Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
0130070
Nº Convencional: JTRP00031420
Relator: PIRES CONDESSO
Descritores: PROCEDIMENTOS CAUTELARES
PROCESSO URGENTE
PRAZO
FÉRIAS
Nº do Documento: RP200103010130070
Data do Acordão: 03/01/2001
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recorrido: 3 J CIV OLIVEIRA AZEMÉIS
Processo no Tribunal Recorrido: 249-B/00
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: AGRAVO.
Decisão: NEGADO PROVIMENTO.
Área Temática: DIR PROC CIV - PROCED CAUT.
Legislação Nacional: CPC95 ART144 ART382 N1 N2.
Sumário: Os procedimentos cautelares têm natureza urgente ao longo de todo o seu processado, não se suspendendo durante as férias; daí que o prazo para apresentar alegações de recurso, da decisão que ordenara o levantamento da providência, não se suspenda nas férias de Verão.
Reclamações:
Decisão Texto Integral: ACORDAM NO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DO PORTO

No Procedimento Cautelar de ARRESTO que Izaura... e marido António... moveram a Mário..., uma vez decretado o arresto, veio a ser deduzida oposição pelo arrestado e decidido o levantamento do mesmo arresto do que foi interposto recurso pelos requerentes.
O despacho que admitiu tal recurso foi notificado aos agravantes através de carta em 19/7/2000, tendo as correspondentes alegações dado entrada no Tribunal em 29/9/2000.
Profere, então, o Mº Juiz o despacho recorrido no sentido de julgar deserto o recurso por as alegações terem sido apresentadas fora de prazo.
Subjacente a ele está a consideração da urgência do procedimento cautelar, nos termos do artº 382º CPC, e da não suspensão do prazo para apresentar alegações durante as férias judiciais conforme art 144º Nº 1 do mesmo diploma.
Inconformados, interpuseram recurso de AGRAVO os requerentes/agravantes apresentando nas alegações a única questão de que, a seu ver, o prazo devia ser suspenso durante as férias e daí resultar a tempestividade da referida apresentação em 29/9, precisamente o último dia de tal prazo.
O recorrido apresentou alegações pugnando pela manutenção do recorrido.
Delimitada de modo claro, nas conclusões, a única questão a decidir, dela resulta que apenas temos de apurar se o prazo para apresentar as alegações de recurso (agravo) da decisão que decidira levantar o arresto, se suspende ou não por se entender (ou não) que a natureza urgente dos procedimentos cautelares (artº 382º Nº 1 CPC) abrange (ou não), por assim dizer, a fase de recurso.
Os factos para conhecimento de tal questão constam do nosso relatório, dispensando-nos de repetições desnecessárias.
Avançando no seu conhecimento, começamos por salientar que é aplicável o CPC na redacção entrada em vigor em 1997.
Diz-nos o art 382º Nº 1 CPC que os procedimentos cautelares (onde se integra o arresto, como bem se sabe) revestem SEMPRE CARACTER URGENTE, precedendo os respectivos actos qualquer outro serviço judicial não urgente, acrescentando mesmo o Nº 2 que eles devem ser decididos em 1ª instância, no prazo máximo de dois meses....
Por outro lado o artº 144º estabelece a regra de que o prazo processual estabelecido por lei ( que é o nosso caso ---alegações de recurso) é contínuo, suspendendo-se, no entanto, durante as férias judiciais, salvo...se tratar de actos a praticar em PROCESSOS QUE A LEI CONSIDERE URGENTES.
Cumpre salientar algumas diferenças que consideramos significativas face às anteriores redacções das disposições legais citadas.
Desde logo a disposição inovadora do artº 382º CPC que consagra expressamente o caracter SEMPRE URGENTE dos procedimentos cautelares, bem podendo interpretar-se este «sempre» não só como querendo dizer respeito a todos e quaisquer procedimentos, em todas as circunstâncias, com também a todo, à totalidade do processo até à decisão final---desde início até ao seu termo o procedimento é sempre urgente.
Por outro lado temos o artº 144º que inicialmente não tinha qualquer suspensão dos prazos processuais nas férias, salvas as disposições especiais da lei, o que não era manifestamente o caso dos procedimentos cautelares.
Surge, depois o DL 457/80 que vem consagrar a suspensão genérica dos prazos durante as férias (sendo este aspecto das férias o que nos interessa); segue--se o DL 242/85 (tudo isto salvo qualquer lapso ditado pelas constantes alterações introduzidas) que volta à regra da continuidade dos prazos apenas com a suspensão durante as férias; surge ainda no mesmo ano o DL 381-A/85 que continua a manter a suspensão durante as férias.
Perante esta últimas alterações, que de um modo ou outro mantêm a suspensão durante as férias, concordamos inteiramente com o AC. Rel. Ev in CJ 9/2/269 que no seu domínio decidiu que os prazos para alegações de recurso não correm durante as férias, o que constitui clara aplicação da disciplina introduzida pelo DL 457/80 que, precisamente, introduziu a suspensão dos prazos processuais durante as férias.
Mas o regime actual (1997) é bem diferente pois a redacção do art 144º CPC é totalmente clara ao impor que os prazos se suspendem durante as férias SALVO «...se tratar de actos a praticar em PROCESSOS QUE A LEI CONSIDERE URGENTES».
Surge aqui a referência à prática de actos sem qualquer limitação ou especificação, pelo que os devemos entender como todos e quaisquer actos (em coincidência com o «sempre» utilizado no art 382°, como referimos) desde que dentro de PROCESSOS URGENTES.
COMO SE NOTOU OS PROCEDIMENTOS CAUTELARES SÃO SEMPRE URGENTES.
Do exposto flui o nosso inteiro acordo com o AC STJ in BMJ 483/157 que precisamente veio entender que o prazo das alegações de recurso se não interrompem durante as férias.
No mesmo sentido pode ver-se J. Lebre de Freitas no seu CPC Anotado ao art 144º e Abrantes Geraldes in Temas da Reforma de P. Civil-3/117 onde, em perfeita consonância com a clareza das normas apontadas entende que a natureza de urgência acompanha os procedimentos cautelares «...em qualquer momento processual, MESMO DEPOIS DA DECISÃO DE DECRETAMENTO OU DA SUA EXECUÇÃO».
Afigura-se-nos interessante referir que actualmente, neste caso dos prazos, dada a nova redacção das disposições citadas, já não é curial o recurso ao critério da prática de actos que se destinem a evitar danos irreparáveis, afirmado no art 143º CPC, que determinaria a suspensão dos prazos, e sustentar que tal já não ocorreria após a decisão do procedimento cautelar, (a partir de então já não haveria tal dano irreparável) e daí a possibilidade da suspensão do prazo nas férias.
Hoje existe o regime próprio acima estabelecido e não temos necessidade de nos socorrermos de outros princípios que nos poderiam levar a solução diferente.
Agora o critério de evitar danos irreparáveis apenas serve para a prática de actos processuais nos termos do artº 143º, com plena aplicação aos procedimentos cautelares antes da decisão mas não já posteriormente pois, após aquela, deixa de existir aquele carácter.
Mas os actos a que se refere o artº 143º não tem aplicação ao decurso do prazo, para o qual rege especificamente os art 382º e 144º CPC, como salientamos.
Foi certamente ponderando estas diferenças que o AC STJ acima apontado deixou subentender que, apesar do carácter urgente de todo o processo, e da não suspensão do prazo nas férias, isso não implicava o conhecimento do recurso subsequente à decisão no Tribunal da Relação durante as férias.(BMJ 483/157).
Entendendo, então, que o referido prazo não se suspende, daí resulta a extemporaneidade da apresentação das alegações, conforme ao decidido.(no sentido desta não suspensão pode ver-se, ainda, o bem recente Ac. STJ in BMJ 489/277)
RESUMINDO:
Entendemos, pois, FACE À ACTUAL REDACÇÃO DOS ARTºS 382 Nº1 E 144º CPC (1997) QUE OS PROCEDIMENTOS CAUTELARES TEM NATUREZA DE URGENTES AO LONGO DE TODO O SEU PROCESSADO E NÃO SE SUSPENDEM DURANTE AS FÉRIAS;
DAÍ QUE O PRAZO PROCESSUAL PARA APRESENTAR AS ALEGAÇÕES DE RECURSO DE AGRAVO--DA DECISÃO QUE ORDENARA O LEVANTAMENTO DO ARRESTO NA SEQUÊNCIA DA OPOSIÇÃO SUSCITADA PELO ARRESTADO--NÃO SE SUSPENDE NAS REFERIDAS FÉRIAS DE VERÃO.
ASSIM,
ACORDAM EM NEGAR PROVIMENTO AO AGRAVO MANTENDO A DECISÃO RECORRIDA.
Custas pelo agravante.
Porto, 1 de Março de 2001
António José Pires Condesso
Gonçalo Xavier Silvano
Fernando Manuel Pinto de Almeida