Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
1140/11.6TTMTS-B.P1
Nº Convencional: JTRP000
Relator: PAULA MARIA ROBERTO
Descritores: ISENÇÃO SUBJECTIVA DE CUSTAS
IPSS
Nº do Documento: RP201301211140/11.6TTMTS-B.P1
Data do Acordão: 01/21/2013
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: NEGADO PROVIMENTO
Indicações Eventuais: 4ª SECÇÃO (SOCIAL)
Área Temática: .
Sumário: I - A isenção subjetiva prevista na alínea f) do n.º l do artigo 4.º do RCP só funciona em processos atinentes às especiais atribuições das pessoas coletivas privadas sem fins lucrativos (como por exemplo as IPSS) ou relativos à defesa dos interesses que lhe estão especialmente conferidos por lei ou pelos respetivos estatutos.
II - Esta isenção não abrange as ações declarativas emergentes de contrato de trabalho interpostas contra uma IPSS com vista ao reconhecimento de créditos decorrentes da relação laboral que existiu entre ela e uma trabalhadora (A.).
Reclamações:
Decisão Texto Integral: Apelação n.º 1140/11.6TTMTS-B.P1
Tribunal do Trabalho de Matosinhos (1º juízo)
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Relator – Paula Maria Roberto
Adjuntos – Machado da Silva
Fernanda Soares

Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação do Porto:

I - Relatório

B…, com sede em …, Coimbra,

veio interpor o presente recurso do despacho proferido pelo Exm.º juiz do tribunal a quo, a fls. 2, e que considerou não estar a mesma isenta de custas por não se mostrar preenchida a condição prescrita na 2ª parte do artigo 4.º, n.º 1, alínea f), do R.C.P..
Conclui tal recurso da seguinte forma:
1. A decisão deve ser reformada porquanto a recorrente integra a isenção subjectiva prevista na al. f) do n.º 1 do art. 4.º do Regulamento das Custas Judiciais, disposição genérica relativa a pessoas colectivas privadas sem fins lucrativos, nomeadamente para defesa dos seus interesses;
2. Acresce que, a decisão sempre deve ser reformada porquanto não considerou a disposição específica relativa às instituições particulares de solidariedade social, tipologia na qual se insere a recorrente, consagrada na al. a) do art.º 1 do D.L. 9/85, de 9.01, que determina a sua isenção;
3. Deve a decisão ser revogada, assim se fazendo a costumada Justiça!”
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Não foram apresentadas contra-alegações.
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A Exm.ª Procuradora-Geral Adjunta emitiu o douto parecer de fls. 275 e 276 concluindo que a recorrente não beneficia do regime legal de isenção de custas, por nele não estar contemplado.
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Colhidos os vistos, cumpre, agora, apreciar e decidir.
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II – Saneamento
A instância mantém inteira regularidade por nada ter entretanto sobrevindo que a invalidasse.
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III – Fundamentação
Factos assentes com relevância para a decisão
1 – C… intentou ação declarativa de condenação emergente de contrato de trabalho, pedindo a condenação da Ré ora recorrente a pagar-lhe uma indemnização por danos patrimoniais e não patrimoniais, uma indemnização por resolução do contrato com justa causa, retribuições não pagas, por trabalho noturno, por trabalho extraordinário e 201 horas de formação profissional.
2 – A Ré recorrente é uma instituição particular de solidariedade social (pessoa coletiva de utilidade pública) e prossegue, entre outras, as atividades de creche, educação pré-escolar, centro de acolhimento temporário, lar de idosos e serviço de apoio domiciliário.
3 – O D… é uma instituição privada de ensino superior e foi instituído pela Ré recorrente B….
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b) - Discussão
Como é sabido, a apreciação e a decisão dos recursos são delimitadas pelas conclusões da alegação do recorrente (art.º 684.º, n.º 3 e 685.º-A, n.º 1, do CPC), com exceção das questões de conhecimento oficioso.
Assim, cumpre apreciar as questões suscitadas pela Ré recorrente, quais sejam:
1 – A sua integração na isenção subjetiva prevista na alínea f), do artigo 4.º, do R.C.P., relativa a pessoas coletivas sem fins lucrativos, nomeadamente, para defesa dos seus interesses.
2 – A sua inserção na isenção prevista na alínea a), do artigo 1.º, do D.L. n.º 09/85, de 09/01 para as IPSS.
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1ª questão
Alega a Ré recorrente que se encontra abrangida pela isenção subjetiva prevista na alínea f), do n.º 1, do artigo 4.º do R.C.P..
Dispõe este normativo que estão isentos de custas <<as pessoas colectivas privadas sem fins lucrativos, quando actuem exclusivamente no âmbito das suas especiais atribuições ou para defender os interesses que lhe estão especialmente conferidos pelo respectivo estatuto ou nos termos de legislação que lhes seja aplicável>>.
Dúvidas não há de que a Ré é uma IPSS e de que estas são pessoas coletivas privadas sem fins lucrativos.
No entanto, a isenção subjetiva em análise está sujeita a outros requisitos além da inexistência de fins lucrativos, ou seja, aquelas IPSS têm de atuar exclusivamente no âmbito das suas especiais atribuições ou para defender os interesses que lhe estão especialmente conferidos.
“Trata-se de uma isenção de custas condicional, na medida em que só funciona em relação aos processos concernentes às suas especiais atribuições ou para defesa dos interesses conferidos pelo seu estatuto ou pela própria lei.
Nesta perspectiva, pode parecer que esta isenção não abrange as acções que tenham por objecto obrigações ou litígios derivados de contratos que essas pessoas celebrem com vista a obter meios para o exercício das suas atribuições.
Todavia, se o objecto de tais acções for instrumental em relação aos fins estatutários dessas entidades, propendemos a considerar serem abrangidas pela isenção de custas em análise>> - Salvador da Costa, Regualmento das Custas Processuais Anotado e Comentado, 2009, Almedina, pág. 146.
Ora, também nós partilhamos este entendimento.
Significa isto que conforme se refere no despacho recorrido “esta isenção não abrange as acções que tenham por objecto obrigações ou litígios derivados de contratos que essas pessoas celebrem com vista a obter meios para o exercício das suas atribuições”.
<<I – A isenção mencionada no artº 4º/1 – f) do RCP (…) não abrange as acções interpostas contra instituições particulares de solidariedade social em que estas defendam interesses conexos com a relação laboral estabelecida com uma trabalhadora. (…)>> – Ac. da Relação de Coimbra de 13/12/2011, processo 68/08.1TTCBR-A.C2, disponível em www.dgsi.pt.
A Ré, como já referimos é uma IPSS (pessoa coletiva de utilidade pública) e prossegue, entre outras, as atividades de creche, educação pré-escolar, centro de acolhimento temporário, lar de idosos e serviço de apoio domiciliário.
Acontece que foi interposta contra a Ré a citada ação declarativa emergente de contrato de trabalho com vista ao reconhecimento dos créditos supra enunciados decorrentes da relação laboral que existiu entre a trabalhadora (docente do D…, instituição privada de ensino superior da qual a Ré é a entidade instituidora) e a ora Ré recorrente, pelo que, não estamos perante qualquer atuação exclusivamente no âmbito das suas especiais atribuições nem para defesa dos interesses que lhe estão especialmente conferidos pelo respectivo estatuto ou nos termos de legislação que lhes seja aplicável.
Conforme refere a Exm.ª Procuradora-Geral Adjunta <<a presente acção judicial insere-se no âmbito da defesa dos interesses especialmente conferidos ao “D…” pelo respectivo estatuto, e não no âmbito dos interesses da própria B… aqui recorrente que, como vimos e no que respeita ao ensino, se limitam à educação pré-escolar>>.

2ª questão
A Ré recorrente alega que beneficia da isenção prevista na alínea a) do artigo 1.º do D.L. n.º 09/85, de 09/01 para as IPSS.
Acontece que, este D.L. foi revogado pelo n.º 1, do artigo 25.º do D.L. nº 34/2008 que revogou as isenções de custas previstas em qualquer lei, regulamento ou portaria e conferidas a quaisquer entidades públicas ou privadas que não estejam previstas naquele.
Assim sendo, facilmente se conclui que também nesta questão não assiste razão à recorrente.
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Improcedem assim as conclusões formuladas pela Ré recorrente, impondo-se a manutenção do despacho recorrido.
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IV – Sumário
1 - As IPSS são pessoas coletivas privadas sem fins lucrativos.
No entanto, a isenção subjetiva prevista na alínea f), do n.º 1, do artigo 4.º do R.C.P., está sujeita a outros requisitos além da inexistência de fins lucrativos, ou seja, aquelas IPSS têm de atuar exclusivamente no âmbito das suas especiais competências ou para defender os interesses que lhe estão especialmente conferidos.
2 – Esta isenção não abrange as ações declarativas emergentes de contrato de trabalho interpostas contra IPSS com vista ao reconhecimento de créditos decorrentes da relação laboral que existiu entre as mesmas e uma trabalhadora.
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V - DECISÃO
Nestes termos, sem outras considerações acorda-se:
1-) em julgar improcedente a apelação, confirmando-se o despacho recorrido.
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Custas a cargo da Ré recorrente.
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Porto, 2013/01/21
Paula Maria Mendes Ferreira Roberto
José Carlos Dinis Machado da Silva
Maria Fernanda Pereira Soares