Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
1709/09.9TBPFR.P1
Nº Convencional: JTRP000
Relator: M. PINTO DOS SANTOS
Descritores: REGULAÇÃO DO EXERCÍCIO DE RESPONSABILIDADES PARENTAIS
ALTERAÇÃO
REGIME DE VISITAS
CRIANÇA
REGIME DE VISITAS SIMPLES
Nº do Documento: RP201112061709/09.9TBPFR.P1
Data do Acordão: 12/06/2011
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO.
Decisão: CONFIRMADA A DECISÃO.
Indicações Eventuais: 2ª SECÇÃO
Área Temática: .
Sumário: I - Qualquer alteração ao regime de visitas fixado em regulação do exercício das responsabilidades parentais deve ser feita em função do superior interesse da criança, tanto maior quanto menor for a idade desta.
II - Em crianças de pouca idade (por ex. com 5 anos) o regime de visitas deve ser o mais simples possível (o que não tem necessariamente a ver com o tempo de permanência com o progenitor), para que elas o apreendam e interiorizem, evitando-se desnecessárias complexidades que afectem demasiado os seus hábitos diários e que possam gerar-lhes insegurança e incerteza.
Reclamações:
Decisão Texto Integral: Pc. 1709/09.9TBPFR.P1 – 2ª Sec.
(apelação)
_________________________________
Relator: Pinto dos Santos
Adjuntos: Des. Ondina Carmo Alves
Des. Ramos Lopes
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Acordam nesta secção cível do Tribunal da Relação do Porto:

I. Relatório:

Nestes autos de alteração da regulação das responsabilidades parentais relativos ao menor B…, filho de C… e de D…, ambos residentes em Paços de Ferreira, foi proferida, no termo da tramitação na 1ª instância, a douta sentença constante de fls. 216 a 233 que decidiu do seguinte modo (na sua parte decisória):
“Pelo exposto, julga-se parcialmente procedente a presente alteração da regulação das responsabilidades parentais em relação ao menor B…, nos seguintes termos:
a) - as responsabilidades parentais serão exercidas conjuntamente por ambos os progenitores, fixando-se, contudo, a residência do menor na residência da progenitora D…;
b) - a guarda do menor será exercida conjuntamente pelos progenitores, nos seguintes termos:
- o pai terá direito a ter o menor consigo, de 15 em 15 dias, desde a quinta-feira dessa semana, a partir da hora da tarde em que o menor sair do Infantário que frequenta, até à segunda-feira imediatamente seguinte, dia em que de manhã, deve diligenciar pela colocação do menor no Infantário que este frequenta, à hora convencionada com aquele estabelecimento da parte da tarde, e que vem já ocorrendo;
- nos demais períodos, o menor permanecerá com a mãe;
- na semana em que o menor permanecer com a mãe ao fim de semana, o pai terá direito a estar com o menor dois dias por semana, a saber, às terças e quintas, podendo, para o efeito, ir buscar o menor ao Infantário, da parte da tarde, devendo entregá-lo na casa da mãe até às 21.00 horas desses mesmos dias;
c) - as demais cláusulas já fixadas na sentença homologatória proferida pelo 1º Juízo Cível do Tribunal Judicial de Paredes (processo apensado ao presente) manter-se-ão em vigor, contanto que não contendam com o ora decidido, designadamente as que ali constam sob os pontos 2.4, 2.5, 2.6, 2.7 e 2.8, e cláusula 3ª, 4ª e 5ª, que aqui se dão por devidamente reproduzidas.
Custas a cargo do requerente e requerida, a meias e em igual proporção, e sem prejuízo do apoio judiciário.
Fixa-se o valor à presente demanda de € 30.000,01.
Após trânsito, comunique o teor desta decisão ao ISS, nos termos solicitados por este organismo.
Registe.
Notifique”.

Inconformado com o sentenciado, recorreu para este Tribunal da Relação o requerente C… (recurso a que foi fixado efeito meramente devolutivo), que culminou as suas doutas alegações com as seguintes conclusões:
“I – É uma evidência que a progenitora, com prejuízo para os superiores interesses do menor, não aceitou o regime provisório fixado pelo Tribunal aquando da Conferência de Pais, transmitindo essa sua adversidade de forma emocional, desmedida, irresponsável e infundada para o seu filho.
II – O progenitor aqui recorrente, com a mediação do avô materno, acordou com a progenitora uma regime provisório passando o menor a pernoitar na semana do progenitor sábado, domingo e quinta-feira com este e na semana da progenitora pernoitava com o progenitor à segunda e quinta-feira.
III – Este regime foi aceite pela progenitora e trouxe a estabilidade emocional ao menor (que pretensamente lhe teria sido retirada pelo regime fixado na conferência de pais) e apesar de o Tribunal o considerar algo confuso, não se vê que assim seja e não se vê razão para não ser mantido quando acabou por ser aquele que as partes acordaram em momento posterior à conferência de pais.
IV – O regime provisório tal como fora acordado por ambos os progenitores, mediado pelo avô materno, vai de encontro às conclusões vertidas quer no relatório efectuado pela técnica da segurança social de fls. 100 a 103 dos autos, quer no relatório médico-legal de folhas 196 a 201.
V – Em ambos os relatórios os técnicos concordam que o menor deve estar mais próximo da progenitora, com ela permanecendo por um período maior de tempo, sem descurar o convívio regular com o progenitor, figura extremamente importante nesta fase da vida do menor, sendo que o regime provisório acordado compatibiliza as conclusões dos referidos relatórios.
VI – Outro argumento em favor da manutenção do regime provisório acordado é o facto de ele ter tido o acordo de ambos os progenitores em determinado momento e ser um voto de confiança nos próprios progenitores para no futuro resolverem qualquer potencial conflito sem necessidade de interposição do Tribunal.
VII – O Tribunal ao decidir, modificando o que havia sido provisoriamente acordado quanto à guarda do menor pelo recorrente e recorrida, abriu novamente a ferida da conflitualidade, dando a aparência de ganho de causa a uma das partes em prejuízo da outra quando o único interesse a acautelar seria o do menor que estaria bem acautelado com o acordado por ambos os progenitores.
VIII – Aparte tudo que se deixa dito, a decisão recorrida é a manutenção da decisão anterior, ou seja, o número de dias em que o menor pernoita e passa com o pai é igual ao que já resultava da decisão proferida no processo nº 3700/07.0TBPRD do 1º Juízo Cível de Paredes.
IX – No anterior regime o menor passava com o recorrente fins-de-semana alternados de sexta-feira às 19 horas até ao domingo às mesmas 19 horas e a noite de um dia da semana com início às 19 horas de quarta-feira até às 19 horas do dia seguinte.
X – Com o regime agora decidido pelo Tribunal e de que se recorre, o menor passa com o requerente de 15 em 15 dias da tarde de quinta-feira (depois de sair do infantário) até à manhã de segunda-feira seguinte (à hora em que entra no infantário) e na semana em que não pernoita com o pai este apenas pode privar com ele às terças e quintas-feiras da parte da tarde ou seja depois da hora do infantário até às 21 horas desses mesmos dias.
XI – Volvidos três anos, com o crescimento e desenvolvimento do menor que permitem, no seu interesse, uma maior aproximação ao pai, o Tribunal, dando guarida aos argumentos infundados da progenitora, impediu essa aproximação ao estabelecer o mesmo período de tempo que lhe tinha dado a decisão inicial proferida no Tribunal de Paredes.
XII – O Tribunal andou mal, mostrou irreflexão em, pelo menos, não decidir manter a título definitivo o regime provisório acordado por recorrente e recorrida, independentemente da confusão que o mesmo possa gerar no menor quanto a com quem vai dormir hoje ou amanhã.
XIII – Ao não manter pelo menos o aludido regime de guarda, o Tribunal não decidiu em função dos interesses do menor, nomeadamente no necessário e salutar estabelecimento de laços de maior afectividade com o pai, violando consequentemente o artigo 1906º nºs 1 e 2 do CC.
Termos em que deve o presente recurso ser julgado procedente, revogando-se a sentença recorrida nos termos referidos”.

A apelada contra-alegou pugnando pela confirmação da decisão recorrida.
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II. Questões a apreciar e decidir:

Face às conclusões das alegações do recorrente (arts. 684º nº 3 e 685º-A nºs 1 e 3 do C.Proc.Civ., na versão actual, aqui aplicável, tendo em conta que a alteração do poder paternal foi requerida em data posterior a 01/01/2008), as únicas questões a apreciar e decidir consistem em saber:
● Se o regime provisório indicado pelo recorrente acautela o superior interesse do menor melhor que o decidido na sentença recorrida
● E se, por via disso, devia ter sido convertido em definitivo na sentença.
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III. Factos Provados:

A decisão recorrida considerou provados os seguintes factos:
1) B…, nascido a 22.10.2006, em …, Penafiel, é filho de C… e de D….
2) Os progenitores não são casados entre si, nem convivem maritalmente, tendo, no âmbito do processo n.º 3700/07.0TBPRD do 1.º Juízo Cível de Paredes, sido regulado o exercício das responsabilidades parentais, nos seguintes termos:
- o menor fica à guarda e cuidados da mãe, sendo no entanto o poder paternal exercido por ambos os progenitores;
- o menor passará, alternadamente, os fins de semana com o pai, sendo-lhe o mesmo entregue à sexta-feira pelas 19.00 horas, e devendo ser entregue à mãe no domingo até às 19.00 horas;
- o menor passará a noite de um dia de semana com o pai, fixando-se esse dia à quarta-feira, desde as 19.00 horas desse dia até às 19.00 horas do dia seguinte;
- o pai fica com o direito de visitar o menor sempre que o quiser, sem prejuízo das horas de descanso, escolares e de outras actividades que venha a desenvolver no processo educativo, com acordo prévio com a mãe e sempre acautelando a entrega do menor até às 21,30h do dia em que exercer o direito;
- relativamente às festas de anos, o menor passará a véspera de Natal com o pai, onde pernoitará e o dia de Natal com a mãe, alternando no ano seguinte;
- quanto à Páscoa, o menor passará a sexta-feira santa com o pai e o dia de Páscoa com a mãe, alternando no ano seguinte;
- quanto ao dia de aniversário do menor, este almoçará com o pai e jantará com a mãe, alternando no ano seguinte;
- o menor passará o dia de aniversário dos progenitores, com cada um a que diga respeito;
- nas férias de Verão, o menor passará 10 dias seguidos das respectivas férias com o pai, sendo que a programação dos referidos 10 dias deverá ser comunicada á mãe, com pelo menos um mês de antecedência, bem como deve a mesma ser informada do local onde se encontra;
- quanto a alimentos, o pai contribuirá com a quantia de € 100,00, a qual deve ser entregue à mãe por transferência bancária (…) até ao dia 08 do mês a que disser respeito;
- as despesas médicas e escolares são pagas por ambos os progenitores, em partes iguais, mediante apresentação de recibo, tudo como flui do teor da acta de fls. 12 a 14 dos autos apensados a estes, que aqui se dá por integralmente reproduzido.
3) Após a entrada da petição de alteração do exercício das responsabilidades parentais, por parte do requerente, veio a ter lugar Conferência de Pais, no âmbito da qual, não tendo os progenitores logrado chegar a solução consensual, a título definitivo, veio a ser fixado regime provisório, que passou a instituir a guarda conjunta, passando o menor a ficar entregue a cada um dos pais durante uma semana, nos termos que constam da acta de fls. 44.
4) Após o regime aludido em 3), a mãe do menor, D…, veio a dar entrada do requerimento que consta a fls. 70 e ss., pedindo que se procedesse a alteração do regime provisoriamente fixado, por alegadamente, o menor ter enfrentado instabilidade emocional manifestada através de pesadelos, sono irregular, ansiedade, por ter sido “afastado” da mãe durante o período de uma semana, nos termos daquele regime provisório.
5) Na sequência deste requerimento, veio a ser notificado o progenitor que, nos termos que constam de fls. 88 a 90, pugnou pelo indeferimento do peticionado pela progenitora, negando qualquer perturbação do menor quando este se encontra à sua guarda, tudo como flui do teor daquela exposição que aqui se dá por reproduzido.
6) Em face do referido em 4) e 5), o tribunal solicitou urgência na junção de relatório a ser efectuado pelos competentes serviços do ISS, IP – Centro Distrital do Porto, com vista a decidir sobre a necessidade de alterar provisoriamente o regime provisório anteriormente fixado, tendo vindo a ser junto o relatório que consta de fls. 98 a 100, cujo teor integral aqui se dá por reproduzido, e no qual se concluiu que os progenitores estavam, doravante, de acordo, em termos provisórios, no que tange ao regime de convívios do B… com o pai, uma vez que a residência do menor permanecerá com a mãe, face à instabilidade do menor com a alteração ocorrida a partir de Janeiro último.
7) Mais se referiu, no relatório aludido em 6), que a partir da implementação no terreno do regime provisório fixado, “o menor passou a manifestar angústia e instabilidade, uma vez que permanecia demasiado tempo longe do agregado familiar a que esteve habituado desde o nascimento, associando a ida para junto do pai à escola, rejeitando a sua permanência no espaço escolar. D... reconhece a proximidade afectiva do filho ao pai” e que “ambos os progenitores apresentam alguns sinais de dificuldade em separar as questões da conjugalidade das da parentalidade, porém com o sofrimento do menor face à mudança, ambos envidaram esforços no sentido de encontrar um regime de convívios que devolvesse ao B… a estabilidade necessária nesta fase de vida”.
8) Na decorrência dos factos referidos em 6) e 7), o tribunal passou a alterar o regime provisório que até então vinha vigorando, dado o acordo entre os pais alcançado, conforme despacho de fls. 106 e 107, passando o regime a ser fixado nos seguintes termos:
- B… pernoitará com o pai numa semana de sábado para Domingo e de Domingo para Segunda e depois de quinta para sexta-feira, jantando com o pai à quarta-feira; na semana seguinte pernoita de segunda para terça-feira, e depois de quinta para sexta-feira, jantando com o pai na terça, tudo conforme teor de fls. 100 a 103 e 106 e 107, que aqui se dá por integralmente reproduzido.
9) Por iniciativa do Tribunal, veio a ser notificada a técnica da Segurança Social que havia sido responsável pela elaboração do relatório constante de fls. 100 a 103 dos autos, a saber, Dr.ª E…, com vista a que a mesma, da observação que realizou, pudesse esclarecer qual o regime que, naquela fase, melhor salvaguardaria os interesses do menor B…, se eventualmente aquele que passou a vigorar provisoriamente por acordo ou outro, o que veio a ser respondido nos termos constantes da informação veiculada a fls. 133, onde se exarou o seguinte: “B… conta agora 3 anos e 7 meses de idade pelo que se encontra, ainda, numa fase de desenvolvimento que requer uma relação afectiva e fisiológica com a progenitora de forma intensa e próxima, para que as transmissões de valores e regras sejam solidificadas de forma normativa. Todavia, requer igualmente a figura paterna a complementar tal normatividade no seu crescimento. Assim, revela-se importante que permaneça junto da mãe por um período maior, com convívios regulares com o progenitor nesta fase (…)”, tudo conforme flui do teor de fls. 107 e 133, que aqui se dá por reproduzido para os devidos e legais efeitos.
10) Foi determinada a realização de exame médico-legal, na área da psiquiatria da infância, nos termos que constam da acta de fls. 170 a 174, a qual veio a ser realizada nos termos constantes de fls. 196 a 201, que aqui se dão por integralmente reproduzidos, e do qual consta(m) as seguintes considerações e conclusões: «É de realçar que no passado, como consta na documentação processual, o examinado já sofreu emocionalmente devido à conflitualidade entre os pais e ao facto de não serem capazes de se entenderem sobre a prestação de cuidados ao filho. Não menos importante é o facto de o pai justificar a alteração da regulação das responsabilidades parentais com a “necessidade de ser pai”. Esta posição revela que as necessidades do pai vão suprir as necessidades da criança, ou que o pai adopta uma posição egocêntrica. Por outro lado, a mãe sempre prestou os cuidados necessários à criança independentemente das suas posições pessoais o que revela mais maturidade emocional por parte da mãe e garante mais segurança na prestação de cuidados no futuro ao examinado. (…) É parecer do perito que a guarda deve ser conjunta. A residência do menor deverá permanecer com a mãe com a qual deve permanecer mais tempo. As visitas, permanências, contactos com o pai devem ser o mais frequentes que for possível sem prejuízo para o examinado (…)».
11) Os progenitores têm uma relação difícil e não comunicam entre si (sem qualquer mediação).
12) Ambos os progenitores detêm condições habitacionais e económicas adequadas para fazer face às necessidades do menor.
13) Os progenitores residem na mesma freguesia e concelho, vivendo perto um do outro.
14) A progenitora é empresária, está actualmente casada com terceira pessoa que é empresário no ramo do mobiliário, com quem não teve até agora mais filhos, encontrando-se casada há já cerca de ano e meio, existindo entre o menor e a pessoa casada com a requerida uma boa relação.
15) O pai do menor trabalha como fotógrafo em empresa familiar, vive em casa própria, fazendo as suas refeições em casa dos pais, e tem namorada.
16) O menor apresenta uma vinculação segura e uma relação gratificante com a mãe e com o pai, sendo que ambos os pais têm projectos de futuro para o menor B….
* * *
IV. Apreciação jurídica:

Dos três aspectos (questões) em que se decompõe a regulação do exercício das responsabilidades parentais - guarda/destino do menor, regime de visitas e prestação de alimentos (arts. 1905º, 1906º, 1909º, 1911º e 1912º do CCiv. e 180º da OTM) -, apenas um deles – o regime de visitas – está em causa na alteração que, nestes autos, foi requerida pelo progenitor do menor B…, ora apelante (o qual, no requerimento inicial, requereu que fosse “alterado o regime das responsabilidades parentais anteriormente fixado no sentido da guarda repartida do menor nos termos alegados”, ou seja, “ficando o menor 3 dias com cada um dos progenitores, ressalvados os períodos de férias, festas de ano e aniversário do menor”).
O recorrente entende que a douta decisão recorrida devia ter adoptado (tornado definitivo) o regime provisório que as partes acordaram (com a mediação do avô materno do menor) e que consta de fls. 100 e 103, também provisoriamente homologado pelo Tribunal por despacho de fls. 106-107, por considerar que o mesmo tem em melhor conta (que o regime fixado na decisão recorrida) o superior interesse da criança e por ter resultado do acordo de ambos os progenitores e da assunção, por estes, de uma maior responsabilização relativamente ao filho de ambos.
Para aferirmos se o recorrente tem razão há que historiar o que tem acontecido desde que as responsabilidades parentais foram pela primeira vez reguladas nos autos que ora estão apensos a estes. Reportar-nos-emos apenas à guarda do menor e, principalmente, ao regime de visitas que tem vigorado, já que a prestação de alimentos não está aqui em causa, continuando a vigorar o que foi decretado no âmbito do processo de regulação do exercício das responsabilidades parentais.
No processo 3700/07.0TBPRD, em 05/11/2007 (por acordo homologado por sentença – cfr. fls. 12-14 do apenso), quando o menor tinha apenas 1 ano de idade, ficou o mesmo confiado à guarda e cuidados da mãe, embora o exercício do poder paternal tenha ficado a cargo de ambos os progenitores. Quanto ao regime de visitas, além de outros pormenores que para aqui não relevam, ficou estabelecido que aquele passaria, alternadamente, os fins-de-semana com o pai, entre as 19 horas de sexta-feira e as 19 horas de domingo, que passaria, ainda, um dia por semana (das 19 horas de quarta-feira às 19 horas de quinta-feira) com o pai e que este poderia visitá-lo quando quisesse, sem prejuízo do descanso e das actividades escolares ou outras daquele.
Tal regime vigorou sem alterações até à conferência de pais que teve lugar no âmbito dos presentes autos, ou seja, até 12/01/2010 (cfr. fls. 44-45). Nessa conferência, por iniciativa do Ministério Público, o regime de visitas foi provisoriamente alterado passando o menor, então com 3 anos e quase 3 meses de idade, a estar uma semana com cada um dos progenitores, de sexta a sexta-feira (estes vivem perto um do outro, na mesma freguesia e concelho).
Esta alteração oficiosa do regime de visitas causou, porém, instabilidade emocional e grande insegurança no menor, o qual, diversamente do que acontecia antes, passou a ser uma criança insegura, assustada, pouco colaborante (relatório de avaliação psicológica junto a fls. 76-79), por permanecer demasiado tempo longe do agregado a que estava habituado desde o nascimento - o da progenitora -, tendo, igualmente, rejeitado a sua permanência no espaço escolar por associar a ida para junto do pai à ida para a escola/infantário (relatório social junto a fls. 98-100, 101-103).
Por via de tal alteração emocional e comportamental do menor, os progenitores, com a mediação do avô materno (por aqueles terem alguma dificuldade em relacionar-se um com o outro e em separar as questões da conjugalidade das da parentalidade), acordaram (em Março de 2010) na seguinte alteração do regime de visitas: o menor pernoitaria com o pai, numa semana, de sábado para domingo e de domingo para segunda-feira e, depois, de quinta para sexta-feira, jantando com aquele à quarta-feira; na semana seguinte, pernoitaria com o pai de segunda para terça-feira e de quinta para sexta-feira, jantando com ele na terça-feira (fls. 100 e 103). Esta alteração foi aceite/homologada provisoriamente pelo Tribunal (despacho de fls. 106-107).
Depois disso, realizou-se a audiência de julgamento e, no decurso desta, foi feito exame médico-legal (psiquiatria da infância e da adolescência) ao menor, no qual (fls. 196-201) o perito médico concluiu que “a residência do menor deverá permanecer com a mãe, com a qual deve permanecer mais tempo” e que “as visitas, permanências, contactos com o pai devem ser o mais frequentes que for possível, sem prejuízo para o examinado” (menor).
Na sentença recorrida acabou por ser fixado o regime de visitas que indicámos no início do ponto I deste acórdão.

Desta resenha decorre que era - e é - necessário algum cuidado na concretização do regime de visitas (repete-se: não está em causa a responsabilidade conjunta dos progenitores no exercício das responsabilidades parentais, nem a guarda do menor ou sequer o «quantum» da prestação de alimentos a que o pai está vinculado) para que não voltem a repetir-se as alterações comportamentais e emocionais negativas que afectaram o menor quando tal regime foi oficiosamente alterado na conferência de pais realizada nestes autos, já que nova recidiva poderá pôr em causa, de modo grave, o harmonioso desenvolvimento da criança (agora com 5 anos), quer sob o prisma da formação da sua personalidade, quer no relacionamento com o progenitor, o que, de todo, não é desejado por este, nem o Tribunal poderia – ou poderá agora esta Relação – contribuir para tal.
Por isso, mais do que fazer as «coisas» depressa/rapidamente (até porque nestes processos nada é definitivo ou imutável), o que nestes casos – em que a criança está habituada ao agregado de um dos pais e só mais tarde começa a ter maior contacto com o outro progenitor – interessa é que as relações parentais (mãe – filho, pai – filho e filho - pais) se sedimentem o mais possível, o que depende, sobremaneira, do modo como os pais (ambos) souberem lidar com o filho menor e souberem transmitir-lhe a necessidade de ele, filho, se relacionar também com o outro progenitor.
Pelo que se afere dos autos, os pais do menor têm feito algum esforço (até com a mediação do avô materno deste) para separarem as questões que lhes dizem respeito só a eles (o seu relacionamento pessoal) das que têm a ver com o filho comum de ambos (parentalidade) e para aceitarem a relevância do papel do outro (a mãe do papel do pai, este do papel daquela) na harmoniosa formação do menor (veja-se o que consta do relatório social de fls. 132-133 e do item II.1.4 do relatório da perícia médico-legal junto a fls. 196-201). E afigura-se bastante positivo que o pai, ora recorrente, esteja a querer ser «mais pai» relativamente ao seu filho, querendo estar mais próximo dele e durante mais tempo, sem pôr em causa (sequer como «arma de arremesso» contra a mãe do menor, como, infelizmente, muitas vezes acontece noutros processos) o seu dever de contribuir para os alimentos do seu filho.

Mas o apelante não pode querer que as «coisas» se alterem de um dia para o outro, pois tem de pensar, em primeiro lugar, no superior interesse do seu filho (e não no seu direito de pai), já que este é o princípio que norteia todo o regime das responsabilidades parentais como proclamam os arts. 1906º nº 7 do CCiv. (redacção actual dada pela Lei nº 61/2008, de 31/10), 147º-A da OTM e 4º da Lei nº 147/99, de 01/09 (Lei de Protecção de Crianças e Jovens em Perigo).
E, face ao parecer médico-legal de fls. 196-201 (cfr. nº 10 dos factos provados), o que neste momento (quer no da sentença, quer agora no deste acórdão) se impõe é que o menor permaneça mais tempo com a mãe, embora deva ter também o maior contacto possível com o pai, sendo certo que o regime de visitas deve ser o mais simples possível para que seja facilmente apreendido pelo menor, para que não lhe causa angústia e incerteza e para que ele próprio o vá interiorizando e, com o tempo, seja até ele a querer ampliá-lo para estar mais tempo com o aqui recorrente.
Ora, em função de todos estes elementos, pensamos que a decisão do Tribunal «a quo» se apresenta mais consentânea com o superior interesse da criança que o acordo provisório que o apelante pretende ver acolhido. Se é verdade que em ambos os casos estava assegurada a maior permanência do menor com a mãe e os necessários contactos/visitas com o pai (no acordo provisório, o menor passaria, numa semana, três noites com este e, na semana seguinte, duas noites; na decisão recorrida o menor passa com o pai quatro noites seguidas, numa semana, e poderá estar com ele dois dias, na semana seguinte, desde a saída do infantário até às 21 horas), mais verdade é ainda que o regime provisório, diversamente do que decorre do fixado na sentença recorrida, previa demasiadas mudanças nos hábitos do menor (necessariamente geradoras de incerteza e angústia em crianças de pouca idade, como é o caso do B…), pois pernoitaria com o pai, numa semana, de sábado para domingo, de domingo para segunda-feira e de quinta para sexta-feira e, na semana seguinte, de segunda para terça-feira e de quinta para sexta-feira, ao passo que na sentença as quatro noites que passa com aquele são seguidas, de quinta-feira a segunda-feira e concentradas na mesma semana, o que torna este regime mais exequível e com menores implicações negativas nos hábitos diários do menor que não tem de andar sempre de malas aviadas da casa da mãe para a do pai e vice-versa.
Daí que entendamos, contrariamente ao apelante (que não pode, nem deve, ver no decidido qualquer “aparência de ganho de causa” de “uma das partes em prejuízo da outra”, nem a reabertura d’ “a ferida da conflitualidade”), que bem andou a douta sentença recorrida ao não ter convertido em definitivo (expressão aqui utilizada sem o seu rigor conceptual, já que, como dissemos, nestes processos nada é imutável e permanente) o apontado regime/acordo provisório, por não tutelar adequadamente o superior interesse do menor B…, interesse este que, como se salientou, fica melhor acautelado com o regime que decretou.
Improcede, assim, a douta apelação.
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Síntese do que fica exposto:
● Qualquer alteração ao regime de visitas fixado em regulação do exercício das responsabilidades parentais deve ser feita em função do superior interesse da criança, tanto maior quanto menor for a idade desta.
● Em crianças de pouca idade (por ex. com 5 anos) o regime de visitas deve ser o mais simples possível (o que não tem necessariamente a ver com o tempo de permanência com o progenitor), para que elas o apreendam e interiorizem, evitando-se desnecessárias complexidades que afectem demasiado os seus hábitos diários e que possam gerar-lhes insegurança e incerteza.
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V. Decisão:

Nesta conformidade, os Juízes desta secção cível da Relação do Porto acordam em julgar improcedente a apelação, confirmando a sentença recorrida, e condenam o recorrente nas custas devidas.
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Porto, 2011/12/06
Manuel Pinto dos Santos
Ondina de Oliveira Carmo Alves
João Manuel Araújo Ramos Lopes