Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
0831308
Nº Convencional: JTRP00041474
Relator: AMARAL FERREIRA
Descritores: EXECUÇÃO
OPOSIÇÃO À EXECUÇÃO
FACTO EXTINTIVO
Nº do Documento: RP200805290831308
Data do Acordão: 05/29/2008
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: AGRAVO.
Decisão: NEGADO PROVIMENTO.
Indicações Eventuais: LIVRO 760 - FLS 158.
Área Temática: .
Sumário: Para que exista o fundamento de oposição à execução de sentença previsto na al. g) do art. 814º do CPC é necessário e imprescindível que o facto extintivo ou modificativo tenha existência no momento em que é invocado, não podendo estar dependente de um evento futuro e incerto.
Reclamações:
Decisão Texto Integral: TRPorto.
Rec. Agravo nº 1308.08.
Relator: Amaral Ferreira (382).
Adj.: Des. Manuel Capelo.
Adj.: Des. Ana Paula Lobo.

Acordam no Tribunal da Relação do Porto:

I – RELATÓRIO.

1. Por apenso à execução comum, para pagamento de quantia certa, contra ele instaurada em 13/3/2006 nos Juízos de Execução do Porto, por B………. e C………., em que o título executivo é o acórdão deste Tribunal no âmbito do recurso de apelação interposto da sentença proferida na acção ordinária que, com o nº …/2000, correu termos na .ª Secção da .ª Vara Cível do Porto, em que são AA. os ora exequentes e R. o ora executado, ainda não transitado em julgado, deduziu o executado D………. oposição à execução, alegando, em síntese, que visando os exequentes obter o pagamento da indemnização que foi condenado a pagar-lhes, à razão de 1.054,97 € mensais, desde 18 de Janeiro de 1995, até à restituição do armazém que vem utilizando, e tendo, na execução, sido penhorados diversos bens que garantem o pagamento da quantia exequenda, certo é que a decisão exequenda ainda não transitou em julgado, por ter arguido a nulidade do acórdão proferido pelo STJ e que, supervenientemente, à audiência de discussão e julgamento na acção em que foi proferida a decisão dada à execução, propôs contra os exequentes e E………. acção declarativa, que, com o nº …./06.9TVPRT, corre termos na .ª Secção da .ª Vara Cível do Porto, em que pede a declaração de nulidade do contrato de compra e venda que está na base da indemnização que constitui a quantia exequenda, de cuja petição junta cópia, pelo que, independentemente da decisão que venha a ser proferida sobre a nulidade que arguiu do acórdão do STJ, subsistirá sempre a questão mencionada nessa acção e, caso a execução prossiga, com a venda dos bens penhorados, nomeadamente a raiz da propriedade do armazém penhorado, a sentença que nela vier a ser proferida fica destituída de qualquer efeito prático, não mais podendo concretizar o seu direito de usar e fruir o armazém, além da morte do usufrutuário inicial, pelo que deve ser suspensa a instância executiva nos termos do artº 279º, nº 1, do Código de Processo Civil, até porque, não tendo havido citação prévia, o simples recebimento da oposição suspende o processo de execução.
Conclui pelo recebimento da execução e pela suspensão da instância executiva até que seja proferida decisão na referida acção nº …./06.9TVPRT.

2. Conclusos os autos, foi proferido despacho a indeferir liminarmente a oposição deduzida, por se ter considerado que os fundamentos invocados não se ajustavam ao disposto no artº 814º do Código de Processo Civil.

3. Dele discordando, agravou o oponente que, nas respectivas alegações, formulou as seguintes conclusões:
1ª: Não se verificam motivos para indeferir liminarmente a oposição à execução.
2ª: Assim é porque o recorrente invocou factos extintivos e modificativos da obrigação exequenda posteriores à discussão no processo de declaração, os quais se provam, como provou, por documentos.
3ª: Entre eles, ou resumindo-os e valendo como um facto novo, em si mesmo considerado, a acção declarativa que propôs, já em 2006, contra o exequente e outros.
4ª: Acção essa que foi alegada no requerimento de oposição, no qual o teor da p.i. - com os fundamentos da acção, portanto -, foi dado como inteiramente reproduzido e integrado.
5ª: São fundamentos da acção nulidades diversas, resultantes de simulação e da ilicitude do objecto, por ser contrário à ordem pública e ofensivo dos bons costumes - as quais nulidades são do conhecimento oficioso, pelo que sempre o Tribunal a quo não poderia deixar de atentar nas mesmas.
6ª: Ignorando-as, o douto despacho recorrido fez incorrecta interpretação das normas dos artºs 280º, 2, e 286º do Código Civil.
7ª: Através do sobredito documento junto com o requerimento de oposição (cópia da p.i. naqueloutra acção declarativa) verifica-se ainda a ocorrência de factos posteriores ao encerramento da discussão na acção onde foi proferida a sentença exequenda.
8ª: Concretamente, a penhora do bem (usufruto do armazém) de que o recorrido se reclama titular, em execução que lhe foi movida por F………. - e sendo certo que é a posse desse bem, exercida pelo recorrente, que está na origem da indemnização em que foi condenado, a favor do recorrido.
9ª: No entanto, o recorrido não se opôs a essa penhora, e foi o recorrente que, deduzindo embargos de terceiro julgados procedentes, assim manteve a posse do usufruto do armazém.
10ª: Os referidos embargos, com julgamento efectuado e sentença proferida em 2003 (posteriormente ao julgamento da acção em que foi proferida a decisão exequenda, em 2002), encontram-se documentados nos autos e constituem, também eles, facto extintivo do direito dos recorridos, dado à execução.
11ª: Na verdade, se o recorrente não houvesse deduzido embargos de terceiro, os recorridos teriam perdido, em sede de execução, por lhes haver sido penhorado e se terem conformado com essa penhora, o direito de usufruto de cuja titularidade se arrogam.
12ª: Logo, não teriam direito à indemnização que agora pretendem, pela simples razão de que o bem - usufruto - estaria na titularidade de outrem e não já na posse do recorrente.
13ª: O douto despacho recorrido faz assim incorrecta interpretação, ou viola, as normas dos artºs 483º, 562º, 563º e 564º do Código Civil.
14ª: O que se confirma por factos já ocorridos em 2004 e 2005, a saber, a remessa à conta dos autos de execução movida aos recorridos e posterior interrupção da instância executiva, sem que a importância exequenda haja sido paga.
15ª: Tal qual o recorrente apurou muito recentemente.
16ª: Conforme se alcança das certidões ora juntas, ao abrigo do disposto no artº 706º, 1, Código de Processo Civil.
17ª: Sendo que o Tribunal ad quem deverá tomar conhecimento destes factos supervenientes, de acordo com a sobredita norma do artº 706º.
18ª: Em face do que a douta sentença recorrida violou a norma do artº 814º, al. g) do Código de Processo Civil.
19ª: Subsistiriam sempre motivos para determinar a suspensão da presente instância executiva, até que fosse proferida decisão nos autos de acção declarativa já identificada e de que existe cópia da respectiva p.i., junta com o requerimento de embargos.
20ª: Isto porque, estando os exequentes garantidos com a penhora dos bens (imóveis e quotas) já efectuada, há que ponderar a protecção dos interesses do recorrente, evitando que a execução prossiga sem que a matéria da acção declarativa esteja esclarecida.
21ª: A não ser assim, o recorrente fica na eminência de não ser reposto na sua situação patrimonial inicial, por os bens penhorados nesta acção executiva se esfumarem após a sua adjudicação ou venda judicial.
22ª: Não ordenando a suspensão da instância executiva, o Mmº Juiz a quo não deu cumprimento à norma do artº 279º, 1, Código de Processo Civil.
Termos em que, concedendo provimento ao recurso e, consequentemente, revogando a douta decisão recorrida, se fará, como sempre inteira Justiça!

4. Não tendo os exequentes contra alegado e tendo sido proferido despacho de sustentação, colhidos os vistos legais, cumpre decidir.

II. FUNDAMENTAÇÃO.

1. Não vindo fixada na decisão recorrida, com interesse para a decisão do agravo, importa considerar, para além da referida no presente relatório, a seguinte matéria de facto:
1) O acórdão dado à execução, datado de 31/1/2006, revogando parcialmente a sentença proferida na acção ordinária nº nº …/2000, que correu termos na .ª Secção da .ª Vara Cível do Porto, condenou o R./oponente a:
a) Restituir de imediato aos AA./opostos o seu direito de uso, fruição e disposição dos locais correspondentes à fracção predial em causa (Fracção autónoma designada pela letra A, correspondente à cave, destinada a comércio, com entrada pelos nºs ….. e ….. do prédio urbano sito na ………., nºs ….., ….. e ….., freguesia de ………., concelho do Porto, descrito na 2ª Conservatória do Registo Predial sob o nº 5841, a fls. 125 do Livro B-16, afecto ao regime de propriedade horizontal pela inscrição 4234, a fls. 192 vº do Livro F-5, e inscrito na matriz respectiva sob o artº 4234º) e a
b) Indemnizar os AA., pela mora na restituição daqueles locais, que vem ocupando, na quantia em Euros correspondente a Esc. 12.901.500$00 e ainda na quantia em Euros correspondente a Esc. 211.500$00 por cada mês de atraso na restituição, a contar de 7 de Setembro de 2000 em diante até ao dia em que ocorrer a entrega efectiva dos locais.
2) Tendo o oponente interposto recurso do acórdão exequendo, o Supremo Tribunal de Justiça, por acórdão de 12/10/2006, negou a revista e confirmou o acórdão recorrido.
3) O oponente arguiu diversas nulidades do acórdão proferido pelo Supremo Tribunal de Justiça.

2. Tendo presente que o objecto dos recursos é balizado pelas conclusões das alegações do recorrente, não podendo este Tribunal conhecer de matérias nelas não incluídas, a não ser que sejam de conhecimento oficioso (artºs 684º, nº3 e 690º, nºs 1 e 3, do Código de Processo Civil), que neles se apreciam questões e não razões e que não visam criar decisões sobre matéria nova, sendo o seu âmbito delimitado pelo conteúdo do acto recorrido, as questões suscitadas no presente agravo são as seguintes:
- Violação do disposto no artº 814º, nº 1, al. g) do Código de Processo Civil e
- Suspensão da instância executiva.

Questão prévia:

Com as suas alegações de recurso, o agravante juntou os documentos de fls. 129 a 143 [certidão da petição da acção ordinária nº ../2000, que correu termos no .º Juízo Cível de Matosinhos, e que F……… moveu contra os opostos/exequentes, não contestada por estes, e em que era peticionado o pagamento de Esc. 3.444.000$00, acrescidos de juros de mora à taxa legal, relativos a empréstimos efectuados, e do despacho proferido a 11/5/2004, no âmbito da execução instaurada com base na sentença nela proferida, a declarar interrompida a instância - fls. 135 a 143 - sem que o exequente haja obtido o pagamento de qualquer quantia, e bem assim da sentença proferida em 14/3/2003 nos embargos de terceiro, que correram por apenso àqueles autos de execução, deduzidos pelo aqui oponente relativamente à penhora do direito de usufruto sobre a fracção referida em II.1.1)a) dos factos provados, que foram julgados procedentes, com o consequente levantamento dessa penhora], com o fundamento de que todos esses factos são posteriores ao encerramento da discussão na acção em que foi proferida a decisão exequenda, cujo julgamento decorreu no ano de 2002.
Há, portanto, que apreciar da admissibilidade dessa junção.

Como se sabe, a junção de documentos na fase de recurso, deve obedecer ao disposto no artº 706º do Código de Processo Civil (diploma a que pertencerão os demais preceitos legais a citar sem outra indicação de origem).
Refere esta disposição legal, no seu nº 1, que as partes podem juntar documentos às alegações, nos casos excepcionais a que se refere o artº 524º, ou seja, em relação aos documentos cuja apresentação não tenha sido possível até ao encerramento da discussão em 1ª instância e aos documentos destinados a provar factos posteriores aos articulados, ou cuja apresentação se tenha tornado necessária por virtude de ocorrência posterior.
Podem ainda ser juntos às alegações, segundo o referido artº 706º nº 1, os documentos cuja junção apenas se tornou necessária em virtude do julgamento proferido na 1ª instância.

Desde logo, há que referir que, com a junção dos documentos, o agravante alega factos novos que não havia alegado com o requerimento da oposição - em que apenas faz referência à acção ordinária que propôs contra os exequentes e E.……… que, com o nº …./06.9TVPRT, corre termos na .ª Secção da .ª Vara Cível do Porto -, e que, por isso, não foram (nem tinham que ser) objecto da decisão recorrida, pelo que, não visando os recursos criar decisão sobre matéria nova, mas destinando-se a rever o julgamento do tribunal recorrido, nem se tratando de questão de conhecimento oficioso, tal seria suficiente para não admitir a junção requerida.

De qualquer modo, entendemos que, na situação dos autos, não se verifica nenhum dos dois primeiros casos excepcionais em que a lei admite a junção de documentos.
Com efeito, tendo a decisão recorrida indeferido liminarmente a oposição, por se ter entendido que os fundamentos invocados não integravam qualquer das alíneas do artº 814º, que prevê taxativamente os fundamentos de oposição à execução baseada em sentença, é indubitável que não está demonstrada a impossibilidade de junção (atenta a data dos documentos) até ao encerramento da discussão em 1ª instância, que tem de se entender como reportada à decisão que indeferiu a oposição (e não ao encerramento da discussão na acção em que foi proferida a decisão exequenda, que era a sede própria para se proceder a essa junção), e, para que a junção fosse lícita, era necessário que a parte demonstrasse que não lhe foi possível juntar os documentos até ao encerramento da audiência - cfr. Ac. do STJ de 12/1/94, BMJ 433, pág. 467 -, demonstração que nem sequer alegou, e os documentos, embora as certidões se encontrem datadas de 12 de Junho de 2007 e 5 de Fevereiro de 2007, referem-se a decisões dos anos de 2003 e de 2004, tendo o despacho recorrido sido proferido em 31/1/2007.
Daqui decorre também que a superveniência da ocorrência de factos ou a necessidade de junção por evento posterior, estão, no caso presente, manifestamente ausentes.
Acresce que não se vislumbra que os documentos em causa - execução movida contra os exequentes em que foi penhorado o seu direito de usufruto sobre o armazém e procedência dos embargos de terceiro deduzidos pelo oponente relativamente a essa penhora - constituam factos extintivos ou modificativos da obrigação, porquanto a decisão exequenda é de 31/1/2006.

No que respeita ao terceiro caso, o facto de a decisão ter sido desfavorável ao agravante não é, só por si, motivo suficiente, para se admitir a junção dos documentos.
É que a necessidade de junção, por via do julgamento efectuado, não abrange a hipótese de a parte se afirmar surpreendida com o desfecho da acção e pretender, com tal fundamento, juntar à alegação documento que já poderia, e deveria, ter apresentado na 1ª instância, e só se verifica, quando, pela fundamentação da sentença ou pelo objecto da condenação, se torne necessário provar factos com cuja relevância a parte não poderia razoavelmente contar antes da decisão ser proferida, significando o advérbio «apenas» inserto no indicado normativo, que a junção só é possível se a necessidade do documento era imprevisível antes da prolação da decisão de 1ª instância (cfr. citado Ac. do STJ), situação que, igualmente, se não verifica no caso vertente.
Mostrando-se os documentos desnecessários para os fins em vista, também a junção não é de aceitar (artºs 706º, nº 3, e 543º, nº 1).
Por isso, não se admite a sua junção.

Violação do disposto no artº 814º, al. g) do Código de Processo Civil.

Resultando dos factos provados estar-se perante execução baseada em sentença, os fundamentos de oposição são os constantes do artº 814º, cuja enumeração é taxativa, como resulta do advérbio só empregado no preceito (“Fundando-se a execução em sentença, a oposição só pode ter algum dos fundamentos seguintes”) - cfr. neste sentido F. Amâncio Ferreira, Curso de Processo de Execução, 8ª ed., 2005, pág. 154.
Como refere o mesmo autor, ibidem, pág. 154 e seguintes, citando Anselmo de Castro, esses fundamentos podem agrupar-se em três categorias: oposição por falta de pressupostos processuais gerais da acção [als. c) e f)], oposição por falta de pressupostos específicos da acção executiva [als. a), b), d) e e)] e oposição por motivos substanciais [al. g)].
No caso de execução de sentença homologatória de transacção [al. h)], pode ainda o executado basear a sua oposição em qualquer das causas que, nos termos da lei substantiva, determinam a nulidade ou anulabilidade desse acto, causas essas que se reportam à falta de vontade e vícios de consentimento dos outorgantes (artº 240º e segs. do CCivil).
Na oposição por motivo substancial, inclui-se qualquer facto extintivo ou modificativo da obrigação, desde que seja posterior ao encerramento da discussão no processo de declaração e se prove por documento [al. g) do artº 814º].
Compreendem as causas extintivas da obrigação, para além do cumprimento, a dação em cumprimento, a consignação em depósito, a compensação, a novação, a remissão e a confusão (artº 837º e segs. do CCivil). Ao lado delas, não obstante não constituir uma verdadeira causa extintiva, mas antes uma excepção, alude também a al. g) à prescrição.
E compreendem as causas modificativas da obrigação as que substituem o seu objecto, as que a extinguem parcialmente e as que alteram as suas garantias.
A lei faz depender de dois requisitos cumulativos esta forma de oposição: que o facto seja posterior ao encerramento da discussão no processo de declaração e se prove por documento.
O encerramento da discussão no processo de declaração marca os limites temporais do caso julgado da decisão executada, pois é até esse encerramento que as partes podem invocar os factos supervenientes [artº 506º, nºs 1 e 3, al. c)] e o tribunal pode considerar os factos constitutivos, modificativos ou extintivos do direito invocado [artº 663º, nº 1] - cfr. Miguel Teixeira de Sousa, Estudos Sobre o Novo Processo Civil, 2ª ed., pág. 625.
Há, assim que respeitar o caso julgado.
Mas, no momento em que se instaura a acção executiva, pode já não corresponder à realidade a situação jurídica que a sentença definiu. Basta atentar na hipótese de o réu, após ter sido condenado no pagamento de certa quantia, efectuar voluntariamente o pagamento e, apesar disso, o credor requerer acção executiva com base na sentença. Deve, nesta circunstância, o executado ser admitido a opor-se à execução, com o fundamento de já ter pago a importância solicitada.

Face aos termos da oposição deduzida, o único fundamento em que ela se integra é o constante da al. g) do artº 814º - qualquer facto extintivo ou modificativo da obrigação, desde que seja posterior ao encerramento da discussão no processo de declaração e se prove por documento.
E a resposta a esta questão, tal como entendeu a decisão recorrida, tem de ser necessariamente negativa.
É que, para que exista o fundamento de oposição à execução de sentença previsto na citada al. g) do artº 814º, é necessário e imprescindível que o facto extintivo ou modificativo tenha existência no momento em que é invocado, não podendo estar dependente de um evento futuro e incerto.
Ora, o facto de o oponente ter proposto, como resulta de fls. 26, em Novembro de 2006 (ou seja posteriormente ao acórdão exequendo e bem assim ao acórdão sobre ele proferido pelo Supremo Tribunal de Justiça, embora ainda não transitado, face à arguição de nulidades), acção declarativa contra os exequentes e E………., peticionando, além do mais, a declaração de nulidade dos negócios celebrados entre os RR., entre os quais o contrato de compra e venda, outorgado por escritura pública de compra e venda de 18/1/95, através do qual o E………. declarou vender e os exequentes comprar o usufruto do armazém em causa nos presentes autos, não constitui facto extintivo ou modificativo da obrigação, por, como se referiu, não existir no momento em que foi invocado, ou seja com a dedução da oposição, podendo apenas vir a sê-lo com a procedência da acção, não tendo o tribunal recorrido, ao contrário do que defende o agravante, que se pronunciar sobre o mérito ou demérito dessa acção.
Inexiste, face ao que se deixou exposto, qualquer facto modificativo da obrigação exequenda, pelo que improcede esta questão.

Suspensão da instância executiva.

A última questão suscitada pelo agravante é a da suspensão da instância executiva, que defende com base em existência de causa prejudicial - referida acção declarativa nº …./06.9TVPRT -, e até ao trânsito em julgado da sentença que nela vier a ser proferida.
Nos termos do disposto nos artºs 276º, nº 1, al. c) e 279º, nº 1, o tribunal pode ordenar a suspensão da instância quando a decisão de uma causa estiver dependente do julgamento de outra já proposta ou quando ocorrer motivo justificado.
Como se afirma no Ac. do Supremo Tribunal de Justiça de 14/10/2004 (Relator Conselheiro Araújo de Barros), Proc. 04B2771, www.dgsi.pt., louvando-se na doutrina e jurisprudência nele citado, cuja posição na apreciação desta questão se acompanha, por com ela se concordar, a jurisprudência é praticamente uniforme no sentido de que a norma do referido artº 279º, nº 1, não é aplicável às acções executivas.
Na vigência do Código de Processo Civil de 1939, cujo artº 284º continha uma redacção muito semelhante à do actual artº 279º, nº 1 (“O juiz pode ordenar a suspensão quando a decisão da causa estiver dependente do julgamento de outra já proposta”), a jurisprudência do Supremo Tribunal de Justiça dividiu-se quanto a saber se a execução podia ou não ser suspensa nos termos da primeira parte do seu artº 284º, divergência a que o Assento de 24/05/60, Diário do Governo, 1ª Série, de 15 de Julho de 1960, pôs termo, fixando jurisprudência no sentido de que «a execução propriamente dita não pode ser suspensa pelo primeiro fundamento do artigo 284º do Código de Processo Civil».
Como se referiu, a primeira parte do artº 284º do Código de Processo Civil de 1939 é idêntica à primeira parte do artº 279º, nº 1, do código vigente, conforme se alcança do confronto dos dois citados textos legais.
O Assento de 24/05/60 consagrou a doutrina que ainda hoje parece ser a melhor, embora apenas com o valor de acórdão uniformizador de jurisprudência (artº 17º, nº 2, do DL nº 329-A/95, de 12 de Dezembro).
Com efeito, a doutrina dos assentos (e dos acórdãos uniformizadores) não caduca pelo simples facto de ser revogada a legislação vigente quando foram proferidos: se essa legislação foi substituída por outra que contenha textos idênticos, não havendo razões para excluir que o sentido dos novos textos seja igual ao dos antigos, a doutrina do assento será de manter e de considerar em vigor.
Reforçando este entendimento, embora a lei não distinga no artº 279° entre a acção declarativa e a acção executiva, e se trate de uma norma geral sobre a suspensão da instância, a redacção da primeira parte do nº 1 torna inaplicável esse comando à execução propriamente dita. Realmente, desde que a suspensão, neste caso, resulta de estar a decisão da causa dependente do julgamento de outra já proposta, parece clara a sua inaplicabilidade ao processo de execução, em que não há que proferir decisão sobre o fundo da causa, visto o direito que se pretende efectivar já estar declarado (ou consta de título que lhe confere prova de primeira aparência), daí que, enquanto tal direito subsistir, é sempre possível a sua execução.
E, apesar de a lei admitir que, dentro do litígio executório, exista uma fase em que é possível ainda discutir a relação jurídica em questão (a fase da oposição), seria contrário a um princípio de eficácia, que deve presidir à concretização ou satisfação prática de um direito, bem como à própria economia processual, admitir que a execução se pudesse também enredar na malha da prejudicialidade.
Senão, teríamos, como no caso dos autos, a interposição da acção declarativa - até posterior à propositura da execução - com a consequência já não de prejudicialidade, mas de litispendência entre essa acção e o processo de oposição.
Acresce que o modo preciso como o artº 818º do Código de Processo Civil regula a forma da oposição suspender ou não a execução, indica que o legislador apenas previu uma espécie de prejudicialidade interna ou no âmbito da própria acção executiva, que é incompatível com a aplicação do disposto no artº 279º nº 1 do mesmo Código às execuções, dado que, a não ser assim, o regime daquele artº 818º deixaria de ter aplicação - neste sentido o Ac. do Supremo Tribunal de Justiça de 31/5/2007, Proc. 07B864, www.dgsi.pt..
Finalmente, ainda que se admita que o disposto no artº 279º é aplicável ao processo de execução (entendimento que, pelo que se deixou exposto, não é o nosso), sempre haveria que ponderar que, nos termos do nº 2 desse preceito legal, não obstante a pendência de causa prejudicial, não deve ser ordenada a suspensão se houver fundadas razões para crer que aquela foi intentada unicamente para se obter a suspensão.
Ora, no caso em apreço existem fundadas razões para crer que acção prejudicial foi intentada com o objectivo de obter a suspensão da execução, como sejam o facto de ela ter sido instaurada em data posterior à decisão dada à execução e até ao acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, que negou a revista dela interposta, sendo certo que, embora não tivesse transitado em julgado na data em que foi deduzida a oposição, como defendido na decisão recorrida, tal circunstância não constitui fundamento de oposição à execução, apenas tendo como consequência que os exequentes não podem ser pagos sem prestarem caução e que a execução iniciada se extinguirá ou modificará em conformidade com a decisão definitiva comprovada por certidão.
III. DECISÃO.
Pelo exposto, acordam os juízes que constituem esta Secção Cível do Tribunal da Relação do Porto em indeferir a junção aos autos dos documentos de fls. 129 a 143 e, em consequência, ordenar o seu desentranhamento e entrega ao agravante e negar provimento ao agravo, mantendo a decisão recorrida.
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Custas do agravo pelo agravante, que suportará também as do incidente de desentranhamento dos documentos, fixando ao incidente a taxa de justiça de 1 (Uma) UC.
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Porto, 29/05/2008
António do Amaral Ferreira
Manuel José Pires Capelo
Ana Paula Fonseca Lobo