Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
276/17.4PFMTS-A.P1
Nº Convencional: JTRP000
Relator: PAULO COSTA
Descritores: PENA DE PRISÃO
REGIME DE PERMANÊNCIA NA HABITAÇÃO
TRABALHO NORMAL
AUTORIZAÇÃO JUDICIAL
COMPETÊNCIA DO TEP
Nº do Documento: RP20190710276/17.4PFMTS-A.P1
Data do Acordão: 07/10/2019
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: RECURSO PENAL (CONFERÊNCIA)
Decisão: PROVIDO O RECURSO DO MINISTÉRIO PÚBLICO
Indicações Eventuais: 1ª SECÇÃO (LIVRO DE REGISTOS Nº 32/2019, FLS 3-11)
Área Temática: .
Sumário: I – A pena de prisão cumprida em regime de permanência na habitação é, como o nome indica, uma pena privativa de liberdade.
II – Uma vez proferida a sentença fica esgotado o poder jurisdicional do juiz.
II – Compete ao Juiz do TEP decidir de uma requerida autorização de trabalho, que não esteja fixada na sentença condenatória, estando o condenado a cumprir pena de regime de permanência na habitação.
Reclamações:
Decisão Texto Integral: Processo n.º 276/17.4PFMTS-A.P1
Acórdão julgado em conferência, na 1ª secção criminal do Tribunal da Relação do Porto:

1). Relatório.
M.P., não se conformando com o douto despacho proferido a 29 de março de 2019 no Tribunal Judicial da Comarca do Porto- Juízo Local Criminal de Matosinhos-Juiz 3, que autorizou o arguido a ausentar-se da sua residência para trabalhar como barbeiro, interpôs recurso.

Em síntese alega que:
“- CONCLUSÕES
1- Por despacho proferido nestes autos a 12112/2018 e transitado em julgado a 04/02/2019, foi determinado, na sequência da revogação da suspensão de tal pena, o cumprimento da pena de prisão de 8 (oito) meses, em regime de permanência na habitação por igual período, com vigilância eletrónica, sem qualquer referência ou previsão sobre eventuais autorizações a que se refere o art.43º, nº3 do Código Penal- v. fls.113, 114 e 130.
2- Decorrido o trânsito e depois de ter visto indeferido igual pretensão junto do T.E.P., veio o arguido B… requerer junto deste Tribunal (nem que para tal se passasse a fazer constar a autorização de ausência no despacho inicial, com recurso à figura ela correção da sentença) "autorização para se ausentar da sua habitação, regularmente, de segunda a quinta-feira, inclusive, entre as 09h e as 21 h para trabalhar, na sua barbearia (...)", durante o cumprimento ela referida pena, o que lhe veio a ser concedida por despacho datado de 29/03/2019, de que ora se recorre.
3-Com efeito, enquadrando-se tal requerimento no âmbito de uma questão incidental suscitada pelo arguido, após o trânsito em julgado da decisão que o determinou e já no decurso da execução da pena de prisão, em RPH, impõe-se concluir, da análise do art.470º, n.°1 do CPP e dos arts.138º, n º s 2 e 4, alínea l), 222.º-B e 222.°- C do Código da Execução das Penas e Medidas Privativas da Liberdade que a sua apreciação cai na esfera da competência material do Tribunal de Execução das Penas.
4- Conforme Acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 07/03/2019 _ que então conheceu de conflito negativo de competência e desta forma concluiu _ proferido no processo n.º366/l 8.6PFMTS-A.P1 "o legislador quis, de forma inequívoca, por um lado, que a intervenção do tribunal da condenação cesse com o trânsito em julgado da sentença que condenou o agente em pena privativa de liberdade; e, por outro, que no Tribunal de Execução das Penas se organize “um processo único" no qual se decidam todos os incidentes relativos à execução da pena".
5-0ra, ao se ter conhecido do requerido neste processado, para mais nos termos em que se fez, o despacho em causa e de que ora se recorre, para além de ter ignorado decisão judicial anterior proferida por quem era competente _ como aliás no próprio despacho contraditoriamente se consignou para o efeito - violou as regras de competência material do tribunal o que e como vimos configura a nulidade insanável prevista no artigo 119.°, alínea e) do Código de Processo Penal, que pode ser declarada a todo o tempo.
6- Terá, assim, de ser declarado nulo o douto despacho ora recorrido, devendo ser substituído por outro que decline conhecer da autorização requerida por não ter materialmente competência para tal e por não estarmos em presença de qualquer situação suscetível de ser enquadrada na figura da correção da sentença _ cfr. art.380º, n.º 1, al. b) do Código de Processo Penal.”
O arguido respondeu dizendo:
“CONCLUSÕES
1. Veio o Ministério Público apresentar recurso do despacho proferido a 29/03/2019, que autorizou o arguido a ausentar-se da sua residência para exercício da sua atividade profissional, o que fez por considerar que foram violadas as regras de competência material do tribunal, o que gera uma nulidade insanável, nos termos do artigo 119º, alínea e) do CP.
2. Nessa sequência, considera o Ministério Público ser o Tribunal de execuções de penas o tribunal competente para decidir a questão objeto de recurso, ao invés, entende o arguido ser o tribunal da condenação o competente.
3. Conforme acórdão de 03-10-2018, proferido pelo Tribunal da Relação do Porto, no âmbito do processo nº 8193/14.3TDPRT.Pl é o tribunal de 1ª instância que revogou a suspensão da execução da pena de prisão inicialmente aplicada que averigua a verificação dos pressupostos de aplicação do regime de permanência na habitação, nomeadamente se através do mesmo se realiza de forma adequada e suficiente as finalidades da execução da pena de prisão.
4. Ou seja, é o tribunal da condenação a única instância capaz de avaliar a adequação do regime de permanência na habitação com as finalidades de execução da pena.
5. Por conseguinte, a ausência do arguido da habitação para exercício da sua atividade profissional interfere com as finalidades da execução da pena e, portanto, tendo que ver como a essência e modo de execução da pena aplicada, deve ser decidida pelo tribunal da condenação, conforme o estipulado no artigo 44º do Código Penal, doravante CP.
6. A acrescer a designação do Tribunal de Execuções das Penas, doravante TEP, aponta para a sua função única de acompanhamento da execução da pena anteriormente determinada pelo Tribunal da Condenação.
7. Daí que de acordo com a lei penal (Código da Execuções das Penas e das Medidas Privativas da Liberdade e Código Penal) o TEP apenas tenha competência para decidir sobre autorizações de ausência de habitação que sejam excecionais.
8. Foi nesse sentido que o TEP indeferiu o requerimento do arguido a solicitar autorização para se ausentar da habitação para exercer atividade profissional, pois conforme transcrevemos, “(...) a autorização de ausência em causa, pelo seu carácter duradouro, repetível e permanente, teria de ter sido fixada e caso se mostrasse adequado, na sentença, pelo tribunal da condenação - v. fls.153 a 155."
9. Além de que, a competência do tribunal da condenação mantém-se mesmo depois de aplicada a pena de prisão em regime de permanência na habitação, pois que é o próprio CPP que admite a decisão de diversas questões depois da sentença, e portanto, depois do trânsito em julgado, o que sucede nomeadamente com a autorização de pagamento da pena de multa em prestações.
10. Depois, sempre as sentenças podem ser corrigidas nos termos do artigo 380º do Código Processo Penal, doravante CPP, o que pode ir ao encontro do pretendido pelo douto tribunal, pois que em sede de audição do arguido nos termos do artigo 495º CPP foi referido o exercício de atividade profissional, o que se crê ter sido pressuposto de aplicação do regime da permanência na habitação.
11. Sem prescindir, por cautela de patrocínio, caso assim não se entenda, a ser o despacho recorrido declarado nulo, sempre deverá o mesmo ser substituído por outro que ordene o envio do requerimento do arguido ao TEP, para que perante toda esta factualidade superveniente tome posição.
12.A admitir-se que é revogado o despacho proferido, existirá conflito negativo de competência e ficará o arguido sem exercer a sua atividade profissional, colocando-se em causa as finalidades da pena.
13. Por outro lado, de acordo com o artigo 40º, nº1 CP, a aplicação da pena visa a reintegração do agente na sociedade e sem dúvida que o exercício de uma atividade profissional é o mais fundamental fator de reintegração social.
14.Em consequência, revogar o despacho proferido no qual o arguido foi autorizado a trabalhar e não permitir que o TEP se pronuncie, face a todo o exposto, não só é negar ao arguido a sua vontade em reintegra-se, como subverter as finalidades da pena e da justiça penal e premiar a inércia dos arguidos, devendo, portanto, o despacho recorrido ser confirmado, em consonância com a lei penal.

O arguido pronunciou-se ao abrigo do 417º, n º 2 do CPP.

O Ministério Público junto desta instância emitiu douto parecer, pugnando pelo provimento do recurso.

Cumprido o ar. 417, nº2º do CPP, nada de relevante se anunciou no processo.

Colhidos os vistos legais, foram os autos à conferência, cumprindo agora decidir.

Objeto.

Saber se a Juíza a quo podia ter decidido a autorização de ausência de casa para trabalho, que não esteja fixada na sentença condenatória, estando o condenado a cumprir pena de regime de permanência na habitação quer pelo lado da competência quer pelo lado do caso julgado.

Cumpre apreciar.
2). Fundamentação.
2.1). De facto.
1. Decisão proferida pela Srº juíza a quo:
“CONCLUSÃO - 29-03-2019
(Termo eletrónico elaborado por Escrivão de Direito C…)
=CLS=
Não obstante as doutas considerações do despacho emanando pelo TEP e pelo Ministério Público nestes autos, não se vê que o art. o 138 I) do CEP distinga entre ausências excepcionais ou duradouras nem que a previsão do art." 43 n.º 3 Código Penal impeça o TEP de autorizar saídas regulares que não tenha sido mencionadas pelo tribunal da condenação.
E foi nesse pressuposto que o despacho de fls. 114 foi proferido.
Assim, e pese embora a discutibilidade jurídica do que se vai decidir, considera-se que o arguido não deve ser prejudicado e impedido de trabalhar, quando já o vem fazendo em outros processo em que cumpre pena de forma semelhante, como resulta dos autos.
Assim sendo, autoriza-se o arguido a ausentar-se da sua residência para trabalhar como barbeiro, nos termos requeridos a fls. 164 ou por outra forma ou com outro horário que melhor venha a ser considerado pelo TEP - art. 44 nº 1 Código Penal.
Notifique
Comunique ao TEP
Matosinhos, d.s.”
2.Promoção, anterior àquele despacho, do M.P.
“O arguido B… foi condenado nestes autos, por douta sentença do Juízo Local Criminal de Matosinhos (Juiz 3), do Tribunal Judicial da Comarca do Porto, proferida em 31/07/2O17 e transitada em julgado em 02/l 0/2017, numa pena de Prisão de 08 meses de prisão suspensa na sua execução pelo período de um ano- v. ata de fls.44 a 47.
Tal Suspensão da execução da pena de prisão veio a ser revogada, por despacho proferido a 12/12/2018 e transitado cm julgado a 04/02/2019, aí se determinando o cumprimento da pena de prisão de 8 (oito) meses em regime de permanência na habitação (doravante também RPH) por igual período, com vigilância eletrónica _ v. fls. 113, 114 e 130.
A fls.164 veio o arguido B… requerer a este tribunal da condenação "a autorização para se ausentar da sua habitação, regularmente, de segunda a quinta-feira, inclusive, entre as 09h e as 21 h para trabalhar, na sua barbearia (...)".
Para n efeito e para o que ora interessa, alegou que já havia apresentado igual pretensão junto do Tribunal de Execução de Penas (doravante também TEP), tendo este decidido e alegadamente, não ser o competente para a pretendida decisão e que, se bem compreendemos, caso tal autorização não possa ser nesta fase concedida, se recorra à figura da correção da sentença para fazer constar no despacho de fls. 113 e 114 a referida autorização.
A fls. 153 -155 mostra -se junta aos autos a decisão de indeferimento proferido pelo TEP que recaiu sobre o requerimento que de idêntico teor ao neste sede versado foi nesse âmbito apresentado.
Ora, impõe-se-nos, assim, pronunciarmo-nos sobre a pretensão aduzida.
Com efeito, importa ter como premissa assente, como aliás já acima fomos adiantando, que o despacho que revogou a suspensão da pena e que determinou o cumprimento da pena de prisão nos termos em que a mesma se mostra a ser executada, foi objeto de conformação do arguido (que não reagiu processualmente), tendo esta transitado em julgado e assim se consolidado na ordem jurídica.
Dito isto e numa abordagem de contexto, diga-se, com pertinência, que estamos em crer que o requerido enquadrar-se-á no âmbito de uma questão incidental suscitada pelo arguido já no decurso da execução da pena de prisão, em regime de permanência na habitação, o que logo nos remete e se bem vemos, para o que estatui o disposto no nº 1 do art.470º do Código de Processo Penal, que dispõe que "A execução corre nos próprios autos perante o presidente do tribunal de 1ª instância em que o processo tiver corrido, sem prejuízo do disposto no art. 138º do Código de Execução de Penas e Medidas Privativas da Liberdade” (doravante CEP).

Ora, a competência material do TEP é estabelecida no artigo 138.° daquele Código da Execução das Penas e Medidas Privativas da Liberdade, constando dos seus nºs 2 e 4, alínea l)1, que:
"2.Após o trânsito em julgado da sentença que determinou a aplicação de pena ou medida privativa da liberdade, compete ao tribunal de execução das penas acompanhar e fiscalizar a respetiva execução e decidir do sua modificação, substituição sem prejuízo do disposto no artigo 371.º-A do Código de Processo Penal.
(...)
4. Sem prejuízo de outras disposições legais, compete aos tribunais de execução das penas, em razão da matéria (...)
l) Decidir sobre a homologação do plano de reinserção social e das respetivas alterações, as autorizações de ausência, a modificação das regras de conduta e a revogação do regime, quando a pena de prisão seja executada em regime de permanência na habitação;".
Do teor do preceituado, inclinamo-nos decisivamente para o entendimento de que a execução da pena de prisão em regime de permanência na habitação (prevista nos arts.43º e 44.° do Código Penal) e a apreciação dos incidentes/requerimentos nesse âmbito formulados caiem na esfera da competência material do Tribunal de Execução das Penas.
Assim assumido, importa recuperar e enquadrar, porque potencial foco de equívocos e porque aparentemente em conflito com o ora exposto relativamente à competência material, o teor do requerimento do arguido na parte em que se sugere, mesmo admitindo que involuntariamente, que o TEP terá declinado competência para a pretendida decisão.
De facto e se bem vemos, ao contrário do que se possa sugerir, da análise do teor da douta decisão do TEP junta a fls.153-155 dos autos, não resulta que o mesmo se tenha declarado incompetente para conhecer do requerido, mas tão-somente que o pedido formulado – que de forma aprofundada foi objeto de análise e decisão - não poderia ser deferido por ausência de suporte legal, uma vez que a autorização de ausência em causa, pelo seu carater duradouro, repetível e permanente, teria de ter sido fixada e caso se mostrasse adequado, na sentença, pelo tribunal da condenação. --
Na verdade, assim e aí se concluiu, com o argumento que aqui se segue de perto, de que ao TEP cabe acompanhar a execução de uma pena fixada por um título emanado de um outro tribunal competente, não cabendo modificar a essência da pena aplicada pelo tribunal da condenação.
Com interesse e na concretização da competência do art.138º do CEP acima referida, o douto despacho proferido pelo TEP a que temos vindo a fazer referência, esclareceu resumidamente que, na conjugação do disposto nos arts.43º, n.3, 44.°, nº1 do Código Penal e 202.°-B, e 202.º-C do CEP na redação dada pela Lei n.º94/2017, ao TEP apenas é possível e neste âmbito conceder/determinar:
- autorização de ausência da habitação que sejam tidas por excecionais e urgentes no decurso da execução do RPH e que por isso, não devam ter sido fixadas na sentença;
- modificação da autorização de ausência, quando previamente determinada na sentença do tribunal da condenação nos termos do art.43.º, n.º3 do Código Penal.
A este respeito e conforme bem se referiu no despacho em análise, que pela sua relevância argumentativa ousamos transcrever, "A não se entender assim a lei, atribuindo-se ao TEP a possibilidade de contrariar o cerne do decidido pelo tribunal da condenação no sua sentença, não só se estaria a permitir uma modificação da essência da pena (o que é diferente da modificação da execução da pena, no especifico caso apenas ao nível da modificação das autorizações de ausência), como se chocaria de frente com o própria limitação do art.222º-C do CEP, que pressupõe que as autorizações de ausência a modificar tenham sido previamente, no dizer da norma do seu nº 1, "determinadas na sentença que tiver decretado a execução da pena de prisão em regime de permanência na habitação",
Por outras palavras, ao permitirmos a determinação pelo TEP e ex-novo, de uma autorização com a índole duradoura e permanente como aquela que se apresenta requerida, ao abrigo das normas em apreço e nesta fase, não só alteraríamos a essência do cumprimento de pena fixada por quem tinha competência para o efeito, que não a quis prever, como criaríamos autorizações de ausência imodificáveis, porquanto só as determinadas na sentença se mostram abrangidas pelo texto do art.202º-C do CEP, como ainda se deixava sem resposta a questão simples que nos ocorre, a de como se modifica uma autorização de ausência, se nenhuma autorização determinada há para se modificar?
Aqui chegados e sensibilizados para a ausência de suporte legal que determinou o indeferimento do requerido junto do TEP, impõe-se-nos perceber se este tribunal da condenação pode conhecer do pedido e se o conhecendo por mera hipótese académica, o pode deferir, como pretende o arguido.
Ora, abreviando caminho, a resposta às duas questões em apreço apresenta-se para ambas de sentido negativo.
A este respeito, importará desde logo recolocar na presente promoção o já acima aflorado relativamente à competência do Tribunal de Execução de Penas no "acompanhamento" da execução da pena de prisão em RPH aplicada nestes autos por decisão transitada em julgado.
Não obstante, mesmo que assim não se entenda, é precisamente o trânsito em julgado da decisão que se pretende ver modificada nesta fase, com aditamentos de essência, que também obstaculiza de forma irreversível e quanto a nós, que o requerido possa merecer acolhimento neste processado.
Na verdade, dizer-se, sem mais, que a autorização de ausência requerida está dentro da esfera de competência do tribunal da condenação não corresponde necessariamente à afirmação de que essa competência pode ser exercida a todo tempo e sem qualquer limite temporal, como parece pretender o ora arguido, por esse mesmo tribunal.
Por seu lado, sempre se diga, que teve o arguido ampla oportunidade em se pronunciar relativamente à revogação da suspensão da pena de prisão e ao modo, na sua eventualidade, como se poderia processar o seu cumprimento, sem que em nenhuma ocasião, como lhe competia, manifestou interesse ou vontade em que a mesma prevê-se qualquer autorização de ausência da sua habitação para efeitos laborais, cfr. fls. 103, 104, 106, 111 e 112.
Aqui chegados, não vemos como se possa abrir uma exceção ao trânsito em julgado da decisão que determinou, nos moldes que se encontram estabelecidos, o cumprimento da pena de prisão em execução pelo arguido, tanto mais que não se vislumbra nenhuma situação de facto enquadrável nos casos previstos do art.449º do Código de Processo Penal.
Ademais, diga-se, também não vemos como se possa enquadrar a pretensão do arguido em análise no âmbito do art.44.º do Código Penal, na medida em que, em coerência aliás com o que acima deixamos dito relativamente ao disposto no art.202º-C do CEP, a disposição é clara quando refere que "As autorizações de ausência e as regras de conduta podem ser modificadas até ao termo da pena sempre que ocorrerem circunstâncias relevantes supervenientes ou de que o tribunal só posteriormente tiver tido conhecimento" _ realce nosso. Não constando, o que se estranha se fosse essa a vontade do legislador, que as mesmas podem ser "fixadas",
Por sua vez, também estamos em crer, que esta última norma do Código Penal citada não poderá deixar de ser lida em conjugação com as disposições dos arts.202.º-C do CEP e 7.°, n.º4, da Lei nº33/2010, que expressamente fazem alusão à sentença, como o momento da fixação de uma autorização de ausência com o cariz daquela que se pretende ver deferida.
Com curiosidade, veja-se que o próprio teor do requerimento a que ora se responde parece ser sensível à figura da consolidação da sentença, daí que deixe em aberto, a figura da correção da sentença, para que possa fazer incluir no despacho que determinou o cumprimento da pena de prisão pelo arguido, a autorização de ausência que ora pretende deferida.
Sucede que e sem grandes delongas, a figura da correção da sentença, prevista no art.380.º do Código de Processo Penal é um remédio apenas para a correção de erros, lapsos, obscuridades ou ambiguidades que não importem a modificação, o que sucederia caso fossemos sensíveis a tal pretensão, essencial da decisão - cfr. art.380.º, nº1, al.b) do Código Penal.
Atento tudo o que fixou exposto e pelos motivos aduzidos, promove-se que se indefira o requerido.”
3.Decisão de revogação da suspensão da execução da pena de prisão.
“CONCLUSÃO - 12-12-2018

Por sentença transitada em julgado em 02.10.2017 foi o arguido B… condenado na pena de 8 meses de prisão, Suspensa na execução por 1 ano, pela prática de crime de condução sem habilitação legal.
O período de suspensão terminou em 02.10.2018
Do CRC constante dos autos e certidão de fls. 90 resulta que, durante o período de suspensão de execução da pena, cometeu o arguido o seguinte crime:

- Condução sem habilitação legal, perpetrado em 16 de Abril de 2018, tendo sido condenado na pena de 8 meses de prisão, a cumprir em regime de permanência na habitação (proc. 118118.3PFMTS).
Mais resulta que na data em que cometeu o crime descrito já havia o arguido praticado 8 crimes anteriores, 3 deles de condução sem habilitação legal e 2 de condução em estado de embriaguez.
Mais resulta da sentença constante de fls., 90 que o arguido não formula juízo crítico, em concreto, para a sua conduta

Do exposto resulta que o arguido desprezou, completamente, a oportunidade que lhe foi dada e infirmou o juízo de prognose favorável oportunamente formulado.

De facto persistiu em manter a sua atitude de desrespeito pelas normas sociais, em manter a mesma conduta criminosa, praticando o mesmo tipo de crime, não obstante ter sido por ele condenado antes várias vezes e bem saber o significado da suspensão de execução da pena de prisão aplicada. Tudo isso o arguido ignorou, continuando a conduzir sem o poder fazer, mantendo a ausência de juízo critico para a sua conduta, não demonstrando esforço para se integrar na sociedade, deixando de delinquir, não obstante, como resulta ainda da sentença supra referida, provir de ambiente familiar afectuoso, o que se mantém até ao presente, e ter sido um bom estudante (concluiu o 12.0 ano, denotando boa capacidade de aprendizagem).
Constata-se, pois, que o arguido não deixa de delinquir, não por falta de apoio ou de capacidade, mas de vontade.
Assim, conclui-se que as finalidades que estiveram na base da suspensão da execução da pena se mostram definitivamente comprometidas, impondo-se a revogação da suspensão da execução da pena de prisão aqui aplicada.

Nesta conformidade, revogo a suspensão da execução da pena de prisão e determino cumprimento, pelo arguido, dos 8 meses de prisão aplicados nestes autos (art.? 56 nº I b) Código Penal)

Uma vez que o arguido nisso consentiu, e caso se reúnam as demais condições (técnicas e outras autorizações), considera-se que a pena de prisão pode ser eficazmente cumprida através de obrigação de permanência na habitação, nos termos do disposto no art.º 43º n.º 1 c) Código Penal, o que se determina
Notifique
Após trânsito em julgado comunique a decisão ao TEP e à equipa da Vigilância Electrónica.
Matosinhos, d.s

4.Dispositivo da decisão do TEP.
“Deste modo, não pode o TEP enquadrar o peticionado pelo condenado como uma situação de autorização de ausência enquadrável na previsão do art. 222.0_ B do CEP, tal como não o pode fazer pela via do art. 222.o-C, igualmente do CEP, entendendo-o como uma modificação de uma autorização, pois nenhuma existe (no âmbito do processo nº 276/17.4PFMTS, cuja pena está agora em execução e ao contrário do que sucedia no âmbito do processo n° 118/18.3PFMTS, cujo cumprimento da pena já terminou), acrescendo inexistir permissão legal para aplicação de regime de progressividade.
Pelo exposto, por ausência de suporte legal, indefiro o requerimento apresentado. Notifique e comunique ao processo da condenação.”

2.2). De direito.
A questão em análise que importa decidir está bem refletida no despacho ora recorrido bem como no teor das alegações de recurso pelo que não há que repetir nesta sede o que tribunal recorrido e recorrente tão claramente expõem.

O âmbito do recurso é delimitado pelas conclusões extraídas pelo recorrente da respetiva motivação, sendo apenas as questões aí sumariadas as que o tribunal de recurso tem de apreciar, o que decorre desde logo desde logo, duma interpretação conjugada do disposto no nº 1 do artigo 412º e nos nºs 3 e 4 do artigo 417º do CP.P., sem prejuízo das de conhecimento oficioso.

A função do tribunal de recurso perante o objeto do mesmo, quando possa conhecer do mérito, é assim a de proferir decisão que dê resposta cabal a todo o thema decidendum que foi colocado á apreciação do tribunal ad quem, mediante a formulação de um juízo de mérito.

Comecemos pela questão da competência material.

A competência dos tribunais - enquanto pressuposto processual é a medida da sua jurisdição e o modo pelo qual se fraciona e reparte o poder jurisdicional que, tomado em bloco, pertence ao conjunto dos tribunais.
A nível doutrinário, a competência é classificada em sentido abstrato e concreto, considerando-se a primeira como a medida da jurisdição e cada tribunal, ou seja, a fração do poder jurisdicional atribuída a determinado tribunal ou a determinação das causas que lhe cabem e a competência sentido concreto, como o poder do tribunal julgar determinada ação, traduzindo-se no facto desta caber dentro da esfera de jurisdição abstrata do tribunal. 3
Assim, a incompetência será a "insusceptibilidade de um tribunal apreciar determinada causa que decorre da circunstância dos critérios determinativos da competência não lhe concederem a medida da jurisdição suficiente para essa apreciação” in Teixeira de Sousa, in Estudos Sobre o Novo Processo Civil, 2.ª edição, Lex-Edições Jurídicas, pág. 128.
No plano interno, o poder jurisdicional divide-se por diferentes categorias de tribunais, de acordo com a natureza das matérias em causa. A competência em razão da matéria atribui-se, deste modo, ar diferentes espécies ou categorias de tribunais que se situam no mesmo plano horizontal sem nenhuma relação de hierarquia, subordinação ou dependência entre eles.
Na base da competência em razão da matéria está o princípio da especialização, com o reconhecimento da vantagem de reservar para órgãos judiciários diferenciados o conhecimento de certos sectores do Direito, pela vastidão e pela especificidade das normas que os integram.
A competência judiciária em razão da matéria é de ordem pública e só pode decorrer da lei, estabelecendo-se em função da natureza da matéria sub judice e atribuindo-se ao tribunal que estiver mais vocacionado para dela conhecer, com vista à melhor prestação da qualidade da justiça. Reveste-se, tal definição de um interesse público fundamental, pelo que a preterição num determinado ato, das regras que a determinam e tendo presente o caso deste processado, é sancionada com a nulidade insanável que decorre expressamente do art.119.º, alínea e) do Código de Processo Penal.
Ora, numa primeira aproximação ao caso dos autos, importa ter como premissa assente, como aliás já acima fomos adiantando, que o despacho que revogou a suspensão da pena e que determinou o cumprimento da pena de prisão nos termos em que a mesma se mostra a ser executada, foi objeto de conformação do arguido (que não reagiu processualmente), tendo esta transitado em julgado e assim se consolidado na ordem jurídica.
Dito isto e numa abordagem de contexto, importa assinalar que o requerido enquadrar-se-á no âmbito de uma questão incidental suscitada pelo arguido já no decurso da execução da pena de prisão, em regime de permanência na habitação, o que logo nos remete e se bem vemos, para o que estatui o disposto no n.º1 do art.470.º do Código de Processo Penal, que dispõe que "A execução corre nos próprios autos perante o presidente do tribunal de 1ª instância em que o processo tiver corrido, sem prejuízo do disposto no artigo 38º do Código da Execução de Penas e Medidas Privativas da Liberdade" (doravante também CEPMPL).
Ora, a competência material do TEP é estabelecida no artigo 138.º daquele CEPMPL, constando dos seus n.ºs 2 e 4, alínea l, que:
''2.Após o trânsito em julgado da sentença que determinou a aplicação de pena ou medida privativa da liberdade, compete ao tribunal de execução das penas acompanhar e fiscalizar a respetiva execução e decidir da sua modificação, substituição e extinção, sem prejuízo do disposto no artigo 371º-A do Código de Processo Penal.
(…)
4. Sem prejuízo de outras disposições legais, compete aos tribunais de execução das penas, em razão da matéria: (...)
l) Decidir sobre a homologação do plano de reinserção social e das respetivas alterações, as autorizações de ausência, a modificação das regras de conduta e a revogação do regime, quando a pena de prisão seja executada em regime de permanência na habitação;
Do teor conjugado e da análise do texto dos preceitos descritos, impõe-se concluir que o acompanhamento da execução da pena de prisão em regime de permanência na habitação (prevista nos al.s.43º e 44.° do Código Penal) e a apreciação dos incidentes/requerimentos nesse âmbito formulados caiem na esfera da competência material do Tribunal de Execução das Penas.
Tal conclusão também se extrai com especial interesse face à concreta natureza daquilo que foi requerido pelo arguido neste processado- do conteúdo dos art.222º- B e 222º-C aditados ao CEPMPL pela Lei nº94/2017, de 27 de Agosto, ambos insertos no Capitulo IX sob a epígrafe "Regime de permanência na habitação".
Dispõe o nº1 do art. 222.°-B que:
"1 - As autorizações de ausência da habitação da competência do juiz são decididas por despacho, mediante parecer do Ministério Público.
2 - O juiz pode solicitar aos serviços de reinserção, social a informação adicional que entender necessária para a decisão.
3 - A tramitação do pedido de autorização tem natureza urgente, nos termos do artigo 151º.
4 -O despacho é notificado ao condenado e comunicado aos serviços de reinserção social".
Dispõe o art.222º-C, sob a epígrafe Modificação das autorizações de ausência e das regras de conduta" que:
“1 - A modificação das autorizações de ausência e das regras de conduta determinadas na sentença que tiver decretado a execução da pena de prisão em regime de permanência na habitação é decidida por despacho do juiz, depois de recolhida prova das circunstâncias relevantes supervenientes ou de que o tribunal só posteriormente tiver tido conhecimento.
2 - O despacho é precedido de parecer do Ministério Público, de audição do condenado e de informação dos serviços de reinserção social.
3 - O despacho é notificado ao Ministério Público e ao condenado e comunicado aos serviços de reinserção social.”
Aliás e a respeito da competência material, neste âmbito, por parte do TEP, pronunciou-se já o Tribunal da Relação do Porto, no seu recente Acórdão de 07/03/2019, que subscrevemos - que então conheceu de conflito negativo de competência- proferido no processo n.º36611 8.6PFMTS-A.P I, que fazendo, para além do mais, uma cuidada análise dos pontos 15, 17 e 19 da exposição de motivos da Proposta de Lei 252/X que teve na base do CEPMPL, decidiu que compete ao Juiz do TEP decidir de uma requerida autorização de trabalho, que não esteja fixada na Sentença condenatória, estando o condenado a cumprir pena de regime de permanência na habitação, sublinhando que "o legislador quis, de forma inequívoca, por um lado, que o intervenção do tribunal da condenação cesse com o trânsito em julgado da sentença que condenou o agente em pena privativa de liberdade; e, por outro que no Tribunal de Execução das Penas se organize "um processo único" no qual se decidam lodos os incidentes relativos à execução da pena".
A decisão ora recorrida, apresenta, para além do mais, uma contradição implícita entre o que disserta e o que decide. Pois se por um lado afirma que poderia o TEP ter deferido o requerido, reconhecendo-lhe assim competência para de tal conhecer, por outro lado chama a si o ónus da decisão, deferindo o solicitado pelo arguido, como se de uma via "encapotada" de recurso se tratasse.
A este respeito, recordamos que a competência do tribunal da condenação e a competência do tribunal de execução de penas apresentam campos de ação devidamente delimitados, não servindo um e outro para buscas sequenciais de uma decisão que melhor garanta a pretensão requerida, ignorando-se por completo, caso seja necessário, uma eventual decisão judicial anterior proferida noutro sentido.
Ora, é este e se bem vemos, o caso dos autos.
Na verdade, bem ou mal, discutível ou indiscutível quanto aos seus fundamentos, certo é que, no uso das suas competências, o TEP já havia indeferido o agora requerido neste processado, pelo que não vemos como possa agora o despacho recorrido, arrogando-se de uma competência que não têm, contornar tal decisão judicial, fazendo inclusivamente perigar as virtudes do caso julgado, entendido este como sendo um efeito processual que por elementares razões de segurança jurídica impede que o que nela se decidiu seja atacado dentro do mesmo processo ou noutro processo.
Como bem se refere em recente acórdão desta Relação Ac. da RP de 7/03/2018,processo 570/15.9GBVFR-A.P1, in www.dgsi.pt “Com as alterações introduzidas pela Lei nº 94/2017 de 23/8 o regime de permanência na habitação previsto no artº 43º CP passou a constituir não só uma pena de substituição em sentido impróprio, mas também uma forma de execução ou cumprimento da pena de prisão”.
In casu, dúvidas não há que estamos perante uma verdadeira pena de substituição: pena de um ano de prisão, substituída por regime de permanência na habitação.
O Tribunal da condenação, na sentença, pode subordinar a pena ao cumprimento de regras de conduta enumeradas exemplificativamente no n.º 4 do art.º 43º do C. Penal.
É princípio geral do direito o de que, uma vez proferida a sentença, fica esgotado o poder jurisdicional do Juiz. Por isso não pode o Juiz alterar as regras de conduta impostas na sentença.
Sucede que, o n.º 1 do art.º 44º do art.º 44º do C. Penal, vem derrogar tal regra, estatuindo: “As autorizações de ausência e as regras de conduta podem ser modificadas até ao termo da pena sempre que ocorrerem circunstâncias relevantes supervenientes ou de que o tribunal só posteriormente tiver tido conhecimento”.
Ou seja, a lei permite que o Tribunal conceda autorizações de ausência em face de “circunstâncias relevantes supervenientes ou de que o tribunal só posteriormente tiver tido conhecimento”.
A questão que se levanta é precisamente a de saber qual o Tribunal competente para conceder tais autorizações, suscitadas posteriormente à sentença.
A pena de prisão cumprida em regime de permanência na habitação é, como o nome indica, uma pena privativa de liberdade, executada nos termos dos art.ºs 477º e segs. do CPP. Designadamente, “O Ministério Público envia ao Tribunal de Execução das Penas e aos serviços prisionais e de reinserção social, no prazo de cinco dias após o trânsito em julgado, cópia da sentença que aplicar pena privativa da liberdade” – n.º 1 do art.º 477º do CPP. Por seu turno, o TEP organiza “um processo individual único relativo à sua situação processual e prisional, que é aberto ou reaberto no momento do ingresso e o acompanha durante o seu percurso prisional, mesmo em caso de transferência” – n.º 1 do art.º 18º do CEPMPL.
Nos termos do art.º 138º deste Diploma Legal, compete ao TEP, em matéria de execução das penas, “acompanhar e fiscalizar a respectiva execução e decidir da sua modificação, substituição e extinção, sem prejuízo do disposto no artigo 371.º-A do Código de Processo Penal”, o que tem lugar “Após o trânsito em julgado da sentença2 que determinou a aplicação de pena ou medida privativa da liberdade”.
Tendo presente o n.º 1 do art.º 222.º-B e ainda e em coerência com o n.º 1 do art.º 44º do C. Penal, o disposto no art.º 222.º-C, sob a epígrafe “Modificação das autorizações de ausência e das regras de conduta” transcrevemos o teor da decisão sumária proferida pelo Sr Presidente desta 1ª Secção e deste Tribunal da Relação, Acórdão de 07/03/2019, que subscrevemos e por não conseguirmos dizer melhor - que então conheceu de conflito negativo de competência- proferido no processo n.º36611 8.6PFMTS-A.P I,” (…) interpretação literal e sistemática dos preceitos em causa impõe que o requerido pelo condenado tenha de ser decidido pelo TEP, a sua interpretação lógica mais o impõe.
Com efeito, o CEPMPL tem na sua génese a Proposta de Lei 252/X, em cujo ponto 15 da exposição de motivos, se pode ler: “No plano processual e no que se refere à delimitação de competências entre o tribunal que aplicou a medida de efectiva privação da liberdade e o Tribunal de Execução das Penas, a presente proposta de lei atribui exclusivamente ao Tribunal de Execução das Penas a competência para acompanhar e fiscalizar a execução de medidas privativas da liberdade, após o trânsito em julgado da sentença que as aplicou.
Consequentemente, a intervenção do tribunal da condenação cessa com o trânsito em julgado da sentença3 que decretou o ingresso do agente do crime num estabelecimento prisional, a fim de cumprir medida privativa da liberdade. Este um critério simples, inequívoco e operativo de delimitação de competências, que põe termo ao panorama, actualmente existente, de incerteza quanto à repartição de funções entre os dois tribunais e, até, de sobreposição prática das mesmas. Incerteza e sobreposição que em nada favorecem a eficácia do sistema”.
Acrescenta-se no ponto 17 da mesma Proposta de Lei 252/X que “a presente proposta de lei defere ao Tribunal da Execução das Penas não só o controlo das questões estritamente respeitantes à execução (…).
Adita-se no item 19 da mesma exposição de motivos: “A presente proposta de lei optou pela organização, no Tribunal de Execução das Penas, de um processo único para cada recluso, a cujos autos principais (os que deram origem à abertura do processo) são depois apensados todos os demais processos e incidentes. Procurou assegurar-se a unidade de critério decisório, a continuidade do processo de reinserção social e a avaliação do mesmo, através do imediato acesso à «história» integral do recluso, por parte do juiz do Tribunal de Execução das Penas chamado a decidir sobre a sua situação”. Ou seja, o legislador quis, de forma inequívoca, por um lado, que a intervenção do tribunal da condenação cesse com o trânsito em julgado da sentença que condenou o agente em pena privativa de liberdade; e, por outro, que no Tribunal de Execução das Penas se organize “um processo único” no qual se decidam todos os incidentes relativos à execução da pena. Estamos perante um incidente relativo á execução da pena, suscitado pelo Condenado. Destarte, o TEP é o competente para deferir ou indeferir ao requerido.”
O despacho recorrido violou, assim, as regras da competência material do tribunal, o que configura uma nulidade insanável prevista no art. 119º. al.e) do CPP, declarável a todo o tempo.
Atento tudo o que se deixou exposto, declaro nulo o despacho ora recorrido, por não poder conhecer da autorização requerida por não ter materialmente competência para tal e por não estarmos em presença de qualquer situação suscetível de ser enquadrada nas alíneas a) e b) do nº 1 do art.380º do Código de Processo Penal, desde logo porque o despacho proferido a 12/12/2018 e transitado em julgado a 04/02/2019 que determinou o cumprimento da pena de prisão em RPH - nenhuma omissão apresenta, estando a salvo de qualquer erro, lapso, obscuridade ou ambiguidade que importe remediar. Sendo certo que, qualquer alteração da índole pretendida, implicaria sempre a legalmente inadmissível modificação essencial da decisão - cfr. art.380º, nº 1, al. b) do Código Penal.
Afigura-se-nos agora referir o seguinte: A Srª juíza-J3 do TEP ao indeferir a pretensão do arguido, só pode interpretar-se aquela sua exposição como um decisão implícita a excecionar a sua competência material. No fundo decidiu que não tinha competência para decidir o requerido, o que pode ter gerado alguma confusão. Contudo, como a Srª juíza de julgamento, embora hesitante, aceitou decidir sobre a ausência, não estamos perante uma situação de conflito negativo de competências, pelo que não se pode devolver a decisão sobre aquele requerimento do arguido ao TEP.

DECISÃO

Nos termos e com os fundamentos expostos, acordam os juízes da 1ª Secção Criminal do Tribunal da Relação do Porto em conceder provimento ao recurso interposto pelo M.P. revogando-se a decisão recorrida proferida na 1ª instância por ser nula por violação das regras de competência material do tribunal.

Sem custas.

Notifique.

Sumário.
(Da responsabilidade do relator)
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Porto, 10 de julho de 2019.
(Elaborado e revisto pelo 1º signatário)
Paulo Costa
Élia São Pedro