expropriante procedeu ao depósito bancário da quantia determinada no acórdão de arbitragem a fls. 4, tendo havido posse administrativa, em 22.9.2005, cfr. consta a fls. 26 e 27.
Após, ter sido recebido o processo em Tribunal, foi proferido despacho de adjudicação da parcela à expropriante, cfr. consta a fls. 69, no dia 24.10.2008.

Notificada da decisão arbitral, dela veio recorrer a entidade expropriante, nos termos do artº 52, do CE, conforme consta a fls. 107 e ss., defendendo que a decisão arbitral atribuiu à parcela expropriada, um valor que excede em muito o seu valor real e corrente.
Conclui que: - o acórdão arbitral adoptou uma metodologia de trabalho que contraria preceitos legais expressos e efectuou uma errónea valorização do terreno expropriado;
- a parcela dispõe de acesso por um caminho publico em terra batida, não infra estruturado;
- face ao PDM de Vila Pouca de Aguiar, o prédio está inserido em “espaços florestais – áreas submetidas a regime florestal, pelo que o seu solo deve ser classificado como “para outros fins”;
- no seu laudo, os árbitros consideraram valores de produção media florestal exagerados, considerando que o solo expropriado está localizado numa zona fria e com afloramentos rochosos;
Pede a revogação da decisão arbitral, considerando que o valor da parcela a expropriar não deverá ser superior a 7.500,00 euros.
A fls. 110 indica lista de quesitos.

Admitido, este recurso, a fls. 115 e notificados os expropriados para responderem, vieram os mesmos ao abrigo do disposto nos artºs 59 e 60, do CE, nos termos que constam a fls. 132 e ss., apresentar quesitos, resposta ao recurso da decisão arbitral e interpôr recurso subordinado, cumulando na mesma peça processual, quer a alegação a este referente, quer a contra-alegação ao recurso principal da parte contrária.
Alegam, em síntese, que: - o valor da avaliação de m2 em toda aquela área foi de € 2,57/m2 (veja-se fls. 283 e 289);
- a área efectivamente ocupada é superior à mencionada, já que foi tida em conta a área ocupada com a infra-estrutura e não com o aterro ali levantado;
- os alicerces e aterro ocupam mais do dobro da parte expropriada;
- tal ocupação inviabiliza o acesso à área sobrante, a qual perdeu os cómodos que tinha enquanto prédio total.
Pedem a improcedência do recurso apresentado e, em consequência, deve o prédio expropriado ser avaliado em 2,57€ m2, bem como ser determinada a expropriação da totalidade do prédio, pelo facto de os cómodos da parte sobrante terem perdido o interesse para os requeridos, nos termos do artº 3, do CE.

Admitido o recurso subordinado da expropriante a fls. 162, veio a expropriante responder a fls. 131 e ss, ao abrigo do disposto no artº 60, nº1, do CE, termina pedindo que deve o recurso subordinado ser julgado improcedente, fixando-se o valor da indemnização conforme requerido no recurso inicial.

A fls. 169 e ss., a expropriante veio responder ao requerimento de expropriação total deduzido pelos expropriados, pedindo a sua improcedência.
Após as diligências tidas por necessárias, tal pedido foi declarado improcedente, de acordo com decisão de fls. 255 a 258.

Nomeados os peritos, procedeu-se à respectiva avaliação.

A fls. 292 e ss., os peritos nomeados pelo tribunal e o perito indicado pelos expropriados emitiram laudo maioritário, calculando o montante da indemnização a atribuir à parcela nº 98, de acordo com as normas estabelecidas nos artºs 24 a 27, do CE, em € 19.275,00.
Já o perito da expropriante calculou o montante da indemnização a atribuir à parcela em € 8.100,00.
Todos consideraram o solo da parcela como solo apto para outros fins.

Notificadas a entidade expropriante e os expropriados do teor do laudo e das respostas aos quesitos, não foram solicitados esclarecimentos.

Concluídas as diligências de prova, em sede de audiência de julgamento, foi proferido o despacho de fls. 322, determinando a notificação das partes nos termos e para efeitos do disposto no artº 64, do CE.

Na sequência disso, apenas, a fls. 325 e ss, alegou a expropriante, defendendo que o valor da justa indemnização corresponde ao valor fixado no laudo pericial minoritário, sugerindo na conclusão VI a fls. 327, que se atenda aos 3 valores unitários do solo, defendidos pelos 6 peritos que intervieram nos presentes autos, fixando-se um valor que resulte da sua média aritmética, concluindo que o valor da indemnização a atribuir aos expropriados não deverá em circunstância alguma exceder o montante calculado nos termos supra expostos.

Por fim, a fls. 330 e ss. foi proferida sentença que decidiu nos seguintes moldes:
“Pelo exposto, julgo improcedente o recurso interposto pela entidade expropriante e parcialmente procedente o recurso interposto pelos expropriados e, em consequência, decido fixar o montante indemnizatório a pagar pela expropriante em € 19.275,00 (dezanove mil, duzentos e setenta e cinco euros), absolvendo do mais a expropriante.
*
O valor fixado será actualizado de acordo com os índices de preços no consumidor, com exclusão da habitação, publicados pelo I.N.E, desde a data da publicação da declaração de utilidade pública até à data da notificação do despacho que autorizou o levantamento da quantia sobre a qual se verificou acordo, sendo que a partir de então a actualização recai apenas sobre a diferença entre o valor apurado nesta decisão e o valor já atribuído aos expropriados.
*
Custas por expropriante e expropriados, na proporção dos respectivos decaimentos – art.º 446.º n.ºs 1 e 2 do CPC.”.

Inconformada a entidade expropriante interpôs recurso, terminando as suas alegações com as seguintes CONCLUSÕES:
I. A perícia suscitou questões de direito com relevância para o cálculo do valor do bem expropriado o que implicava que o julgador não estivesse vinculado a uma mera subscrição do laudo pericial.
II. O rigor do conteúdo do relatório de vistoria APRM levava a que este constituísse um elemento de prova suficientemente sólido que habilitava o julgador a divergir dos peritos subscritores do laudo maioritário.
III. É essencial a referência feita pelo relatório de vistoria APRM de que estamos perante solo com relevo declivoso e com vários afloramentos rochosos, o que notoriamente resulta em encargos de abate superior aos usuais, bem como a uma menor produção, uma vez que a produção não pode coexistir com a área onde se encontram os afloramentos rochosos.
IV. Todavia, a sentença em crise aderiu a um laudo pericial que não tomou em consideração as características reais da parcela à data da DUP, tendo avaliado o solo como se tivesse um bom povoamento de pinheiro bravo, com boa capacidade produtiva, bons acessos e uma boa localização, determinando produções acima da média para a região de trás-os-montes.
V. Ao terem considerado uma produção de material lenhoso médio, os Srs. Peritos deveriam ter contabilizado os encargos com a transformação do solo, nomeadamente a remoção dos afloramentos rochosos.
VI. Pelo que se consideram exagerados os valores e encargos de produção defendidos no laudo maioritário, o qual não espelha as circunstâncias de facto supra referidas.
VII. Em contrapartida, o laudo minoritário encontra-se devidamente fundamentado, preconizando critérios sensatos e ponderados o que contribui para que o valor nele fixado corresponda ao da justa indemnização.
VIII. Deve ainda ser atendido que no caso concreto, temos um relatório adicional junto aos autos, o qual pode e deve ser atendido como meio de prova com relevância para a determinação do valor unitário do solo: relatório do perito que avaliou a área sobrante da parcela expropriada.
IX. Uma vez que temos 3 valores unitários do solo, defendidos pelos 6 peritos que intervieram nos presentes autos, um método equitativa poderá consistir na fixação de um valor que resulte da sua média aritmética.
X. Sem prescindir, note-se que o Tribunal não pode condenar em quantia superior àquela que foi pedida, estando limitado pelo valor defendido no recurso subordinado dos expropriados, nomeadamente, 11.250€, os quais defenderam um valor unitário de 1,50€/m2.
Nestes termos e nos melhores de direito que V. Ex.as doutamente suprirão, deve a presente apelação ser julgada procedente, e em consequência, ser revogado o douto despacho em crise, com as respectivas consequências legais. Assim decidindo, farão V. Ex.as a habitual JUSTIÇA.
E.R.D.

Não foram apresentadas contra-alegações.

Colhidos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir.
Sendo o objecto dos recursos delimitado pelas conclusões dos recorrentes não podendo este tribunal conhecer de matérias nelas não incluídas, sem prejuízo das de conhecimento oficioso, são as seguintes as questões a decidir:
- saber se deve revogar-se a decisão recorrida, por se mostrarem exagerados os valores defendidos no laudo maioritário e, o valor da indemnização não deve ser fixado em montante superior a € 11.250,00;
- saber se o Tribunal “a quo” condenou em quantia superior àquela que foi pedida.

III - FUNDAMENTAÇÃO
A) - OS FACTOS
a) Por despacho do Secretário de Estado Adjunto das Obras Públicas e das Comunicações de 25/05/2005, publicado no Diário da República n.º 115, II Série, de 17/06/2005, declarada a utilidade pública da expropriação da parcela de terreno, com a área total de 7500 m2, a destacar de um prédio sito na freguesia de Vila Pouca de Aguiar, concelho de Vila Pouca de Aguiar, inscrito na matriz predial rústica sob o artigo 2158 e descrito na Conservatória do Registo Predial de Vila Pouca de Aguiar com o número 243/19880915, que confronta do norte com F…, a Sul com baldio, Nascente com herdeiros de G… e Poente com baldio.
b) A referida expropriação destinou-se à execução da obra “IP3 – Scut Interior Norte – Sublanço E1 – … – …”.
c) A entidade expropriante tomou posse administrativa da parcela expropriada.
d) A parcela tem a área de 7500 m2 e apresenta uma configuração irregular.
e) À data da VAPRM a parcela apresentava um relevo declivoso, com vários afloramentos rochosos e esteve florestada com pinheiros já abatidos, encontrando-se actualmente em fase de reflorestação, após ter sido devastada por um incêndio de grandes proporções.
f) Na área da parcela e do prédio existe uma nascente de água, à data da VAPRM, sem água.
g) De acordo com o PDM de Vila Pouca de Aguiar, vigente à data da DUP, a parcela localiza-se em “espaços florestais – áreas submetidas a regime florestal”.
h) A área total do prédio é de 24.850 m2.
i) Dadas as condicionantes do Plano Director Municipal e as características do local, consideraram-se os seguintes parâmetros para a totalidade do prédio e para a parcela expropriada:
a) produção de material lenhoso: 15ton/ha/ano.
b) valor médio do material lenhoso: 45€/tonelada.
c) custos de administração 5%.
d) taxa de capitalização do rendimento 2,5%.
j) O Acórdão dos Senhores Árbitros proferido na fase da arbitragem, proferido por unanimidade, encontrou como indemnização devida pela expropriação o valor de € 19.275,00 para a parcela expropriada, conforme documento que consta de fls. 5 a 9 dos autos e cujo teor se dá por integralmente reproduzido.
l) Os Senhores Peritos indicados pelo Tribunal e pelos expropriados calcularam a indemnização para a parcela e acharam o valor de € 19.275,00, conforme consta de fls. 292 a 300 e cujo teor se dá por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais.
m) O Senhor Perito indicado pela expropriante no seu laudo, calculou a indemnização para a parcela e achou o valor de € 8.100,00, conforme consta das já referidas fls. 292 a 300.
*
B) O DIREITO
Insurge-se a expropriante, no recurso interposto, contra o valor de € 19.275,00 que foi fixado na decisão recorrida a título de indemnização a atribuir aos expropriados, pugnando pela sua revogação e peticionando que se fixe a justa indemnização a atribuir aos expropriados em valor não superior a € 11.250,00, argumentando (veja-se conclusão X) que o Tribunal não pode condenar em quantia superior àquela que foi pedida, estando limitado pelo valor defendido no recurso subordinado dos expropriados, os quais defenderam um valor unitário de 1,50€/m2.
Ora, há desde já que dizer que, não tem a recorrente qualquer razão, neste aspecto, ao insurgir-se contra a decisão recorrida.
O que a verificar-se, constituiria causa de nulidade da sentença, nos termos referidos no nº1, al. e), do art. 668º, do CPC.
Mas, não se verifica e, certamente, só por lapso a recorrente suscita esta questão, já que o lapso cometido pelos expropriados foi, atempadamente, rectificado, vejam-se o requerimento de fls. 283, onde se solicita a sua correcção e o douto despacho de fls. 289, datado de 14.12.2011, que a deferiu.

Improcede, assim, a conclusão X das alegações.

Resta-nos apreciar se deve ser revogada a decisão recorrida, por se mostrar exagerado o valor da indemnização nela fixado como defende a recorrente, por considerar exagerados os valores e encargos de produção defendidos no laudo maioritário, devendo ter-se em consideração o laudo minoritário, já que, em seu entender, o valor nele fixado corresponde ao da justa indemnização, ou então, fixar-se o valor que resulte da média aritmética dos 3 valores unitários do solo, defendidos pelos 6 peritos que intervieram nos presentes autos, como alega nas conclusões VIII e IX.
Diga-se, que a divergência entre o laudo maioritário e minoritário radica, apenas no valor do solo apurado, tendo como base a produção florestal, já que são diferentes os valores dos parâmetros considerados: produção de material lenhoso (15ton/ha/ano e 12ton/ha/ano), valor médio do material lenhoso (45€/ton e 30€/ton), custos de administração (5% e 10%) e taxa de capitalização do rendimento (2,5% e 3%).
Alega a expropriante, para fundamentar a sua pretensão, que a sentença sob recurso aderiu a um laudo pericial que não tomou em consideração as características reais da parcela à data da DUP. Defende que os Srs. Peritos ao terem considerado uma produção de material lenhoso médio deveriam ter contabilizado os encargos com a transformação do solo, nomeadamente a remoção dos afloramentos rochosos, apesar de não concretizar em que termos e, nem do laudo minoritário resulta que tal tenha sido considerado.
Ao invés, o Relatório do Perito da Expropriante é fundamentado com base nos mesmos parâmetros que o Relatório dos Peritos do Tribunal e Expropriados, o valor atribuído ao solo da parcela pelo perito da expropriante só é diferente do valor atribuído pelos restantes peritos, porque aquele considerou valores diferentes de produção e valor desta, custos de administração e taxa de capitalização do rendimento em percentagens, também, diferentes, como já referimos supra.

Exposto o que antecede, vejamos.
É sabido que, por imperativo constitucional, qualquer expropriação importa para o expropriante o dever de reparar os prejuízos causados ao expropriado com a expropriação, ou seja, de lhe pagar uma justa indemnização. A indemnização é justa quando repõe no património do expropriado, pelo equivalente em dinheiro, o valor da perda do bem por este sofrida. Assim, a justa indemnização há-de ser obtida com recurso a critérios que respeitem os princípios constitucionais da igualdade e proporcionalidade, assim como do direito geral à reparação dos danos, como corolário do Estado de direito democrático – art.º 2.º, da CRP, tomando como ponto de referência o valor adequado que permita ressarcir o expropriado da perda do bem que lhe pertencia, com respeito pelo princípio da equivalência de valores.
A expropriação por utilidade pública só pode ser efectuada com base na lei mediante o pagamento de justa indemnização – art.º 62.º, n.º 2, da CRP.
Nos termos que dispõe o art. 1º, do CE, (Código das Expropriações aprovado pela Lei n.º 168/99 de 18 de Setembro, aqui aplicável, atenta a data de publicação da declaração de utilidade pública (17/06/2005) e, diploma a que respeitarão todos os artigos a seguir referidos sem outra menção de origem) a expropriação dos bens imóveis e os direitos a eles inerentes podem ter lugar mediante o pagamento contemporâneo de uma justa indemnização nos termos do presente Código.
O valor pecuniário arbitrado, a título de indemnização, deve ter como referência o valor real do bem expropriado, valor esse que numa economia com as características daquela que é a nossa – economia de mercado – é o do seu valor corrente, ou seja o seu valor venal ou de mercado, numa situação de normalidade económica.
A indemnização calculada de acordo com o valor de mercado, isto é, com base na quantia que teria sido paga pelo bem expropriado se este tivesse sido objecto de um livre contrato de compra e venda, é aquela que está em melhores condições de compensar integralmente o sacrifício patrimonial do expropriado e de garantir que este, em comparação com outros cidadãos não expropriados, não seja tratado de um modo injusto e desigual.
Este valor normativo de mercado foi o critério adoptado pelo Código das Expropriações de 1999, concretizando o princípio constitucional, no seu art. 23º, o qual é o valor venal com algumas correcções, e constitui o critério referencial determinante da avaliação dos bens expropriados para o efeito de fixação da respectiva indemnização a receber pelos expropriados.
Estabelece o art. 23º, nº 1 – “A justa indemnização não visa compensar o benefício alcançado pela entidade expropriante, mas ressarcir o prejuízo que para o expropriado advém da expropriação, correspondente ao valor real e corrente do bem de acordo com o seu destino efectivo ou possível numa utilização económica normal, à data da publicação da declaração de utilidade pública, tendo em consideração as circunstâncias e condições de facto existentes naquela data.”.
Acrescentando, no seu nº 5 – “Sem prejuízo do disposto nos nºs 2 e 3 do presente artigo, o valor dos bens calculado de acordo com os critérios referenciais constantes dos artigos 26º e seguintes deve corresponder ao valor real e corrente dos mesmos, numa situação normal de mercado, podendo a entidade expropriante e o expropriado, quando tal se não verifique, requerer ou o tribunal decidir oficiosamente, que na avaliação sejam atendidos outros critérios para alcançar aquele valor.”.
Tendo em vista evitar alguma subjectividade na determinação deste valor, o legislador fixou critérios valorativos instrumentais, relativamente a vários tipos de bens expropriados.
A expropriação não pode ser entendida como fonte de enriquecimento, o que aconteceria a satisfazerem-se frequentes pretensões exageradas dos expropriados, nem fonte de empobrecimento, fazendo recair apenas sobre eles os encargos com a satisfação das necessidades colectivas que se visaram satisfazer com a expropriação.
Para se alcançar o justo valor dos bens há que atender ao destino efectivo ou possível do bem numa utilização económica normal.
A sentença recorrida classificou o solo da parcela expropriada como solo apto para outros fins, classificação que nunca foi posta em questão pelas partes, nem foi colocada em crise no recurso, pelo que para determinação do seu valor devem ser aplicados os critérios de cálculo da indemnização previstos no artigo 27º.
Relativamente ao cálculo do valor do “Solo para outros fins” valem os critérios legais estabelecidos no art. 27º, designadamente, nos termos do n.º3 do citado preceito legal “(…) o valor do solo para outros fins será calculado tendo em atenção os seus rendimentos efectivo e possível no estado existente à data da DUP, a natureza do solo ou subsolo, a configuração do terreno e as condições de acesso, as culturas predominantes e o clima da região, os frutos pendentes e outras circunstâncias objectivas susceptíveis de influir no respectivo cálculo”.

Analisemos, então, se o cálculo da indemnização efectuado na sentença não é justo, mostrando-se exagerado como defende a recorrente.
A sentença recorrida fixou o montante da indemnização, aderindo aos valores apurados no laudo maioritário, em € 19.275,00. O que a recorrente considera exagerado, considerando sensato e ponderado o valor de € 8 100,00 fixado no laudo minoritário.
A sentença recorrida decidiu do seguinte modo: “Na situação vertente, existe um laudo maioritário, subscrito por quatro peritos (três do tribunal e o perito dos expropriados) que concerne à fixação do montante indemnizatório a atribuir aos expropriados com justiça.
Utilizando os critérios legais para fixação da indemnização como terreno apto para outros fins, observando o preceituado no art.º 27.º n.º 3 do actual CE chegaram os senhores peritos subscritores do laudo maioritário, ao valor global de € 19.275,00, respeitante ao valor do solo, sendo que entenderam não existir qualquer depreciação da parte sobrante, já que a mesma mantem o mesmo tipo de uso e proporcionalmente os mesmos cómodos.
É a bondade desses critérios que fundamentam as conclusões e os valores em causa que, afinal, cumpre ponderar.
Assim, analisados os laudos, os senhores peritos calcularam o valor da parcela expropriada com base na produção de material lenhoso.
Divergem os senhores peritos quanto ao valor de tal produção, ao valor medio do material lenhoso, aos custos de administração e à taxa de capitalização do rendimento, sendo que no laudo maioritário considerou-se uma produção de material lenhoso: 15ton/ha/ano; valor medio do material lenhoso: 45€/tonelada; custos de administração 5%; taxa de capitalização do rendimento 2,5%.
Uma vez que os critérios utilizados pelo laudo maioritário respeitam as regras legais dos preceitos citados, bem como os preços unitários e encargos de exploração atribuídos, à produção de material lenhoso, nos parecem mais adequados, aceitam-se como justos os resultados encontrados pelos peritos do laudo maioritário.
Temos, assim, que a decisão recorrida, aderiu ao laudo de peritagem, maioritário, a expropriante discorda, referindo que a mesma “aderiu a um laudo pericial que não tomou em consideração as características reais da parcela à data da DUP...”.
Mas, não lhe assiste razão.
Pois, ao analisarmos o relatório pericial junto, não podemos concordar que assim seja, basta atentar no exposto pelos Srs. Peritos intervenientes na perícia realizada, nomeadamente a fls. 294 e 296. Donde, a sentença recorrida aderiu ao laudo, no caso maioritário, subscrito pelos peritos nomeados pelo tribunal e pelos expropriados, em nosso entendimento muito bem.
Segundo a jurisprudência maioritária é entendimento que, verificando-se divergência de análise entre os peritos, cumpre considerar o resultado da prova pericial, no laudo maioritário, sobretudo quando se mostra subscrito pelos peritos nomeados pelo tribunal cuja isenção revela maiores garantias de imparcialidade. E, sendo o mesmo proferido sobre matérias específicas, fora da área de conhecimento do julgador, não se mostra razoável que o Tribunal tenha a necessidade de tecer considerações, sobre assuntos técnicos, em relação aos quais não tem formação para poder pronunciar-se sobre os mesmos, quando tem uma informação subscrita, por maioria, por técnicos com conhecimentos específicos para o efeito.
Contrariamente ao defendido pela expropriante, não concordamos que sejam exagerados os valores e encargos de produção aplicados, maioritariamente e, que os mesmos não tenham tomado em consideração as características reais do terreno à data da DUP.

Por maioria, os peritos que procederam à peritagem, depois de caracterizarem a parcela, referindo que: “...De acordo com o PDM de Vila Pouca de Aguiar, vigente à data da DUP, a parcela localiza-se em “espaços florestais – áreas submetidas a regime florestal”, em sede de avaliação referiram o seguinte: “...Dadas as condicionantes do Plano Director Municipal e as características do local, consideraram-se os seguintes parâmetros para a totalidade do prédio e para a parcela expropriada:
a) produção de material lenhoso: 15ton/ha/ano.
b) valor médio do material lenhoso: 45€/tonelada.
c) custos de administração 5%.
d) taxa de capitalização do rendimento 2,5%.”.
Conforme consta da decisão recorrida a Mª Juíza “a quo” pareceu-lhe mais adequados e, aceitou como justos os valores encontrados pelos peritos do laudo maioritário, referindo: “…os critérios utilizados pelo laudo maioritário respeitam as regras legais dos preceitos citados, bem como os preços unitários e encargos de exploração atribuídos, à produção de material lenhoso,…”, o que subscrevemos, considerando, também nós, justos e adequados os valores que os peritos consideraram correctos perante a avaliação que, maioritariamente, fizeram, possuindo conhecimentos técnicos para esse efeito, pelo que, não assiste razão à recorrente.

Depois, também, não vemos que a decisão recorrida, perante o carácter técnico da questão e tendo em conta a maioria da decisão dos Srs. Peritos, tivesse necessidade de se pronunciar de outro modo, já que não apurou que essa decisão tivesse por base critérios legalmente inadmissíveis ou desadequados ou padecesse de qualquer erro ou lapso.
Pois como é sabido e vem sendo decidido a este propósito, sem prejuízo da força probatória da perícia ser fixada livremente pelo tribunal – art. 389º do Cód. Civil -, no processo de expropriação a perícia assume uma particular importância – evidenciada até pela circunstância de se tratar de diligência obrigatória, nos termos do art. 61º, nº 2 – de tal forma que podemos, seguramente, afirmar que as conclusões apresentadas pelos peritos – unanimemente ou por maioria, preferindo-se as que provêm dos peritos nomeados pelo tribunal, pela maior equidistância relativamente às partes – só devem ser afastadas quando se constata que foram elaboradas com base em critérios legalmente inadmissíveis ou desadequados, ou quando se nos deparam erros ou lapsos evidentes, que importem correcção.
E se é certo que o tribunal não deve aceitar acriticamente os elementos fornecidos pelos Srs. Peritos, temos também por seguro que os Srs. Juízes não devem substituir-se aos peritos, cedendo à tentação de emitir juízos valorativos de carácter eminentemente técnico, para o qual não estão – nem têm de estar – vocacionados.
Tudo isto, sem prejuízo de aceitar-se que há um grau mínimo de subjectividade que é inerente à apreciação de cada um dos peritos, na aplicação dos seus específicos conhecimentos científicos, e em função da sua experiência pessoal.

Pelo que, não merece reparo, o facto da Mª Juíza “a quo” ter dado prevalência ao relatório maioritário dos Srs. Peritos do Tribunal e expropriados, sendo que o relatório de avaliação em causa se mostra conforme às normas legais ao caso aplicáveis, e devidamente fundamentado, revestindo-se de cariz exclusivamente técnico, nomeadamente no tocante ao valor e encargos da produção.
Pois que, como é sabido, o julgador, nos seus poderes de livre apreciação da prova, decorrentes dos art.º 655º e 591º do Código de Processo Civil, só deverá afastar-se do laudo dos peritos, caso verifique que estes se afastaram da aplicação de critérios legalmente previstos ou que o laudo padece de erro manifesto ou que é insuficiente a fundamentação, o que não se demonstra no caso em apreço, devendo, ainda, em regra, privilegiar-se o parecer dos peritos do tribunal por oferecerem maiores garantias de imparcialidade, neste sentido, vejam-se os Acs. RL de 6.6.2006 e 17.3.2005 e da RG de 22.1.2003, entre muitos outros, in www.dgsi.pt.
Perante todo o exposto, como já dissemos, não vemos razões, nem temos argumentos que nos permitam pronunciar em sentido contrário ao decidido, a este propósito, na sentença recorrida, não se vislumbrando que tenha sido violado qualquer dispositivo legal.
Acrescendo, que em nosso entender, contrariamente à alusão feita pela recorrente na conclusão I, no caso, a 1ª instância seguiu a orientação subjacente à avaliação feita pelos peritos nomeados pelo tribunal e pelos expropriados, mas não o fez acriticamente, como à evidência decorre da fundamentação expressa na sentença, em sede de direito.
Nestes termos, mantêm-se a decisão por referência aos valores expressos no indicado laudo maioritário, não se demonstrando razões para alteração da mesma.
Assim, improcedem todas as conclusões da apelação.
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Sumário:
I - Sem prejuízo da força probatória da perícia ser fixada livremente pelo tribunal – art. 389º do Código Civil -, no processo de expropriação a perícia assume uma particular importância – evidenciada até pela circunstância de se tratar de diligência obrigatória, nos termos do art. 61º, nº 2, do C. Expropriações.
II – De modo que, as conclusões apresentadas pelos peritos – unanimemente ou por maioria, preferindo-se as que provêm dos peritos nomeados pelo tribunal, pela maior equidistância relativamente às partes – só devem ser afastadas se o julgador, nos seus poderes de livre apreciação da prova, decorrentes dos art.º 655º e 591º do Código de Processo Civil, constata que foram elaboradas com base em critérios legalmente inadmissíveis ou desadequados, ou quando se lhe deparam erros ou lapsos evidentes, que importem correcção.
III - E se é certo que o tribunal não deve aceitar acriticamente os elementos fornecidos pelos Srs. Peritos, é também certo que os Srs. Juízes não devem substituir-se aos peritos, cedendo à tentação de emitir juízos valorativos de carácter eminentemente técnico, para o qual não estão – nem têm de estar – vocacionados.
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III - DECISÃO
Pelo exposto, acordam os Juízes desta secção em julgar improcedente a apelação e confirmar, na íntegra, a sentença recorrida.

Custas pela recorrente.

Porto, 18 de Dezembro de 2013
(processei e revi – art. 138º/5 CPC)
Rita Romeira)
Manuel Domingos Fernandes
Caimoto Jácome