Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
174/16.9T8VLG-B.P1
Nº Convencional: JTRP000
Relator: MANUEL DOMINGOS FERNANDES
Descritores: EXCEPÇÃO DE CASO JULGADO
AUTORIDADE DE CASO JULGADO
Nº do Documento: RP20181008174/16.9T8VLG-B.P1
Data do Acordão: 10/08/2018
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: REVOGADA
Indicações Eventuais: 5ªSECÇÃO, (LIVRO DE REGISTOS N.º681, FLS.343-358)
Área Temática: .
Sumário: I - Os efeitos do caso julgado podem ser vistos numa dupla perspectiva, tratando-se de realidades distintas: a excepção de caso julgado, excepção dilatória a que alude o artigo 577.º, alínea i) do Cód. de Processo Civil, aferindo-se pela identidade dos sujeitos, pedido e causa de pedir (artigo 581.º do mesmo diploma).
II - E a autoridade do caso julgado, que importa a aceitação de decisão proferida anteriormente, noutro processo, cujo conteúdo importa ao presente e que se lhe impõe, assim obstando que uma determinada situação jurídica ou relação seja novamente apreciada, considerando parte da jurisprudência e doutrina que, nesta acepção, não se exige a tríplice identidade.
III - Entendimento que se justifica pela necessidade de evitar que um tribunal possa definir uma concreta situação controvertida de forma válida, de modo contraditório e incompatível com outra anterior transitada em julgado.
Reclamações:
Decisão Texto Integral: Processo nº 174/16.9T8VLG-B.P1-Apelação
Origem: Tribunal Judicial da Comarca do Porto-Juízo Local Cível de Valongo - J2
Relator: Manuel Fernandes
1º Adjunto Des. Miguel Baldaia
2º Adjunto Des. Jorge Seabra
Sumário:
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I - RELATÓRIO
Acordam no Tribunal da Relação do Porto:
Vieram os autores B… e C… intentar a presente acção em processo comum contra as Rés D…, S.A., E…, S.A. e E1…, S.A. peticionando:
1. o reconhecimento dos Autores como proprietários (consortes) das águas provenientes do I…, por usucapião,
2. o reconhecimento dos Autores como proprietários (consortes) das três represas e mina por usucapião;
3. a condenação das Rés a efectuar todas as obras necessárias à recuperação de todas as águas das nascentes e a empresá-las sem perda e com segurança, no local das nascentes;
4. a condenação das Rés a pagar-lhes solidariamente a privação do uso pleno da água sem qualquer limitação ou uso, gozo e fruição das águas da mina e represas, quer para fins agrícolas, quer para fins domésticos, desde a privação até à sua reposição efectiva, em conformidade com as normas de venda de água, a liquidar em execução de sentença até reposição efectiva;
5. a condenação das Rés a pagar-lhes solidariamente todos os custos e despesas decorrentes da falta de água (electricidade dos furos, motor e baixada para o efeito), a liquidar em execução de sentença, desde a privação até reposição efectiva;
6. a condenação das Rés a pagar-lhes solidariamente a perda de rendimentos motivados pela falta de rega até à efectiva reposição, a liquidar em execução de sentença, desde a privação até à efectiva reposição;
7. a condenação das Rés a reconhecer o direito dos Autores a aceder livremente e sem quaisquer restrições às represas e à mina;
8. a condenação das Rés a absterem-se de praticar quaisquer actos ou factos que impeçam os Autores do livre acesso às represas e mina e à utilização das águas dos mesmos em benefício dos seus prédios;
9. a condenação das Rés a pagar solidariamente a cada um dos Autores a quantia de cinco mil euros a título de danos não patrimoniais;
10. e finalmente, a condenação das Rés no pagamento solidário a favor dos Autores de todas as despesas e custos por estes suportados com vista a serem repostos os seus direitos.
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Alegaram para tanto, e em síntese, que os seus antepassados fizeram em … explorações de água, terrenos àquela data baldios, a nível superior para consumo e rega dos terrenos agrícolas que possuíam em cotas inferiores e que as escavações a nível horizontal deram origem a uma mina (artigo 7.º da p.i).
Seguem dizendo que, em relação a essa mina, os seus antepassados e os próprios autores sempre usaram toda a água sem qualquer limitação, durante todo o ano, excepto e 24 de Junho a 29 de Setembro, altura em que funcionava o sistema de consortes de acordo com os usos e costumes estabelecidos.
Mais invocam que sempre agiram publicamente, de boa-fé, na qualidade de proprietários da mina, represas e das águas em causa (artigo 30.º da p.i.), imputando às rés a prática de actos que obstam ao aproveitamento de todas as utilidades decorrentes do seu direito pleno de propriedade e daí assacando os prejuízos que pretendem ver ressarcidos.
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Citadas as Rés contestaram, defendendo-se por excepção dilatória, invocando a verificação de caso julgado, o qual se teria formado no processo n.º 342/1998, actualmente com o número 238/14.3T8VLG (cfr. fls. 474 dos autos), que correu termos no 1.º juízo do Tribunal Judicial de Valongo e no processo 4/04.4 TBVLG, o qual correu igualmente termos no 1.º Juízo do mesmo Tribunal.
As Rés alegaram, ainda, a excepção dilatória de litispendência, com base no alegado pelos Autores no artigo 143.º da sua petição inicial, no qual aventam a existência de uma acção executiva em curso.
Finalmente a título de excepção invocam, ainda, a prescrição relativamente aos factos ilícitos que lhes são imputados pelos Autores.
No mais, defenderam-se as Rés por impugnação e requereram a condenação dos autores como litigantes de má-fé, peticionando, a tal título, uma indemnização não inferior a cinco mil euros e ainda nas custas do processo, honorários do signatário e demais quantias conforme a lei.
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Após a contestação das Rés o co-Autor B… deduziu incidente de habilitação de herdeiros, por óbito de C…, requerendo que a acção prosseguisse, nela figurando como sucessores da falecida os filhos herdeiros B… e F….
Foram juntos aos autos a declaração notarial de habilitação de herdeiros e certidões de nascimento do Requerente e Requerida.
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Notificada do incidente a Requerida nada disse, pelo que, em consequência, foram habilitados como sucessores da co-Autora C…, os seus filhos, B… e F….
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Ao abrigo do disposto no artigo 3.º, n.º 3 do CPC, os Autores, em resposta às excepções, vieram defender a inexistência de caso julgado, por não serem os mesmos; nem os sujeitos, nem o pedido com o efeito jurídico que se pretende obter; nem haver identidade da causa de pedir, bem como da inexistência de prescrição, posto que os factos ilícitos em causa são continuados e, sem prescindir, devido, ainda, à interrupção do prazo prescricional por força da interposição dos processos n.º 342/1998 e 4/04.4TBVLG.
Os Autores advogam, por último, a inexistência de litispendência, porquanto, também aqui os sujeitos não são os mesmos; nem a causa de pedir, nem o pedido com o efeito jurídico que se pretende obter.
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Ao abrigo do disposto no artigo no artigo 6.º, n.º 1 do CPC os autores foram convidados a esclarecer se a represa existente à saída da mina, com 20M2, a que se reporta o pedido 1.b), formulado na acção 4/04.4TBVLG é a mesma que os autores mencionam no artigo 24.º da Petição Inicial; a concretizar a matéria contida nos artigos 23.º a 27.º da petição inicial, tendo em vista concretizar a data e modo/actos através do qual se extraia a conclusão de que G… e seu irmão H… agiam na qualidade de proprietários das represas ali em causa e a concretizar temporalmente os factos articulados nos artigos 177.º a 181.º da petição inicial.
Os autores pronunciaram-se, quanto ao convite formulado, nos termos vertidos no seu requerimento com ref.ª27230462.
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Seguindo o processo os seus regulares termos, o tribunal recorrido proferiu despacho saneador sentença que julgando verificada as excepções de caso julgado e autoridade de caso julgado absolveu as Rés da instância:
1) Quanto ao pedido formulado sob o ponto 1;
2) Quanto ao pedido formulado sob o ponto 2, relativamente ao pedido de reconhecimento de propriedade da mina por parte dos autores;
3) Quanto ao pedido formulado nestes autos sob o ponto 3;
4) Quanto ao pedido formulado sob os pontos 4 (este com excepção da parte referente aos danos da privação do uso para fins domésticos), 5 e 6.
II) E conhecendo de mérito julgou parcialmente improcedente o peticionado pelos Autores:
- no pedido formulado sob o ponto 4 quanto ao pedido de indemnização pela privação do uso pleno à água da mina para fins domésticos;
- no pedido formulado sob o ponto 7 na parte em que pedem o acesso ilimitado e sem restrições à mina;
- no pedido formulado sob o ponto 8 no que concerne à condenação das Rés a absterem-se de praticar factos que impeçam os Autores do livre acesso à mina e bem assim à utilização plena das águas dos mesmos em benefício dos seus prédios, absolvendo as rés de tais pedidos.
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Não se conformando com o assim decidido vieram os Autores interpor o presente recurso concluindo as suas alegações pela seguinte forma:
I. Versa o presente recurso versa sobre a decisão proferida pelo Tribunal a quo que por Despacho proferido ao abrigo do artigo 595.º, n.º 1, alínea a) do CPC, julgou verificada a excepção da autoridade do caso julgado:
a) Quanto ao pedido formulado sob o ponto 1, 2 (relativamente ao pedido de reconhecimento de propriedade da mina por parte dos autores), 3, 4 (este com excepção da parte referente aos danos da privação do uso para fins domésticos), 5 e 6.
E que por Despacho proferido ao abrigo do artigo 595.º, n.º 1, alínea c) do CPC, julgou parcialmente improcedentes, absolvendo as Rés:
a) No pedido formulado sob o ponto 4 quanto ao pedido de indemnização pela privação do uso pleno à água da mina para fins domésticos;
b) No pedido formulado sob o ponto 7 na parte em que pedem o acesso ilimitado e sem restrições à mina;
c) No pedido formulado sob o ponto 8 no que concerne à condenação das Rés a absterem-se de praticar factos que impeçam os Autores do livre acesso à mina e bem assim à utilização plena das águas dos mesmos em benefício dos seus prédios, de tais pedidos.
II. Entendem os Recorrentes que dos autos resultam factos alegados e prova documental bastante que permitiriam julgar de forma diferente, como adiante se demonstrará.
Posto isto,
Do Despacho proferido ao abrigo do artigo 595.º, n.º 1, alínea a), do CPC.
I. Da Excepção do Caso Julgado / I.1. Da identidade dos sujeitos
III. Quanto a esta matéria, dos documentos juntos aos autos, resulta que a 3.ª Ré (E1…, S.A.) não foi parte em nenhum dos processos referidos, a saber, proc. n.º 342/1998 e n.º 4/04.4TBVLG, nem neles interveio directa ou indirectamente, sob qualquer forma e, a 2.ª Ré (E…, S.A.) não foi parte no processo proc. n.º 342/1998.
IV. Do teor da Certidão Predial Permanente, com o código de acesso: PA-….-…..-…….-……, que os Recorrentes juntaram aos autos por requerimento (ref. 26990514), de 10/10/2017, verifica-se que 2.ª Ré (E…, S.A.) não teve, nem tem a invocada “qualidade de proprietária do terreno onde estão implantadas a mina e represas”.
V. Pelo que, e salvo melhor opinião, entendem os Recorrentes que não existe identidade de Sujeitos, pelo que falta um requisito essencial para o caso julgado, decaindo assim tudo o decidido no despacho proferido ao abrigo do artigo 595.º, n.º 1, alínea a), do CPC.
Sem prescindir,
Da causa de pedir no processo 342/1998.
VI. Para a hipótese de se considerar que existe identidade de sujeitos e, quanto ao demais decidido em sede de despacho proferido ao abrigo do artigo 595.º, n.º 1, alínea a), do CPC, sempre se dirá que da Petição Inicial resulta que o facto jurídico de onde resultou a pretensão dos ali Autores foi, em suma, a destruição pela 1.ª Ré (D…, S.A.) dos regos existentes nas várias propriedades que medeiam o terreno onde se encontram implantadas a mina e represas, e os terrenos dos Recorrentes.
VII. Regos que já existiam há mais de 100 anos consecutivos e eram conhecidos por todos os agricultores, que se limitavam a mante-los e a orienta-los de acordo com as divisões da água e que atravessavam diversas propriedades, um caminho público e dois ribeiros.
VIII. A 1.ª Ré (D…, S.A.) ao proceder ao loteamento de vários terrenos (contíguos aos terrenos dos Recorrentes e ao terreno onde se encontram implantadas a mina e represas) por onde a água da mina e represas circulava para chegar ao seu destino, bloqueou a passagem para as respectivas propriedades, destruindo os regos existentes.
IX. Facto que obrigou os Recorrentes a recorrer à via judicial (proc. 342/1998), dado que a 1.ª Ré (D…, S.A.) estava obrigada a manter o curso da água desde a mina e represas até às propriedades dos Recorrentes, que são comproprietários da água e têm servidão de passagem para o seu curso até aos seus terrenos.
X. Tudo o mais peticionado pelos Recorrentes neste processo foi consequência directa deste concreto facto jurídico, pois, o que se pretendeu, em primeira instância com o proc. 342/1998 foi ver reconhecida servidão de passagem da água, e consequentemente fosse a 1.ª Ré (D…, S.A.) condenada a restabelecer o curso normal da água desde a sua nascente até aos terrenos dos Recorrentes, por forma a fazer chegar a água aos terrenos dos Recorrentes, o que veio a acontecer através da sentença proferida.
Da causa de pedir no processo 4/04.4TBVLG.
XI. Compulsada a Petição Inicial resulta ali se alegou que tendo proferida sentença, em 05/01/2001, no processo 342/1998 e, imediatamente após a sua publicação os Réus, em comum e em conjugação de esforços, destruíram completamente a entrada e a represa da mina, com trabalhos a fundo de terraplanagem, iniciando grandes obras de desaterro e início de construção de obra, mesmo no local onde se encontra instalada a I…, há mais de cem anos.
XII. O pórtico de entrada na mina, que era constituído por duas lousas de grande porte, uma no seu interior e outra à vista foi totalmente destruído pelos ali Réus com os trabalhos iniciados imediatamente após a publicação da sentença e, foi também totalmente destruída a represa existente na saída da mina, com uma área de cerca de 20 m2.
XIII. Alegaram ainda que a destruição da entrada da mina e da sua represa foi efectuada pela 2ª Ré (E…, S.A.), Empreiteira e 3º Réu (J…), funcionário da 2.ª Ré que ordenou e coordenou os trabalhos de destruição da mina e represas, a mando do 1º Réu (D…, S.A.), Dona da Obra.
XIV. Assim, o facto jurídico concreto que levou Recorrentes a proporem o proc. 4/04.4TBVLG, foi a destruição pela 2.ª Ré (E…, S.A.) da mina e represa, sendo tudo o mais peticionado pelos Recorrentes neste processo a consequência directa deste concreto facto jurídico.
XV. Assim, compulsadas as causas de pedir destes dois processos, resulta que nenhuma similitude encontramos com a causa de pedir dos presentes autos, pelo que também, desta forma se pode concluir que não existe caso julgado relativamente a nenhum dos pedidos formulados na presenta acção, como adiante se procurará demonstrar.
I.2. Dos pedidos formulados,
Pedido formulado sob o ponto 1.
XVI. O Tribunal a quo julgou verificada a excepção da autoridade do caso julgado, quanto a este pedido por força da decisão anterior, transitada em julgado, proferida no processo 342/1998, assente no seguinte:
“…Assim, atendendo a que, em acção precedente, e transitada em julgado, foram os Autores reconhecidos como tendo adquirido o direito ao uso da água, limitado por períodos de tempo, proveniente da mina I…, através de servidão, na qualidade de proprietários dos prédios dominantes que descreveram, não podem ver debatida nestes autos, porque precludida, a questão do direito de propriedade plena (que lhe conferiria um uso ilimitado) sobre essa mesma água da mina, por tal se mostrar incompatível ou bem que têm direito ao uso pleno da água, porque dela são proprietários, ou bem que têm direito ao uso limitado da água, por dela beneficiarem, em determinados moldes, a título de servidão.…”
XVII. Porém, tenha-se em consideração que o direito ao uso pleno da água, porque dela são proprietários (consortes), não está precludido, dado que nunca foi discutido e/ou apreciado judicialmente, bastando para o efeito atentarmos às causas de pedir no processo 342/1998 e proc. 4/04.4TBVLG.
XVIII. Pelo que a conclusão que fundamenta o caso julgado nesta parte não tem sustentação fáctica em nenhum dos processos que tiveram pendencia judicial.
I.2.b) Quanto ao pedido formulado sob o ponto 2.
XIX. Na decisão ora em crise refere-se que “compulsados os processos 238/14.3T8VLG e 4/04.4TBVLG, verifica-se que em nenhum deles foi discutida, a título principal, a existência do direito de propriedade das três represas e da mina, agora invocado pelos Autores e, adianta-se, que os processos em causa não assentam na mesma causa de pedir da presente acção.”
XX. Pois, efectivamente e conforme se alegou na P.I. nos presentes autos, os antepassados dos Recorrentes fizeram, em I…, freguesia e concelho de …, exploração de água em terrenos baldios (naquela época), de nível superior para consumo e rega dos terrenos agrícolas que possuíam em cotas inferiores, através de escavações no solo e subsolo, quer na vertical (que deram origem a três poças represas), quer na horizontal (que deram origem a uma mina).
XXI. Foram H… (Tio-Avô dos Autores) e seu irmão G… (Avô dos Autores), quem, em conjunto, contrataram uma equipa de mineiros a fim de fazer escavações subterrâneas para aumentar o cumprimento da mina em causa nos presentes autos, com o objectivo de aumentar a sua capacidade de captação e armazenamento, sempre agindo na qualidade de proprietários da mina, represas e águas que delas provinha.
XXII. E tanto assim é que em nenhum dos processos referidos na decisão ora em crise se arrogaram as Recorridas proprietárias da mina e represa, nem tão pouco peticionaram fosse a sua qualidade de proprietárias reconhecida, pelo que se entende não existir caso julgado.
I.2.c) No que concerne ao pedido formulado nestes autos sob o ponto 3.
XXIII. Como se referiu supra, o que esteve em causa no proc. 342/1998 foi a destruição pela 1.ª Ré (D…, S.A.) dos regos existentes nas várias propriedades que medeiam o terreno onde se encontram implantadas a mina e represas, e os terrenos dos Recorrentes.
XXIV. Porquanto, os Recorrentes enquanto comproprietários da água têm servidão legal de passagem para o seu curso até aos seus terrenos, razão pela qual foi esta reconhecida e condenada a 1.ª Ré (D…, S.A.) a restabelecer o curso normal da água desde a sua nascente até aos terrenos dos Recorrentes, por forma a fazer chegar a água aos terrenos dos Recorrentes.
XXV. O que se pretende com este pedido nos presentes autos é serem as Rés condenadas a efectuar todas as obras necessárias à recuperação de todas as águas das nascentes e a empresa-las sem perda e com segurança, no local das nascente.
XXVI. E como se referiu, no processo 342/1998, apenas a 1.ª Ré (D…, S.A.) foi condenada a restabelecer o curso normal da água desde a sua nascente até aos terrenos dos Recorrentes, por forma a fazer chegar a água aos terrenos dos Recorrentes
XXVII. Ou seja, “desde a sua nascente” e “no local da nascente”, são duas realidades bem distintas, razão pela qual se entende que não se verifica a excepção do caso julgado.
I.2.d) Quanto ao peticionado sob os pontos 4, 5 e 6.
XXVIII. Em primeiro lugar importa ter presente que as 2.ª e 3.ª Rés não foram partes nos processos 4/04.4TBVLG e 342/1998), pelo que não foi contra elas formulado qualquer pedido, muito menos os pedidos 4, 5, 6 dos presentes autos.
XXIX. Acresce que, mais uma vez, a decisão ora em crise quanto a estes pedidos, volta a invocar caso julgado sustentado numa alegada identidade de pedidos, no entanto, não podem estes ser dissociados das respectivas causas de pedir e decisões proferidas no tempo.
XXX. Com esta decisão veem-se os Recorrentes quartados de fazer pedidos que distam de 1998 para 2017, pois, foi proferido um despacho Saneador, que deita por terra estes pedidos com base em que “não há nada de novo”.
XXXI. Ainda que não se tenha provado que existiram, não quer dizer que não se tenham entretanto verificado, bastando para o efeito que sejam danos supervenientes, pelo que se entende também aqui não existir caso julgado Despacho ao abrigo do artigo 595.º, n.º 1, alínea b) do CPC (conhecimento de mérito), que julgou parcialmente improcedentes os pedidos formulados nos pontos 4, 7, 8:
XXXII. Considerando o disposto no artigo 609.º, n.º do CPC, nos termos do qual a sentença não pode condenar em quantidade superior ou em objecto diverso do que se pedir e compulsado o proc. 342/1998 e proc. 4/04.4TBVLG, resulta que em nenhum deles foi pedido por nenhum dos intervenientes o reconhecimento da propriedade da mina e represas, nem tão pouco, nos presentes autos as Rés invocaram tal propriedade, nem tal propriedade resulta do Registo predial.
XXXIII. Não se compreende que o Julgador entenda assistir às Rés o direito a “alterar a configuração da mina”, quando existe decisão já transitada em julgado que determinou a reconstrução do pórtico de entrada da mina com duas lousas de grande porte, uma no seu interior e outra à vista e na saída da mina, uma represa com uma área de cerca de 20m2.
XXXIV. Também não se compreende que prossigam os autos para discussão da propriedade das represas e tal não aconteça com mina, pois conforme sempre se alegou, em todos os processos, os Recorrentes e os seus antepassados sempre acederam à mina e represas sem condições e sempre procederam à sua limpeza e manutenção.
XXXV. Ora, se ficou provado no proc. 342/1998, por sentença proferida em 20/12/2000, já transitada em julgado que a mina e represas existiam há mais de 100 anos, se atendermos à data da aquisição do terreno por parte do proprietária originária, resulta que a mina e represas são muito anteriores á aquisição da propriedade do terreno.
XXXVI. Sendo que a proprietária originária do terreno onde se encontram implantadas a mina e represas, aquando do registo, não contemplou a mina e represas, precisamente por saber que não eram sua propriedade.
XXXVII. Se atentarmos ao Doc. 4, junto com a P.I., resulta certo que os trisavôs dos Autores já em 1885 beneficiavam das águas de rega e lima resultantes de tal exploração sem qualquer limitação, conforme se alcança de um contrato para casamento lavrado a 12/10/1885, entre K… e L…, ambos moradores no lugar de ….
XXXVIII. Os Recorrentes para poderem utilizar a água nos moldes em que sempre foi feita, necessitam agora, como sempre necessitaram, de ter acesso às represas, mas também à mina, nomeadamente, porque as pedras de ardósia de grande porte que tinham a função de manter as águas nascidas em, retenção (armazenadas) durante 24 horas e tinham um furo junto ao solo, por onde a água saía, bem como era regulado o caudal de água em função das culturas a regar e das horas de rega de cada consorte.
XXXIX. Daí a necessidade de os Recorrentes terem acesso incondicional à mina e represas, nomeadamente, para abrirem a mina, para regularem o caudal da mina, para procederem à limpeza, para procederem à sua manutenção (como sempre foi feito, pelo menos desde 1885).
XL. Nunca as Rés alegaram ter sido elas as colocar na entrada da mina as duas lousas de grande porte, uma no seu interior e outra à vista e ter construído na saída da mina, uma represa com uma área de cerca de 20m2 e isto porque, como bem sabem, estas lousas de grande porte foram colocadas no local pelos antepassados dos Recorrentes e por estes construída a represa.
XLI. Acresce que, no que concerne mais concretamente à improcedência do pedido de indemnização pela privação do uso pleno à água da mina para fins domésticos, salvo melhor opinião, se se encontra provado que a mina por dia dava entre 80 a 100 mil litros de nascente de água, a qual fica em represa durante 24h e que esta circulava até aos terrenos dos autores através de regos existentes nas várias propriedades que medeiam a propriedade onde se localizava a mina e os referidos terrenos, beneficiando da inclinação dos mesmos, uma vez que a mina se localiza num ponto muitíssimo alto em relação aos terrenos, conclui-se que independentemente da propriedade da mina, os Recorrentes tinham e têm direito a 80 a 100 mil litros por dia, para a utilização que lhe vinham dando, nomeadamente para uso doméstico.
XLII. Sendo que compete aos Recorrentes provar este uso e a bondade da peticionada indemnização, que se pretende fazer valor nos presentes autos, pois o alegado e invocado “uso doméstico” refere-se à água e não a uma mina ou represas.
Sem prescindir,
XLIII. Nos factos dados como provados o Julgador dá como provado o facto 3, sem fundamentar como alcançou tal decisão.
XLIV. Como se referiu, nos anteriores processos e nos presentes autos em momento algum foi invocada pela 3.ª Ré (E1…, S.A.) a propriedade da mina e represas, nem as restantes Rés alegaram ou invocaram a sua propriedade, nem tao pouco qualquer das Rés formulou um pedido nesse sentido.
XLV. E, porque, o artigo 609.º, n.º do CPC, consagra que a sentença não pode condenar em quantidade superior ou em objecto diverso do que se pedir, não tendo sido pedido não houve, portanto, condenação.
XLVI. No entanto, foi com base nessa decisão de facto (dar como provado o facto 3), que o Julgador decide liminarmente pela improcedência destes três pedidos.
XLVII. Finalmente importa considerar que o Julgador vem agora ao fim destes anos todos com uma decisão liminar impedir os Recorrentes de ter acesso à mina (facto que nunca foi contestado por ninguém, nomeadamente, pelas Rés), acesso que está provado existir há mais de 100 anos por si e pelos seus antepassados.
XLVIII. A falta de fundamentação e sustentação fáctica e jurídica desta decisão consubstancia uma nulidade que aqui expressamente se invoca.
XLIX. Ainda que assim não se entenda, entendem os Recorrentes que, considerando o supra exposto e deve ser revogado o despacho proferido ao abrigo do artigo 595.º, n.º 1, alínea c) do CPC, julgou parcialmente improcedentes os pedidos 4, 5, 6.
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Não foram apresentadas contra-alegações.
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Corridos os vistos legais cumpre decidir.
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II- FUNDAMENTOS
O objecto do recurso é delimitado pelas conclusões da alegação do recorrente, não podendo este Tribunal conhecer de matérias nelas não incluídas, a não ser que as mesmas sejam de conhecimento oficioso-cfr. artigos 635.º, nº 4, e 639.º, nºs 1 e 2, do C.P.Civil.
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No seguimento desta orientação é apenas uma a questão que importa apreciar e decidir:
a)- saber se se verifica, ou não a excepção de autoridade de caso julgado e excepção de caso julgado;
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A)- FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO
O tribunal recorrido deu como provados os seguintes factos:
1 - A mina de água em causa nos autos situa-se no prédio rústico descrito na Conservatória do Registo Predial de Valongo sob o número três mil duzentos e setenta e inscrito na respectiva matriz predial rústica com o artigo 1338.
2 - Tal prédio é, actualmente, propriedade de E1…, S.A..
3 - A mina é, igualmente, propriedade da Ré E1…, S.A.
4 - No processo n.º 38/14.3T8VLG, foi decidido, reconhecer que os aqui Autores adquiriram o direito ao uso da água proveniente da mina I…, na qualidade de proprietários dos terrenos rústicos descritos na C.R.P de Valongo sob os n.ºs …./……. e n.º 3809, beneficiando aquela de água de rega, com direito a dia e meio numa semana (12h de Sexta-feira e 24h de Sábado) e dois dias noutra, alternadamente, (24h de Sábado e 24h de Domingo) e a segunda com direito a quatro dias numa semana (24h de Domingo, de Segunda, de Terça e de Quarta).
5 - Da mesma mina de I… ou M… era ainda proveniente água de lima, isto é, água de nascente que corre para a primeira propriedade, descrita sob o n.º ……/……, 24 h por dia ininterruptamente.
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III. O DIREITO
Como supra se referiu é apena uma a questão que importa apreciar e dicidir:
a)- saber se se verifica ou não a excepção de caso julgado.
Como se sabe, a excepção de caso julgado constitui uma excepção dilatória, de conhecimento oficioso, que se traduz num pressuposto processual negativo, cuja função consiste em impedir o prosseguimento do processo com o objectivo de evitar que o tribunal se veja na contingência de proferir decisão de mérito que contrarie ou repita uma outra, anterior e definitiva.
Na verdade, o trânsito em julgado imprime à decisão carácter definitivo; uma vez transitada em julgado, a decisão não pode ser alterada. Ao caso julgado está, assim, inerente a ideia de imutabilidade ou de estabilidade. O fim do caso julgado é o de evitar a reprodução ou contradição de uma dada decisão transitada em julgado.
Como refere Manuel de Andrade[1] a excepção do caso julgado traduz-se em “a definição dada à relação controvertida se impor a todos os tribunais quando lhes seja submetida a mesma relação, todos tendo de acatá-la, julgando em conformidade, sem nova discussão e de modo absoluto, com vista não só à realização do direito objectivo ou à actuação dos direitos subjectivos privados correspondentes, mas também à paz social”.
O caso julgado, a verificar-se, obsta a que o tribunal conheça do mérito da causa e conduz à absolvição da instância (artigo 576.º, n.º 2 do CPCivil).
Distingue a lei o caso julgado material, do caso julgado formal.
O caso julgado formal consiste em estar excluída a possibilidade de recurso ordinário, não podendo a decisão ser impugnada e alterada por esta via (artigos 620.º e 628.º CPCivil).
O caso julgado material que nos interessa analisar na situação presente, consiste na definição dada à relação controvertida se impor a todos os tribunais quando lhes seja submetida a mesma relação, quer a título principal, quer a título prejudicial (art. 619º CPC).
O caso julgado verifica-se em relação às decisões que versam sobre o fundo da causa e portanto sobre os bens discutidos no processo; as que definem a relação ou situação jurídica deduzida em juízo, as que estatuem sobre a pretensão do Autor.
O caso julgado material tem força obrigatória dentro do processo e fora dele e por isso não pode ser alterado em qualquer acção nova que porventura se proponha sobre o mesmo objecto, entre as mesmas partes e com fundamento na mesma causa de pedir. A estabilidade ultrapassa as fronteiras do processo e portanto, além da preclusão operada naquele, produz-se a impossibilidade de a decisão ser alterada mesmo noutro processo, com a excepção da possibilidade da sua revogação ou modificação por meio dos recursos extraordinários de revisão (artigo 696.º do CPCivil) para os casos em que o caso julgado se formou em circunstâncias patológicas ou anormais.
Para que o caso julgado se imponha fora do processo, vinculando o juiz e as partes, é indispensável que concorram os requisitos estatuídos no artigo 581.º do CPCivil, isto é, que entre a acção em que se formou o caso julgado e a acção em que se pretende fazer projectar a sua eficácia se verifiquem as três identidades previstas no artigo citado: sujeitos, pedido e causa de pedir.
O artigo 581.º do CPCivil define cada um dos requisitos do caso julgado da seguinte forma:
1 - Repete-se a causa quando se propõe uma acção idêntica a outra quanto aos sujeitos, ao pedido e à causa de pedir.
2 - Há identidade de sujeitos quando as partes são as mesmas sob o ponto de vista da sua qualidade jurídica.
3 - Há identidade de pedido quando numa e noutra causa se pretende obter o mesmo efeito jurídico.
4 - Há identidade de causa de pedir quando a pretensão deduzida nas duas acções procede do mesmo facto jurídico. Nas acções reais a causa de pedir é o facto jurídico de que deriva o direito real; nas acções constitutivas e de anulação é o facto concreto ou a nulidade específica que se invoca para obter o efeito pretendido.
1 - Identidade de sujeitos
A lei coloca este requisito no plano da qualidade jurídica ou da identidade do interesse jurídico, não relevando aqui a identidade física ou nominal, mas o interesse jurídico que a parte actuou no processo.
Segundo o n.º 2 do art. 581.º do CPC, «há identidade de sujeitos quando as partes são as mesmas sob o ponto de vista da sua qualidade jurídica».
Tem entendido a jurisprudência que «as partes são as mesmas sob o aspecto jurídico desde que sejam portadoras do mesmo interesse substancial», não sendo exigível uma correspondência física dos sujeitos nas duas acções e sendo indiferente a posição que os sujeitos assumam em ambos os processos.
Alberto dos Reis[2] entendia, a propósito do significado da expressão “sob o ponto de vista da qualidade jurídica”, que “As partes são as mesmas sob o aspecto jurídico desde que sejam portadoras do mesmo interesse substancial. O que conta, pois, para o efeito da identidade jurídica, é a posição das partes quanto à relação jurídica substancial (…)”.
A identidade jurídica dos sujeitos da relação jurídica, não tem, portanto, necessariamente, que coincidir com a identidade física, pois o que interessa é que estes actuem como titulares da mesma relação substancial, isto no que toca à litispendência e caso julgado.
Aliás, o STJ tem assumido uma posição de flexibilidade na interpretação dos requisitos legais do caso julgado, pronunciando-se no sentido da verificação da excepção de caso julgado material, mesmo nos casos em que estes requisitos não estejam formalmente verificados.[3]
2. - Identidade do pedido e da causa de pedir
O pedido consiste no efeito jurídico pretendido pelo autor (ou pelo réu através da reconvenção), por exemplo, o reconhecimento do direito de propriedade.
A identidade dos pedidos é perspectivada em função da posição das partes quanto à relação material.
Existe identidade de pedidos sempre que ocorra coincidência nos efeitos jurídicos pretendidos do ponto de vista da tutela jurisdicional reclamada e do conteúdo e objecto do direito reclamado, sem que seja de exigir uma adequação integral das pretensões.
A identidade da causa de pedir verifica-se quando as pretensões formuladas em ambas as acções emergem de facto jurídico genético do direito reclamado comum a ambas.
Nas acções reais, a causa de pedir é o facto jurídico de que emerge o direito real a tutelar, por exemplo, o contrato de compra e venda ou a usucapião. Mas a causa de pedir não consiste na categoria legal invocada ou no facto jurídico abstracto configurado pela lei, mas, antes, nos concretos facto da vida a que se virá a reconhecer, ou não, a força jurídica bastante e adequada para desencadear os efeitos pretendidos pelo autor.
Mas não é somente sobre a pretensão do autor que se forma o caso julgado.
A lei também pretende que a solução dada à pretensão do autor, em função da causa de pedir em que tal pretensão se alicerça, seja respeitada pela força do caso julgado.
Na jurisprudência do STJ[4], entende-se que não é apenas a conclusão ou dispositivo da sentença que tem força de caso julgado, aceitando-se como mais equilibrado um critério ecléctico, que, sem tornar extensiva a eficácia do caso julgado a todos os motivos objectivos da sentença, reconhece, todavia, essa autoridade à decisão daquelas questões preliminares que forem antecedente lógico indispensável à emissão da parte dispositiva do julgado, em homenagem à economia processual, ao prestígio das instituições judiciárias quanto à coerência das decisões que proferem e, finalmente, à estabilidade e certeza das relações jurídicas.
No mesmo sentido, Teixeira de Sousa[5] afirma que “Não é a decisão, enquanto conclusão do silogismo judiciário, que adquire o valor de caso julgado, mas o próprio silogismo considerado no seu todo: o caso julgado incide sobre a decisão como conclusão de certos fundamentos e atinge esses fundamentos enquanto pressuposto daquela decisão”.
O artigo 581.º do CPCivil coloca os dois requisitos da identidade objectiva pedido e causa de pedir precisamente no mesmo plano, sem qualquer diferença de projecção e alcance.
Factos e pedido são portanto sempre partes do objecto do processo de igual valor e importância. É esta a ideia central defendida pela doutrina e pela jurisprudência alemãs, e aceite por Castro Mendes[6], segundo a qual «o caso julgado é o raciocínio como um todo e não cada um dos seus elementos.
O objecto do processo é necessariamente dual, pois sem causa de pedir não há individualização da pretensão processual e sem pedido não existe requisição de tutela jurisdicional para a pretensão processual individualizada.[7]
Entre a causa de pedir e a pretensão processual existe um nexo de individualização caracterizado pela reciprocidade: a causa de pedir individualiza a pretensão delimitada e a pretensão delimitada individualiza a causa de pedir. Esta reciprocidade permite determinar a causa de pedir em razão da pretensão processual individualizada e a pretensão processual individualizada em razão da causa de pedir, estabelecendo-se entre ambas uma relação de implicação mútua”.[8]
Conforme afirma Antunes Varela[9] “É a resposta dada na sentença à pretensão do autor, delimitada em função da causa de pedir, que a lei pretende seja respeitada através da força e autoridade do caso julgado» e «a eficácia do caso julgado, como se depreende do art. 498.º, apenas cobre a decisão contida na parte final da sentença (art. 659.º, n.º 2, in fine, ou seja, a resposta injuntiva do tribunal à pretensão do autor ou do réu, concretizada no pedido ou na reconvenção e limitada através da respectiva causa de pedir”.
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Importa, porém, sopesar que o caso julgado tem uma dupla função: vale como excepção, actualmente dilatória, através da qual se alcança o efeito negativo da inadmissibilidade de uma segunda acção e ainda, como autoridade, pela qual se alcança o seu efeito positivo, que é o de impor uma decisão como pressuposto indiscutível de uma segunda decisão, assentando por isso numa relação de prejudicialidade.
O objecto da primeira decisão de mérito constitui pressuposto necessário da decisão de mérito a proferir na segunda acção, não podendo a decisão de determinada questão voltar a ser discutida, tal como decorre do disposto no artigo 621.º do CPCicil.
A excepção do caso julgado não se confunde, pois, com a autoridade do caso julgado.
Como refere Teixeira de Sousa[10] “a autoridade do caso julgado visa evitar que o órgão jurisdicional, duplicando as decisões sobre idêntico objecto processual, contrarie na decisão posterior, o conteúdo da decisão anterior: a excepção do caso julgado garante não só a impossibilidade de o Tribunal decidir sobre o mesmo objecto duas vezes de maneira diferente, mas também a inviabilidade do Tribunal decidir sobre o mesmo objecto de maneira idêntica. Já quando vigora a autoridade do caso julgado, o caso julgado material manifesta-se no seu aspecto positivo de proibição de contradição da decisão transitada”.
A jurisprudência tem reiterado que são abrangidas pelo caso julgado as questões apreciadas que constituem antecedente lógico da parte dispositiva da sentença[11].
Com a autoridade do caso julgado, os tribunais ficam vinculados às decisões uns dos outros, quanto a questões essenciais. Se a decisão da questão em causa foi decisiva para a procedência ou improcedência da acção, impõe-se aquela autoridade, não podendo o tribunal da segunda acção julgá-la em contrário, mesmo que a causa de pedir seja diferente.[12]
As questões essenciais são as que respeitam aos factos judiciais, os factos concretos que são determinados e separados de todos os outros pela norma aplicável, e foram tornados certos através da decisão que sobre eles recaiu após transitar em julgado e perante as mesmas partes, nela cabendo, entre outras as relações de prejudicialidade entre os objectos quando o fundamento da decisão transitada condiciona a apreciação do objecto numa acção posterior[13] bem como nas relações sinalagmáticas entre prestações, assim se o autor pede a condenação do réu na entrega do automóvel comprado, a validade do contrato do contrato de compra e venda não pode ser questionada na acção em que o vendedor pede o cumprimento da prestação sinalagmática, isto é, o pagamento do preço.
É claro que, nesta perspectiva, só as questões essenciais poderão ter a autoridade de caso julgado, o que significa que só a terão as decisões sobre questões relativas à causa de pedir da acção transitada. Mas, mesmo que a sua causa de pedir seja diferente, aquela autoridade deve impor-se na segunda acção.
Ora, os tribunais superiores e a doutrina têm entendido, e bem, que a imposição da autoridade do caso julgado não exige a coexistência da tríplice identidade prevista no já citado artigo 581.º do CPCivil.[14]
Tal entendimento justifica-se como já se referiu, pela necessidade de evitar que um tribunal possa definir uma concreta situação controvertida de forma válida, de modo contraditório e incompatível com outra anterior transitada em julgado.
Como referia Manuel de Andrade,[15] a definição dada pela sentença à situação ou relação material controvertida que estiver em causa, deve ser respeitada para todos os efeitos em qualquer novo processo, tendo este novo processo de ter por assente que a mesma situação já existia ou subsistia a esse tempo tal como a sentença a definiu.
Postos estes breves considerandos teóricos debrucemo-nos, então, sobre o caso concreto.
Importa, desde logo, assinalar que no que tange aos pedidos formulados sob o ponto 1., 2. e 3, destes autos o tribunal recorrido considerou verificar-se a excepção da autoridade do caso julgado, por força da decisão anterior, transitada em julgado, proferida no processo 238/14.3T8VLG, que correu termos no 1.º Juízo do Tribunal Judicial de Valongo e absolvo as Rés da instância quanto ao mesmo, pelo que se revela inócuo saber, como alegam os Autores se não existe identidade de sujeitos e causa de pedir nas acções em causa, pois que, tal como supra se referiu, para a verificação da existência da autoridade de caso julgado não se exige a coexistência da tríplice identidade prevista no já citado artigo 581.º do CPCivil, improcedendo desta forma, as conclusões III a XV formuladas pelos Autores recorrentes.
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Isto dito, o que importa então verificar é se se verifica, ou não, a referida excepção de autoridade de caso julgado quanto aos referidos pedidos.
Ora, a resposta é quanto a nós, salvo divergente entendimento, positiva quanto ao pedido formulado sob o ponto 1.
Efectivamente, no processo n.º 238/14.3T8VLG, foi decidido, reconhecer que os aqui Autores adquiriram o direito ao uso da água proveniente da mina I…, na qualidade de proprietários dos terrenos rústicos descritos na C.R.P de Valongo sob os n.ºs …../…… e n.º 3809, beneficiando aquela de água de rega, com direito a dia e meio numa semana (12h de Sexta-feira e 24h de Sábado) e dois dias noutra, alternadamente, (24h de Sábado e 24h de Domingo) e a segunda com direito a quatro dias numa semana (24h de Domingo, de Segunda, de Terça e de Quarta).
Decisão, que foi também pressuposto daquela que posteriormente foi proferida no processo 4/04.4TBVLG (cfr. fls. 466 dos autos).
Significa, portanto, que tendo aos Autores na referida acção sido reconhecido terem adquirido o direito ao uso da água, limitado por períodos de tempo, proveniente da mina I…, através de servidão, na qualidade de proprietários dos prédios dominantes que descreveram, não podem ver debatida nestes autos, a questão do direito de propriedade plena, que como é evidente, lhe conferiria um uso ilimitado sobre essa mesma água da mina, por não serem conciliáveis os dois direitos.
É que se se admitisse nestes autos a discussão da propriedade plena sobre a água em questão, poder-se-ia gerar uma situação em que o tribunal recorrido iria apreciar uma concreta questão de forma válida mas de modo contraditório e incompatível com outra anterior transitada em julgado, situação que, precisamente se quer evitar com a imposição da autoridade do caso julgado.
E, ao contrário do que defendem os Autores recorrentes, a preclusão verifica-se porque já se definiu, por decisão transitada em julgado, que os Autores tinham apenas o direito limitado do uso da água em termos de servidão.
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Improcedem, assim, as conclusões XVI a XVIII formuladas pelos Autores recorrentes.
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No ponto 2. petitório solicitam os Autores recorrentes que “sejam reconhecidos como proprietários (consortes) das três represas e mina por usucapião”.
Também quanto a este pedido o tribunal recorrido entendeu que se verificava a excepção da autoridade de caso julgado e, cremos, que bem.
Não há dúvida de que nos processos 238/14.3T8VLG e 4/04.4TBVLG não se discutiu, a título principal, a existência do direito de propriedade das três represas e da mina, agora invocado pelos Autores.
Acontece que, no processo com o número 4/04.4TBVLG discutiu-se, fundamentalmente, a destruição da mina e da represa à sua saída (represa da mina), e respectivas reconstituições.
Ora, perscrutando os fundamentos em que assentou a decisão proferida no Acórdão do Tribunal da Relação do Porto, no processo 4/04.4TBVLG, consta o seguinte: “a mina (estrutura externa englobando os pórticos) não pertence(r) aos autores. Estes apenas são titulares de um direito de uso da água”. E, ainda, que “o direito de uso da água nada tem a ver com as lousas que formavam o pórtico, ou com quaisquer construções adjacentes, podendo o dono do terreno (que é o dono da mina e da água) alterar a configuração da mina, desde que garanta o pleno fornecimento da água do prédio dominante (dos autores)” (cfr. fls. 466 e 467 dos autos).
Como acima se referiu, é entendimento dominante que a força do caso julgado material abrange, para além das questões directamente decididas na parte dispositiva da sentença, as que sejam antecedente lógico necessário à emissão da parte dispositiva do julgado.
Como diz Miguel Teixeira de Sousa[16] “não é a decisão, enquanto conclusão do silogismo judiciário, que adquire o valor de caso julgado, mas o próprio silogismo considerado no seu todo: o caso julgado incide sobre a decisão como conclusão de certos fundamentos e atinge estes fundamentos enquanto pressupostos daquela decisão”.
Como assim, será sempre em função do teor da decisão que se mede a extensão objectiva do caso julgado e, consequentemente, a autoridade deste.
Portanto, em face do teor do segmento transcrito do Acórdão do Tribunal do Porto, no processo 4/04.4TBVL, no qual se atendeu como precedente lógico da decisão proferida ser o proprietário da mina, o proprietário do terreno onde a mesma se insere (a Ré D…, S.A.), não pode o tribunal recorrido nestes autos apreciar a propriedade dessa mesma mina por banda dos Autores, (também estes partes naquela mesma acção), sob pena de haver contradição de julgados.
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Improcedem, desta forma, as conclusões XIX a XXII formuladas pelos Autores recorrentes.
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No ponto 3. do petitório os Autores recorrentes solicitam que “sejam as Rés condenadas a efectuar todas as obras necessárias à recuperação de todas as águas das nascentes e a empresa-las sem perda e com segurança, no local das nascentes”.
Quanto a este pedido o tribunal recorrido concluiu que se verificada a excepção de caso julgado por referência a acção nº 238/14.3T8VGL.
Vejamos se assim é.
Na referida acção os Autores pediram que a Ré fosse condenada a “proceder de modo a restabelecer o curso normal da água desde a sua nascente até aos terrenos dos AA. através do encanamento em tubos de cimento de 8 polegadas, no mínimo com caixa de limpeza de 25 em 25 metros de distância”.
Nesta mesma acção foi julgado parcialmente procedente o pedido dos Autores formulado sob a alínea b), tendo a Ré, D…, S.A., sido condenada a proceder de modo a restabelecer o curso normal da água desde a sua nascente até aos terrenos dos AA., através de obras que se adeqúem e sejam suficientes para tal finalidade, designadamente através de encanamento da água.
Entendeu o tribunal recorrido que no segmento do dispositivo referido, se encontra já contida a satisfação da pretensão ora apresentada pelos autores, na medida em que a Ré D…, S.A. foi já condenada a proceder ao restabelecimento do curso da água desde a sua nascente até ao terreno dos autores através, designadamente, do seu encanamento, e/ou da realização de “obras que se adeqúem e sejam suficientes para tal finalidade”, nas quais se incluirá, a necessidade de empresar a água, desde que necessárias ao apontado fim-de restabelecimento do curso da água desde a sua nascente até ao terreno dos Autores.
Sob este conspecto não se acompanha a decisão recorrida.
Com efeito, o que se pretende com o pedido supra referido e formulados nestes autos é que as Rés sejam condenadas a efectuar todas as obras necessárias à recuperação de todas as águas das nascentes e a empresa-las sem perda e com segurança, no local das nascente.
É que empresar as águas no local da nascente não é a mesma coisa que a proceder ao restabelecimento do curso normal da água em causa até ao terreno dos Autores.
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Procedem, assim, as conclusões XXIII a XXVII formuladas pelos Autores recorrentes.
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No que tange aos pedidos formulados sob os pontos 4., 5. 6. dos presentes autos o tribunal recorrido julgou procedente a excepção do caso julgado e, consequentemente, absolveu as Rés da instância quanto aos referidos pedidos, sendo que em relação ao 4. com excepção da parte referente aos danos da privação do uso para fins domésticos.
Sob este conspecto os Autores recorridos vêm alegar que, desde logo, não existe identidade de sujeitos por as 2ª e 3ª Rés não terem sido partes nos processos nos processos 4/04.4TBVLG e 342/1998), pelo que não foi contra elas formulado qualquer pedido, muito menos os pedidos 4, 5, 6 dos presentes autos.
Como já noutro passo se referiu para este efeito, deve atender-se somente à qualidade jurídica das partes, não sendo exigível uma correspondência física nas duas acções, sendo a mesma irrelevante.
Vejamos então.
Nestes autos figuram como Autores B… e F…, os quais detinham a mesma posição jurídica no processo 4/04.4TBVLG, bem como no processo 238/14.3T8VLG (anteriormente com o número 342/1998).
Em todas as acções (inclusive nesta) assumiu a posição de Ré, a também aqui Ré, D…, S.A., diferindo, apenas, enquanto Rés nestas anteriores acções a E…, S.A. e a E1…, S.A., que não eram partes nos processos 4/04.4TBVLG, bem como 238/14.3T8VLG (anteriormente com o número 342/1998).
Acontece que a segunda e a terceira Rés aparecem, aqui, na qualidade de proprietárias do terreno onde estão implantadas a mina e as represas, qualidade essa que sujeitou a D…, S.A. à condição de Ré nas acções anteriores.
Temos, assim, que, sendo a qualidade jurídica das partes a mesma, existe identidade de sujeitos quanto às acções referidas, pelo que se encontra verificado o requisito imposto pelo artigo 582.º, n.º 2 do CPCivil.
Quanto mais concorda-se com a decisão recorrida e, portanto, aqui nos abstemos de voltar a repisar.
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Improcedem, por conseguinte as conclusões XXVIII a XXX formuladas pelos Autores recorrentes.
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Vejamos por último a questão do conhecimento parcial do mérito quanto aos pedidos formulados em 4., 7. e 8. do petitório.
Analisemos, desde logo, o ponto 3. da fundamentação factual.
O referido ponto tem a seguinte redacção:
A mina é, igualmente, propriedade da Ré E1…, S.A”.
Referem os Autores recorrentes que o tribunal recorrido deu como provado o citado facto sem fundamentar como alcançou tal decisão.
Ora, na motivação da decisão da matéria de facto o tribunal recorrido discorreu da seguinte forma:
A convicção do Tribunal quanto à factualidade considerada provada radicou na análise global e concatenada, crítica e ponderada da prova carreada para os autos apreciada segundo as regras da experiência comum e o princípio da livre convicção do julgador.
Concretamente, o Tribunal alicerçou a sua convicção nas certidões das decisões proferidas nos processos n.º 238/14.3T8VLG e 4/04.4 TBVLG, juntas aos autos a fls. 390 e ss. e na certidão de fls. 616”.
Daqui resulta ter o tribunal recorrido formado a sua convicção, essencialmente, nas certidões das decisões proferidas nos processos n.º 238/14.3T8VLG e 4/04.4 TBVLG.
Pode-se dizer que tal fundamentação é vaga e genérica, todavia, o que não se pode é dizer que exista falta de fundamentação.
Aliás, sobe este conspecto, importa assinalar que os Autores recorrentes não impugnam a decisão da matéria quanto aos seus pontos 1. e 2., razão pela qual da sua consideração já resulta que a mina também e propriedade da Ré E1…, S.A…
No que concerne à decisão em si, parece-nos, salvo o devido respeito, que os Autores laboram em manifesto erro.
Atentemos.
É certo que em nenhum dos processos 4/04.4TBVLG e 238/14.3T8VLG (anteriormente com o número 342/1998), foi pedido o reconhecimento do pedido do direito de propriedade da mina e represas.
Todavia, no processo n.º 238/14.3T8VLG, foi decidido, reconhecer que os aqui Autores adquiriram o direito ao uso da água proveniente da mina I…, na qualidade de proprietários dos terrenos rústicos descritos na C.R.P de Valongo sob os n.ºs …./……. e n.º 3809, beneficiando de água de rega, com direito a dia e meio numa semana (12h de Sexta-feira e 24h de Sábado) e dois dias noutra, alternadamente, (24h de Sábado e 24h de Domingo) e a segunda com direito a quatro dias numa semana (24h de Domingo, de Segunda, de Terça e de Quarta).
Na mesma decisão foi reconhecido que da mesma mina I… ou M… era ainda proveniente água de lima, isto é, água de nascente que corre para a primeira propriedade, descrita sob o n.º 02267/171193, 24 h por dia ininterruptamente.
Tendo os sido reconhecidos como titulares de um direito de uso da água da mina, exarou-se no Acórdão proferido por esta Relação que: “O que os autores podem exigir, baseados no seu direito (de uso da água da mina), é, apenas, isto: que tal direito (traduzido na servidão do prédio onde a mina se encontra instalada) se mantenha inalterado (salvo se a nascente perder caudal ou secar naturalmente), devendo o dono do terreno ou qualquer outro lesante do direito, repor a situação anterior e indemnizar pelos danos causados com a privação do uso da água (…)”.
Diga-se, aliás, que nem de outro poderia ser, já que os Autores são apenas titulares de um direito real limitado adveniente da servidão.
Portanto, no caso concreto, as utilidades passíveis de serem gozadas pelos Autores, na qualidade de proprietários dos prédios dominantes, terrenos rústicos descritos na C.R.P de Valongo sob os n.ºs …/……. e n.º 3809, consistem no uso da água proveniente da mina, pelos períodos acima referidos.
A mesma decisão reconheceu que a dita mina de I… ou M… era ainda proveniente água de lima, isto é, água de nascente que corre para a primeira propriedade, descrita sob o n.º ……/……., 24 h por dia ininterruptamente.
Ora, os Autores peticionam, agora, nestes autos, uma indemnização pelo uso pleno da água para fins domésticos (ponto 4. do pedido), o livre e ilimitado acesso às águas e mina (ponto 7. do pedido) e inerente abstenção das Rés quanto a este acesso (ponto 8. Do pedido), no seguimento (pressuposto) dos pedidos de reconhecimento de propriedade das águas e da mina, conforme descrito nos pontos 1. e 2. da petição inicial.
Repare-se, porém, que tais pedidos apenas teriam viabilidade se os Autores fossem proprietários da mina e da água que corre da mesma, o que já se viu não sucede, como justamente resulta de sentença anterior, e já transitada em julgado, e por isso com força de caso julgado que se impõe aqui observar.
Como já acima se assinalou, no citado Acórdão desta Relação proferido no processo 4/04.4TBVLG, referiu-se que “a mina (estrutura externa englobando os pórticos) não pertence(r) aos autores. Estes apenas são titulares de um direito de uso da água”. E ainda que “o direito de uso da água nada tem a ver com as lousas que formavam o pórtico, ou com quaisquer construções adjacentes, podendo o dono do terreno (que é o dono da mina e da água) alterar a configuração da mina, desde que garanta o pleno fornecimento da água do prédio dominante (dos autores)”.
Portanto, o direito de os Autores acederem à mina e ao gozo da mesma e uso da água é limitado na medida das necessidades decorrentes do exercício do direito de uso da água proveniente da mina, tal como veio consignado no dispositivo da sentença proferida na acção 238/14.3T8VLG e pelos períodos ali designados.
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Daqui resulta, que os citados pedidos tinham de ser julgados parcialmente improcedentes como o foram, não merecendo, por isso, qualquer censura a decisão recorrida.
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Improcedem, desta forma, as conclusões XXXI a XLIX, formulados pelos Autores recorrentes.
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IV - DECISÃO
Pelos fundamentos acima expostos, acordam os Juízes deste Tribunal da Relação em julgar a apelação interposta parcialmente procedente por provada e, consequentemente, revogar a decisão recorrida na parte em que considerou verificar-se a excepção de caso julgado quanto ao pedido formulado em 3. do petitório devendo, portanto, a acção prosseguir também para a apreciação do mencionado pedido.
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No mais mantém-se o decidido.
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Custas da apelação pelos Autores apelantes na proporção do decaimento (artigo 527.º nº 1 do C.P.Civil).
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Porto, 8 de Outubro de 2018.
Manuel Domingos Fernandes
Miguel Baldaia de Morais
Jorge Seabra
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[1] In Noções Elementares de Processo Civil, Coimbra, pp. 305-306.
[2] In Código de Processo Civil Anotado, 3.ª edição, 1981, pp. 101.
[3] Cfr., entre outros, Acs. de 24-04-1996, 15-01-2013 e de 17/06/2014.
[4] Cfr. os acórdãos de 10.07.97–CJ/STJ–2.º/165; de 27.04.04, de 20.05.04 de 13.01.05 de 05.07.05 e de 08.03.07 in www.dgsi.pt.
[5] In “Estudos sobre o Novo Processo Civil”, 2.ª edição, Lex, Lisboa, 1997, pp. 578-579.
[6] In “Limites objectivos do caso julgado em processo civil”, Edições Ática, 1968, pp. 161-162.
[7] Cfr. Teixeira de Sousa, O objecto da sentença e o caso julgado material, O estudo sobre a funcionalidade processual, BMJ,1983, Abril, n.º 325, p. 105.
[8] Cfr. Teixeira de Sousa, O objecto da sentença ob. cit., p. 106.
[9] Manual de Processo Civil, 2.ª edição, Coimbra Editora, 1985, p. 712 e 714.
[10] In O Objecto da Sentença e o Caso Julgado Material, BMJ 325,p. 171.
[11] Cfr. a basta jurisprudência citada por Teixeira de Sousa, obra citada pág. 580.
[12] Cfr. Silva Carvalho, O Caso Julgado na Jurisdição Contenciosa (como excepção e como autoridade-limites objectivos) e na Jurisdição Voluntária (haverá caso julgado?).
[13] O Prof. Teixeira de Sousa na obra citada pág. 581 dá o exemplo de numa acção em que o réu é absolvido quanto ao pedido de pagamento do capital com fundamento na inexistência de qualquer contrato de mútuo celebrado entre as partes, é vinculativa numa acção posterior em que o mesmo autor pede contra o mesmo réu o pagamento de juros relativos ao mesmo capital.
[14] Cfr., entre outros, Ac. desta Relação 13/01/20011 da RG de 15/03/2011 e de 12/07/2011, da RC de 15/05/2007, do STJ de Ac. do STJ de 12/11/1987, todos publicados em www.dgsi.pt e ainda, Manuel Andrade,” Lições Elementares de Processo Civil, 1979, pág. 320 e 231.
[15] Obra citada.
[16] In “Estudos sobre o Novo Processo Civil”, pág. 579.