Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
1230/14.3PJPRT.P1
Nº Convencional: JTRP000
Relator: PEDRO VAZ PATO
Descritores: CRIME DE VIOLÊNCIA DOMÉSTICA
PENA SUSPENSA
PERDÃO
Nº do Documento: RP201709131230/14.3PJPRT.P1
Data do Acordão: 09/13/2017
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REC PENAL
Decisão: NEGADO PROVIMENTO
Indicações Eventuais: 1ª SECÇÃO, (LIVRO DE REGISTOS N.º44/2017, FLS.42-53)
Área Temática: .
Sumário: I - Configura um crime de violência doméstica um ato único de agressão a um menor de dez anos de idade que pretendia reagir à agressão de que estava a ser vítima a sua mãe.
II - O perdão da vítima de violência doméstica, não se verificando uma situação de especial vulnerabilidade ou de acentuada gravidade da ilicitude do crime e das suas consequências, atenua as exigências de prevenção especial e prevenção geral e deverá ser tido em conta para o efeito de suspensão da execução da pena respectiva.
Reclamações:
Decisão Texto Integral: Proc. nº 1230/14.3PJPRT.P1

Acordam os juízes, em conferência, no Tribunal da Relação do Porto

I – B… vem interpor recurso do douto acórdão do Juízo Central Criminal do Porto (Juiz 13) do Tribunal Judicial da Comarca do Porto que o condenou, pela prática de um crime de violência doméstica, p. e p. pelo artigo 152º, nº 1, b), e n,º 2, do Código Penal, na pena de dois anos e três meses de prisão; pela prática de prática de um crime de violência doméstica, p. e p. pelo artigo 152º, nº 1, d), e n.º 2, do mesmo Código, na pena de dois anos de prisão; e, em cúmulo jurídico, na pena de dois anos e seis meses de prisão.

Da motivação do recurso constam as seguintes conclusões:
«1. O acórdão recorrido não identifica corretamente o ora Recorrente, quanto ao seu nome, pelo que deve o mesmo ser corrigido nessa parte, corrigindo-se o nome do Recorrente para B…, nos termos da al. b) do nº 1 do artigo 380º do C.P.P.
2. O acórdão recorrido, tal como resulta do seu texto, não contém indicação sumária das conclusões contidas nas contestações apresentadas pelo Recorrente, nos termos do preceituado pela al. d) do nº 1 do artigo 374º do C.P.P., pelo que deve ser corrigido nos termos da al. a) do nº 1 do artigo 380º do C.P.P.
3. O acórdão recorrido tem um vício de erro notório na apreciação da prova, uma vez que a factos que dá como provados terem ocorrido no verão de 2015 (Em altura indeterminada do verão de 2015 o arguido entrou na residência da ofendida, abeirou-se da mesma e desferiu-se socos na boca, após, o arguido segurou a ofendida pelos cabelos e desferiu-lhe mais dois socos. Na sequência de tal agressão a ofendida sofreu dores e incómodos e ulceração da mucosa interna do lábio superior, lesões que foram causa directa e necessária de 4 dias de doença, sem incapacidade para o trabalho.”) faz corresponder, como consequência dos mesmos, as lesões da ofendida descritas no Relatório da Perícia de Avaliação do Dano Corporal em Direito Penal, elaborado em 24/03/2015, por factos alegadamente ocorridos em 23/03/2015, a fls. 111 dos autos.
4. Tal contradição, resulta do texto da decisão recorrida, por si só e ou conjugada com as regras da experiência comum, e ainda da sua conjugação com a prova pericial de fls. 111 dos autos.
5. Assim, o acórdão recorrido padece do vício previsto na alínea c) do nº 2 do artigo 410º do C.P.P. quando dá como provados os factos que refere terem ocorrido no verão de 2015, padecendo do vício de erro notório na apreciação da prova, pelo que se devem considerar como não provados os factos constantes dos parágrafos 4º e 5º da segunda folha da decisão recorrida e supra transcritos, no ponto 3.
6. O Tribunal a quo na fundamentação da matéria de facto escreveu: “Diga-se por último, que o depoimento do arguido prestado ao JIC nos termos do artigo 144º, do CPP nada mais permite demonstrar. Pois o arguido admite apenas os insultos negando ter praticado qualquer agressão”.
7. O depoimento prestado pelo Recorrente perante o JIC, e referido no ponto anterior, não foi lido/reproduzido em sede de audiência – cfr. atas das duas sessões de julgamento de fls. 394 a 398 e de fls. 420 a 423 e gravação digital das audiências de julgamento, disponível na aplicação informática em uso no Tribunal a quo.
8. Tais declarações só poderiam ter sido valoradas pelo Tribunal a quo para efeito de motivação da decisão de facto, se lidas/reproduzidas em sede de audiência de julgamento, permitindo ao Recorrente cumprir o seu contraditório.
9. Uma vez que no caso concreto tal leitura/reprodução não sucedeu, o Tribunal a quo ao considerar tais declarações em sede de motivação de facto, incorreu em clara violação do disposto pelo nº 1 do artigo 355º do C.P.P., o que acarreta nulidade nos termos do disposto pela alínea d) do nº 2 do artigo 120º do CPP, que se arguiu.
10. A nulidade agora arguida terá como efeito a nulidade do acórdão recorrido, nos termos do nº 1 do artigo 122º do CPP, em virtude de terem sido violados os artigos 355º e 357º do C.P.P.
11. O acórdão recorrido faz uma errada qualificação do crime pelo qual foi condenado o Recorrente pelo facto praticado contra o menor C… em 06/09/2015
12. O Recorrente não assumiu nem assume qualquer agressão ao menor C….
13. No entanto o Tribunal a quo deu como provado que “ (…) como, o menor C… foi em defesa da mãe, o arguido desferiu a este um soco na face”.
14. Este facto dado como provado traduz-se num episódio único.
15. O Recorrente por estes factos foi condenado pela prática de um crime de violência doméstica p. p. pelo artigo 152º nº 1 alínea d) e nº 2 do C. P. com o que não pode concordar.
16. No entanto estes factos não tipificam o crime de violência doméstica, mas antes o crime de ofensa à integridade física, previsto e punido pelo artigo 143º do C.P.
17. Da prova produzida em audiência de julgamento e acima transcrita resulta não existirem maus tratos infligidos pelo Recorrente ao menor C…, pois o Tribunal apenas deu como provado um episódio único.
18. Dos factos provados não decorre que a conduta do Recorrente seja expressão de uma qualquer atitude de menosprezo e de humilhação para com o ofendido C…, antes resulta de um ato isolado, ocorrido num contexto muito preciso de uma discussão entre a ofendida e o Recorrente.
19. Conclui-se assim não estarem preenchidos os elementos típicos do crime de violência doméstica imputado ao Recorrente, pelo que o Recorrente nesta parte deveria ter sido absolvido.
20. Os factos dados como provados quanto ao menor C…, tipificam o crime de ofensa à integridade física simples p. e p. pelo nº 1 artigo 143º do C.P., o qual depende de queixa, a qual não foi formalizada nos autos.
21. Pelo exposto, deve o Recorrente ser absolvido do crime de ofensa à integridade física contra o menor C….
22. O ora Recorrente foi condenado pela prática em concurso real, na forma consumada e autoria singular de um crime de violência doméstica p. p. pelo artigo 152º nº 1 alínea b) do C. P., cometido na pessoa da Sra. D…, na pena concreta de 2 (dois) anos e 3 (três) meses de prisão, e um crime de violência doméstica p. p. pelo artigo 152º nº 1 alínea d) e nº 2 do C. P., na pessoa do menor C…, na pena de 2 (dois) anos de prisão, as quais cumuladas entre si integram a pena única de 2 (dois) anos e 6 (seis) meses de prisão, pena que se revela desproporcional ao caso em apreço.
23. A fls. 18 do douto acórdão o Tribunal a quo refere que o modo de atuação do Recorrente, face aos factos provados situa-se num patamar médio, considerando que as consequências do crime são diminutas.
24. No caso em concreto e atento o supra exposto, o Recorrente apenas poderá ser condenado na prática de um crime de violência doméstica praticado na pessoa da D. D….
25. Pelo que, no entender da defesa, deve o Recorrente ser condenado na pena mínima, uma vez que o Recorrente se encontra em paz com a ofendida e que a ofendida não quis prestar declarações em audiência de julgamento, pois mantém um bom relacionamento com o Recorrente, tal como resulta dos relatórios sociais, a fls. dos autos.
26. Atentos os factos dados como provados, o referido na presente motivação de recurso, o tempo decorrido, o grau de ilicitude (que já se encontra esgotada nas circunstâncias usadas para agravar a moldura), o modo de execução, as suas consequências (limiar mais baixo do dano corporal), as condições pessoais do agente (constantes dos dois relatórios sociais juntos aos autos e prova testemunhal e contestações), a sua modesta situação económica e que o Recorrente se encontra em paz com a ofendida D. D…, deve a pena a aplicar ao Recorrente ser a correspondente ao mínimo legal, nos termos do artigo 71º do C.P.
27. Nesta sequência o Tribunal violou o preceituado no artigo 71º do C.P.
28. No entender do Recorrente atendendo ao caso em concreto, mostra-se adequado a aplicação da pena mínima de dois anos, a qual, como infra se concretizará, deve ser suspensa na sua execução, satisfazendo assim as necessidades de prevenção geral e especial.
29. O presente processo teve um impacto muito grande na vida familiar do Recorrente, o qual está consciente da sua conduta, sendo que a simples censura do facto e a ameaça da prisão realizam de forma adequada e suficiente as finalidades da punição, pelo que nos termos do artigo 50º do C.P. deve a pena de prisão que vier ser aplicada ao Recorrente ser suspensa na sua execução.
30. Deve o Tribunal valorar o facto de o arguido se encontrar em paz com a ofendida e de manterem um bom relacionamento e que os antecedentes criminais do Recorrente, exceto um, foram praticados há mais de cinco anos e têm a pena extinta, não sendo nenhum de violência doméstica.
31. O relatório Social, menciona que “ (…) O relacionamento foi avaliado pela ofendida como globalmente positivo e gratificante, atribuindo contudo ao arguido condutas desajustadas que em análise minimizou ou justificou (…) ”
32. Face ao exposto, encontram-se preenchidos os pressupostos do nº 1 do artigo 50º do C.P., e deve este Venerando Tribunal determinar a suspensão da execução da pena que concretamente vier a aplicar ao Recorrente.
33. Ao não suspender a pena em que o Recorrente foi condenado o Tribunal a quo violou o artigo 50º do C.P.
34. O Recorrente também está disponível a cumprir a pena com regime de prova ou sanções acessórias que eventualmente este Tribunal entenda por adequadas.
35. Pelo exposto, o tribunal a quo violou a al. a) e d) do nº1 do artigo 374º, a al. c) do nº 2 do artigo 410º, 355º e 357º todos do todos do Código de Processo Penal, os artigos 50º e 71º do Código Penal e a qualificação jurídica do crime pelo qual o Recorrente foi condenado pelo facto, alegadamente, praticado contra o menor C…»
O Ministério Público junto do Tribunal de primeira instância apresentou resposta a tal motivação, pugnando pelo não provimento do recurso.

O Ministério Público junto desta instância emitiu douto parecer, pugnando também pelo não provimento do recurso.

Colhidos os vistos legais, foram os autos à conferência, cumprindo agora decidir.

II – As questões que importa decidir são, de acordo com as conclusões da motivação do recurso, as seguintes:
- saber se o acórdão recorrido deverá ser corrigido, nos termos indicados pelo recorrente e ao abrigo do disposto no artigo 380.º, n.º 1, b), do Código de Processo Penal;
- saber se o acórdão recorrido padece de erro notório na apreciação da prova, nos termos do artigo 410.º, n.º 2, c), do mesmo Código e como é indicado pelo recorrente;
- saber se o acórdão recorrido padece de nulidade, nos termos dos artigos 120.º, n.º 1, d), e 122.º, n.º 1, do mesmo Código, por ter valorado as declarações do arguido e recorrente prestadas em inquérito e não lidas ou reproduzidas em audiência, contra o disposto nos artigos 355.º e 357.º do mesmo Código;
- saber se a factualidade provada não integra a prática de um crime de violência doméstica, p. e p. pelo artigo 152.º, n.º 1, d), e n.º 2, do Código Penal, na pessoa do menor C…, por que o arguido e recorrente foi condenado, mas um crime de ofensas à integridade física, p. e p. pelo artigo 143.º, n.º 1, deste Código;
- saber se, face aos critérios legais, as penas em que o arguido e recorrente foi condenado deverão ser reduzidas;
- saber se, face aos critérios legais, tais penas deverão ser suspensas na sua execução.

III - Da fundamentação do douto acórdão recorrido consta o seguinte:
« (…)
III. Factos provados
Proc. N.º 1230/14.3PJPRT
O arguido e a ofendida D… passaram a viver juntos, como marido e mulher, no início do ano de 2014, na residência da ofendida, sita em …, nº .., …, nesta cidade do Porto.
Com o casal viviam os filhos da ofendida:
- E…, nascido a 03.01.2001
- C…, nascido a 21.04.2005
- F…, nascido a 23.07.2010
Em Junho de 2105 arguido e ofendida voltaram a viver juntos.
Em altura indeterminada do verão de 2015 o arguido entrou na residência da ofendida, abeirou-se da mesma e desferiu-se socos na boca, após, o arguido segurou a ofendida pelos cabelos e desferiu-lhe mais dois socos.
Na sequência de tal agressão a ofendida sofreu dores e incómodos e ulceração da mucosa interna do lábio superior, lesões que foram causa directa e necessária de 4 dias de doença, sem incapacidade para o trabalho.
No dia 06.09.2015, no interior da residência, durante uma discussão, o arguido puxou a ofendida pelos braços bateu-lhe no corpo e, como, o menor C… foi em defesa da mãe, o arguido desferiu a este um soco na face.
Na sequência de tal agressão sofreu o menor edema na face esquerda, lesões que foram causa directa e necessária de 1 dia de doença, sem incapacidade para o trabalho em geral e sem afectação da capacidade de trabalho formativa.
Nas datas referidas o arguido quis provocar lesões físicas e insultar a ofendida, sua companheira, provocando-lhe receio e fazendo-a viver em constante sobressalto, servindo-se da privacidade da vida familiar para o efeito, pretendendo que a mesma se sentisse menorizada e humilhada, o que conseguiu, bem sabendo que a afectava na sua saúde psíquica e física, querendo ainda atingi-la na sua dignidade enquanto ser humano, o que logrou, praticando tais actos na presença dos menores, filhos da ofendida.
O arguido quis ainda atentar contra o menor C…, bem sabendo que o afectava na sua saúde psíquica e física, querendo ainda atingi-lo na sua dignidade enquanto ser humano, o que conseguiu.
O arguido actuou de forma livre, deliberada e consciente, sabendo serem as suas condutas proibidas e punidas por lei penal.
Proc. N.º 102/16.1PIPRT
A ofendida D… viveu com o arguido, em condições análogas às dos cônjuges, em períodos dos anos 2015 e 2016, numa habitação sita nas …, n.º .., …, no Porto.
Durante o período de tempo que viveu com o arguido debaixo do mesmo teto, e no decurso das discussões a que este deu origem, a ofendida foi por ele agredida nos termos já descritos supra.
Incapaz de suportar esta situação por mais tempo, a ofendida separou-se do arguido em meados do ano 2015, acabando por retomar o relacionamento com ele em data indeterminada do final desse mesmo ano.
Entre essa data e Janeiro de 2016 o relacionamento entre o casal decorreu com normalidade, a partir de então recomeçaram as discussões e os insultos.
Este facto motivou a ofendida a abandonar novamente a habitação aonde vivia com o arguido, e a mudar-se para casa da mãe, nas …, …, no Porto.
A 13 de Fevereiro de 2016, o arguido deslocou-se à habitação aonde a ofendida residia com a mãe - no local acima referido -, exigindo que ela lhe entregasse 20 euros, o que a D… fez de imediato, através da sua mãe.
Depois, após uma discussão com a mãe desta o arguido dirigiu-se à porta de casa, pontapeá-la e abri-la, assim conseguindo aceder ao interior da habitação. Uma vez aí, o arguido acercou-se da mãe ofendida Sra. G… procurando agredi-la.
Nessas ocasiões o arguido dirigindo-se à Sra. D… disse, pelo menos, “és uma puta, uma vaca, andas por ai a chupar piças, andas metidas com todos os homens”.
Sempre que insultou, bateu e dirigiu palavras à ofendida em tom de voz sério e intimidatório, o arguido atuou de forma livre, voluntária e consciente, bem sabendo o que estava a fazer e que não podia nem devia fazê-lo, dado que nada justificava o seu comportamento.
O arguido agiu com a intenção conseguida de maltratar psicologicamente a sua companheira, atingindo-a na honra e na consideração, humilhando-a e fazendo-a receá-lo, deste modo a atingindo na dignidade.
Mais sabia o arguido que praticava os factos que antecedem no interior da habitação, facto que aproveitou para melhor alcançar os seus objetivos.
Sabia ainda que as suas condutas eram proibidas e punidas por lei.
O arguido foi anteriormente condenado pela prática dos seguintes crimes:

Data crimeData trânsitocrimepena
24.7.200129.11.2002roubo15 meses de prisão suspensa, extinta em 25.6.2004
6.9.9927.6.2003Condução sem habilitação legal90 dias de multa extinta
3.3.20044.10.2005Roubo na forma tentada1 ano de prisão suspensa por 2 anos
16.11.991.3.2006Furto qualificado2 anos de prisão suspensa por 3 anos, extinta
27.07.0523.10.06Roubo agravado3 anos e 9 meses de prisão
12.7.200528.5.20091 crime de ameaças. 1 crime de ofensas (145º. Do CP)(em cumulo?) com anterior 5 anos e 6 meses de prisão, extinta em 2011
4.2.201126.3.20121 crime de ofensas e 1 crime de injuria qualificado7 meses de prisão substituída por 210 horas de trabalho, extinta
201303.11.20152 crimes de roubo2 anos e 8 meses de prisão suspensa por igual período

No seu relatório social junto a fls. 386 e cujo restante teor se dá por reproduzido, consta que: B… é o único descendente de uma relação de namoro dos progenitores. O seu desenvolvimento psicossocial decorreu no agregado familiar monoparental materno, juntamente com dois irmãos uterinos, de condição económica e cultural humilde, integrado num anexo à habitação, cuja cedência residencial era proporcionada pela madrinha. Embora conheça o pai, nunca estabeleceu um relacionamento próximo com este ou os dois irmãos consanguíneos. Relata uma grande proximidade afetiva com a mãe e a madrinha, figuras de proteção e apoio. Aos cinco anos ingressou no Colégio H…. Nessa instituição frequentou a escolaridade até ao 4.º ano do ensino básico, posteriormente integrou dois estabelecimentos de ensino público onde concluiu o 7º ano, apresentando um registo de absentismo e desinvestimento por manifesto desinteresse pelas aprendizagens. Pelos quinze anos de idade, iniciou consumos de estupefacientes, designadamente haxixe, em contexto de convivência com o grupo de pares, A conduta transgressiva nas normas sociais, iniciada aos dezasseis anos de idade, associada à ausência de hábitos de trabalho, consumos de estupefacientes e com a conivência das duas figuras de suporte (mãe e madrinha) que não tinham um ascendente controlador do comportamento de B…, tiveram como consequência a primeira condenação na maioridade e que se seguiram outras, pela prática de crime de roubo, condução sem habilitação legal, roubo na forma tentada, furto qualificado, roubo, ameaça e ofensa à integridade física, no período temporal entre 1999 a 2005. Nesta sequência foi condenado em pena de multa, em penas suspensas na execução e em pena de prisão efetiva; sendo englobado num cúmulo jurídico nos últimos três crimes supra descritos. Em 18/11/2005 deu entrada no E.P. I…, preso preventivamente à ordem do processo 488/05.3SJPRT, onde viria a ser condenado numa pena de prisão de 3 anos e 9 meses pela prática de crime de roubo, que por acórdão transitado em 28/05/2009, cumulou estes autos com o processo 458/05.1SJPRT, numa pena de 5 anos e 6 meses de prisão, acrescendo os crimes de ameaça e ofensa à integridade física. Paralelamente à pena de prisão, também cumpriu em meio institucional uma pena suspensa na sua execução, sujeita a regime de prova pelo período de 2 anos no âmbito do processo 153/04.9SJPRT, onde foi condenado em período precedente à medida de coação, por crime de roubo na forma tentada. Ainda em meio prisional e quando se encontrava a cumprir pena no Estabelecimento Prisional J…, voltou a cometer crimes, o que motivou a sua transferência para o Estabelecimento Prisional K… e condenação em sentença transitada em julgado em 26/03/2012 no âmbito do processo 748/11.4TAMTS, por injúria agravada e ofensa à integridade física qualificada sobre elemento do corpo da guarda prisional, numa pena de 7 meses de prisão, substituída por 210 horas de trabalho a favor da comunidade, que veio a cumprir já em liberdade. Na entrevista concretizada em Janeiro, apesar do arguido não ter conseguido precisar datas, referiu que viveu junto do agregado da ofendida, D…, durante um curto período de tempo relatando nunca terem efetuado gestão conjunta ao nível financeiro (a ofendida seria beneficiária do rendimento social de inserção e o arguido ia trabalhando por períodos de tempo na construção civil). O relacionamento foi-nos descrito como tendo sido gratificante durante o tempo em que estiveram juntos, sendo mencionado que o arguido terá desenvolvido uma relação próxima com o filho mais novo da ofendida. A rutura é atribuída à quebra de confiança na companheira, sendo referido que mantêm uma relação cordial, continuando a conviver com a ofendida e com o filho mais novo desta. De acordo com os elementos vicinais contatados, a ofendida era vista com regularidade a sair e entrar da casa do arguido, sendo assumido que estes se encontrariam a viver juntos. No que diz respeito à ocupação, no contacto realizado em Janeiro, o arguido mencionou que ocupa o seu quotidiano com trabalho, quando lhe surgem oportunidades, sendo que quando não se encontra a trabalhar se desloca diariamente a casa da madrinha, de 72 anos, onde por efetua regularmente as refeições, referindo ainda conviver com os amigos e gostar de ver carros e motas na internet. Da deslocação ao meio socio residencial, contatamos com vários elementos vicinais que descreveram o arguido como uma pessoa globalmente adequada no que refere ao trato com os vizinhos, no entanto são conhecidos “desentendimentos” entre o casal. A não colaboração do arguido inviabiliza a ponderação, análise e avaliação das eventuais necessidades de intervenção psicossocial, junto do mesmo.
(…)
3.3. Motivação da decisão de facto
O arguido usou do seu direito ao silêncio. E, mais importante, a vítima dos crimes, que deu origem por participação, a todo o processado não pretendeu prestar declarações.
A Sra. L… mãe da alegada vítima, admite que a única ocasião que presenciou directamente diz respeito a uma agressão do arguido a si e não à sua filha. Quanto a estas sabe apenas que via marcas no rosto ou corpo de agressões, mas que não sabe, porque não viu, quem as fez. Note-se porém que esta testemunha esclarece e comprova que a sua filha viveu com o arguido maritalmente desde 2014, juntamente com os seus filhos, nas …, casa .. que pertencia à filha mais velha.
A testemunha G…, vizinha da vítima, diz nunca ter visto qualquer agressão do arguido à vítima, mas apenas a situação em que este agrediu a sua amiga testemunha L…. Por vezes viu a vítima magoada e diz que não viu qualquer soco ao miúdo porque isso se passou dentro da casa, mas viu o garoto magoado e este disse-lhe que foi agredido pelo arguido. Ouviu várias vezes insultos vindo de dentro de casa dirigidos pelo arguido (cuja voz reconhece) à D….
O Sr. M…, agente da PSP confirma ainda o auto por si elaborado, esclarecendo que não viu qualquer agressão. O Sr. N… também nada de concreto presenciou.
A Sra. Dra. O…, que na data presidia à CPCJ da zona, refere também que a Sra. D… lhe disse ser vítima de agressões do arguido, apenas quando falou com ela sozinha. Diz ter visto ainda marcas de agressões e que lhe foi dito que as agressões eram feitas na presença dos filhos. Numa ocasião diz ainda ter sido chamada à casa, e quando aí chegou o arguido já lá não estava mas viu a casa “toda a partida” e a D… “marcada” com marcas do pescoço e pernas.
A fls. 195 constam os elementos clínicos do C… sendo que na data não existiam vestígios de ferimentos a fls. 184 o mesmo apresentava ligeiro edema na hemiface esquerda.
Ou seja desses elementos probatórios o tribunal possui a comprovação indirecta, sempre indirecta da existência de agressões (que nunca foram vistas directamente pelas testemunhas), e a comprovação directa e segura da relação existentes entre o arguido e a vítima, da data do mesmo e do local onde ambos viviam, bem como dos insultos proferidos.
Note-se que a existência dos insultos foi confirmada de forma direta quer pela mãe da vítima, quer pela vizinha destas (G…), quer, pelo filho C…. O Tribunal não pode apurar as datas concretas dos mesmos, mas sabe que estes ocorreram, foram frequentes e incluíam, pelo menos, os que constam dos factos provados.
Todavia o filho da Sra. D… prestou declarações (oficiosamente determinadas nos termos do art. 341º, do CPP) e no decurso das mesmas diz que numa ocasião viu o arguido a bater na mãe com uma colher do tacho, depois deu-lhe pontapés e socos, isto ocorreu na casa onde moravam. Situa esses factos no fim do verão de 2015, ainda antes de ir para as aulas, mas no período de férias.
Diz também que estava lá quando o arguido deu um murro ao C…, no interior da casa, após uma agressão deste à sua mãe. Isso ocorreu “um pouco mais para a frente”. Mais esclareceu que uma semana depois dessa ocasião voltaram a ocorrer agressões. Confirma que a sua mãe por vezes ia ao Hospital mas nunca apresentava queixa por medo do arguido.
Tem a certeza que o arguido bateu no C… porque “estava como daqui para o microfone”. Diz também que estas agressões são frequentes. Diz também que ele “ferra”, e que puxava os cabelos”.
Quanto às asneiras diz que diziam muitas mas que a sua mãe também respondia nos mesmos termos, por vezes baixo.
Ou seja, o Tribunal possui um cotejo coerente e mais do que consistente de prova indirecta respeitante a algumas agressões, e suas consequências (quanto à Sra. D… o relatório clínico de fls. 111 que demonstra marcas de agressões na face). Tem ainda depoimentos testemunhais e documentais que comprovam a relação mantida pelo arguido que era, em tudo análoga à de cônjuges. Quanto à concreta autoria dos factos possui apenas o depoimento de uma testemunha, mas essa testemunha depôs de forma consistente (revelando até uma natural confusão nas datas, que demonstra que o seu depoimento não foi ensaiado), credível (afirma pormenores dificilmente imaginados como o facto de “ele mordia e puxava cabelos); e coerente (diz que as agressões ocorriam na casa destes, de forma habitual e que até a sua mãe retorquia aos insultos).
Deste modo, apesar do silêncio do arguido e da vítima principal o certo é, que o Tribunal logrou comprovar de forma segura parte dos factos da acusação, com base no depoimento de uma testemunha directa e fiável, conjugada com todos os elementos indirectos (exames médicos, depoimento da técnica responsável pela CPCJ, da vizinha que ouvia insultos e presenciou uma agressão à mãe da vítima, etc.).
Convém frisar que existe uma discrepância de datas no depoimento do C…. Este denota dificuldades em situar os eventos no tempo. Por isso, o tribunal sabe apenas com segurança a data da agressão ao C… (cotejando essa informação com os elementos clínicos 6.9.2015 fls. 185). Sabe também que em altura indeterminada ocorreu outra e sabe por fim que posteriormente uma terceira, a qual porém não pode ser valorada porque não consta da acusação, na medida em que com base no depoimento da mãe da vítima, obtemos a certeza que em Fevereiro de 2016 ocorreu uma agressão à mãe desta e não à vítima D…. Note-se aliás que quanto a essa suposta agressão não existem quaisquer registos clínicos, sendo que quer a mãe quer o filho da vítima referem que esta ia ao Hospital apenas não apresentava queixa.
Acresce que foi dessa materialidade (agressões em duas ocasiões, insultos e pontapés) que o tribunal logra comprovar o elemento subjectivo. Pois, a reiteração dessas condutas e a multiplicidade de vítimas demonstra a acção directa, dolosa e voluntária do arguido que não padece de qualquer deficiência cognitiva (tanto quanto foi possível de observar nas duas sessões de julgamento).
Diga-se, por último, que o depoimento do arguido prestado ao JIC nos termos do art. 144º, do CPP nada mais permite demonstrar. Pois, o arguido admite apenas os insultos negando ter praticado qualquer agressão.
Por fim a idade dos menores foi comprovado com os assentos de nascimento de fls. 279 e seguintes.
Os factos negativos derivam precisamente da inexistência de prova testemunhal directa desses factos, já que a testemunha referiu apenas 3 (três) agressões, uma das quais (a última) não faz parte dos factos descritos na acusação.
Quanto à situação pessoal o tribunal baseou-se no relatório social e CRC referidos e ainda nas declarações da madrinha do arguido descreveu que este faz biscates, vive na casa da mãe e segundo ela já terminou a relação conjugal.
IV Do direito
(…)
2. Quanto ao crime cometido na pessoa do menor C…
Está comprovada a idade do menor por documento.
Está também demonstrado que essa agressão ocorreu no interior da casa onde a companheira ou ex-companheira do arguido residia.
Logo está preenchida a previsão do art. 152º, nº1, al. d), do CP, que inclui no âmbito das vítimas “a pessoa particularmente indefesa, nomeadamente em razão da idade”.
Cumpre notar que a fase de crescimento (11 anos) constituiu ainda uma fase particularmente indefesa, já que as consequências do crime podem ser mais gravosas que noutras fases, porque “A criança de 10 anos possui um grande poder de assimilação, gosta de memorizar, identificar ou reconhecer os factos, fazer classificações, etc.; no entanto custa-lhe mais conceptualizar ou generalizar”. E, “Tem um grande sentido de justiça e horror à fraude”[1].
Acresce estar demonstrada a tipicidade objectiva (deu um murro no menor quando este procurava defender a sua mãe, causando-lhe lesões), e subjectiva (agiu de forma dolosa conhecendo a natureza dos castigos corporais).
Note-se por fim que a mera agressão, naquelas circunstâncias, integra o conceito de maus tratos, tanto mais que o Ac da RE de 1.10.2013 in www.dgsi.pt decidiu que “São maus tratos psíquicos, para os efeitos do disposto no art.º 152.º, n.º 1, do Código Penal (violência doméstica) o envio pelo arguido à ofendida de sms de teor manifestamente injurioso.”.
1. Da agravação
Nos termos do art. 152, nº2, do CP o crime será agravado quando for cometido no domicílio da vítima ou na presença de um menor
A este propósito o Ac da RG de 3.3.2014 in www.dgsi.pt esclarece que “A agravação do crime de violência doméstica, resultante do facto ser praticados na presença de menor (art. 152 nº 2 do Cod. Penal), espelha a intenção do legislador de estender a tutela penal a pessoas de maior vulnerabilidade, que possam tornar-se vítimas “indiretas” dos maus tratos inicialmente dirigidos a outras pessoas. Ocorre aquela circunstância agravante quando são perpetradas agressões físicas e dirigidos insultos à mãe de um menor de um ano e seis meses que está ao seu colo, pois, para além do risco do menor ser atingido fisicamente, nessa idade a criança já se apercebe da emoção dos adultos, vivendo a perturbação que a rodeia”.
In casu está comprovado que, pelo menos, uma das agressões, ocorreu na presença do C…, o qual até procurou defender a sua mãe.
Logo, quer do ponto de vista formal quer material (o menor tinha 11 anos de idade na altura) está preenchida esta previsão normativa.
Por outro lado, ambos os crimes cometidos na pessoa da Sra. D… foram cometidos no domicílio desta (não sendo, pois, necessário comprovar que naquela precisa data o domicilio era comum). O conceito de domicílio para efeitos desta norma, tal como nos termos do art. 190º, do CP é a privacidade, a protecção de uma esfera pessoal e a conta a função social do domicílio (cfr. anotação ao art. 190.º no “Comentário Conimbricense do Código Penal”, tomo I, pág. 701).
Logo, esse domicílio existe, quer a vítima habite em casa própria, arrendada, comum ou cedida gratuita e temporariamente, elemento esse que está, pois verificado no presente caso.
Concluímos assim que o arguido deverá ser punido na forma agravada, nos termos do art. 152º, al. 2); do CP na pena de 2 a 5 anos de prisão.
*
4. Do concurso de crimes
Face à apensação processual o arguido está acusado da prática de dois crimes de violência na pessoa da sua (ex-) companheira. Tendo em conta o supra referido quanto ao bem jurídico protegido por esta incriminação é evidente que está verificado apenas um dos crimes, pois, recorde-se, nos termos do art. 30º, do CP foi violado apenas e só um bem jurídico pessoal.
Do mesmo modo, existindo duas vítimas ocorre uma situação de concurso real entre os crimes cometidos na pessoa da Sra. D… e do Menor C… (art. 30º, do CP).
5. Da pena concreta
A pena visa, além da protecção de bens jurídicos, a “reintegração do agente na sociedade” – art.º 40.º, n.º 1, do Código Penal.
Figueiredo Dias resume a intenção desta norma nos seguintes termos: “toda a pena serve finalidades exclusivas de prevenção geral e especial; a pena concreta é limitada, no seu máximo inultrapassável, pela medida da culpa; dentro deste limite máximo ela é determinada no interior de uma moldura de prevenção geral de integração, cujo limite superior é oferecido pelo ponto óptimo de tutela dos bens jurídicos e cujo limite inferior é constituído pelas exigências mínimas de defesa do ordenamento jurídico; dentro desta moldura de prevenção geral de integração a medida da pena é encontrada em função de exigências de prevenção especial, em regra positiva ou de socialização, excepcionalmente negativa, de intimidação ou de segurança individuais” (Direito Penal Português, Parte Geral I, Coimbra Editora, 2004, p.81)
A prevenção geral positiva ou de integração apresenta-se como a finalidade primordial a prosseguir com as penas, não podendo a prevenção especial positiva pôr em causa o mínimo de pena imprescindível à estabilização das expectativas comunitárias na validade da norma violada, tendo a culpa como limite.
No caso teremos de atender às seguintes circunstâncias
O modo de actuação do arguido, face aos factos provados situa-se num patamar médio. Tendo em conta o número de agressões (3 no total), o modo de execuções destas (com as mãos), e o espaço que mediou entre elas (verão a Setembro de 2016).
As consequências do crime são, nesta moldura também diminutas. Não apenas conforme consta dos relatórios policiais de avaliação do perigo a Sra. C… já vive de novo com o arguido, como os ferimentos causados situam-se no limiar mais baixo do dano corporal.
No modo de execução não podemos usar novamente a agravação domicílio e presença do menor.
A intensidade do dolo é grave porque foi directo.
As exigências de prevenção geral que se fazem sentir neste tipo de crime, são sérias. Tendo em conta a frequência com que ocorre e as consequências tão negativas no seio familiar para a saúde física e psíquica da lesada, atingindo, por vezes, a própria vida.
Quanto às necessidades de prevenção especial, as mesmas são graves, e estão evidenciadas na personalidade revelada pelo arguido, marcada pela ausência de autocrítica, de arrependimento ou interiorização do mal do crime, assim como os seus relevantes antecedentes criminais.
Note-se aliás que apenas por poucos meses não podemos imputar ao mesmo a prática do crime no decurso do período de suspensão da pena de prisão pelo cometimento de dois crimes de roubo, que transitou em julgado apenas em Novembro de 2016.
Por fim, as condições pessoais do arguido, (está a trabalhar, ainda que de forma irregular), não atenuam de forma saliente essa prevenção.
Assim, ponderados os supra citados elementos de ilicitude e de culpa e exigências de prevenção e reprovação do crime, a fixação da pena próxima do seu limite mínimo, parece-nos ainda capaz de acautelar as exigências de tutela dos bens jurídicos em causa. Porque, convém frisar a ilicitude encontra-se quase toda esgotada nas circunstâncias usadas para agravar a moldura e que, como é evidente, não podem agora ser esgotadas.
A pena em 2 anos de prisão para o crime cometido na pessoa do menor C… e 2 anos e 3 meses de prisão para o crime cometido na pessoa da Sra. D….
6. Da Pena única
A moldura abstracta nos termos do art. 77º, nº2, do CP é de 27 meses no seu mínimo e 4 anos e 3 meses no seu máximo
Nos termos da mesma norma, nº1, devem ser considerados em conjunto, os factos e a personalidade do agente, o que significa que o cúmulo jurídico de penas não é uma operação aritmética de adição, nem se destina, tão só, a quantificar a pena conjunta a partir das penas parcelares cominadas.
Ora, in casu teremos de considerar a unidade temporal de acções do arguido já que o crime cometido pelo arguido na pessoa do C… foi cometido quando agrediu também a sua companheira. Depois, não podemos também esquecer alguma unidade temporal na sua actuação, bem menos grave, recorde-se da que constava da acusação dos autos principais (2014 a 2016). Por último, não podemos esquecer que estes crimes revelam algo estrutural na personalidade do arguido a sua violência (que o levou a ser condenado por vários crimes de roubo e ofensas corporais, inclusive em meio prisional);a sua imaturidade (agride uma criança perante a qual diz ter uma boa relação – relatório social); e de algum modo a sua cobardia (usa sempre o interior da habitação).
Todavia, não podemos esquecer que a unidade de acção entre duas das situações e fundamentalmente as escassas consequências do dano corporal causado, num crime que recorde-se abarca a simples bofetada e insulto e actos de elevada perversidade. Depois, teremos de notar que o factor de compreensão usado pelo Tribunal é amplo e quiçá generoso demais a favor do arguido, mas também não podemos esquecer que a agressão ao menor tratou-se de um soco isolado, no decurso de uma altercação com a ex-companheira.
Ponderando, pois, esses factores e tendo em conta decisões[2] semelhantes julga-se proporcional e suficiente aplicar ao arguido a pena de 2 anos e 6 meses de prisão.
7. Da suspensão da pena
Nos termos do art.º 50.º, n.º 1 do Código Penal essa pena é passível de suspensão.
Mas para que o tribunal possa suspender a pena é necessário que consiga fazer um prejuízo favorável ao arguido, ao considerar que a simples ameaça da aplicação da pena de prisão é suficiente para o afastar da prática de novos crimes.
In casu o arguido já possui um extenso rol no seu registo criminal, incluindo penas de prisão suspensa que não foram suficientes para evitar o cometimento de novos crimes. Teremos aliás de notar um crescendo de energia criminosa na medida em que de ofensas simples e roubos o arguido passou agora a praticar crimes de violência doméstica.
Cumpre salientar que a carreira criminal do arguido se iniciou em 1999, já sofreu uma média pena de prisão, cometeu um crime no interior do EP, encontra-se neste momento a usufruir de uma pena suspensa (desde Novembro de 2015), e cometeu estes crimes em 2015.
Acresce que o seu relatório social revela necessidades de socialização, sendo que este usufruiu do rendimento mínimo e que diz nas suas declarações “está à espera do programa C mais (…), faz biscates ganhando 25/30 euros).
Logo, o tribunal não possui qualquer tipo de elementos que lhe permita efectuar um juízo positivo relativo aos pressupostos de suspensão da pena.
Acresce que o fenómeno da violência doméstica no nosso País tem sido sinalizado como um problema social a exigir medidas para a sua resolução, que têm vindo a ser adoptadas, no que se insere a adopção de um Plano Nacional contra a Violência Doméstica.
E, mais importante, que isso no caso concreto, apesar da vítima ter perdoado o seu companheiro, o tribunal não possui qualquer garantia que o arguido num acesso de fúria (ou como diz a sua companheira “com a cabeça quente” (cfr. relatório), não venha a cometer uma desgraça.
Temos, pois, que o arguido revela já várias passagens pela prisão que não o impediram de cometer novos crimes; demonstra um temperamento violento que não controla e não verbaliza qualquer admissão de culpa, revelando por isso não ter interiorizado o mal do crime.
Por tudo isto é claro que não existem elementos que permitam a suspensão da execução da pena, porque essa medida e mesmo a prisão foi impotente para evitar que o arguido tenha evitado a repetição de comportamentos delituosos.
(…)»
IV 1. – Cumpre decidir.
Vem o arguido e recorrente alegar que o acórdão recorrido deverá ser corrigido, ao abrigo do disposto no artigo 380.º, n.º 1, b), do Código de Processo Penal.
Quanto ao seu nome, já o mesmo foi corrigido no Tribunal de primeiro instância, pelo que nada há a determinar nesta sede.
Alega, por outro lado, o arguido e recorrente que o relatório do acórdão recorrido, de onde consta que não foi apresentada contestação, deverá ser corrigido de modo a que dele passe a constar a indicação sumária das conclusões das contestações que apresentou, como impõe o artigo 374.º, n.º 1, d), do Código de Processo Penal.
Na verdade, deve ser corrigido o acórdão recorrido de modo a que dele conste a indicação sumária das conclusões da contestação junta a fls.366, nos termos das disposições conjugadas dos mencionados preceitos legais.
IV 2. –
Vem o arguido e recorrente alegar, por outro lado, que o acórdão recorrido padece de erro notório na apreciação da prova, nos termos do artigo 410.º, n.º 2, c), do Código de Processo Penal. Alega que as lesões aí indicadas como consequência da agressão aí descrita como tendo ocorrido no Verão de 2015 correspondem às lesões descritas num relatório pericial junto aos autos a fls. 111 e que se reporta à data de 23 de março de 2015.
Na verdade, da análise do relatório pericial referido resulta que o mesmo se reporta à data de 23 de março de 2015.
Assim, a agressão em causa deverá situar-se em 23 de março de 2015.
É certo que o filho da vítima aludiu a uma agressão que terá ocorrido no Verão desse ano (e a ela se refere a motivação do recurso), mas com características algo diferentes das que são descritas no elenco dos factos provados constante do acórdão recorrido e que correspondem a tal relatório (essa testemunha alude a uma agressão com uma colher do tacho, pontapés e socos, quando nesse elenco se descreve uma agressão com socos na boca e segurando os cabelos e mais dois socos). O depoimento dessa testemunha servirá para concluir que as agressões do arguido para com a vítima eram recorrentes (nessa medida, também servirá para provar a agressão a que se reporta tal relatório) e poderia fundamentar uma outra agressão (essa sim ocorrida no Verão de 2015) para além das que vêm descritas no elenco dos factos provados constante do acórdão recorrido (que não pode ser agora considerada, à luz do princípio da proibição da reformatio in pejus)
Como bem refere o Ministério Público na sua resposta, estamos perante um lapso que, claramente, não invalida a conclusão do acórdão recorrido quanto à prática do crime de violência doméstica por que o arguido foi condenado.
Tal lapso deverá também ser corrigido ao abrigo do disposto no artigo 380,º, n.º 1, b), do Código de Processo Penal.
IV 3. –
Vem o arguido e recorrente alegar, por outro lado, que o acórdão recorrido padece de nulidade, nos termos dos artigos 120.º, n.º 1, d), e 122.º, n.º 1, do Código de Processo Penal, por ter valorado as suas declarações prestadas em inquérito e não lidas ou reproduzidas em audiência, contra o disposto nos artigos 355.º e 357.º do mesmo Código.
Na verdade, na motivação do acórdão recorrido, acima transcrita, é feita uma alusão a essas declarações, prestadas nos termos do artigo 144.º desse Código.
No entanto, não pode dizer-se que tais declarações tenham sido valoradas de modo a influir, de algum modo, na decisão sobre a prova dos factos.
Assim, não se verifica a invocada nulidade e deverá ser negado provimento ao recurso quanto a este aspeto.
IV 4. –
Vem o arguido e recorrente alegar, por outro lado, que a factualidade provada não integra a prática de um crime de violência doméstica, p. e p. pelo artigo 152.º, n.º 1, d), e n.º 2, do Código Penal, na pessoas do menor C…, por que foi condenado, mas um crime de ofensas à integridade física, p. e p. pelo artigo 143.º, n.º 1, deste Código. Invoca a circunstância de estarmos perante um ato isolado, praticado num contexto de uma discussão de um casal e que não é expressão de menosprezo e humilhação.
Há que identificar um traço distintivo entre o crime de violência doméstica e os crimes de ofensas à integridade física, injúrias, ameaças ou outros, praticados contra as potenciais vítimas daquele crime (neste caso, menores).
Esse traço distintivo dependerá da perspectiva adotada a respeito do bem jurídico protegido através da incriminação em apreço.
De acordo com Plácido Conde Fernandes, esse bem jurídico é «a saúde enquanto manifestação da dignidade da pessoa humana e da garantia da integridade pessoal contra os tratos cruéis, degradantes ou desumanos, num bem jurídico complexo que abrange a tutela da sua saúde física, psíquica, emocional e moral». Para que uma conduta integre o crime em questão, exige-se «uma intensidade do desvalor, da acção e do resultado, que seja apta e bastante a molestar o bem jurídico protegido – mediante ofensa da saúde física, psíquica, emocional ou moral, de modo incompatível com a dignidade da pessoa humana» (in «Violência doméstica – novo quadro penal e processual penal», Revista do CEJ, nº 8 (especial), 1º semestre de 2008, p. 304 a 308).
Para André Lamas Leite, «o fundamento último das acções abrangidas pelo tipo reconduz-se ao asseguramento das condições de livre desenvolvimento da personalidade de um indivíduo no âmbito de uma relação interpessoal próxima, de tipo familiar ou análogo» (in «A violência relacional íntima», Julgar, nº 12 (especial), Novembro de 2010, p. 49).
À luz de uma ou outra destas perspetivas, podemos afirmar que a factualidade provada na douta sentença em apreço configura a prática de “maus tratos físicos e psíquicos” e, portanto, um crime de violência doméstica, p. e p. pelo artigo 152º, nº 1, d), e n,º 2, do Código Penal.
Na verdade, embora estejamos perante um ato isolado e que não envolve uma acentuada violência física, não podemos deixar de considerar a tenra idade do menor e, sobretudo, o relevante trauma psíquico que resulta do contexto em que ocorre a agressão: um contexto de agressão à mãe do menor, contra a qual ele pretendia reagir. Tal contexto não pode deixar de se repercutir, negativa e gravemente, na saúde psíquica do menor
Assim, deverá ser negado provimento ao recurso quanto a esta aspeto
IV 5. –
Vem o arguido e recorrente alegar que as penas em que foi condenado deverão ser reduzidas, face aos critérios legais. Invoca as circunstâncias de o seu modo de atuação se situar num patamar médio, de as consequências do crime serem diminutas e de manter um bom relacionamento com a ofendida.
Vejamos.
Os crimes de violência doméstica, p. e p. pelos artigos 152º, nº 1, b) e d), e n.º 2, do Código Penal, por que o arguido foi condenado, são puníveis com pena de prisão de dois a cinco anos.
O arguido e recorrente foi condenado nas penas de dois anos de prisão (quanto ao crime praticado na pessoa do menor C…) e de dois anos e três meses de prisão (quanto ao crime praticado na pessoa da sua companheira D…). Em cúmulo jurídico, nos termos do artigo 77.º, n.ºs 1 e 2, do Código Penal, foi condenado na pena de dois anos e seis meses de prisão.
Uma vez que a pena correspondente ao crime praticado na pessoa do menor C… se situa no mínimo legal, nada há a determinar a respeito de tal pena.
Quanto à pena relativa ao crime praticado na pessoa de D…, a mesma situa-se muito próximo do mínimo legal.
À luz do que dispõem os artigos 40.º, n.ºs 1 e 2, e 71.º, n.ºs 1 e 2, do Código Penal, não pode, neste caso, e desde logo, ignorar-se os relevantes antecedentes criminais do arguido como circunstância agravante. E as circunstâncias atenuantes invocadas não se revestem de acentuado peso. Não pode, por isso, de modo algum, considerar-se excessiva a pena em que o arguido foi condenado pela prática do crime de que foi vítima a sua companheira.
E o mesmo se diga da pena única resultante do cúmulo jurídico de penas, também fixada muito próximo do mínimo legal à luz dos critérios decorrentes do artigo 77.º, n.ºs 1 e 2, do Código Penal
Assim, deverá ser negado provimento ao recurso quanto a este aspeto.
IV 6. –
Alega, por outro lado, o arguido e recorrente que as penas em que foi condenado deverão ser suspensas na sua execução. Alega que estão verificados os respetivos pressupostos legais, invocando as circunstâncias de ter um bom relacionamento com a ofendida e de nenhuma das suas condenações anteriores ser relativa ao crime de violência doméstica e as penas respectivas (à exceção de uma) estarem já extintas.
Vejamos.
Nos termos do artigo 50.º, n.º 1, do Código Penal, o tribunal suspende a pena de prisão aplicada em medida não superior a cinco anos se, atendendo à personalidade do agente, às condições da sua vida, à sua conduta anterior e posterior ao crime e às circunstâncias deste, concluir que a simples censura do facto e a ameaça da prisão, realizam de forma adequada e suficiente as finalidades da punição. O tribunal, se o julgar conveniente e adequado às finalidades da punição, subordina a suspensão da execução da pena de prisão ao cumprimento de deveres ou à observância de regras de conduta ou determina que a suspensão seja acompanhada de regime de prova (n.º 2 desse artigo e artigos 51.º a 54.º).
Preside ao instituto da suspensão da execução da pena de prisão um propósito de favorecimento de penas mais adequadas à prevenção especial positiva (reinserção social, ou não desinserção social do agente) do que a pena de prisão. É seu pressuposto uma prognose social favorável o arguido, isto é, a prognose de que a censura do facto e a ameaça de eventual cumprimento da pena de prisão sejam suficientes para o afastar da criminalidade.
É também pressuposto da suspensão da pena de prisão que esta satisfaça outros fins da pena (artigo 50º, nº 1, in fine, do Código Penal). De acordo com o artigo 40º, nº 1, do mesmo Código, a aplicação das penas visa a proteção de bens jurídicos e a reintegração do agente na sociedade. A “proteção dos bens jurídicos” corresponde, fundamentalmente, à prevenção geral positiva, isto é, ao reforço da confiança comunitária na validade da ordem jurídica e na proteção que esta assegura aos bens que estruturam a vida social. Diante da violação da ordem jurídica e da agressão a esses valores, a consciência jurídica comunitária poderá ficar abalada se o sistema jurídico-penal não reagir, fechar os olhos a tal violação, ficando comprometida a referida confiança. A pena exerce, assim, uma função pedagógica de interpelação social que veicula uma mensagem cultural de chamada de atenção para a relevância de valores e bens jurídicos e, nessa medida, traduz-se numa forma de proteção desses bens jurídicos e da ordem jurídica em geral. Ora, a suspensão da pena pode ser interpretada pela consciência comunitária como uma forma de desvalorização de bens jurídicos a que dá particular importância e como um sinal de prática impunidade, uma mensagem contraditória com um propósito de tutela desses bens.
Invoca o arguido e recorrente a circunstância de ter hoje um bom relacionamento com a ofendida. Segundo o douto acórdão recorrido, é isso mesmo que se verifica, mesmo que aí não se afirme com certeza que foi reatada a convivência marital.
O crime de violência doméstica reveste natureza pública e, por isso, não será o perdão da ofendida a afastar a condenação do arguido. Subjacente a esta opção legislativa está, por um lado, uma conceção da indisponibilidade do valor da dignidade da pessoa humana que é atingido com a prática deste crime e, por outro lado, a consideração de dados empíricos que demonstram que por detrás do perdão da vítima de violência doméstica estão com frequência situações de particular vulnerabilidade, designadamente de dependência económica em relação ao agressor, que desvirtuam a autenticidade desse perdão.
Mas, se é certo que o perdão da vítima de violência doméstica não poderá afastar a condenação do autor de tal crime, pode tal perdão ser tido em consideração para o efeito que agora está em causa: saber se, me concreto, as exigências de prevenção especial e de prevenção geral afastam a possibilidade de suspensão de execução das penas em que o arguido e recorrente vai condenado.
No caso em apreço, como é reconhecido pelo próprio acórdão recorrido, a vítima não está numa situação de dependência económica em relação ao autor do crime. Não se vislumbra que o reatamento do relacionamento entre ambos seja forçado ou fruto de alguma situação de particular vulnerabilidade. Esse reatamento terá sido livre, como o foi a rutura subsequente à prática dos crimes em apreço.
Por outro lado, a ilicitude dos crimes em apreço, e as suas consequências, não se revestem de acentuada gravidade. Tanto assim é que as penas respetivas se situam, como vimos, no mínimo legal ou muito próximo desse mínimo.
Ora, se assim é, e apesar dos antecedentes criminais do arguido, impõe-se-nos concluir que as exigências de prevenção especial e de prevenção geral não reclamam, no caso em apreço, o cumprimento de uma pena de prisão efetiva. Não o reclamam as exigências de prevenção especial precisamente porque é a própria vítima (sem que se vislumbre uma situação de especial vulnerabilidade) que confia no comportamento futuro do arguido. Não o reclamam as exigências de prevenção geral precisamente porque a ilicitude dos crimes em apreço e as suas consequências não se revestem de acentuada gravidade.
Tal não significa que esteja completamente afastado o perigo de continuação da atividade criminosa. Não podem ser ignorados o carácter reiterado da conduta do arguido e os seus antecedentes criminais.
E também não podem ignorar-se as exigências de prevenção geral inerentes ao crime de violência doméstica, pela frequência da sua prática no nosso país e pela gravidade de que frequentemente se reveste
Para afastar tal perigo e para satisfazer tais exigências será adequado (porventura até mais do que o cumprimento de pena de prisão efetiva) o regime de prova.
A suspensão de execução das penas em que o arguido e recorrente foi condenado deverá, pois, ser acompanhada do regime de prova (artigos 50.º, n.º 2, 53.º e 54.º do Código Penal).
Deverá, assim, ser concedido provimento ao recurso quanto a este aspeto.


Não há lugar a custas (artigo 513º, nº 1, a contrario, do Código de Processo Penal)

V – Pelo exposto, acordam os juízes da 1ª Secção Criminal do Tribunal da Relação do Porto em determinar a correção do douto acórdão recorrido, ao abrigo do disposto no artigo 380,º, n.º 1, b), do Código de Processo Penal, nos seguintes termos.
No relatório desse acórdão, onde se lê: «Não foi apresentada contestação e rol de testemunhas»; deverá passar a ler-se: «O arguido apresentou contestação, oferecendo o merecimento dos autos e descrevendo a sua situação social e económica».
No elenco dos factos provados desse acórdão, onde se lê: «Em altura indeterminada do verão de 2015»; deverá passar a ler-se: «No dia 22 de março de 2015».
Acordam em conceder provimento parcial ao recurso, suspendendo a execução das penas em que o arguido e recorrente foi condenado, pelo período respetivo, sendo tal suspensão acompanhada de regime de prova, nos termos dos artigos 50.º, n,º 2, 53.º e 54.º do Código Penal, e mantendo-se, no restante, o douto acórdão recorrido.

Notifique.

Porto, 13/9/2017
(processado em computador e revisto pelo signatário)
Pedro Vaz Pato
Eduarda Lobo
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[1] Características psicológicas da criança dos 10 aos 12 anos, acedido em Abril 2017 in nhttp://educacao.aaldeia.net/psicologia-crianca-1012-anos/.
[2] Ac do STJ de 5.6.12 in www.dgsi.pt que aplicou a um arguido a pena única de 5, 6 anos de prisão pela prática de dois crimes de violência doméstica, de dois crimes de extorsão e de um crime de detenção de arma proibida.