Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
35/18.7PAESP.P1
Nº Convencional: JTRP000
Relator: MARIA DOLORES DA SILVA E SOUSA
Descritores: CRIME DE CONDUÇÃO DE VEÍCULO SEM HABILITAÇÃO LEGAL
INCONSTITUCIONALIDADE MATERIAL
PENA ACESSÓRIA DE PROIBIÇÃO DE CONDUZIR
PENA ÚNICA
Nº do Documento: RP2018101035/18.7PAESP.P1
Data do Acordão: 10/10/2018
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: CONFERÊNCIA
Decisão: PROVIDO PARCIALMENTE
Indicações Eventuais: 4ªSECÇÃO, (LIVRO DE REGISTOS N.º772, FLS.251-259)
Área Temática: .
Sumário: I - Não é inconstitucional a previsão e punição do crime de condução sem habilitação legal.
II - É de aplicar a pena acessória prevista no artigo 69.º do Código Penal a agentes condenados pelo crime de condução sem habilitação legal.
III - A graduação da pena única resultante do cúmulo próximo do máximo é, no caso em apreço, contraditória com a graduação das penas parcelares e com os critérios decorrentes do artigo 77.º, n.º 1, do Código Penal.
Reclamações:
Decisão Texto Integral: Rec. Penal n.º 35/18.7PAESP.P1
Comarca de Aveiro
Juízo Competência Genérica de Espinho

Acordam, em Conferência, na 2ª secção Criminal do Tribunal da Relação do Porto.
I - Relatório.
No Processo sumário n.º 35/18.7PAESP do Juízo de Competência Genérica de Espinho, Juiz 1, da Comarca de Aveiro, foi submetido a julgamento o arguido B…, identificado na sentença a fls. 56.
A sentença de 28.02.2018, depositada no mesmo dia, tem o seguinte dispositivo:
«• Condeno o arguido B… pela prática, como autor material, de um Crime de Condução de Veículo em Estado de Embriaguez, p. e p. pelo art. 292.°, n.° 1, do Cód. Penal, na pena de 100 (cem) dias de multa;
Condeno o arguido B… pela prática, como autor material, de um Crime de Condução de Veículo Sem Habilitação Legal, p. e p. pelas disposições conjugadas dos arts. 3.°, n.°s 1 e 2, do Decreto-lei n.° 2/98, de 03 de Janeiro e 121.° do Cód. da Estrada, na pena de 120 (cento e vinte) dias de multa;
Condeno o arguido B… na pena única de 200 (duzentos) dias de multa, à taxa diária de €:15,00 (quinze euros), o que perfaz o montante global de €:3.000,00 (três mil euros);
Condeno o arguido B…. como autor material, de um Crime de Condução de Veículo em Estado de Embriaguez, p. e p. pelo art. 292.°, n.° 1, e 69.°, n.° 1, do Cód. Penal, na pena de 7 (sete) meses de proibição de conduzir veículos com motor;
Mais se condena o arguido no pagamento de 2 UC (duas unidades de conta) de taxa de justiça e demais custas do processo, nos termos do disposto nos arts. 513.° e 514.º do Cód. Processo Penal.
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Mais se determina que o arguido proceda à entrega da sua licença/carta de condução na secretaria deste Tribunal ou em qualquer posto policial, no prazo de 10 (dez) dias a contar do trânsito em julgado da presente sentença, nos termos do disposto nos arts. 69.º, n.º 3, do Cód. Penal e 500.º do Cód. Processo Penal, sob pena de incorrer na prática de um crime de desobediência, p. e p. pelo art. 348.°, n.º 1, alínea b), do Cód. Penal.
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Comunique à Autoridade Nacional de Segurança Rodoviária, nos termos do disposto no n.º 4 do art. 69.º do Cód. Penal.
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Boletim à D.S.I.C., consignando-se que não se procederá à transcrição da condenação nos certificados a que se referem os n.ºs 5 e 6 do art. 10.º da Lei n.º 37/2015, de 5 de maio.
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Proceda a depósito da sentença na secretaria, nos termos do disposto no n.º 5 do art. 372.º do Cód.»
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Inconformado, o arguido interpôs recurso apresentando a competente motivação, que remata com as seguintes conclusões:
«1ª. Deve ser declarada a Inconstitucionalidade material do crime previsto e punido no artigo 3.º do Decreto-Lei n.º2/98, de 3 de Janeiro.
2ª. E nesta medida ser o arguido absolvido do crime de condução de veículo sem habilitação legal.
3ª. Da impossibilidade de aplicação da pena acessória de inibição de conduzir, uma vez que o arguido foi condenando pelo crime de condução sem habilitação legal.
4ª. E nesta medida deve ser o arguido absolvido da sanção acessória de inibição de conduzir.
5ª. Da impossibilidade de no crime sem habilitação legal se ordenar a entrega do título de condução no prazo de 10 dias após o trânsito em julgado.
Sem prescindir,
6ª. Toda a aplicação de uma pena deve ter em vista a retribuição do mal pelo agente, a prevenção especial e a prevenção geral artigos 70.º e 71.º do Código Penal.
7ª. A pena em que foi condenado o recorrente viola o preceituado nos artigos 70º, 71º e 72º do Código Penal.
8ª. O Tribunal, na fixação da pena de multa, atenta a factualidade dada como provada, aplicou uma pena inadequada e excessiva.
9ª. Na determinação concreta da pena, o Tribunal não valorou adequadamente todas as circunstâncias que, depuseram a favor do ora recorrente, bom como não teve em conta o arrependimento sincero que levaria à aplicação da Atenuação Especial da Pena.
10ª. Não atendeu devidamente aos critérios de razoabilidade e proporcionalidade, nem os conjugou com os critérios gerais do artigo 71º do Código Penal.
11ª. O Tribunal, na fixação da pena de multa, atenta a factualidade dada como provada, aplicou uma pena inadequada e excessiva.
12ª. Na determinação concreta da pena, o Tribunal não valorou adequadamente todas as circunstâncias que, depuseram a favor do recorrente.
13ª. Não teve em conta ainda o preceituado na lei no que se refere à fixação do montante da coima e da punição do concurso de crimes.
14ª. Assim, deve interpretar-se o artigo 71º do Código Penal no sentido de reduzir-se a medida da pena de multa aplicada.
15ª. Decidindo assim, o Tribunal, sem perder de vista a infracção, a punição deve de o ser de uma forma adequada à sua culpa, sem que sofra mais do que o estritamente necessário face a sua conduta infractora,
16º. Bem como fixar a coima tendo em conta os critérios enunciados para tal na lei, aplicando assim uma coima aproximada ou igual ao limite mínimo da moldura do concurso.
17ª. Assim, deve interpretar-se o artigo 71º do Código Penal, no sentido de reduzir-se a medida da pena aplicada, para 170 (cento e setenta) dias de multa à taxa diária de €10,00 (dez euros), que perfaz a multa total de €1.700,00 (mil e setecentos euros);
18ª. Decidindo assim, o Tribunal, sem perder de vista o infractor, o pune de uma forma adequada à sua culpa e lhe continua a dar hipóteses de se ressocializar, sem que sofra mais do que o estritamente necessário face a sua conduta infractora.
19ª. Pois a pena não deve, de forma alguma, impedir que o recorrente não possa suprir as suas despesas necessárias às suas necessidades mais básicas da vida, designadamente a alimentação e as suas necessidades habitacionais.
20ª. O arguido não tem antecedentes criminais e está comprometido com a continuação da sua vida com o respeito pelas normas legais
Termina pedindo a alteração da sentença no sentido de se reduzir a medida da pena aplicada para um valor aproximado ou igual ao limite mínimo da moldura do crime ou do concurso de crimes.»
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O recurso foi Liminarmente admitido por despacho constante de fls. 75.
O Mº Pº na primeira instância respondeu ao recurso com a competente motivação, não sumariando conclusões, mas sufragando a improcedência total do recurso.
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Nesta Relação o Exmo. PGA pronunciou-se pelo provimento parcial do recurso, relativamente ao segmento da sentença em que se ordena a entrega da licença/carta de condução, sob pena de se incorrer na prática de um crime de desobediência; e, concordando, por dizer “nada se opondo à aplicação da pena única sugerida pelo recorrente”.
Foi cumprido o artigo 417º, n.º2, do CPP, sem resposta,
Colhidos os vistos cumpre apreciar e decidir.
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II- Fundamentação.
Como é jurisprudência assente, sem prejuízo das questões de conhecimento oficioso – vícios decisórios e nulidades referidas no artigo 410.º, n.º s 2 e 3, do Código de Processo Penal – é pelas conclusões que o recorrente extrai da motivação apresentada, em que sintetiza as razões do pedido (artigo 412.º, n.º 1, do CPP), que se delimita o objecto do recurso e os poderes de cognição do Tribunal Superior.
1.-Questões a decidir
Face às conclusões extraídas pelos recorrentes da motivação apresentada são as seguintes as questões a apreciar e decidir:
- Inconstitucionalidade material do crime do art. 3.º do D.L. n.º 2/98, de 3 de Janeiro, por violação do art. 18.º, n.º 2, da Constituição da República Portuguesa,
- Impossibilidade de aplicação da pena acessória de inibição de conduzir;
- Impossibilidade de, no caso concreto, o arguido entregar o título de condução, pois também foi condenado pelo crime de condução sem habilitação legal.
- Atenuação especial da pena;
- Quantitativo diário aplicado à pena de multa.
- Medida da pena única.
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2. Factualidade.
Segue-se a enumeração dos factos provados, e motivação.
«2.1. Da discussão da causa resultou provado que:
1.º No dia 15 de Janeiro de 2018, cerca das 00h40, após ter ingerido bebidas alcoólicas, o arguido conduzia o veículo automóvel ligeiro de passageiros com a matrícula ……. no cruzamento da Avenida … com a Rua …, em Espinho, sem ser titular de carta de condução que o habilitasse para o efeito.
2.ºAo ser submetido ao teste de controlo de alcoolemia realizado no aparelho Drager, o mesmo acusou uma TAS de pelo menos 2,447 g/l, correspondente a uma TAS de 2,66 g/l, depois de deduzido o erro máximo admissível, não tendo o arguido requerido contraprova.
3.º O arguido agiu livre, deliberada e conscientemente, bem sabendo que conduzia veículo a motor na via pública após ter ingerido imoderadamente bebidas alcoólicas e sem estar habilitado com o respetivo título de condução.
4.º Sabia que a sua conduta era proibida e punida por lei.
5.º Não são conhecidos antecedentes criminais ao arguido.
6.º O arguido encontra-se emigrado em França; explora uma oficina de automóveis, com três funcionários, auferindo um rendimento médio mensal de €:2.000,00/€:3.000,00; vive em casa própria, suportando o pagamento mensal da quantia de €:700,00 (setecentos euros) para amortização de empréstimo bancário para a sua aquisição; tem um filho de 13 (treze) anos de idade, que vive com a mãe, pagando o arguido o montante mensal de €:600,00 (seiscentos euros) a título de prestação de alimentos; possui um veículo automóvel da marca e modelo PORSCHE …, do ano 2011; possui um veículo automóvel da marca e modelo FORD …, do ano 2000.
Matéria de facto não provada:
Não resultaram provados quaisquer outros factos, com interesse para a decisão da causa.
Motivação da decisão de facto:
A decisão do tribunal, após livre apreciação crítica das provas que concorreram para a formação da sua convicção, fundou-se nas declarações do arguido, que confessou, integralmente e sem reservas, os factos integrantes do crime de condução de veículo em estado de embriaguez.
Quanto a este ilícito criminal, foram, ainda, ponderados os seguintes documentos:
Auto de notícia de fls. 4/5; e
Talão de fls. 6.
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Quanto ao crime de condução de veículo sem habilitação legal, já não foram tidas em consideração as declarações do arguido, ao afirmar estar habilitado a conduzir. Na realidade, tendo sido dada, ao arguido, oportunidade de vir aos autos juntar documento que corporize tal habilitação, este não o fez, apesar de, como refere no requerimento com a ref. 28261798, se ter deslocado ao país onde se encontra emigrado, onde o teria deixado esquecido.
Assim, quanto a esta matéria, as declarações do arguido foram, totalmente, infirmadas pelos demais elementos probatórios, designadamente pelo teor da pesquisa eletrónica efetuada nas bases de dados do IMT, constante de fls. 20, da qual se conclui que, à data dos factos, o arguido não era detentor de habilitação legal para conduzir.
A prova do facto constante do ponto 5.º estribou-se no teor do Certificado de Registo Criminal de fls. 15.
No que se refere, por fim, à factualidade relativa às condições pessoais e profissionais do arguido, e constante do ponto 6.º, foram ponderadas as declarações por este prestadas que, nesta matéria, mereceram total crédito por parte do tribunal.»
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3.- Apreciação do recurso.
3.1. - Inconstitucionalidade material do crime do art. 3.º do D.L. n.º 2/98, de 3 de Janeiro.
Sustenta o recorrente a inconstitucionalidade material do artigo 3º do DL n.º 2/98, de 3 de Janeiro, por violação do art. 18.º, n.º 2, da Constituição da República Portuguesa.
Vejamos
A presente questão foi apreciada no Tribunal Constitucional, no Acórdão n.º 337/2002, que julgou não inconstitucional a norma do n.º 2 do artigo 3.º do Decreto-Lei n.º 2/98, de 3 de Janeiro.
As razões do juízo de não inconstitucionalidade formulado no Acórdão n.º 337/2002, são, em síntese, as seguintes:
«(…) os veículos, mormente os automotorizados, são, reconhecidamente, geradores de risco para a vida, integridade física e para os bens, seja de toda a comunidade, seja de todos aqueles que utilizam as vias públicas ou fazem utilização das suas margens ou proximidades.
Como a condução de veículos automotorizados não é, em regra, inata às faculdades humanas, requerendo, por isso, aprendizagem, quer das respectivas técnicas, quer das regras a que deve obedecer a circulação rodoviária, é facilmente aceitável a ideia de que ao Estado se imponham especiais cautelas para apurar da suficiência dessa aprendizagem, não permitindo que quem não seja detentor de tal suficiência possa livremente levar a efeito a condução.
Se alguém a pratica, sem que o apuramento pelo Estado seja certificado, a presunção de que a prática da condução nessas condições não tem um mínimo de segurança não se antolha como um despropósito ou um excesso.
E, para obviar ao acrescido risco decorrente dessa presunção (para além de se não poder, nem dever, escamotear que são inúmeros os casos de condução por quem legalmente não está legalmente habilitado para tanto e que é mui elevada a sinistralidade, mesmo atendendo aos que estão habilitados) não se mostra minimamente como implicando uma injusta medida a «desincentivação» dos comportamentos consistentes na condução sem título, «desincentivação» essa que é efectuada através da respectiva criminalização.
(…)
Do exposto resulta que se há de concluir que a norma em apreço apresenta aquele mínimo de ressonância ética que expressa os valores da coletividade, consequentemente não se mostrando, ao desenhar como ilícito criminal a conduta nela tipificada, como desproporcionada, excessiva ou ultrapassadora de uma justa medida e, por isso, se afigurando como compatível com a dignidade humana o sancionamento criminal que leva a efeito. (…)»
Na fundamentação do Acórdão n.º 83/1995 reforça-se que «a vida e a segurança das pessoas que circulam nas estradas — que o legislador pretende proteger com a punição da condução de veículos automóveis por quem não possua habilitação legal — são seguramente bens que, à luz da ordem jurídico-constitucional de valores, o direito penal pode assumir como seus (isto é, como bens jurídico-penais)».
No Ac. n.º 173/2012, foi aduzida a mesma argumentação relativamente à condução de um ciclomotor.
Assim, a restrição a direitos fundamentais que a pena representa encontra-se cabalmente justificada, pois estamos perante a tutela de um bem jurídico digno e carente de tutela penal, como se deixou explicado, na fundamentação reproduzida do citado Acórdão do Tribunal Constitucional.
Por outro lado, o legislador infraconstitucional tem uma ampla margem de conformação para tipificar certos comportamentos como crime (cfr., entre outros, os Acórdãos n.ºs 573/95 e 595/2008) e estando em causa a protecção do bem jurídico segurança rodoviária, a perigosidade do comportamento em causa e as evidentes necessidades de prevenção, conclui-se pela não inconstitucionalidade da norma em apreço, tal como vem considerando o Tribunal constitucional nos Arestos citados.
Improcede a questão.
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3.2. - Impossibilidade de aplicação da pena acessória de inibição de conduzir.
O Recorrente sustenta a impossibilidade de aplicação da pena acessória de inibição de conduzir, uma vez que o arguido foi condenando pelo crime de condução sem habilitação legal. E, conclui que nesta medida deve ser absolvido da sanção acessória de inibição de conduzir.
Por sua vez, o MP, sustenta que decorre do artigo 69º do CP, que para a prática do crime de condução de veículo em estado de embriaguez é sempre e obrigatoriamente aplicável a pena acessória de proibição de conduzir veículos com motor, não fazendo a norma depender tal imposição do agente ter ou não ter título de condução.
A sentença sob escrutínio fundamentou a aplicação ao arguido da pena acessória de proibição de conduzir do seguinte modo:
«De harmonia com o disposto no art. 69.°, n.° 1, alínea a), do Cód. Penal, "é condenado na proibição de conduzir veículos motorizados por um período fixado entre três meses e três anos quem for punido por crime cometido no exercício da condução com grave violação das regras de trânsito rodoviário."
A condução de veículo motorizado na via pública com a T.A.S. superior a 1,2 g/l corresponde, por si mesma, a uma grave violação das regras de trânsito rodoviário, mais se considerando a taxa de 2,44g/l que o arguido apresentava.
Assim sendo, tendo em conta os factos praticados, o disposto na aludida norma, e os considerandos "supra" expendidos quanto à fixação da pena principal, condena-se o arguido na proibição de conduzir veículos rodoviários pelo período de 7 (sete) meses.
Quanto a uma eventual suspensão da inibição da faculdade de conduzir entendemos a mesma não ser possível.
A pena acessória visa prevenir a perigosidade do agente, embora também tenha um efeito de prevenção geral, enquanto a pena principal tem a vista a proteção de bens jurídicos e a reintegração do agente na sociedade (cfr. art. 40.°, n.°1, do Cód. Penal).
Sendo assim, visando, como se referiu, a pena acessória prevenir a perigosidade do agente, sendo-lhe alheia a finalidade de reintegração deste na sociedade, à mesma não poderá ser aplicável o regime da suspensão da execução da pena (cfr. art. 50.° do Cód. Penal).
A perigosidade que a pena acessória visa atingir esta em ligação com o perigo que subjaze ao próprio facto ilícito típico de que depende a sua aplicação.
Sendo um crime de perigo abstrato, o art. 292.º impõe e justifica a aplicação da pena acessória de inibição de conduzir.
Se a pena acessória visa prevenir a perigosidade que está imanente na própria norma incriminadora, que a justifica e impõe, sendo-lhe indiferente qualquer outras finalidades, é lógico que tal desiderato só com a execução efetiva da correspondente pena poderá ser atingido, ou seja, o perigo que a condução de veículos com motor em estado de embriaguez gera e desencadeia, só é prevenivel com a execução efetiva da sanção de inibição de condução ao agente imposta.
Logo se conclui que a referida pena acessória não é possível de substituição, designadamente por caução de boa conduta.»

Vejamos.
Dispõe o artigo 69º do CP que:
«1 - É condenado na proibição de conduzir veículos com motor por um período fixado entre três meses e três anos quem for punido:
a). Por crimes de homicídio ou de ofensa à integridade física cometidos no exercício da condução de veículo motorizado com violação das regras de trânsito rodoviário e por crimes previstos nos artigos 291.º e 292.º;
(…)
2 - A proibição produz efeito a partir do trânsito em julgado da decisão e pode abranger a condução de veículos com motor de qualquer categoria.
3 - No prazo de 10 dias a contar do trânsito em julgado da sentença, o condenado entrega na secretaria do tribunal, ou em qualquer posto policial, que remete àquela, o título de condução, se o mesmo não se encontrar já apreendido no processo.
4 - A secretaria do tribunal comunica a proibição de conduzir à Direcção-Geral de Viação no prazo de 20 dias a contar do trânsito em julgado da sentença, bem como participa ao Ministério Público as situações de incumprimento do disposto no número anterior.
(…)
7 - Cessa o disposto no n.º 1 quando, pelo mesmo facto, tiver lugar a aplicação de cassação ou de interdição da concessão do título de condução nos termos do artigo 101.»

É certo que sobre a questão em apreço não existe entendimento unânime por parte da jurisprudência dos Tribunais Superiores. No entanto, há uma clara tendência, mais nítida na jurisprudência mais recente, no sentido de considerar aplicável a pena acessória prevista no art. 69º do CP aos autores dos ilícitos criminais elencados nas alíneas do nº 1 desse inciso legal, mesmo quando não se encontrem legalmente habilitados a conduzir veículos.
Podemos indicar como representativos dessa orientação, a título meramente exemplificativo, os Acórdãos seguintes:
- Relação do Porto, de de 13.01.16, Relator Desembargador Ribeiro Coelho; de 07.07.10, Relatora Desembargadora Adelina Barradas Oliveira; de 14.04.10, Relator Desembargador Jorge Gonçalves; de 10.03.10, Relator Desembargador Francisco Marcolino; de 07.10.09 Relatora Desembargadora Maria Leonor Esteves; de 01.04.09, Relator Desembargador Borges Martins
- Relação de Guimarães de 11.06.2012, Relator Desembargador António Condesso; de 04.05.2015, Relator Desembargador Lee Ferreira;
- Relação de Coimbra de 03.07.12, Relator, Desembargador Alberto Mira; de 11.09.2013, Relator Desembargador Correia Pinto; de 07.06.2017, Relatora, Desembargadora Maria Pilar de Oliveira;
- Relação de Lisboa de 24.01.07, Relatora Desembargadora Conceição Gonçalves; de 12/9/07, Relatora Desembargador Telo Lucas;
- Relação de Évora de 07.04.2015, Relator Desembargador Sérgio Corvacho; [todos disponíveis em www.dgsi.pt.]
Não vislumbramos razões válidas para nos afastarmos da orientação jurisprudencial dominante na questão que nos ocupa.
Com efeito, e como bem enfatiza o MP junto da 1ª instância, nada no texto do nº 1 do art. 69º do CP permite sugerir que devam ser excluídos da pena nele prevista os agentes dos crimes referidos nas suas alíneas, quando não sejam detentores de título que os habilite à condução, pois a norma não faze depender tal imposição do agente ter ou não ter título de condução.
Os argumentos esgrimidos no sentido da condenação do infractor não habilitado que pratique crime de condução de veículo em estado de embriaguez são, no essencial, os seguintes:
- Seria “um contra-senso que o condutor não habilitado legalmente a conduzir, podendo vir a obter licença ou carta de condução logo pouco depois da sentença condenatória, não se visse inibido de conduzir, quando o já habilitado fica sujeito a tal sanção” - Ac. do Trib. da Relação de Lisboa, de 19/09/95, Col. Jur. Ano XX, 1995, Tomo IV, pág. 147.
- Após a publicação da Lei n.º 77/2001, o Código da Estrada foi alterado pelo Decreto-Lei n.º 265-A/2001, de 28-09, tendo este diploma mantido como um dos requisitos para a obtenção do título de condução a circunstância de o requerente não se encontrar a cumprir decisão que tenha imposto a proibição de conduzir [cf. art. 126.º n.º 1, al. d) do C.E.]. A manutenção deste requisito para a obtenção da carta de condução pressupõe que a proibição de conduzir possa [deva] ser aplicada a quem não for dela titular.
- No mesmo sentido aponta o facto de o conteúdo material da sanção em causa ser o da imposição de uma proibição de conduzir e não o da previsão de uma suspensão dos direitos conferidos pela titularidade da carta de condução.
- A aplicação da proibição de conduzir visa não só assegurar de uma forma reforçada a tutela dos bens jurídicos como também evitar que o agente de tal crime volte a praticar factos semelhantes.
- Acresce, ainda, o facto de o art. 353.º do Código Penal criminalizar a violação de proibições impostas por sentença criminal a título de pena acessória ou de medida de segurança não privativa da liberdade.
Da violação dessa proibição pode resultar para o agente, ainda que não seja titular de carta de condução, a responsabilização pela prática, em concurso efectivo, de um crime do art. 3.º do Decreto - Lei n.º 2/98, de 03-01, e de um crime do referido art. 353.º, pois que este tipo legal visa tutelar a autoridade pública e não a segurança das comunicações.
- A não aplicação da pena acessória num caso como este traduzir-se-ia num privilégio injustificado para quem teve um comportamento globalmente mais grave do que a [simples] condução em estado de embriaguez (cf., entre outros, o acórdão da Relação de Lisboa de 12-09-2007, acima mencionado).
- Aponta-se também o confronto do artigo 69.º, n.º 1 e n.º 7, com o artigo 101.º, n.º 4, do Código Penal, de cuja conjugação de normas se evidencia que, ao estabelecer a pena acessória, o artigo 69.º, na sua redacção actual, prevê a condenação nessa pena mesmo em relação ao condutor não habilitado e a sua exclusão quando, pelo mesmo facto, tiver lugar a interdição da concessão do título de condução, na certeza de que esta interdição pressupõe que o agente não é titular de título de condução.
Na doutrina, Germano Marques da Silva (in Crimes Rodoviários, Pena Acessória e Medidas de Segurança, pág. 32 e nota 54) também entende que «a pena acessória de proibição de conduzir veículos motorizados pode ser aplicada a agente que não seja titular de licença para o exercício legal da condução; o condenado fica então proibido de conduzir veículo motorizado, ainda que entretanto obtenha licença» e acrescenta ainda que “diferentemente quando for aplicada a medida de segurança de cassação e o agente não seja titular de licença, caso em que ao agente não pode ser concedida licença durante o período de interdição”, dado que «a proibição de conduzir veículo motorizado não pressupõe habilitação legal».
Consequentemente é de manter a pena acessória de proibição de conduzir veículos automóveis, que o Tribunal a quo aplicou ao recorrente.
Improcede a questão posta.
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3.3. - Impossibilidade de, no caso concreto, o arguido entregar o título de condução, pois também foi condenado pelo crime de condução sem habilitação legal.
Defende o recorrente que mesmo que se entenda ser de aplicar a sanção acessória de inibição de conduzir, existe a impossibilidade de o arguido entregar o título de condução, pois na mesma data o arguido foi condenado pelo crime de condução sem habilitação legal pelo que se torna impossível cumprir a condenação de entrega ordenada.
O Exmo. PGA neste TRP entende que assiste razão, neste ponto ao recorrente; e que a ordem neste sentido terá ficado a dever-se a lapso informático eventualmente motivado no facto de se ter utilizado uma anterior sentença de condenação de veículo em estado de embriaguez para se elaborar a sentença a que se reportam os presentes autos.
Vejamos.
Cremos assistir razão ao recorrente.
Com efeito, como ele próprio enfatiza, num caso como o dos autos, o conteúdo material da pena acessória é o de uma imposição de uma proibição de conduzir e não o da previsão de uma suspensão dos direitos conferidos pela titularidade da carta de condução.
Para poder entregar a sua licença, nos termos do disposto no art. 69º, 3, e assim iniciar o cumprimento da pena acessória, é suposto que o agente seja titular de licença válida.
Estando em causa a proibição de conduzir por um determinado período, faz sentido que o agente não titular da necessária licença cumpra essa proibição, na medida fixada na sentença, ainda que venha a obter tal licença no decurso do prazo fixado para a proibição; mas esta cessa logo que decorra o período respectivo.
Isto é, a proibição tem a duração definida na sentença e essa duração, na falta de título válido, inicia-se com o trânsito da sentença condenatória e prolonga-se até ao termo do período fixado, mantendo-se mesmo que o condenado, nesse período, obtenha habilitação legal.
Face à actual redacção do art. 126º do CE, «os requisitos exigidos para a obtenção dos títulos de condução são fixados no RHLC». Resulta, por sua vez, da alínea e) do nº 1 do art. 18º deste Regulamento de Habilitação Legal para Conduzir, que:
-1 - A obtenção de título de condução está condicionada ao preenchimento cumulativo dos seguintes requisitos: (…) e) Não se encontrar a cumprir sanção acessória de proibição ou de inibição de conduzir ou medida de segurança de interdição de concessão de carta de condução determinada por autoridade judicial ou administrativa portuguesa.
A “interpretação de tal norma conduz, de forma imperativa, à conclusão de que ao agente está vedada a possibilidade de aceder à faculdade legal de conduzir, e assim à capacidade de ser titular de tal direito, enquanto decorrer o período fixado como sanção acessória de proibição ou de inibição de conduzir ou medida de segurança de interdição de concessão de carta de condução determinada por autoridade judicial ou administrativa portuguesa. Tal norma inculca a ideia de que essa proibição de obtenção da faculdade legal de conduzir durará enquanto durar a proibição decretada pelo tribunal, de onde se deve concluir que a proibição é cumprida antes da obtenção do título e a obtenção deste não é pressuposto do início de cumprimento daquela, antes pelo contrário, só após o decurso daquele prazo pode ocorrer”.- vide o Ac. do TRC de 12.04.2018, in www.dgsi.pt.que vimos seguindo, nesta questão.
Assim, perante a inexistência de título válido, aguardar-se-á pelo decurso do prazo da pena acessória fixado na sentença, contado desde o respectivo trânsito em julgado. Decorrido o referido prazo deve declarar-se a mesma cumprida.
Procede, assim, nesta parte o recurso, dando-se sem efeito a determinação do Tribunal a quo para que o arguido proceda à entrega da sua licença/carta de condução na secretaria do Tribunal a quo ou em qualquer posto policial, no prazo de 10 (dez) dias a contar do trânsito em julgado da presente sentença, pelas razões expostas.
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3.4.- Atenuação especial da pena.
Sustenta o recorrente a atenuação especial da pena como prescreve o art. 72º do CP, pois, argumenta, no caso tal como dispõe a al. c) do artigo “ficou provada o sincero arrependimento do arguido” o que diminui a culpa.
Vejamos.
Ao contrário do pretendido pelo recorrente da leitura dos factos provados e da motivação da decisão de facto, constata-se que o arguido não revelou o arrependimento que invoca sendo certo que relativamente ao crime de condução de veículo sem habilitação legal chegou mesmo a afirmar estar habilitado a conduzir o que bem sabia não corresponder à verdade [pelo menos em Portugal, pois o arguido é de naturalidade Francesa].
A atenuação especial da pena constitui um instrumento de utilização excepcional, visando casos de uma gravidade de tal modo reduzida que as circunstâncias que a podem determinar, ainda que legalmente catalogadas como exemplo padrão, terão que estar associadas a uma diminuição considerável da ilicitude do facto, da culpa do agente ou da necessidade da pena.
Ora, no caso sub judice, embora os crimes praticados sejam do âmbito da criminalidade menor, o invocado pelo recorrente não se verifica e, portanto, não constitui circunstância que diminua de forma acentuada a ilicitude dos factos, a sua culpa ou a necessidade da pena daí que o Tribunal a quo não lhe poderia ter atenuado especialmente a pena nos termos do art. 72.º, n.º 1, do Código Penal, nem tão pouco este Tribunal, pelo que improcede este segmento do recurso.
Portanto, a questão da atenuação especial da pena improcede claramente.
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3.5.- Quantitativo diário da pena de multa e Medida da pena única.
O recorrente pretende a redução da pena única para 170 dias de multa, em vez dos 200 dias que lhe foram aplicados na 1ª instância e entende que o quantitativo diário aplicado à pena de multa é excessivo devendo ser reduzido para 10€ em vez dos 15€ que lhe foram aplicados.
§. Quantitativo diário da pena de multa.
Em relação ao montante diário a aplicar ao número de dias de multa, dispõe o artigo 47º, n.º2 do CP que “cada dia de multa corresponde a uma quantia entre (euro) 5 e (euro) 500, que o tribunal fixa em função da situação económica e financeira do condenado e dos seus encargos pessoais.
Do elenco dos factos provados, resulta que o arguido encontra-se emigrado em França; explora uma oficina de automóveis, com três funcionários, auferindo um rendimento médio mensal de €:2.000,00/€:3.000,00; vive em casa própria, suportando o pagamento mensal da quantia de €:700,00 (setecentos euros) para amortização de empréstimo bancário para a sua aquisição; tem um filho de 13 (treze) anos de idade, que vive com a mãe, pagando o arguido o montante mensal de €:600,00 (seiscentos euros) a título de prestação de alimentos; possui um veículo automóvel da marca e modelo PORSCHE CAYENNE V6, do ano 2011; possui um veículo automóvel da marca e modelo FORD TRAFFIC, do ano 2000.
Atenta a situação financeira espelhada nos factos e os encargos que o recorrente suporta, temos por acertado e consentâneo com a real situação económica do recorrente o quantitativo diário de 15,00€ encontrado na primeira instância, dado que as receitas do arguido são muito superiores às suas despesas, e a sua situação económica muito superior à da esmagadora maioria das pessoas da classe média em Portugal, como aliás não deixa de enfatizar o facto de ser possuidor de um veículo automóvel da marca e modelo PORSCHE CAYENNE V6, do ano 2011.
Portanto mantém-se o quantitativo diário aplicado de 15,00€.
Improcede esta questão do recurso.
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§§ Medida da pena única.
Como vimos o recorrente entende que a pena única devia situar-se nos 170 dias.
Para tanto argumenta que no caso o limite máximo do concurso de crimes seria de 220 (duzentos e vinte dias) de multa, resultante da soma das penas parcelares de 100 e 120 dias multa e o limite mínimo da pena será a pena parcelar mais elevada, ou seja, 120 (cento e vinte dias) de multa.
E defende que a pena aplicada deveria ter sido perto do limite mínimo da moldura abstracta tendo em consideração que o arguido é primário e está inserido socialmente. Pugna por uma pena de 170 (cento e setenta) dias de multa.
Vejamos:
Estabelece o art. 77º, n.º1 do CP, relativamente às regras de punição do concurso de crimes, que “Quando alguém tiver praticado vários crimes antes de transitar em julgado a condenação por qualquer deles é condenado numa pena única. Na medida da pena são considerados, em conjunto, os factos e a personalidade do agente”.
E nos termos do nº 2, a penalidade, a moldura do concurso, a pena aplicável tem como limite máximo a soma das penas concretamente aplicadas aos vários crimes, não podendo ultrapassar 900 dias, tratando-se de pena de multa; e como limite mínimo a mais elevada das penas concretamente aplicadas aos vários crimes.
A medida da pena a atribuir em sede de cúmulo jurídico tem uma especificidade própria.
Por um lado, está-se perante uma nova moldura penal mais abrangente.
Por outro, tem lugar uma específica fundamentação, que acresce à decorrente do artigo 71º do Código Penal.
Como se lê em Figueiredo Dias, Direito Penal Português - As Consequências Jurídicas do Crime, Aequitas, Editorial Notícias, 1993, §§ 420 e 421, págs. 290/2, a pena conjunta do concurso será encontrada em função das exigências gerais de culpa e de prevenção, fornecendo a lei, para além dos critérios gerais de medida da pena contidos no art. 72º-1 (actual 71º-1), um critério especial: o do artigo 77º, nº 1, 2ª parte.
Explicita o Autor que, na busca da pena do concurso, “Tudo deve passar-se como se o conjunto dos factos fornecesse a gravidade do ilícito global perpetrado, sendo decisiva para a sua avaliação a conexão e o tipo de conexão que entre os factos concorrentes se verifique. Na avaliação da personalidade – unitária – do agente relevará, sobretudo, a questão de saber se o conjunto dos factos é reconduzível a uma tendência (ou eventualmente mesmo a uma «carreira») criminosa, ou tão só a uma pluriocasionalidade que não radica na personalidade: só no primeiro caso, já não no segundo, será cabido atribuir à pluralidade de crimes um efeito agravante dentro da moldura penal conjunta”. Acrescenta que “de grande relevo será também a análise do efeito previsível da pena sobre o comportamento futuro do agente (exigências de prevenção especial de socialização)”.
Na consideração dos factos (do conjunto dos factos que integram os crimes em concurso) está ínsita uma avaliação da gravidade da ilicitude global, que deve ter em conta as conexões e o tipo de conexão entre os factos em concurso, como vem entendendo a jurisprudência do STJ, vide a título meramente exemplificativo, o Ac. do STJ de 18-06-2009, processo n.º 8523/06.1TDLSB-3ª.
A moldura abstracta do concurso no caso concreto, ou seja a moldura de punição tem uma amplitude entre 120 dias de multa [limite mínimo, dado pela pena parcelar mais elevada] e 220 dias de multa [soma das penas parcelares].
Quanto à ilicitude do conjunto dos factos será de considerar no patamar inferior, entendida a ilicitude como juízo de desvalor da ordem jurídica sobre um comportamento, por este lesar e pôr em perigo bens jurídico-criminais, no caso presente estamos face a crimes da criminalidade menor, condução sem habilitação legal e condução sob o efeito do álcool.
Quanto à modalidade de dolo, o recorrente agiu com dolo directo.
No que toca à indagação de uma conexão entre os ilícitos presentes, a única relação é terem sido ambos os crimes praticados na mesma ocasião e na mesma acção.
Na avaliação da personalidade do recorrente, importa reter o que consta dos factos dados como provados, nomeadamente, as suas condições de vida, de onde decorre que tem uma situação económica desafogada, está inserido profissional e socialmente e mesmo familiarmente, e que o arguido à data da prática dos factos tinha 42 anos de idade [nasceu em 20.05.1975, fls. 11 e 16].
Por outro lado, é de considerar o ilícito global agora em análise, tendo em atenção que não lhe são conhecidos antecedentes criminais, como uma pluriocasionalidade que não radica na personalidade.
São prementes as exigências de prevenção geral, atenta o número de crimes da mesma natureza cometidos todos os dias no País.
No que toca à prevenção especial mostram-se as mesmas exigências reduzidas.
A graduação da pena única praticamente no máximo é contraditória com a fixação das penas parcelares, e com os critérios supra assinalados. Neste contexto, valorando o ilícito global perpetrado, ponderando em conjunto a gravidade dos factos e a sua relacionação com a personalidade do recorrente, é de concluir, face à natureza dos crimes cometidos, que se mostra adequado, proporcional e equilibrado aplicar ao arguido uma pena única de 170 dias de multa à taxa diária de 15,00€, o que perfaz a quantia global e única de 2.550,00€.
Procede parcialmente o recurso, com a procedência desta questão.
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III- Decisão.
Acordam os juízes deste Tribunal da Relação do Porto em julgar o recurso parcialmente provido, alterando a decisão recorrida nos seguintes termos:
- Condena-se o arguido B… na pena única de 170 (cento e setenta) dias de multa, à taxa diária de 15,00€ (quinze euros), o que perfaz o montante global e único de 2.550,00€ (dois mil, quinhentos e cinquenta euros] [em substituição da pena única de 200 dias de multa em que havia sido condenado na 1ª instância].
- Dá-se sem efeito a determinação do Tribunal a quo para que o arguido proceda à entrega da sua licença/carta de condução na secretaria do Tribunal a quo ou em qualquer posto policial, no prazo de 10 (dez) dias a contar do trânsito em julgado da presente sentença, pelas razões que acima deixamos expostas.
-No mais mantém-se a decisão sob escrutínio.
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- Sem custas dado o parcial provimento.
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- Notifique
(Processado em computador e revisto pela relatora – artigo 94º, n.º 2, do C.P.P.)
Porto, 10 de Outubro de 2018.
Maria Dolores da Silva e Sousa
Manuel Soares