Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
0613241
Nº Convencional: JTRP00039433
Relator: MANUEL BRAZ
Descritores: PROIBIÇÃO DE CONDUZIR VEÍCULO MOTORIZADO
CONDUÇÃO SOB O EFEITO DE ÁLCOOL
Nº do Documento: RP200607190613241
Data do Acordão: 07/19/2006
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REC PENAL.
Decisão: REJEITADO O RECURSO.
Indicações Eventuais: LIVRO 453 - FLS 82.
Área Temática: .
Sumário: A proibição de conduzir, quando tem como fundamento a condenação pelo crime do art. 292º do Cód. Penal, não pode deixar de abarcar todas as categorias de veículos com motor, desde que destinados a circular nas vias públicas ou equiparadas.
Reclamações:
Decisão Texto Integral: Acordam, em conferência, no Tribunal da Relação do Porto:

No 3º juízo do Tribunal Judicial da comarca de Vila Real, em processo sumário, foi o arguido B………. submetido a julgamento e condenado, pela prática de um crime de condução de veículo em estado de embriaguez p. e p. pelos artºs 292º, nº 1, e 69º, nº 1, alínea a), do CP, na pena de 40 dias de multa a € 10 por dia e 3 meses de proibição de conduzir veículos com motor.

Da sentença que assim decidiu interpôs recurso o arguido, sustentando, em síntese, na sua motivação:
-O montante diário da multa não deve exceder € 5.
-A pena acessória de proibição de conduzir deve ser suspensa, mediante prestação de caução de boa conduta.
-Ou então a proibição de conduzir não deve abranger o seu instrumento de trabalho.

O recurso foi admitido.
Não houve resposta.
Nesta instância, a senhora procuradora-geral-adjunta foi de parecer que o recurso deve ser rejeitado, por manifesta improcedência.
Corridos os vistos, cumpre decidir.

Foram dados como provados os seguintes factos:
No dia 09/02/2006, pelas 15,35 horas, o arguido conduzia o seu veículo ligeiro de passageiros, de matrícula ..-..-LR, na EN ., ao km 54,5, no concelho de Vila Real.
Submetido a exame através do aparelho DRAGER, modelo 7110 MKIII P, acusou uma taxa de álcool no sangue de 1,24 g/l.
O arguido agiu livre e conscientemente, bem sabendo que a sua conduta não lhe era permitida.
Confessou livre e espontaneamente os factos provados, mostrando-se arrependido.
Não tem antecedentes criminais, nem tem averbada no seu RIC a prática de qualquer contra-ordenação. É considerado por aqueles com quem convive como pessoa muito bem comportada.
É taxista há cerca de 45 anos, sendo a mulher doméstica. Tem dois filhos maiores.
Tem o 4º ano de escolaridade.

Foi dado como não provado que tenha graves dificuldades económicas.

Fundamentação:
Houve renúncia ao recurso em matéria de facto – artºs 389º, nº 2, e 428º, nº 2, do CPP.
Não se invoca nem vislumbra qualquer dos vícios do artº 410º, nº 2.
Também não vem arguida qualquer nulidade e nenhuma que seja de conhecimento oficioso se verifica.
É, pois, intocável a decisão de facto.

A primeira discordância do recorrente dirige-se à quantia a que se fez corresponder cada dia de multa, defendendo que não deve exceder € 5.
Sobre a matéria rege o artº 47º, nº 2, do CP: Cada dia de multa corresponde a uma quantia entre € 1 e € 498,80, que o tribunal fixa em função da situação económica e financeira do condenado e dos seus encargos pessoais.
A decisão recorrida dá-nos poucos elementos acerca da situação económica e financeira do recorrente e dos seus encargos. Não sabemos, nomeadamente, qual o rendimento mensal do seu agregado familiar e se vive em casa própria ou arrendada, de nada valendo aqui o que sobre a matéria se alegou na motivação de recurso, por não constar da decisão proferida em matéria de facto.
Mas, sabemos que é, há cerca de 45 anos, taxista, profissão que, como é facto notório, não é exercida pelos mais pobres, até pelos requisitos que exige, como a habilitação com licença de condução, e propicia rendimentos pelo menos medianos.
Também sabemos que não tem filhos menores a seu cargo, o que desde logo exclui certos encargos. A sentença recorrida afirma que tem dois filhos maiores, mas não diz que estão a seu cargo. E nada permite concluir que estejam.
Assim, porque a decisão recorrida fixou o quantitativo diário da multa em € 10, ou seja, muito perto do limite mínimo previsto, os elementos disponíveis são suficientes para concluir que esse montante nada tem de excessivo. Valor inferior só pode aceitar-se para pessoas com situação económico-financeira muito débil. E, como se viu, não esse o caso.
De resto, o recorrente limita-se a dizer que o valor diário da multa não devia ser superior a € 5, com fundamento em alegadas dificuldades económicas, que não se provaram.

Em segundo lugar, diz o arguido que a pena acessória de proibição de conduzir devia ser suspensa, mediante a prestação de boa conduta ou trabalho a favor da comunidade.
Trata-se de pretensão manifestamente sem suporte legal.
A pena de proibição de conduzir veículos com motor é consequência da prática de um crime, no caso, do crime de condução de veículo em estado de embriaguez, está prevista no Código Penal – artº 69º – e rege-se pelas disposições deste diploma, que só prevê a possibilidade de suspensão da execução de penas de prisão – artº 50º.
Sobre o tema escreve Germano Marques da Silva: “Importa referir que a pena acessória de proibição de conduzir não pode ser suspensa na sua execução nem substituída por outra. Verificados os seus pressupostos e aplicada a pena acessória, esta tem de ser executada” (Crimes Rodoviários, página 28).
A sanção cuja execução pode ser suspensa, com ou sem condições, é a da inibição de conduzir aplicada pela prática de contra-ordenações graves – artºs 141º e 147º do Código da Estrada.

Subsidiariamente, pretende o recorrente que a proibição de conduzir não abranja o “seu instrumento de trabalho”, isto é, os “táxis”.
Claramente, também esta pretensão não pode proceder.
O recorrente não indica fundamento legal para a pretendida restrição.
Terá, contudo, em vista a norma do nº 2 do artº 69º: A proibição (...) pode abranger a condução de veículos com motor de qualquer categoria.
Resulta desta norma que a proibição de conduzir pode não abranger todo o tipo de veículos.
Mas, a condenação por crime de condução em estado de embriaguez é fundamento de aplicação da proibição de conduzir pelos perigos que essa condução potencia para os utentes das vias públicas ou equiparadas. E tais perigos não resultam da natureza do veículo, mas antes do estado em que se encontra quem o conduz.
Por isso, a proibição de conduzir, quando tem como fundamento a condenação pelo crime do artº 292º do CP, não pode deixar de abarcar todas as categorias de veículos com motor, desde que destinados a circular nas vias públicas ou equiparadas. Efectivamente, se a perigosidade da condução, que é a razão de ser da pena, é alheia ao tipo de veículo que se conduz, por respeitar à pessoa do condenado, ela poderá verificar-se na condução de qualquer veículo com motor.
A possibilidade de a proibição de conduzir abranger apenas alguma ou algumas categorias de veículos com motor só é, pois, concebível em casos diferentes do presente. Neste sentido se decidiu nos acórdãos desta Relação proferidos nos processos nºs 696/03, 6394/03 e 6412/03, da 1ª secção, com o mesmo relator deste.

Sendo, assim, manifestamente improcedente, o recurso deve ser rejeitado, nos termos do artº 420º, nº 1, do CPP.

Decisão:

Em face do exposto, acordam os juízes desta Relação em rejeitar o recurso, por manifesta improcedência.
O recorrente vai condenado a pagar 3 UCs, ao abrigo do nº 4 daquele artº 420º

Porto, 19 de Julho de 2006
Manuel Joaquim Braz
Luís Dias André da Silva
Ângelo Augusto Brandão Morais