Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
418/22.8T8VLG.-A.P1
Nº Convencional: JTRP000
Relator: ANABELA DIAS DA SILVA
Descritores: EXECUÇÃO
INJUNÇÃO
ERRO NA FORMA DE PROCESSO
Nº do Documento: RP20220927418/22.8T8VLG.-A.P1
Data do Acordão: 09/27/2022
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: CONFIRMADA
Indicações Eventuais: 2. SECÇÃO
Área Temática: .
Sumário: I - O procedimento de injunção não é meio processual próprio para se peticionar o pagamento de uma quantia a título de cláusula penal indemnizatório ou qualquer outra quantia a título de indemnização pelos encargos com a cobrança da dívida.
II - Intentando-se a execução dando-se como título executivo injunção de onde resulte que abrange semelhantes quantias, há que se verificar o erro na forma de processo, excepção dilatória de conhecimento oficioso que conduz à absolvição da instância, devendo-se indeferir liminar e parcialmente, em conformidade, o requerimento executivo.
Reclamações:
Decisão Texto Integral: Apelação
Processo n.º 418/22.8 T8VLG-A.P1
Tribunal Judicial da Comarca do Porto – Juízo de Execução de Valongo – Juiz 1

Recorrente – N..., S.A
Recorrida – AA

Relatora – Anabela Dias da Silva
Adjuntos – Desemb. Ana Lucinda Cabral
Desemb. Rodrigues Pires



Acordam no Tribunal da Relação do Porto

I – N..., S.A. interpôs no Tribunal Judicial da Comarca do Porto – Juízo de Execução de Valongo a presente acção executiva para pagamento de quantia certa contra AA com vista a obter dela o pagamento coercivo da quantia total de €2.519,22.
A exequente deu à execução um requerimento de injunção no valor de €2.062,22, ao qual foi aposta a fórmula executória, e no qual reclamou o pagamento da factura n.º ....., emitida em 5.02.2020 e vencida em 27.02.2020, o valor de €643,34 referente ao “incumprimento do período mínimo do contrato”, tendo reclamado ainda o pagamento da quantia de €321,48,“a título de indemnização pelos encargos associados à cobrança da dívida”.
No requerimento executivo faz acrescer aos referidos €2.062,22 a quantia de €457,00 que diz respeitar aos juros de mora contabilizados à taxa legal comercial desde a entrada da injunção, aos juros compulsórios e às quantias exigíveis nos termos do art.º 33.º n.º 4 da Lei n.º 32/2014 e art.º 26.º n.º 3 al. c) do RCProcessuais.
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A 1.ª instância notificou a exequente para esclarecer que montantes respeitam às quantias exigíveis nos termos do art.º 33.º n.º 4 da Lei n.º 32/2014 e quais as que reclamava ao abrigo do disposto no art.º 26º nº 3 al. c) do RCProcessuais, tendo a mesma vindo dizer que reclama ao abrigo do art.º 33.º n.º 4 da Lei n.º 32/2014 – a quantia de €94,10, e ao abrigo do art.º 26.º n.º 3 al. c) do RCProcessuais – a quantia de €19,13.
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De seguida foi proferido despacho liminar de onde consta a seguinte decisão:
“Pelo exposto e ao abrigo do disposto nos art.º 726.º n.º 2 al. a) e 734.º do CPC indefiro liminarmente o requerimento executivo quanto à quantia de €983,95, prosseguindo os autos para cobrança das quantias de €1.040,58 e €94,10, acrescidas dos juros moratórios calculados sobre os valores e desde a data de vencimento das facturas que integram o capital de €964,08 e dos juros compulsórios a contar da data de aposição da fórmula executória calculado sobre o referido capital.
Custas do decaimento pela exequente”.

Inconformada com a tal decisão, dela veio a exequente recorrer de apelação pedindo a sua revogação e substituída por outra que ordene o prosseguimento integral do pedido executivo.
A apelante juntou aos autos as suas alegações que terminam com as seguintes conclusões:
1. Foi indeferido, liminarmente, o requerimento executivo pelo Tribunal a quo, por ter considerado que “estamos perante o uso indevido do procedimento de injunção o que configura erro na forma de processo” relativamente à importância de €643,34 (incumprimento contratual) e à quantia de €321,48 (a título de indemnização pelos encargos com a cobrança da dívida).
2. Salvo, porém, o devido respeito, tal decisão carece de oportunidade e fundamento, uma vez que,
3. O procedimento injuntivo é um meio adequado para peticionar o pagamento da obrigação resultante da aplicação da cláusula penal acordada para o incumprimento do período de fidelização, bem como,
4. A injunção é um meio adequado para peticionar ao devedor o pagamento dos referidos custos administrativos relacionados com diligências de cobrança da dívida.
5. Outra conclusão seria manifestamente contrário ao “espírito” legislativo associado à criação do DL n.º 269/98, de 01 de Setembro, conforme decorre, indubitavelmente da leitura do preâmbulo deste diploma legal.
De tudo quanto ficou exposto, resulta que, a decisão proferida nos presentes autos
- violou o artigo 1.º do diploma preambular anexo ao DL n.º 269/98, de 01 de Setembro.
- violou o art.º 590.º do CPC
- violou o artigo 726.º n.º 2 al. a) do CPC.

Não há contra-alegações.


II – Os factos relevantes para a decisão do presente recurso são os que estão enunciados no supra elaborado relatório, pelo que, por razões de economia processual, nos dispensamos de os reproduzir aqui.

III – Como é sabido o objecto do recurso é definido pelas conclusões do recorrente (art.ºs 5.º, 635.º n.º3 e 639.º n.ºs 1 e 3, do C.P.Civil), para além do que é de conhecimento oficioso, e porque os recursos não visam criar decisões sobre matéria nova, ele é delimitado pelo conteúdo da decisão recorrida.

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Ora, visto o teor das alegações da apelante são questões a apreciar no presente recurso:
1.ª – Apurar se efectivamente verifica-se erro na forma do processo relativamente ao pedido de €643,34 e se o mesmo vício se verifica relativamente à quantia de €321,48.
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Como se viu a 1.ª instância indeferiu parcialmente o pedido executivo quanto à quantia de €983,95, prosseguindo os autos para cobrança das quantias de €1.040,58 e €94,10, acrescidas dos juros moratórios calculados sobre os valores e desde a data de vencimento das facturas que integram o capital de €964,08 e dos juros compulsórios a contar da data de aposição da fórmula executória calculado sobre o referido capital.
Para tanto, considerou, além do mais, que: “(…) Nos termos do artigo 7.º do DL n.º 269/98 de 1 de Setembro (DL n.º 269/98 de 1 de Setembro) considera-se injunção (…)
Do exposto, resulta que são duas as situações que podem fundamentar o uso deste processo especial: transacções comerciais nos termos do Decreto-Lei n.º 32/2003 de 17 de Fevereiro e o cumprimento de obrigações pecuniárias emergentes de contrato de valor não superior a 15.000 Euros.
Do alegado pela exequente e do requerimento de injunção dado à execução resulta que este foi intentado, no que respeita às facturas referida em cima, não para o cumprimento de obrigação emergente de contrato de valor não superior a 15.000 Euros mas, antes, para fazer valer direitos indemnizatórios concernentes à responsabilidade contratual inerente ao incumprimento do contrato celebrado com o executado.
Estamos, de facto, no âmbito da responsabilidade civil contratual por via do incumprimento que, como decorre do disposto no artigo 2.º c) do DL 32/2003, não pode ser exercida através do procedimento de injunção.
Em suma, estamos perante o uso indevido do procedimento de injunção o que configura
(…)
Assim, não podia a exequente ter-se socorrido do procedimento de injunção para se fazer munir de título executivo relativamente à importância de €643,34 já que o regime processual da injunção “só é aplicável às obrigações pecuniárias directamente emergentes de contratos, pelo que não tem a virtualidade de servir para a exigência de obrigações pecuniárias resultantes, por exemplo, de responsabilidade civil, contratual ou extracontratual”(…)
O procedimento de injunção devia ter sido recusado pela secretaria com fundamento na pretensão nele deduzida não se ajustar à finalidade do procedimento, em conformidade com o que dispõe o art.º 11.º n.º 1 al. h) do Regime Anexo ao Dec. Lei 269/98 de 01/09, na redacção introduzida pelo Dec. Lei 107/2005 de 01/07 ou, não o tendo sido, sempre devia o secretário judicial ter recusado a aposição da formula executória, conforme prevê o art.º 14.º n.º 3 do citado diploma.
E não obstante a questão não tenha sido suscitada no procedimento de injunção pela requerida, nada obsta a que na acção executiva ela possa ser apreciada uma vez que, como vimos, está subjacente o erro na forma de processo o que consubstancia nulidade de todo o processo, e constituiu uma excepção dilatória de conhecimento oficioso que conduz à absolvição da instância – art.ºs 193.º, 576.º, n.º 2, 577.º, n.º 1, al. b) e 578.º do C.P.C. e 14.º-A n.º 2 al. a) do Regime dos Procedimento a que se refere o art.º 1.º do D.L. 269/98 de 1 de Setembro.
E igual conclusão vale para a quantia de €321,48 “a título de indemnização pelos encargos com a cobrança da dívida” pois que tal não deixa de ser um direito indemnizatório concernente à responsabilidade contratual que, como vimos, não pode ser exercido através do mecanismo simplificado da injunção.
Quanto à quantia reclamada com fundamento no disposto no art.º 26.º n.º 3 al. c) do RCP. A liquidação da obrigação de pagamento das custas de parte que o art.º 533.º do CPC faz recair sobre a parte vencida é regulada pelas normas dos art.ºs 25.º e 26.º do RCP, devendo a mesma e a respectiva interpelação ocorrer até ao momento previsto no nº 1 do artigo 25.º do RCP e as que venha a ter direito em virtude da interposição da presente execução apenas são reembolsáveis a final e nos termos do disposto no art.º 541.º do C.P.C. e Regulamento das Custas Processuais. Do que se conclui que carece em absoluto de título a pretensão da exequente de receber a quantia de €19,13 a título de custas de parte previstas no art.º 26.º n.º 3 al. c) do Regulamento das Custas Processuais (…)”.
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Como vimos defende a exequente/apelante que o procedimento injuntivo é um meio adequado para peticionar o pagamento da obrigação resultante da aplicação da cláusula penal acordada para o incumprimento do período de fidelização, dado que tal encargo é uma obrigação pecuniária de valor determinável e resulta da celebração de um contrato de prestação de serviços e respectivo incumprimento; assim como ao montante de despesas peticionadas a título de indemnização pelos custos administrativos e internos associados à cobrança da dívida.
Mas não lhe assiste razão, já que a decisão recorrida adoptou a corrente decisória da maioria da jurisprudência, assim como o nosso entendimento sobre tal questão. Veja-se neste mesmo sentido os Acs. da Relação de Lisboa de 12.05.2015, de 08.10.2015, de 17.12.2015 e de 14.05.2020, desta Relação do Porto de 28.10.2015, de 15.01.2019, e de 7.06.2021, da Relação de Coimbra de 25.10.2016 e da Relação de Évora de 16.12.2010.
Também Salvador da Costa, in “A Injunção e as Conexas Acção e Execução”, pág. 43 refere que se deve “…distinguir consoante a natureza da cláusula penal em causa, isto é, conforme ela foi convencionada a título indemnizatório, para o caso de incumprimento de um contrato, ou com escopo meramente compulsório. Na primeira situação trata-se de indemnização por incumprimento contratual antecipadamente fixada e, consequentemente não pode ser exigida neste tipo de acção ou de procedimento; na segunda situação, em que se está perante uma sanção aplicável sempre que se verifique ou não um facto contratualmente previsto, parece que nada obsta a que o pedido do montante convencionado possa ser objecto da acção ou procedimento em causa.”. Havendo contudo quem, cfr. João Vasconcelos Raposo/Luís Batista Carvalho, in “Injunções e Ações de Cobrança, Quid Juris, 2012, para quem mesmo o accionamento de uma cláusula penal compulsória não deve ser feito por via do procedimento de injunção.
Como é sabido a injunção, enquanto “providência que permite que o credor de uma prestação obtenha de uma forma célere e simplificada um título executivo (…) quando se consubstancie no cumprimento de uma obrigação pecuniária”, surgiu com o DL n.º 404/93 de 10.12, prevendo-se que inexistindo oposição, fosse aposta no requerimento injuntivo uma imediata fórmula executória, “Execute-se”, o que era realizado pelo próprio secretário judicial do tribunal territorialmente competente e não era previsto como acto jurisdicional. A existência de oposição, pelo contrário, implicava a apresentação obrigatória dos autos ao juiz, cfr. art.º 6.º n.º2, passando a observar-se a tramitação prevista para o processo sumaríssimo, com a designação imediata do dia para julgamento.
O DL n.º 404/93 de 10.12 foi revogado pelo DL n.º 269/98 de 1.09, veio aprovar o regime dos procedimentos destinados a exigir o cumprimento de obrigações pecuniárias emergentes de contratos de valor não superior a €5.000,00, posteriormente objecto de alterações que sucessivamente lhe foram sendo introduzidas além do mais, pelo DL n.º 32/2003, de 17.02 – por sua vez revogado e substituído pelo DL n.º 62/2013, de 10.05 e pelo DL n.º 303/2007, de 24.08, que veio elevar para €15.000,00 euros o valor das obrigações pecuniárias abrangidas pelo referido diploma. Baseado no então processo sumaríssimo, mas simplificando-o, passou a prever uma acção declarativa com processo especial para cumprimento de obrigações pecuniárias. Paralelamente aprovou-se o procedimento de injunção, entendido este enquanto providência que tem por fim possibilitar a obtenção de um título com força executiva que possibilite exigir o cumprimento das obrigações a que se refere o artigo 1.º do diploma preambular, ou das obrigações emergentes de transacções comerciais abrangidas pelo DL n.º 32/2003, de 17.02, cfr. art.º 7º do “Regime dos Procedimentos” anexo ao referido DL n.º 269/98 de 1.09. E como se refere expressamente no preâmbulo do DL n.º 269/98, na sua redacção originária, a aprovação desses procedimentos especiais teve em vista, quando aplicáveis às obrigações pecuniárias resultantes de contratos de valor não superior a (euro) €15.000, racionalizar e agilizar o existente “contencioso de massa”.
Depois de várias alterações a tais diplomas legais, desde que o art.º 8.º do DL n.º 32/2003, de 17.02 alterou a redacção do art.º 7.º do DL n.º 269/98, de 1.09, o procedimento da injunção passou a ser utilizável no caso do cumprimento das obrigações a que se refere o art.º 1.º do diploma preambular – obrigações pecuniárias emergentes de contrato – e a obrigações emergentes de transacções comerciais abrangidas pelo DL n.º 32/2003 de 17.02, estas independentemente do valor.
E finalmente desde a entrada em vigor do DL n.º 62/2013 de 10.05, que transpôs para a ordem jurídica nacional a Directiva n.º 2011/7/EU do Parlamento Europeu e do Conselho de 16.02.2011, foi revogado o DL n.º 32/2003 de 17.02, à excepção dos seus art.ºs 6.º e 8.º.
Resulta do DL n.º 62/2013, mormente do seu art.º 10.º, que o procedimento de injunção se mantém independentemente do valor da dívida quando esteja em causa o atraso de pagamento em transacções comerciais, sendo que havendo oposição à injunção, se a obrigação for de valor não superior a metade da alçada da Relação, o processo é remetido à distribuição, seguindo-se a tramitação prevista na acção declarativa especial, cfr. art.º 10.º n.º 4, e se a obrigação for de valor superior a metade da alçada da Relação, o processo é remetido ao tribunal competente e distribuído como acção declarativa na forma comum, cfr. n.º 2 do mesmo preceito.
Preceitua o art.º 7.º a noção de injunção, dizendo que “Considera-se injunção a providência que tem por fim conferir força executiva a requerimento destinado a exigir o cumprimento das obrigações a que se refere o artigo 1.º do diploma preambular, ou das obrigações emergentes de transacções comerciais abrangidas pelo Decreto-Lei n.º 32/2003, de 17 de Fevereiro”. Mas no que ao presente caso diz respeito não se define nos supra referidos diplomas legais o que é “…o cumprimento de obrigações pecuniárias emergentes de contratos…”. Logo há que interpretar a lei civil no seu todo, e concretamente analisar o que consta dos art.ºs 550.º a 558.º, 774.º e 806.º, todos do C.Civil. Da interpretação que se tem feito desses preceitos legais pode concluir-se que as obrigações pecuniárias são uma modalidade de obrigações genéricas, cuja prestação consiste numa quantia em dinheiro; e podem distinguir-se como obrigações de quantidade, se têm por objecto uma pura e simples quantia pecuniária, e como obrigações de moeda específica, se além do montante da prestação, é especificada a moeda nacional em que o pagamento deve ser feito, podendo ainda especificar-se a própria moeda ou o metal da moeda.
Mas não se pode olvidar que a lei refere, se forma talvez lata, “obrigações pecuniárias emergentes de contratos” e assim há que decidir se aqui se subsumem as obrigações pecuniárias de quantidade (dívida em dinheiro) e também as obrigações de valor, ou apenas aquelas. Da letra da lei, a que qualquer intérprete se não deve apenas cingir, nada resulta, assim há que indagar o espírito da lei ou a intenção do legislador por detrás da sua criação. Ora, como acima já se deixou aflorado, o legislador do DL n.º 269/98, perante a realidade existente, ou seja, perante uma “…crescente ocupação dos tribunais como órgãos de reconhecimento e cobrança de dívidas (…) por parte dos grandes utilizadores (…) transformando-os em meras extensões dessas empresas (…)” sentiu necessidade de criar um meio processual, de natureza administrativa, que permitisse ao credor de obrigação pecuniária a obtenção, de forma célere e simplificada, de um título executivo sem contraditório. Logo, atentas estas características de simplicidade, ausência de apreciação judicial, rapidez e fito de descongestionar os tribunais desta litigância em massa, podemos concluir que o legislador se propôs atingir um fim ou um objectivo prático, daí a manifesta simplicidade do procedimento de injunção como resulta do art.º 10.º do DL n.º 269/98, mormente da sua al. e) do n.º1, onde se preceitua que o requerente deve formular o pedido, com discriminação do valor do capital, juros vencidos, o que nos leva a concluir que se trata de obrigações pecuniárias de quantidade ou de soma, isto é, dívidas em dinheiro.
Pelo que em conclusão entendemos que a lei ao expressar “…obrigações pecuniárias emergentes de contratos…” está a referir-se aos tipos de contratos cuja prestação principal, a cargo do devedor, consiste na obrigação pecuniária de quantidade (ou de soma) isto é, dívidas em dinheiro, pondo de parte ou como não subsumível ao procedimento de injunção o cumprimento de obrigações pecuniárias de valor, quer a título de prestação principal, sejam enquanto prestação acessória ou como obrigação com faculdade alternativa a parte creditoris, como sucede com as obrigações emergentes de cláusulas penais, ainda que pecuniárias. Consequentemente, entendemos que é irrelevante a distinção entre cláusulas penais indemnizatórias e cláusulas penais compulsória, pois a cobrança de ambas está arredado do procedimento de injunção, até porque as cláusulas penais não constituem a estipulação de prestações principais de obrigações pecuniárias de quantidade, são sim, cláusulas acessórias que determinam o pagamento de obrigações de valor substitutivas da prestação principal ainda que estabelecidas em quantidade.
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In casu” é evidente que a exequente/apelante lançou mão do procedimento de injunção, que deu à execução nos presentes autos, tendo além de peticionar o pagamento da factura n.º ....., peticionou ainda, não para o cumprimento de obrigação emergente de contrato de valor não superior a €15.000, mas para fazer valer direitos indemnizatórios emergentes de responsabilidade contratual inerente ao incumprimento do contrato celebrado, nos valores de €643,34, no dizer da exequente reportado ao “incumprimento do período mínimo do contrato”, ou seja cláusula penal indemnizatória, e de €321,48, este valor no seu dizer “a título de indemnização pelos encargos com a cobrança da dívida”.
Considerando o que acima se deixou consignado é manifesto que ocorreu quanto àqueles dois valores o uso indevido do procedimento de injunção, o que configura erro na forma de processo e como decorre do art.º 193.º do C.P.Civil, o que constituiu uma excepção dilatória de conhecimento oficioso que conduz à absolvição da instância, cfr. art.ºs 576.º, n.º2, 577.º n.º 1 al. b) e 578.º, todos do C.P.Civil e art.º 14.º-A n.º 2 al. a) do Regime dos Procedimentos a que se refere o art.º 1.º do DL n.º 269/98 de 1.09, e “… importa unicamente a anulação dos actos que não possam ser aproveitados, devendo praticar-se os que forem estritamente necessários para que o processo se aproxime, quanto possível, de forma estabelecida na lei”, todavia, “…não devem aproveitar-se os actos já praticados, se do facto resultar uma diminuição de garantias do réu”. Destarte nenhuma censura nos merece a decisão de 1.ª instância ao indeferir liminar e parcialmente o título executivo dado à execução.
Improcedem as conclusões da exequente/apelante.

Sumário:
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IV – Pelo exposto acordam os Juízes desta secção cível em julgar a presente apelação improcedente, e consequentemente, confirma-se a decisão recorrida.

Custas pela exequente/apelante.


Porto, 2022.09.27
Anabela Dias da Silva
Ana Lucinda Cabral
Rodrigues Pires