Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
0731623
Nº Convencional: JTRP00040318
Relator: JOSÉ FERRAZ
Descritores: ARBITRAMENTO DE REPARAÇÃO PROVISÓRIA
ACÇÃO IMPROCEDENTE
RECURSO
Nº do Documento: RP200704260731623
Data do Acordão: 04/26/2007
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: AGRAVO.
Decisão: NEGADO PROVIMENTO.
Indicações Eventuais: LIVRO 716 - FLS 100.
Área Temática: .
Sumário: Proferida sentença - ainda que sem trânsito em julgado - que julga improcedente o pedido indemnizatório, deve ser indeferido o pedido de arbitramento de reparação provisória, formulado nos termos do artº 403º, nº 4 do CPC e ainda não apreciado à data da sentença.
Reclamações:
Decisão Texto Integral: Acordam no Tribunal da Relação do Porto

1) – B………., com domicílio no ………., .. - .º, Apartado …. – ….-… ………., em procedimento cautelar de arbitramento de reparação provisória contra a Câmara Municipal ………., pede que a esta seja imposta a obrigação de pagamento do “renda mensal” ao requerente de € 5 000,00.

Para fundamentar essa pretensão, alega, em resumo, que é co.proprietário de um prédio rústico sito, no ………., ………., ………., e, em meados de 1986, entre a mãe do requerente e outros proprietários, por um lado, e a requerida, por outro, foi acordada a cedência de uma área de terreno á requerida, para construção de uma rua e reorganização da C………., na condição da celebração do acordo por escritura pública e loteamento da parte restante do terreno, condições não verificadas pois que nem foi o negócio celebrado por escritura pública nem a ré loteou o terreno (que ainda nem terá sido desafectado da reserva agrícola nacional).

Não obstante a requerida, desde 1987, ocupou – para a organização da C………. e construção da via - o prédio de que o requerente é co.proprietário, pelo que está este impedido de o agricultar, de o vender e mesmo de o vedar, o que causou ao requerente enormes prejuízos.

Com a exploração da feira e do estacionamento, a requerida tem auferido avultados rendimentos, que, desde 1989 até ao presente, ascenderão a € 3.750.000,00.
Como o requerente está impedido de exercer no prédio a actividade agrícola, por perda de rendimentos dessa actividade, tem direito a ser indemnizado, nesta data, no valor estimado de € 277.251,14.
O prédio, já em 1998, valia € 3.553.037,00, estando o requerente impedido de vender a sua propriedade, valor esse que teria rendido, de juros, € 2.027.087,55, pelo que tem o requerente direito a indemnização que já se encontra judicialmente reclamada.

O facto de estar impedido de retirar da sua propriedade os seus frutos e ter de pagar os impostos da propriedade que está a ser usufruída pela requerida, criou e cria uma grave situação financeira, agravada pelo facto da demora na decisão quanto a “de quem é a propriedade do arruamento que se encontra construído sobre essa propriedade” (o prédio de que o requerente é co-proprietário) e que se aguarda há mais de oito anos.

O requerente, após a ocupação do prédio pela requerida em 1987, viu-se obrigado a abandonar a actividade agrícola que nele exercia, por a propriedade deixar de estar vedada e ter um arruamento a atravessá-la.
O requerente viu a sua situação económica piorar, tendo de vender bens pessoais e pedir dinheiro emprestado para poder viver.
Viu-se obrigado a retirar os filhos do colégio porque ficou sem dinheiro para poder suportar esse encargo e deixou de poder suportar as mensalidades (alimentos) dos seus filhos fixadas pelo tribunal.
Não tem rendimentos mensais para poder viver, bem como a sua família, condignamente, sendo certo que a requerida está a usufruir um rendimento mensal, à sua custa, que deve ser muito superior a € 25.000,00.
Pelo que o requerente tem direito a que lhe seja arbitrada uma reparação provisória, que requer seja fixada em € 5.000,00/mês, a pagar pela requerida.

Mais afirmou o requerente que na acção principal, de que este procedimento é apenso, foi proferida sentença em 28/06/06, de que o requerente (nela, autor) interpôs recurso em 07/07/2006.
Nessa acção foi julgada improcedente a pretensão indemnizatória formulada pelo autor, aqui requerente.
O recurso interposto nessa acção foi recebido com efeito devolutivo.
As alegações nesse recurso de apelação constam transcritas na alegação neste agravo.

2) - A providência foi liminarmente indeferida.
O Senhor Juiz motiva a sua decisão, no essencial, nos seguintes termos: “A questão que, com respeito pela tese adoptada pelo Autor, para nós inquina o sucesso do procedimento cautelar n° …-G/99 que ora nos ocupa é outra. É que já existe uma decisão proferida no processo principal que nega ao Autor o direito a tal indemnização - fls. 697 a 709, dos autos …/99. Tal decisão encontra-se sob recurso que foi admitido com efeito devolutivo pelo que para todos os efeitos e até eventual alteração pelo tribunal superior, o Autor não tem direito à indemnização definitiva pelo que também não está indiciada a existência de obrigação de indemnizar o Autor como exige o artigo 403°, n° 1, do C. P. C..
Não pode, em nosso entender, o Autor querer agora, após decisão na acção principal, que o tribunal, em termos provisórios, decida ao contrário do que, em 1ªa instância já foi decidido definitivamente (permiti-lo seria consagrar a possibilidade de um Autor, perdedor na acção principal, procurar obter o seu vencimento provisório com base em factos que o tribunal já concluiu não lhe darem razão). Ou seja, se na acção principal naufraga o direito do Autor, este terá de aguardar pelo trânsito em julgado de tal decisão. Situação diferente ocorre se a decisão lhe é favorável na acção principal pois aí pode alegar-se que já existe indício de existência de pagamento de indemnização a seu favor e que com a interposição de recursos, com a natural maior demora que o simples correr do prazo de recurso, poderá ficar colocado numa situação difícil a nível económico.
Mas, repete-se, o que sucede nos presentes é a situação inversa, logo tal indício não existe”.
“Por falta do referido indício de obrigação de indemnização a cargo do Município ………. previsto no artigo 403°, nº 1, do C. P. C., tem de improceder desde já o presente procedimento cautelar”.

3) - Discordante do assim decidido, agrava o requerente da providência que, alegando doutamente, conclui:
“1. Ao fundamentar o despacho apenas com base no nº 1 do art.º 403º do C.P.C., o tribunal omitiu os nºs 3 e 4 no mesmo artigo, números esses referidos no art.º 69.º da P.I.;
2. Assim, o douto despacho viola o art.º 403, nºs 3 e 4, do C.P.C.;
3. Que deveria ter sido interpretado e aplicado no sentido de admitir a providência;
4. A decisão partiu do pressuposto errado de que o requerente já tinha proposto outra providência com os mesmos fundamentos;
5. Quem propôs a providência anteriormente foi a sua mãe que também é parte na acção principal. Não são admissíveis erros destes numa decisão judicial!
6. A acção principal ainda não transitou em julgado, ao contrário do que parece dizer a decisão. Dela já foi interposto recurso e apresentadas alegações.
7. Assim, é irrelevante que ainda não tenha transitado em julgado para obstar ao bom sucesso desta providência.
8. Pelo que se deve ordenar que a providência seja recebida, seguindo o seu procedimento normal.”

A requerida contra-alega pelo improvimento do agravo.
Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.

4) - Factualidade a atender:
- a que consta descrita em 1),
- a co-autora D………. requereu providência cautelar idêntica à formulada pelo ora agravante que foi indeferida.

5) - Perante as doutas conclusões formuladas pelo agravante e tendo em atenção o disposto nos arts. 684º/3 e 690º/1 e 3, do CPC, cumpre, essencialmente, averiguar e decidir se, julgada improcedente a acção em que se pede a condenação de outrem no pagamento de uma indemnização, e apesar de interposto recurso da improcedência, pode o requerente vir posteriormente, procurando exercer (provisoriamente) o direito não reconhecido, pedir uma reparação provisória nos termos do artigo 403º do CPC.

6) - Pelo agravante são apontados alguns vícios à decisão recorrida que entendemos de todo injustificados e só podem ser fruto de alguma insuficiência de interpretação.
Nas conclusões 1ª e 2ª diz-se que o despacho recorrido foi fundamentado apenas com “base no nº 1 do art.º 403º do C.P.C.” tendo o tribunal omitido “os nºs 3 e 4 no mesmo artigo, números esses referidos no art.º 69.º da P.I.” pelo que o “despacho viola o art.º 403, nºs 3 e 4, do C.P.C.”
Se o nº 3 do preceito citado é irrelevante para alicerçar qualquer direito do requerente, na decisão recorrida não se indefere o requerido (só) com base no nº 1 mas atende-se ao que dispõe o nº 4 desse artigo.
Para que não fiquem dúvidas cita-se “… pensamos que a manifesta improcedência, com base nos fundamentos do despacho de 06/06/06 aqui não se verificam pois o nº 4 do artigo 403º do C.P.C., refere que «o disposto nos números anteriores é também aplicável aos casos em que a pretensão indemnizatória se funde em dano susceptível de pôr seriamente em causa o sustento ou habitação do lesado» (…) Desta forma, atenta tal alegação, manifesta improcedência (sem audição de prova) por aquele motivo não ocorre pois são alegados factos que em princípio podem sustentar o pedido”
O despacho de 06/06/06 é o despacho proferido em procedimento idêntico (processo …-F/1999) que indeferiu uma providência cautelar de arbitramento de reparação provisória.
Ora, verifica-se que nem a providência destes autos foi indeferida por inverificação dos requisitos previstos no artigo 403º/1 – no que respeita pretensão indemnizatória fundada em morte ou lesão corporal - nem se desconsiderou o nº 4 desse preceito. A providência foi indeferida, em atenção a essa norma (nºs 1 e 4), pela inexistência de indício do direito (de indemnização) alegado. Como na decisão recorrida se escreve “são alegados factos que em princípio podem sustentar tal pedido” baseado no artigo 403º/4 do CPC. Aliás, como é explícito, o procedimento foi indeferido atento o disposto no artigo 403º, nºs 1, 3 e 4, do CPC. Não faz, pois, sentido afirmar-se a desconsideração das citadas normas pela decisão em recurso.

Por outro lado, tem-se por infundada a afirmação de que a “decisão partiu do pressuposto errado de que o requerente já tinha proposto outra providência com os mesmos fundamentos” (conclusão 4ª) para indeferir a pretensão do aqui agravante.
Sendo verdade que consta do despacho recorrido que “verifica-se que o mesmo requerente já havia interposto procedimento cautelar visando a mesma finalidade que a presente, ou seja, a fixação de uma indemnização provisória por conta de um seu alegado direito”.
Logo se acrescentou “no entanto, e em segundo lugar, por duas ordens de razões, não se dará aqui aplicação a tal artigo” (referindo-se à norma do artigo 384º/4 do CPC, que obsta à repetição, como dependência da mesma causa, da providência que haja sido julgada injustificada).
Significa que, embora a incorrecta afirmação da anterior instauração de idêntico procedimento pelo requerente (a anterior providência foi requerida por D………. e não pelo requerente), certo é que tal suposição em nada pesou ou interferiu na decisão recorrida.

Como ainda é incorrecta a afirmação na conclusão 6º “a acção principal ainda não transitou em julgado, ao contrário do que parece dizer a decisão”.
Seguro é que da sentença proferida na acção principal foi interposto recurso (aliás, pelas alegações que se transcrevem nas alegações nestes autos, vários recursos foram interpostos na acção principal), não tendo pois transitado em julgado.
Mas na decisão ora impugnada não se dá a entender ou transparece o contrário.
Nesta se afirma explicitamente que “tal decisão encontra-se sob recurso que foi admitido com efeito devolutivo pelo que para todos os efeitos e até eventual alteração pelo tribunal superior, o Autor não tem direito à indemnização definitiva pelo que também não está indiciada a existência de obrigação de indemnizar o Autor”.
Na decisão tem-se presente que a sentença proferida na acção principal ainda não transitou em julgado, por isso que ainda não é definitiva.

7) – Estabelece o artigo 403º do CPC que:
“1 – Como de pendência da acção de indemnização fundada em morte ou lesão corporal, podem os lesados (…) requerer o arbitramento de quantia certa, sob a forma de renda mensal, como reparação provisória do dano.
2 – O juiz deferira a providência requerida, desde que se verifique uma situação de necessidade em consequência dos danos sofridos e esteja indiciada a existência de obrigação de indemnizar a cargo do requerido.
3 – A liquidação provisória, a imputar na liquidação definitiva do dano, será fixada equitativamente pelo tribunal.
4 – O disposto nos números anteriores é também aplicável aos casos em que a pretensão indemnizatória se funde em dano susceptível de pôr seriamente em causa o sustento do dano ou habitação do lesado”.
O requerente instaurou o procedimento ao abrigo da previsão do nº 4 citado e, tanto quanto é possível determinar do texto da petição (remissões são efectuadas para peças processuais da acção principal, não juntas a estes autos), apelando a responsabilidade civil extracontratual (mas ainda que de responsabilidade contratual se tratasse, e na admissibilidade da requerida providência nesse âmbito, a solução a dar ao pedido seria idêntica, in casu). Até porque a providência foi liminarmente indeferida, não porque os factos alegados (se provados) não pudessem (eventualmente) sustentar uma providência como a requerida, análise em que nem sequer se entrou, mas porque já existia uma sentença a denegar a pretensão do requerente, a concluir pela inexistência do direito indemnizatório (apesar de, dessa sentença, ter sido interposto recurso, admitido como apelação e com efeito devolutivo).

São requisitos do arbitramento duma reparação provisória, nos termos dessa norma – a) a existência da obrigação de indemnizar ou do direito a obter do requerido uma indemnização (nº 2 desse artigo), em termos de fumus boni iuris, e b) que o dano ponha seriamente em causa (risco) o sustento ou habitação do lesado (nº 4), pelo denominado periculum in mora, de forma a evitar os danos decorrentes da demora (normal ou não) na prolação da decisão definitiva e a torná-la eficaz. Ao sucesso da pretensão de reparação provisória, nesta situação, não basta que o requerente dela tenha necessidade por causa dos danos sofridos (como sucederá nos casos previstos no nº 1 do artigo), mas que essa necessidade seja tal que, sem a reparação provisória e por causa dos danos, esteja em causa o sustento e habitação do lesado ou apenas visa “garantir a recomposição provisória das condições necessárias à garantia do «sustento e habitação» do lesado”[1]. Assim assegurando uma eficaz tutela do direito do requerente, antecipando os efeitos da sentença que reconheça esse direito em situações de sérias dificuldades do seu titular, por estar em causa o seu sustento ou a sua habitação.

A pretensão só será deferida quando se mostre indiciada a existência da obrigação de indemnização e o periculum in mora, de forma afastar as consequências nefastas do arrastamento do processo para conceder a tutela definitiva, tudo em termos de verosimilhança ou séria probabilidade.
Sem considerar o mérito do pedido, que implicaria o prosseguimento do procedimento para se apurar da realidade da alegação factual, vejamos se é possível, na circunstância, afirmar o fumus boni iuris, perante a improcedência da acção, no que ao direito indemnizatório respeita e, daí, da necessidade de prosseguimento do processo.
Os procedimentos cautelares “representam uma antecipação ou garantia de eficácia relativamente ao resultado do processo principal e assentam numa análise sumária (summaria cognitio) da situação de facto que permita afirmar a provável existência do direito ameaçado (fumus boni iuri) e o receio justificado de que o mesmo seja seriamente afectado ou inutilizado se não for decretada uma determinada medida cautelar (periculum in mora). São, afinal, um antecâmara do processo principal, possibilitando a emissão de uma decisão interina ou provisória destinada a atenuar os efeitos erosivos decorrentes da demora na resolução definitiva ou a tornar frutuosa a decisão que, porventura, seja favorável ao recorrente”[2].

Antes de mais o decretamento de uma providência cautelar implica a probabilidade séria da existência do direito invocado, que virá a ser definitivamente reconhecido na acção de que o procedimento é mera dependência; o pensamento subjacente a todas as providências “é o de garantir a manutenção ou a restauração da situação de facto necessária à eventual realização do direito invocado pelo requerente”[3].
A providência cautelar surge como antecipação e preparação duma providência ulterior; prepara o terreno e abre o caminho para uma providência final, é posta ao serviço duma outra providencia, que há-de definir, em termos definitivos, a relação jurídica litigiosa e tem como função antecipar certos efeitos jurídicos próprios do julgamento da casa principal (antecipa-os em atenção ao periculum in mora), e defender o presumido titular do direito contra os danos e prejuízos que lhe possa causar a demora da decisão definitiva[4].
Têm uma função instrumental que é a de prevenir o risco de lesão grave a direitos subjectivos e a outros interesses legalmente protegidos ou antecipar a realização do direito ameaçado de lesão. Não visam a justa composição (definitiva) dos interesses em litígio, antes acautelam a eficácia prática de direitos ou antecipam certos efeitos práticos da decisão definitiva dando eficácia ao direito ameaçado, por isso que só são decretadas na previsão de que a decisão definitiva a obter no processo principal virá a ser favorável ao requerente.

A decisão cautelar assenta numa prova sumária (summaria cognitio, porque o procedimento sendo “urgente e conducente a uma providência provisória, não se compadece com indagações probatórias próprias do processo principal, contentando-se, quanto ao direito ou interesse do requerente, com a constatação objectiva da grande probabilidade de que exista”[5]), sem as garantias probatórias que hão-de preceder a prolação da decisão definitiva, de reconhecimento do direito invocado e o seu decretamento parte da ideia de que o desfecho da acção virá a ser favorável ao autor (requerente da providência). De contrário, a providência deve ser indeferida.

A sorte da providência anda estreitamente ligada à da acção de que é dependência.
Do que decorre que, existindo assente (ou fortemente indiciada) factualidade no processo principal indiciador da inviabilidade do direito invocado, sobretudo se já existe decisão “final” (em primeira instância) a concluir pela improcedência, é injustificada a pretensão de decretamento da providência instrumental daquele direito. As providências são decretadas na pressuposição de que a decisão definitiva, a ser proferida na acção principal, vai ser favorável ao requerente. Juízo que se não poderá fazer se já existe essa sentença, mesmo não transitada, desfavorável ao requerente.
Isto é, se já existe sentença que denega o direito invocado, não pode essa situação deixar de reflectir-se negativamente na admissão da aparência da existência desse direito. Mesmo que, da sentença, tenha sido interposto recurso, sobremodo quando ao mesmo é, conforme de lei, atribuído efeito devolutivo.

Na espécie, a providência é interposta quando já foi decidida a matéria de facto na acção principal e aí já proferida sentença, a fazer improceder o pedido de indemnização requerida pelo aqui agravante, como decorre da alegação no requerimento inicial e da fundamentação do indeferimento da providência. Concluiu-se aí pela inexistência do direito, face ao que se provou.
Assim, colhe-se em Teixeira de Sousa[6] “se na acção principal já tiver sido proferida uma decisão desfavorável ao autor (nomeadamente uma decisão que está pendente de recurso), não pode esta parte requerer, durante esse recurso, qualquer providência cautelar, porque nessas circunstâncias, durante esse recurso, qualquer providência cautelar, porque nessas circunstância, não é possível fazer prevalecer a probabilidade da existência da situação sobre a apreciação realizada naquela decisão” ou, como escreve António Abrantes Geraldes[7], “parece claro que na emissão da decisão cautelar, o juiz não deixará de ponderar a decisão favorável ou desfavorável proferida no processo principal, mesmo que ainda não tenha transitado em julgado”, pois trata-se de facto “revelador da falta de um dos requisitos substantivos: a verosimilhança acerca da existência do direito”.

E como decorre da decisão recorrida, (cita-se) “já existe uma decisão proferida no processo principal que nega ao Autor o direito de indemnização”, de que foi interposto recurso, recebido com efeito devolutivo, “pelo que para todos os efeitos e até eventual alteração pelo tribunal superior o autor não tem direito à indemnização definitiva pelo que também não está indicada a existência de obrigação de indemnizar o Autor”. Embora se não acompanhando todo o discurso, concordamos que enquanto a sentença não for alterada, vale o que dela consta quanto à inexistência do direito invocado, pelo que seguramente, não se pode considerar, nestes autos, demonstrada a existência (em termos de fumus boni iuris) desse direito.
Não tem lógica acolher uma pretensão cautelar que, dada a sua instrumentalidade (hipotética), pressupõe que ao requerente assista o direito, quando já foi proferida sentença a denegar esse direito. Seria contraditório que, na base do fumus boni iuris e summaria cognitio, se aceitasse uma pretensão quando, produzidos todos os amplos meios probatórios normais (sem a pressão da urgência e a consideração da provisoriedade da decisão, características dos procedimentos cautelares), já se tivesse concluído que ao requerente não assiste o direito, cujos efeitos práticos e eficácia se pretende antecipar ou garantir com a medida cautelar. Tudo isto, e ainda que, como no caso, a sentença esteja pendente de recurso, e se alegue a existência de outros vícios procedimentais (do processo principal), com eventual nulidade pela não intervenção do tribunal colectivo. Vício arguido sem êxito e cuja decisão esta igualmente em recurso.
Tem de se concluir que não se indicia a existência do direito do requerente (artigo 403º/1 e 4, do CPC) e, portanto, pela não verificação do primeiro dos requisitos de que depende a procedência, injustificando o prosseguimento do procedimento.

Em conclusão - proferida sentença que julga improcedente o pedido indemnizatório, mesmo que não transitada em julgado, deve ser indeferido o pedido de arbitramento de reparação provisória, solicitada nos termos do artigo 403º/4 do CPC;
- se já foi proferida sentença em que se nega o direito indemnizatório que se exercitava na acção, e dada a função instrumental da providência, seria contraditório com essa sentença, vir decretar-se uma medida cautelar que pressupõe a existência desse direito.
- se a sentença (ainda que não transitada) já fora proferida aquando a instauração do procedimento, deve este ser liminarmente indeferido.

8) – Pelo exposto, acorda-se neste tribunal da Relação do porto em negar provimento ao agravo e manter a decisão recorrida.
Custas pelo agravante.
Porto, 26 de Abril de 2007
José Manuel Carvalho Ferraz
Nuno Ângelo Rainho Ataíde das Neves
António do Amaral Ferreira

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[1] António Abrantes Geraldes, em Temas da Reforma do Processo Civil, IV, 2ª Edição, 143, e Célia Sousa Pereira, em Arbitramento de Reparação Provisória, 128/129.
[2] Abrantes Geraldes, em Temas da Reforma do Processo Civil, III, 3ª Ed/35.
[3] A. Varela, Miguel Bezerra e Sampaio e Nora, Manual de Processo Civil, 2ª Ed/26, em nota.
[4] Alberto dos Reis, Cód. Proc. Civil Anotado, I/págs. 623/627.
[5] J. Lebre de Freitas (e outros), CPC Anotado, II, 35).
[6] Em “Estudos Sobre o Novo Processo Civil, 233.
[7] Em “Temas da Reforma do Processo Civil”, III, pág. 35.