Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
633/09.0TTMAI.P1
Nº Convencional: JTRP000
Relator: FERREIRA DA COSTA
Descritores: COOPERATIVA
ACORDO DE TRABALHO COOPERATIVO
TRIBUNAL DO TRABALHO
COMPETÊNCIA MATERIAL
Nº do Documento: RP20110919633/09.0TTMAI.P1
Data do Acordão: 09/19/2011
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO.
Decisão: PROVIDO.
Indicações Eventuais: 4ª SECÇÃO (SOCIAL)
Área Temática: .
Sumário: I – Dentro dos três sectores de propriedade dos meios de produção, as cooperativas inserem-se no sector cooperativo, como dispõe o Art.º 82.º da Constituição da República, sendo um dos seus ramos o da “Produção operária”.
II – As cooperativas de produção operária, visando garantir trabalho aos seus sócios, estabelecem com estes acordos de trabalho cooperativo, figura distinta do contrato de trabalho, pois este pressupõe a subordinação jurídica e aquele a cooperação.
III – Tendo o sócio trabalhador proposto uma acção emergente de contrato de trabalho contra a cooperativa, o Tribunal o Trabalho é incompetente em razão da matéria para conhecer o litígio existente ente as partes, o que traduz uma excepção dilatória, conducente à absolvição da R. da instância, atento o disposto nos Art.ºs 101.º, 105.º, n.º 1, 288.º, n.º 1, alínea a), 493.º, n.ºs 1 e 2 e 494.º, alínea a) do Cód. Proc. Civil.
Reclamações:
Decisão Texto Integral: Reg. N.º 785
Proc. N.º 633/09.0TTMAI.P1

Acordam no Tribunal da Relação do Porto:

B… deduziu em 2009-09-22 contra C…, CRL a presente acção declarativa, emergente de contrato individual de trabalho, com processo comum, pedindo que se condene a R. a pagar ao A. a quantia de € 17.705,00, sendo €14.040,00 de indemnização de antiguidade e a restante relativa a subsídios de férias e de Natal de 2007 e 2008, salário e subsídio de refeição de Agosto e de Setembro de 2008 e férias, respectivo subsídio e subsídio de Natal, proporcionais ao tempo de trabalho prestado no ano de 2008, para além de juros de mora, à taxa legal, sobre o capital em dívida, desde a data da citação até efectivo e integral pagamento.
Alega o A., para tanto e em síntese, que tendo sido admitido ao serviço da R. em 1983-06-06 para, sob a sua autoridade e direcção, desempenhar as funções de acabador, mediante o salário mensal de € 540,00, depois de o ter suspendido, resolveu o contrato de trabalho em 2008-12-18, com invocação de justa causa, alegando a falta de pagamento do salário de Agosto de 2008 e do subsídio de férias vencido em 2008-01-01, tendo para o efeito remetido à R. em 2008-12-16 carta registada com aviso de recepção, o que fez também em relação à Inspecção Geral do Trabalho, comportamento que já havia adoptado anteriormente a propósito da suspensão do contrato, efectuada através de cartas datadas 2008-09-03. Mais alega que nenhuma das quantias reclamadas aos diversos títulos lhe foi paga, salvo o salário de Julho de 2008, que foi pago após o decurso do prazo da suspensão do contrato de trabalho, acabada de referir.
Contestou a R., por excepção, alegando que o contrato celebrado com o A. é um acordo de trabalho cooperativo, na medida em que as relações existentes entre as partes são de cooperação e não de subordinação, pois os trabalhadores são simultaneamente trabalhadores e empregadores de si mesmos, que não recebem uma retribuição pelo trabalho prestado, mas parte do rendimento que a R. gera, em função da actividade prestada por cada cooperador e existindo, ou podendo existir, distribuição pelos cooperadores, no fim de cada ano, dos excedentes líquidos gerados. Daí que, a seu ver, inexistindo contrato de trabalho entre as partes, o Tribunal do Trabalho seja incompetente em razão da matéria, o que conduz à absolvição da R. da instância e, caso assim se não entenda, deverá a R. ser absolvida do pedido.
O A. respondeu à contestação, reafirmando existir entre as partes um contrato de trabalho, cujos factos pertinentes descreveu, impugnou os factos alegados pela R., na contestação, em sede de excepção e concluiu pela improcedência desta e pela procedência do pedido.
Convocada a audiência preliminar e tendo-se frustrado a tentativa de conciliação, o Tribunal a quo proferiu despacho saneador tabelar, relegou para a decisão final o conhecimento da excepção de incompetência absoluta do Tribunal em razão da matéria, assentou os factos considerados provados e elaborou a BI[1], sem reclamações.
No entanto, no início da audiência de discussão e julgamento e antes de iniciada a produção de prova, foi ordenada a rectificação do quesito 18.º da BI de forma que onde constava a data de 2006-01-06, passasse a constar a data de 1986-01-06, bem como foi ordenada a eliminação do quesito 13.º passando a respectiva matéria a integrar uma nova alínea da MA[2], a ora aditada alínea I). Refira-se que a primeira alteração foi requerida pela R. e a segunda pelo A., tendo cada uma delas obtido a concordância da parte contrária.
Procedeu-se a julgamento com gravação da prova pessoal, tendo-se respondido à BI pela forma constante do despacho de fls. 100 e 101, que suscitou reclamações das partes, que foram deferidas.
Proferida sentença, foi julgada improcedente a excepção de incompetência absoluta do Tribunal e foi a R. condenada a pagar ao A. a quantia de € 17.115,90, acrescida de juros de mora, à taxa legal, desde a citação até integral pagamento.
Inconformada com o assim decidido, veio a R. interpôr recurso de agravo [sic], pedindo a revogação da sentença, tendo formulado a final as seguintes conclusões:

I. A R. interpôs recurso de agravo, pedindo a revogação da sentença, que deverá ser substituída por decisão que não considere ter ficado demonstrado que a relação jurídica invocada nos autos é uma relação laboral e que, portanto, conclua pela procedência da deduzida excepção de incompetência material pelo tribunal e em consequência absolva a ré da instância.
II. Pelo presente recurso pretende o recorrente manifestar o seu inconformismo contra a decisão do Tribunal Recorrido no que se refere às duas primeiras (e decisivas) questões apontadas na douta sentença, a saber: Se entre A. e R. existia um contrato qualificável de trabalho? Se, dependendo disso, o tribunal de trabalho é competente para julgar a causa?
III. Discordância fundamentada no facto dos elementos probatórios carreados para os autos, por si só, permitirem ao tribunal a quo uma decisão oposta à proferida, no sentido de considerar que a relação entre A. e R. é, exclusivamente, um acordo de trabalho cooperativo e que, por esse motivo, o tribunal de trabalho não é competente para a resolução do litígio.
IV. De modo que o Tribunal Recorrido ao não relevar a prova produzida no tocante às questões indicadas e ao não ter realizado a melhor apreciação jurídica do caso, a decisão em crise orientou-se em sentido diverso do caminho da justiça do caso concreto.
V. Para o demonstrar o recorrente impugna a matéria de facto dada por assente pelo Tribunal Recorrido (no quesito 3) e reclama que seja dado como assente os quesitos 15,16 e 18.
VI. No discernir do recorrente nenhuma prova foi revelada nos autos que traduzisse, cabalmente, que houvesse contrato de trabalho celebrado entre as partes.
VII. Para chegar a essa conclusão o tribunal a quo baseou a sua convicção na valoração dos depoimentos das testemunhas D…, E…, F…, colegas de trabalho do Autor na Ré. Por outro lado, considerou que as testemunhas G…, H…, I… e J…, intitulando-se cooperadores da Ré, prestaram depoimentos algo comprometidos, e contraditórios em diversos aspectos fundamentais, tais como o horário praticado pelo Autor e colegas, de quem é que aquele recebia ordens, como desempenhava a sua actividade profissional, e a contrapartida económica de tal trabalho.
VIII. Analisada a fundamentação sobre a decisão da matéria de facto verifica-se que o tribunal acreditou nas testemunhas do Autor e declarou "comprometidas" e "contraditórias" as testemunhas da R.. Isto apesar de as três testemunhas do A. terem todas quantias avultadas (pela antiguidade) a receber da R.. Duas delas (E… e F…) como cooperadoras e uma delas (D…) no âmbito de uma relação laboral, ou seja, têm interesse indirecto no desfecho deste processo.
IX. Por outro lado, entende a R. que as suas testemunhas foram credíveis pois, ao longo do seu testemunho, em nenhum momento se pode aferir o referido "comprometimento". É que se assim fosse devia o Tribunal utilizar tal critério para a totalidade das testemunhas do A. pois o seu estatuto é de credores da R. seja como cooperadores (dois deles pelos levantamentos por conta em falta) ou trabalhador (um deles pelos créditos laborais).
X. Em concreto, analisados os depoimentos das testemunhas pelas transcrições dos seus depoimentos revela-se que:
XI. sobre "Horário de trabalho" as testemunhas H… e I… falaram claramente e sem contradições. As restantes testemunhas da R. nada responderam sobre este assunto. Por isso se pergunta: onde está a contradição referida pelo Tribunal recorrido?
XII. Sobre "De quem recebiam ordens?": a testemunha H… respondeu de forma credível afirmando que "ninguém mandava em ninguém.". Também a testemunha J… refere no seu depoimento que os cooperadores escolhiam a Direcção que depois organiza os trabalhos. A corroborar esse depoimento existem documentos como o nº 3 (estatutos da R.) e nº 8 (Convocatórias para eleições dos órgãos sociais e aprovar o Orçamento e Plano de actividades do ano de 2007) em que o A. e testemunhas participaram.
XIII. Sobre "Como desempenhavam a sua actividade profissional?": as testemunhas H… e G… explicaram como o trabalho era organizado e esclareceram o contexto da sua relação de cooperador (e logo por similitude a do A.). Igualmente a testemunha I… explicou que desempenha a sua actividade como cooperador na R. e qualificou os instrumentos de trabalho como sendo propriedade da C…, logo seus. A testemunha J… refutou a existência de qualquer relação hierárquica nas cooperativas, aponta a inexistência de salários nas cooperativa para os cooperadores (mas sim levantamentos por conta), realça a existência de benefícios na cooperativa e explicou como se processa a entrada de um cooperador. As testemunhas foram, ao contrário do que entendeu Tribunal recorrido, credíveis e descomprometidas.
XIV. Sobre a "Contrapartida económica de tal trabalho": a testemunha G…, refere-se a existência de levantamentos em atraso e não salários e a testemunha H… assume a existência de levantamentos e excedentes. Também a testemunha J… explica as regras das relações de trabalho nas Cooperativas e a contrapartida económica que os cooperadores recebem. Tudo de forma credível e clara: o que o Tribunal recorrido não entendeu.
XV. Acresce que no entender da R., também, não foi valorado convenientemente os documentos juntos pela R. a saber: registo de sócio do A., título de capital do A. na R. e, em particular, os estatutos da R.
XVI. Ora numa análise ponderada destes documentos verifica-se que nos termos do art. 3 nº 1 dos Estatutos da R. esta "tem como finalidade criar, manter e aumentar a propriedade colectiva ..." - cf. Doc. 3. Que cada cooperador devia contribuir economicamente e com trabalho: cf. artigo 6°, 11° nº 1 al. b) dos Estatutos; Que se o A. antes de pedir para ser sócio já prestava o seu contributo para a C…fazia-o de acordo com os Estatutos da R. (cf. artigo 11° e 12° dos Estatutos da R.) Que o A. é também proprietário das máquinas com que trabalhou e dos edifícios onde laborou: cf. art. 3° dos Estatutos. Que o A, de livre vontade, entrou para a R. conforme Doc. 1, 2 e 3 - cf. artigo 11° nº 1, al. a) - e pagou a jóia - cf. artigos 5° nº 1 e nº 2 e art. 6° e art. 7° nº 1 dos Estatutos da R. Que a relação jurídica entre A. e R. envolve levantamentos e excedentes e não salários (cf. art. 13° al. a) e b) dos Estatutos da R.).
XVII. Analisada a situação de facto cabe agora interpretar o pleito juridicamente.
XVIII. Ora a questão magna deste processo é, se existe um contrato de trabalho a ligar A. e R. E face à posição assumida pela R. ao longo do processo existe um acordo de trabalho cooperativo, exclusivamente.
XIX. De acordo com a alteração da matéria de facto reclamada no presente recurso não ficaram demonstrados os elementos constitutivos de um contrato de trabalho, ou seja, a prestação de uma actividade sob a autoridade de outrem mediante retribuição (cf. art. 11° do CT).
XX. Em sentido diametralmente oposto ficou provado que o A. era cooperador na R. e que a sua relação com esta não possuía natureza laboral. Tal entendimento tem as seguintes razões jurídicas:
XXI. A R é uma Cooperativa de produção operária nos termos do artigo 2° nº 1 do DL 309/81 de 16.11. Tal regime jurídico é acolhido nos estatutos da R. (cf. também artigo 3°).
XXII. Sendo assim, a génese da Cooperativa está na resposta à procura de trabalho. Por seu lado, cabe ao cooperador realizar a entrada mínima e se obrigue participar, regularmente, com o seu trabalho - cf. artigo 6° art. 11° nº 1 al. b); e art.12° nº 1 dos Estatutos da R.
XXIII. Assim, enquadrado por este contexto jurídico, o Autor, de livre vontade, solicitou a entrada na C… conforme previsto no Cód. Cooperativo art. 3° (princípio da adesão voluntária e livre).
XXIV. A partir dessa data, 6 Janeiro de 1986, o vínculo de acordo de trabalho cooperativo estabelece-se de forma definitiva. Se é verdade, que o A. já prestava o seu contributo para a C…, fazia-o de acordo com os estatutos da R. no âmbito de um período de experiência (cf. artigo 11° e 12° dos Estatutos da R.).
XXV. Acresce que A. desempenhou a função de "Acabador" e tal facto poderia indiciar a existência de um contrato de trabalho. Mas esta situação nada tem de estranho. O A., como outros cooperadores, realizavam tarefas a si adstritas no âmbito da dinâmica C… aprovada em Assembleia-geral da qual o A. fazia parte por direito próprio. Nesse sentido, o artigo 7° nº 1 e nº 3 e 8° nº 3 do DL 309/81 de 16.11.
XXVI. De igual forma, a partir dessa data, o relacionamento entre A. e R. é regido pelos Estatutos da R. e pelo Cód. Cooperativo onde não existe salário no sentido laboral mas sim levantamentos por conta - cf. o art. 73° nº 1 Cód. Cooperativo.
XXVII. Refere-se ainda na sentença que o acordo de trabalho cooperativo (também dado como provado - resposta ao quesito R) não era exclusivo. Ora não podemos aplaudir este entendimento. De facto, o A. recebia proporcionalmente às horas/dias de trabalho efectivamente prestado segundo uma orgânica definida em Assembleia-geral pelos cooperadores e na qual o A. tinha poder de decisão. E esse regime está estatuído e regulamentado na lei.
XXVIII. E por isso se entende que, conforme referido por RUI NAMORADO, os critérios para a determinação da quota-parte dos resultados anuais líquidos podem variar mas o lógico não pode deixar de ser de repartir os resultados na proporção do trabalho prestado ou seja quem mais contribuiu para a cooperativa mais receberia. Assim quem mais contribuiu com dias de trabalho recebeu mais. Discorda-se, por isso, quando se refere na sentença que a retribuição era certa. Questiona-se então: não havia excedentes e por isso anos em que o A. recebeu mais?
XXIX. Também devemo-nos socorrer dos princípios cooperativos, ignorados pelo Tribunal, nomeadamente, do princípio da participação económica dos membros cf. artigo 3° nº 3 do Código Cooperativo e Declaração de Princípios da Aliança Cooperativa Internacional com recepção na Constituição da República Portuguesa. Nesse princípio os cooperadores destinam os excedentes a um objectivo: benefício dos membros na proporção das suas transacções.
XXX. O A. tinha um horário de trabalho mas, mais uma vez, por si só, não deve ser motivo para qualquer qualificação como contrato de trabalho. O desenvolvimento de uma actividade industrial ou comercial implica a definição de tempos de trabalho a executar pelos diversos intervenientes.
XXXI. Por diversas vezes se aflorou a questão dos instrumentos de trabalho ou as instalações pertencerem à R. e, por esse motivo, indiciar a existência de uma relação laboral. Nada mais falacioso; basta atentar no artigo 3° dos Estatutos da R. para perceber que o A. é também proprietário das máquinas com que trabalhou e dos edifícios onde laborou. Concorre também para esse entendimento a ideia de que Constitucionalmente as Cooperativas, por oposição ao sector público e privado, pertencem ao Sector Cooperativo e Social e os meios de produção são geridos colectivamente (cf. artigo 82° nº 1 a 4 da CRP).
XXXII. Por último, a subordinação jurídica dada como assente pelo Tribunal. O A. participou em diferentes actividades cooperativas conforme Convocatórias e respectivas listas de presenças em que se discutiam aspectos essenciais da vida da Cooperativa: eleições dos órgãos sociais, apreciação e votação do orçamento e plano de 2007, Votação de propostas da Direcção e Comissão Técnica, Alteração da idade de reforma (que a R. paga aos cooperadores), entre outros assuntos. Ao contrário do trabalhador subordinado o Cooperador, tinha o direito a tomar parte na assembleia-geral e apresentar propostas, eleger e ser eleito, entre outros direitos, o que o A. manifestamente fez ou estava no seu poder fazer - cf. art. 33° do Cód. Cooperativo.
XXXIII. Assim, nesta "Livre associação entre iguais" - um membro, um voto - que é a R. na qualidade de Cooperativa e no contexto dos princípios que resultam do enquadramento jurídico-constitucional, inexiste subordinação jurídica.
XXXIV. Concluindo: resulta claro do aqui referido que o A. era membro activo da R. isto é verificava-se a dinâmica do princípio de gestão democrática das cooperativas consagrado no Cód. Cooperativo e que vai contra a ideia de subordinação do típico contrato de trabalho.
XXXV. Concluído o confronto jurídico da noção de contrato de trabalho não pode concluir-se pela natureza laboral da relação entre A. e R. Impõe-se agora que procuremos a sua verdadeira denominação.
XXXVI. A qualificação da relação jurídica entre o Cooperador e a Cooperativa é o elemento-chave destes autos. A sua explanação aparece na doutrina, nomeadamente em Jorge Leite e Rui Namorado que melhor se descrevem no corpo das alegações.
XXXVII. A partir da realidade factual do viver cooperativo da R. podemos definir a relação jurídica entre a Cooperativa e o Cooperador como um negócio jurídico misto, como um acordo de trabalho associado, designação preferida em Espanha, ou como prefere Jorge Leite "acordo de trabalho cooperativo".
XXXVIII. Com o devido respeito por entendimento da douta decisão, no que concerne à decisão da matéria de facto, a primeira preocupação do juiz deve ser a de evitar que a sua apreciação seja feita mais de acordo com a solução jurídica pré-configurada do que com a real prova produzida. O que aqui não sucedeu.
XXXIX. De modo que o Meritíssimo Juiz a quo incorreu em erro de apreciação da prova testemunhal e documental e na subsequente apreciação jurídica das questões em debate uma vez que face à prova dos autos não poderia ter dado como provado a factualidade assente com a letra K. Por outro lado, competia ao tribunal a quo em face da prova produzida dar como assente os quesitos 15,16 e 18.
XL. Deve-o fazer agora o VENERANDO TRIBUNAL nos termos do artigo 712 nº 1 a) e b) e artigo 669º nº 2 a) e b) do CPC.
XLI. Passando à análise da segunda questão central deste recurso, ou seja, se o tribunal de trabalho é competente para julgar a causa.
XLII. Sabendo que competem aos Tribunais de Trabalho conhecer das questões emergentes das relações de trabalho subordinado e se demonstrando de facto e de direito, que a relação jurídica presente nos autos não pode ser qualificada nos termos do artigo 10º e segs do Cód. de Trabalho mas sim como acordo de trabalho cooperativo gera-se a incompetência do Tribunal Trabalho.
XLIII. Neste contexto, é de concluir que se verifica a incompetência absoluta nos presentes autos, motivada pela infracção de regras de competência em razão da matéria implicando, portanto, a absolvição da instância (cf. art. 101º e 105º do CPC).

O A. apresentou a sua contra-alegação, pedindo a confirmação da sentença.
O Exm.º Sr. Procurador-Geral Adjunto, nesta Relação, emitiu douto parecer no sentido de que a apelação não merece provimento.
Recebido o recurso, elaborado o projecto de acórdão e entregues as respectivas cópias aos Exm.ºs Juízes Desembargadores Adjuntos[3], foram colhidos os vistos legais.

Cumpre decidir.

São os seguintes os factos dados como provados pelo Tribunal a quo:

A) A Ré dedica-se à indústria de Construção Civil.
B) O Autor é associado do K…, com o n.º ….. desde 9 de Fevereiro de 1990 (doc. 1).
C) O Autor desempenhava a actividade de acabador.
D) O Autor auferia por mês € 540,00.
E) O Autor remeteu à Ré em 3 de Setembro de 2008 a carta cuja cópia, talão de registo e aviso de recepção foram juntas (docs. 2, 3 e 4) na qual lhe comunica a sua intenção de suspensão do contrato de trabalho com justa causa e com fundamento na falta de pagamento dos salários de Julho e Agosto de 2008 bem como do subsídio de férias, vencido em 1/1/2008.
F) O Autor, na mesma data, remeteu à Inspecção-Geral do Trabalho a carta cuja cópia, talão de registo e aviso de recepção se encontram juntos (docs. 5, 6 e 7) na qual notifica aquela entidade de suspensão do contrato de trabalho que operou com a R.
G) Após o decurso da supracitada suspensão do contrato de trabalho a R. pagou ao A. o mês de Julho de 2008 na quantia de € 540,00.
H) O Autor remeteu à R., em 16 de Dezembro de 2008 a carta cuja cópia, talão de registo e aviso de recepção que se encontram juntas (docs. 8, 9 e 10) na qual lhe comunica a intenção de rescisão do contrato de trabalho com justa causa e com fundamento na falta de pagamento pontual da retribuição, operando-se a referida rescisão na data da carta.
I) A data de início da relação entre Autor e Ré foi 06/06/1983.
J) Para o desempenho da profissão de Acabador, que o Autor sempre deteve ao serviço da Ré.
K) O Autor trabalhou sempre sob a autoridade e direcção efectiva da Ré, com zelo e assiduidade, mediante retribuição mensal que dela auferia em exclusividade, executando as funções inerentes à sua profissão.
L) A Ré não pagou ao Autor o salário do mês de Agosto de 2008 nem na data do seu vencimento nem posteriormente.
M) A Ré não lhe pagou o subsídio de férias vencido em 1/1/2008.
N) A R. não pagou ao A. o subsídio de natal de 2008 e somente lhe pagou metade do valor do subsídio de natal de 2007.
O) A R. não pagou ao A. o salário do mês de Agosto de 2008 e metade do salário de Setembro de 2008, sendo que neste mês o A. apenas trabalhou nove dias.
P) Bem como também lhe não pagou o subsídio de refeição relativo ao citado período de Agosto e Setembro de 2008, no valor de 5,00 € por cada dia de trabalho prestado.
Q) A Ré não pagou ao Autor as férias, o subsídio de férias e o subsídio de Natal todos de 2008 e proporcionais ao tempo de serviço prestado nesse ano.
R) O Autor era cooperador na Ré existindo acordo de trabalho Cooperativo.
S) O Autor ficava obrigado em geral aos deveres de membro previsto nos estatutos e a executar trabalhos cooperativos de que a R. carece para realização do seu objecto social.
T) No mês de Agosto todos os cooperadores estiveram de férias (entre 11 e 29 de Agosto); sendo que o A. faltou um dia – cfr. doc. 6 e 7 - aviso de férias e recibo em falta.
U) Por diversas vezes o A. vivenciou o viver cooperativo.
V) O A. participou em diferentes actividades cooperativas conforme Convocatórias e respectivas listas de presenças Doc. 8, 9, 10, 11, 12, 13.
X) Assembleias essas onde se discutiram aspectos essenciais da vida da R.
Z) Eleições dos órgãos sociais.
AA) Apreciação e votação do orçamento e plano de 2007.
AB) Votação de propostas da Direcção e Comissão Técnica.
AC) Alteração da idade de reforma (que a R. paga aos cooperadores), entre outros assuntos.
Por terem interesse para a decisão e não terem sido impugnados, consideram-se provados os seguintes factos:
AD) Datado de 2004-09-17, a R. emitiu o Título de Capital, no montante de € 15,00, figurando o A. como subscritor – cfr. doc. de fls. 43, cujo teor aqui se reproduz.
AE) Os Estatutos da R. foram juntos a fls. 44 a 54, cujo teor aqui se reproduz.

O Direito.
Sendo pelas conclusões do recurso que se delimita o respectivo objecto[4], como decorre do disposto nos Art.ºs 684.º, n.º 3 e 685.º-A, n.º 1, ambos do Cód. Proc. Civil, na redacção que lhe foi dada pelo diploma referido na nota(3), ex vi do disposto no Art.º 87.º, n.º 1 do Cód. Proc. do Trabalho de 2000, salvo tratando-se de matérias de conhecimento oficioso de que o Tribunal ad quem pode conhecer por sua iniciativa, são as seguintes as questões a decidir nesta apelação:
I – Questão prévia: espécie de recurso.
II – Alteração da matéria de facto.
III – Qualificação da relação existente entre as partes e
IV – Competência do Tribunal do Trabalho em razão da matéria.

A 1.ª questão.
Trata-se de saber se é de agravo o recurso interposto, como a R., ora recorrente, afirma na 1.ª conclusão.
A reforma dos recursos em processo civil, empreendida pelo Decreto-Lei n.º 303/2007, de 24 de Agosto, tendo posto fim à espécie agravo, não revogou as pertinentes disposições do Cód. Proc. do Trabalho de 2000, aqui aplicável uma vez que a presente acção foi intentada em 2009-09-22, pelo que neste continuou a existir o sistema dualista de recursos, nomeadamente apelação/agravo, isto é, a reforma manteve incólume todo o direito processual do trabalho, maxime, o respeitante aos recursos.
Na verdade, depois do PROJECTO QUE ACOMPANHOU A PROPOSTA DE LEI DE AUTORIZAÇÃO ter ignorado a existência do CPT, a PROPOSTA DE DECRETO-LEI AUTORIZADO SUBMETIDO A AUDIÇÕES PÚBLICAS contemplava no seu Art.º 4.º alterações ao Cód. Proc. do Trabalho de 2000, operando neste domínio o que se passava no Cód. Proc. Civil, ou seja, propondo a extinção da espécie de recurso agravo, também na jurisdição laboral.[5]
Inexplicavelmente, porém, foi com surpresa que se constatou que a reforma dos recursos em processo civil, empreendida pelo Decreto-Lei n.º 303/2007, de 24 de Agosto, nenhuma alteração introduziu no CPT de 2000, nomeadamente, em matéria de recursos, pelo que deveremos concluir que o sistema dualista apelação/agravo se manteve durante 2009 na jurisdição laboral, sendo-lhe aplicável as disposições próprias previstas no CPT e, nos casos omissos, as disposições do CPC compatíveis com a índole do processo laboral ou, sendo caso disso, as disposições do CPT que regulam outras situações e que sejam aplicáveis analogicamente.[6]
Daí que, in casu, tratando-se de uma acção de processo comum que terminou por sentença, que conheceu do mérito da causa, seja aplicável o recurso de apelação, atento o disposto no Art.º 691.º, n.º 1 do CPC, na sua redacção anterior.
Improcede, assim, a primeira conclusão do recurso.

A 2.ª questão.
Trata-se de saber se deve ser alterada a matéria de facto.
Na verdade, a R., ora apelante, discorda da resposta dada aos quesitos 3, 15, 16 e 18, como se vê das conclusões V a XVI do recurso.
Ora, dispõe o Art.º 685.º-B[7], n.ºs 1 e 2 do Cód. Proc. Civil, o seguinte:
1 — Quando se impugne a decisão proferida sobre a matéria de facto, deve o recorrente obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição:
a) Os concretos pontos de facto que considera incorrectamente julgados;
b) Os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida.
2 — No caso previsto na alínea b) do número anterior, quando os meios probatórios invocados como fundamento do erro na apreciação das provas tenham sido gravados e seja possível a identificação precisa e separada dos depoimentos, nos termos do disposto no n.º 2 do artigo 522.º-C, incumbe ao recorrente, sob pena de imediata rejeição do recurso no que se refere à impugnação da matéria de facto, indicar com exactidão as passagens da gravação em que se funda, sem prejuízo da possibilidade de, por sua iniciativa, proceder à respectiva transcrição.[8]
Por sua vez, estabelece o n.º 2 do Art.º 522.º-C do mesmo diploma, o seguinte:
Quando haja lugar a registo áudio ou vídeo, devem ser assinalados na acta o início e o termo da gravação de cada depoimento, informação ou esclarecimento, de forma a ser possível uma identificação precisa e separada dos mesmos.[9]
In casu, a R., ora apelante, discorda da resposta dada aos quesitos 3, 15, 16 e 18 e indicou o sentido da alteração pretendida.
Indicou os meios de prova que impõem decisão diversa, que são as testemunhas por si arroladas, H…, I…, J… e G…, bem como os documentos 1 a 3, juntos com a contestação.
Por outro lado, tendo havido gravação da prova testemunhal em CD e fundando-se nela o recurso de impugnação da decisão da matéria de facto, deveria a R. ter indicado, para além dos nomes das testemunhas, como o fez, os passos da gravação com menção dos respectivos início e fim, donde constem os depoimentos que devam conduzir a diferente decisão daquela que foi proferida no respectivo despacho. Tal é possível uma vez que ao ouvir o depoimento é sempre exibido no monitor do computador o momento temporal do registo áudio, feito no CD, com menção da hora, minuto e segundo.
No entanto, tendo a apelante feito transcrever, em anexo à alegação, como se vê de fls. 164 a 176, os excertos dos depoimentos prestados em audiência, em que se baseia, com menção do minuto e segundo, devemos considerar cumprido o ónus em causa, atento o disposto no n.º 2, in fine, do Art.º 685.º-B do Cód. Proc. Civil.
O acabado de expor significa que, apesar de tudo, deveremos conhecer o recurso acerca da decisão proferida sobre a matéria de facto.
Ora, a Relação pode alterar a matéria de facto, nos termos do disposto no Art.º 712.º, n.ºs 1 e 2 do Cód. Proc. Civil.
Importa, no entanto, que o faça com a parcimónia devida.
Na verdade, o contacto directo com os depoentes em audiência permite colher impressões do comportamento de cada um deles que habilitam o Juiz a concluir pela veracidade ou não dos respectivos depoimentos, o que é impossível de transmitir através da reprodução dos registos sonoros. E, mesmo relativamente ao registo vídeo, a sua reprodução não possibilita a interacção da pergunta-resposta, típica do diálogo da audiência, ficando os Juízes numa posição passiva ou estática, tendo de se conformar com o material que lhes é dado, pois não podem pedir esclarecimentos, por exemplo. De qualquer forma, sendo os nossos registos apenas sonoros, a sua falibilidade é muito maior.
É por isso que se tem entendido que o Tribunal da Relação só deve alterar a matéria de facto nos casos de manifesta e clamorosa desconformidade dos factos assentes com os meios de prova disponibilizados nos autos, dando assim prevalência ao princípio da oralidade, da prova livre e da imediação[10].
In casu, a R., ora apelante, discorda da resposta dada aos quesitos 3, 15, 16 e 18 e indicou também o sentido das alterações pretendidas, pois entende que o quesito 3 deveria ter tido resposta negativa e os restantes resposta positiva.
Tais quesitos têm a seguinte redacção:
3
O Autor trabalhou sempre sob a autoridade e direcção efectiva da Ré, com zelo e assiduidade, mediante retribuição mensal que dela auferia em exclusividade, executando as funções inerentes á sua profissão?
15
Mais do que exercer a sua função o A. era chamado a participar na dinâmica C…?
16
No acordo de trabalho cooperativo não existe qualquer obrigação de pagar uma remuneração mas sim a, de acordo com os Estatutos da R. e a legislação cooperativa, um levantamento mensal de € 540?
18
O A. entrou para a R. no dia 6 de Janeiro de 1986 após um período de experiência legalmente admissível (máximo de 3 anos) que se iniciou em Junho de 1983?
Estes três últimos quesitos receberam respostas de “Não provado” e o quesito 3 mereceu a resposta constante do facto assente sob a alínea K), na sentença, do seguinte teor:
“K) O Autor trabalhou sempre sob a autoridade e direcção efectiva da Ré, com zelo e assiduidade, mediante retribuição mensal que dela auferia em exclusividade, executando as funções inerentes à sua profissão.".
A R., ora apelante, indicou os meios de prova que, em seu entender, impõem decisão diversa, que são as testemunhas por si arroladas, H…, I…, J… e G…, bem como os documentos 1 a 3, juntos com a contestação.
Já o Tribunal a quo respondeu aos quesitos com base nos depoimentos das testemunhas arroladas pelo A. que considerou credíveis.
Procedemos à audição atenta de todos os depoimentos gravados, que constam de CD e não apenas das testemunhas indicadas no recurso e concluímos que as respostas dadas aos quesitos estão genericamente suportadas pelo depoimento das testemunhas arroladas pelo A., pelo que serão de aceitar, não se suscitando quaisquer irregularidades. Na verdade, tendo o Tribunal a quo firmado convicção com base no depoimento das testemunhas arroladas pelo A., não julgou contra a prova ou sem prova, pelo que a sua decisão deverá, em princípio, ser confirmada.
Tal não ocorre, no entanto, com a resposta dada ao quesito 18, pois todas as testemunhas referiram que o A. era sócio da R., que todos “tinham de ser”, que a maioria era sócio, que as testemunhas do A. E… e F… tendo começado a desenvolver a sua actividade para a R., acabaram por se inscrever como sócios e subscrever capital e até a testemunha D…, que não era sócio, afirmou que era considerado, como os restantes não sócios, como “sócios auxiliares”, tendo chegado a receber “excedente” em certo ano que não precisou.
Por outro lado, tal quesito teve por fonte o facto alegado no artigo 43 da contestação, que termina com a referência “vd. DOC. 1.”, sendo certo que se trata do documento junto a fls. 42. Vendo a resposta à contestação, verificamos que tal documento não foi impugnado, o mesmo acontecendo com o de fls. 43, “Título de capital de € 15,00”, antes se encontram aceites enquanto tais, apesar de o A. lhes atribuir um significado de acordo com a sua tese de que o A. tinha com a R. um contrato de trabalho apenas ou, subsidiariamente, um contrato de trabalho ao par de uma relação cooperativa, em simultâneo. Seja como for, tais documentos não foram impugnados e do primeiro se vê que o A. foi admitido como sócio da R. em 1986-01-06, tendo o número 2802, onde constam os restantes elementos de identificação, para além da fotografia. Tal documento, tendo sido apresentado pela R. contra o A., que não o impugnou, o seu conteúdo tem de ser considerado como verdadeiro, atento o disposto nos art.ºs 374.º, n.º 1 e 376.º, n.º 1 do Cód. Civil, em consonância aliás com a prova pessoal produzida, pois todos, ainda que a diferentes níveis e com cargas intencionais diferenciadas, afirmaram ou admitiram que o A. era sócio da R. Daí que, a nosso ver, o quesito não deva receber resposta de “Não provado”, mas uma resposta positiva, ainda que restritiva, que dê como provada a inscrição do A. como sócio da R., com a seguinte redacção:
18
Provado apenas que o A. foi admitido como sócio da R. no dia 6 de Janeiro de 1986 – cfr. doc. de fls. 42.
Já quanto à resposta dada ao quesito 3, constante da alínea k), deverá ela, em princípio, ser mantida, no que à convicção formada pelo Tribunal a quo diz respeito. No entanto, ela deverá ser modificada, por envolver vários juízos conclusivos, do que deve ser extirpada, atento o disposto no Art.º 646.º, n.º 4 do Cód. Proc. Civil.
Mais grave do que isso é a utilização da expressão “O Autor trabalhou sempre sob a autoridade e direcção efectiva da Ré", pois a manter-se tal redacção, estaria resolvida a sorte da acção, uma vez que o contrato dos autos seria de trabalho, o que acarretaria a improcedência da excepção de incompetência do Tribunal em razão da matéria e, certamente, a procedência do pedido. Diga-se desde já que a matéria assente sob a alínea R), em que se dá como provado que “O Autor era cooperador na Ré existindo acordo de trabalho cooperativo”, também não poderá subsistir, pelas mesmas razões - para além da contradição - pois, de contrário, estaria resolvida a sorte da acção, pois a relação jurídica das partes traduziria uma acordo de trabalho cooperativo, o que acarretaria a procedência da excepção de incompetência do Tribunal em razão da matéria, com a consequente absolvição da R. da instância.
Assim, a alínea K) ficará com a seguinte redacção:
“O A. exerceu actividade para a R., mediante o pagamento de uma quantia mensal, executando as funções inerentes à sua profissão”.
Por outro lado, como anunciado anteriormente, por ser matéria de direito ou ter natureza conclusiva e em cumprimento do disposto no Art.º 646.º, n.º 4 do Cód. Proc. Civil, elimina-se da lista dos factos provados, constante da sentença, as seguintes alíneas:
R) O Autor era cooperador na Ré existindo acordo de trabalho Cooperativo.
S) O Autor ficava obrigado em geral aos deveres de membro previsto nos estatutos e a executar trabalhos cooperativos de que a R. carece para realização do seu objecto social.
U) Por diversas vezes o A. vivenciou o viver cooperativo.
Em síntese, mantém-se as respostas de “Não provado” dadas aos quesitos 15 e 16, altera-se a resposta dada ao quesito 18 para
Provado apenas que o A. foi admitido como sócio da R. no dia 6 de Janeiro de 1986 – cfr. doc. de fls. 42.,
altera-se a redacção dada à alínea k) para
O A. exerceu actividade para a R., mediante o pagamento de uma quantia mensal, executando as funções inerentes à sua profissão”.
e elimina-se as alíneas R), S), U).
Procedem, destarte, parcialmente as conclusões V a XVI da apelação.

A 3.ª questão.
Trata-se de saber como qualificar a relação existente entre as partes.
Na verdade, o A. entende que está e sempre esteve ligado à R. por um típico contrato de trabalho, enquanto a R. entende que a relação se deve qualificar como acordo de trabalho cooperativo.
Vejamos.
“Contrato de trabalho é aquele pelo qual um pessoa se obriga, mediante retribuição, a prestar a sua actividade a outra ou outras pessoas, sob a autoridade e direcção destas” – assim dispõe o Art.º 10.º do Código de Trabalho, aplicável in casu porque, tendo entrado em vigor em 2003-12-01, como resulta do disposto no Art.º 3.º, n.º 1 da Lei n.º 99/2003, de 27 de Agosto, o contrato dos autos – na versão do A. – teria cessado em 2008-12-17, corforme facto assente sob a alínea H) da respectiva lista e doc. 1, junto com a petição inicial, pois o Cód. do Trabalho de 2009 apenas entrou em vigor, para a generalidade das matérias, em 2009-02-17.
Em sentido muito próximo, já anteriormente dispunha o Art.º 1.º do regime jurídico do contrato individual do trabalho, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 49 408, de 24 de Novembro de 1969 e o Art.º 1152.º do Cód. Civil que ”Contrato de trabalho é aquele pelo qual um pessoa se obriga, mediante retribuição, a prestar a sua actividade intelectual ou manual a outra pessoa, sob a autoridade e direcção desta”.
Tem-se entendido que o contrato de trabalho é caracterizado essencialmente pelos elementos subordinação económica e subordinação jurídica; no entanto, como a generalidade dos contratos são remunerados, insiste-se que o verdadeiro critério distintivo consiste na subordinação jurídica, em termos tais que se se provar tal elemento, fica definida sem mais a qualificação do contrato como de trabalho.
Acontece que o contrato de trabalho é celebrado, do lado do empregador, por entidades que se inserem no sector privado, quando a R. integra o sector cooperativo.
De acordo com o disposto no Art.º 82.º da Constituição da República Portuguesa, de ora em diante designada apenas por CRP, coexistem entre nós três sectores de propriedade dos meios de produção, a saber: público, privado e cooperativo, como se vê do consignado nos n.ºs 2, 3 e 4 do mesmo artigo.
Ao par da iniciativa pública e privada, existe a iniciativa cooperativa, no âmbito da qual a CRP reconhece, no seu Art.º 61.º, o direito à livre constituição de cooperativas, desde que observados os princípios cooperativos[11], bem como o direito destas a desenvolverem livremente as suas actividades no quadro da lei.
Daí a criação de um Código Cooperativo, de ora em diante designado apenas por Cód. Coop., para reger o sector, o que foi levado a cabo pelo Decreto-Lei n.º 454/80, de 9 de Outubro, actualmente substituído pela Lei n.º 51/96, de 7 de Setembro, cujo Art.º 2.º dispõe:
“1 – As cooperativas são pessoas colectivas autónomas, de livre constituição, de capital e composição variáveis, que, através da cooperação e entreajuda dos seus membros, com obediência aos princípios cooperativos, visam, sem fins lucrativos, a satisfação das necessidades e aspirações económicas, sociais ou culturais daqueles.
2 – As cooperativas, na prossecução dos seus objectivos, podem realizar operações com terceiros, sem prejuízo de eventuais limites fixados pelas leis próprias de cada ramo.”
Por outro lado, o sector cooperativo divide-se em vários ramos, sendo um deles o da “produção operária”, como prevê o Art.º 4.º, n.º 1, alínea f) do mesmo Cód. Coop., ramo a que pertence a R., como à frente melhor se explicitará.
Por seu turno, as cooperativas do ramo da produção operária têm como legislação complementar o Decreto-Lei n.º 309/81, de 16 de Novembro, cujo Art.º 2.º, n.º 1 dispõe:
“São cooperativas de produção as que tenham por objecto principal a extracção, bem como a produção e a transformação, de bens no sector industrial”.[12]
Ora, qualquer profissional das actividades desenvolvidas por uma cooperativa de produção pode ser sócio, apresentando uma proposta, subscrevendo 3 títulos de capital e pagando uma jóia, pode eleger e ser eleito para os órgãos da direcção, assembleia geral ou conselho fiscal, desenvolve a sua actividade ao serviço da cooperativa, recebe uma quantia mensal e pode receber no fim do ano económico os designados excedentes, como resulta dos Art.ºs 25.º, 31.º, 33.º, 51.º e 73.º do Cód. Coop., dos Art.ºs 5.º e 7.º a 9.º do Decreto-Lei n.º 309/81, de 16 de Novembro e dos Art.ºs 6.º, 10.º, 11.º e 13.º dos Estatutos.
No entanto, não sendo sócio, também pode desenvolver a sua actividade profissional para a C…, mas como trabalhador subordinado dela e, neste caso, são considerados terceiros, não tendo os direitos atribuídos aos sócios, maxime, o direito à distribuição de excedentes, sendo certo que aqueles que forem por eles gerados não podem ser distribuídos, inclusive, entre os sócios, como estabelecem os Art.ºs 2.º, n.º 2, 72.º e 73.º, n.º 1 do Cód. Coop. e os Art.ºs 6.º e 9.º, n.º 2 do Decreto-Lei n.º 309/81, de 16 de Novembro.
Por outro lado, nas cooperativas de produção, pelo menos ¾ dos trabalhadores têm de ser sócios, como dispõe o Art.º 8.º, n.º 3 do Decreto-Lei n.º 309/81, de 16 de Novembro, sob pena de não ter direito a isenção de IRC nos termos do Art.º 13.º, n.º 2 da Lei n.º 85/98, de 16 de Dezembro, que criou o Estatuto Fiscal Cooperativo (EFC).
Acresce que os sócios podem demitir-se da cooperativa, como podem dela ser excluídos por deliberação da Assembleia Geral, precedida de um processo escrito válido, sendo a deliberação recorrível para os tribunais, como estatui o disposto nos Art.ºs 36.º e 37.º do Cód. Coop. e nos Art.ºs 15.º a 18.º dos Estatutos.
Do exposto decorre que as cooperativas, inserindo-se num sector próprio, distinto do público e do privado, são pessoas colectivas distintas das associações, fundações e sociedades, apresentam um substracto pessoal e de capital, com composição variável, estrutura e funcionamento de acordo com os princípios cooperativos, visam satisfazer as necessidades dos seus associados e não têm fins lucrativos, para além do mais.
As cooperativas de produção têm a indústria por objecto e visam, tal como acontece com a R., dar trabalho aos seus sócios, através da construçao de edifícios para venda.
A estrutura pessoal destas cooperativas assenta predominantemente em trabalhadores-sócios, podendo ter trabalhadores não cooperadores.
Ora a circunstância de prestarem a sua actividade ao par, tal não significa identidade de estatuto jurídico. Na verdade, enquanto o contrato de trabalho se caracteriza pelos elementos da subordinação jurídica e económica, a actividade desenvolvida pelos trabalhadores-sócios assenta numa relação de cooperação. Pois, apesar de o trabalhador não sócio e o trabalhador sócio executarem a mesma actividade e serem dirigidos pelas mesmas pessoas físicas, estas intervêm em qualidades jurídicas diferentes, para o primeiro como empregador e para o segundo como o cooperador que tem funções de distribuição de trabalho. Daí que o primeiro possa ser perseguido disciplinarmente pela prática de uma infracção e o segundo possa, perante o incumprimento de deveres cooperativos, ser objecto de um processo escrito e de uma deliberação de exclusão da Assembleia Geral. Isto apesar de facticamente ambos os trabalhadores terem praticado a mesma infracção e de ela ter sido apreciada em prévio processo escrito, só que ali ele tem natureza disciplinar e aqui social. Dai que o trabalhador sócio não possa resolver o vínculo, mas demitir-se e não possa ser despedido, mas excluído.
Por outro lado, a circunstância de ambos receberem mensalmente uma importância, tal também não significa identidade de estatuto, ainda que a quantia seja de igual montante. Na verdade, para o trabalhador não sócio tal quantia é retribuição, contrapartida do trabalho prestado e para o sócio é uma parte do rendimento anual da cooperativa, que é antecipada previsionalmente e que será contabilizada no final do ano económico, podendo haver excedentes para distribuir entre os sócios, ou perdas a suportar pelos mesmos. Por isso e a este nível, no primeiro caso o risco da actividade corre por conta do empregador cooperativa [havendo excedentes, não podem ser distribuídos, sendo remetidos para um fundo de reserva] e no segundo corre por conta dos trabalhadores sócios.
Assim, a relação jurídica que intercede entre o não sócio e a cooperativa é qualificável como contrato de trabalho, enquanto a que intercede entre o sócio e a cooperativa tem sido qualificada como “acordo de trabalho associado”, “acordo de cooperação laboral” ou “acordo de trabalho cooperativo”, sendo seu elemento essencial, que o permite distinguir de qualquer outro negócio jurídico, a prestação de trabalho cooperativo que, nas cooperativas de produção, traduz o designado “acto cooperativo”.[14]
Nem se diga que a R. a todos pagando quantias a título de ordenado, subsídio de refeição, subsídio de férias e subsídio de Natal, adoptou a terminologia típica do contrato de trabalho, pelo que assim deve ser qualificada a relação que o A. teve com a R. Na verdade, tais elementos são meramente acessórios face às características - essenciais - do acto cooperativo, que substitui a subordinação por cooperação e a alienidade do produto da actividade pela sua manutenção naqueles que associadamente a realizaram. Aliás, o uso da nomenclatura habitualmente utilizada noutros domínios, revela as dificuldades da cooperatividade em criar e adoptar nomencatura própria como, por exemplo, levantamento ou adiantamento, em vez de salário ou de retribuição, ou excedente em vez de lucro ou retribuição pois, apesar do paralelismo em muitas situações fácticas, persiste a natureza própria que lhe advem da essência do acto cooperativo. De resto, a autonomização do direito cooperativo do direito comercial só ocorre com a aprovação do Cód. Coop., aprovado pela Lei n.º 51/96, de 7 de Setembro, em cujo Art.º 9.º se estabeleceu como direito subsidiário o Código das Sociedades Comerciais.
Nem se diga também que o A., tendo iniciado a sua actividade na R. em 1983 e tendo sido inscrito como sócio em 1986, adquiriu a qualidade de trabalhador subordinado, que mantém. Tanto os estatutos como o Decreto-Lei n.º 309/81, de 16 de Novembro, exigem ou aceitam um período de actividade antes da admissão como sócio da R., nos seus Art.ºs, respectivamente, 12.º e 8.º. Tal não significa que o sócio, depois de admitido como tal, não passe a estar vinculado à cooperativa por meio de acordo de trabalho cooperativo. Aliás, entendemos que nas cooperativas de produção o sócio trabalhador não tem um duplo estatuto: trabalhador subordinado, por um lado, e sócio ou cooperador, por outro. Como decorre de tudo o que se expôs anteriormente, o sócio trabalhador, ao desenvolver a sua actividade na C..., pratica actos cooperativos, efectua a sua prestação de trabalho cooperativo, que não tem natureza privada nem pública [contrato de trabalho], mas cooperativa, pelo que goza de um estatuto único, de sócio trabalhador, o qual engloba todo o leque de direitos e deveres económicos, sociais e outros.[15],[16]
Vejamos agora o caso concreto.
Dos factos provados resulta que o A. se increveu na R., realizou o capital necessário e prestou actividade na R., pelo que é seu sócio trabalhador desde 1986. Participou em assembleia gerais onde se debateu o direito à reforma privativa dos sócios da R., entre outros temas. Recebia uma quantia mensal que, face ao direito aplicável, tem de ser considerada como levantamento por conta do produto anual da R. Ora, sendo sócio da R., que é uma cooperativa de produção, dado o seu objecto, que é a indústria de construção civil, como vem provado sob a alínea A) e prestando o seu trabalho à R. como acabador, como vem provado sob a alínea C), a conclusão a extrair é que a relação jurídica que vincula as partes é qualificável como acordo de trabalho cooperativo.
Procedem, destarte, as conclusões XVII a XL da apelação.

A 4.ª questão.
Trata-se de saber se o Tribunal do Trabalho é competente em razão da matéria para julgar a causa.
A R. entende que o Tribunal do Trabalho não é competente para julgar a causa, como refere nas conclusões XLI a XLIII. Vejamos.
A Lei n.º 3/99, de 13 de Janeiro, alterada e republicada pela Lei n.º 105/2003, de 10 de Dezembro, prescreve no seu Art.º 85.º, alínea b) que “Compete aos tribunais do trabalho conhecer, em matéria cível, das questões emergentes de relações de trabalho subordinado…”
Ora, estando o A. vinculado à R. por um acordo de trabalho cooperativo, como se decidiu na questão anterior, o Tribunal do Trabalho é incompetente, em razão da matéria, para conhecer o litígio dos autos.
Verifica-se, assim, uma excepção dilatória, conducente à absolvição da R. da instância, atento o disposto nos Art.ºs 101.º, 105.º, n.º 1, 288.º, n.º 1, alínea a), 493.º, n.ºs 1 e 2 e 494.º, alínea a) do Cód. Proc. Civil.
Tal determina a procedência das conclusões XLI a XLIII do recurso.

Decisão.
Termos em que se acorda em conceder provimento à apelação, assim revogando a sentença, que se substitui pelo presente acórdão em que se julga procedente a excepção dilatória da incompetência do Tribunal do Trabalho, em razão da matéria e se absolve a R. da instância.
Custas pelo A., sem prejuízo do que se encontrar decidido em sede de protecção jurídica.

Porto, 2011-09-19
Manuel Joaquim Ferreira da Costa
António José Fernandes Isidoro
Paula Alexandra Pinheiro Gaspar Leal Sotto Mayor de Carvalho
_________________
[1] Abreviatura de Base Instrutória.
[2] Abreviatura de Matéria Assente.
[3] Atento o disposto no Art.º 707.º, n.º 2 do CPC, na redacção que lhe foi dada pelo Decreto-Lei n.º 303/2007, de 24 de Agosto, ex vi do disposto nos Art.ºs 11.º, n.º 1 – a contrario sensu – e 12.º, n.º 1, ambos deste diploma.
[4] Cfr. Alberto dos Reis, in Código de Processo Civil Anotado, volume V, reimpressão, 1981, págs. 308 a 310 e os Acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 1986-07-25 e de 1986-10-14, in Boletim do Ministério da Justiça, respectivamente, n.º 359, págs. 522 a 531 e n.º 360, págs. 526 a 532.
[5] Cfr. REFORMA DOS RECURSOS EM PROCESSO CIVIL. TRABALHOS PREPARATÓRIOS, DGPJ, Ministério da Justiça, Almedina, 2008, págs., respectivamente, 269 e segs. e 371 e segs., nomeadamente, 414 a 416.
[6] Cfr. António Santos Abrantes Geraldes, in A REFORMA DOS RECURSOS INTRODUZIDA PELO DEC. LEI Nº 303/07 E OS SEUS REFLEXOS NO CÓDIGO DE PROCESSO DO TRABALHO, intervenção efectuada no Centro de Estudos Judiciários, no dia 2008-04-03, no âmbito da acção de formação “Questões Práticas sobre o Processo Laboral” e João Palla Lizardo, in O PROCESSO LABORAL FACE À “NOVÍSSIMA REFORMA” DO PROCESSO CIVIL, ambos in Prontuário de Direito do Trabalho, n.º 74/75, CEJ, respectivamente, págs. 159 a 184 e 185 a 194, Albino Mendes Baptista, in A Reforma dos Recursos e o Processo do Trabalho, Revista do Ministério Público, n.º 113, págs. 47 a 62 e in Temas de Direito do Trabalho e de Direito Processual do Trabalho, 2008, págs. 251 a 267 e, genericamente, Fernando Amâncio Ferreira, in Manual dos Recursos em Processo Civil, 8.ª edição, 2008.
[7] Nova numeração do artigo – anterior 690.º-A – introduzida pelo diploma referido na nota (1) e aplicável in casu.
[8] Era a seguinte a anterior redacção:
1. Quando se impugne a decisão proferida sobre a matéria de facto, deve o recorrente obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição:
a) Quais os concretos pontos de facto que considera incorrectamente julgados;
b) Quais os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida.
2 - No caso previsto na alínea b) do número anterior, quando os meios probatórios invocados como fundamento do erro na apreciação das provas tenham sido gravados, incumbe ainda ao recorrente, sob pena de rejeição do recurso, indicar os depoimentos em que se funda, por referência ao assinalado na acta, nos termos do disposto no n.º 2 do artigo 522.º-C.
[9] Era a seguinte a anterior redacção:
2 - Quando haja lugar a registo áudio ou vídeo, deve ser assinalado na acta o início e o termo da gravação de cada depoimento, informação ou esclarecimento.
[10] Cfr. António Santos Abrantes Geraldes, in TEMAS DA REFORMA DO PROCESSO CIVIL, II VOLUME, 4.ª EDIÇÃO, 2004, págs. 266 e 267 e o Acórdão da Relação do Porto, de 2003-01-09, in www.dgsi.pt, JTRP00035485 e o Acórdão da Relação de Lisboa, de 2001-03-27, in Colectânea de Jurisprudência, Ano XXVI-2001, Tomo II, págs. 86 a 88.
[11] A CRP não diz quais são, ao contrário do Cód. Coop. em cujo Art.º 3.º os enuncia e define:
1.º princípio – Adesão voluntária e livre.
2.º princípio – Gestão democrática pelos membros.
3.º principio – Participação económica dos membros.
4.º princípio – Autonomia e independência.
5.º princípio – Educação, formação e informação.
6.º princípio – Intercooperação e
7.º princípio – Interesse pela comunidade.
[12] A cooperativa de produção “…é uma associação de trabalhadores que produzem em comum, vendem em comum o que produzem … e distribuem entre si os lucros da sua empresa.”, na definição de António Sérgio, in O Cooperativismo Objectivos e Modalidades, Introdução: Quadro Geral do Cooperativismo e do Sector Cooperativo, Lisboa, s/data, pág. VIII.
[13] Cfr. Jorge Leite, in Relação de Trabalho Cooperativo, Questões Laborais, Ano I, N.º 2, 1994, maxime, pág. 103.
[14] “São actos cooperativos os realizados entre as cooperativas e os seus sócios… Os vínculos das cooperativas com os seus trabalhadores dependentes regem-se pela legislação laboral.”, como refere José Maria Montolío (1990), in Legislacion Cooperativa en América Latina, Madrid, Ministério del Trabajo y Seguridad Social, citado por Rui Namorado in Cooperatividade e Direito Cooperativo, Estudos e Pareceres, Almedina, 2005, pág. 98.
[15] Cfr. o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 1980-06-06, in Boletim do Ministério da Justiça, n.º 298, págs. 156 a 168 e o Acórdão da Relação de Lisboa de 1991-06-12, in Colectânea de Jurisprudência, Ano XVI-1991, Tomo III, págs. 218 a 220.
[16] Cfr. Jorge Leite, cit., págs. 89 e ss., Rui Namorado, cit., págs. 95 e ss. e 139 e ss., in Horizonte Cooperativo, Almedina, 2001, págs. 43 a 45 e in Introdução ao Direito Cooperativo, Almedina, 2000, págs. 181 e ss. e 308 e ss. e Vasco de Carvalho, in O Cooperativismo Objectivos e Modalidades, Cooperativas de Produção Industrial, Lisboa, s/data, págs. 139 a 149.
_____________________
S U M Á R I O
I – Dentro dos três sectores de propriedade dos meios de produção, as cooperativas inserem-se no sector cooperativo, como dispõe o Art.º 82.º da Constituição da República, sendo um dos seus ramos o da “Produção operária”.
II – As cooperativas de produção operária, visando garantir trabalho aos seus sócios, estabelecem com estes acordos de trabalho cooperativo, figura distinta do contrato de trabalho, pois este pressupõe a subordinação jurídica e aquele a cooperação.
III – Tendo o sócio trabalhador proposto uma acção emergente de contrato de trabalho contra a cooperativa, o Tribunal o Trabalho é incompetente em razão da matéria para conhecer o litígio existente ente as partes, o que traduz uma excepção dilatória, conducente à absolvição da R. da instância, atento o disposto nos Art.ºs 101.º, 105.º, n.º 1, 288.º, n.º 1, alínea a), 493.º, n.ºs 1 e 2 e 494.º, alínea a) do Cód. Proc. Civil.

Manuel Joaquim Ferreira da Costa