Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
0515288
Nº Convencional: JTRP00038520
Relator: BORGES MARTINS
Descritores: PRISÃO PREVENTIVA
ALTERAÇÃO
PRESSUPOSTOS
Nº do Documento: RP200511160515288
Data do Acordão: 11/16/2005
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REC PENAL.
Decisão: PROVIDO.
Área Temática: .
Sumário: Não tendo havido alteração dos pressupostos que determinaram a aplicação da medida de prisão preventiva, não deve a mesma ser substituída por outra menos gravosa na sua execução.
Reclamações:
Decisão Texto Integral: Acordam, em conferência, os juízes deste Tribunal da Relação do Porto:

No proc. n.º ......., ..º Juízo da Comarca da Feira, foi proferido despacho transitado em julgado determinativo da prisão preventiva de B.........., solteiro, sem profissão, nascido a 16.2.1984, em .........., concelho de .........., filho de C.......... e de D.........., residente em ..........- .........., por se encontrar indiciada a autoria material do crime de furto qualificado, p. p. no art.º 204.º, n.º2, al. a) do CP e ainda ao facto de alguns dos processos crimes acima referidos terem origem na noticia/denuncia de crimes da mesma natureza da dos presentes autos (conforme o próprio arguido admitiu), a existência do perigo da continuação da actividade criminosa, e tendo, ainda, em conta que o arguido é consumidor de heroína, facto que terá motivado a prática dos ilícitos supra referidos, mostra-se necessária a aplicação ao arguido de uma medida de coacção. Por outro lado, dos autos resulta também que a sujeição do arguido às apresentações periódicas não foi eficaz, no sentido de evitar que praticasse novos crimes.

Posteriormente veio a ser lavrado outro despacho revogando aquela prisão preventiva e impondo estas apresentações, referindo-se no mesmo que pese embora o arguido se mostrar acusado por factos de idêntica natureza em outros processos, a verdade é que o mesmo admitiu a prática dos factos de que vinha acusado. Por outra via, não consta que o veículo alegadamente furtado não tenha sido recuperado pelo seu proprietário. De outro prisma, a condenação de que o arguido foi alvo remonta a 2002. Ademais, toda a prova já se mostra recolhida, não havendo qualquer susceptibilidade da sua obtenção ser turbada pela actividade do arguido.

Recorreu deste despacho o M.º P.º, considerando, em síntese, que foi violado o disposto no art.º 212.º, n.º1 do CPP, por não ter sido invocado nenhum facto novo susceptível de revelar diminuição das exigências cautelares impostas pelo fundamento invocado no despacho inicial – perigo de continuação de actividade criminosa.
O Exmo PGA junto deste Tribunal no seu parecer referiu igualmente este aspecto e sublinhou também o modo de vida do arguido, fortemente sugestivo relativamente àquele perigo.
Cumpriu-se o disposto no art.º 417.º, n.º2 do CPP.
Colhidos os vistos, cumpre decidir.

Fundamentação:

A única circunstância que se mostra alterada em relação ao circunstancialismo verificado a quando da aplicação da prisão preventiva é a fase processual diversa derivada da dedução da acusação.
O perigo de continuação da actividade criminosa e o alarme social são os mesmos à data do despacho inicial, bem como a situação pessoal do arguido.
A decisão que determinou a prisão preventiva teve por objecto a indiciação de um crime de furto qualificado que era imputado ao arguido, sendo agora na acusação pública imputado ao arguido dois crimes, um de furto qualificado, outro de perturbação da segurança rodoviária, o que agrava a pena única que previsivelmente lhe será aplicada.
Este despacho decretou depois a prisão preventiva ao abrigo do disposto no art.º 204.º, al. c) do CPP.
Ou seja, respectivamente, considerou haver perigo de continuação da actividade criminosa.
Por força do caso julgado, não podia no despacho recorrido questionar-se esse entendimento, nem tão pouco este Tribunal da Relação apreciar a sua bondade nesta altura, quando atempadamente não foi alvo de recurso.
Se assim não fosse e se o juiz do processo pudesse alterar o anteriormente decidido, por entender que afinal as razões cautelares invocadas não ocorriam, seria a negação da segurança jurídica e do princípio do caso julgado.
O que se podia então na decisão recorrida apreciar agora era a manutenção desses perigos enunciados no art.º 204.º do CPP face a novas ocorrências.
Nos termos do disposto no art.º 212.º, n. 1, a) do CPP, as medidas de coacção são imediatamente revogadas sempre que se verificar terem deixado de subsistir as circunstâncias que justificaram a sua aplicação. Determina também o n. 3 deste preceito legal que quando se verificar uma atenuação das exigências cautelares que determinaram a aplicação de uma medida de coacção, o juiz substitui-a por outra menos grave ou determina uma forma menos gravosa as sua execução.
Contudo, se não ocorreram entretanto factos ou argumentos supervenientes, nem o despacho recorrido os indica, no sentido de se dever julgar alterado o circunstancialismo do despacho que determinou a prisão preventiva do recorrente, então é óbvio que esta medida não pode ser alterada.
A decisão recorrida aponta claramente qual o facto que entende constituir uma alteração do circunstancialismo inicial: o fim do inquérito e a dedução da acusação. Mas não foi o perigo de perturbação do inquérito o fundamento que levou à aplicação da prisão preventiva.
Continuou a subsistir o perigo de continuação de actividade criminosa.
Do ponto de vista formal, não andou bem a decisão recorrida nesta linha de pensamento, por ofender o princípio da necessidade de superveniência para a modificação em vista.

Decisão:

Face ao exposto, acordam os juízes deste Tribunal da Relação em conceder provimento ao recurso interposto pelo M.º P.º, revogando a decisão recorrida e impondo ao arguido a medida de prisão preventiva.
Sem tributação.
Passem-se mandados de detenção contra o arguido com vista à sua prisão preventiva.

Porto, 16 de Novembro de 2005
José Carlos Borges Martins
João Inácio Monteiro
Élia Costa de Mendonça São Pedro