Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
439/14.4TBVCD.P1
Nº Convencional: JTRP000
Relator: AUGUSTO DE CARVALHO
Descritores: LEILÃO JUDICIAL
PUBLICIDADE DA VENDA
Nº do Documento: RP20190308439/14.4TBVCD.P1
Data do Acordão: 03/08/2019
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: CONFIRMADA
Indicações Eventuais: 5ª SECÇÃO (LIVRO DE REGISTOS Nº 691, FLS 267-271)
Área Temática: .
Sumário: I - O nº 1 do artigo 837º do C.P.C. institui a venda em leilão eletrónico como a modalidade preferencial quando esteja em causa a venda de bens móveis ou imóveis penhorados.
II - O artigo 20º da citada Portaria nº 282/2013, de 29 de agosto, prevê que o leilão eletrónico se processa em plataforma eletrónica acessível na Internet, nos termos definidos nesta portaria e nas regras do sistema que venham a ser aprovadas pela entidade gestora da plataforma e homologadas pelo membro do Governo responsável pela área da justiça.
III - O Despacho 12.624/2015, publicado no DR, II Série, de 9.11.2015, veio definir como entidade gestora da plataforma de leilão eletrónico a Câmara dos Solicitadores e homologar as regras do sistema aprovadas por essa entidade.
IV - É o artigo 6º do Despacho 12.624/2015 que define as regras aplicáveis à venda em leilão eletrónico, prescrevendo que os leilões são publicados na plataforma www.e-leilões.pt. A publicitação da venda em leilão eletrónico naquela plataforma é obrigatória, sendo as outras formas de publicidade empreendidas pelo AE meramente facultativas.
Reclamações:
Decisão Texto Integral: Apelação nº 439/14.4TBVCD-C.P1

Acordam no Tribunal da Relação do Porto

Na execução para pagamento de quantia certa que lhe move a B... veio o executado C... reclamar das irregularidades da venda em leilão eletrónico, pedindo a sua anulação, uma vez que o mesmo se prolongou para além da data anunciada e que as propostas vencedoras foram apresentadas após a hora anunciada para o fecho.

O proponente vencedor pronunciou-se no sentido da improcedência do requerido, dado que a irregularidade não existiu e, a existir, não influenciaria o resultado do leilão.

A agente de execução prestou esclarecimentos.

Foi proferida decisão, no sentido de que a apontada irregularidade se encontrava sanada e era irrelevante para a venda operada – artigos 191º, nºs 2 a 4, e 195º, nº 1, do C.P.C.

Inconformada, a ré recorreu para esta Relação, formulando as seguintes conclusões:
1. A notificação de 22/03/2018 de que os bens penhorados iriam ser vendidos em leilão eletrónico até às 10:00 horas do dia 08.05.2018, tendo o mesmo sido colocado na competente Plataforma, com data de início em 22/03/2018 e fim 08/05/2018, foram notificados, no que aqui interessa, ao executado C... (Referência ......72) e ao então seu mandatário (Referência ......47), bem como publicados anúncios às 14.38, 14:43, 14:7 e 14:50 desse mesmo dia (Referências ......08, ......49, ......02 e ......13, respetivamente), onde nas referidas notificações e publicações sempre se determinou que o encerramento do leilão seria até às 10:00 horas do dia 08/05/2018.
2. Ora, quer na notificação ao executado e seu então mandatário, quer na publicitação dos anúncios referidos no item anterior, sempre constou, como hora e local da abertura das propostas o dia 08/05/2018, até às 10.00 horas, nos termos do nº 3 do artigo 817º, ex vi nº 2 do artigo 837º do C.P.C..
3. Sendo que, a comunicação e publicitação da venda em leilão eletrónico deve efetuar-se nos termos dos números 2, 3 e 4 do artigo 817º, com as devidas adaptações, ex vi nº 2 do artigo 837º, ambos do C. P. C.
4. Ou seja, das comunicações à exequente, aos executados e aos credores reclamantes, bem como dos anúncios devem constar “o nome do executado, a identificação do agente de execução, o dia, a hora e local da abertura de propostas (leia-se dia e hora do encerramento do leilão), sendo que, tanto nas comunicações ao executado, como nos anúncios publicitados, foi sempre referido como termo do leilão as 10:00 horas do dia 08/05/2018 (cf. item 6 das presentes alegações).
5. Assim, sempre o executado confiou na data e hora comunicadas pela Senhora Agente de Execução como final do leilão eletrónico que lhe foi comunicado, não duvidando da fiabilidade de tal comunicação, atenta a competência e funções desempenhadas pela referida Auxiliar de Justiça.
6. E, na aceitação da indicação do dia e hora do final do leilão eletrónico, só lhe restou aguardar pelo último dia para, dada a sua inabilidade para aceder à Plataforma e-leiloes, pelos motivos acima expostos, se socorrer de representante para controlar e provavelmente licitar através de tal representante nos leilões em causa nestes autos.
7. Porém, no último dia de encerramento do leilão, o seu representante faleceu, falecimento que ocorreu às 00 horas e 44 minutos (cf. Doc. n.º 1 junto em 22/05/2018, Ref.ª ......38), ou seja, cerca de 10 horas antes do encerramento do leilão.
8. Nada mais restou ao executado senão, com a constituição do novo mandatário, ora signatário, vir reclamar das irregularidades cometidas, só passíveis de serem efetuadas por mandatário judicial, dada a obrigatoriedade de constituição de advogado (artigo 40º, nº 1 do C.P.C.).
9. Assim, resulta evidente que a irregularidade cometida pela Senhora Agente de Execução nas notificações e anúncios da venda em leilão eletrónico dos imóveis penhorados produz uma nulidade secundária porquanto pode influir e influiu no exame e na decisão da causa.
10. Com efeito, tal irregularidade permitiu que houvesse licitações posteriores à hora designada para o encerramento do leilão nos valores de € 6.850,00 e € 15.350,00 quando, a serem, como deviam, só reconhecidas as propostas apresentadas antes das 10:00 horas desse dia 08/05/2018 para tais leilões, de €4.040,00 e €14.000,00, as mesmas deviam ser rejeitadas por serem inferiores ao valor mínimo, que era de €6.800,00 e €15.300,00, respetivamente.
11. Ao serem rejeitadas tais propostas, como devem, e consequentemente ser anulado o respetivo leilão, tem o executado possibilidade de, antes de designado novo leilão, ou outra modalidade de venda, proceder ao pagamento da quantia exequenda ao exequente, com extinção da execução.
12. Ao julgar diversamente, a Meritíssima Juiz violou, por erro de interpretação e aplicação as normas constantes do nº 3 do artigo 817º, aplicável por força do nº 2 do artigo 837º, ambos do C. P. C., do nº 2 do artigo 835º, ex vi nº 3 do artigo 837º, também do C. P. C., bem como o artigo 157º, nº 6 do C. P. C., aplicável por força do nº 1 do artigo 162º da Lei nº 154/2015, de 14 de Setembro, e nºs 1 e 2 do artigo 195º, ainda do C. P. C., e artigo 22º da Portaria nº 282/2013, de 29 de Agosto, e artigo 7º, nº 1, alíneas a) e b) do Despacho Ministerial nº 1264/2015 de 09/11/2015.

Não houve contra-alegações.

Cumpre decidir.

Com interesse para a decisão do recurso consideram-se assentes os seguintes factos:
1. O leilão dos bens imóveis em venda nestes autos, identificados pelos nºs LO........., LO........., LO......... e LO........., teve início no dia 22.3.2018 até às 11:00horas do dia 8.5.2018.
2. Nas notificações efetuadas às partes, ficou mencionado que o leilão encerraria às 10:00horas, contudo, é também mencionado que o interveniente poderia acompanhar o leilão electrónico no respectivo link, do qual constava que o leilão encerraria às 11:00horas.
a. Link: https://e-leiloes.pt/info.aspx?lo=LO.........
b. Link: https://e-leiloes.pt/info.aspx?lo=LO.........
c. Link: https://e-leiloes.pt/info.aspx?lo=LO.........
d. Link: https://e-leiloes.pt/info.aspx?lo=LO.........
3. Dos 4 imóveis em venda apenas 2 tiveram propostas de valor superior ao mínimo fixado, apresentadas às 10:04h e 10:05h, ambas pelo mesmo proponente vencedor do leilão, D....
4. Todas as outras propostas apresentadas foram inferiores ao valor mínimo fixado.
5. Os executados foram notificados do resultado do leilão em 9.5.2018.
6. O proponente vencedor, D..., foi também notificado na referida data para proceder ao depósito do preço, bem como comprovar a liquidação das obrigações fiscais, o que fez em 10.5.2018, tendo sido emitido o respetivo título de transmissão e feito o respectivo registo de aquisição a seu favor.
7. O mandatário do executado, Dr. E..., faleceu em 8.5.2018, tendo aquele junto procuração a favor do atual mandatário em 16.5.2018.

São apenas as questões suscitadas pelos recorrentes e sumariadas nas respetivas conclusões que o tribunal de recurso tem de apreciar – artigos 635º, nº 4 e 639º, nº 1, do novo C.P.C.
A questão a decidir consiste em saber se a discrepância entre a hora que consta da notificação efetuada às partes e aquela que foi anunciada nas páginas do leilão eletrónico provoca a nulidade deste.

I. O artigo 811º, nº 1, alínea g), do C.P.C., prevê a venda em leilão eletrónico, sendo que o nº 1 do artigo 837º do mesmo diploma institui tal modalidade como a preferencial quando esteja em causa a venda de bens móveis ou imóveis penhorados.
Nos artigos 20º a 26º da Portaria nº 282/2013, de 29 de agosto, encontram-se regulamentados os termos da venda em leilão eletrónico de bens penhorados.
O artigo 20º da citada Portaria nº 282/2013 prevê que o leilão eletrónico se processa em plataforma eletrónica acessível na Internet, nos termos definidos na presente portaria e nas regras do sistema que venham a ser aprovadas pela entidade gestora da plataforma e homologadas pelo membro do Governo responsável pela área da justiça.
O Despacho 12.624/2015, publicado no DR, II Série, de 9.11.2015, veio definir como entidade gestora da plataforma de leilão eletrónico a Câmara dos Solicitadores e homologar as regras do sistema aprovadas por essa entidade.
O artigo 22º da Portaria nº 282/2013 regula sobre a duração do leilão, estabelecendo que o dia e a hora de abertura e de termo de cada leilão eletrónico são estabelecidos pela entidade gestora da plataforma eletrónica, sendo tais prazos divulgados na mesma plataforma.
O nº 2 do citado artigo 837º do C.P.C. estabelece que a publicidade da venda em leilão eletrónico é feita, com as devidas adaptações, nos termos dos nºs 2 a 4 do artigo 817º.
No entanto, é o artigo 6º do Despacho 12.624/2015 que define as regras aplicáveis a este tipo de venda, prescrevendo que os leilões são publicados na plataforma www.e-leilões. pt. Pode proceder-se à publicitação noutros sítios da Internet, na imprensa escrita e através de correio eletrónico ou através de outros meios que o AE entenda relevantes.
Deve entender-se que a publicitação da venda em leilão eletrónico na plataforma www.e-leilões é obrigatória, sendo as outras formas de publicidade empreendidas pelo AE meramente facultativas.
O leilão em causa, como consta dos factos assentes, foi publicitado na respetiva plataforma (link: https://e-leiloes.pt/info.aspx?lo), da qual constava que o mesmo encerraria às 11:00horas e, neste sentido, foi cumprida a regra obrigatória imposta no artigo 6º do Despacho 12.624/2015. As duas propostas de valor superior ao valor mínimo fixado foram apresentadas às 10:04h e 10:05h e, portanto, antes da hora anunciada para o encerramento.
Não há, pois, qualquer irregularidade do leilão, tendo este sido concretizado em conformidade com a regra obrigatória imposta no artigo 6º do Despacho 12.624/2015.
Mas, existe uma discrepância entre a hora de encerramento que consta da notificação efetuada às partes (10:00horas) e aquela que foi anunciada nas páginas do leilão eletrónico (11:00horas).
Aquela discrepância consubstancia, de facto, uma irregularidade, mas que, além de se encontrar sanada, não influenciou o resultado do leilão.
A única pessoa que licitou acima do valor mínimo – D... – não foi, sequer, notificada e o executado, que não apresentou qualquer proposta, não viu qualquer direito próprio ser preterido. Os bens imóveis foram vendidos pelo valor base com o qual se conformou, na modalidade que não sofreu oposição e dentro da hora que foi publicitado na respetiva plataforma (link: https://e-leiloes.pt/info.aspx?lo).
A isto acresce que a notificação da qual o executado agora se queixa por conter um erro na hora de encerramento do leilão foi concretizada em 22.3.2018, mais de um mês antes do falecimento do seu anterior mandatário – 8.5.2018 –, sendo que tal erro, no nosso entendimento, simples erro de escrita, era revelado do contexto da mesma notificação, uma vez que aí se mencionava a possibilidade do interveniente poder acompanhar o leilão eletrónico no respetivo link, do qual constava a hora correta (11:00horas).
Sobre o erro da hora do encerramento do leilão, assim revelado do contexto da notificação, o executado, através do seu mandatário, nada disse e, portanto, a irregularidade arguida, como se referiu, além de se encontrar sanada, não influenciou o resultado do leilão.
Improcede, deste modo, o recurso do executado C....

Decisão:
Pelos fundamentos expostos, acordam os Juízes desta secção cível em julgar improcedente a apelação e, consequentemente confirmar a decisão recorrida.

Custas pelo apelante.

Sumário:
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Porto, 8.3.2019
Augusto de Carvalho
Carlos Gil
Carlos Querido