Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
250/12.7TAVFR.P2
Nº Convencional: JTRP000
Relator: MARIA DOLORES DA SILVA E SOUSA
Descritores: INSTRUÇÃO
NULIDADE DA ACUSAÇÃO
ARGUIÇÃO
Nº do Documento: RP20170524250/12.7TAVFR.P2
Data do Acordão: 05/24/2017
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REC PENAL
Decisão: PROVIDO
Indicações Eventuais: 4ª SECÇÃO, (LIVRO DE REGISTOS N.º718, FLS.360-392)
Área Temática: .
Sumário: Tendo havido instrução, e sendo ali arguida a nulidade da acusação, que foi conhecida e indeferida, não pode ser arguida de novo tal nulidade para ser conhecida pelo juiz de julgamento (arts. 310º, e 338º1 CPP)
Reclamações:
Decisão Texto Integral: Rec. Penal n.º 250/12.7TAVFR.P2
Comarca de Aveiro
Instância Local de Santa Maria da Feira

Acordam, em Conferência, na 2ª secção criminal do Tribunal da Relação do Porto.
I - Relatório.
No Processo comum singular n.º 250/12.7TAVFR, da Instância Local de Santa Maria da Feira, Secção criminal, Juiz 2, foi submetido a julgamento o arguido B…, identificado na sentença a fls. 1063 dos autos.
A sentença de 22.07.2016, depositada no mesmo dia, tem o seguinte dispositivo:
«Em face do exposto, decide-se:
1). Condenar o arguido B… pela prática de um crime de falsidade de testemunho, p. p. pelo artigo 360º, n.º1 do Código Penal, na pena de 180 (cento e oitenta) dias de multa;
2). Condenar o arguido B… pela prática de um crime de difamação, p. p. pelo artigo 180º, n.º1 do C.P., na pena de 100 (cem) dias de multa;
3). Efectuar o cumulo jurídico das penas aplicadas em 1) e 2) e, consequentemente, condenar o arguido B… na pena única de 230 (duzentos e trinta) dias de multa, fixando-se o quantitativo diário em €10 (dez euros), perfazendo o montante global de €2.300,00 (dois mil e trezentos euros);
4). Julgar parcialmente procedente por provado o pedido cível de fls. 204/207, e consequentemente, condenar o demandado/arguido B… a pagar ao demandante/assistente C…, a quantia de 750,00€ (setecentos e cinquenta euros), sobre a qual vencerão juros de mora, à taxa legal, contados desde a presente data até efectivo e integral pagamento, a título de indemnização pelo danos morais sofridos na sequência do crime de difamação, absolvendo-o do demais peticionado;
5). Julgar parcialmente procedente por provado o pedido cível de fls. 226/240, e consequentemente, condenar o demandado/arguido B… a pagar ao demandante/assistente C…, a quantia de 3.000,00€ (três mil euros), sobre a qual vencerão juros de mora, à taxa legal, contados desde a presente data até efectivo e integral pagamento, a título de indemnização pelos danos morais sofridos na sequencia do crime de falsidade de testemunho, absolvendo-o do demais peticionado;
6). Condenar o arguido nas custas criminais do processo, fixando-se a taxa de justiça em 3 (três) unidades de conta;
7). Declarar que não são devidas custas quanto ao pedido cível de fls. 204/207;
8). Condenar demandado e demandante, a pagar as custas relativas ao pedido cível de fls. 226/240, na proporção do respectivo decaimento.»
*
Inconformado, o arguido interpôs recurso apresentando a motivação de fls. 1114 a 1194 que remata com as seguintes conclusões:
«1.- O Tribunal “a quo” indeferiu todas as nulidades invocadas pelo Arguido em sede de contestação, invocando para tal a sua extemporaneidade e infundada invocação;
2.- E, decidiu condenar o Arguido e Demandado Cível:
I. pela prática de um crime de falsidade de testemunho, p. p. pelo artigo 360º,n.º1 do Código Penal, na pena de 180 (cento e oitenta) dias de multa;
II. pela prática de um crime de difamação, p. p. pelo artigo 180º, n.º1 do C.P., na pena de 100 (cem) dias de multa;
III. efectuar o cumulo jurídico das penas aplicadas em 1) e 2) e, consequentemente, condenar o arguido B… na pena única de 230 (duzentos e trinta) dias de multa, fixando-se o quantitativo diário em €10 (dez euros), perfazendo o montante global de €2.300,00 (dois mil e trezentos euros);
IV. julgar parcialmente procedente por provado o pedido cível de fls. 204/207, e consequentemente, condenar o demandado/arguido B… a pagar ao demandante/assistente C…, a quantia de 750,00€(setecentos e cinquenta euros), sobre a qual vencerão juros de mora, à taxa legal, contados desde a presente data até efectivo e integral pagamento, a titulo de indemnização pelo danos morais sofridos na sequencia do crime de difamação, absolvendo-o do demais peticionado;
V. julgar parcialmente procedente por provado o pedido cível de fls. 226/240, e consequentemente, condenar o demandado/arguido B… a pagar ao demandante/assistente C…, a quantia de 3.000,00€ (três mil euros), sobre a qual vencerão juros de mora, à taxa legal, contados desde a presente data até efectivo e integral pagamento, a titulo de indemnização pelos danos morais sofridos na sequencia do crime de falsidade de testemunho, absolvendo-o do demais peticionado;
3 - Ora, salvo o devido respeito, a Sentença Recorrida está ferida de vícios e nulidades que a invalidam;
4 - No âmbito dos presentes autos, em consequência de recurso intercalar de fls., e não obstante a prolação de sentença final, vieram a ser declarados inválidos os atos subsequentes, incluindo o julgamento, à decisão proferida a fls. 549 e 549 verso;
5 - Repetida a audiência de discussão e julgamento, veio a ser proferida sentença condenatória do arguido B…, que é objecto do presente recurso;
6 - Compulsadas as decisões finais proferidas no âmbito dos presentes autos, constata-se que a decisão ora em crise é ipsis verbis fiel à primeira sentença proferida também pelo Tribunal “a quo”, a qual veio a ser posteriormente anulada por V. Ex.as Venerandos Desembargadores;
7 - Atente-se nomeadamente, aos factos dados como provados, e bem assim, a respectiva motivação dos mesmos;
8 - Ora, se por um lado, está vedado a possibilidade, por impedimento, de o Juiz intervir em julgamento, recurso ou pedido de revisão relativos a processos em que tiver participado em julgamento ao anterior, artigo 40º, alínea c) do C.P.P.;
9 - Por maioria de razão, o Juiz que intervier em repetição de julgamento, estará, de igual modo, impedido de conhecer os atos anulados, incluindo a sentença final;
10 - Isto porque o artigo 40.º do CPP tem em vista garantir a imparcialidade do juiz enquanto elemento fundamental à integração da função jurisdicional, face a intervenções processuais anteriores que, pelo seu conteúdo e âmbito, condiciona uma futura intervenção;
11 - O envolvimento do juiz no processo, através da sua directa intervenção enquanto julgador, através da tomada de decisões, o que sempre implica a formação de juízos e convicções, é suscetível de o condicionar em futuras decisões, assim afetando a sua imparcialidade objetiva; 12 - O que conduziu o legislador a impedi-lo de intervir nas situações em que a cumulação de funções processuais poderá fazer suscitar no interessado, bem como na comunidade, apreensões e receios, objetivamente fundados;
13 - Com efeito, a fase processual é a mesma;
14 - Por outro lado, existe razão geradora de desconfiança sobre a imparcialidade do juiz, posto que se trata da repetição de acto processual anulado;
15 - Não obstante a prova produzida em sede de audiência de discussão e julgamento ter sido diferente da prova produzida em sede de audiência de discussão e julgamento posteriormente anulada, os factos dados como provados bem como a sua motivação geram a convicção plena de que não existiu uma tomada de decisão imparcial, que condicionou a decisão em causa;
16 - Isto porque, tais factos dados como provados e respectiva motivação são rigorosamente os mesmos, ou seja, são cópia integral, incluindo, letra, texto e pontuação, dos factos dados como provados e da respectiva motivação da sentença anterior objecto de anulação;
17 - Fazendo crer piamente que tal sentença não foi proferida com a imparcialidade exigida ao julgador, isto porque ditam as regras da experiência, da logica e do bom senso, que a probabilidade de ser reproduzida tão fielmente tal acto processual, é nula;
18 - Ora, o cargo de juiz deve, pois, ser rodeado de cautelas para assegurar aqueles objetivos, para que a comunidade confie nele, pois que a confiança da comunidade nas suas decisões é essencial ao “ administrar a justiça em nome do povo “, nos termos do art.º 205.º, da CRP, como se anota no AC. do TC n.º 124/90 , in DR , II Série , de 8.2.91, além de que só assim se materializa o direito constitucionalmente previsto dos cidadãos a um processo justo –art.º 32.º n.º 1, da CRP;
19 - Mais, o artigo 6.º n.º 1 da Convenção para a Proteção dos Direitos do Homem e das Liberdades Fundamentais, segundo o qual qualquer pessoa tem direito a que a sua causa seja examinada, equitativa e publicamente, em prazo razoável, por um tribunal independente e imparcial, com o alcance de que, num estado de direito, o juiz que preside ao julgamento o faça com independência, ou seja à margem de quaisquer pressões, e imparcialidade, numa posição distanciada, acima dos interesses das partes, sendo desejável também que o povo, em nome de quem exerce a justiça, nele tenha confiança, surgindo aos olhos daquele o julgamento como objetivamente justo e imparcial, impondo-se a predefinição de um quadro legal orientado para tal finalidade;
20 - Nesta esteira, e salvo sempre o devido respeito, parece-nos que o Tribunal “a quo” estava impedido de conhecer a sentença anteriormente proferida, e, ao que nos parece, ao fazê-lo minou a objetividade e imparcialidade da decisão que veio a proferir;
21 - Pelo que, e tendo como fonte o estatuído para as hipóteses plasmadas no artigo 40º do C.P.P., parece-nos que, à sentença proferida devem ser aplicadas as mesmas consequências das previstas no artigo 41º, n.º3 do C.P.P., ou seja, a nulidade;
22 - O Arguido na sua contestação invocou, desde logo, a nulidade da acusação pública quanto ao imputado crime de falsidade de testemunho, por ser manifestamente infundada, por absoluta ausência de provas que a fundamentem e por falta do elemento objectivo constitutivo do crime;
23 - “O conhecimento das questões suscitadas, na contestação, são da competência do Tribunal de julgamento e terão forçosamente que ser apreciadas na audiência, nomeadamente nos termos do artº 338º do CPP.”, vide Acórdão Tribunal Relação do Porto, de 01.07.2009, in www.dgsi.pt;
24 - Tendo o Tribunal “a quo” indeferido a invocada nulidade, por entender que “a nulidade ou falta de fundamentação da acusação pública apenas pode ser conhecida pelo juiz de julgamento se o processo não tiver comportado a fase de instrução, caso contrário, é na instrução que tal suposta nulidade ou falta de fundamento deve ser conhecida, ficando precludida a sua arguição em momento posterior se o arguido a não invocar”;
25 - Refere ainda que, tendo o Arguido requerido abertura de instrução “é totalmente extemporânea e infundada tal invocação.”;
26 - Discordando de tal entendimento, diremos que, por um lado, apenas quanto ao imputado crime de falsidade de testemunho, requereu o Arguido a abertura de instrução;
27- Por outro lado, o Tribunal “a quo”, na sua apreciação e ponderação, não vislumbrou o estabelecido no artigo 338º, n.º1 e bem assim o disposto no artigo 310º, n.º1, ambos do C.P.P.; É que, a decisão instrutória não se apreciou sobre nenhuma das invocadas nulidades, pelo que, não se formou caso julgado;
28 - E ainda porque o artigo 310º, n.º1 do C.P.P. não permite a recorribilidade sobre o despacho que se pronuncie sobre as nulidades arguidas em sede de instrução; E, sendo essas nulidades arguidas na contestação, deve o juiz de julgamento conhecê-las na sentença;
29 - Pelo que, ao considerar extemporânea e infundada a invocada nulidade ou falta de fundamentação da acusação pública, violou o Tribunal “a quo” o disposto nos artigos 338º, n.º1 e artigo 310º, n.º1 ambos do C.P.P.;
30 - Por outro lado, o Tribunal “a quo” não se pronuncia sobre nenhum dos factos/argumentos aduzidos pelo Arguido, apenas referindo que “ os factos que estão sujeitos a julgamento são os que constam do despacho judicial de pronúncia”;
31 - Assim, o Tribunal “a quo”, em face da invocada nulidade da acusação pública, designadamente, por ser manifestamente infundada, por absoluta ausência de provas que a fundamentem e por falta do elemento objectivo constitutivo do crime, não emite qualquer pronúncia;
32 - Nomeadamente, qual a circunstância em que se encontra verificado o elemento objectivo do tipo de crime de falsidade de testemunho de que veio acusado o arguido, se porque prestou duas declarações antagónicas no mesmo processo sobre uma mesma realidade, ou se resultou da declaração falsa prestada enquanto testemunha em oposição à realidade demonstrada por outros meios prova no mesmo processo;
33 - Tendo, em sufrágio da falta de fundamentação da acusação publica, o Arguido, insurgido-se alegando que, nenhuma das duas circunstâncias se encontram verificadas, pois o Arguido prestou unicamente uma vez declarações no âmbito do processo n.º 1152/11.0TAVNF, em 13 de Janeiro de 2012, na qualidade de testemunha, e onde relatou de forma clara e objetiva a sua perceção da realidade factual que presenciou no dia 28.09.2011, por volta da 00h00, e, em cumprimento de um dever imposto por lei – artigo 132º C.P.P., e artigo 31º, n.º2, alínea c) do C.P.;
34 - E por outro lado, da acusação pública consta que “ sucede, porém, que, contrariamente ao por aquele afirmado, no mencionado dia e hora, C… se encontrava na residência de D…, a comemorar o aniversário deste último.”, cuja realidade não se encontra demonstrada de forma alguma;
35 - No entanto, nos autos que deram origem à extração da certidão dos presentes, nunca em nenhum momento das suas declarações enquanto arguido, o aqui assistente, referiu que naquela data e hora “ se encontrava na residência de D…, a comemorar o aniversário deste último”;
36 - Pois que tal factualidade – que o assistente se encontrava na residência de D…, a comemorar o aniversário deste último – apenas surge no âmbito destes mesmos autos, e por apensação de um outro processo-crime na sequência de uma denúncia apresentada, pelo aqui assistente, em 20 de Abril de 2012 que deu origem ao processo de inquérito n.º 576/12.0TAVFR;
37 - Ora, nunca a falta de prova de um facto, pode ser considerada como prova de outro, isto é, não se pode presumir (ou ficcionar) a prática de um crime pela ausência de prova de outro;
38 - Pois que, o processo originário, n.º1152/11.0TAVNF, foi arquivado, NÂO por se ter considerado que não foi o arguido, aqui assistente, que praticou os factos uma vez que nesse dia e hora, estaria em casa do D…, com outras pessoas a comemorar o aniversário daquele, mas antes SIM por não se terem “obtido indícios suficientes da autoria e até da prática do crime”;
39 - Pelo que, não podia ser no âmbito deste processo que essa realidade apresentada podia ser dada como provada, pois nesse caso, seria a mesma decisão judicial a fixar, por um lado, a realidade concreta e, por outro, a decidir se o arguido praticou o crime de falsidade de testemunho por contrariar essa mesma realidade;
40 - Ora, tendo o Arguido deposto como testemunha no cumprimento de um dever legal, narrou os factos de que tinha conhecimento. E, não se tendo provado que enquanto testemunha, no quadro da função social de prestação de depoimento como tal, faltou à verdade, deveria, agora com a qualidade de arguido, ter sido rejeitada a acusação pelo crime de falso testemunho que lhe era imputado;
41 - Deste modo, entendeu e entende o Arguido, que não se encontra verificado o elemento objectivo do tipo de crime de falsidade de testemunho, e deste modo, é manifestamente infundada a acusação pública;
42 - De igual modo, o Arguido, invocando a manifesta falta de fundamentação da acusação pública, por absoluta ausência de provas, alegou ainda que, os motivos pelos quais foi ordenada a extração da respectiva certidão, prendem-se não com o facto de o Tribunal ter considerado um quadro factual diferente daquilo que o arguido, à data testemunha, tinha referido no seu depoimento,
43 - Mas antes sim com o facto de o Tribunal considerar “ … não obstante a testemunha B… referir que viu o arguido a atirar o DVD para a sua residência, entendemos que tal versão não é minimamente verosímil, tendo em consideração que o mesmo acompanhou a denunciante aquando da apresentação da queixa e nunca mencionou tal facto – nem consta dos autos que o tenha indicado a queixosa – o que, no mínimo, nos levante a dúvida sobre a veracidade das declarações.”;
44 - Ora, salvo sempre o devido respeito, tal circunstância não é indiciadora de coisa nenhuma, tanto mais porque o Arguido acompanhou a denunciante aquando da apresentação da queixa, nessa mesma qualidade de acompanhante, não foi inquirido como testemunha naquele momento, nem tendo qualquer intervenção processualmente relevante até ao dia em que efectivamente prestou o seu depoimento nos Serviços do Ministério Público desta comarca;
45 - E, porque, nada nos autos indiciava, fosse a que título fosse, que o Arguido tivesse faltado à verdade no seu depoimento;
46 - Por um lado, porque das declarações prestadas pelo C…, a 09.02.2012, se bem que enquanto arguido não são ajuramentadas, não resulta qualquer indício que o aqui arguido estivesse a prestar depoimento falso;
47 - O qual, além de negar peremptoriamente a prática dos factos que lhe eram imputados, nada de concreto é referido quanto aos acontecimentos do dia e hora em questão, ou seja, em nenhum momento o Sr. C… refere que no dia e hora dos acontecimentos estava em casa do Drº D… a comemorar o aniversário daquele conjuntamente com várias outras pessoas;
48 - E também porque, inquirido o Inspector da Policia Judiciária E…, que tomou conta da ocorrência aquando da apresentação da queixa que deu origem ao processo n.º1152/11.0TAVNF, o qual de forma límpida referiu que o arguido apenas acompanhou a denunciante na sua visita às instalações da Policia Judiciária, não tendo naquela data qualquer intervenção;
49 - E, novamente ouvido o C…, aqui assistente, o qual em 17 de Abril de 2012, refere algo totalmente diferente e distinto de tudo quanto havia dito no processo n.º 1152/11.0TAVNF, tendo poucos dias depois, a 20 de Abril de 2012, apresentado queixa-crime contra o aqui arguido, pelo crime de falsidade de testemunho, onde mais uma vez, não refere que naquele dia e hora esteve na casa do Drº D… a festejar o aniversário deste;
50 - Factos que o Tribunal “a quo” omitiu pronúncia por um lado, e, não fundamentando, por outro, apenas considerou que “tendo havido instrução, os factos que estão sujeitos a julgamento são os que constam do despacho judicial de pronúncia”;
51 - Sendo por isso, NULA a acusação pública deduzida quanto ao imputado crime de falsidade de testemunho, por manifestamente infundada, por absoluta ausência de provas que a fundamentem e por falta do elemento objectivo constitutivo do crime;
52 - E, em consequência NULA a Sentença proferida, por omissão de pronuncia, nos termos do disposto no artigo 379º, n.º 1, alínea c) do C.P.P., e por falta de fundamentação, nos termos do disposto nos artigos 379º, nº 1, alínea a) e 374º, nº 2, do Código de Processo Penal;
53 – No que concerne ao crime de difamação, o Arguido arguiu a nulidade da acusação pública na parte em que a mesma consubstancia uma alteração substancial dos factos descritos na acusação particular (crime difamação), em violação do disposto no artigo 285º, n.º4 do C.P.P.; 54 - E, do mesmo modo, o Tribunal “a quo” indeferindo-a, por entender que tal invocação “é manifestamente imprópria nesta fase processual e extemporânea já que os autos comportaram a fase de instrução e, como tal, nessa sede poderia o arguido ter invocado tal vício e, não tendo feito, fica precludida a sua arguição - artigo 311º, n.º 2, do Código de Processo Penal.”;
55 - Ora, renovamos aqui o alegado supra quanto ao conhecimento das nulidades pelo Juiz de julgamento, quanto às nulidades invocadas na contestação, violando reiteradamente o Tribunal “a quo” os dispositivos vertidos nos artigos 338º, n.º1 e 310º, n.º1 do C.P.P.;
56 - Alegou para tanto o Arguido que, na sua acusação particular, o Assistente o acusa de, alegadamente, “no dia 3 de Fevereiro de 2012, à noite e quando B… se encontrava no restaurante “F…”, sito em …, nesta comarca de Santa Maria da Feira, o arguido, na sequencia de uma conversa sobre o assistente, virou-se para a proprietária do mencionado restaurante, G…, e por forma a ser ouvido por ela e por todos os presentes, como de facto sucedeu, disse que o assistente “era conhecido em Santa Maria da Feira por burlista e chulo”;
57 - E, a Sr.ª Procuradora-Adjunta acompanhando aquela acusação, deduziu a sua acusação, imputando o mesmo tipo de crime, mas alegadamente porque: “no dia 3 de Fevereiro de 2012, à noite e quando B… se encontrava no restaurante “F…”, sito em …, nesta comarca, na sequência de uma conversa acerca de C…, o arguido, dirigindo-se a G…, proferiu a seguinte expressão: “ELE É UM BURLISTA, UM CHULO QUE TEM A MANIA, MAS NÓS VAMOS FODÊ-LO”;
58 - Perante o que, o Tribunal “a quo” entendeu que, “o facto de na acusação pública constar “Ele é um burlista, um chulo que tem a mania, mas nós vamos fode-lo”, ao invés do que consta na acusação particular o assistente “era conhecido em Santa Maria da Feira por burlista e chulo”, não consubstancia naturalmente qualquer alteração substancial, sendo até duvidoso que se trate de uma qualquer alteração de factos”; 59 - Ora, com o devido respeito, com a Acusação define-se e fixa-se o objecto do processo que, por sua vez, delimita os poderes de cognição do Tribunal, o âmbito do caso julgado e, os direitos de defesa do Arguido;
60 - Conforme se referiu, na acusação particular, o assistente acusa o arguido de ter dito à dona do restaurante que o assistente “era conhecido em Santa Maria da Feira por burlista e chulo”;
61 - E na acusação pública vem imputado ao Arguido a prática do crime de difamação por ter proferido a seguinte expressão: “Ele é um burlista, um chulo que tem a mania, mas nós vamos fode-lo”;
62 - Ora, as expressões alegadamente proferidas pelo arguido têm em comum os epítetos “burlista e chulo”, no entanto, na acusação pública a imputação é directa, pessoal, “Ele é um burlista e um chulo”, enquanto na acusação particular a imputação consubstancia a reprodução de um juízo de valor acerca do assistente “era conhecido em Santa Maria da Feira por burlista e chulo”;
63 - Assim, as expressões imputadas ao Arguido na acusação particular, constitui em abstrato a formulação de um juízo de valor, pois comporta uma afirmação que encerra uma apreciação pessoal negativa sobre o carácter da pessoa acerca da qual se subscreve tal juízo, “era conhecido em Santa Maria da Feira por burlista e chulo”;
64 – Enquanto que, na acusação pública, as expressões alegadamente proferidas pelo Arguido encerram em si, uma imputação, a qual tem o significado de atribuir um facto, apresentá-lo como correto ou verdadeiro, segundo a convicção ou perspectiva do Arguido, que assim se identifica com o respectivo conteúdo, atribuindo ao assistente a prática de determinado facto, que lhe ofende a reputação ou o bom-nome, “Ele é um burlista, um chulo que tem a mania, mas nós vamos fode-lo”;
65 - Ora, a distinção é funcional, não podendo ser feita de forma semântica, mas pelo contexto em que ela é proferida. E, no domínio da intenção o legislador exige que haja a especial intenção, o propósito de ofender, sendo bastante a consciência, por parte do agente, de que a sua conduta é de molde a produzir a ofensa da honra e consideração de alguém;
66 - Assim, os factos/expressões imputados ao Arguido na acusação particular, constituem a reprodução de um juízo de valor, enquanto na acusação pública os factos/expressões alegadamente proferidas pelo Arguido encerram em si uma imputação segundo a sua convicção ou perspectiva;
67 - É que para além de carecer de legitimidade para formular acusação por crimes particulares, ilegitimidade que é de conhecimento oficioso, o M.P. ao alterar os termos, factos e expressões alegadamente proferidas pelo Arguido sobre o assistente, alterou substancialmente os factos que vinham descritos na acusação particular;
68 - Alteração substancial que ao nível da consciência, da culpa do Arguido implica alteração quer dos limites das sanções aplicáveis, quer dos seus legítimos direitos de defesa constitucionalmente consagrados, designadamente ao nível das causas de justificação, artigos 180º, n.º2 e 31º do C.P., cujas causas apenas funcionam relativamente à imputação de factos e já não quanto aos juízos de valor;
69 - Pelo que, a acusação pública deduzida pelo M.P., quanto ao crime particular de difamação, deveria ter sido rejeitada por manifestamente infundada e ilegal, em violação do artigo 285º, n.º4 do C.P.P.;
70 - Não a tendo rejeitado, o Tribunal “a quo”, violou ou interpretou incorretamente, para além daquela disposição, ainda o disposto nos artigos 50º, n.º1 e 2, artigo 311º, n.º 2, alínea b) e n.º3 alínea c), todos do C.P.P.;
71 - Sendo NULA a acusação pública ainda, na parte em que acompanha a acusação particular quanto ao crime de difamação, por alterar substancialmente os factos descritos nesta última, nos termos do dispôs no artigo 285º, n.º4 do C.P.P.;
72 - E, em consequência NULA a Sentença proferida, por omissão de pronuncia, nos termos do disposto no artigo 379º, n.º 1, alínea c) do C.P.P., e por falta de fundamentação, nos termos do disposto nos artigos 379º, nº 1, alínea a) e 374º, nº 2, do Código de Processo Penal;
73 - Na sua contestação, o Arguido invocou ainda a nulidade das acusações pública e particular, por não existirem nos autos indícios suficientes da prática do crime particular de difamação imputado ao Arguido, perante a qual, o Tribunal “a quo” omitiu em absoluto qualquer pronúncia;
74 - Ora, as deduzidas acusações decorrem da participação crime que C… apresentou contra H… e B…, em 20.04.2012, que deu origem ao processo n.º 576/12.0TAVFR, e que a 24.04.2012 por despacho da Sr.ª Procuradora-Adjunta foi apensado aos presentes autos - Apenso A;
75 - Mais participou o assistente que: “no dia 17.02.2012, à noite, durante um jantar no restaurante “F…”, em … … o denunciado B… disse: - “…Ele (denunciante) é um burlista e um chulo que tem a mania, mas nós vamos fode-lo”;
76 - Assim, e, não existindo quaisquer outros meios de prova, acusou o assistente o arguido de “no dia 03.02.2012, à noite, durante um jantar no restaurante “F…”, em …, na sequência de uma conversa sobre o aquele, virou-se para a proprietária do mencionado restaurante, G…, e por forma a ser ouvido por ela e por todos os presentes, como de facto sucedeu, disse que o assistente era conhecido em Santa Maria da Feira por burlista e chulo”;
77 - Acusação acompanhada pelo Ministério Publico, que no entanto, alterando substancialmente os factos, acusa o arguido de “ no dia 3 de Fevereiro de 2012, à noite quando se encontrava no restaurante “F…”, sito em …, nesta comarca, na sequência de uma conversa acerca de C…, dirigindo-se a G…, proferiu a seguinte expressão: “ELE É UM BURLISTA, UM CHULO QUE TEM A MANIA, MAS NÓS VAMOS FODE-LO”;
78 - Ora, não existem nos autos de inquérito, qualquer meio de prova que comprove suficientemente, qual a data da alegada prática dos factos, qual de entre as expressões referidas (“que o assistente era conhecido em Santa Maria da Feira por burlista e chulo” ou “ELE É UM BURLISTA, UM CHULO QUE TEM A MANIA, MAS NÓS VAMOS FODE-LO”) foi de facto proferida pelo arguido, e ainda a quem foi a mesma dirigida e por quem foi ouvida;
79 - Assim, verificando-se ausência de elementos probatórios que comprovem alguma das versões apresentadas pelo assistente, não vislumbrando qualquer juízo de convicção que possa ser confirmado em julgamento, constata-se a inexistência de indícios suficientes que comprovem a acusação deduzida;
80 - Porquanto os elementos existentes nos autos não são suficientes para preencher o conceito de indícios suficientes nos termos dos artigos 283º, n.º2 e 285º, n.º2 ambos do C.P.P., não sendo suficiente para a sua verificação a versão apresentada pelo assistente, sem qualquer outra base probatória;
81 - Não o tendo feito, devem as referidas acusações serem rejeitadas por manifestamente infundadas – artigo 283º, n.º1 e n.º2, 285º, n.º2, 311º, n.º2, alínea a) e n.º3, alíneas c) e d), todos do C.P.P.;
82 - E, em consequência NULA a Sentença proferida, por omissão de pronuncia, nos termos do disposto no artigo 379º, n.º 1, alínea c) do C.P.P., e por falta de fundamentação, nos termos do disposto nos artigos 379º, nº 1, alínea a) e 374º, nº 2, do Código de Processo Penal;
83 - Por outro lado, e conforme foi alegado em sede de contestação, o Tribunal “a quo” constatou a circunstância de os factos narrados na acusação terem alegadamente ocorrido em 03/02/2012, e de acordo com a queixa apresentada pelo assistente os mesmos factos terem ocorrido em 17/02/2012;
84 - A qual, consubstancia ainda a inexistência de queixa quanto aos factos descritos na acusação particular;
85 - No entanto, pronunciando-se, o Tribunal “a quo” argumenta que “no caso dos autos, os factos constantes da acusação pública são exatamente aqueles que já constavam da queixa apresentada pelo assistente. Contudo, na acusação particular consta que esses factos terão ocorrido em 03/02/2012, enquanto na participação os mesmos situar-se-iam em 17/02/2012.”;
86 - E conclui que, “os factos constantes da acusação particular encontram correspondência integral na queixa apresentada, salvo quanto à data dos mesmos, que de acordo com a investigação, e depois, com a instrução, ter-se-á fixado num dia distinto daquele que inicialmente se referia. Contudo, esses factos correspondem ao mesmo “pedaço de vida” que esteve na origem do processo.”;
87 - Ora, não poderemos concordar com tal posição propagada pelo Tribunal “a quo”, pois que, “a verificação da condição de procedimento estabelecida para os crimes particulares, ínsita no art. 50º, nº 1 do C. Processo Penal pressupõe a correspondência entre o facto transmitido na queixa e o facto levado à acusação.”;
88 - Não tendo a questão da condição de procedimento, in casu, da legitimidade para o procedimento, sido conhecida no despacho proferido nos termos do art. 311.º do C. Processo Penal, não existe caso julgado formal sobre ela;
89 - E, nos termos do disposto no art. 595.º, n.º 3 do C. Processo Civil, aplicável ex vi, art. 4.º do C. Processo Penal, aquele despacho só constitui caso julgado formal quanto às questões concretamente apreciadas;
90 - Pelo que, deveria o Tribunal “a quo” conhecendo da questão suscitada, ter por não verificada a condição de procedimento e, em consequente, ter rejeitado a acusação particular por manifestamente infundada; Não o tendo feito, violou o Tribunal “a quo” o disposto no artigo 311º, n.º2, alínea a) e n.º3 alínea b) do C.P.P.;
91 - Por outro lado, o Arguido em sede de inquérito nunca foi confrontado com o dia 03/02/2012 como a data da alegada prática do imputado crime de difamação na pessoa do assistente;
92 - Pois que, aquando do interrogatório complementar realizado a 12.10.2012, foi confrontado com os factos vertidos na queixa apresentada pelo assistente de que “no dia 17.02.2012, à noite, durante um jantar no restaurante “F…”, em …, desta comarca … o denunciado B… disse: - “…Ele (denunciante) é um burlista e um chulo que tem a mania, mas nós vamos fode-lo”;
93 - E logo a 29.10.2012, o assistente deduziu acusação particular contra o Arguido, acusou-o de “no dia 03.02.2012, à noite, durante um jantar no restaurante “F…”, em …, na sequência de uma conversa sobre o aquele, virou-se para a proprietária do mencionado restaurante, G…, e por forma a ser ouvido por ela e por todos os presentes, como de facto sucedeu, disse que o assistente era conhecido em Santa Maria da Feira por burlista e chulo”;
94 - Verificando-se a falta de queixa do assistente contra o Arguido pelos factos vertidos na acusação particular;
95 - Procedimento que determina a nulidade insanável do inquérito, no termos do artigo 119º, alínea d) do C.P.P., a qual é de conhecimento oficioso;
96 - Invocou o Arguido ainda em sede de contestação a excepção de ilegitimidade do assistente para deduzir pedido de indemnização civil contra o si pelo imputado crime de falsidade de testemunho;
97 - Em face da qual, o Tribunal “a quo” declarando o assistente parte legitima relativamente ao pedido de indemnização civil, improcedendo assim, a excepção invocada;
98 - Ora, como se antevê, a questão invocada em sede de contestação, em nada se assemelha com a decisão proferida por este Douto Tribunal da Relação;
99 - Vejamos, recorreu o Arguido da constituição de C… como assistente após ter sido notificado do pedido formulado por aquele no âmbito do processo n.º 576/12.0TAVFR, o qual viria a ser apensado aos presentes autos;
100 - Desconhecendo em absoluto o aqui Arguido, qual o objecto do referido processo à data, designadamente, o conteúdo da participação criminal deduzida por C…;
101 - No entanto, do despacho recorrido que veio a ser mantido, decorre que, “por ter legitimidade (em face dos ilícitos denunciados e sua natureza), …, admito C… a intervir nos autos na qualidade de assistente.”;
102 - Sendo que a referência à sua natureza não é em vão;
103 - Pois que, soube-o mais tarde o Arguido, o assistente denunciara crimes de natureza particular, difamação e denúncia caluniosa, e é com base nesta factualidade que, e em face da queixa apresentada a 20 de Abril de 2012, requereu, o aqui, assistente como tal a sua constituição; 104 - Motivo pelo qual, o Douto Despacho recorrido e o Douto Acórdão que o manteve, faz referência aos ilícitos denunciados e à sua natureza para fundamentar o motivo pelo qual admitiu a constituição como assistente em causa, o qual foi proferido na fase inicial de inquérito, onde se exige apenas uma análise perfunctória no sentido de saber se, perante os factos participados, o requerente se inclui numa das categorias elencadas no artigo 68º do CPP.;
105 - A decisão que admite o Assistente não forma caso julgado sobre a legitimidade dessa intervenção, vigorando a este respeito o princípio rebus sic stantibus;
106 - Diferentemente, é a questão suscitada pelo Arguido, na sua contestação, ao invocar a excepção de ilegitimidade do assistente para deduzir pedido de indemnização civil contra o Arguido pela alegada prática do crime de falsidade de testemunho;
107 - No crime de falsidade de testemunho (artº 360º CP) o interesse protegido é essencialmente a realização ou administração da justiça como função do Estado; ali se protege, exclusivamente, um interesse público e não já outro de cariz pessoal;
108 - Sendo certo que a falsidade de depoimento se repercute directamente na esfera jurídica da pessoa que o agente dolosamente visou prejudicar, causou ou procurou causar prejuízo aos interesses particulares de determinada pessoa, então, a esta deve ser reconhecida legitimidade para intervir como assistente no respectivo processo penal, enquanto titular dos interesses que a lei penal tem - também - especialmente por fim proteger;
109 - Ora, nos presentes autos, não se verifica a especial relação imediata e estreita entre a qualidade de testemunha do aqui Arguido no âmbito do processo n.º 1152/11.0TAVNF, e o aqui assistente, arguido que foi no âmbito do referido processo;
110 - A qual apenas se verificaria se o aqui Arguido fosse a denunciante (H…) daquele processo 1152/11.0TAVNF;
111 - Ao que acresce, que aqueles autos de inquérito terminaram com o Arquivamento da denúncia ali apresentada contra o aqui assistente; 112 - Assim sendo, e em face do exposto, não se verificando os pressupostos da legitimidade e interesse em agir do assistente para, em face do crime de falsidade de testemunho, deduzir o pedido de indemnização civil formulado contra o aqui Arguido;
113 - Pelo que, ao ter declarado o aqui assistente parte legitima relativamente ao pedido de indemnização civil formulado contra o Arguido pelo crime de falsidade de testemunho, violou o Tribunal “ a quo” o disposto nos artigos 68º, n.º1 alínea a), 74º, n.º1 ambos do C.P.P., e ainda o artigo 113º, n.º1 do C.P.;
Sem prescindir,
114 – A Douta Sentença está, salvo o devido respeito por opinião contrária, ainda ferida de vícios que a invalidam;
115 - Ora, o Tribunal “a quo” deu como provados factos que, no decorrer do julgamento e da prova produzida, imponham decisão contrária; 116 - Ora, analisando as declarações prestadas pelo assistente e pelas testemunhas D… e I…, não poderia o Tribunal “a quo” ter dado provado designadamente o ponto 7) dos factos provados;
117 - Nas suas declarações o assistente demonstra não ter certeza dos factos, afirmando inúmeras vezes não se recordar e não saber as datas; 118 - Porém, e no que concerne à hora que alegadamente saiu sozinho de casa da testemunha D…, é perentório em afirmar que foi às 02h00;
119 - Ora, não poderemos deixar de constatar das mais elementares regras da experiencia comum e da normalidade que, o assistente de modo a afastar qualquer suspeita sobre os factos investigados no inquérito n.º 1152/11.0TAVNF, e conhecedor do depoimento enquanto testemunha ali prestado pelo aqui Arguido, apesar de não se recordar que tinha estado na festa de aniversário da testemunha D…, se recordar, no entanto, da hora que a festa terminou para si;
120 - Fazendo assim crer ao Tribunal “a quo” os factos que de antemão sabia serem pertinentes, não esquecendo que o assistente é advogado e tem conhecimentos técnicos que lhe permitem saber o sentido e alcance das afirmações que proferia;
121 - Por outro lado, o Tribunal “a quo” na sua motivação afirma que o assistente só mais tarde aquando da elaboração da denúncia de folhas 2 a 11 do apenso n.º 576/12.0TAVFR se apercebeu como podia provar a sua inocência dos factos que lhe eram imputados pela denunciante no inquérito n.º 1152/11.0TAVNF e que teriam sido presenciados pelo ora arguido;
122 - Ora, lendo a denúncia de folhas 2 a 11 do apenso n.º 576/12.0TAVFR, constata-se que o assistente não faz qualquer referência, directa ou indiretamente, ao local onde alegadamente estaria no dia 27.09.2011;
123 - Contradições que o Tribunal ignorou, fazendo errada valoração das declarações do assistente, ao dar os pontos 6) e 7) como provados; 124 - Por outro lado, ignorou completamente a relação existente entre o assistente e o “confidente”, a testemunha D…;
125 - Ora, a única testemunha que declarou que o assistente saiu de sua casa já bastante tarde, depois das 02h00, foi precisamente a testemunha D…, confidente do assistente, não podendo ignorar o Tribunal “a quo” que também esta testemunha é advogado;
126 - E os elementares juízos de experiencia e da normalidade dizem-nos que após terem conhecimento das declarações prestadas pelo aqui Arguido na qualidade de testemunha no âmbito do processo 1152/11.0TAVNF, onde o aqui assistente, na qualidade de arguido se limitou a negar os factos que lhe foram imputados, é logico que o assistente e a única testemunha D… declarassem que aquele saiu do festejo em casa deste depois da 00h00, afastando deste modo qualquer suspeita sobre os factos investigados no inquérito n.º 1152/11.0TAVNF;
127 - Ora, o assistente declarou que só se recordara de onde estaria no dia 27 de Setembro de 2011, entre as 19h30 e as 02h00, quando “faço o pedido de indemnização cível e que meto o Dr. D… como testemunha e é ele quem me dá conhecimento”;
128 - Pedido de indemnização cível que foi deduzido após a dedução das acusações particular e públicas, e depois das referidas testemunhas (D… e I…) ter prestado declarações no âmbito do inquérito;
129 - Ora, pelo exposto, o Tribunal “a quo” não poderia ter dado como provados os factos supra referidos, pois que, quer das declarações do próprio assistente quer da denúncia de folhas 2 a 11 do apenso 576/12.0TAVFR, referida na motivação do Tribunal resulta contradição entre a prova produzida e os factos dados como provados;
130 - Em face do que, não poderia o Tribunal “a quo” de forma límpida e convicta dar como assente os factos vertidos nos pontos 6) e 7), considerando para tal que o assistente se apercebeu que na data dos factos em causa estaria na festa de aniversário de um colega advogado aquando da elaboração da denúncia de folhas 2 a 11 do apenso 576/12.0TAVFR, se o assistente referiu que foi quando fez o pedido de indemnização cível e o mostrou ao Dr. D… que o alertou para onde aquele tinha estado;
131 - Então quando teve o assistente consciência de que afinal tinha estado no dia 27 de Setembro de 2011 na festa de aniversário do Dr. D…? Terá sido aquando da elaboração da denúncia de folhas 2 a 11 do apenso 576/12.0TAVFR ou do pedido de indemnização cível?
132 - E, analisando quer a referida denúncia, quer o referido pedido de indemnização cível, dos mesmos não resulta vertido qualquer facto que permita concluir como concluiu o Tribunal “a quo”, porquanto, que o assistente na data dos factos em causa estava na festa de aniversario da testemunha D…;
133 - Por isso, o Tribunal “a quo” considerando para a sua motivação factos ou acontecimentos que não tiveram correspondência com qualquer meio de prova produzida em audiência, errou na sua apreciação, vicio que constitui fundamento para revogação da sentença recorrida;
134 - Ora, a circunstância especial que motivou o Tribunal “a quo” para, designadamente, dar como provado que o depoimento prestada na qualidade de testemunha pelo ora arguido “não corresponde à verdade dos factos”, não constitui prova ou meio de prova dos factos dados como provados, pois que, nunca a falta de prova de um facto, pode ser considerada como prova de outro;
135 - Isto é, o facto de na denúncia apresentada pela queixosa no processo 1152/11.0TAVNF aquela não ter relatado que o ora arguido viu o individuo que teria depositado o referido CD no jardim da habitação e que seria capaz de o reconhecer, não prova que as declarações prestadas pelo arguido não correspondem à verdade;
136 - Apenas prova que a denunciante não relatou que o arguido viu o indivíduo que depositou o CD no jardim da habitação;
137 - De igual modo, a estreita ligação que unia e une o arguido à denunciante, não prova que esta tinha conhecimento de que o arguido tinha visto o indivíduo que depositou o CD no jardim da habitação;
138 - E, mesmo que a denunciante tivesse aquele conhecimento, daí tê-lo indicado como testemunha, não prova que o arguido tenha faltado à verdade nas suas declarações, prestadas logo que para tal foi notificado, sendo completamente alheio e isento de qualquer responsabilidade que, as mesmas tenham sido prestadas cerca de 3 meses e meio depois (13.01.2012) da denúncia apresentada (28.09.2011), e não como refere o Tribunal a quo “quase meio ano volvido do início do processo”;
139 - Circunstância que o Tribunal “a quo”, no entanto, entendeu não ter ficado dissipada no julgamento e que, a dúvida levaria a considerar não provados os referidos factos, pontos 6) e 7) tendo em conta ainda as declarações prestadas pela testemunha Dr.ª H…; 140 - Ora, resulta assim, da prova produzida, que o Arguido a ter prestado falsas declarações como testemunha no âmbito do proc. 1152/11.0TAVNF, seria porque a denunciante naqueles autos não referiu que o ora Arguido tinha visto o individuo que teria depositado o referido DVD-R no jardim da sua residência, e não, porque se apurou que no mencionado dia e hora, C… se encontrava na residência de D… a comemorar o aniversário deste;
141 - Assim, é gritante a violação pelo Tribunal “a quo” das regras sobre a valoração da prova vinculada, ao dar como provados os factos vertidos nos pontos 6) e 7), o que acarreta a NULIDADE da Sentença;
142 - Como deveria ter dado o Tribunal “a quo” como não provado que o Arguido “quando prestou o seu depoimento nos termos supra descritos, o arguido tinha perfeito conhecimento de que o por si afirmado não correspondia à verdade.”;
143 - E ainda como não provado que o “Arguido agiu de vontade livre e consciente, com o propósito de, através do seu depoimento não correspondente à verdade dos factos, conseguir demonstrar que havia sido, de facto, o ora assistente a deixar o mencionado DVD-R no jardim da sua residência, bem sabendo que a sua conduta era proibida e punida por lei.”;
144 - Desde logo, por ausência absoluta de prova vinculada do elemento subjectivo do tipo de crime imputado;
145 - Ora, não ficou demonstrado por qualquer meio de prova produzido em audiência que o arguido conhecia e tinha consciência da imputada falsidade dos factos sobre que depôs enquanto testemunha no processo 1152/11.0TAVNF;
146 - Aliás, como supra se alegou, não se verificam preenchidos nem o elemento objectivo, nem o elemento subjectivo do tipo de crime imputado ao Arguido;
147 - Na verdade, o Arguido aquando das suas declarações relatou, enquanto testemunha, a perceção que teve da realidade que presenciou; 148 - E não tendo ficado provado que o Arguido quando prestou as suas declarações, sabia que o assistente estava na festa de aniversário da testemunha D…, tem-se por não verificado ou comprovado os factos alegados na acusação pública quanto ao elemento subjectivo;
149 - Pelo que, ao dar como provados tais factos, o Tribunal “a quo”, não só violou todas as regras de valoração da prova, como ainda atentou contra os mais elementares princípios do processo penal, ao condenar o Arguido sem provas;
150 – E relativamente à acusação particular, alicerçou-se o Tribunal “a quo” nas declarações prestadas pelo assistente C… e no depoimento prestado pela testemunha G…, e, por outro lado, quanto aos mesmos factos, resultou para o Tribunal “a quo” a inveracidade do depoimento da testemunha J…;
151 - Considerando positivamente o facto de espontânea e frontalmente a testemunha G… ter reconhecendo, a sua relação próxima de amizade e de cliente/advogado com o assistente (de resto, também o assistente havia logo assumido tal estreita ligação) e evidenciando um discurso visivelmente agastado e pesaroso, a testemunha de forma que se afigurou credível porque pormenorizada e vivida, narrou o episódio em apreço que também protagonizou (já que as locuções em causa foram-lhe transmitidas), fundadamente apontando o enquadramento espácio-temporal (na Sexta-feira entre o aniversário do seu marido -02/02 - e o aniversário do assistente -05/02) relato tanto mais credível quando considerado o arrependimento (que pareceu sincero pela sua inadequação) pela mesma manifestado em ter contado o sucedido ao assistente, por tudo ter culminado no julgamento no âmbito dos presentes autos;
152 - E, pelo contrário, e negativamente, a reconhecida estreita relação familiar e de amizade que une a testemunha J… ao arguido (é prima e amiga de longa data do arguido) e bem assim à sua mulher;
153 - Pois que, “o modo como foi prestado tal depoimento que deixou antever uma clara exercitação do mesmo, referindo pormenores que de antemão sabia serem pertinentes, querendo fazer crer que tinha uma memória absolutamente extraordinária, recordando-se, por exemplo, das pessoas com quem tinha estado a jantar no restaurante “O F…” nesse dia, dos motivos pelos quais o arguido não tinha ido, recordando-se da data do aniversário da sua mãe, e da data da comemoração do aniversário, e da ida do filho do arguido a esse festejo. Mais quis fazer querer ao tribunal nada ter contra a testemunha G…, o que muito se estranha, já que na sua perspectiva aquela teria imputado factos falsos e prejudiciais ao seu primo e grande amigo, o ora arguido, quando sabia não serem verdadeiros.”;
154 - E, não obstante, as declarações prestadas pelo Arguido, onde “referiu que a menção do dia 3 na acusação será um lapso, já que da participação consta o dia 17. De resto, disse ser cliente habitual do restaurante “O F…”, ali jantando quase todas as sextas-feiras, sendo normal conversar com a dona do restaurante, G…, quando a mesma se sentava à mesa consigo e com os demais. Quanto ao referido dia 3, negou ter estado sequer no restaurante, já que esteve em …, a jantar num outro restaurante, entre as 20H00 e as 23H00, juntamente com o seu filho, a sua mulher e os seus pais, já que se tratava da comemoração do aniversário da sua mãe. Mais referiu nunca ter proferido as palavras mencionadas na acusação relativamente ao ofendido”;
155 - O Tribunal a quo não fez qualquer análise critica a este meio de prova, e muito menos o valorizou;
156 - Analisando criticamente as referidas declarações produzidas em sede de audiência de julgamento, não se vislumbra da motivação os fundamentos para que o Tribunal “a quo” tenha tido dois pesos e duas medidas na ponderação e valoração da referida prova;
157 - Voltando aos factos dados como provados, errou o Tribunal “a quo” na sua apreciação, pois da prova produzida imponha outro desiderato;
158 - Ora, do que acaba de se transcrever supra, e das declarações prestadas pelas duas testemunhas com conhecimento directo sobre os factos, G… e J…, resulta claramente que, por um lado, a amiga e cliente do assistente relatando uma conversa mantida com o Arguido no dia 3 de Fevereiro de 2012, imputando-lhe a autoria da seguinte expressão, referindo-se ao assistente: “sabias que o teu advogado que era conhecido por chulo e burlista?”;
159 - E, por outro lado, a prima e amiga do Arguido reportando-se ao mencionado dia, referiu que o Arguido não foi naquele dia jantar ao F…, pois “…a mãe do B… faz anos a 31/01. Então o que é que acontece? Ele, se o aniversário calha ao início da semana ou a meio da semana, como o filho dele anda na escola, eles passam sempre esse jantar para o fim-de-semana, à sexta-feira ou ao sábado. Eu lembro-me, nessa altura - pronto, posso falar que ainda a semana passada tivemos num casamento e estivemos a falar - o Sr. B… andava em litígio com a companheira dele para ter visitas do filho mais assiduamente já que ela proibia o filho de vir visitar os avós e quando a I… fez anos…”; 160 - No entanto, e ao arrepio de todas as regras e princípios de valoração da prova, entendeu o Tribunal “a quo” dar como provado que: “No dia 3 de Fevereiro de 2012, à noite, durante um jantar no restaurante “O F…”, sito em …, Santa Maria da Feira, o arguido B…, na sequencia de uma conversa sobre o assistente, virou-se para a proprietária do mencionado estabelecimento, G…, e de forma a ser ouvido por ela e por todos os presentes disse que o assistente era conhecido em Santa Maria da Feira como “burlista e chulo”;
161 - Considerando por um lado credível as declarações prestadas pela testemunha G…, e ao invés considerando a inveracidade do depoimento da testemunha J…, por alegadamente se ter recordado de pormenores que de antemão sabia serem pertinentes, querendo fazer crer que tinha uma memoria absolutamente extraordinária, recordando-se, por exemplo, das pessoas com quem tinha estado a jantar no restaurante “O F…” nesse dia;
162 - Entendemos que o relato da referida testemunha no que concerne quer à referência da data do aniversario da sua prima, mãe do Arguido, a 31 de Janeiro, e ainda a referência ao litigio que nessa altura o Arguido mantinha com a mãe do seu filho, K…, encontrando-se por fixar as responsabilidades parentais, impossibilitando o Arguido de estar com a seu filho, designadamente em datas festivas como a do aniversario da sua mãe, como não poderia deixar de ser, é DE FACTO, DIGNO DE NOTA E DE RELEVO, como ditam as regras da experiencia comum e da normalidade;
163 - Assim, e em face da prova produzida, imponha-se ao Tribunal “a quo” concluir pela improcedente da acusação particular, dando como não provados os factos supra referidos, pontos 10) a 12), pois que, perante a dúvida irremediável, o arguido beneficiaria sempre da aplicação do princípio do in dubio pro reo;
164 - “O princípio in dubio pro reo só é desrespeitado quando o Tribunal, colocado em situação de dúvida irremovível na apreciação das provas, decidir, em tal situação, contra o arguido - Ac. do Supremo Tribunal Justiça de 18/3/98 in Proc. 1543/97.”;
165 - Perante o que, a decisão tinha de ser a absolvição do Arguido;
166 - Pelo que, violou o Tribunal “a quo” o disposto no artigo 127º do C.P.P., bem como o princípio do in dubio pro reo, enquanto corolário do princípio da presunção da inocência, consagrado no artigo 32º, n.º2, 1ª parte da CRP. Erro notório e imperdoável na apreciação da prova, que invalida a sentença recorrida;
167 – No que concerne aos pedidos de indemnização civil deduzidos pelo assistente, entendeu o Tribunal “a quo” que quanto à matéria vertida nos pedidos de indemnização civil foi tomado em consideração o teor das certidões extraídas do processo de inquérito n.º 1152/11.0TAVNF, dos Serviços do Ministério Público de Santa Maria da Feira, acima referidas, e das cópias extraídas dos mesmos autos, juntas de folhas 287 a 291 e 486 a 487, 491 a 493, 497, mormente quanto à realização das mencionadas buscas e bem assim à incidência que o depoimento do ora arguido necessariamente teve na promoção e ulterior determinação daquelas buscas;
168 - Analisada a prova produzida em audiência resulta, salvo o devido respeito, como não provado, designadamente que a diligência de buscas foi efectuada na sequência das declarações prestados pelo aqui Arguido enquanto testemunha;
169 - Ora, do que se acaba de transcrever é evidente que as buscas foram promovidas pela Procuradora-Adjunta titular do inquérito, testemunha Dr.ª L…, e ordenadas pela Juiz de instrução, não existindo nenhum meio de prova de onde se afirme que as declarações do Arguido enquanto testemunha no processo 1152/11.0TAVNF, contribuíram para a sua determinação;
170 - Pelo que, errou uma vez mais o Tribunal a quo na apreciação da prova produzida em julgamento, dando como provados factos sobre os quais foi feita prova em contrário;
171 - Não tendo ficado provado de que modo e através de quem foi difundida a noticia daquelas buscas ao assistente;
172 - Aliás, nas suas declarações o assistente imputa a sua determinação e realização à denunciante do processo de inquérito n.º 1152/11.0TAVNF;
173 - De igual modo, os factos dados como provados pelo Tribunal “a quo” no que concerne aos danos não patrimoniais sofridos pelo assistente, responsabilizando o arguido pela vergonha, humilhação e indignação sofrida pelo ofendido em ambas as situações quando delas teve conhecimento, bem como os sentimentos de revolta e injustiça que perturbaram à data e posteriormente o sono, a capacidade de trabalho e a disposição para a vida social do assistente;
174 - Pois que, como confessado pelo próprio assistente, que imputa a responsabilidade de todo o processo, incluindo as buscas de que foi alvo, à “Sra. Dra. H…”, e não ao Arguido;
175 - Pelo que, deu o Tribunal “a quo” como provado factos que não têm assento em nenhum meio de prova produzido em audiência, antes pelo contrário, pelo que tais factos deveriam ter sido dados como não provados, errando assim na apreciação da prova;
176 - Não se vislumbrando qualquer responsabilidade civil do aqui arguido no que concerne ao imputado crime de falsidade de testemunho, alias, que como se deixou referido supra, carece de legitimidade o assistente para o deduzir;
177 - Por tudo o exposto, não restam a V. Ex.as, aplicando o Direito, revogar a sentença Nula proferida pelo Tribunal “a quo”, e absolver o Arguido.
Termina pedindo que seja dado provimento ao presente recurso e, por via dele, revogada a sentença recorrida, tudo com as legais consequências.»
*
Admitido o recurso por despacho constante de fls. 1203, o Mº Pº na primeira instância ofereceu a sua resposta, conforme fls. 1210 a 1236.
Questão prévia da legitimidade de apresentação de resposta ao recurso pelo MP.
O recorrente veio a fls. 1246 a 1252 dos autos [com os mesmos argumentos e idênticos pedidos a fls. 1266 e 1267 relativamente ao parecer do Exmº PGA] pedir se julgue verificada a ilegitimidade do MP para oferecer resposta ao recurso, cuja rejeição solicita, por o MP junto da primeira instância e nas alegações orais ter defendido a absolvição do arguido relativamente ao crime de difamação.
Vejamos.
Em causa quer na resposta quer no Parecer do MP, trata-se de posições processuais meramente facultativas e não vinculativas, pelo que se entende não se colocar qualquer questão de legitimidade e/ou interesse em agir nos termos que decorrem do decidido no Ac. de fixação de jurisprudência n.º 2/2001, pois não estamos perante recurso do MP sobre decisão concordante com posição por si assumida no julgamento.
Visto que em causa estão mera resposta e parecer e sobre recurso do arguido [recorde-se que o MP acompanhou, a acusação particular pelo crime de difamação, com descrição dos respectivos factos na acusação pública], entendemos que o MP tem legitimidade para apresentação da sua resposta como decorre do disposto do art. 411, n.º 6, em conjugação com o artigo 413, n.º1 do CPP, tendo-se até em atenção que não obstante a sua tomada de posição em audiência, o MP pode ter-se deixado convencer pela argumentação da sentença.
E do mesmo passo a legitimidade do Ministério Público nesta instância para oferecer o seu parecer, conforme decorre do disposto no artigo 416º do CPP em conjugação com o artigo 417º do CPP.
Pelo exposto, admite-se a resposta oferecida pelo Ministério Público junto do tribunal na primeira instância e o Parecer do Exmº PGA.
*
Posto o acabado de decidir, o MP rematou a sua resposta com as seguintes conclusões:
«1. Incidindo o recurso sobre a decisão da matéria de facto que o recorrente impugnou aludindo ao teor do depoimento prestado quer pelas testemunhas quer pelo arguido a que foi contraposto, impunha-se-lhe, dada a documentação da prova em audiência, dar cumprimento ao ónus de nas conclusões apresentadas apontar especificadamente, as provas que impõem decisão diversa da recorrida e as que deveriam ser renovadas, em conformidade com os termos do art. 412º, nº 3 e 4 do C.P.P., não sendo de conhecer o recurso nesta parte que se reconduz à sua rejeição, nos termos do art. 420º, nº 1 do C.P.P.;
2.-A impugnação da decisão em matéria de facto do recorrente assenta, em concreto, numa diferente valoração dos elementos objectivos colhidos na produção da prova situando a sua pretensão no âmbito da censura da formação da convicção do tribunal “a quo”, postergando o princípio da livre apreciação da prova, consagrado no artº 127º do C.P.P., pelo que se impõe a rejeição do recurso por manifestamente improcedente, nos termos do artº 420º, nº 1 do C.P.P.;
3.- Não se vislumbrando que da sentença “sub judice” resulte a violação do teor dos arts. 374º, nº2 e 379° do C.P.P., pois se mostra devidamente fundamentada, contendo os factos e a exposição dos motivos que fundamentam a decisão, assentando a formação da convicção numa opção do julgador na base da imediação e da oralidade, que apenas é susceptível de crítica se se demonstrar que é inadmissível face às regras da experiência comum, o que não logrou fazer o recorrente nenhuma razão se lhe reconhece na sua pretensão de pugnar por decisão diversa da proferida;
4.- O recurso da matéria de facto não visa a reapreciação de toda a prova produzida nos autos, como se de um segundo julgamento se tratasse, mas apenas a detecção e correcção de erros de julgamento, incidindo sobre pontos determinados da matéria de facto, que o recorrente deveria apontar claramente e fundamentar na sua motivação, mas não por invocação da sua própria apreciação da prova produzida;
5.- Enunciados pelo recorrente nas conclusões de recurso do vício da sentença do artº 410º, nº 2, al. c) do C.P.P., mas referenciados ao registo da prova produzida em audiência, é evidente a sua inverificação uma vez que para o seu conhecimento necessário é que estes resultem do texto da própria decisão recorrida, por si ou conjugada com as regras da experiência comum, o que o recorrente não logrou demonstrar.
6.- A alegada violação do princípio “in dúbio pro reo” - consagrado no artº 32º do C.R.P. - pressupõe um estado de dúvida no espírito do julgador que só pode ser afirmada quando, do texto da decisão recorrida, se constata, por forma evidente, que o tribunal, na dúvida, optou por decidir contra o arguido, o que se não verifica na sentença “sub judicie”, pelo que não assiste razão ao recorrente quanto a tal invocação;
7.- A factualidade que resultou provada em audiência e tal como imputada à sua autoria do recorrente configura o crime de falsidade de testemunho, por verificados os elementos objectivos e subjectivos deste tipo legal pelo qual foi condenado, outra não podendo ser a sentença proferida, sem que se verifique violação dos termos do art.º 360º do Código Penal.
8.- Da sentença como da acusação pública e da particular não se vislumbra resultar qualquer das nulidades invocadas pelo recorrente quer seja por falta de fundamentação, que se não impõe em sede de acusação, quer seja por omissão de pronúncia face ao preceituado nos art.º 338º, nº 1 e 310º como art.º 374º e 379º, nº 1 al. a), ou do art.º 40º e 43º todos do C.P.P., não se revelando haver fundamento para alterar os termos da sentença e condenação do arguido nos termos fixados na decisão ora em causa;
9.- A prova produzida não impõe decisão diversa da recorrida, razão pela qual são de improceder todas as conclusões do recurso interposto pelo arguido, não merecendo censura a decisão recorrida, e não existindo, portanto, fundamento para a sua modificação, pelo que não vislumbrando decorrer da Douta Sentença recorrida qualquer vício ou nulidade, é, o recurso apresentado de julgar improcedente, por infundado, e, manter integralmente o teor da decisão.
Termina pedindo que, por manifesta improcedência, seja negado provimento ao recurso e mantida a decisão judicial proferida pelo M.mo Juiz do Tribunal a quo.»
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Nesta Relação o Exmo. PGA pugnou pela improcedência do recurso.
Foi cumprido o art. 417º, n.º2, do CPP.
Colhidos os vistos cumpre apreciar e decidir.
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II- Fundamentação.
Como é jurisprudência assente, sem prejuízo das questões de conhecimento oficioso – vícios decisórios e nulidades referidas no artigo 410.º, n.º s 2 e 3, do Código de Processo Penal – é pelas conclusões que o recorrente extrai da motivação apresentada, em que sintetiza as razões do pedido (artigo 412.º, n.º 1, do CPP), que se delimita o objecto do recurso e os poderes de cognição do Tribunal Superior.
1.-Questões a decidir
Face às conclusões extraídas pelos recorrentes da motivação apresentada são as seguintes as questões a apreciar e decidir:
- Nulidade da sentença por quebra do dever de imparcialidade - art. 41º n.º 3 do CPP- a Sra. Juiz que fez o novo julgamento conheceu e reproduziu a sentença anterior resultante do julgamento anterior anulado pela Relação (conclusões 3 a 21)
- Violação do disposto nos artigos 338º n.º1 e 310º n.º 1, ambos do C.P.P. por considerar extemporânea e infundada a invocada nulidade da acusação pública – ou falta de fundamentação da acusação - pelo crime de falsidade de testemunho, arguida na contestação (conclusões 22 a 29);
- Nulidade da acusação pública, por insuficientemente infundada, por absoluta ausência de provas que a fundamentem, por falta do elemento objectivo constitutivo do crime; nulidade consequente da “sentença proferida, por omissão de pronúncia, nos termos do disposto no artigo 379º, n.º 1, alínea c) do C.P.P., e por falta de fundamentação, nos termos do disposto nos artigos 379 n.º 1, alínea c) do C.P.P., e por falta de fundamentação, nos termos do disposto nos artigos 379º n.º 1 alínea a) e 374.º, n.º 2, do Código de Processo Penal (conclusões 30 a 52).

- Nulidade da acusação pública no acompanhamento da acusação particular pelo crime de difamação, por alteração substancial dos factos descritos nesta - violação do disposto no art. 285.º n.º 4 do CPP e consequente nulidade da sentença proferida, por omissão de pronúncia, nos termos do disposto no artigo 379º, n.º 1, alínea c) do CP.P. e por falta de fundamentação, nos termos do disposto nos artigos 379º, n.º 1, alínea a) e 374.º, n.º2 do Código de Processo Penal (conclusões 53 a 73).
- Não rejeição da acusação particular e pública na parte em que a acompanha por falta de indícios suficientes - arts. 283º nºs 1 e 2, 285º n.º2 e 311º, nºs 2 e 3 als. e) e d) do CPP – e, por isso nulidade da sentença proferida, por omissão de pronúncia, nos ternos do disposto no artigo 379º, n.º 1, alínea c) do C.P.P. e por falta de fundamentação, nos termos do disposto nos artigos 379º, n.º1, alínea a) e 374º, n.º 2 do Código de Processo Penal (conclusões 74 a 82);
- Nulidade da sentença por omissão de pronúncia quanto à invocada inexistência de queixa pelo crime de difamação e, por isso, nulidade insanável do inquérito, nos termos do artigo 119º, alínea d) do C.P.P. de conhecimento oficioso que impõe dever ser o Assistente considerado parte ilegítima (conclusões 83 a 105);
- Ilegitimidade do assistente para deduzir pedido cível contra o Recorrente pelo crime de falsidade de testemunho - violação do disposto nos artigos 68º, n.º1, al. a) e 74.º, n.º 1, ambos do C.P.P., e ainda o artigo 113º, n.º 1 do C.P. (conclusões 106 a 113);
- Impugnação da matéria de facto provada, sob os artigos 6, 7, 8, 10, 11 e 12 da matéria de facto provada, por erro de julgamento e por violação do princípio in dubio pro reo e princípio da livre apreciação da prova. (conclusões 114 a 166);
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2. Factualidade.
Segue-se a enumeração dos factos provados, não provados e respectiva motivação.
«III. Fundamentação de Facto:
Realizou-se audiência de discussão e julgamento com observância do legal formalismo prescrito por lei, tendo, em abono da verdade material resultado os seguintes.
III.1.Factos provados.
Da acusação pública
1). O arguido B… foi indicado e inquirido como testemunha no processo de inquérito n.º 1152/11.0TAVNF, que correu os seus termos nos Serviços do Ministério Público de Santa Maria da Feira.
2). Investigava-se naqueles autos a prática do crime de fotografias ilícitas, previsto e punido pelo artigo 199.º, n.º 2, alínea b), do Código Penal, por parte de C…, ora assistente. 3). Com efeito, dava-se conta naqueles autos que, no dia 27 de Setembro de 2011, entre as 22h00m e as 00h00m, havia sido deixado, no jardim da residência do ora arguido, sita na Avenida …, n.º …, em …, um DVD-R contendo fotografias íntimas do assistente e de H… (que haviam mantido um relacionamento amoroso que terminara em 2010).
4). H…, queixosa naqueles autos, suspeitava do ora assistente como autor dos factos em virtude de apenas os dois terem acesso às ditas fotografias.
5). Aquando da sua inquirição no âmbito daqueles autos, a 13 de Janeiro de 2012 e nos Serviços do Ministério Público de Santa Maria da Feira, o ora arguido B…, depois de advertido do dever de falar com verdade e das consequências penais para as falsas declarações, declarou perante a técnica de justiça principal encarregada de tal diligência, na qualidade de testemunha, para além do mais, que havia visto C…, ora assistente, a atirar algo para o jardim da sua residência. Mais referiu que se aproximou do objecto arremessado, apercebendo-se tratar-se de um envelope castanho, com o nome do arguido escrito, contendo um DVD-R no seu interior.
6). Com tal depoimento B… pretendia fazer crer que havia sido, de facto, o ora assistente quem havia deixado o mencionado DVD-R no jardim da sua residência e, deste modo, afastar dúvidas acerca da autoria da prática do ali denunciado ilícito criminal.
7). Sucede, porém, que, contrariamente ao por aquele afirmado, no mencionado dia e hora, C… encontrava-se na residência de D…, a comemorar o aniversário deste último.
8). Quando prestou o seu depoimento nos termos supra descritos, o arguido tinha perfeito conhecimento de que o por si afirmado não correspondia à verdade.
9). O arguido agiu de vontade livre e consciente, com o propósito de, através do seu depoimento não correspondente à verdade dos factos, conseguir demonstrar que havia sido, de facto, o ora assistente a deixar o mencionado DVD-R no jardim da sua residência, bem sabendo que a sua conduta era proibida e punida por lei.
Da acusação particular
10). No dia 3 de Fevereiro de 2012, à noite, durante um jantar no restaurante “F…”, sito em …, Santa Maria da Feira, o arguido B…, na sequência de uma conversa sobre o assistente, virou-se para a proprietária do mencionado estabelecimento, G…, e de forma a ser ouvido por ela e por todos os presentes disse que o assistente era conhecido em Santa Maria da Feira como “burlista e chulo”.
11). O arguido proferiu tais expressões de viva voz, tendo actuado de forma livre, deliberada e consciente, com o propósito concretizado de ofender o bom-nome, a honra e consideração do assistente.
12) O arguido sabia que a sua conduta era proibida e punida por lei.
Dos pedidos de indemnização civil
13) O assistente é advogado na Comarca de Santa Maria da Feira há mais de vinte anos.
14) Gozando de credibilidade e reputação.
15) Sendo reconhecido nesta Comarca e noutras como bom profissional, quer pelos seus pares, quer pelos demais agentes judiciários.
16) O assistente é cliente habitual do restaurante “F…”, advogado e amigo pessoal dos donos do restaurante e é conhecido na zona.
17) Ao saber de tais expressões, o assistente vivenciou sentimentos de mal - estar e revolta.
18) No âmbito do mencionado processo de inquérito n.º 1152/11.0TAVNF, o assistente foi constituído arguido e interrogado nessa qualidade e foi sujeito a buscas no seu escritório de advocacia, na sua residência e no seu veículo automóvel.
19) O depoimento do arguido prestado nos mencionados autos de inquérito nos sobreditos termos contribuiu para que viessem a ser determinadas as referidas buscas.
20) Nas buscas não foi encontrado qualquer objecto ou documento (fotografia) com relevo para o crime em investigação.
21) O arguido sabia que o assistente é advogado na Comarca ….
22) As referidas buscas foram realizadas no escritório do assistente por volta das 14:25 horas.
23) O escritório do assistente localiza-se numa rua …, contíguo ao …, perto da Câmara Municipal, dos Correios e da M….
24) Trata-se de uma rua com bastante movimento de veículos e pessoas.
25) O assistente foi inesperadamente interceptado pelo Sargento N… no Mercado Municipal, na presença de outras pessoas, tendo daí seguido para o seu escritório.
26) Junto à entrada do escritório do assistente encontrava-se já a Senhora Juíza de Instrução, a Senhora Procuradora-adjunta, o Senhor Advogado representante da Ordem dos Advogados, um Senhor Funcionário Judicial e outro elemento da Guarda Nacional Republicana.
27) O ocorrido foi nesse mesmo dia comentado pela cidade.
28) As buscas iniciaram-se no escritório do assistente, depois passaram para o seu automóvel e terminaram na residência do assistente, na freguesia de …, ….
29) No escritório as buscas decorreram durante cerca de cinquenta minutos, tendo sido examinado tudo o que ali se encontrava, nomeadamente o computador utilizado pelo assistente, registos digitais, livros, gavetas, etc., tudo na presença do assistente que ali permaneceu na presença das demais pessoas já referidas.
30) Ao veículo automóvel as buscas decorreram no parque do escritório durante cerca de dez minutos. 31) Nos dias seguintes já corria por todo o concelho e concelhos vizinhos a notícia de que o assistente tinha tido buscas no seu escritório.
32) Tal facto foi e ainda é comentado em diversos locais públicos.
33) Sendo difundido pela Comarca de Santa Maria da Feira e pelas Comarcas vizinhas, atento o facto de o visado ser advogado há mais de vinte anos.
34) Aliás, tal facto foi comentado por colegas de profissão do assistente logo no próprio dia da realização dessas buscas.
35) E ainda hoje é comentado por Advogados, Funcionários Judiciais, clientes do assistente e Magistrados.
36) O assistente foi abordado por diversos colegas e pessoas a propósito do sucedido, o que aumentou o seu mal-estar e revolta.
37) Esse facto constrangeu o assistente e no período que se sucedeu não encarou os seus colegas e demais operadores judiciários com a naturalidade que sempre o caracterizou.
38) Tal factualidade provocou um sentimento de desconfiança no trabalho do assistente.
39) Na casa do assistente, sita em …, as buscas decorreram durante aproximadamente quarenta e cinco minutos e foi examinado o que se encontrava no seu interior.
40) O assistente assistiu a tudo, abriu gavetas e portas de armários, mostrando o que lá estava.
41) As buscas no domicílio do assistente foram comentadas na Freguesia de …, razão pela qual o assistente ficou ainda mais vexado.
42) O assistente é uma pessoa socialmente querida, tendo muitos amigos.
43) Sentiu-se e sente-se injustiçado, ansioso e revoltado com tudo o sucedido, o que faz com que, por vezes, tenha dificuldades em dormir, em concentrar-se no trabalho e com falta de disposição para a vida social.
Da contestação do arguido:
44) O arguido é reputado pelas pessoas que lhe são próximas como pessoa séria, honesta, trabalhadora e educada.
Mais se provou quanto ao arguido que:
45) Trabalha como vendedor de automóveis, por conta própria, sendo esta a sua única fonte de rendimento, pela qual recebe a quantia média mensal líquida de €1.250,00.
46) É casado e a mulher é advogada.
47) Vive com a mulher em casa dos pais, ajudando nas despesas de alimentação.
48) Tem um filho com 16 anos de idade, para o sustento do qual paga a quantia mensal de €150,00 de pensão de alimentos.
49) Tem o 12.º ano de escolaridade, como habilitações literárias.
50) Não tem antecedentes criminais.
III.2.Factos não provados
a).As expressões proferidas pelo arguido no circunstancialismo descrito na alínea 10) dos factos provados foram ouvidas por várias pessoas.
b).E nelas criaram a suspeição da sua veracidade.
c).Após tais factos, o assistente tem sido abordado por várias pessoas que lhe relatam o sucedido, facto que aumenta o mal-estar e revolta do assistente, que se vê impotente para o contrariar.
d).O arguido estava presente aquando a apresentação da denúncia pela sua mulher que deu origem ao processo de inquérito n.º 1152/11.0TAVNF.
e). As pessoas que se encontravam junto do assistente no circunstancialismo descrito na alínea 25) dos factos dados como provados e bem assim as vendedoras do Mercado aperceberam-se do que se passava.
f) As buscas ao veículo automóvel decorreram com ampla visibilidade para a rua, tendo sido vistas por quem ali circulava naquele momento.
g)As referidas buscas causaram um afastamento de pessoas do escritório do assistente.
h)As buscas foram comentadas por familiares do assistente perante os quais o assistente se sente particularmente reservado e vexado.
i) O assistente tem pautado a sua actividade profissional por critérios de rigor, seriedade e competência.
III.3.Motivação
Na formação da sua convicção este Tribunal analisou de forma livre, crítica e conjugada a prova produzida em audiência de discussão e julgamento, de acordo com o preceituado no artigo 127.º do Código de Processo Penal.
Antes de mais, importa referir que o arguido prestou declarações relativamente aos factos por que está pronunciado. Com efeito, no que concerne aos factos descritos na acusação pública, admitiu ter prestado depoimento na qualidade de testemunha no âmbito do processo de inquérito n.º 1152/11.0TAVNF, que correu os seus termos nos Serviços do Ministério Público de Santa Maria da Feira, em meados de Janeiro de 2012, admitindo ter sido no dia 13. Mais admitiu que lhe foram feitas todas as advertências legais, designadamente do dever de falar com verdade e da consequência penal para a falsidade de declarações. Depois referiu que esse seu depoimento foi aceite de uma determinada forma e foi determinante para buscas, nada mais tendo querido falar quanto a esta factualidade, com excepção de ter querido realçar que o dia 27/09/2011 corresponde a dia da semana que antecedeu o seu casamento com H…, tendo sido intenção do assistente perturbar o relacionamento do casal, e em Dezembro 2011 ter apareceu um 2.º DVD, contendo algumas das mesmas fotografias, junto a uma agência bancária onde tinha conta e que se situava num prédio onde residiam.
No que diz respeito aos factos vertidos na acusação particular, referiu que a menção do dia 3 na acusação será um lapso, já que da participação consta o dia 17. De resto, disse ser cliente habitual do restaurante “F…”, ali jantando quase todas as sextas-feiras, sendo normal conversar com a dona do restaurante, G…, quando a mesma se sentava à mesa consigo e com os demais. Quanto ao referido dia 3, negou ter estado sequer no restaurante, já que esteve em …, a jantar num outro restaurante, entre as 20H00 e as 23H00, juntamente com o seu filho, a sua mulher e os seus pais, já que se tratava da comemoração do aniversário da sua mãe. Mais referiu nunca ter proferido as palavras mencionadas na acusação relativamente ao ofendido.
Perante esta postura do arguido relativamente ao libelo acusatório, a nossa convicção quanto à factualidade provada da acusação pública (factos provados nos pontos 1) a 9) supra) ancorou-se nas declarações prestadas pelo assistente C…, nos depoimentos prestados pelas testemunhas D… e I…, e no teor das certidões do processo de inquérito n.º 1152/11.0TAVFR, que correu termos nos Serviços do Ministério Público de Santa Maria da Feira, constantes de fls. 2/12 destes autos e de fls. 13/21 do apenso A (contendo: auto de denúncia de 23/09/2011 efetuada por H… (28/09/2011), auto de inquirição daquela denunciante (22/11/2011), auto de inquirição do ora arguido, na qualidade de ali testemunha (13/01/2012), auto de interrogatório do ora assistente, na qualidade de ali arguido (09/02/2012), despacho de arquivamento desses autos); das fotocópias do despacho que determinou a realização das buscas nesse inquérito (fls. 486 e 487) e dos mandados e autos de busca e apreensão de fls. 497, 498, 499, e 631 a 634; bem como da certidão do assento de nascimento de D… (cf. fls. 627/629).
Concretizando.
A prova oralmente produzida e acima expressamente referida contraria de forma contundente o depoimento prestado pelo arguido no processo de inquérito n.º1152/11.0TAVNF, na qualidade de testemunha.
Com efeito, enquanto o arguido ali referiu ter visto, no dia 28/09/2011 (querendo certamente referir-se a 27/09/2011 – já que a queixa crime foi apresentada a 28/09/2011, pelas 19.30), “por voltas da meia noite ao chegar à residência sua dos seus pais (indo de carro) sita em … – …, deparou-se com uma pessoa que ia a pé na via pública o qual atirou para o jardim da residência dos seus pais.": mais referindo que “de imediato reconheceu pessoa como sendo “C…”. (…) Quando entrou em casa dos pais dirigiu-se ao jardim a fim de ver o que para ali tinha sido atirado pelo C…, tendo deparado com um envelope almofadado de cor castanho selado e com o nome do depoente inscrito com letras bem grandes do lado de fora.”, mais dizendo que se tratava do DVD-R contendo 100 fotografias da sua actual mulher em atos sexuais.
O assistente e as testemunhas D… e I… declaram que tal facto não pode corresponder à verdade, já que na referida data e hora, o assistente estava na residência de D…, festejando o seu aniversário.
Com efeito, sem embargo o registo visivelmente consternado com o sucedido e antagonizado com o arguido e a sua mulher (denunciante naqueloutros autos), o assistente C…, relatou de forma aparentemente coerente e verosímil como só mais tarde (já depois de proferido despacho de arquivamento) se veio a aperceber como podia provar a sua inocência dos factos que lhe eram imputados pela denunciante no identificado processo de inquérito e que alegadamente teriam sido presenciados pelo ora arguido, já que na data em causa estaria na festa de aniversário de um colega Advogado – o Senhor Doutor B… –, disso apenas se apercebendo aquando a elaboração da denúncia de folhas 2 a 11 do apenso n.º 576/12.0TAVFR.
Por seu turno, a testemunha D…, reconhecendo uma relação pessoal estreita com o assistente, de modo que se teve por plenamente credível, porque coeso e seguro, declarou que na data em causa o assistente foi à sua festa de aniversário – comemorada no próprio dia (27 de Setembro – cfr. certidão emitida pela Conservatória do Registo Civil de Santa Maria da Feira, junta de folhas 627 a 629) –, de onde não se ausentou no intervalo temporal que se situa, pelo menos, entre as 20:00 e as 2:00. Mais relatou o depoente como veio a alertar o assistente para aquela coincidência quando aquele lhe mostrou o esquiço da referida peça processual. Por último, narrou ainda a testemunha o que ainda pôde percepcionar das buscas levadas a cabo no escritório do assistente, uma vez que o seu escritório é mesmo ao lado do assistente e, por tal motivo, como chegou no decurso das mesmas, logo se pôde aperceber do que se estava a passar, explicitando a visibilidade e difusão que tal evento teve na Rua onde se situa o escritório, no meio social e no seio dos Colegas e da Comarca, descrevendo os efeitos que tal factualidade teve na pessoa do assistente, na sua vida social e na sua vida profissional, sendo de pôr em evidência que a testemunha apenas referia os factos que tinha por seguros, evitando exacerbar tais consequências.
De igual modo, a testemunha I…, também ele amigo e colega do assistente, de forma fundada e vivida explicou porque se recordava da presença do assistente na festa de aniversário da antecedente testemunha – por ter sido a última em casa dos progenitores daquele (entretanto ambos tinham tido um filho – 2013 – e no ano de 2012 a testemunha D… havia mudado de casa) –, seu amigo próximo. Mais referiu que o seu amigo C… nunca se ausentou daquela casa, desde a hora a que chegou (pelas 20:00) até à hora da sua saída (00:00), sendo certo que aquele ainda ali continuou.
Ora, os depoimentos destas testemunhas, para além de objetivos, seguros, pormenorizados e coerentes, relatam factos que chegaram ao seu conhecimento de forma direta e pessoal. Além disso, no que diz respeito à data de aniversário de D…, são corroborados pela certidão do assento de nascimento junta aos autos.
Assim, não se nos suscita qualquer dúvida relativamente à veracidade dos seus relatos, sendo certo que corroboram os factos descritos pelo próprio assistente, tornando o depoimento prestado pelo arguido B… no processo de inquérito n.º 1152/11.0TAVNF absolutamente incompatível como a realidade.
Importa ainda atentar numa outra circunstância que motivou já o despacho que arquivamento proferido nesses autos e cuja estranheza gerada não foi dissipada neste julgamento. Com efeito, do teor da certidão extraída do processo de inquérito n.º 1152/11.0TAVNF, dos Serviços do Ministério Público de Santa Maria da Feira, em especial, da denúncia feita por H… em 28/09/2011 resulta que a queixosa nunca refere que o ora arguido viu o indivíduo que teria depositado o referido “CD” no jardim da habitação e que seria capaz de o reconhecer (folhas 3 a 6), assim como também não o mencionou quando foi inquirida no âmbito de tais autos (cfr. folhas 7 a 8), facto que, a ser verdade, era de inegável valor probatório e necessariamente seria transmitido aquando a apresentação da denúncia, até porque inelutavelmente não podia deixar de ser do conhecimento da denunciante, atenta a estreita ligação que a unia e une ao arguido, então testemunha, sendo que tal circunstancialismo apenas foi narrado na inquirição do arguido como testemunha – «(…) o depoente de imediato reconheceu a pessoa como sendo “C…” (…)» –, quase meio ano volvido do início do processo. Aliás, do discurso da queixosa nessa participação (e releva-se que a queixosa é advogada de profissão) vai no sentido de ter tomado conhecimento da colocação do DVD no interior dos muros da residência do então seu noivo e testemunha por si no acto indicada, pelo próprio e no dia anterior, referindo expressamente que “Não tem a mínima dúvida de que só o denunciado às mesmas (referindo-se às fotografias do DVD) teve acesso e só este as podia ter agora feito chegar ao seu noivo, ora si ou por interposta pessoa, foi o próprio quem as fez e nunca em momento algum a inquirida autorizou a sua exibição a terceiros. (…) Mais deseja acrescentar que a letra da palavra “B…” constante do envelope, em tudo se assemelha à do denunciado, com quem conviveu cerca de 4 anos.”. Ora, este discurso (tentando procurar e evidenciar indícios que liguem o DVD ao ora assistente C…) só se justifica se nenhuma prova direta existisse, designadamente o testemunho de alguém que tivesse visto tal facto.
Quanto aos factos referentes ao elemento subjetivo do crime (dolo), a nossa convicção ancora-se novamente nos elementos probatórios acima referidos, analisados à luz das regras de normalidade, conjugadas com as próprias declarações do arguido, que refere expressamente ter sido advertido da consequência penal para a falsidade do depoimento. Acresce que os factos descritos pelo arguido nesse seu depoimento relativamente à visualização do arremesso do DVD pelo aqui assistente, nas circunstâncias de tempo e de lugar por si descritas foram-no de forma muito clara e objetiva, não se suscitando dúvidas de que o mesmo queria efectivamente referir tais factos.
Perante a negação dos factos por parte do arguido, quanto à factualidade provada da acusação particular (factos provados nos pontos 10) a 12) supra) alicerçou-se nas declarações prestadas pelo assistente C… e no depoimento prestado pela testemunha G….
De facto, espontânea e frontalmente reconhecendo, a sua relação próxima de amizade e de cliente/advogado com o assistente (de resto, também o assistente havia logo assumido tal estreita ligação) e evidenciando um discurso visivelmente agastado e pesaroso, a testemunha de forma que se afigurou credível porque pormenorizada e vivida, narrou o episódio em apreço que também protagonizou (já que as locuções em causa foram-lhe transmitidas), fundadamente apontando o enquadramento espácio-temporal (na Sexta-feira entre o aniversário do seu marido -02/02 - e o aniversário do assistente -05/02) relato tanto mais credível quando considerado o arrependimento (que pareceu sincero pela sua inadequação) pela mesma manifestado em ter contado o sucedido ao assistente, por tudo ter culminado no julgamento no âmbito dos presentes autos.
Tal depoimento foi ademais corroborado pelas declarações do próprio assistente que, como supra já ficou dito, esclareceu os moldes em que o sucedido lhe foi relatado por esta depoente, sendo de realçar que as duas versões foram, no essencial, inteiramente coincidentes, apenas se surpreendendo algumas diferenças despiciendas, às quais não foi dada relevância, até porque reveladora da não existência de uma concertação nos depoimentos, bem como também necessariamente imputável ao tempo já decorrido e à inerente subjectividade da memória e do observador/relator.
Ora, da conjugação deste depoimento e das declarações do assistente resultou, ainda, afirmada a inveracidade do depoimento da testemunha J… mas não só deles. Desde logo, cumpre não perder de vista a reconhecida estreita relação familiar e de amizade que une a depoente ao arguido (é prima e amiga de longa data do arguido) e bem assim à sua mulher.
Por outro lado e com maior acuidade, o modo como foi prestado tal depoimento deixou antever uma clara exercitação do mesmo, referindo pormenores que de antemão sabia serem pertinentes, querendo fazer crer que tinha uma memória absolutamente extraordinária, recordando-se, por exemplo, das pessoas com quem tinha estado a jantar no restaurante “F…” nesse dia, dos motivos pelos quais o arguido não tinha ido, recordando-se da data do aniversário da sua mãe, e da data da comemoração do aniversário, e da ida do filho do arguido a esse festejo. Mais quis fazer querer ao tribunal nada ter contra a testemunha G…, o que muito se estranha, já que na sua perspectiva aquela teria imputado factos falsos e prejudiciais ao seu primo e grande amigo, o ora arguido, quando sabia não serem verdadeiros.
No que concerne ao elemento subjectivo a convicção do tribunal alicerçou-se nos mais elementares juízos de experiência comum e de normalidade, em conjugação com a globalidade da prova produzida em audiência.
Quanto à matéria vertida nos pedidos de indemnização civil foi tomado em consideração o teor das certidões extraídas do processo de inquérito n.º 1152/11.0TAVNF, dos Serviços do Ministério Público de Santa Maria da Feira, acima referidas, e das cópias extraídas dos mesmos autos, juntas de folhas 287 a 291 e 486 a 487, 491 a 493, 497, mormente quanto à realização das mencionadas buscas e bem assim à incidência que o depoimento do ora arguido necessariamente teve na promoção e ulterior determinação daquelas buscas.
Na verdade, muito embora no despacho que determina a realização das buscas ao escritório, veículo e domicílio do assistente expressamente não se refira os indícios colididos até àquele momento no inquérito que sustentam a prolação de tal decisão, o certo é que a mesma é proferida por referência à promoção cuja cópia se mostra junta de folhas 486 a 487 e nela se verte claramente o testemunho do ora arguido. Acresce que, as buscas apenas foram promovidas na sequência do depoimento prestado pelo ora arguido nesses autos e para tanto concluir basta atentar na sequência temporal do processado (só após tal inquirição é que aparece a mencionada promoção, não obstante já terem existido dois requerimentos da denunciante pedindo a realização das buscas), e não sendo seguramente o único elemento de prova que sustentou a determinação daquela diligência, a inquirição do arguido foi, pelo menos, expressivamente relevante.
No mais, foram considerados os inúmeros depoimentos das testemunhas arroladas pelo assistente e demandante.
De facto, a testemunha O…, advogado que interveio nas buscas ao escritório e domicílio do assistente em representação da Ordem dos Advogados, relatou o modo como decorreram tais buscas e a percepção que teve da diligência, em particular quanto à exteriorização da diligência no meio e a difusão que mais tarde veio pessoalmente a constatar por conversas que alguns colegas mantinham.
Já a testemunha P…, amigo do assistente há vários anos, referiu que o assistente é conhecido em Santa Maria da Feira e que ouviu uns rumores quanto às buscas, em vários locais públicos de Santa Maria da Feira, sem que se falasse dos motivos subjacentes a esses actos.
A testemunha Q…, amigo e colega do assistente, relatou como veio a saber das buscas realizadas ao escritório do assistente – através da sua mulher que é advogada em … e que ouviu comentar naquela comarca o sucedido – e como tal foi um facto muito propalado na altura, narrando ainda as consequências anímicas de tal circunstancialismo para o assistente, bem como os efeitos ao nível profissional.
Também a testemunha S…, amigo próximo e colega do assistente (foi o seu Patrono), relatou o estado de nervosismo em que encontrou o assistente no dia das buscas ao seu escritório e o desalento que nele sempre constatava por esta altura, descrevendo ainda algumas situações em que clientes do assistente o contactaram para o substituir em virtude do sucedido, não logrando confirmar se tal veio efectivamente a ocorrer.
A testemunha T… (pretérito …), amigo de infância do assistente, relatou que soube das mencionadas buscas por ouvir comentários no café da localidade – … – e que, nessa mesma altura, houve um afastamento do assistente dos amigos e até dos clientes, tendo o depoente percebido que o mesmo se sentia melindrado e envergonhado com o sucedido, insistindo em dizer-lhe que esta situação tinha destruído a sua imagem profissional.
A testemunha U… (Presidente da Junta …), amigo próximo do arguido, há cerca de doze anos, narrou que veio a saber das mencionadas buscas num café, Mais referiu que chegou a ser abordado por pessoas que tinha encaminhado para o assistente como cliente, a fim de saber o que tinham ocorrido.
Por fim, a testemunha V…, Adjunto do Chefe do Serviço de Finanças de … e amigo pessoal do assistente há mais de quinze anos, relatou ficou a saber que o assistente tinha sido alvo de buscas, tendo-o contactado para saber pormenores do sucedido. Mais referiu que acompanhou de perto o assistente nesta altura por o achar mais combalido e deprimido, embora o tenha deixado de indicar como advogado.
A testemunha W…, que foi cliente do arguido, apenas revelou que teve conhecimento de que o mesmo tinha sido alvo de buscas, num café.
Quanto às testemunhas arroladas pelo arguido, importa referir as testemunhas N…, Chefe do NIC da GNR de …, e X…, Cabo do NIC da GNR de …, tendo estado presente durante as buscas realizadas nos autos do processo de inquérito n.º 1152/11.0TAVNF, confirmando os factos constantes dos respectivos autos, mas também a descrição desse ato, não tendo sido percebido pelas pessoas juntas das quais o assistente se encontrava quando foi abordado para as buscas.
Quanto a estes factos, também a testemunha L…, procuradora-adjunta em funções … à data dos factos, foi ouvida quanto às buscas efectuadas ao escritório, veículo e domicílio do assistente, designadamente quanto ao modo e tempo em que as mesmas decorreram, não tendo apercebido que as buscas tenham suscitado a curiosidade de populares, estando convencidos que passaram despercebidas.
Mais valorámos o depoimento de Y…, irmão do assistente, revelando que apenas tomou conhecimento das buscas no âmbito do julgamento realizado anteriormente nos autos. As testemunhas Z…, Procurador - adjunto dos Serviços do MP de … desde há 3 anos, tendo sido o representante do MP no 1.º julgamento, e AB…, a juíza desse julgamento, pouco ou nada adiantaram à convicção do Tribunal, salvo esta última testemunha referindo que os autos do processo de inquérito em causa eram alvo de cometários entre aqueles que trabalhavam no tribunal. Neste mesmo sentido, valorámos o depoimento da testemunha AC…, funcionário judicial …, designadamente do DIAP …, desde há 20 anos.
Por fim, a testemunha AD…, médica subscritora da declaração junta a folhas 303, revelou não ter qualquer memória dos factos que conduziram à elaboração de tal “relatório médico”, apenas se tendo recordado do assistente quando confrontada com o mesmo.
Foi também considerado o teor do certificado de registo criminal junto aos autos.
Quanto às condições pessoais do arguido, considerámos as suas declarações, as quais, nesta parte, se nos afiguraram como sinceras, não tendo sido infirmadas pelos demais elementos probatórios.
Por fim, no que tange aos factos não provados, os mesmos assim resultaram pela circunstância de quanto a eles não ter sido produzida qualquer prova ou por as testemunhas supra identificadas não terem quanto aos mesmos conhecimento directo ou por o conhecimento que revelaram ter os infirmar.»
*
3.- Apreciação do recurso.
3.1. Nulidade da sentença por quebra do dever de imparcialidade - art. 41º, n.º 3, do CPP- (conclusões 3 a 21).
Sustenta o recorrente, no essencial, que na sequência de recurso intercalar vieram a ser declarados inválidos os atos subsequentes à decisão proferida a fls. 549 e 549 verso, incluindo o julgamento e a sentença, repetida a audiência de discussão e julgamento, veio a ser proferida sentença condenatória do arguido B…, que é objecto do presente recurso; argumenta, que pelo compulsar das decisões, a anulada e ora em recurso, constata-se que a decisão em recurso é ipsis verbis fiel à primeira sentença proferida também pelo Tribunal “a quo”, atendendo, nomeadamente, aos factos dados como provados, e bem assim, a respectiva motivação dos mesmos.
Defende que se por um lado, está vedado a possibilidade, por impedimento, de o Juiz intervir em julgamento, recurso ou pedido de revisão relativos a processos em que tiver participado em julgamento anterior, artigo 40º, alínea c) do C.P.P., por maioria de razão, o Juiz que intervier em repetição de julgamento, estará, de igual modo, impedido de conhecer os atos anulados, incluindo a sentença final, pois o disposto no artigo 40.º do CPP visa garantir a imparcialidade do juiz face a intervenções processuais anteriores que, pelo seu conteúdo e âmbito, condicione uma futura intervenção. Argumenta que a fase processual é a mesma; que existe razão geradora de desconfiança sobre a imparcialidade do juiz, posto que se trata da repetição de acto processual anulado; que não obstante a prova produzida em sede de audiência de discussão e julgamento ter sido diferente da prova produzida no julgamento posteriormente anulado, os factos dados como provados bem como a sua motivação geram a convicção plena de que não existiu uma tomada de decisão imparcial, o que condicionou a decisão em causa, pois que tais factos dados como provados e respectiva motivação são rigorosamente os mesmos, ou seja, são cópia integral, incluindo, letra, texto e pontuação, dos factos dados como provados e da respectiva motivação da sentença anterior objecto de anulação.
Para concluir que tal sentença não foi proferida com a imparcialidade exigida ao julgador, isto porque segundo as regras da experiência, da lógica e do bom senso, a probabilidade de ser produzido tão fielmente tal acto processual é nula; e que o Tribunal “a quo” estava impedido de conhecer a sentença anteriormente proferida, e ao fazê-lo minou a objetividade e imparcialidade da decisão que veio a proferir. Defende, finalmente que tendo como fonte o estatuído para as hipóteses plasmadas no artigo 40º do C.P.P., à sentença proferida devem ser aplicadas as mesmas consequências previstas no artigo 41º, n.º3 do C.P.P., ou seja, a nulidade.
Vejamos.
No essencial o recorrente entende que a sentença é nula, porque a Sra. Juíza [diferente da que elaborou e assinou a sentença anterior anulada, apenas pela procedência de recurso intercalar] que fez o novo julgamento conheceu e reproduziu a sentença anterior resultante de julgamento anterior também anulado.
Impõe-se que se diga, antes de prosseguirmos, que compulsadas as duas sentenças proferidas nos autos, a anteriormente anulada e a objecto de recurso não é verdade que: “a decisão ora em crise é ipsis verbis fiel à primeira sentença …, atendendo, nomeadamente, aos factos dados como provados e, bem assim, à respectiva motivação dos mesmos”.
Com efeito, compulsando os artigos 1, 22, 29, 30, 38, 39, 43 e 50 da sentença sob escrutínio, com os artigos correspondentes da sentença anulada logo se colhe que têm redacções e em muitos deles conteúdos diferentes, sendo que os artigos 45 a 49 dos factos provados não existiam na sentença anteriormente anulada.
Quanto à motivação da decisão de facto, compulsando a da sentença em apreço com a da sentença anteriormente anulada conclui-se de imediato que têm estruturas muito diversas e que embora alguns parágrafos sejam muito semelhantes, acrescem-lhe, no entanto outros que não existiam na sentença anterior.
Posto isto, falha desde logo a invocada fidelidade ipsis verbis da sentença em apreço à sentença anulada, atendendo, nomeadamente, aos factos dados como provados e, bem assim, à respectiva motivação dos mesmos.
Sem embargo e com brevidade.
Como resulta da argumentação do recorrente a meritíssima juíza que subscreve a presente sentença não interveio em qualquer fase processual anterior ao julgamento e prolação da sentença em recurso.
Assim, salvo sempre o devido respeito por opinião diversa, não faz qualquer sentido esgrimir com o substancialmente disposto no artigo 40º e consequências previstas no artigo 41º, n.º3 do CPP.
Como escreve Germano Marques da Silva, Curso de Processo Penal, I, 5ª edição revista e actualizada, Verbo, 2008, pág. 215, “A organização judiciária está estruturada na busca da independência dos juízes e tutela do direito de defesa em ordem a assegurar as máximas garantias de objectiva imparcialidade da jurisdição.”
O direito a um tribunal independente e imparcial é expressamente afirmado pelo artigo 10º da Declaração Universal dos Direitos do Homem, pelo artigo 14º do Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos e pelo artigo 6º da CEDH.
Independência e imparcialidade são verso e reverso da mesma realidade fundamental, e a imparcialidade (…) é uma nota essencial do próprio conceito de tribunal”. Vide Jorge Miranda Rui Medeiros, Constituição Portuguesa Anotada, Coimbra Editora, 2007, Tomo III, pág. 43 em anotação ao artigo 203.
Na fórmula do Acórdão do TC n.º 393/04 a imparcialidade é qualificada como “exigência específica (e indissociável) de uma verdadeira decisão judicial ou de um escorreito e justo julgado” e definiu-a a partir da “ausência de todo o prejuízo ou prejuízo concretizados ou plausíveis no que tange à matéria a decidir e no que toca às pessoas a que a decisão afecte”.
Vem sendo entendido sobre os fundamentos do impedimento, instrumentais da garantia da imparcialidade objectiva, que este só têm sentido quando exista uma relação entre alguma decisão ou posição anterior que o juiz tenha tomado num processo e o objecto actual que lhe é submetido para decisão, tendo de existir uma implicação e sequência entre a posição anterior e o objecto actual de decisão, que possa gerar riscos de existência de algum prejuízo ou preconceito relativamente à matéria a decidir.
Assim, tendo em atenção o que deixamos escrito sobre as sentenças proferidas nos autos, e a autoria das mesmas, afigura-se-nos claro que não existe matéria que possa gerar apreensões objectivas sobre a imparcialidade da juíza subscritora da sentença em apreço, porquanto os motivos invocados se prendem com a organização de um processo penal, onde uma sentença anulada faz parte do processo, não sendo por isso extirpada do mesmo e, por isso, há sempre a possibilidade de ser lida por quem tem de decidir a final o processo e muitas vezes torna-se mesmo necessário proceder à sua leitura.
Acresce que o anterior Acórdão deste Tribunal da Relação decretou a nulidade do julgamento e sentença anteriores no âmbito de um recurso interlocutório, e por arrastamento, o que menos comporta a abstenção de leitura da sentença anteriormente proferida.
Pelo exposto, não se vislumbra qualquer violação da imparcialidade objectiva da juíza subscritora, improcedendo, assim, a questão.
*
3.2.- Violação do disposto nos artigos 338º, n.º1 e 310º, n.º 1, ambos do C.P.P. por o Tribunal a quo considerar extemporânea e infundada a invocada nulidade da acusação pública, ou falta de fundamentação da acusação, pelo crime de falsidade de testemunho, arguida na contestação (conclusões 22 a 29).
Informa o recorrente que invocou na sua contestação a nulidade da acusação pública, quanto ao crime de falsidade de testemunho, por ser manifestamente infundada, por absoluta ausência de provas que a fundamentem e por falta do elemento objectivo constitutivo do crime; defende que o conhecimento das questões suscitadas na contestação é da competência do Tribunal de julgamento e terão forçosamente que ser apreciadas na audiência, nomeadamente nos termos do art. 338º do CPP., invoca em abono da sua tese o Acórdão deste TRP de 01.07.2009, disponível in www.dgsi.pt. Mais argumenta que o Tribunal “a quo” indeferiu a invocada nulidade, por entender que “a nulidade ou falta de fundamentação da acusação pública apenas pode ser conhecida pelo juiz de julgamento se o processo não tiver comportado a fase de instrução, caso contrário, é na instrução que tal suposta nulidade ou falta de fundamento deve ser conhecida, ficando precludida a sua arguição em momento posterior se o arguido a não invocar”, e tendo o arguido requerido abertura de instrução “é totalmente extemporânea e infundada tal invocação.”, mas discorda de tal entendimento, com os seguintes argumentos:
- por um lado, apenas quanto ao imputado crime de falsidade de testemunho, requereu o arguido a abertura de instrução;
- por outro lado, o Tribunal “a quo”, na sua apreciação e ponderação, não vislumbrou o estabelecido no artigo 338º, n.º1 e bem assim o disposto no artigo 310º, n.º1, ambos do C.P.P., pois a decisão instrutória não se debruçou sobre nenhuma das invocadas nulidades, pelo que, não se formou caso julgado;
- o artigo 310º, n.º1 do C.P.P. não permite a recorribilidade do despacho que se pronuncie sobre as nulidades arguidas em sede de instrução, pelo que sendo essas nulidades arguidas na contestação, deve o juiz de julgamento conhecê-las na sentença.
Vejamos.
Cumpre referir em primeiro lugar, que o arguido requereu a abertura de instrução, nomeadamente, quanto ao crime de falsidade de testemunho, p. e p. pelo art. 360º, n.º1, por entender que não existiam indícios suficientes da prática desse crime e por entender não constarem da acusação os elementos objectivos do tipo de crime em causa. Nada requereu relativamente ao crime de difamação.
Na decisão instrutória conhecendo as questões invocadas ponderou-se:
«(…)
Assim, os elementos de prova que importa avaliar, de forma a ponderar se se verifica uma suficiente indiciação de factos que justifiquem a pronúncia do arguido, são os resultantes da fase de inquérito e tidos já em consideração aquando da prolação do despacho acusatório. (sublinhado nosso)
A saber:
- a certidão de fls. 2/13, extraída dos autos 1152/11.0TAVNF, da qual resulta ter o arguido prestado o seu depoimento tal como vem descrito na acusação;
- as declarações do assistente, o qual nega ter praticado os factos tal como resultam descritos no depoimento do ora arguido e então testemunha, constante da dita certidão;
- a certidão de fls. 13/32, constante do apenso A destes autos, extraída dos mesmos autos 1152/11.0TAVNF, da qual resulta que o aí arguido e aqui assistente nega os mesmos factos referidos no parágrafo anterior;
- depoimentos de D… e I…, os quais, de forma consentânea com as declarações do assistente, asseveraram que, no dia e hora descritos pelo ora arguido como correspondendo às circunstâncias de tempo em que vislumbrou o assistente a praticar os actos por si descritos, este último se encontrava, juntamente com os dois depoentes, no jantar de aniversário do primeiro, ali tendo permanecido o segundo desde cerca das 19,30 até depois da meia noite e asseverando o primeiro que o assistente se dirigiu consigo para o dito jantar, pelas 19,30 horas, ali permanecendo até às 2,30/3,00 horas, sem nunca dali se ausentar;
(…)
*
A prova constante dos autos corresponde, pois, à disparidade entre a versão sustentada pelo ora arguido (nos autos em que depôs como testemunha) e a que se mostra sustentada pelos depoentes D… e I… e bem assim pelas declarações do assistente. Tais versões são incompatíveis entre si, porquanto implicam a verificação de um mesmo contexto temporal e a presença física do assistente em locais distintos.
A versão dos factos, tal como vem descrita pelo ora arguido, é isolada e contrariada pelos acima referidos meios de prova (declarações do assistente e depoimentos de D… e I…).
Acresce a circunstância de o ora arguido apenas ter sustentado esta versão no dia 13.01.2012, e não em 28.11.2011, quando H…, sua companheira, fez uma participação à Polícia Judiciária, visando o ora assistente, e estando na companhia daquele, o qual nada referiu.
Nessa ocasião (28.11.2011), tendo o ora arguido, supostamente, conhecimento directo da actuação do ora assistente (uma razão de ciência mais próxima do que a da participante H…), normal seria que o tivesse partilhado no imediato, sendo certamente considerado processualmente oportuna a recolha do seu depoimento naquela ocasião.
Não o tendo feito, tal postura torna menos verosímil que o ora arguido tivesse um tal conhecimento dos factos.
*
No que respeita ao crime de falsidade de testemunho, prevê o art. 360º, n.º 1 do Código Penal, para o que aqui interessa, que "quem, como testemunha (..) perante tribunal ou funcionário competente para receber como meio de prova (..) prestar depoimento (..) falsos, é punido com pena de prisão de 6 meses a 3 anos ou com pena de multa não inferior a 60 dias."
O tipo de crime em apreço prevê que o agente assuma a condição de testemunha e que, prestando depoimento, o faça falsamente, ou seja, que relate factos que não correspondam à verdade histórica, verdade material, aos factos da vida real.
A verificação da falsidade do depoimento é uma matéria sujeita à livre apreciação do Tribunal (art. 127º do CPP), ou seja, não se encontra adstrita a um específico meio de aferição.
Assim, tal falsidade resultará, em tese, apurada, quando o depoente presta dois depoimentos, em momentos distintos, diametralmente opostos ou em si inconciliáveis. Ou quando em sentença transitada em julgado se julga fixada uma determinada configuração factual incompatível com um depoimento prestado pelo agente.
Mas poderá, igualmente, decorrer da mera desconformidade entre o depoimento do agente e outros depoimentos, tudo dependendo do grau de desconformidade e de razões de facto contextuais que possam densificar, em sede probatória, a actuação ilícita na prestação do depoimento. (Sublinhados nossos)
E ao nível da suficiente indiciação que se impõe para o momento acusatório ou de pronúncia, somos do entendimento que, considerando a prova resultante destes autos, se impõe a pronúncia do arguido pela prática de ambos os crimes pelos quais vem acusado (,,,)
*
Assim, de todos os elementos carreados para os autos evidencia-se existirem indícios suficientes que permitem vislumbrar como provável a futura condenação do arguido, ou que um tal sentido decisório é mais provável do que o de sentido absolutório.
Importa, pois, nestes termos e nos do disposto no art. 308º, n.º 1 do Código de Processo Penal, pronunciar o arguido pelos factos de que se encontra acusado.
*
Em face do exposto, decide-se, para julgamento em processo comum com intervenção do tribunal singular, pronunciar o arguido B…, melhor identificado nas acusações de fls. 201/203 e 212/215, porquanto indiciam suficientemente os autos a ocorrência dos factos nesta última vertidos, para os quais remeto, nos termos do disposto no art. 307º, n.º 1 do Código de Processo Penal.
*
Tais factos integram a prática, pelo arguido, em autoria material e na forma consumada, de um crime de falsidade de depoimento, previsto e punido pelo art. 360º, n.º 1 e (…)»

Resulta, portanto, que a decisão instrutória considerou haver suficiente indiciação da prática do crime de falso testemunho p. e p. pelo art. 360º, n.º1 do CPP, e considerou ainda que estavam verificados os elementos objectivos do crime em causa.
Assim, na presente questão argumentar que apenas quanto ao crime de falsidade de testemunho requereu o arguido a abertura de instrução, não é argumento nenhum, visto que é este o crime que está em causa nesta questão.
Por outro lado, é claríssimo que a decisão instrutória outra coisa não fez que responder às questões colocadas no RAI pelo arguido, a questão de saber da existência de indícios suficientes da prática do crime de falsidade de depoimento p. e p. pelo artigo 360º do CP e a questão da alegação ou não, na acusação, dos elementos objectivos do tipo de crime em causa, respondendo a ambas afirmativamente, como questões de fundo.
Não obstante, o Tribunal a quo [o do julgamento] pronunciou-se sobre as questões em causa, e no que ora releva, do seguinte modo:
«II.1.Da nulidade das acusações
O arguido invoca a nulidade das acusações pública e particular dos autos, com os seguintes fundamentos: - quanto à acusação pública, por manifestamente infundada, por absoluta ausência de provas que a fundamentem e por falta do elemento objectivo constitutivo do crime – artigo 283.º, n.º 3, alínea b), e 311.º, n.º 2 alínea a), e n.º 3, ambos do Código de Processo Penal (cfr. artigo 49º da contestação);
(…)
Importa decidir. Sob a epígrafe “saneamento do processo”, dispõe o artigo 311.º do Código de Processo Penal: «1 - Recebidos os autos no tribunal, o presidente pronuncia-se sobre as nulidades e outras questões prévias ou incidentais que obstem à apreciação do mérito da causa, de que possa desde logo conhecer.
2 - Se o processo tiver sido remetido para julgamento sem ter havido instrução, o presidente despacha no sentido:
a) De rejeitar a acusação, se a considerar manifestamente infundada;
b) De não aceitar a acusação do assistente ou do Ministério Público na parte em que ela representa uma alteração substancial dos factos, nos termos do n.º 1 do artigo 284.º e do n.º 4 do artigo 285.º, respectivamente.
3 - Para efeitos do disposto no número anterior, a acusação considera-se manifestamente infundada:
a) Quando não contenha a identificação do arguido;
b) Quando não contenha a narração dos factos;
c) Se não indicar as disposições legais aplicáveis ou as provas que a fundamentam; ou
d) Se os factos não constituírem crime.».
Deste preceito resulta que a nulidade ou falta de fundamento da acusação pública apenas pode ser conhecida pelo juiz de julgamento se o processo não tiver comportado a fase da instrução, caso contrário, é na instrução que tal suposta nulidade ou falta de fundamento deve ser conhecida, ficando precludida a sua arguição em momento posterior se o arguido a não invocar.
Na verdade, tendo havido instrução, os factos que estão sujeitos a julgamento são os que constam do despacho judicial de pronúncia (ainda que esse despacho remeta, dando por integralmente reproduzidos os factos e a qualificação jurídica constante das acusações).
Ora, no presente caso concreto, o arguido requereu a abertura de instrução e foi pronunciado pelos crimes previstos nas acusações, pública e particular, pelo que é totalmente extemporânea e infundada tal invocação.
Por outro lado, nesta fase processual, a falta de indícios ou provas suficientes para suportar a acusação/pronúncia deduzida e/ou a falta de elementos do tipo do crime imputado ao arguido, não consubstanciam qualquer nulidade. Esta falta é exclusivamente apreciada em sede de instrução. Contudo, verificando-se na fase de julgamento tem por efeito, não a nulidade da acusação ou da pronúncia, mas a absolvição do arguido a final. (…)
Por tudo o que acabámos de expor, julgo não verificadas as nulidades das acusações pública e particular, invocadas pelo arguido na sua contestação.»
Mas, o recorrente invoca como violados os artigos 338º, n.º1 e 310º, n.º1, ambos do C.P.P
Quanto à violação destes artigos.
Dispõe o n.º1, do art. 310º do CPP:
1 - A decisão instrutória que pronunciar o arguido pelos factos constantes da acusação do Ministério Público, formulada nos termos do artigo 283.º ou do n.º 4 do artigo 285.º, é irrecorrível, mesmo na parte em que apreciar nulidades e outras questões prévias ou incidentais, e determina a remessa imediata dos autos ao tribunal competente para o julgamento.
Dispõe o n.º1, do art. 338º do CPP:
1 - O tribunal conhece e decide das nulidades e de quaisquer outras questões prévias ou incidentais susceptíveis de obstar à apreciação do mérito da causa acerca das quais não tenha ainda havido decisão e que possa desde logo apreciar.
Relativamente ao art. 310º, n.º1, do CPP e à invocada não recorribilidade do despacho que se pronuncia sobre nulidades arguidas em sede de instrução, é a mesma invocação desprovida de sentido e relevo argumentativo na questão em análise, visto que as questões que ora são [e foram na contestação] invocadas como nulidades, no âmbito da Instrução eram o cerne da Instrução, contenderam com o mérito da decisão instrutória de Pronúncia do arguido, e foram aí ponderadas e decididas, sendo que a irrecorribilidade da decisão instrutória que pronunciar o arguido pelos factos constantes da acusação do Ministério Público é pacífica [a sua constitucionalidade foi afirmada no Ac. do TC n.º 79/2005] confinando-se a sindicabilidade da mesma ao próprio julgamento.
O que o recorrente, ora faz, e já fez na contestação, é com denominações diferentes discutir até à exaustão as mesmas questões, pretextando olvidar que o processo se encontra em fases distintas da sua tramitação e que em cada fase as questões se apreciam por uma perspectiva diferente.
Atento o exposto, a pronúncia do juiz do julgamento nos termos que deixamos expostos é a adequada, assistindo razão ao tribunal quando considera que é extemporânea e infundada a invocada nulidade da acusação pública [manifestamente infundada, por absoluta ausência de provas que a fundamentem e por falta do elemento objectivo constitutivo do crime], pelo crime de falsidade de testemunho, na contestação.
Quanto ao disposto no artigo 338º, n.º1 do CPP, vem sendo entendido que “as questões prévias aqui referidas, …, são todas as que, além das incidentais, ou seja das que surgem no decurso da audiência, podem obstar ao conhecimento do mérito. Essas questões podem ter natureza substantiva (morte do arguido, amnistia, prescrição, etc.) ou adjectiva (incompetência do tribunal, ilegitimidade do acusador, etc.).” vide Maia Gonçalves, Código de Processo Penal Anotado, 17ª Edição, 2009, pág. 778.
Por outro lado, a jurisprudência vem entendendo que o n.º1 do artigo 338.º do CPP apenas permite o conhecimento de questões prévias ou incidentais que sejam susceptíveis de obstar à apreciação do mérito da causa, nos termos que acabamos de mencionar, acerca das quais não tenha havido decisão e de que possa desde logo conhecer – vide os Ac. do TRL de 29.03.2007 e de 24.03.2010, e de 17.02.2011, todos disponíveis in www.dgsi.pt.
Vem muito a propósito, o esclarecedor trecho do Ac. do Tribunal Constitucional n.º 520/2011: «Não se proíbe que o juiz do julgamento determine a extinção do procedimento criminal, não prosseguindo a audiência de julgamento, quando ainda em fase introdutória tenha ajuizado que os factos constantes do despacho de pronúncia não têm relevância criminal; o que se proíbe é que o juiz de julgamento, nessa fase, possa sequer efectuar uma tal avaliação, devendo apenas decidir pela condenação ou absolvição do Réu, após realizada a produção de prova e alegações, e fixados os factos que se provaram na audiência de julgamento.
Esta limitação dos poderes do juiz de julgamento tem como fundamento um reconhecimento da autoridade do caso julgado formal. Tendo já sido decidido pelo juiz de instrução criminal, por decisão transitada em julgado proferida nesse processo, que o arguido deve ser submetido a julgamento pelos factos constantes do despacho de pronúncia, entende-se que o juiz do julgamento não pode reponderar a relevância criminal dos factos imputados ao arguido, com a finalidade de emitir um segundo juízo sobre a necessidade de realização da audiência de julgamento.» [sublinhado nosso]
Posto isto, é para nós claro que não houve qualquer violação dos incisos citados e, clara, também, a improcedência da questão.
*
3.3.- Nulidade da acusação pública, por ausência de provas que a fundamentem, por falta do elemento objectivo constitutivo do crime; nulidade consequente da sentença proferida, por omissão de pronúncia, nos termos do disposto no artigo 379º, n.º 1, alínea c) do C.P.P., e por falta de fundamentação, nos termos do disposto nos artigos 379 n.º 1, alínea c) do C.P.P., e por falta de fundamentação, nos termos do disposto nos artigos 379º n.º 1 alínea a) e 374.º, n.º 2, do Código de Processo Penal (conclusões 30 a 52).
Sustenta o recorrente que o Tribunal “a quo” não se pronuncia sobre nenhum dos factos/argumentos aduzidos pelo Arguido, apenas referindo que “os factos que estão sujeitos a julgamento são os que constam do despacho judicial de pronúncia”; e que em face da invocada nulidade da acusação pública, designadamente, por ser manifestamente infundada, por absoluta ausência de provas que a fundamentem e por falta do elemento objectivo constitutivo do crime, não emite qualquer pronúncia; argumentando que as referidas faltas resultam de o arguido ter prestado unicamente uma vez declarações no âmbito do processo n.º 1152/11.0TAVNF, em 13 de Janeiro de 2012, na qualidade de testemunha, e onde relatou de forma clara e objetiva a sua percepção da realidade factual que presenciou no dia 28.09.2011, por volta da 00h00, e por outro lado, da acusação pública consta “sucede, porém, que, contrariamente ao por aquele afirmado, no mencionado dia e hora, C… se encontrava na residência de D…, a comemorar o aniversário deste último.”, realidade que não se encontra demonstrada de forma alguma.
Argumenta ainda que nos autos que deram origem à extracção da certidão dos presentes, nunca em nenhum momento das suas declarações enquanto arguido, o aqui assistente, referiu que naquela data e hora “se encontrava na residência de D…, a comemorar o aniversário deste último”, sendo que tal factualidade apenas surge no âmbito destes mesmos autos; argumentas no sentido de vincar a sua tese que o processo originário, n.º1152/11.0TAVNF, foi arquivado, não por se ter considerado que não foi o arguido, aqui assistente, que praticou os factos, uma vez que nesse dia e hora estaria em casa do D… com outras pessoas a comemorar o aniversário daquele, mas antes sim por não se terem “obtido indícios suficientes da autoria e até da prática do crime”; e defende que não podia ser no âmbito deste processo que essa realidade apresentada podia ser dada como provada; e no seguimento deste entendimento, sufraga que não se tendo provado que enquanto testemunha faltou à verdade, deveria, agora com a qualidade de arguido, ter sido rejeitada a acusação pelo crime de falso testemunho e, por isso, entende o arguido, que não se encontra verificado o elemento objectivo do tipo de crime de falsidade de testemunho, e deste modo, é manifestamente infundada a acusação pública.
Invoca ainda visando a manifesta falta de fundamentação da acusação pública, por absoluta ausência de provas, que, os motivos pelos quais foi ordenada a extração da respectiva certidão, prendem-se não com o facto de o Tribunal ter considerado um quadro factual diferente daquilo que o arguido, à data testemunha, tinha referido no seu depoimento, mas antes com o facto de o Tribunal considerar que a versão da testemunha, aqui arguido “ … não é minimamente verosímil, tendo em consideração que o mesmo acompanhou a denunciante aquando da apresentação da queixa e nunca mencionou tal facto – nem consta dos autos que o tenha indicado a queixosa – o que, no mínimo, nos levante a dúvida sobre a veracidade das declarações.”, argumentando que tal circunstância não é indiciadora de coisa nenhuma, já que o Arguido não foi inquirido como testemunha naquele momento, nem teve qualquer intervenção processualmente relevante até ao dia em que efectivamente prestou o seu depoimento nos Serviços do Ministério Público desta comarca, sendo que das declarações prestadas pelo C…, a 09.02.2012 não resulta qualquer indício que o aqui arguido estivesse a prestar depoimento falso, já que este além de negar peremptoriamente a prática dos factos que lhe eram imputados, nada de concreto refere quanto aos acontecimentos do dia e hora em questão, pois nunca aí refere que no dia e hora dos acontecimentos estava em casa do Dr. D… a comemorar o aniversário daquele conjuntamente com várias outras pessoas;
Acresce que novamente ouvido o aqui assistente, em 17 de Abril de 2012, refere algo totalmente diferente e distinto de tudo quanto havia dito no processo n.º 1152/11.0TAVNF, tendo poucos dias depois, a 20 de Abril de 2012, apresentado queixa-crime contra o aqui arguido, pelo crime de falsidade de testemunho, onde mais uma vez, não refere que naquele dia e hora esteve na casa do Drº D… a festejar o aniversário deste.
Conclui que o Tribunal “a quo” omitiu pronúncia e não fundamento, já que apenas considerou que “tendo havido instrução, os factos que estão sujeitos a julgamento são os que constam do despacho judicial de pronúncia”; Sendo por isso, NULA a acusação pública deduzida quanto ao imputado crime de falsidade de testemunho, por manifestamente infundada, por absoluta ausência de provas que a fundamentem e por falta do elemento objectivo constitutivo do crime; e, em consequência NULA a Sentença proferida, por omissão de pronuncia, nos termos do disposto no artigo 379º, n.º 1, alínea c) do C.P.P., e por falta de fundamentação, nos termos do disposto nos artigos 379º, nº 1, alínea a) e 374º, nº 2, do Código de Processo Penal.
Vejamos.
Como supra referimos na questão anterior, embora sob um nome diferente, as questões da nulidade da acusação pública, por manifestamente infundada, por ausência de provas que a fundamentem, por falta do elemento objectivo constitutivo do crime, foram conhecidas pelo juiz de instrução, eram a própria essência da instrução e consubstanciaram o mérito da consequente decisão instrutória
Também o juiz de julgamento se pronunciou sobre o que lhe foi pedido na forma que deixamos reproduzida na questão anterior, e que no caso era a correcta, fundamentando de direito e de facto a questão colocada. O tribunal como é unanimemente aceite não se pronuncia sobre argumentos, ou factos/argumentos, mas sobre questões. E não há dúvida que o juiz de julgamento se pronunciou sobre as questões que lhe foram colocadas, nomeadamente sobre a questão em análise.
O juiz de instrução, na parte da decisão instrutória que reproduzimos, referiu que naquela fase processual os elementos de prova carreados para os autos e ali descriminados e, bem assim, o que de mais essencial se podia retirar de cada um deles, levava ao isolamento da versão dos factos relatado pelo ora arguido, enquanto testemunha, com efeito escreveu: “A prova constante dos autos corresponde, pois, à disparidade entre a versão sustentada pelo ora arguido (nos autos em que depôs como testemunha) e a que se mostra sustentada pelos depoentes D… e I… e bem assim pelas declarações do assistente. Tais versões são incompatíveis entre si, porquanto implicam a verificação de um mesmo contexto temporal e a presença física do assistente em locais distintos.
A versão dos factos, tal como vem descrita pelo ora arguido, é isolada e contrariada pelos acima referidos meios de prova (declarações do assistente e depoimentos de D… e I…).
Acresce a circunstância de o ora arguido apenas ter sustentado esta versão no dia 13.01.2012, e não em 28.11.2011, quando H…, sua companheira, fez uma participação à Polícia Judiciária, visando o ora assistente, e estando na companhia daquele, o qual nada referiu.
Nessa ocasião (28.11.2011), tendo o ora arguido, supostamente, conhecimento directo da actuação do ora assistente (uma razão de ciência mais próxima do que a da participante H…), normal seria que o tivesse partilhado no imediato, sendo certamente considerado processualmente oportuna a recolha do seu depoimento naquela ocasião.
Não o tendo feito, tal postura torna menos verosímil que o ora arguido tivesse um tal conhecimento dos factos.»
Assim, a falta de razão do recorrente sobre a ausência de prova da acusação e a sua manifesta falta de fundamento é claríssima, e, portanto, a consequente nulidade, tudo vindo a cifrar-se na credibilidade que em julgamento venham a gerar no tribunal os meios de prova ali enunciados dado o circunstancialismo inerente aos mesmos especialmente à prova testemunhal e por declarações.
E se assim é quanto à nulidade da acusação o mesmo ocorre relativamente à falta de preenchimento do elemento objectivo do tipo de crime em causa, visto que para que se verifique o referido elemento basta que alguém na “condição de testemunha e que, prestando depoimento, o faça falsamente, ou seja, que relate, que relate factos que não correspondam à verdade histórica, verdade material, aos factos da vida real.
A verificação da falsidade do depoimento é uma matéria sujeita à livre apreciação do Tribunal (art. 127º do CPP), ou seja, não se encontra adstrita a um específico meio de aferição.
Assim, tal falsidade resultará, em tese, apurada, quando o depoente presta dois depoimentos, em momentos distintos, diametralmente opostos ou em si inconciliáveis. Ou quando em sentença transitada em julgado se julga fixada uma determinada configuração factual incompatível com um depoimento prestado pelo agente.
Mas poderá, igualmente, decorrer da mera desconformidade entre o depoimento do agente e outros depoimentos, tudo dependendo do grau de desconformidade e de razões de facto contextuais que possam densificar, em sede probatória, a actuação ilícita na prestação do depoimento.”
Ora, no caso e em sede de instrução considerou-se que na acusação, atenta a desconformidade entre o depoimento do aqui arguido, testemunha no processo pretérito, e outros depoimentos descriminados, era suficiente, naquela fase, para que se pudesse antever como preenchido o elemento prestação de depoimento não correspondente com a verdade real ou histórica num futuro julgamento. Pelo que, também por aqui, falecia e falece a almejada nulidade.
Por outro lado, o tribunal a quo, na sentença em análise, conheceu as questões que lhe foram colocadas, como vimos na questão anterior, com a necessária fundamentação de facto e de direito, inexistindo assim qualquer das nulidades, quer as referentes à acusação quer as referentes à sentença, nomeadamente, por omissão de pronúncia ou falta de fundamentação, nos termos dos artigos 374º, n.º2 e 379º al. a) e c) do CPP, com o que a questão aqui colocada é manifestamente improcedente.
*
3.4.- Nulidade da acusação pública no acompanhamento da acusação particular pelo crime de difamação, por alteração substancial dos factos descritos nesta - violação do disposto no art. 285.º n.º 4 do CPP e consequente nulidade da sentença proferida, por omissão de pronúncia, nos termos do disposto no artigo 379º, n.º 1, alínea c) do CP.P. e por falta de fundamentação, nos termos do disposto nos artigos 379º, n.º 1, alínea a) e 374.º, n.º2 do Código de Processo Penal (conclusões 53 a 72).
Argumenta o recorrente que no que respeita ao crime de difamação arguiu a nulidade da acusação pública na parte em que a mesma consubstancia uma alteração substancial dos factos descritos na acusação particular (crime difamação), em violação do disposto no artigo 285º, n.º4 do C.P.P.; e que o Tribunal “a quo” indeferindo-a, por entender que tal invocação “é manifestamente imprópria nesta fase processual e extemporânea já que os autos comportaram a fase de instrução e, como tal, nessa sede poderia o arguido ter invocado tal vício e, não tendo feito, fica precludida a sua arguição - artigo 311º, n.º 2, do Código de Processo Penal.”; Informa que renova aqui o alegado quanto ao conhecimento das nulidades pelo Juiz de julgamento relativamente às nulidades invocadas na contestação, pelo que defende, mais uma vez, que o Tribunal “a quo” violou os dispositivos vertidos nos artigos 338º, n.º1 e 310º, n.º1 do C.P.P.;
Vejamos.
Dispõe o artigo 285º, n.º4 do CPP:
4 - O Ministério Público pode, nos cinco dias posteriores à apresentação da acusação particular, acusar pelos mesmos factos, por parte deles ou por outros que não importem uma alteração substancial daqueles.
Compulsando a acusação particular, verifica-se que o Assistente no artigo 2º acusa o arguido, aqui recorrente, de “no dia 3 de Fevereiro de 2012, à noite, durante um jantar no restaurante “F…”, sito em…, nesta comarca de Santa Maria da Feira, o arguido, na sequencia de uma conversa sobre o assistente, virou-se para a proprietária do mencionado restaurante, G…, e por forma a ser ouvido por ela e por todos os presentes, como de facto sucedeu, disse que o assistente era conhecido em Santa Maria da Feira por “burlista e chulo”;
Por sua vez, a Sr.ª Procuradora-Adjunta acompanhando aquela acusação, deduziu a sua acusação pública imputando o mesmo tipo de crime, mas descrevendo o referido facto do seguinte modo: “…no dia 3 de Fevereiro de 2012, à noite, e quando B… se encontrava no restaurante “F…”, sito em …, nesta comarca, na sequência de uma conversa acerca de C…, o arguido, dirigindo-se a G…, proferiu a seguinte expressão: “ELE É UM BURLISTA, UM CHULO QUE TEM A MANIA, MAS NÓS VAMOS FODÊ-LO”;
Posto isto, é claro que existe uma ligeira alteração de redacção entre um e outro facto.
Contudo, a lei fornece-nos na al. f) do artigo 1º do CPP, a definição legal de “alteração substancial dos factos” como sendo “aquela que tiver por efeito a imputação ao arguido de um crime diverso ou a agravação dos limites máximos das sanções aplicáveis;”
Assim, alteração não substancial dos factos é aquela que, consubstanciando embora uma modificação dos factos constantes da acusação ou da pronúncia, não tem por efeito a imputação de um crime diverso, nem a agravação dos limites máximos das sanções aplicáveis.
É o caso, embora haja uma expressão, na acusação pública que acresce à da acusação particular, nomeadamente a expressão “que tem a mania, mas nós vamos fodê - lo”, certo é que o facto concreto pressuposto da aplicação ao arguido de uma pena é o mesmo, quer porque os seus elementos essenciais não divergem, quer porque a expressão que acresce na acusação pública se integra ainda no facto histórico descrito na acusação particular, existindo apenas uma ligeira alteração no evento material descrito.
Trata-se, portanto de uma alteração não substancial dos factos descritos na acusação particular, e não de alteração substancial de factos, como pretende o recorrente, inexistindo qualquer nulidade. Por isso, não havia qualquer imposição de o juiz de julgamento no despacho proferido nos termos do art. 311º do CPP, rejeitar a acusação pública por conter factos que constituíam alteração substancial dos factos da acusação particular, nos termos do artigo 311º, n.º2 al. b) do CPP.

Por outro lado, na sentença em apreço o tribunal a quo pronunciou-se sobre a questão que lhe foi colocada do seguinte modo:
«O arguido invoca a nulidade das acusações … particular dos autos, com os seguintes fundamentos:
- quanto à acusação pública, (…); e, bem assim, na parte em que a mesma consubstancia uma alteração substancial dos factos descritos na acusação particular, imputando-se-lhe a violação do disposto no artigo 285.º, n.º 4, do Código de Processo Penal;
(…)
Importa decidir. Sob a epígrafe “saneamento do processo”, dispõe o artigo 311.º do Código de Processo Penal:
«1 - Recebidos os autos no tribunal, o presidente pronuncia-se sobre as nulidades e outras questões prévias ou incidentais que obstem à apreciação do mérito da causa, de que possa desde logo conhecer.
2 - Se o processo tiver sido remetido para julgamento sem ter havido instrução, o presidente despacha no sentido:
a) De rejeitar a acusação, se a considerar manifestamente infundada;
b) De não aceitar a acusação do assistente ou do Ministério Público na parte em que ela representa uma alteração substancial dos factos, nos termos do n.º 1 do artigo 284.º e do n.º 4 do artigo 285.º, respectivamente.
3 - Para efeitos do disposto no número anterior, a acusação considera-se manifestamente infundada:
a) Quando não contenha a identificação do arguido;
b) Quando não contenha a narração dos factos;
c) Se não indicar as disposições legais aplicáveis ou as provas que a fundamentam; ou d) Se os factos não constituírem crime.».
(…)
No que diz respeito à nulidade da acusação pública, na parte em que acusa por factos que consubstanciam uma alteração substancial dos factos descritos na acusação particular, imputando-se-lhe a violação do disposto no artigo 285.º, n.º 4, do Código de Processo Penal; Ora, uma vez mais se salienta aqui que tal invocação é manifestamente imprópria nesta fase processual e extemporânea já que os autos comportaram a fase de instrução e, como tal, nessa sede poderia o arguido ter invocado tal vício e, não o tendo feito, fica precludida a sua arguição – artigo 311.º, n.º 2, do Código de Processo Penal.
Acresce que alteração substancial dos factos é “aquela que tiver por efeito a imputação ao arguido de um crime diverso ou a agravação dos limites máximos das sanções aplicáveis” – artigo 1.º, alínea f), do Código de Processo Penal. Por conseguinte, o facto de na acusação pública constar «Ele é um burlista, um chulo que tem a mania, mas nós vamos fode-lo», ao invés do que consta na acusação particular o assistente «era conhecido em Santa Maria da Feira por burlista e chulo», não consubstancia naturalmente qualquer alteração substancial, sendo até duvidoso que se trate de uma qualquer alteração de factos.
Por tudo o que acabámos de expor, julgo não verificadas as nulidades das acusações pública e particular, invocadas pelo arguido na sua contestação.»
Portanto, a questão colocada ao tribunal foi apreciada com averiguação dos pertinentes factos e das pertinentes normas jurídicas, pelo que se não verifica qualquer nulidade da sentença por omissão de pronúncia ou por falta de fundamentação.
Quanto à violação do disposto nos artigos 338º, n.º1 e 310º, n.º1 do C.P.P. remetemos para o que supra deixamos escrito na questão 3.2..
Improcede, portanto, na totalidade a questão invocada.
*
3.5.- Não rejeição da acusação particular, e pública na parte em que a acompanha, por falta de indícios suficientes - e, por isso nulidade da sentença proferida, por omissão de pronúncia, e por falta de fundamentação. (conclusões 73 a 82);
Sustenta o recorrente que invocou, na sua contestação a nulidade das acusações pública e particular, por não existirem nos autos indícios suficientes da prática do crime particular de difamação imputado ao Arguido, perante a qual, o Tribunal “a quo” omitiu em absoluto qualquer pronúncia;
Defende que não existe nos autos de inquérito, qualquer meio de prova que comprove suficientemente, a data da alegada prática dos factos, e qual de entre as expressões referidas (“que o assistente era conhecido em Santa Maria da Feira por burlista e chulo” ou “ELE É UM BURLISTA, UM CHULO QUE TEM A MANIA, MAS NÓS VAMOS FODE-LO”) foi de facto proferida pelo arguido, e ainda a quem foi a mesma dirigida e por quem foi ouvida. Para concluir que inexistem indícios suficientes que comprovem a acusação deduzida, não sendo suficiente para a sua verificação a versão apresentada pelo assistente, sem qualquer outra base probatória; e finaliza com o entendimento de que as referidas acusações devem ser rejeitadas por manifestamente infundadas e, em consequência nula a Sentença proferida, por omissão de pronúncia e por falta de fundamentação.
Vejamos.
Sobre esta questão pronunciou-se a decisão instrutória, do seguinte modo:
“(…)
O Ministério Público deduziu, a fls. 212/216 e ss. Acusação contra B….
Imputando-lhe a prática de um crime de (…) e um crime de difamação, previsto e punido pelo art. 180, n.º1, sendo que, relativamente a este último crime fora deduzida, pelo assistente, acusação particular, a fls. 201/203. (sublinhado nosso
(…)
Assim, os elementos de prova que importa avaliar, de forma a ponderar se se verifica uma suficiente indiciação de factos que justifiquem a pronúncia do arguido, são os resultantes da fase de inquérito e tidos já em consideração aquando da prolação do despacho acusatório. (sublinhado nosso)
A saber:
(…)
- depoimento de G…, a qual sustentou que o arguido se lhe dirigiu em palavras dizendo que o assistente "era conhecido na Feira por burlista e chulo".
*
(…)
E ao nível da suficiente indiciação que se impõe para o momento acusatório ou de pronúncia, somos do entendimento que, considerando a prova resultante destes autos, se impõe a pronúncia do arguido pela prática de ambos os crimes pelos quais vem acusado (a depoente G… surge como interlocutora da verbalização das palavras que integram o crime de difamação). (sublinhado nosso)
*
Assim, de todos os elementos carreados para os autos evidencia-se existirem indícios suficientes que permitem vislumbrar como provável a futura condenação do arguido, ou que um tal sentido decisório é mais provável do que o de sentido absolutório.
Importa, pois, nestes termos e nos do disposto no art. 308º, n.º 1 do Código de Processo Penal, pronunciar o arguido pelos factos de que se encontra acusado.
*
Em face do exposto, decide-se, para julgamento em processo comum com intervenção do tribunal singular, pronunciar o arguido B…, melhor identificado nas acusações de fls. 201/203 e 212/215, porquanto indiciam suficientemente os autos a ocorrência dos factos nesta última vertidos, para os quais remeto, nos termos do disposto no art. 307º, n.º 1 do Código de Processo Penal.
*
Tais factos integram a prática, pelo arguido, em autoria material e na forma consumada, de (…) e um crime de difamação, previsto e punido pelo art. 180º, n.º 1, ambos do Código Penal.»

É certo que não foi requerida abertura de instrução relativamente ao crime de difamação, nem estamos em face dos casos que o n.º 4, do artigo 307º do CPP visavam prevenir, mas também é certo que o recorrente, na sua veste de arguido, requereu a abertura de instrução em relação ao crime de falsidade de depoimento e não a requereu [apesar de a acusação pública que acompanha a acusação particular estar contida na mesma peça] em relação ao crime particular, para esgrimir a questão colocada na contestação e em recurso.
Mas, mesmo tendo em atenção que não foi requerida instrução relativamente ao crime de difamação, resulta da referida acusação que o arguido foi identificado; os factos foram narrados, como já demos nota; as disposições legais aplicáveis e as provas que fundamentam a acusação foram indicadas; e os factos que foram descritos constituem inequivocamente crime e o crime indicado na acusação; acresce, já agora, e ex abundante, que do depoimento da testemunha G…, fls. 63 do Iº Volume, resulta, que: “O arguido também disse à depoente se ela não sabia que o Dr. Q… era conhecido na … por “burlista e chulo”.
Posto isto, atento o disposto no artigo 311º, n.º 2 al. a) e n.º 3 do CPP, afigura-se-nos claro que a acusação particular e, por consequência, a pública que a acompanha, nunca poderiam ser consideradas “manifestamente infundadas”.
Por outro lado, o Tribunal a quo [o do julgamento] pronunciou-se sobre a questão em causa, e no que ora releva, do seguinte modo:
«II.1.Da nulidade das acusações
(…)
O arguido invoca a nulidade das acusações pública e particular dos autos, com os seguintes fundamentos:
(…)
- quanto à acusação particular, por entender que não existem nos autos indícios suficientes da prática do crime particular pelo arguido, indicando como suporte da sua pretensão o disposto nos artigos 283.º, n.º 1 e n.º 2, 285.º, n.º 2, 311.º, n.º 2, alínea a), e n.º 3, alíneas c) e d), todos do Código de Processo Penal (o que acaba por corresponder ao mesmo fundamento invocado quanto à acusação pública).
(…)
Por outro lado, nesta fase processual, a falta de indícios ou provas suficientes para suportar a acusação/pronúncia deduzida e/ou a falta de elementos do tipo do crime imputado ao arguido, não consubstanciam qualquer nulidade.
Esta falta é exclusivamente apreciada em sede de instrução.
Contudo, verificando-se na fase de julgamento tem por efeito, não a nulidade da acusação ou da pronúncia, mas a absolvição do arguido a final.
(…)
Por tudo o que acabámos de expor, julgo não verificadas as nulidades das acusações pública e particular, invocadas pelo arguido na sua contestação.»
Portanto, na sentença em recurso houve inequivocamente pronúncia sobre o requerido e pronúncia fundamentada, pelo que argumentar com a omissão de pronúncia em relação à questão ou com a falta de fundamentação é uma pura perda de tempo.
Portanto, e em conclusão, a acusação pelo crime de difamação não se apresentava manifestamente infundada, para efeitos, do artigo 311º, n.º2 al. b), e n.º3 do CPP, pelo que não havia razões para a sua rejeição.
A sentença sob recurso pronunciou-se sobre a questão que lhe foi posta e de forma fundamentada pelo que não foi cometida qualquer nulidade e nomeadamente, as previstas no artigo 379º als. a) e c) do CPP.
Pelo exposto improcede a questão.
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3.6.- Nulidade da sentença por omissão de pronúncia quanto à invocada inexistência de queixa pelo crime de difamação e, por isso, nulidade insanável do inquérito, nos termos do artigo 119º, alínea d) do C.P.P. de conhecimento oficioso que impõe dever ser o Assistente considerado parte ilegítima (conclusões 83 a 95);

Sustenta o recorrente que em sede de inquérito nunca foi confrontado com o dia 03/02/2012 como a data da alegada prática do crime de difamação na pessoa do assistente; aquando do interrogatório complementar realizado a 12.10.2012, foi confrontado com os factos vertidos na queixa apresentada pelo assistente de que “no dia 17.02.2012, à noite, durante um jantar no restaurante “F…”, em …, desta comarca … o denunciado B… e disse: - “…Ele (denunciante) é um burlista e um chulo que tem a mania, mas nós vamos fode-lo”; o assistente a 29.10.2012, deduziu acusação particular contra o Arguido e acusou-o de “no dia 03.02.2012, à noite, durante um jantar no restaurante “F…”, em …, na sequência de uma conversa sobre o aquele, virou-se para a proprietária do mencionado restaurante, G…, e por forma a ser ouvido por ela e por todos os presentes, como de facto sucedeu, disse que o assistente era conhecido em … por burlista e chulo”.
Em consequência, entende o recorrente que existe falta de queixa do assistente contra o Arguido pelos factos vertidos na acusação particular, o que na sua perspectiva, determina a nulidade insanável do inquérito, no termos do artigo 119º, alínea d) do C.P.P., de conhecimento oficioso;
Mais acrescenta que o tribunal a quo, pronunciando-se argumenta que “no caso dos autos, os factos constantes da acusação pública são exatamente aqueles que já constavam da queixa apresentada pelo assistente. Contudo, na acusação particular consta que esses factos terão ocorrido em 03/02/2012, enquanto na participação os mesmos situar-se-iam em 17/02/2012.”; E que o tribunal a quo conclui que, “os factos constantes da acusação particular encontram correspondência integral na queixa apresentada, salvo quanto à data dos mesmos, que de acordo com a investigação, e depois, com a instrução, ter-se-á fixado num dia distinto daquele que inicialmente se referia. Contudo, esses factos correspondem ao mesmo “pedaço de vida” que esteve na origem do processo.”. O recorrente expressa a sua discordância com o entendimento do Tribunal “a quo”, pois que, diz, “a verificação da condição de procedimento estabelecida para os crimes particulares, ínsita no art. 50º, nº 1 do C. Processo Penal pressupõe a correspondência entre o facto transmitido na queixa e o facto levado à acusação.”;

Vejamos, com brevidade, atento, nomeadamente, o teor da queixa apresentada.
Dispõe o artigo 49º, n.º1, do CPP que «quando o procedimento criminal depender de queixa, do ofendido ou de outras pessoas, é necessários que essas pessoas dêem conhecimento do facto ao Ministério Público, para que este promova o processo
Dispõe o artigo 50º do CPP sob a epígrafe “legitimidade em procedimento dependente de acusação particular
«1.Quando o procedimento criminal depender de acusação particular, do ofendido ou de outras pessoas, é necessário que essas pessoas se queixem, se constituem assistentes e deduzam acusação particular
Confrontados os autos verifica-se que neles existe uma queixa ou participação, da qual, aliás, o recorrente dá conta pormenorizadamente nos artigos da sua contestação já citados, e onde se alegam e se dá queixa de factos ocorridos em várias datas, entre elas, os dias 03.02.2012 e 17.02.2012; e quer os factos objecto de queixa relativamente ao dia 03.02.2012, quer os objecto de queixa relativamente ao dia 17.02.2012 se passam perante a testemunha G…, proprietária do Restaurante “F…”, em …, e tem outros elementos comuns nomeadamente a expressões com uso do verbo “foder”, assim: “ Vou fodê-lo todo”; “Ele vai-se foder, porque eu não tenho nada a perder….”;“Só descanso quando o foder e ele….” “…mas nós vamos fodê-lo”.
Ora, perante o modo como foi efectuada a queixa e o modo como foi deduzida acusação não há quaisquer dúvidas que foi apresentada queixa sobre os factos acusados, pois ambas as datas foram objecto de queixa, e todos os factos quer os constantes da acusação particular quer da pública que aquela acompanha, foram objecto de queixa, acontece que na acusação particular se alegou que os factos ocorridos no dia 03.02.2012 eram os que tinham sido descritos na queixa como ocorridos em 17.02.2012.
Todavia, como ambas as datas constavam da queixa e todos os factos descritos na acusação [ou acusações] constavam da queixa, não se pode falar em falta de queixa ou em queixa infundada, apenas numa alteração, nesta fase com pouca relevância [porquanto o arguido teve possibilidade de dela se defender em julgamento e até em instrução, se assim o entendesse] nos factos acusados no seu confronto com os factos participados, mais especificamente na data dos mesmos.
Por outro lado, na sentença em escrutínio escreveu-se e ponderou-se, com interesse para a questão:
«No que diz respeito à acusação particular, apesar de não ter sido invocada pelo arguido na sua contestação, em sede de audiência de julgamento foi suscitada uma outra irregularidade relacionada com a circunstância de os factos narrados nessa acusação terem alegadamente ocorrido em 03/02/2012, e de acordo com a queixa apresentada pelo assistente os mesmos factos terem ocorrido em 17/02/2012.
Ou seja, da inexistência de queixa quanto aos factos descritos na acusação particular e depois, por remissão, no despacho de pronúncia.
Antes de mais, importa ter presente, naturalmente, que o crime de difamação reveste natureza particular, o que significa que tanto a queixa como a acusação particular constituem pressupostos de procedibilidade da acção penal.
Ou seja, inexistindo queixa ou acusação particular, não pode o Tribunal condenar o agente pela prática de um crime de natureza particular – art.s 188.º, n.º 1, e 117.º do CP.
Ora, no caso dos autos, os factos constantes da acusação pública são exactamente aqueles que já constavam da queixa apresentada pelo assistente.
Contudo, na acusação particular consta que esses factos terão ocorrido em 03/02/2012, enquanto na participação os mesmos situar-se-iam em 17/02/2012.
A questão que se coloca é assim a de saber se a mera alteração de data dos factos alegadamente criminosos faz com que consideremos que inexiste queixa/participação relativamente aos factos que constituem o crime de difamação.
Sobre este assunto, refere-se no acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães de 11/07/2013 (proc. 1/12.6TAEPS.G1, in www.dgsi.pt) que a eficácia duma queixa, inicialmente limitada à imputação dum concreto comportamento, não se pode estender a todos os outros eventuais comportamentos do denunciado, passados, presentes ou futuros que o queixoso venha a considerar ofensivos.
Contudo, não se exige, naturalmente, que nos crimes semipúblicos e particulares os factos da queixa tenham uma coincidência milimétrica com os que, depois, são investigados no inquérito e vertidos na acusação. Mas há-de ser possível formular o juízo de que os factos da acusação pertencem ao mesmo “pedaço de vida” que foi referido na queixa que esteve na origem do processo.
No caso, os factos constantes da acusação particular encontram correspondência integral na queixa apresentada, salvo quanto à data dos mesmos, que de acordo com a investigação, e depois, com a instrução, ter-se-á fixado num dia distinto daquele que inicialmente se referia. Contudo, esses factos correspondem ao mesmo “pedaço de vida” que esteve na origem do processo.
Assim, os factos constantes da acusação particular para a qual remete o despacho de pronúncia, têm como queixa aquela que aqui foi apresentada pelo assistente, inexistindo qualquer irregularidade com base nesse fundamento.»
Como já resulta do que foi dito pelo tribunal a quo não é verdade ter o arguido invocado na sua contestação a mencionada nulidade, muito pelo contrário, ao longo da sua contestação faz várias vezes referência à «participação crime que C… apresentou contra H…, e B…, em 20.04.2012, que deu origem ao processo n.º 576/12.0TAVFR, e que a 24.04.2012, por despacho da Srª Procuradora-Adjunta foi apensado aos presentes autos - Apenso A.», mas nunca levanta esta questão. vide fls. 471/vº no 2º volume, artigo 53º da Contestação, atendendo-se ainda aos artigos 54º, 55º, 66º da mesma contestação.
Não há, portanto, dúvida que foi apresentada queixa, pois, todos os factos e todas as datas foram objecto de queixa.
Posto isto, é claro que não houve qualquer omissão de pronúncia e, tendo em atenção o que acima referimos e os argumentos expendidos pelo tribunal a quo com os quais concordamos, inexiste qualquer nulidade insanável, por falta de queixa.
Improcede, portanto, a questão na totalidade.
*
3.7.- Ilegitimidade do assistente para deduzir pedido cível contra o Recorrente pelo crime de falsidade de testemunho - violação do disposto nos artigos 68º, n.º1, al. a) e 74.º, n.º 1, ambos do C.P.P., e ainda o artigo 113º, n.º 1 do C.P. (conclusões 96 a 113);

Sustenta o recorrente que ainda em sede de contestação invocou a excepção de ilegitimidade do assistente para deduzir pedido de indemnização civil contra si pelo imputado crime de falsidade de testemunho e argumenta que o assistente foi admitido a intervir nos autos nessa qualidade em face dos crimes denunciados de natureza particular, difamação e denúncia caluniosa, motivo pelo qual entende que o Douto Despacho recorrido e o Douto Acórdão que o manteve, não forma caso julgado sobre a legitimidade dessa intervenção, vigorando a este respeito o princípio rebus sic stantibus;
Na sentença sob escrutínio, por sua vez, entendeu-se:
«II.2.Da ilegitimidade do demandante civil
No que concerne ao pedido de indemnização civil deduzido pelo assistente de folhas 226 a 240, relativo aos danos patrimoniais e não patrimoniais decorrentes do crime de falsidade de depoimento imputado ao arguido, este último pugna pela sua ilegitimidade em deduzi-lo, de acordo com o que preceitua o artigo 74.º, n.º 1, do Código de Processo Penal.
Ora, dispõe o invocado n.º 1 do artigo 74.º do Código de Processo Penal: «O pedido de indemnização civil é deduzido pelo lesado, entendendo-se como tal a pessoa que sofreu danos ocasionados pelo crime, ainda que se não tenha constituído ou não possa constituir-se assistente.».
Considerando o teor deste preceito legal e vistos os fundamentos de facto expedidos no pedido de indemnização civil em apreço, não nos restam dúvidas quanto à patente legitimidade processual do demandante para deduzir o pedido indemnizatório, já que, de acordo com tal alegação, o demandante sofreu danos patrimoniais e não patrimoniais decorrentes da actuação que ao arguido é imputada na acusação pública.
Acresce que a questão relativa à legitimidade de o demandante civil para se constituir como assistente nos autos foi decidida por acórdão proferido no dia 12 de Dezembro de 2012 pelo Tribunal da Relação do Porto, nos presentes autos (folhas 53 a 62 do apenso de recurso). Questão diferente é a de saber se esses danos se verificaram e se, tendo-se verificado, são os mesmos consequência direta e necessária da actuação alegadamente criminosa do arguido/demandado. Esta é uma questão de legitimidade substantiva e não processual, a que deve ser apurada em face da prova produzida.
Por todo o exposto, declaro o demandante C… parte legítima relativamente ao pedido de indemnização civil deduzido de folhas 226 a 240.»
Vejamos.
Ao contrário do ora invocado em recurso, na participação que deu entrada em tribunal a 20 de Abril de 2012, em que era queixoso C… e denunciados H… e B…, foram alegados, nos artigos 8º a 13º da referida queixa, factos passíveis de serem, como foram, inclusive na referida queixa, subsumidos ao crime de falsidade de testemunho, p. e p. pelo artigo 360º, n.º1 do CP, como decorre das als. a) e b) do artigo 16º da referida queixa.
Por outro lado, o Acórdão deste TRP de 12 de Dezembro de 2012, também ao contrário do pretendido neste recurso, debruçou-se especificamente sobre a questão da legitimidade do queixoso para se constituir assistente em relação ao crime de falsidade de depoimento ou declaração, como decorre da argumentação expendida, naquele acórdão a fls. 8 e 9 do mesmo, fls. 60 e 61 daqueles autos – 250/12.7TAVFR-A.
Com efeito aí se escreveu:
«Passemos agora à questão de saber se, C… deve ou não intervir nos autos como assistente.
Como já se disse e resulta da resenha acima efectuada, nos autos a estes apensos, o assistente denunciou, entre outros, a prática de crimes de difamação, crimes esses que assumem natureza particular - cfr. art. 188°, n.º1 do Código Penal.
Ora, relativamente a tais crimes, determina o art. 50º, n.º1 do Código de Processo Penal que "quando o procedimento criminal depender de acusação particular, do ofendido ou de outras pessoas, é necessário que estas se queixem, se constituam assistentes e deduzam acusação particular”.
C… apresentou queixa a 20 de Abril de 2012 e nessa mesma queixa requereu a sua constituição como assistente.
Quer dizer, o ofendido apresentou o requerimento (para intervir nos autos como assistente) no prazo a que alude o art. 68º, n.º2, do Código de Processo Penal. E diga-se que, atenta a natureza de um dos crimes denunciados nos autos a estes apensos, tal requerimento é imprescindível para a prossecução dos autos.
Por outro lado, o assistente denunciou ainda factos que, na sua opinião, integram a prática dos crimes de denúncia caluniosa e falsidade de declaração.
Ora, quanto ao crime de denúncia caluniosa há que considerar a Jurisprudência assente no sentido de que o "caluniado" tem legitimidade para se constituir assistente no processo instaurado contra o "caluniador" - Acórdão de Fixação de Jurisprudência do STJ, n." 8/2006, publicado no Diário da República, I Série-A, de 28/11/2006.
Acrescenta-se ainda que, mesmo que o objecto destes autos se circunscrevesse ao crime de falsidade de depoimento ou declaração, sempre o denunciante gozaria de legitimidade para se constituir como assistente.
A este propósito escreve o Prof. Paulo Pinto de Albuquerque no Comentário do Código de Processo Penal, Universidade Católica Editora, página 8, 208, em anotação ao artigo 68º: «A limitação da legitimidade para constituição como assistente aos titulares dos interesses protegidos pela incriminação não viola a CRP (acórdão do TC n076/2002). Mas a constituição como assistente não pode ser excluída em função da natureza pública do bem jurídico protegido pela incriminação, antes ela se há-de admitir sempre que esse bem jurídico puder ser encabeçado num portador concreto ou, dito nas palavras do excelente acórdão de fixação de jurisprudência do STJ n01/2003, "quando os interesses, imediatamente protegidos pela incriminação, sejam, simultaneamente, do Estado e de particulares … a pessoa que tenha sofrido danos em consequência da sua prática tem legitimidade para se constituir assistente" (também neste sentido, Figueiredo Dias e Anabela Rodrigues, 1989: 105, Damião da Cunha, 1998 a: 630, Costa Pinto 2001: 699 e 700, e Silva Dias, 2004: 61). Assim, por exemplo, têm legitimidade para se constituírem assistentes:
(…)
b) a pessoa prejudicada pelo crime de falsidade de testemunho, perícia, interpretação ou tradução (também assim, Silva Dias, 2004:62, mas sem razão, acórdão STJ, de 14/11/2002, in CJ, Acs do STJ, X, 3, 227).»
Neste contexto, mesmo que estivesse em causa apenas o crime de falsidade de testemunho, o que não é manifestamente o caso, sempre o denunciante teria legitimidade para se constituir como assistente.
Pelos motivos expostos, e independentemente da oposição do arguido, nada obsta a que C… seja admitido a intervir nos autos na qualidade de assistente. Pelo que, bem andou, o Sr. Juiz quando admitiu tal constituição como assistente.» [sublinhados nossos]
Posto isto, importa referir que vem sendo maioritariamente sufragado que a legitimidade da constituição do assistente não é «uma questão sujeita ao efeito negativo do caso julgado penal, a que alude o princípio non bis idem, previsto no artigo 29º, n.º5 da CRP, a decisão que admite o assistente tem o valor de caso julgado formal subordinado à condição rebus sic stantibus; ou seja, alterado o objecto da lide por efeito da acusação, ou de posterior qualificação do crime, se a relação processual de quem até então interviera como assistente for afectada, a sua posição processual deve ser reapreciada em conformidade com a nova situação» – vide neste sentido AC. da Rel. Porto de 26.04.2000, CJ 2000, Tomo II, pag. 242, e Ac. do STJ de 08.02.2001, Rel. Simas Santos e Ac. da Rel. de Lisboa de 25.11.2001, disponíveis no site da DGSI, e o Ac. da RL de 01.10.1997 in CJ 1997, Tomo IV, pág. 146.
Esta regra parte da ideia do dinamismo da relação jurídica processual em conjugação com a teoria da imprevisão, e consubstancia-se em a legitimidade do assistente poder ser reapreciada sempre que as circunstâncias que determinaram a consideração da legitimidade para intervir como assistente, se modificarem.
Todavia, nos autos, a questão da legitimidade do queixoso C… para se constituir assistente está decidida, fazendo caso julgado formal nos autos até que sobrevenham circunstâncias que alterem as que foram levadas em consideração aquando da prolação do despacho de admissão do queixoso como assistente; circunstâncias modificativas que não foram alegadas e que percorrendo os autos também se não vislumbram.
Ora, de acordo com o artigo 74º do CPP lesado é toda a pessoa que em consequência do crime (ou do facto por que o arguido foi acusado) tenha sofrido danos em direitos ou interesses juridicamente protegidos, segundo as normas de direito civil que fixam os pressupostos da responsabilidade civil extracontratual por facto ilícito. Por outro lado, o lesado tem os direitos que a lei confere aos assistentes, mas restritos à sustentação e prova do pedido de indemnização…[Vide Henriques Gaspar, in Código de Processo Penal Comentado, págs. 273].
Assim, visto que o queixoso alega factos que, na sua perspectiva integram a prática pelo arguido de um crime de falsidade de depoimento ou declaração, e de onde resulta ter sofrido danos que invoca, é claro que para efeitos do artigo 74º do CPP, que o queixoso, ora assistente, é lesado e, portanto, tem legitimidade para deduzir pedido de indemnização civil.
Pelo exposto improcede a questão posta.
*
3.8.- Impugnação da matéria de facto provada sob os artigos 6, 7, 8, 10, 11 e 12 da matéria de facto provada, por erro de julgamento e por violação do princípio in dubio pro reo. Violação do princípio da livre apreciação da prova (conclusões 114 a 166).

Atento o disposto no artigo 428.º, n.º 1, do Código Processo Penal, as Relações conhecem de facto e de direito, acrescentando o artigo 431.º que “Sem prejuízo do disposto no artigo 410.º, a decisão do tribunal de 1ª instância sobre matéria de facto pode ser modificada: a) Se do processo constarem todos os elementos de prova que lhe serviram de base; b) Se a prova tiver sido impugnada, nos termos do n.º 3, do artigo 412.º; ou c) Se tiver havido renovação da prova.”
Assim e de acordo com o artigo 412.º, n.º 3, “Quando impugne a decisão proferida sobre matéria de facto, o recorrente deve especificar: a) Os concretos pontos de facto que considera incorrectamente julgados; b) As concretas provas que impõem decisão diversa da recorrida; c) As provas que devem ser renovadas”.
A tais ónus acresce ainda, caso pretenda a reapreciação da prova, o da indicação concreta das passagens do registo áudio em que se funda a impugnação, de harmonia com o estatuído no n.º 4, do artigo 412, do CPP.
Impõe-se, ainda, referir que o recurso sobre a matéria de facto não pressupõe uma reapreciação pelo tribunal de recurso de todos os elementos de prova que foram produzidos e que serviram de fundamento à sentença recorrida, mas apenas e tão-só a reapreciação da razoabilidade da convicção formada pelo tribunal a quo, a incidir sobre os pontos de facto impugnados e com base nas provas indicadas pelo recorrente (Ac. STJ de 2007/Jan./10).
Daí que esse reexame esteja sujeito ao referido ónus de impugnação, sendo através do mesmo que se fixam os pontos da controvérsia e se possibilita o seu conhecimento pela Relação (Ac. STJ de 2006/Nov./08).
Trata-se, pois, de apurar se os meios probatórios sindicados sustentam a convicção adquirida pelo tribunal a quo, de harmonia e em coerência com os princípios que regem a apreciação da prova, e não de obter uma nova convicção do tribunal ad quem em resultado da apreciação da globalidade da prova produzida.
É consabido que muito embora, segundo o disposto no artigo 127.º, o tribunal seja livre na formação da sua convicção, existem algumas restrições legais ou condicionantes estruturais que o podem comprimir. Tais restrições existem no valor probatório dos documentos autênticos e autenticados (169.º), no efeito de caso julgado nos Pedido de Indemnização Cível (84.º), na prova pericial (163.º) e na confissão integral sem reservas (344.º). Aquelas condicionantes assentam no princípio da legalidade da prova (32.º, n.º 8, da Constituição; 125.º e 126.º) e no princípio “in dubio pro reo”, enquanto emanação da garantia constitucional da presunção de inocência - 32.º, n.º 2, da Constituição.
O princípio da livre apreciação da prova impõe ao julgador uma convicção vinculada às regras da experiência e da lógica, bem como às provas que não estão subtraídas a esse juízo, e consequentemente imprescindível motivação da referida convicção, estando ainda sujeito aos princípios estruturantes do processo penal, como o da legalidade das provas e “in dubio pro reo”.
Assim, salvo a violação das mencionadas restrições legais ou violação dos princípios estruturantes, o juízo decisório da matéria de facto só é susceptível de ser alterado, em sede de recurso, quando a racionalidade do julgamento da matéria de facto corresponda, de um modo objectivo, a um juízo desrazoável ou mesmo arbitrário da apreciação da prova produzida.
O recorrente cumpriu satisfatoriamente os ónus a que estava obrigado, mormente na sua motivação.
Vejamos, então.
Argumenta a recorrente – conclusões 115 a 149 - que os pontos 6 e 7 [e, bem assim, os factos 8 e 9] dos factos provados não podiam ter sido dados por provados, pelas seguintes razões:
- analisando as declarações prestadas pelo assistente e pelas testemunhas D… e I…, não poderia o Tribunal “a quo” ter dado provado designadamente o ponto 7) dos factos provados;
- nas suas declarações o assistente afirma inúmeras vezes não se recordar de datas, porém no que concerne à hora que alegadamente saiu sozinho de casa da testemunha D…, é perentório em afirmar que foi às 02h00;
- resulta das regras da experiencia comum que sendo o assistente advogado, tem conhecimentos técnicos que lhe permitem saber o sentido e alcance das afirmações que proferiu;
- o Tribunal “a quo” na sua motivação afirma que o assistente só mais tarde aquando da elaboração da denúncia de folhas 2 a 11 do apenso n.º 576/12.0TAVFR se apercebeu como podia provar a sua inocência nos factos que lhe eram imputados pela denunciante no inquérito n.º 1152/11.0TAVNF e que teriam sido presenciados pelo ora arguido, mas lendo a denúncia de folhas 2 a 11 do apenso n.º 576/12.0TAVFR, constata-se que o assistente não faz qualquer referência, directa ou indiretamente, ao local onde alegadamente estaria no dia 27.09.2011;
- o tribunal ignorou também a relação existente entre o assistente e o “confidente”, a testemunha D… e que este também é advogado;
- a única testemunha que declarou que o assistente saiu de sua casa já bastante tarde, depois das 02h00, foi precisamente a testemunha D…;
- o aqui assistente, no âmbito do processo 1152/11.0TAVNF e na qualidade de arguido limitou-se a negar os factos que lhe foram imputados.
- após terem conhecimento das declarações prestadas pelo aqui arguido na qualidade de testemunha no âmbito do processo 1152/11.0TAVNF, é logico que o assistente e a testemunha D… declarassem que aquele saiu do festejo em casa deste depois da 00h00, afastando deste modo qualquer suspeita sobre os factos investigados no inquérito n.º 1152/11.0TAVNF;
- o assistente declarou que só se recordara de onde estaria no dia 27 de Setembro de 2011, entre as 19h30 e as 02h00, quando “faço o pedido de indemnização cível e que meto o Dr. D… como testemunha e é ele quem me dá conhecimento”;
- o pedido de indemnização cível foi deduzido após a dedução das acusações particular e públicas, e depois das referidas testemunhas (D… e I…) terem prestado declarações no âmbito do inquérito;
- quer das declarações do assistente quer da denúncia de folhas 2 a 11 do apenso 576/12.0TAVFR, referida na motivação do Tribunal, resultam contradições entre a prova produzida e os factos dados como provados;
- o Tribunal não podia considerar que o assistente se apercebeu, que na data dos factos em causa estaria na festa de aniversário de um colega advogado, aquando da elaboração da denúncia de folhas 2 a 11 do apenso 576/12.0TAVFR, se o assistente referiu em tribunal que se apercebeu disso quando fez o pedido de indemnização cível e o mostrou ao Dr. D…, que o alertou para onde aquele tinha estado;
- quando teve o assistente consciência de que afinal tinha estado no dia 27 de Setembro de 2011 na festa de aniversário do Dr. D…? Terá sido aquando da elaboração da denúncia de folhas 2 a 11 do apenso 576/12.0TAVFR ou do pedido de indemnização cível?
- e, analisando quer a referida denúncia, quer o referido pedido de indemnização cível, dos mesmos não resulta vertido qualquer facto que permita concluir como concluiu o Tribunal “a quo”, que o assistente na data dos factos em causa estava na festa de aniversário da testemunha D…;
- o Tribunal “a quo” considerando para a sua motivação factos ou acontecimentos que não tiveram correspondência com qualquer meio de prova produzida em audiência, errou na sua apreciação…
- o facto de na denúncia apresentada pela queixosa no processo 1152/11.0TAVNF aquela não ter relatado que o ora arguido viu o individuo que teria depositado o referido CD no jardim da habitação e que seria capaz de o reconhecer, não prova que as declarações prestadas pelo arguido não correspondem à verdade, apenas prova que a denunciante não relatou que o arguido viu o indivíduo que depositou o CD no jardim da habitação;
- de igual modo, a estreita ligação que unia e une o arguido à denunciante, não prova que esta tinha conhecimento de que o arguido tinha visto o indivíduo que depositou o CD no jardim da habitação;
- mesmo que a denunciante tivesse aquele conhecimento, daí tê-lo indicado como testemunha, não prova que o arguido tenha faltado à verdade nas suas declarações, prestadas logo que para tal foi notificado.
- o aqui arguido é completamente alheio e isento de qualquer responsabilidade, no facto de as suas declarações como testemunha terem sido prestadas cerca de 3 meses e meio depois (13.01.2012) da denúncia apresentada (28.09.2011), e não como refere o Tribunal a quo “quase meio ano volvido do início do processo”;
- o Arguido a ter prestado falsas declarações como testemunha no âmbito do proc. 1152/11.0TAVNF, seria porque a denunciante naqueles autos não referiu que o ora Arguido tinha visto o individuo que teria depositado o referido DVD-R no jardim da sua residência, e não, porque se apurou que no mencionado dia e hora, C… se encontrava na residência de D… a comemorar o aniversário deste;
- deveria o Tribunal “a quo” ter dado como não provado que “quando prestou o seu depoimento nos termos supra descritos, o arguido tinha perfeito conhecimento de que o por si afirmado não correspondia à verdade.”; E ainda como não provado que o “Arguido agiu de vontade livre e consciente, com o propósito de, através do seu depoimento não correspondente à verdade dos factos, conseguir demonstrar que havia sido, de facto, o ora assistente a deixar o mencionado DVD-R no jardim da sua residência, bem sabendo que a sua conduta era proibida e punida por lei.”;
- ao dar como provados tais factos, o Tribunal “a quo”, não só violou todas as regras de valoração da prova, como ainda atentou contra os mais elementares princípios do processo penal, ao condenar o arguido sem provas.

Por sua vez, o tribunal a quo motivou, a sua decisão relativamente a estes factos, no seguinte:
«… a nossa convicção quanto à factualidade provada da acusação pública (factos provados nos pontos 1) a 9) supra) ancorou-se nas declarações prestadas pelo assistente C…, nos depoimentos prestados pelas testemunhas D… e I…, e no teor das certidões do processo de inquérito n.º 1152/11.0TAVFR, que correu termos nos Serviços do Ministério Público de Santa Maria da Feira, constantes de fls. 2/12 destes autos e de fls. 13/21 do apenso A (contendo: auto de denúncia de 23/09/2011 efetuada por H… (28/09/2011), auto de inquirição daquela denunciante (22/11/2011), auto de inquirição do ora arguido, na qualidade de ali testemunha (13/01/2012), auto de interrogatório do ora assistente, na qualidade de ali arguido (09/02/2012), despacho de arquivamento desses autos); das fotocópias do despacho que determinou a realização das buscas nesse inquérito (fls. 486 e 487) e dos mandados e autos de busca e apreensão de fls. 497, 498, 499, e 631 a 634; bem como da certidão do assento de nascimento de D… (cf. fls. 627/629).
Concretizando.
A prova oralmente produzida e acima expressamente referida contraria de forma contundente o depoimento prestado pelo arguido no processo de inquérito n.º1152/11.0TAVNF, na qualidade de testemunha.
Com efeito, enquanto o arguido ali referiu ter visto, no dia 28/09/2011 (querendo certamente referir-se a 27/09/2011 – já que a queixa crime foi apresentada a 28/09/2011, pelas 19.30), “por voltas da meia noite ao chegar à residência sua dos seus pais (indo de carro) sita em … – …, deparou-se com uma pessoa que ia a pé na via pública o qual atirou para o jardim da residência dos seus pais.": mais referindo que “de imediato reconheceu pessoa como sendo “C…”. (…) Quando entrou em casa dos pais dirigiu-se ao jardim a fim de ver o que para ali tinha sido atirado pelo C…, tendo deparado com um envelope almofadado de cor castanho selado e com o nome do depoente inscrito com letras bem grandes do lado de fora.”, mais dizendo que se tratava do DVD-R contendo 100 fotografias da sua actual mulher em atos sexuais.
O assistente e as testemunhas D… e I… que tal facto não pode corresponder à verdade, já que na referida data e hora, o assistente estava na residência de D…, festejando o seu aniversário.
Com efeito, sem embargo o registo visivelmente consternado com o sucedido e antagonizado com o arguido e a sua mulher (denunciante naqueloutros autos), o assistente C…, relatou de forma aparentemente coerente e verosímil como só mais tarde (já depois de proferido despacho de arquivamento) se veio a aperceber como podia provar a sua inocência dos factos que lhe eram imputados pela denunciante no identificado processo de inquérito e que alegadamente teriam sido presenciados pelo ora arguido, já que na data em causa estaria na festa de aniversário de um colega Advogado – o Senhor Doutor D… –, disso apenas se apercebendo aquando a elaboração da denúncia de folhas 2 a 11 do apenso n.º 576/12.0TAVFR.
Por seu turno, a testemunha D…, reconhecendo uma relação pessoal estreita com o assistente, de modo que se teve por plenamente credível, porque coeso e seguro, declarou que na data em causa o assistente foi à sua festa de aniversário – comemorada no próprio dia (27 de Setembro – cfr. certidão emitida pela Conservatória do Registo Civil de Santa Maria da Feira, junta de folhas 627 a 629) –, de onde não se ausentou no intervalo temporal que se situa, pelo menos, entre as 20:00 e as 2:00. Mais relatou o depoente como veio a alertar o assistente para aquela coincidência quando aquele lhe mostrou o esquiço da referida peça processual. Por último, narrou ainda a testemunha o que ainda pôde percepcionar das buscas levadas a cabo no escritório do assistente, uma vez que o seu escritório é mesmo ao lado do do assistente e, por tal motivo, como chegou no decurso das mesmas, logo se pôde aperceber do que se estava a passar, explicitando a visibilidade e difusão que tal evento teve na Rua onde se situa o escritório, no meio social e no seio dos Colegas e da Comarca, descrevendo os efeitos que tal factualidade teve na pessoa do assistente, na sua vida social e na sua vida profissional, sendo de pôr em evidência que a testemunha apenas referia os factos que tinha por seguros, evitando exacerbar tais consequências.
De igual modo, a testemunha I…, também ele amigo e colega do assistente, de forma fundada e vivida explicou porque se recordava da presença do assistente na festa de aniversário da antecedente testemunha – por ter sido a última em casa dos progenitores daquele (entretanto ambos tinham tido um filho – 2013 – e no ano de 2012 a testemunha D… havia mudado de casa) –, seu amigo próximo. Mais referiu que o seu amigo C… nunca se ausentou daquela casa, desde a hora a que chegou (pelas 20:00) até à hora da sua saída (00:00), sendo certo que aquele ainda ali continuou.
Ora, os depoimentos destas testemunhas, para além de objetivos, seguros, pormenorizados e coerentes, relatam factos que chegaram ao seu conhecimento de forma direta e pessoal. Além disso, no que diz respeito à data de aniversário de D…, são corroborados pela certidão do assento de nascimento junta aos autos.
Assim, não se nos suscita qualquer dúvida relativamente à veracidade dos seus relatos, sendo certo que corroboram os factos descritos pelo próprio assistente, tornando o depoimento prestado pelo arguido B… no processo de inquérito n.º 1152/11.0TAVNF absolutamente incompatível como a realidade.
Importa ainda atentar numa outra circunstância que motivou já o despacho que arquivamento proferido nesses autos e cuja estranheza gerada não foi dissipada neste julgamento. Com efeito, do teor da certidão extraída do processo de inquérito n.º 1152/11.0TAVNF, dos Serviços do Ministério Público de Santa Maria da Feira, em especial, da denúncia feita por H… em 28/09/2011 resulta que a queixosa nunca refere que o ora arguido viu o indivíduo que teria depositado o referido “CD” no jardim da habitação e que seria capaz de o reconhecer (folhas 3 a 6), assim como também não o mencionou quando foi inquirida no âmbito de tais autos (cfr. folhas 7 a 8), facto que, a ser verdade, era de inegável valor probatório e necessariamente seria transmitido aquando a apresentação da denúncia, até porque inelutavelmente não podia deixar de ser do conhecimento da denunciante, atenta a estreita ligação que a unia e une ao arguido, então testemunha, sendo que tal circunstancialismo apenas foi narrado na inquirição do arguido como testemunha – «(…) o depoente de imediato reconheceu a pessoa como sendo “C…” (…)» –, quase meio ano volvido do início do processo. Aliás, do discurso da queixosa nessa participação (e releva-se que a queixosa é advogada de profissão) vai no sentido de ter tomado conhecimento da colocação do DVD no interior dos muros da residência do então seu noivo e testemunha por si no acto indicada, pelo próprio e no dia anterior, referindo expressamente que “Não tem a mínima dúvida de que só o denunciado às mesmas (referindo-se às fotografias do DVD) teve acesso e só este as podia ter agora feito chegar ao seu noivo, ora si ou por interposta pessoa, foi o próprio quem as fez e nunca em momento algum a inquirida autorizou a sua exibição a terceiros. (…) Mais deseja acrescentar que a letra da palavra “B…” constante do envelope, em tudo se assemelha à do denunciado, com quem conviveu cerca de 4 anos.”. Ora, este discurso (tentando procurar e evidenciar indícios que liguem o DVD ao ora assistente C…) só se justifica se nenhuma prova direta existisse, designadamente o testemunho de alguém que tivesse visto tal facto.
Quanto aos factos referentes ao elemento subjetivo do crime (dolo), a nossa convicção ancora-se novamente nos elementos probatórios acima referidos, analisados à luz das regras de normalidade, conjugadas com as próprias declarações do arguido, que refere expressamente ter sido advertido da consequência penal para a falsidade do depoimento. Acresce que os factos descritos pelo arguido nesse seu depoimento relativamente à visualização do arremesso do DVD pelo aqui assistente, nas circunstâncias de tempo e de lugar por si descritas foram-no de forma muito clara e objetiva, não se suscitando dúvidas de que o mesmo queria efectivamente referir tais factos.»

Ouvidas as declarações e depoimentos esgrimidos, do arguido, do assistente, e das testemunhas D… e I… e analisados os documentos mencionados pelo tribunal e pelo recorrente no seu recurso e conciliados uns e outros, entendemos que em parte assiste razão ao recorrente quando entende que, pelo menos, com base no princípio in dubio pro reo deveriam ter sido dados por não provados os pontos 6, 7, 8 e 9 dos factos provados.
É o que procuraremos demonstrar de seguida.
Não se colocam dúvidas de maior sobre o facto de as referidas duas testemunhas, D…, I… e o Assistente terem sido mais ou menos coerentes entre si na forma como relataram ao tribunal que o assistente no dia 27.09.2011, entre cerca das 8 horas da noite [20 horas] e as duas horas da madrugada do dia seguinte [depoimento da Testemunha D…; testemunha Dr. I… até á hora de ir embora, pois disse: “Eu devo ter saído, no dia seguinte tenho ideia que era dia de trabalho, saí dali onze e meia, meia noite”] permaneceu no festejo de aniversário do Dr. D… [que está provado documentalmente nasceu em 27de Setembro de 1979, conforme fls. 628, 3º volume] em casa dos pais do aniversariante, numa dependência da casa daqueles, no rés-do-chão, sem sequer nesta sede se explorar se já estava tudo organizado, pronto, quando chegaram a casa dos pais do Dr. D… ou se a comida a foi ele buscar ao restaurante, ou ao vizinho…
A questão que se coloca é a da credibilidade dos seus depoimentos e da verosimilhança dos mesmos em face do que já constava dos autos e das certidões do processo 1152/11.0TAVNF, onde o aqui arguido havia sido testemunha, e o aqui assistente havia sido arguido, e onde nunca, nessa qualidade, o ali arguido fez referência a ter estado em qualquer festejo de aniversário do Dr. D….
Dito de outra maneira, a questão essencial é a da demonstração da veracidade do álibi do ora assistente C… em relação aos factos de que era suspeito no processo 1152/11.0TAVNF.
A prova de que o assistente estava no aniversário do amigo à hora em que o arguido disse que o viu a atirar o DVD, vem a cifrar-se na prova da verdade oposta à relatada pela testemunha naquele processo – única, que no caso [por não terem sido prestados no mesmo processo depoimentos contraditórios], pode demonstrar a mentira – e tem de ser ela própria indubitável a todos os títulos.
E logo aqui começam os referidos depoimentos e declarações a tergiversar.
Com efeito, como bem refere o recorrente, o tribunal a quo refere na sua motivação: «o assistente C…, relatou de forma aparentemente coerente e verosímil como só mais tarde (já depois de proferido despacho de arquivamento) se veio a aperceber como podia provar a sua inocência dos factos que lhe eram imputados pela denunciante no identificado processo de inquérito e que alegadamente teriam sido presenciados pelo ora arguido, já que na data em causa estaria na festa de aniversário de um colega Advogado – o Senhor Doutor D… –, disso apenas se apercebendo aquando a elaboração da denúncia de folhas 2 a 11 do apenso n.º 576/12.0TAVFR.»
Acontece que ouvidos os depoimentos do assistente e da testemunha Dr. D…, são ambos concordantes que o momento em que se aperceberam, que a data de 27 de Setembro correspondia à data de aniversário do Dr. D…, foi no momento em que o assistente já com o Pedido de Indemnização Civil feito [algumas dúvidas poderiam existir, relativamente a saber se o assistente falava do PIC relativo ao crime de difamação, pois por duas vezes falou na acusação particular, mas não nos parece verosímil, pois embora naquele PIC também a testemunha D… fosse indicada como testemunha, nada há naquele que diga respeito aos factos agora em análise e sobre os quais depunha o assistente] mete o Dr, D… como testemunha e fala com o mesmo [e ele, a testemunha D…, querendo inteirar-se sobre o que iria testemunhar, lê o PIC que lhe é dado a ler pelo assistente, altura em que “ele diz, oiça lá, você nesse dia sabe onde é que estava?”] e ele lhe dá conhecimento que nesse dia estava em casa dele, Dr. D…, a festejar o aniversário deste último.
Portanto, resulta daqui que o tribunal se equivocou ao referir na sua motivação que o assistente se apercebeu disso no momento da “elaboração da denúncia de folhas 2 a 11 do apenso n.º 576/12.0TAVFR”, pois ambas as testemunhas referem esse momento como sendo o momento em que o PIC estava feito [pelas razões já descritas entendemos que o PIC a que se referia o assistente era o PIC do Crime de falsas declarações], o qual deu entrada em Tribunal a 28 de Nov. de 2012.
Acresce que também nessa altura pelo compulsar dos elementos objectivos constantes dos autos estas afirmações do assistente e da testemunha D… não fazem sentido.
Com efeito do PIC referido [fls. 226 a 240 dos presentes autos] consta relatado aquele álibi e o assistente não disse nas suas declarações que reformulou ou acrescentou o PIC que já tinha feito [após o Dr. D… lhe ter alegadamente dito o que diz que disse] e que declarou ter dado a ler à testemunha D…. Ora, sendo o assistente advogado essa omissão tem grande relevância. Por outro lado, também não faz qualquer sentido que só nesse momento tenha associado o aniversário do Dr. D… ao dia do alegado arremesso do DVD para o jardim, pois as testemunhas no inquérito dos presentes autos, onde se inclui o assistente [que prestou declarações nestes autos a 17.04.2012], já haviam falado sobre esse álibi, sendo que o PIC [data de entrada em tribunal, de acordo com fls. 226 do 1º vol., a 28 Nov. 2012] é posterior à acusação pública [esta tem conclusão datada de 31.10.2012 e no seu final consta D.S.] e esta também já menciona o referido álibi, nomeadamente a fls. 213 in fine do 1º volume.
Vem, ainda a propósito referir que o depoimento da testemunha I… foi no sentido de situar, primeiro e espontaneamente, esse momento próximo das buscas de Dezembro de 2011, fim do ano de 2011 início de 2012; um mês ou dois depois das buscas; e depois, já com menos espontaneidade situou esse momento dois ou três meses antes de prestar declarações no inquérito e no MP, o que aconteceu em 25.06.2012.
Por outro lado, se essa associação tivesse sido feita aquando da elaboração da denúncia forçosamente essa associação tinha de constar relatada da denúncia e não consta [denúncia que se encontra junta a estes autos a fls. 1274 a 1283, por o inquérito onde foi apresentada ou a que deu origem, o proc. n.º 576/12.0TAVFR não ter sido encontrado após ofício deste tribunal a solicitar a sua remessa, conforme fls. 1270 e 1273 dos autos].
Veja-se que a denúncia no processo 576/12.0TAVFR é apresentada em juízo em 20.04.2012 e nela nada se relata sobre o álibi do aqui assistente, por isso que também não faz qualquer sentido o Tribunal situar esse momento [o momento em que se dão conta que a data de arremesso do DVD corresponde à data de comemoração do aniversário do Dr. D…] no momento da elaboração da denúncia. Embora para que houvesse uma denúncia com fundamento assim devesse ter sido. O certo é que o tribunal fundamenta essa tomada de conhecimento [de que a data de arremesso do DVD corresponde à data de comemoração do aniversário do Dr. D…] com os depoimentos do assistente e da testemunha D…, e não com as regras da experiência ou com a data de inquirição do assistente nestes autos [17.04.2012], e as testemunhas só ao PIC se referem.
Portanto, e em resumo, fica em absoluto por explicar em que momento é que o assistente fez a propalada associação entre a data do alegado arremesso do DVD e a celebração do aniversário do Dr. D…; associação de superior importância para a credibilidade e prova do álibi, já que este não foi relatado no momento crucial, durante a sua audição na qualidade de arguido, no processo n.º 1152/11.0TAVNF; mas que não pode em face dos elementos dos autos ser considerado o momento da elaboração da denúncia e não pode, pela mesma razão, ser tido o momento de apresentação do PIC [pelo que nesse particular quer o assistente quer a testemunha D… faltaram à verdade].
Por outro lado, o assistente é advogado com mais de 25 anos de carreira, segundo as contas que fizemos, pois terá feito estágio em 1990 [depoimento da testemunha I…, que disse ter o assistente efectuado estágio com o seu pai].
E um advogado acusado de ter praticado um crime num dia e hora em que estava noutro local presta declarações nesse inquérito esquecendo-se disso?
Dizem-nos as regras da experiência que o advogado faz e refaz na sua cabeça todas as linhas de defesa, e neste fazer e refazer se tiver uma defesa ele há-de lembrar-se [veja-se que a testemunha D… diz em audiência, mais que uma vez, que o Dr. C… andava obcecado com aquilo das buscas, por isso que consultou um psiquiatra].
Ora compulsando as declarações prestadas no inquérito 1152/11.0TAVNF, conforme certidão de fls. 267 a 270, verifica-se que C… não fez qualquer referência ao acontecimento que agora diz ter tido lugar nessa data.
E como é que é possível que nem com o despacho de arquivamento se tivesse lembrado? Quando o despacho de arquivamento levanta dúvidas em relação à veracidade das declarações do aqui arguido [com efeito consta do despacho de arquivamento: «Por outro lado, e não obstante a testemunha B… referir que viu o arguido a atirar o DVD para a sua residência, entendemos que tal versão não é minimamente verosímil, tendo em consideração que o mesmo acompanhou a denunciante aquando da apresentação da queixa e nunca mencionou tal facto – nem consta dos autos que o tenha indicado à queixosa – o que no mínimo, nos levanta dúvidas sobre a veracidade de tais declarações.»].
Um advogado? Um advogado que é acusado de uma coisa que não fez por uma testemunha que falta à verdade tem de invocar esse argumento logo no processo em que é acusado.
Portanto e em conclusão, o álibi apresentado pelas razões apresentadas não merece credibilidade.
É claro que poderiam haver elementos de sinal contrário que apontassem para a verosimilhança da mentira do ora arguido no outro processo em que foi testemunha.
E, para o efeito, refere o tribunal a quo, na sua motivação “do teor da certidão extraída do processo de inquérito n.º 1152/11.0TAVNF, dos Serviços do Ministério Público de Santa Maria da Feira, em especial, da denúncia feita por H… em 28/09/2011 resulta que a queixosa nunca refere que o ora arguido viu o indivíduo que teria depositado o referido “CD” no jardim da habitação e que seria capaz de o reconhecer (folhas 3 a 6), assim como também não o mencionou quando foi inquirida no âmbito de tais autos (cfr. folhas 7 a 8), facto que, a ser verdade, era de inegável valor probatório e necessariamente seria transmitido aquando a apresentação da denúncia, até porque inelutavelmente não podia deixar de ser do conhecimento da denunciante, atenta a estreita ligação que a unia e une ao arguido, então testemunha, sendo que tal circunstancialismo apenas foi narrado na inquirição do arguido como testemunha – «(…) o depoente de imediato reconheceu a pessoa como sendo “C…” (…)» –, quase meio ano volvido do início do processo. Aliás, do discurso da queixosa nessa participação (e releva-se que a queixosa é advogada de profissão) vai no sentido de ter tomado conhecimento da colocação do DVD no interior dos muros da residência do então seu noivo e testemunha por si no acto indicada, pelo próprio e no dia anterior, referindo expressamente que “Não tem a mínima dúvida de que só o denunciado às mesmas (referindo-se às fotografias do DVD) teve acesso e só este as podia ter agora feito chegar ao seu noivo, ora si ou por interposta pessoa, foi o próprio quem as fez e nunca em momento algum a inquirida autorizou a sua exibição a terceiros. (…) Mais deseja acrescentar que a letra da palavra “B…” constante do envelope, em tudo se assemelha à do denunciado, com quem conviveu cerca de 4 anos.”. Ora, este discurso (tentando procurar e evidenciar indícios que liguem o DVD ao ora assistente C…) só se justifica se nenhuma prova direta existisse, designadamente o testemunho de alguém que tivesse visto tal facto.»

Sobre estes considerandos impõe-se referir, em primeiríssimo lugar, que o tribunal deu como não provado em III.2.factos não provados d) que: “O arguido estava presente aquando da apresentação da denúncia pela sua mulher que deu origem ao processo de inquérito n.º 1152/11.0TAVNF.”
Ora, esta circunstância faz cair um dos motivos pelos quais a Srª Procuradora entendeu que a versão do assistente não era minimamente credível, ao ter em consideração “que o mesmo acompanhou a denunciante aquando da apresentação da queixa e nunca mencionou tal facto”- o facto era o B… referir que viu o arguido a atirar o DVD para a sua residência.
Por outro lado, por mais que se estranhe o que ficou a constar da denúncia, ou mesmo as declarações da denunciante no inquérito o certo é que o que ali foi vertido não tem nada a ver com o aqui arguido, mas apenas com a denunciante e com a pessoa que recebeu aquelas denúncia e declarações, não esquecendo que naquela denúncia consta logo indicada como testemunha o aqui arguido e a menção de que o suspeito podia ser reconhecido.
Acresce que da mesma denúncia também consta - fls. 5 do 1º volume destes autos – sob a epígrafe Data e Local da Ocorrência
Data: 27.09.2011
Pelas/Entre as 22:00 horas de 28.09.2011 e as 0:00horas de 29.09.2011.(sublinhado nosso)
E, não obstante, o que consta da referida denúncia no que tange às horas da ocorrência [que têm implicação com a data da ocorrência], ninguém discutiu de qualquer forma a data em que ocorreram os factos relatados pelo aqui arguido no inquérito 1152/11.0TAVNF, que aliás os situa em 28.09.2011, por volta da meia noite (de encontro à denúncia, na parte em que é mais específica) – vide fls. 5 e 11 destes autos, 1º volume – e não em 27.09.2011).
Como já referimos, logo na denúncia do processo 1152/11.0TAVNF foi indicado como testemunha dos factos denunciados, o aqui arguido B…, com indicação da sua residência, nº de BI, contacto de telemóvel, pelo que argumentar que o seu depoimento foi prestado “quase meio ano volvido do início do processo” é argumento falacioso, pois nem à denunciante nem à ali testemunha, aqui arguido, é imputável esse facto; facto que nem sequer é verdadeiro, visto que a denúncia terá sido efectuada em final de Setembro de 2011 [28.09.2011] e o aqui arguido ouvido no processo 1152/11.0TAVNF, no dia 13.01.2012 [fls. 11 destes autos], portanto cerca de 3 meses e meio depois do início do processo.
Da indicação da testemunha logo no momento da denúncia decorre que a mesma não surge depois do então suspeito (ora assistente) prestar declarações e negar os factos, e, portanto, como estratégia para dar força à denúncia.
Portanto, atento o exposto resulta que o tribunal apelou a provas que não foram produzidas, como seja o apercebimento pelo assistente, que na data em causa estaria na festa de aniversário do Dr. D…, aquando da elaboração da denúncia de folhas 2 a 11 do apenso n.º 576/12.0TAVFR; e que as restantes provas produzidas não são suficientes para demonstrar, para além de toda a dúvida razoável e objectiva como deixamos exposto, que o assistente C… não podia ter atirado o DVD para o jardim da residência do aqui arguido, por a essa data e hora se encontrar a festejar o aniversário do Dr. D….
Pelo exposto afigura-se-nos claro que não há alternativa senão, fazendo apelo ao principio in dubio pro reo, passar para o elenco dos factos não provados os seguintes factos impugnados relativos aos pontos 6, 7, 8 e 9 dos factos provados:
Não provado que:
J) Com o seu depoimento o B… visava afastar dúvidas acerca da autoria da prática do ali denunciado ilícito criminal.
l) Contrariamente ao por aquele afirmado, no mencionado dia e hora, C… encontrava-se na residência de D…, a comemorar o aniversário deste último.
m) Quando prestou o seu depoimento nos termos supra descritos, o arguido tinha perfeito conhecimento de que o por si afirmado não correspondia à verdade.
n) O arguido agiu de vontade livre e consciente, com o propósito de, através do seu depoimento não correspondente à verdade dos factos, conseguir demonstrar que havia sido, de facto, o ora assistente a deixar o mencionado DVD-R no jardim da sua residência, bem sabendo que a sua conduta era proibida e punida por lei.
O facto provado em 6 dos factos provados ficará a ter a seguinte redacção:
6). Com tal depoimento B… declarou que havia sido o ora assistente quem havia atirado o mencionado DVD-R para o jardim da sua residência.
Procede, nesta parte, a impugnação da matéria de facto.
Na procedência desta parte da impugnação da matéria de facto sobrevém sem mais a absolvição do arguido do crime de falsidade de testemunho, p. e p. pelo art. 360º n.º1 do CP, e, bem assim, o pedido cível concernente, aquele onde foi condenado a pagar ao assistente C…, a quantia de 3.000,00€ e juros vincendos [pontos 1) e 5) do Dispositivo da sentença sob escrutínio].
*
Impõe-se atacar a segunda parte da impugnação, na parte que respeita aos pontos 10, 11 e 12 dos factos provados.
Argumenta a recorrente que tais factos não podiam ser dados por provados pelas seguintes razões:
- o tribunal teve dois pesos e duas medidas, na avaliação do depoimento da testemunha G…, por um lado, e da testemunha J…, por outro;
- não valorizou o depoimento do arguido;
- o tribunal errou na apreciação da prova, pois das declarações prestadas pelas duas testemunhas com conhecimento directo sobre os factos, G… e J…, resulta claramente que, por um lado, a amiga e cliente do assistente relatando uma conversa mantida com o Arguido no dia 3 de Fevereiro de 2012, imputando-lhe a autoria da seguinte expressão, referindo-se ao assistente: “sabias que o teu advogado que era conhecido por chulo e burlista?”; enquanto, por outro lado, a prima e amiga do Arguido reportando-se ao mencionado dia, referiu que o Arguido não foi naquele dia jantar ao F…, e justificou esta afirmação com o aniversário da mãe do B…, no dia 31 de Janeiro, comemoração transferida para o fim de semana seguinte;
- Ao arrepio das regras e princípios de valoração da prova, entendeu o Tribunal “a quo” dar como provada a versão das declarações prestadas pela testemunha G…, e ao invés considerar a inveracidade do depoimento da testemunha J…, por alegadamente se ter recordado de pormenores que de antemão sabia serem pertinentes, querendo fazer crer que tinha uma memória absolutamente extraordinária, recordando-se, por exemplo, das pessoas com quem tinha estado a jantar no restaurante “F…” nesse dia.
- Impunha-se ao Tribunal “a quo” concluir pela improcedente da acusação particular, dando como não provados os factos supra referidos, pontos 10) a 12), pois que, perante a dúvida irremediável, o arguido beneficiaria sempre da aplicação do princípio do in dubio pro reo;
Por sua vez, o Tribunal a quo nesta sede motivou a decisão de facto do seguinte modo:
«Perante a negação dos factos por parte do arguido, quanto à factualidade provada da acusação particular (factos provados nos pontos 10) a 12) supra) alicerçou-se nas declarações prestadas pelo assistente C… e no depoimento prestado pela testemunha G….
De facto, espontânea e frontalmente reconhecendo, a sua relação próxima de amizade e de cliente/advogado com o assistente (de resto, também o assistente havia logo assumido tal estreita ligação) e evidenciando um discurso visivelmente agastado e pesaroso, a testemunha de forma que se afigurou credível porque pormenorizada e vivida, narrou o episódio em apreço que também protagonizou (já que as locuções em causa foram-lhe transmitidas), fundadamente apontando o enquadramento espácio-temporal (na Sexta-feira entre o aniversário do seu marido -02/02 - e o aniversário do assistente -05/02) relato tanto mais credível quando considerado o arrependimento (que pareceu sincero pela sua inadequação) pela mesma manifestado em ter contado o sucedido ao assistente, por tudo ter culminado no julgamento no âmbito dos presentes autos.
Tal depoimento foi ademais corroborado pelas declarações do próprio assistente que, como supra já ficou dito, esclareceu os moldes em que o sucedido lhe foi relatado por esta depoente, sendo de realçar que as duas versões foram, no essencial, inteiramente coincidentes, apenas se surpreendendo algumas diferenças despiciendas, às quais não foi dada relevância, até porque reveladora da não existência de uma concertação nos depoimentos, bem como também necessariamente imputável ao tempo já decorrido e à inerente subjectividade da memória e do observador/relator.
Ora, da conjugação deste depoimento e das declarações do assistente resultou, ainda, afirmada a inveracidade do depoimento da testemunha J… mas não só deles. Desde logo, cumpre não perder de vista a reconhecida estreita relação familiar e de amizade que une a depoente ao arguido (é prima e amiga de longa data do arguido) e bem assim à sua mulher.
Por outro lado e com maior acuidade, o modo como foi prestado tal depoimento deixou antever uma clara exercitação do mesmo, referindo pormenores que de antemão sabia serem pertinentes, querendo fazer crer que tinha uma memória absolutamente extraordinária, recordando-se, por exemplo, das pessoas com quem tinha estado a jantar no restaurante “F…” nesse dia, dos motivos pelos quais o arguido não tinha ido, recordando-se da data do aniversário da sua mãe, e da data da comemoração do aniversário, e da ida do filho do arguido a esse festejo. Mais quis fazer querer ao tribunal nada ter contra a testemunha G…, o que muito se estranha, já que na sua perspectiva aquela teria imputado factos falsos e prejudiciais ao seu primo e grande amigo, o ora arguido, quando sabia não serem verdadeiros.
No que concerne ao elemento subjectivo a convicção do tribunal alicerçou-se nos mais elementares juízos de experiência comum e de normalidade, em conjugação com a globalidade da prova produzida em audiência.
Vejamos, então.
Os factos dos presentes autos foram participados como tendo ocorrido a 17.02.2012, por isso nas suas declarações o arguido refere que certamente por lapso constam da acusação como ocorrendo no dia 03.02.2012, refere também que nesse dia 03 de Fevereiro não jantou no restaurante o F…, porque a sua mãe havia feito anos a 31 de Janeiro e por isso festejaram esse aniversário na sexta-feira à noite, dia 03 de Fevereiro, versão que veio a ser corroborada pela testemunha J…. Mais esclareceu que efectivamente jantou no Restaurante “F…” no dia 17.02.2012, mas que não proferiu as expressões que lhe são imputadas.
Pois bem, analisados os depoimentos e declarações prestados em audiência, podemos afirmar que todos os factos foram alvo de tentativa de justificação ou de infirmação, consoante a perspectiva, com base em comemorações de aniversários, que são acontecimentos facilmente prováveis inclusivamente por documento, e que dão sempre origem a uma ou mais festas, com várias intervenientes, portanto num esquema probatório que tem todos os ingredientes para dar frutos, o que nos causou uma enorme estranheza pelo inusitado.
E se a estranheza se gerou em si, pelos factos:
- de o arguido apelar ao aniversário da sua mãe, a 31 de Janeiro, com comemoração ao jantar da sexta feira seguinte, para contrariar a prova de que esteve no restaurante “F…” a 03 de Fevereiro de 2012, pois nesse dia foi a um restaurante diferente [declarações do arguido e da J…], em … ao restaurante “AE…”;
- de o assistente tentar infirmar os factos, do inquérito 1152/11.0TAVNF que correu contra si, com a sua declaração e dos restantes supostos convivas, de que no dia 27.09.2011 esteve no aniversário do Dr. D…;
- e ainda de o assistente afirmar a certeza de que a expressão que imputa ao arguido foi proferida no restaurante “F…” na sexta-feira dia 03.09.2012, por ter a certeza que lhe foi comunicada pela dona do restaurante, testemunha G… [que nesse dia 03.02.2012, estivera na mesa com os referidos arguido, esposa, Drª H…, e J…] no próprio dia dos seus anos, dia 05.02 de 2012, que comemorou com o marido da dona do restaurante [testemunha G…] e esta, em casa destes [não no restaurante, o que não merece sequer credibilidade, visto ser a G… a chefe de cozinha do restaurante e o dia 05.02.2012 ser a um Domingo].
Ora, se esta estranheza existiu só pelo exuberante uso de argumentos de defesa fundados em referencias de memória demasiado coincidentes e convenientes, a estranheza agudiza-se quando se atende ao que diz o arguido, que atrás reproduzimos e que pelo compulsar da participação se verifica ser verdadeiro, com efeito na participação que deu origem ao processo 576/12.0TAVFR, o único comportamento que era imputado ao arguido situava-se temporalmente no dia 17.02.2012, e vinha assim descrito: «No dia 17.02.2012, à noite, durante uma jantar no restaurante “F…”, em …, desta comarca de …, a denunciada H… disse à proprietária desse restaurante, G…, durante uma conversa que ambos os denunciados e a G… estavam a ter acerca do denunciante:
“ele denunciado está foder-me a vida toda…”
(…
Perante tais afirmações da denunciada H…, o denunciado B… disse:
(…)
“…Ele (denunciante) é um burlista e um chulo que tem a mania, mas nós vamos fodê-lo”.» [sublinhado nosso)(
Pois bem, sem que haja qualquer razão objectiva constante dos autos, na acusação particular esta imputação passa a ser descrita no dia 03.02.2012.
Ora, a certeza que o assistente ora tem de que tal facto lhe foi comunicado no dia dos seus anos, não é compatível com o ter situado esse facto a 27.02.2012, por lapso, na participação, como quis fazer crer, e também não é compatível com o facto, por si relatado, de que ia anotando em papéis ou guardanapos de papel, à medida que lhe iam sendo contadas pela G…, as expressões ditas pelos arguido e esposa e que foram relatadas na participação.
Se expressões deste jaez tivessem sido contadas no dia de aniversário, dizem as regras da experiência que jamais o aniversariante ofendido as esqueceria e menos ainda trocaria o dia em que foram ditas….
No mais, as testemunhas mereceram-nos equivalente credibilidade, digamos até, que pela serenidade e educação nos mereceu maior credibilidade a testemunha J…, que não mostrou qualquer memória extraordinária, pois que quando referiu quem no dia 03.09.2012, se juntou a ela, após o jantar que fez sozinha no F…, só referiu os habitués, Sr. AF… e Dr. AG…; sendo que, pelo contrário, a testemunha G… além de se socorrer várias vezes de palavrões, de mau gosto e completamente deslocados [desnecessários e despropositados] na sala de audiências, para dar ênfase ao que relatava, ainda enviesou várias vezes o seu depoimento com pormenores que favoreciam o Assistente C… como quando disse que seguidamente ao arguido ter proferido a expressão que lhe imputa lhe disse: “Eu já o conheço há tanto anos e chulo e burlista, nunca ouvi isso na minha vida, mas se tu o dizes”, “Ah pois é. É conhecido por isso. Admira-me vocês terem um advogado desses”, “Olha, eu nunca tive nada que dizer dele, nem tenho até à data continua a ser o meu advogado para o que eu preciso. E além de ser advogado é nosso amigo também. É uma pessoa considerada lá da casa.”.
Aqui chegados impõe-se que digamos o seguinte.
O assistente é advogado. A esposa do arguido é advogada, e é a advogada que subscreve o recurso e esteve na audiência, também foi denunciada na participação que deu origem ao processo 576/12.0TAVFR, é muito mais nova do que o assistente e viveu com este. Todos estão de relações cortadas, têm vários processos uns contra os outros, têm conhecimentos dos meandros da técnica processual, e todos têm interesses no caso.
Nestas condições este tribunal não tem a mínima possibilidade de destrinçar quem está a falar verdade ou quem está a mentir, pelo que assim sendo e havendo duas versões dos factos uma em que comungam o arguido e J…, sua prima [prima direita de sua mãe] e amiga; outra em que comungam o assistente e a G…, sua cliente e amiga, nada mais nos resta que uma dúvida final irredutível e inultrapassável pela livre apreciação da prova, fundada e fundamentada, nas regras da lógica e da experiência, pelo que fazendo uso do princípio in dubio pro reo impõe-se dar como não provados os factos em análise que passarão para o rol dos factos não provados do seguinte modo:
Não provado que:
O) No dia 3 de Fevereiro de 2012, à noite, durante um jantar no restaurante “F…”, sito em …, …, o arguido B…, na sequência de uma conversa sobre o assistente, virou-se para a proprietária do mencionado estabelecimento, G…, e de forma a ser ouvido por ela e por todos os presentes disse que o assistente era conhecido em … como “burlista e chulo”.
P). O arguido proferiu tais expressões de viva voz, tendo actuado de forma livre, deliberada e consciente, com o propósito concretizado de ofender o bom-nome, a honra e consideração do assistente.
Q) O arguido sabia que a sua conduta era proibida e punida por lei.
Procede, também nesta parte, a impugnação da matéria de facto.
Na procedência desta parte da impugnação da matéria de facto sobrevém a absolvição do arguido do crime de difamação, p. e p. pelo art. 180º, n.º1, do CP, e, bem assim, o pedido cível concernente, aquele onde foi condenado a pagar ao assistente C…, a quantia de 750,00€ e juros vincendos [pontos 2) e 4) do Dispositivo da sentença sob escrutínio].
Pelo exposto procede, o recurso.
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IV- Decisão.
Pelo exposto, acordam os juízes da segunda secção criminal do Tribunal da Relação do Porto em julgar provido o recurso interposto pelo recorrente, com a alteração da matéria de facto nos termos que deixamos expostos e consequente absolvição dos crimes que lhe vinham imputados.
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Sem custas nesta instância, visto que o assistente não ofereceu resposta, aderiu ou deduziu oposição, ao recurso.
Custas, na primeira instância pelo assistente, fixando-se a taxa de justiça em 5 UC, artigo 515º, n.º 1 al. b) do CPP e artigo 8º, n.º1 do RCP.
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Custas do pedido de indemnização civil de fls. 226/240 [visto que quanto ao PIC de fls. 204/207, foi declarado na 1º instância que não são devidas custas] pelo demandante, nos termos do artigo 523º do CPP e 527, n.ºs 1 e 2 do CPCN, relativamente ao PIC de fls.
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Notifique.
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Processado em computador e revisto pela relatora – artigo 94º, n.º 2, do C.P.P.
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Porto, 24 de Maio de 2017
Maria Dolores da Silva e Sousa
Manuel Soares