Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
67/13.1TMPRT-F.P1
Nº Convencional: JTRP000
Relator: FÁTIMA ANDRADE
Descritores: RESPONSABILIDADES PARENTAIS
ALTERAÇÃO
REAPRECIAÇÃO DA MATÉRIA DE FACTO
CONCLUSÕES
GUARDA ALTERNADA DO MENOR
AUDIÇÃO DO MENOR
Nº do Documento: RP2018012467/13.1TMPRT-F.P1
Data do Acordão: 01/24/2018
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: REVOGADA
Indicações Eventuais: 5ª SECÇÃO, (LIVRO DE REGISTOS N.º 667, FLS.271-296)
Área Temática: .
Sumário: I - Visando as conclusões de recurso delimitar o seu próprio objeto, é exigível que no mínimo das mesmas conste de forma clara quais os pontos de facto que o recorrente considera incorretamente julgados, sob pena de rejeição do mesmo.
II - Na reapreciação da matéria de facto o tribunal da Relação fazendo uso dos seus poderes de livre apreciação dos meios de prova, deve alterar o decidido pelo tribunal a quo quando verifique erro de julgamento.
III - Nas decisões a proferir em sede de regulação das responsabilidades parentais ou alteração destas, é critério norteador das mesmas o interesse do menor.
IV- O regime de guarda ou residência alternada deve ser alterado quando pela presente conflitualidade entre os progenitores que assumem modelos educativos não convergentes, estes se mostram incapazes de dialogar e assim assegurar a estabilidade emocional do menor.
V- A opinião de uma menor com 13 anos, de acordo com a maturidade que evidencia, deve ser ouvida e ponderada na decisão sobre o regime de visitas a estabelecer.
Reclamações:
Decisão Texto Integral: Processo nº. 67/13.1TMPRT-F.P1
3ª Secção Cível
Relatora – Juíza Desembargadora M. Fátima Andrade
Adjunto - Juiz Desembargador Oliveira Abreu
Adjunto - Juiz Desembargador António Eleutério
Tribunal de Origem do Recurso - Tribunal Judicial da Comarca do Porto – Jz. de Família e Menores do Porto
Apelante/ B…
Apelado/ C…

Relatora: Juíza Desembargadora M. Fátima Andrade
1º Adjunto: Juiz Desembargador Oliveira Abreu
2º Adjunto: Juiz Desembargador António Eleutério
Sumário (artigo 663º nº 7 do CPC):
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Acordam no Tribunal da Relação do Porto
I- Relatório
B…, melhor id. a fls. 4, na qualidade de progenitora dos menores D… e E… instaurou a presente ação de alteração da regulação do exercício das responsabilidades parentais contra C…, igualmente melhor id. a fls. 4, pedindo a final e no que tange à menor D… que se mantenham as visitas acordadas no processo principal, sem pernoitas com o pai, todavia, por a estas se recusar a menor; quanto ao menor E… requerendo no mesmo conspecto a redução ou igualmente a eliminação das pernoitas com o pai requerido.
Para tanto e em suma alegou:
- que no quadro do conflito vivenciado pelos progenitores a menor D… tem vindo a rejeitar as pernoitas com o pai, a tal se recusando nos últimos tempos de forma firme e decidida, evidenciando sintomas de profunda ansiedade negativa. Sendo a menor acompanhada tecnicamente pela psicóloga do estabelecimento escolar que frequenta, bem como pelo gabinete de apoio à vítima do Porto;
- o requerido não lida com estas situações de forma correta, pressionando e criticando a menor D…;
- quanto ao menor E…, embora pela sua idade vivencie com mais defesas este conflito, sofre em silêncio;
- é na companhia da mãe que estas crianças se sentem mais tranquilas, livres, alegres e felizes.
Citado o requerido, alegou em suma não ter fundamento sério o requerido, por tal solicitando o imediato arquivamento do processo (nos termos do 182º nº 4 da OTM então ainda em vigor).
No mais alegou ser exclusivamente imputável à requerente a situação pela mesma relatada que nunca aceitou que os menores passassem tanto tempo em casa do pai. Inexistindo fundamentos para a pretendida alteração.
Concluindo a final pela improcedência da requerida alteração.
Designada dia para a conferência de pais, não se logrou obter acordo, tendo sido decidido provisoriamente manter o regime provisório já fixado «nas decisões de fls. 243/244 e 434 dos autos apensos sob a letra “D”», tendo os autos ficado a aguardar «os relatórios dos exames solicitados naquele apenso».
Junto o relatório social relativo à menor D… (fls. 45 a 55) foi agendada nova conferência na qual estiveram presentes os progenitores e a menor D…, bem como o técnico da SS que elaborou o relatório de fls. 45 a 55 que ali foram ouvidos (ata de fls. 57 a 60).
Atentas as diversas diligências já levadas a cabo no âmbito do “incidente de incumprimento” e por se considerar inútil o “recurso à mediação ou audição de técnica especializada nos termos do artigo 38º do RGPTC” foi determinada a notificação das partes para os fins do artigo 39º 4 do RGPTC [RGPTC que entretanto entrou em vigor com aplicação aos processos em curso, tal como disposto no artigo 5º da Lei 141/2015 de 08/09 que aprovou o referido RGPTC].
Tendo ainda os progenitores acordado em tal conferência em fixar o seguinte regime provisório (em causa apenas a menor D…) que pelo tribunal foi homologado:
“ A jovem, durante um mês (até 15 de Outubro), deverá estar com o progenitor às quintas-feiras, desde o final das atividades letivas e jantar com este, e aos sábados, a partir da hora de almoço; as pernoitas serão em casa da mãe,
Após a data supra fixada, o regime de visitas provisoriamente fixado será retomado.”
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Apresentaram as partes alegações nas quais e em suma a requerente pugnou pela alteração do regime em vigor nos termos por si inicialmente indicados quanto à menor D…. O requerido por sua vez, pugnou pela improcedência da requerida alteração.
Procedeu-se à realização de audiência de discussão e julgamento - julgamento conjunto com o incidente de incumprimento deduzido pelo progenitor aqui requerido e que correu seus termos sob o apenso D), após o que:
- foi proferida sentença única neste apenso F decidindo não só o objeto deste processo mas também do mencionado apenso D;
- foi julgada extinta a instância relativamente a E…, atenta a maioridade pelo mesmo atingida em 07/05/2017, “por impossibilidade superveniente da lide relativamente ao pedido de alteração do regime de convívios com o progenitor referente ao mesmo”.
Sentença em que o tribunal a quo decidiu:
“julgar verificado o incumprimento e condenar a progenitora na multa de €250,00;
- julgar improcedente a peticionada alteração da regulação das responsabilidades parentais.”.
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Do assim decidido apelou a requerente B… (fls. 264 e segs.), oferecendo alegações e formulando as seguintes
Conclusões:
- A douta sentença recorrida violou os artigos 1906º do CC e 40º e 42º do RGPTC;
2ª – A douta sentença recorrida devia ter dado resposta positiva, pelo menos, aos pontos 1 a 14 dos factos dados como não provados;
3a- Impõe-se, assim, tal resposta positiva face às declarações das testemunhas F…, G…, H…, I…;
4ª- O mesmo acontecendo com as declarações da menor, cuja reaudição se impõe no sentido da conclusão da resposta positiva aos mesmos factos;
5ª- A douta sentença recorrida ignorou, completamente, a apreciação crítica das testemunhas F…, G…, H…, I…;
6ª - Em arrepiante desprezo pela prova testemunhal produzida pelas testemunhas referidas;
Termos em que deve o presente recurso ser julgado procedente e provado e após a reanálise da prova testemunhal produzida e da apreciação crítica do relatório do IML à luz das mesmas testemunhas e conclusões; ser julgado a presente ação de alteração do exercício das responsabilidades parentais provada e procedente.
Atendendo-se, igualmente, ao superior interesse da menor e ao seu cristalino depoimento e vontade.
Em consequência ser a douta sentença revogada e substituída por outra que ponha cobro às pernoitas, como peticionado, com as legais consequências, e, bem assim, julgado improcedente e não provado o incidente de incumprimento deduzido.”
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Foram apresentadas contra-alegações pelo requerido onde em suma:
- alegou não ter a recorrente cumprido o ónus contido na al. a) do nº 2 do artigo 640º do CPC a implicar que o recurso restrito à reapreciação da matéria de facto deverá ser imediatamente rejeitado na sua totalidade;
- no mais pugnou pelo bem decidido pelo tribunal a quo e consequentemente pela improcedência do recurso.

Respondeu ainda o MºP ao recurso de B… em suma alegando ter aceite a sentença sob recurso, não obstante “ter efetuado outra leitura jurídica da matéria discutida em audiência de julgamento, aliás expressa nas alegações proferidas a final”.
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O recurso foi admitido como de apelação, com subida nos próprios autos e efeito meramente devolutivo.
Foram colhidos os vistos legais.
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II- Âmbito do recurso.
Delimitado como está o recurso pelas conclusões das alegações, sem prejuízo de e em relação às mesmas não estar o tribunal sujeito à indagação, interpretação e aplicação das regras de direito, nem limitado ao conhecimento das questões de que cumpra oficiosamente conhecer – vide artigos 5º n.º 3, 608º n.º 2, 635º n.ºs 3 e 4 e 639º n.ºs 1 e 3 do CPC [Código de Processo Civil] – resulta das formuladas pela apelante serem as seguintes as questões a apreciar:
1) erro quanto ao julgamento de facto e nesta matéria e, como questão prévia suscitada pelo recorrido/requerido, observância dos ónus de impugnação da recorrente.
2) erro na aplicação do direito.
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III- Fundamentação
Foram dados como provados os seguintes factos:
1. D… nasceu em 10/04/2004 e é filha de C… e de B…;
2. Os progenitores casaram em 1998, altura em que o progenitor trabalhava em Madrid, onde permanecia de segunda a quinta-feira;
3. A partir de 2001, o progenitor passou a exercer a sua atividade em Londres, o que se manteve durante cerca de cinco anos, tendo a progenitora e os menores acompanhado o progenitor;
4. A partir de 2005, a família instalou-se em Paris, situação que se manteve até ao final de 2007;
5. Em 2008, passaram a residir em Portugal;
6. Até essa altura, e porque não trabalhava, era a progenitora quem se ocupava primordialmente dos filhos;
7. O progenitor intentou ação de regulação das responsabilidades parentais em 11/03/2011, peticionando que a residência da D… fosse fixada alternada e semanalmente com cada um dos progenitores;
8. A progenitora opôs-se ao requerido, pugnando pela fixação da residência da D… junto de si, com fins de semana quinzenais com o progenitor, de sexta-feira a domingo;
9. Em 15/06/2011 procedeu-se à conferência então prevista no artigo 175º da OTM, não tendo sido possível o acordo dos progenitores; nessa data, foi fixado um regime provisório referente às férias de verão, nos termos do qual o período de férias foi dividido em períodos sensivelmente iguais por ambos os progenitores;
10. Após esse período de férias, a D… descreveu vivências positivas durantes as férias com ambos os progenitores, relatando convívios com elementos da família alargada paterna e materna;
11. Por despacho de 15/09/2011 foi determinado que se mantivesse a lógica de alternância e repartição de tempos de convívio da D… com os progenitores constante do despacho que fixou o regime provisório;
12. Em 07/11/2011 procedeu-se a nova conferência de progenitores, não tendo sido possível o acordo entre os mesmos;
13. Foi realizada mediação familiar no PIAC, não tendo sido possível o acordo dos progenitores;
14. Nessa altura, a D… residia com ambos os progenitores, numa alternância de oito noites com a mãe e seis noites com o pai;
15. Em 19/06/2012 o Tribunal procedeu à audição da D…, que verbalizou, para além do mais, que gostaria que as visitas ao progenitor fossem realizadas aos fins de semana, de quinze em quinze dias, entre sexta e segunda-feira;
16. Em outubro de 2012, a progenitora reduziu, unilateralmente, o período que a D… permanecia com o pai;
17. Por despacho de 04/12/2012 foi fixado regime provisório, nos termos do qual a residência da D… foi fixada junto da mãe, permanecendo com o pai, em semanas alternadas, desde terça-feira no final das atividades escolares, até domingo às 20h30;
18. Em 26/06/2014 os progenitores acordaram na fixação do regime descrito em 12., o qual foi homologado por sentença;
19. A partir de meados de setembro de 2014, a D… passou a verbalizar ao progenitor que tinha medo de dormir sozinha, que se sentia tonta, cansada e enjoada;
20. Nessa altura, a D… apresentava crises de ansiedade e ataques de pânico, queixando-se de “dores no coração”, “tremuras” e “falta de ar”;
21. Inicialmente, as queixas verbalizadas pela D… não foram valorizadas pelo progenitor, que as interpretou como uma estratégia utilizada pela progenitora para fundamentar a alteração do regime de convívios, atitude de que se arrepende;
22. Nesses momentos, a D…. trocava mensagens por telemóvel com a progenitora e uma tia materna, de nome J…, nas quais dava conta do seu desconforto e da vontade de ir para junto da mãe;
23. A progenitora apoiava a D… e incitava-a a dizer ao pai e à avó que queria ficar com a mãe, mesmo perante a afirmação da D… de que não podia dizer isso ao pai;
24. a tia materna da menor, que é praticante de “Reiki”, tentava, através dessa filosofia, transmitir força à D…, referindo-se aos ensinamentos do seu professor de “Reiki” e a um anjo da guarda a quem a menor chama “pai K…”;
25. as crises referidas em 15. ocorriam igualmente em casa da progenitora (onde dormia num colchão ao lado da cama da mãe) e em pelo menos uma viagem de estudo no âmbito da escola que frequentava;
26. a ocorrência de tais crises expressa a dificuldade da D… em se adaptar às alterações sofridas no seu enquadramento familiar, tais como o divórcio dos pais, o conflito entre os progenitores, a alteração da sua rotina com permanência alternada em casa de ambos os progenitores, a alteração na composição dos agregados familiares, com o novo relacionamento da progenitora e o nascimento de um irmão mais novo e a partilha mais frequente de períodos de tempo com a família paterna;
27. a cristalização deste quadro de sintomas foi potenciado quer pela reação do progenitor, que não valorizou inicialmente as suas queixas, quer pela reação da progenitora e do agregado familiar materno, que manteve nestas alturas uma comunicação constante com a D…, passível de estimular a sintomatologia por si sentida;
28. Em 03/11/2014 a progenitora comunicou ao progenitor que, por força dos ataques de pânico e de ansiedade que a D… vinha sofrendo, acompanhados de choro, febre e dores, não entregaria a D…. ao progenitor no dia seguinte;
29. No dia 04/11/2014, quando o progenitor se deslocou à escola frequentada pela menor para a levar consigo, a D… não o acompanhou, tendo-se deslocado da escola na companhia da progenitora, da avó materna e de uma tia materna;
30. Em 12/11/2014 a progenitora solicitou o acompanhamento da D… junta da APAV (Gabinete de Apoio à Vítima), onde passou a ser acompanhada, acompanhamento que se manteve até setembro de 2016, altura em que se mostravam já ultrapassadas as crises de ansiedade sofridas pela D…;
31. Por despacho de 18/11/2014 foi determinado que o regime de visitas se processasse nos moldes anteriormente determinados, mas sem pernoitas, vontade que a D… expressou perante a Psicóloga que então exercia funções neste Tribunal;
32. Em fevereiro de 2015 a D… foi de férias para a neve com o pai, não tendo apresentado qualquer sintomatologia de ansiedade relativamente às pernoitas;
33. em junho de 2015, no âmbito de um arrolamento requerido pelo progenitor, foi realizada diligência em casa da progenitora, a qual consentiu que o progenitor entrasse na casa;
34. nessa altura, a D… encontrava-se em casa por estar doente;
35. por despacho de 14/07/2015 foi determinada a realização de mediação familiar e acompanhamento psicológico, em entidade a indicar pelo ISS;
36. o acompanhamento psicológico da D… pelo PIAC (Programa Integrado de Apoio à Comunidade) não se concretizou, por a D… manter acompanhamento psicológico na APAV, tendo aquele organismo considerado contraindicada a ocorrência de dois processos de acompanhamento psicológico em simultâneo;
37. a mediação também não se concretizou, por a progenitora ter recusado participar em sessões conjuntas com o progenitor;
38. em 14/10/2015 o Tribunal procedeu a nova audição da D…, onde esta afirmou que não consegue verbalizar o motivo do que sente (ansiedade, suores frios e tremores) quando tem de dormir em casa do pai, só conseguindo adormecer às quatro da manhã;
39. em janeiro de 2016, num período de convívio com o progenitor em casa deste, o progenitor questionou a D… acerca de alguns atrasos da mesma à chegada ao Colégio, ao que esta retorquiu que os atrasos se deviam ao facto de andar cansada por ao fim de semana se ter de levantar cedo para ir para casa do pai;
40. o progenitor reagiu ralhando e berrando com a D…, tendo-lhe transmitido que, de castigo, não iria jantar com amigas na sexta-feira seguinte;
41. a avó paterna da D…, que se encontrava presente, afirmou, dirigindo-se à D…, que não era resposta que se desse ao pai, e que se fosse sua filha levava duas bofetadas;
42. a tia paterna da D…, L…, que presenciou igualmente a conversa, disse aos seus filhos que não toleraria que tivessem atitude semelhante com o pai;
43. na sequência de tais factos, a D…, a chorar, telefonou à mãe para a ir buscar, o que veio a ocorrer;
44. a progenitora permitiu que a D… fosse jantar com as amigas na sexta-feira seguinte;
45. no dia seguinte a tal discussão, a D… não foi para casa do pai, mantendo-se a ausência de contacto presencial até 15/09/2016;
46. nesse período, a progenitora delegou na menor a decisão de manter ou não contactos com o progenitor;
47. em 15/09/2016, o Tribunal procedeu a nova audição da D…, tendo esta verbalizado não pretende retomar os contactos com o pai;
48. nessa data, os progenitores acordaram fixar o seguinte regime provisório:
A D…, durante um mês (até 15 de outubro) deverá estar com o progenitor às quintas-feiras, desde o final das atividades letivas e jantar com este, e aos sábados, a partir da hora de almoço; as pernoitas serão em casa da mãe; Após a data supra fixada, o regime de visitas provisoriamente fixado será retomado;
49. após 15 de outubro de 2016, o regime provisório fixado não foi retomado, tendo a D… recusado acompanhar o progenitor;
50. por despacho de 31/10/2016 foi determinado que a execução do regime provisório fixado fosse acompanhada por técnico da Segurança Social;
51. a D… continuou a recusar acompanhar o progenitor, não tendo o referido técnico logrado reverter a situação;
52. após tal recusa, a D… vem mantendo contactos esporádicos com o progenitor, em moldes sugeridos pela mesma, que envolvem, nomeadamente, refeições em restaurantes e idas ao centro hípico onde a D… tem um cavalo;
53. o progenitor assume um estilo educativo caracterizado pela elevada exigência relativamente ao comportamento dos filhos, estabelecendo regras, horários e rotinas e recorrendo a castigos quando existem comportamentos que reputa desadequados;
54. a progenitora assume um estilo educativo mais permissivo, tendo dificuldade em dizer que não à D…;
55. apresenta igualmente um estilo parental sobreprotetor, que se caracteriza por uma sobreproteção dos filhos, observada através de elevada preocupação com potenciais perigos para o seu bem-estar e por uma permanente disponibilidade para a resolução dos problemas dos filhos;
56. desvaloriza o contexto familiar paterno como importante para o desenvolvimento dos seus filhos, destacando o seu contexto familiar como aquele que desempenha o papel central na vida dos mesmos;
57. os progenitores representam-se reciprocamente de forma negativa, expressando afetos negativos em relação um ao outro, o que influencia negativamente a relação da D… com o progenitor;
58. a progenitora encara a pretensão do progenitor de manter o regime de convívios fixado como uma vingança do progenitor, que se traduzirá em pretender privá-la de tempo com os filhos;
59. a comunicação entre os progenitores limita-se à troca de e-mails;
60. a D… demonstra um conhecimento aprofundado dos conflitos entre os progenitores no tocante à regulação das responsabilidades parentais;
61. denota hipermaturidade em relação aos conflitos relacionados com a sua situação familiar, a qual é frequente em crianças que são obrigadas a adaptarem-se a situações familiares complexas, para as quais os seus recursos pessoais são insuficientes;
62. em sede de audição, nomeadamente pela psicóloga que então exercia funções neste Tribunal, denota receio que a verbalização que faça dos seus sentimentos e vivências possa levar a que o Tribunal mantenha o regime inicialmente fixado;
63. a D… não pretende restabelecer o regime de convívios fixado, pretendendo antes a fixação de um regime que lhe permita conviver com o pai quando e como quiser;
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64. de acordo com o regime vigente relativamente a alimentos, homologado por sentença de 26/06/2014, as despesas de saúde, médicas, medicamentosas e de educação (incluindo explicações) são suportadas em partes iguais pelos progenitores;
65. a D… e o seu irmão frequentam a “M…”;
66. a progenitora é administradora da empresa “N…, S.A.”.
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O tribunal a quo deu ainda como não provada a seguinte factualidade:
“1. que, na pendência do casamento entre os progenitores, o progenitor nunca prestou qualquer atenção aos filhos e nunca os acariciava ou brincava com eles, nunca lhes mudou uma fralda ou contou uma história;
2. que durante a sua estadia em Londres, o progenitor estava frequentemente fora e ausente de casa cinco dias seguidos;
3. Que a D… sempre demonstrou um forte desagrado face ao regime de convívio estabelecido provisoriamente, por o progenitor ser uma pessoa muito ocupada a nível profissional e, porque quando estava com o pai, ficava com a avó paterna;
4. Que em data anterior a 26/06/2014, a D…, nos dias que antecediam a sua entrega ao progenitor, mostrava grande tristeza e tentava por todos os meios evitar essa entrega;
5. Que a requerida tudo fazia para persuadir a D… de que a convivência com o progenitor era essencial, e que deveriam manter com ele e com a avó paterna uma relação sã;
6. Que os sintomas apresentados pela D… e referidos em 14. e 15. Dos factos provados se manifestavam sobretudo nos períodos que antecediam os convívios com o progenitor;
7. Que aquando duma dessas crises da menor, o progenitor e a avó paterna a fecharam numa sala gritando-lhe que parasse de fingir;
8. Que eram repetidas as vezes em que a D… era presa pelo requerente e pela avó paterna em salas ou quartos, onde lhe gritavam incessantemente;
9. Que durante essas discussões, a avó paterna apertava com as mãos os braços da D…;
10. Que a requerida sempre foi tentando persuadir a D… de que os convívios com o progenitor eram necessários e úteis e que deveria deles tirar o melhor partido possível;
11. Que a menor passou a ter ataques de febre e dores abdominais nos dias que antecediam os convívios com o progenitor;
12. Que quando a D… verbalizava ao progenitor o seu desagrado face aos períodos de convívio com o mesmo, este afirmava que iria arranjar meios de retirar a guarda à progenitora ou que se iria embora para Londres e não quereria saber mais da D…;
13. Que em janeiro de 2016, aquando dos factos referidos em 27. e ss dos factos provados, o progenitor disse à D… “És um lixo”, “És uma mentirosa”, “Devias ter vergonha”, “mal-educada”, “És uma pessoa sem escrúpulos”;
14. Que, na mesma altura, o progenitor levantou a mão para bater na D….”
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Conhecendo.
Cumpre, em primeiro lugar apreciar do invocado erro na apreciação da prova e assim na decisão da matéria de facto e como questão prévia: observância por parte da recorrente do ónus de alegação e especificação a que alude o artigo 640º do CPC e em caso negativo, consequente rejeição de tal reapreciação.
Estando em causa a impugnação da matéria de facto, obrigatoriamente e sob pena de rejeição deve o recorrente especificar (vide artigo 640º n.º 1 do CPC):
“a) Os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados;
b) Os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida;
c) A decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas”.
No caso de prova gravada, incumbindo ainda ao recorrente [vide n.º 2 al. a) deste artigo 640º] “sob pena de imediata rejeição do recurso na respetiva parte, indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda o seu recurso, sem prejuízo de poder proceder à transcrição dos excertos que considere relevantes”.
Importa ainda ter presente que é ónus do recorrente apresentar a sua alegação e concluir de forma sintética pela indicação dos fundamentos por que pede a alteração ou anulação da decisão – artigo 639º n.º 1 do CPC - na certeza de que estas têm a função de delimitar o objeto do recurso conforme se extrai do n.º 3 do artigo 635º do CPC.
Assim e sem prejuízo das situações de conhecimento oficioso que impõem ao tribunal da Relação, perante a violação de normas imperativas, proceder a modificações na matéria de facto, estão estas dependentes da iniciativa da parte interessada tal como resulta deste citado artigo 640º do CPC.
Motivo por que e tal como refere António S. Geraldes in “Recursos no Novo Código do Processo Civil, 2ª ed. de 2014 Almedina, em anotação ao artigo 662º do CPC, p. 238 “à Relação não é exigido que, de motu próprio, se confronte com a generalidade dos meios de prova que estão sujeitos à livre apreciação e que, ao abrigo desse princípio, foram valorados pelo tribunal de 1ª instância, para deles extrair, como de se tratasse de um novo julgamento, uma decisão inteiramente nova. Pelo contrário, as modificações a operar devem respeitar em primeiro lugar o que o recorrente, no exercício do seu direito de impugnação da decisão de facto, indicou nas respetivas alegações que servem para circunscrever o objeto do recuso. Assim o determina o princípio do dispositivo (…)”.
Atendendo precisamente à finalidade das conclusões e em obediência ao disposto no artigo 639º nº 1 do CPC, é exigível no mínimo que destas conste de forma clara quais os pontos de facto que o recorrente considera incorretamente julgados, sob pena de rejeição do mesmo.
Embora na jurisprudência se encontrem posições mais ou menos exigentes quanto aos elementos que das conclusões devem constar, este é um denominador mínimo comum a todas elas [fazendo uma resenha alargada desta temática vide Ac. TRG de 07/04/2016, Relator José Amaral in www.dgsi.pt/jtrg; vide igualmente Abrantes Geraldes in ob. cit., em anotação ao artigo 640º, nota 5 – p. 135, bem como Acs. STJ de 01/10/2015, Relatora Ana Luísa Geraldes, de 22/09/2015, Relator Pinto de Almeida, de 29/10/2015 Relator Lopes do Rego e de 06/12/2016 Relator Garcia Calejo, todos in www.dgsi.pt ].
Sempre tendo de constar se não das conclusões, pelo menos do corpo das alegações os demais elementos exigidos.
Sobre a parte interessada na alteração da decisão de facto recai portanto o ónus de alegação e especificação dos concretos pontos de facto que pretende ver reapreciados; dos concretos meios de prova que impõem tal alteração e da decisão que a seu ver sobre os mesmos deve recair, sob pena de rejeição do recurso [artigo 640º n.º 1 als. a) a c)].
Bem como e no caso de prova gravada, a indicação das passagens da gravação em que se funda o recurso, entendendo-se para o efeito suficiente a “fixação eletrónica/digital” bem como a transcrição pelo recorrente dos “excertos que entenda relevantes de forma a permitir a reanálise dos factos e o contraditório”.
Tendo presentes estes considerandos e revertendo ao caso concreto, verifica-se desde logo que nas conclusões de recurso a recorrente indica como factos que julga padecerem de erro de julgamento os factos 1 a 14 dos factos não provados e que declara deveriam ter merecido resposta positiva, ou seja deveriam ser dados como provados [vide conclusões 2ª e 3ª].
Mais indica os meios de prova que impõem conclusão diversa – os depoimentos de F…, G…, H… e I… e ainda as declarações da menor - [vide conclusões 3ª a 6ª], tendo nas respetivas alegações transcrito, em parte, as declarações das mencionadas testemunhas e menor, bem como indicado não só a data da gravação, como o período da gravação e minutos aos mesmos correspondentes.
Em função de cujos depoimentos pugna pela alteração da resposta dada aos factos em questão.
Os ónus de alegação e especificação referidos nas als. a) e c) do n.º 1 do artigo 640º do CPC encontram-se por tanto claramente observados e introduzidos nas conclusões de recurso.
Igualmente resultam observadas as demais obrigações de especificação dos meios probatórios que impõem decisão diversa, com especificação das exatas passagens de gravação onde a recorrente entendeu ser de recorrer às provas gravadas.
Tendo nas respetivas alegações de recurso, a recorrente transcrito os depoimentos testemunhais e especificado por referência aos vários trechos que foi transcrevendo os minutos a que se reporta.
De tais depoimentos, sobre os quais fez apreciações concretas ainda que muito breves tendo concluindo nos termos requeridos.
Impõe-se assim concluir que a recorrente cumpriu os ónus de alegação e especificação que lhe são impostos pelo artigo 640º n.º 1 – als. a), b) e c) - e nº 2 al. a) do CPC, consequentemente se admitindo a pretendida reapreciação da prova produzida por referência a estes pontos da matéria de facto – factos não provados 1 a 14.
Diversamente, observa-se, assim não ocorre para os factos “23 e 26” ou “23 a 26” a que a recorrente aludiu no início das suas alegações, mas sobre os quais após não teceu quaisquer considerações, não indicou sequer o sentido decisório que reputava como correto e finalmente não os incluiu nas conclusões.
Motivo porque e quanto a estes pontos de facto - “23 e 26” ou “23 a 26” - se rejeita a sua apreciação (a entender-se que esta era com efeito a vontade da recorrente).
Isto sem prejuízo, naturalmente, da coerência dos factos provados que se impõe a este tribunal de recurso assegurar, em função das eventuais alterações na decisão de facto que decorrerem da apreciação dos factos impugnados (vide 662º nº 1 do CPC).
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Na reapreciação da matéria de facto – vide nº 1 do artigo 662º do CPC - a modificação da decisão de facto é um dever para a Relação, se os factos tidos como assentes, a prova produzida ou a junção de documento superveniente impuser diversa decisão.
Tendo presente que o princípio da livre apreciação das provas continua a ser a base, nomeadamente quando em causa estão documentos sem valor probatório pleno; relatórios periciais; depoimentos das testemunhas e declarações de parte [vide art.ºs 341º a 396º do Código Civil (C.C.) e 607º, n.ºs 4 e 5 e ainda 466.º, n.º 3 (quanto às declarações de parte) do C.P.C.], cabe ao tribunal da Relação formar a sua própria convicção mediante a reapreciação dos meios de prova indicados pelas partes ou que se mostrem acessíveis. Fazendo ainda [vide António S. Geraldes in “Recursos no Novo Código do Processo Civil, 2ª ed. 2014, anotação ao artigo 662º do CPC, págs. 229 e segs. que aqui seguimos como referência]:
- uso de presunções judiciais – “ilações que a lei ou julgador tira de um facto conhecido para afirmar um facto desconhecido” (vide artigo 349º do CC), sem prejuízo do disposto no artigo 351º do CC, enquanto mecanismo valorativo de outros meios de prova;
- ou extraindo de factos apurados presunções legais impostas pelas regras da experiência em conformidade com o disposto no artigo 607º n.º 4 última parte (aqui sem que possa contrariar outros factos não objeto de impugnação e considerados como provados pela 1ª instância);
- levando em consideração, sem dependência da iniciativa da parte, os factos admitidos por acordo, os provados por documentos ou por confissão reduzida a escrito por força do disposto no artigo 607º n.º 4 do CPC (norma que define as regras de elaboração da sentença) ex vi artigo 663º do CPC (norma que define as regras de elaboração do Acórdão e que para o disposto nos artigos 607º a 612º do CPC remete, na parte aplicável).
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Tendo presentes estes considerandos, cumpre apreciar a pretensão da recorrente validamente deduzida – introdução dos factos não provados 1 a 14 nos factos provados.
Invoca em favor da sua pretensão, os depoimentos das testemunhas e declarações acima elencadas.
Foi ouvida toda a prova produzida em audiência de discussão e julgamento – testemunhal; declarações de requerente e requerido; dos menores D… e E… (este entretanto atingiu a maioridade); esclarecimentos do perito Carlos Peixoto [que subscreveu os relatórios do INML de fls. 510 e segs. (relativo à D…), de fls. 519 e segs. relativo à requerente B… e de fls. 526 e segs. relativo ao requerido C… – apenso D] como forma de assegurar uma melhor perceção do litígio e assim da reapreciação da matéria de facto.

i - Procurando fazer um primeiro enquadramento da prova por nós ouvida e que aliás apenas confirma o que já resultava quer dos articulados quer do já longo processado [deste apenso F (alteração do exercício das responsabilidades parentais que deu entrada em 27/01/2015 pela mão da progenitora); apenso D (Incidente de incumprimento instaurado pelo progenitor em 28/10/2014) e ainda apenso A (Regulação das Responsabilidades Parentais previamente instaurada pelo progenitor em 12/03/2011)] com tradução na factualidade provada, é evidente o pendente conflito que ainda acompanha estes ex-cônjuges (reportamo-nos ao período pós-separação), progenitores da menor D….
Conflito – pessoal - que estes progenitores não mostraram na pendência destes apensos D e F ter a capacidade de separar do exercício das responsabilidades parentais como forma de obviar ou minimizar os conflitos que também esta relação causa, já que se representam ambos de forma negativa, expressando afetos negativos em relação um ao outro, o que afeta negativamente a relação da D… com o progenitor (vide 57 dos factos provados); demonstrando a D… um conhecimento aprofundado dos conflitos entre os progenitores no tocante à regulação das responsabilidades parentais (60) dos factos provados.
Isto mesmo foi aliás referenciado nos relatórios do INML de fls. 510 e segs. (do apenso D), nomeadamente do Relatório de fls. 510 e segs. respeitante à menor D… – cujo processo avaliativo decorreu em 3 sessões realizadas entre 11/11/2015 e 13/01/2016, acrescido de uma nova sessão em 26/01/2016 por iniciativa da menor (vide fls. 511 do apenso D) de cujas “Conclusões” consta: “Do ponto de vista psicoafectivo a D… evidencia sinais de hipermaturidade e de instabilidade afetiva, sobretudo manifestada através de episódios de pânico. Conforme já referimos anteriormente entendemos que esta sintomatologia estará relacionada e catalisada pelo conflito permanente entre os progenitores” e “saliente-se que ao longo do presente processo avaliativo observamos que persiste um elevado grau de conflitualidade entre os progenitores da D… o que na nossa opinião tem prejudicado o sucesso do atual regime de regulação das responsabilidades parentais (…)” [entendida “hipermaturidade” como a “aquisição precoce na análise e resolução de problemas e conflitos, sobretudo aqueles que dizem respeito à sua situação familiar, adotando esquemas e estratégias do pensamento que são atípicos da sua faixa e etária e muito mais caraterísticos do pensamento adulto” – vide fls. 514 verso].
Do mesmo Relatório do INML consta (entre o mais) ainda que a D… referiu:
- ter começado cerca de um ano antes (portanto meados de 2014 de acordo com a indicação da menor) a sentir-se mal quando estava a dormir em casa do pai e apenas ali;
- que nessas ocasiões o pai gritava com ela dizendo ser uma “fingida”;
- ter ido de férias com o pai em fevereiro de 2015 na neve, altura em que muito embora sentindo alguma ansiedade, “se sentiu bem porque estava com amigos”;
- na sua relação com o pai, gritar este muito com ela quando está sozinho, sempre a dizer “que está desiludido com ela” e que “ela é manipulada pela mãe”;
- que no episódio de 26/01/16 o pai disse que “era lixo e que saía à minha mãe”.
E mais consta na “Avaliação psicológica” que o pai da D… referiu ao perito que nessa altura interpretou os medos/preocupações “como comportamentos intencionais e induzidos pela mãe no sentido de obstaculizar os seus contactos com a filha”, admitindo então (perante o perito) não ter lidado de forma eficaz e adaptada com as queixas da D… (fls. 514 apenso D)
Revertendo agora ao Relatório do INML relativo ao progenitor da menor elaborado (fls. 526 e segs., tendo o processo avaliativo decorrido em 3 sessões entre 11/11/15 e fevereiro de 2015) e em consonância com o acima referido no Relatório da menor, consta o arrependimento declarado pela desvalorização dos sintomas da menor manifestados, relativos ao medo de dormir e de não querer dormir sozinha.
Sobre o episódio de 21/01/16 tendo ainda referido (para além do mais), de acordo com o mesmo relatório que naquele momento e perante a resposta da D… se “terá exaltado” e lhe “terá dito que ela estaria a mentir (…)”
Sobre este evento tendo ainda dito que “mesmo com os problemas que têm existido e com o facto de a D… não querer dormir em sua casa, não poderá tolerar estes comportamentos da sua filha”. Tendo acrescentado que o “modelo educativo que adota implica o cumprimento de regras e horários e que em casa da mãe sabe que isto não acontece e por esta razão, o estilo educativo que adota não será o mais apelativo para a D…” (fls. 528 verso).
As referências acima extratadas são relevantes para apreciar a factualidade objeto de recurso [factos 1 a 14 dos factos não provados] na conjugação com a demais prova produzida.
ii - O conflito referido em i foi referenciado, de forma geral, pela maioria das testemunhas, sustentado quer de forma direta pelo que vivenciaram com o(s) progenitore(s), quer de forma indireta, pelo ouvido aos filhos destes progenitores ou a outros familiares.
Neste contexto foram ainda e de forma mais ou menos consensual elencadas diversas qualidades ou caraterísticas pessoais da menor que permitirão avaliar a credibilidade das suas queixas.
Assim a testemunha H…, vizinha da menor (da residência da mãe da menor) desde setembro de 2015, ainda que referindo ter já antes comprado e realizado obras na sua fração que demoraram muito tempo, durante o qual já criara empatia com a menor com quem assim foi mantendo contactos, descreveu a D… como uma criança dócil, educada, polida, de fácil socialização. Tendo nas conversas que manteve consigo a D… evidenciado tristeza por no convívio com o pai, segundo contou, este proferir insultos dirigidos à mãe, entre os quais (no que releva) “mentirosa” e “tu és igual à tua mãe”. Justificando por isso não querer ir para casa do pai;
- Por sua vez a testemunha I…, professora de história e português da D… nos 6º a 8º ano (antes tendo sido professora do irmão E…) afirmou que a D… é boa aluna, muito empenhada e trabalhadora, mais madura que o nível geral da turma, apesar de ser a aluna mais nova, com discurso fluente e maduro; ponderada e querida por todos.
Mais disse que em conversas mantidas com a sua aluna D… por quem tem muita estima, esta evidencia tristeza e perturbação que imputa à relação com o pai de quem se queixa que grita e berra, não querendo estar só com o pai, nem dormir na casa dele (casa dos avós paternos).
Tendo ainda confirmado ter ouvido do E… (irmão) a referência ao episódio referido em 39) a 42) dos factos provados, sobre o qual o irmão disse ter intervindo, o que da sua parte e pela tristeza da D… levou a que reportasse esta situação à psicóloga da escola.
Ambas estas duas testemunhas prestaram um depoimento coerente, calmo, com aparente isenção, demonstrando nutrir pela menor grande carinho, depondo sem quaisquer outras ligações próximas a intervenientes nos autos ou diretos familiares.
- A testemunha O…, amigo dos pais da B… de igual forma descreveu a D… como uma menina madura para além da idade e afirmou ter ouvido a D… (no que releva) dizer que não quer ir para casa do pai porque este a acusa de mentirosa. Adjetivo que de igual forma o progenitor terá utilizado em conversa mantida com esta testemunha na semana anterior ao depoimento prestado pela mesma (segundo o referiu).
Mais referiu ser amigo dos pais da progenitora, sabendo por tanto que esta enquanto casada se dedicou aos filhos, sendo o progenitor boa pessoa, mas um pai ausente por motivos profissionais.
Afirmou ainda não acreditar que a progenitora e pais desta instrumentalizem os menores, por serem pessoas bem formadas que vivem para os filhos e netos.
Estando antes a causa da recusa da menor em ir para casa do pai na crítica que ali é feita à família materna, conforme ouviu da própria menor, nomeadamente em Dezembro (a inquirição desta testemunha ocorreu em fevereiro de 2017).
Não obstante este depoimento ter sido prestado de uma forma mais acalorada, evidenciando juízo de censura sobre a atuação do progenitor – ainda que dizendo ser uma boa pessoa - e uma maior proximidade à família materna, a acusação de mentirosa sobre a D… é consonante com a demais prova já referenciada e inclusive com as declarações mencionadas no relatório do INML imputadas ao progenitor;
- Por sua vez a testemunha G…, tia (irmã da avó materna) confirmou de igual modo ter presenciado ao longo dos anos (sem especificar datas) tristeza da menor associada a críticas da família paterna (tia e avó) sobre a família materna que associa às queixas da menor relacionadas com a dificuldade em dormir e à recusa em dormir em casa do pai. Não obstante e conforme igualmente afirmou, a D… gosta do pai. Entendendo serem os afetos mútuos.
Mais disse que a progenitora fomenta a relação dos filhos com o pai, só por isso sendo a relação do E… com o pai tão boa.
Precisando a D… de ser conquistada.
Este depoimento demonstrou proximidade com os menores e respetiva família materna. E embora tenha ficado clara a crítica à atuação e caráter do progenitor de quem disse ser pessoa agressiva (verbalmente), não fica afetada a credibilidade do que depôs quanto às queixas da menor (e também do seu irmão). De qualquer modo o assim afirmado (tal como o já fora pela testemunha O…) não é suficiente para alterar a resposta relativa à atuação da progenitora sobre o relacionamento dos menores com o seu pai por referência aos factos não provados 5 e 10.
Porquanto o contrário – em causa nestes factos uma conduta unívoca e permanente - se infere do teor das mensagens referidas na fundamentação de facto e a que se reportam os factos provados 22 e 23.
- Quanto às testemunhas F… e J…, respetivamente avó e tia maternas, mais próximas do conflito, em suma e uma vez mais no que ora releva, confirmaram as queixas de ansiedade e incapacidade de dormir apresentadas pela D… relacionando-as com o ambiente vivido na casa paterna - associado a críticas à menor e à sua família materna, causando à menor sofrimento.
Caraterizaram o progenitor como uma pessoa irascível e com modelo educacional autoritário, com falta de afetos por contraponto ao ambiente familiar materno.
Acusaram ainda o progenitor de ser um pai ausente enquanto o casal viveu junto, ainda que reconhecendo ser por motivos profissionais.
Tanto que a irmã J… viveu um ano em Londres para ajudar a tomar conta do E… enquanto a irmã estudava.
Rejeitaram de todo qualquer tentativa de influenciar a menor a não estar com a família paterna. Não obstante afirmarem que os menores ofereciam muita resistência à ida para a casa paterna.
Sendo evidente a discórdia existente entre estes membros da família materna para com a família paterna e em especial para com o progenitor, estes depoimentos têm de ser valorizados no contexto da demais prova produzida, na medida em que por via desta se mostram coerentes.
Dos mesmos se não podendo retirar, nomeadamente, que sempre os menores e em especial a D… demonstraram forte desagrado face ao regime de convívio estabelecido.
- A testemunha P… que trabalhou para o casal quando este esteve em Paris, confirmou de igual modo a ocupação profissional do requerido progenitor por via da qual referiu ser um pai pouco atento. Não obstante acabou por reconhecer que todos os sábados o pai levava o E… ao futebol ou que passavam tempo juntos em férias, ainda que nalgumas o pai não acompanhasse.
- O tio materno Q… deu nota apenas de uma relação mais distante e menos carinhosa do requerido.
- Para os factos não provados em causa nada de relevante disseram as testemunhas S… e T…, nem a testemunha U….
- Por sua vez as testemunhas V… e W… confirmaram em suma a descrição feita da D… – quanto à sua natureza dócil, carinhosa, alegre, expansiva e bem-disposta por natureza.
Declarando o primeiro nunca ter visto nenhum problema quer entre o casal enquanto estiveram juntos quer entre pais e filhos, apenas tendo referido ter ouvido dizer ao requerido que a D… deixou de dormir na sua casa por dizer ter medo.
Declarando a segunda de igual forma nunca ter presenciado, quer durante o período em que convivia com o casal enquanto juntos quer durante o período em que após a separação do casal passou a conviver com o progenitor e filhos, nomeadamente férias na neve, qualquer problema entre o progenitor e seus filhos e nomeadamente a D… que os acompanhou de 2012 a 2015.
Tendo apenas referido ter ouvido o progenitor dizer que a D… não quer dormir em sua casa e que a progenitora fará para isso pressão.
Progenitor de quem referiu ter tido uma educação britânica, mais disciplinado, calculando, sem saber, que tal se reflita na educação dos filhos.
- Finalmente as testemunhas X… e L… respetivamente avó e tia paternas prestaram depoimento coincidente no que respeita à separação traumática para todos e ao carinho com que os menores foram recebidos no seio da família paterna, onde aliás disseram que já antes frequentavam e gostavam de estar.
No mais a testemunha L… disse de nada se lembrar – quer quanto a queixas da sobrinha quer quanto à ocorrência do episódio referido em 39 a 42 dos factos provados.
Episódio que porém foi na integra confirmado pela avó paterna que de igual forma reconheceu o quão sentida a D… ficou, tanto que chorava e sufocava com o choro, não estando portanto a fazer fita.
Do depoimento desta avó foi possível extrair uma sincera ligação afetiva aos dois netos pelo convívio que descreveu quer durante o período em que os mesmos ali residiram com o pai - e consequentemente consigo – quer ainda durante o período em que o casal vivia junto.
Tendo referido que após separação e como forma de o progenitor (seu filho) poder conviver com os filhos, este alterou a sua agenda profissional, assim reconhecendo que até então ele trabalhava e a progenitora tomava conta dos meninos.
Confirmou ser vontade do progenitor passar os valores e hábitos e maneira de viver da casa e família dele aos filhos - diferente da família materna. Vontade que também assumiu, esclarecendo entender que tais valores, hábitos e maneira de viver não serão nem melhores nem piores que os da família materna, mas apenas diferentes.
Bem como afirmou ter ouvido o filho a dizer insultos por referência à progenitora em frente aos menores uma única vez (aos seis anos da D…) pelo que o repreendeu, nunca mais tendo ouvido tal.
Finalmente e quanto aos sintomas da D… relacionados com a dificuldade em adormecer disse ter constatado os mesmos – após setembro de 2014 e ter tentado acalmar a D… para adormecer. Tendo-se apercebido, tal como o filho que com as queixas a D… começou a receber muitas msgs. o que não seria normal, deixaram a D… adormecer e viram as mensagens da B… e J… (as juntas aos autos).
Mensagens que em seu entendimento prejudicaram a D… e serviram para manipular a mesma, no sentido de a retirar lá de casa.
Quanto aos sintomas nenhuma outra atitude tendo tomado, porquanto entretanto a mesma deixou de lá dormir e passou a ser acompanhada por psicólogos.
Embora reconhecendo que a progenitora é uma boa mãe, afirmou que a mesma nunca aceitou que os filhos estivessem tanto tempo com o pai.
Ainda, expressou tristeza por a D… ter deixado de ir a sua/do pai casa após o episódio de janeiro de 2016.
Também este depoimento confirma o litígio existente entre as famílias materna e paterna.
E tem de ser valorizado no contexto da demais prova produzida, na medida em que por via desta se mostra coerente.

Finalmente o requerido confirmou por referência ao episódio de janeiro de 2016 ter “berrado” com a D… a qual sofreu uma “repreensão, geral porque todos lá estavam” querendo referir-se à mãe e tia paternas. Repreensão que afirmou justificada pela resposta constante de 39 dos factos provados.
Confirmou a conversa que teve com o filho E… a propósito da irmã, altura em que lhe disse que a mãe manipula a irmã e que não pode permitir que a irmã ande a dizer em tribunal coisas que não são verdade.
Do seu depoimento resultou evidente o desgosto que sente por a relação com a filha se não desenvolver de forma harmoniosa e próxima e o sentimento de que na origem dos problemas sentidos está a atuação da família materna, em especial da progenitora.

Revertendo aos factos não provados que a recorrente pretende sejam alterados, entende-se de todos estes elementos estar cabalmente demonstrado que enquanto o agregado familiar residiu em Londres o progenitor e pelo menos durante um ano ausentava-se para fora por motivos profissionais (não foi feita prova de quantos dias em concreto).
Com efeito a testemunha J… justificou a necessidade de ir viver um ano para Londres precisamente pelas ausências do cunhado, numa altura em que a irmã ainda estudava.
Assim esta parte do ponto 2 dos factos não provados e com a limitação temporal correspondente ao período em que esta testemunha ali viveu, deve ser levada à factualidade provada (e consequentemente eliminada na mesma medida dos factos não provados).
No mais do constante em 1 e 2 dos factos não provados, nada mais ficou demonstrado.
Sobre os pontos 3 e 4 dos factos não provados, tão pouco inexiste prova suficiente para alterar a sua resposta.
Note-se que tendo sido referida a dificuldade inicial no estabelecimento de um novo modo de viver – com guarda alternada – o que se entende dentro dos parâmetros normais, não foi produzida prova de que sempre a D… demonstrou um forte desagrado pelo regime estabelecido. Não só pelo que em contrário foi afirmado pela avó e tia paternas e pelo relato das testemunhas V… e W…, como pela inexistência de reportadas queixas objetivas apresentadas nomeadamente a nível escolar onde a D… sempre teve um bom desempenho escolar e de onde apenas consta um reporte de problemas em novembro de 2014 (conforme doc. junto pela própria progenitora com o requerimento deste apenso F a fls. 10/11), confirmadas pela professora I…. Sem prejuízo das referências de queixas igualmente reportadas pela tia-avó materna, sem especificação de datas.
Tão pouco foi feita prova de que já em data anterior a 26/06/14 a D… apresentava os sintomas que se vieram a apurar como verbalizados a partir de setembro de 2014 (vide 19 dos factos provados).
Para além do que consta no relatório do INML referente à menor D… acima já referido, nem se compreenderia que a ser assim, a progenitora tivesse então em 26/06/2014 acordado a regulação das responsabilidades parentais nos termos mencionados em 18) dos factos provados, estabelecendo para além do mais a residência “com a progenitora, sendo as responsabilidades parentais relativas às questões de particular importância para a vida das crianças exercidas por ambos os progenitores – artigo 1906º nº 1 do CC (…)”; e os convívios com o progenitor “em semanas alternadas, desde a terça-feira no final das atividades escolares, até ao domingo às 20.30 horas” (vide fls. 729 a 731 do apenso A).
Quanto aos pontos 5 e 10 dos factos não provados, o conflito evidente entre os progenitores e a representação negativa que ambos fazem da outra parte e respetiva família, incluindo as intenções subjacentes - no que ora releva - imputadas ao progenitor como causa do tempo de convívio pretendido com os filhos (como vingança contra a ex-mulher – vide 58 dos factos provados); aliado à incapacidade de estabelecer um contacto saudável ao nível parental, imputando a progenitora o mau estar da D… em exclusivo à relação estabelecida com o progenitor e respetiva família – assim o faz não só a progenitora, como também o seu núcleo familiar mais próximo – desvalorizando o contexto familiar paterno (vide 56 dos factos provados), justificam a resposta negativa destes pontos 5 e 10 dos factos não provados.
Quanto aos pontos 7 a 9 manifestamente dos mesmos nenhuma prova foi feita.
Igualmente sobre a matéria referida em 11 e 12 dos factos provados, não foi feita da mesma qualquer prova.
Do ponto 6 entende-se igualmente não ter sido produzida prova cabal.
Com efeito e embora seja relatado com credibilidade que os sintomas referidos em 19 e 20 (e não 14 e 15 conforme por manifesto lapso de escrita consta em 6 dos factos não provados) se manifestavam quando a menor via a proximidade dos convívios com o progenitor, facto é que os mesmos se manifestaram noutras ocasiões como em casa da mãe ou em casa de amigas (vide relatório do INML a fls. 513) ou ainda após uma deslocação ao tribunal (assim o disse a professora I…). Tendo no relatório do INML sido defendido que as alterações psicofisiológicas sentidas pela D… expressam “a sua dificuldade em se adaptar a alterações no seu enquadramento familiar, bem como às consequências e exigências que estas alterações suscitaram do ponto de vista cognitivo e emocional a saber: o divórcio dos pais e consequente e continuado conflito entre os progenitores no qual a D… terá participado de diversas formas; a alteração de rotinas com a permanência alternada em casa dos progenitores; alterações na composição dos agregados familiares com o novo relacionamento da progenitora e o nascimento do irmão mais novo e com a partilha mais frequente de períodos com os avós e outros familiares paternos.”
Tanto é quanto baste para que se justifique a não alteração deste ponto 6 dos factos não provados. Sem prejuízo de estar provado que ali se manifestavam também.
Quanto ao ponto 14 dos factos não provados temos apenas o relato da menor (assim o disse quando foi ouvida pelo tribunal a quo) a afirmar que o pai lhe levantou a mão para bater.
Atendendo a que dos autos não se vislumbra o reporte de qualquer episódio de agressão física por parte do pai em relação à filha; atendendo a que a discussão foi de acordo com o apurado vivenciada de forma muito marcante pela menor, tanto para mais que se sentiu triplamente criticada, pois para além do pai também a avó e a tia paternas intervieram na situação, reforçando a carga negativa da situação e assim ampliando para a menor a sensação de humilhação e incapacidade de lidar com a situação [o que se diz sem exercício de qualquer juízo de valor sobre a (des)adequação da resposta dada pela menor e da (des)proporção da reação originada que nesta sede não nos cumpre avaliar], admite-se que qualquer gesto do progenitor possa pela mesma ter sido interpretado de forma excessiva.
Nesta medida e porque, repete-se, a menor refere muitas vezes que o pai berra, grita, zanga-se, mas nunca que lhe bate ou sequer ameaça bater, entende-se de igual forma não merecer censura o neste ponto decidido pelo tribunal quo.
Finalmente e quanto ao ponto 13, importa ter presente que o progenitor no articulado de resposta ao articulado em que os factos em questão foram reportados aos autos, disse e quanto ao artigo 9º em que foram alegados estes mesmos factos, que impugnava o mesmo, esclarecendo “não disse à D… que ela era um lixo”. O mesmo é dizer que no mais não impugnou o ali alegado, ou seja que disse à D… “És uma mentirosa; “Devias ter vergonha”; “mal-educada” e “És uma pessoa sem escrúpulos”.
A posição processual assumida pelo progenitor relativamente a facto pessoal ao mesmo imputado e sobre o qual tomou posição nos termos referidos é de valorar.
Aliás e confirmando parcialmente o sentimento perante o então ocorrido, esclarece o progenitor no seu requerimento de resposta que “irritou-se com a resposta mal-educada da sua filha, reveladora de uma fraca personalidade em formação (…)”. (vide fls. 480 e segs. do apenso D).
Assim e por tudo o mais já referenciado supra que consta do Relatório do INML, bem como dos depoimentos das testemunhas H… e I… reportando as queixas da menor, entende-se ser de deferir parcialmente, neste ponto, a pretendida alteração factual.

Do exposto resulta a parcial procedência da alteração da decisão de facto, à qual serão aditados os seguintes pontos factuais, ordenando-os por uma questão de sequência lógica conforme segue:

3-A) enquanto o agregado familiar residiu em Londres o progenitor pelo menos durante o período de um ano, ausentava-se para fora, por motivos profissionais.
40-A) No dia e situação referidos em 39 e 40 dos factos provados, o progenitor disse à D… “És uma mentirosa; “Devias ter vergonha”; “mal-educada” e “És uma pessoa sem escrúpulos”.
*
***
Em 2º lugar insurgiu-se a recorrente quanto à subsunção jurídica dos factos..
Cumpre portanto apreciar de direito.
Tendo sido instaurada ação de regulação das responsabilidades parentais [a que respeita o apenso A enviado da 1ª instância para consulta] relativas (no que ora releva ) à menor D…, vieram os seus progenitores em 26/06/2014 - portanto quando a mesma tinha já 10 anos, porquanto nasceu em 10/04/2004 – a declarar o acordo quanto à regulação das Responsabilidades Parentais nos termos que constam da ata de fls. 729 a 731 do mencionado apenso A. Acordo este que foi devidamente homologado por sentença transitada, por então se ter entendido acautelar os interesses da (dos) menor(es).
Nos termos do acordo firmado, ficou estabelecido:
”1- Residência e exercício das responsabilidades parentais – As crianças E… (…) e D… (…) ficam a residir com a progenitora, sendo as responsabilidades parentais relativas às questões de particular importância para a vida das crianças exercidas por ambos os progenitores – artigo 1906º nº 1 do CC (…)”;
2- Convívios: Os progenitores acordam em fixar o seguinte regime de convívio:
2.1) Os menores estarão com o progenitor em semanas alternadas, desde a terça-feira no final das atividades escolares, até ao domingo às 20.30 horas.
2.2) Férias
(…)
2.3) Festividades
(…)” (vide fls. 729 a 731 do apenso A).

A 28/10/2014 o progenitor deu entrada a requerimento autuado como incidente de incumprimento como apenso D.
Em 27/01/2015 a progenitora deu entrada a requerimento para alteração das Responsabilidades Parentais que veio a ser autuado como apenso F.
Através deste último requerimento peticionou a progenitora que pela sua procedência fossem reduzidas ou eliminadas as pernoitas com o pai, quanto ao regime de visitas estipulado.
Foi proferida decisão única para os apensos D e F.
Apreciando o pedido formulado neste apenso F, decidiu o tribunal a quo julgar improcedente o pedido de alteração formulado.
Interpôs a requerente do assim decidido recurso, concluindo pela procedência do formulado pedido e assim pelo fim das pernoitas tal como peticionado.

Analisando o acordo estabelecido entre os progenitores em 2014 quanto às responsabilidades parentais depreende-se do mesmo que estes fixaram o exercício conjunto das responsabilidades parentais, fixando a residência da menor com a mãe.
Ou seja por via desta cláusula deram as partes observância ao previsto no artigo 1906º nºs 1 e 5 do CC, seguindo o princípio regra do exercício conjunto das responsabilidades parentais (nº1) e fixando a residência principal dos menores em casa de um dos progenitores, in casu a mãe (nº5).
O “exercício conjunto das responsabilidades parentais” a que alude este citado artigo e que o legislador definiu como princípio regra reporta-se “às questões de particular importância para a vida do filho” tal como resulta do texto da lei, deixando portanto os atos da vida corrente para o progenitor com quem o mesmo residir habitualmente ou com quem se encontrar temporariamente . Neste caso salvaguardando o legislador o cuidado de não deverem ser contrariadas as orientações educativas mais relevantes, tal como elas são definidas pelo progenitor com quem o filho reside habitualmente (vide nº 3 do citado artigo 1906º do CC).
Ainda, a fixação da residência ou dos direitos de visita (vide nº 5) sempre terá para o tribunal como critério norteador - tendo em atenção todas as circunstâncias relevantes , designadamente, o eventual acordo dos pais e a disponibilidade manifestada por cada um deles para promover relações habituais do filho com o outro - o interesse do menor, incluindo o de manter uma grande relação de proximidade com os dois progenitores promovendo, aceitando acordos e tomando decisões que favoreçam amplas oportunidades de contacto com ambos e de partilha de responsabilidades entre eles (nº 7 do mesmo 1906º do CC).

No caso dos autos, sob a epígrafe “Convívios” – atenta a residência fixada junto de um dos progenitores impunha-se estabelecer o regime de contactos ou visitas para o outro de forma a promover as relações habituais do filho com o outro progenitor (1906º nº 5 do CC) - definiram as partes que os menores ficariam com o progenitor “em semanas alternadas, desde a terça-feira no final das atividades escolares, até ao domingo às 20.30 horas.”.
Na prática, o regime assim acordado, pela regularidade e equilíbrio aproximado de tempo em que se estipulou ficarem os menores na casa de cada um dos progenitores, enquadra-se mais no modelo da chamada guarda alternada – que não pressupõe a fixação de apenas uma residência habitual - do que na prevista regra geral (artigo 1906º nº 1) de exercício conjunto de responsabilidades parentais a que se adicionou a fixação de residência principal com apenas um dos progenitores, indicada na cláusula 1 do acordo.
O regime da guarda ou residência alternada fixado por acordo dos progenitores [sobre a distinção entre o exercício conjunto das responsabilidades parentais e a “chamada guarda conjunta ou guarda alternada” vide Clara Sotto Mayor, in Temas de Direito das Crianças, ed. 2016 - Almedina, “Entre idealismo e realidade: a dupla residência das crianças após o divórcio”, p. 72/73] tem por norma como vantagem clara promover o contacto e consequente desenvolvimento de relações afetivas em termos iguais entre ambos os progenitores, bem como por esta forma possibilitar que ambos possam ter um papel ativo e responsável na educação e desenvolvimento da criança, satisfazendo o princípio da igualdade destes previsto quer na CRP (vide artigos 13º e 36º nºs 3 e 5) quer na Convenção sobre os Direitos da Criança [CDC] (vide artigo 18º desta última, adotada pela Assembleia Geral nas Nações Unidas em 20 de Novembro de 1989 e ratificada por Portugal em 21 de Setembro de 1990).
Responsabilidade educativa que sempre se deve pautar pelo interesse superior da criança, igualmente consagrado no artigo 3º desta CDC [“Todas as decisões relativas a crianças, adotadas por instituições públicas ou privadas de proteção social, por tribunais, autoridades administrativas ou órgãos legislativos, terão primacialmente em conta o interesse superior da criança”], para o efeito se impondo o igualmente consagrado princípio do respeito pelas opiniões da criança – artigo 12º da CDC – que assim deverão ser ouvidas por forma a permitir que expressem a sua opinião sobre todas as decisões que as afetem. Opinião que em função da sua idade e maturidade deverá ser levada em consideração.
Tanto este direito de audição – a ser considerado em função da idade e maturidade - como a consagração do primacial interesse superior da criança se encontram de igual forma consagrados no artigo 24º nºs 1 e 2 da Carta dos Direitos Fundamentais da UE, aprovada em Protoloco anexo ao TFUE e assim com força vinculante no Espaço da UE. Podendo a não observância deste direito de audição obstar à não execução de decisão sobre responsabilidades parentais nos termos previstos no Regulamento CE 2201/03.
Em consonância com estes instrumentos internacionais se encontra a legislação nacional e desde logo o RGPTC que como princípio orientador consagrou o direito de audição e participação da criança com capacidade de compreensão dos assuntos em discussão [artigo 4º nº 1 al. c)] e de novo no artigo 5º o direito da criança a ser ouvida para a determinação do seu superior interesse.
Retomando ainda a solução da guarda ou residência alternada, são-lhe reconhecidas como adicionais vantagens, a preservação da relação em modos igualitários com ambos os progenitores, em moldes similares à situação experienciada em momento anterior à separação, reduzindo o risco e a incidência da “alienação parental”, bem como o potencial conflito parental e consequentemente situações de incumprimento, entre outras que têm vindo a ser apontadas [num estudo publicado em 2012 por Edward Kruk “Arguments for an Equal Parental Responsibility Presumption” in Contested Child Custody The American Journal of Family Therapy, Volume 40, Issue 1, 2012, pp. 33-55 citado por Joaquim Silva in Da residência única à alternada – um percurso jurisprudencial”, comunicação apresentada na ação de formação “Responsabilidades Parentais”, realizada pelo CEJ no dia 05 de abril de 2013 e disponível in “A Tutela Cível do Superior Interesse da Criança”, Tomo I, julho 2014, Ebook CEJ p. 24 disponível in http:// www.cej.mj.pt/ cej/ recursos/ ebooks/familia/Tutela_Civel_Superior_Interesse_Crianca_TomoI.pdf. foram elencados estes entre outros argumentos favoráveis a esta opção].
Helena Bolieiro in “Novos modelos e tendências na regulação do exercício das responsabilidades parentais. A residência alternada: casa do pai – casa da mãe – E agora?” [comunicação apresentada na ação de formação “Novos modelos e tendências na regulação do exercício das responsabilidades parentais”, realizada pelo CEJ no dia 01 de junho de 2012) in “A Tutela Cível do Superior Interesse da Criança”, Tomo I, julho 2014, Ebook CEJ p. 24 disponível in http:// www.cej.mj.pt/ cej/ recursos/ ebooks/ familia/ Tutela _Civel _Superior_Interesse_Crianca_TomoI.pdf.”] apontou como critérios orientadores para a opção da residência alternada:
“ -Interesse superior da criança.
- Capacidade de diálogo, entendimento e cooperação por parte dos progenitores.
- Modelo educativo comum ou consenso quanto às suas linhas fundamentais (orientações educativas mais relevantes).
- Proximidade geográfica.
- Vivência de facto que precede a tomada de decisão (qualidade, consistência e duração).
- Opinião da criança.
- Idade da criança.
- Ligação afetiva com ambos os progenitores.
- Disponibilidade dos pais para manterem contacto direto com a criança durante o período de residência que a cada um cabe.
- Condições económicas e habitacionais equivalentes.”
No relatório do INML junto ao apenso D relativo à menor D… (fls. 510 e segs.) são referidas como vantagens, de acordo com a literatura da especialidade e experiência clínica do Sr. Perito subscritor: “flexibilidade nos contactos entre crianças e progenitores; a não existência de uma clivagem entre os espaços e momentos vivenciados com cada um dos progenitores; variedade de interações sociais com ambos os progenitores; participação das crianças nos momentos importantes da vida de cada progenitor e destes na vida dos seus filhos”.
Neste relatório é ainda expressa a opinião de que este modelo para que funcione por forma a contribuir para um “desenvolvimento integrado da criança, sobretudo relativamente à sua estabilidade afetiva, deverá ser aplicado em casos em que se verifiquem determinadas condições: quando existe uma proximidade geográfica entre as habitações dos progenitores (…); quando existe uma relação de cordialidade e entendimento entre os progenitores sobretudo quanto às decisões que dizem respeito à parentalidade o que proporciona às crianças uma continuidade educacional (…); ou seja deverá existir sobretudo um clima de cooperação e respeito mútuo entre os progenitores com objetivos educacionais comuns. Em contrapartida o regime de guarda conjunta é altamente negativo nos casos em que existe um elevado conflito entre os progenitores”.
Propendemos a concordar com o entendimento manifestado pelo Sr. perito, o qual traduz a ponderação dos critérios orientadores acima elencados para a apreciação no caso concreto da adequação da opção pela residência alternada.
É do superior interesse da criança que à mesma seja propiciado um ambiente familiar estável e harmonioso, onde impere a capacidade de diálogo e entendimento, favorável ao estabelecimento de fortes laços familiares com cada um dos progenitores e família alargada respetiva.
No caso de residência alternada é favorável à estabilidade afetiva e emocional da criança uma continuidade educacional, sem representações negativas ou desautorizações educativas de parte a parte entre cada um dos progenitores.
Sendo vital no desenvolvimento da criança o estabelecimento de laços afetivos e uma sã e gratificante convivência do menor com ambos os progenitores, necessariamente que as representações negativas que cada um dos progenitores faça do outro ou respetivo núcleo familiar perante seus filhos menores, ou a descontinuidade educativa entre ambos, será nocivo à pretendida estabilidade emocional.
Em especial quando o regime estabelecido é o da residência ou guarda alternada, pelas periódicas transições de residências operadas [sobre as vantagens da adoção do regime de guarda ou residência alternada, pressupondo contudo um entendimento mínimo entre os progenitores vide Ac. TRL de 07/08/2017 e doutrina e jurisprudência vasta aí citada, in www.dgsi.pt/jtrl].
Tendo presente os princípios norteadores da regulação das responsabilidades parentais acima aludidos, bem como pressupostos em que se entende favorável a opção pelo regime da guarda ou residência alternada, cumpre apreciar se existe fundamento para alterar o regime estipulado quanto às visitas, eliminando as pernoitas com base na invocada recusa da menor às mesmas [tendo presente que e conforme tivemos já oportunidade de referir concetualmente o regime estipulado quanto a visitas se aproxima mais da residência alternada].
O tribunal a quo, fundamentando a sua decisão afirmou:
“No caso concreto, entendemos que a vontade expressa pela D… não se mostra fundamentada em termos de poder justificar a alteração do regime fixado.
De facto, e analisada toda a factualidade provada, não encontramos qualquer fundamento válido para a peticionada alteração.
Assim, e em primeiro lugar, a recusa da D… em pernoitar com o pai reportou-se às crises de ansiedade que vinha sofrendo, sendo certo que, conforme já se expôs supra, as mesmas foram pericialmente justificadas com a dificuldade da D… em se adaptar às alterações sofridas no seu enquadramento familiar, e não à permanência junto do pai. E, de qualquer forma, já em fevereiro de 2015, a D… foi de férias com o pai para a neve, incluindo pernoitas, não tendo apresentado qualquer sintomatologia de ansiedade em relação às pernoitas (cfr. ponto 32. dos factos provados), mostrando-se já ultrapassada a ocorrência de tais crises.
Por outro lado, não se apurou qualquer facto atinente à conduta do progenitor que nos permita ajuizar que o convívio da D… com o mesmo é contrário ao seu superior interesse, em termos de justificar a alteração do regime fixado.
Assim, a invocação da progenitora referente à ocorrência de junho de 2015 – invocada em termos de justificar a posição da D… – mais não foi do que uma diligência no âmbito de um processo de arrolamento (cfr ponto 33. dos factos provados), não permitindo qualquer juízo de valor relativamente à conduta do progenitor.
A invocada “humilhação” sofrida pela D… e descrita em 39. a 41. dos factos provados traduz apenas a reação de um pai a uma resposta insolente de uma filha, situação seguramente frequente em famílias onde existem pré-adolescentes, estando longe de constituir, por si só, uma circunstância superveniente passível de fundamentar uma alteração ao regime de convívios.
Do exposto resulta que, a nosso ver, a vontade da D… resulta da circunstância de o estilo educativo do progenitor se caracterizar por elevada exigência relativamente ao comportamento dos filhos, em contraponto com o da progenitora, que se mostra mais permissiva (cfr ponto 53. dos factos provados), revelando-se assim mais apelativo para a D… permanecer junto da progenitora. Tal facto, aliado à circunstância de ter sido inculcada na D… a ideia de que ninguém a pode obrigar a seguir um regime que não é da sua vontade (cfr as mensagens telefónicas parcialmente transcritas em sede de fundamentação de facto), bem como a desvalorização do contexto familiar paterno levada a cabo pela progenitora, explicam a posição assumida pela D… ao longo do processo, que culminou com a prática de um regime em que a mesma convive com o pai como e quando quer.
Entendemos que tal regime não satisfaz o interesse da D….
A D… necessita, para a sua saudável formação, da mãe e do pai, e a intimidade e confiança que se pretende mantenha com ambos os progenitores não se consegue com o regime atualmente em vigor. Por outro lado, entendemos que o modo e tempo de convívio com o progenitor não residente não pode ficar nas mãos de uma adolescente de treze anos, incumbindo à progenitora garantir o cumprimento do regime judicialmente fixado.
Por fim, não pode deixar de notar-se que o regime por cuja fixação a progenitora pugna é precisamente o que foi provisoriamente fixado em novembro de 2014 e que não é por si cumprido desde janeiro de 2016.
Por todo o exposto, entendemos que não se verifica qualquer circunstância superveniente que legitime a alteração do regime fixado, impondo-se a improcedência da ação.”
Expressando desde já o total acordo quanto à afirmação de que a “A D… necessita, para a sua saudável formação, da mãe e do pai” bem como de que com ambos deverá manter “intimidade e confiança”, justifica a factualidade provada uma abordagem diversa.
Assim extrai-se da factualidade provada:
- que os progenitores seguem modelos educativos não convergentes – a progenitora mais permissiva e o progenitor mais exigente, estabelecendo regras e rotinas e recorrendo a castigos quando existem comportamentos que reputa desadequados [vide factos provados (f.p.) 53 a 55];
- ambos os progenitores se representam reciprocamente negativamente, expressando afetos negativos em relação ao outro o que influencia negativamente a relação da D… com o progenitor [vide f.p. 57];
- a comunicação entre os progenitores limita-se à troca de e-mails [vide f.p. 59];
- a D… demonstra um conhecimento aprofundado dos conflitos entre os progenitores no tocante à regulação das responsabilidades parentais [vide f.p. 60];
- denota hipermaturidade em relação aos conflitos relacionados com a sua situação familiar, a qual é frequente em crianças que são obrigadas a adaptarem-se a situações familiares complexas, para as quais os seus recursos pessoais são insuficientes [vide f.p. 61];
- em sede de audição, nomeadamente pela psicóloga que então exercia funções neste Tribunal, denota receio que a verbalização que faça dos seus sentimentos e vivências possa levar a que o Tribunal mantenha o regime inicialmente fixado [f.p. 62];
- a D… não pretende restabelecer o regime de convívios fixado, pretendendo antes a fixação de um regime que lhe permita conviver com o pai quando e como quiser [f.p. 63];
- após regulado definitivamente o regime das responsabilidades parentais em junho de 2014, [f.p. 18] a partir de meados de setembro de 2014 a D… passou a verbalizar ao progenitor ter medo de dormir sozinha e sentir-se tonta, cansada e enjoada, apresentando crises de ansiedade e ataques de pânico. Queixas que inicialmente não foram valorizadas pelo progenitor que as interpretou como uma estratégia utilizada pela progenitora para fundamentar a alteração do regime de convívios, atitude de que se arrepende [vide f.p. 19 a 21];
- tais crises ocorriam igualmente em casa da progenitora e em pelo menos uma viagem de estudo [f.p. 25];
- a ocorrência de tais crises expressa a dificuldade da D… em se adaptar às alterações sofridas no seu enquadramento familiar, tais como o divórcio dos pais, o conflito entre os progenitores, a alteração da sua rotina com permanência alternada em casa de ambos os progenitores, a alteração na composição dos agregados familiares, com o novo relacionamento da progenitora e o nascimento de um irmão mais novo e a partilha mais frequente de períodos de tempo com a família paterna [f.p. 26];
- a cristalização deste quadro de sintomas foi potenciado quer pela reação do progenitor, que não valorizou inicialmente as suas queixas, quer pela reação da progenitora e do agregado familiar materno, que manteve nestas alturas uma comunicação constante com a D…, passível de estimular a sintomatologia por si sentida [f.p. 27] ;
- Em 3/11/14 a progenitora comunicou ao progenitor que por força de tais sintomas não entregaria a D… no dia seguinte e por despacho de 18/11/14 foi determinado que as visitas se processassem no regime anterior mas sem pernoitas [f.p. 28 e 31];
- estando em vigor este regime (sem pernoitas) em janeiro de 2016 ocorreu o episódio aludido em 39 a 43 dos factos provados após o que e até 15/09/16 se manteve a ausência de contacto presencial, altura em que a D… foi de novo ouvida e verbalizou não pretender retomar os contactos com o pai [vide 45 e 47 dos f.p.];
- nessa data (15/09/16) os progenitores acordaram em fixar o seguinte regime provisório:
A D…, durante um mês (até 15 de outubro) deverá estar com o progenitor às quintas-feiras, desde o final das atividades letivas e jantar com este, e aos sábados, a partir da hora de almoço; as pernoitas serão em casa da mãe; Após a data supra fixada, o regime de visitas provisoriamente fixado será retomado [f.p. 48];
- após 15 de outubro de 2016, o regime provisório fixado não foi retomado, tendo a D… recusado acompanhar o progenitor [f.p. 49];
- por despacho de 31/10/2016 foi determinado que a execução do regime provisório fixado fosse acompanhada por técnico da Segurança Social [f.p. 49];
- a D… continuou a recusar acompanhar o progenitor, não tendo o referido técnico logrado reverter a situação [f.p. 51];
- após tal recusa, a D… vem mantendo contactos esporádicos com o progenitor, em moldes sugeridos pela mesma, que envolvem, nomeadamente, refeições em restaurantes e idas ao centro hípico onde a D… tem um cavalo [f.p. 52.]
- Do episódio referido em 39 e 40 dos f.p. há ainda a realçar que na altura o progenitor disse à D… “És uma mentirosa; “Devias ter vergonha”; “mal-educada” e “És uma pessoa sem escrúpulos” [f.p. 40-A].

Ou seja, desta factualidade extrai-se numa primeira linha, um ambiente de conflito entre os progenitores que apenas conseguem comunicar por email.
Progenitores que se representam negativamente – ambos – o que influencia negativamente a relação da D… com o pai, a qual demonstra um conhecimento profundo dos conflitos entre os progenitores no tocante à regulação das responsabilidades parentais.
A ocorrência das crises de ansiedade e ataques de pânico – a partir de meados de setembro de 2014 – foram pericialmente justificadas com a dificuldade em a mesma se adaptar às alterações sofridas no seu enquadramento familiar, abrangendo várias valências: o divórcio dos pais; o conflito entre os progenitores; a alteração da sua rotina com permanência alternada em casa de ambos os progenitores; a alteração da composição dos agregados familiares, com o novo relacionamento da progenitora e o nascimento de um irmão mais novo e a partilha mais frequente de períodos de tempo com a família paterna.
Ainda, os progenitores não seguem modelos educativos convergentes, sendo a progenitora mais permissiva e o progenitor mais exigente.
Neste contexto, a D… desenvolveu, conforme dito, crises de ansiedade e ataques de pânico, cujas queixas não foram inicialmente valorizadas pelo progenitor que as interpretou como uma estratégia utilizada pela progenitora para fundamentar a alteração do regime de convívios (do que hoje se arrepende).
Posteriormente e numa altura em que a D… já estava com um regime de visitas sem pernoitas, ocorreu em janeiro de 2016 uma discussão entre pai e filha que agudizou o mau estar na relação entre estes – na perspetiva desta última, tanto que desde então a mesma passou a recusar-se a acompanhar o progenitor no âmbito do regime de visitas estabelecido sem visitas.
Desde 2012, foram já várias as vezes que a D… foi ouvida, sempre tendo pugnado por um regime de visitas mais restrito em relação ao pai.
O tribunal e bem, tomou várias medidas e solicitou o apoio da mediação familiar bem como do acompanhamento psicológico, sem sucesso diga-se [no contexto que a factualidade provada também reflete], com vista a viabilizar o regime de guarda alternada acordado entre os progenitores por entender assim salvaguardar o superior interesse da menor.
Não obstante e no circunstancialismo que a factualidade provada também demonstra, não logrou a D… estabelecer laços afetivos de igual intensidade para com ambos os progenitores, evidenciando uma maior proximidade relacional com a mãe que parece ser a principal figura de vinculação [conforme consta no relatório do INML a fls. .514 verso].
Não obstante a recusa da D… em não querer dormir em casa do pai primeiro e depois do episódio de janeiro de 2016 em ir para a casa do pai – invocando [e recorrendo-se uma vez mais ao relatório do INML] para além de “comportamentos verbalmente agressivos”, sobre o que nos autos apenas está demonstrado o referido em 39 e seguintes dos factos provados e que na sua origem teve uma resposta desrespeitosa da menor; a imposição de horários ou castigos como não sair com as amigas – simultaneamente expressa a mesma claros afetos positivos em relação ao pai manifestando igualmente e perante a hipótese de os contactos serem reduzidos afetos negativos relativamente a tal hipótese [vide relatório do INML a fls. 515 do apenso D].
Significa esta ambivalência de sentimentos que a relação entre o progenitor e a sua filha deve ser estimulada e acarinhada, criando condições para fortalecer os laços de confiança e respeito que entre ambos é importante existam como parte do equilibrado desenvolvimento e crescimento da menor.
Revertendo uma vez mais ao relatório do INML, as condições para que esta relação se desenvolva de forma positiva e gratificante, na medida em que os problemas suscitados estão associados e fomentados pelo conflito inter parental, pressupõem de um lado uma postura concertada de ambos os progenitores no sentido de excluírem a D… dos conflitos existentes entre eles; de outro uma atuação colaborante por parte da progenitora no sentido de estimular e valorizar os contactos da menor com o pai, dando a oportunidade de no seio familiar deste ser possível resolver problemas relacionados com a D…; em terceiro lugar mas não menos importante que o progenitor adote uma postura mais proativa no tempo disponibilizado à menor, mais tolerante e compreensiva quanto aos comportamentos da D….
No entretanto, atendendo à idade da menor – em abril já a perfazer 14 anos; à sua maturidade, de acordo com o já referido relatório do INML evidencia “hipermaturidade ou seja a aquisição precoce na análise e resolução de problemas e conflitos, sobretudo aqueles que dizem respeito à sua situação familiar, adotando esquemas e estratégias do pensamento que são atípicos na sua faixa etária e muito mais caraterísticos do pensamento adulto (…) estas caraterísticas devem ser entendidas como uma forma desaptativa da criança lidar com um contexto de vida complexo e exigente, sobretudo do ponto de vista afetivo ”; ponderando as causas que levaram à situação presente, em especial o já falado conflito parental sem diálogo entre progenitores que permita uma continuidade relacional nas transferências (i.e na mudança de residências), associado a modelos educativos não convergentes – questão que na presença de diálogo poderia ser minimizada; impõe-se valorizar a opinião da menor expressa ao longo dos autos.
E se a pretensão de conviver com o pai quando e como quiser [para além de não ser sequer esse o pedido no recurso] se nos afigura desadequada pelo risco inerente – atento o afastamento gradual nos autos evidenciado - de se não promover os contactos entre pai e filha; também a manutenção do regime antes estabelecido, tal como o decidiu o tribunal a quo, não se mostra ser consentâneo ao superior interesse da menor, na medida em que pelas questões acima já enunciadas mostrou não ser favorecedor da sua estabilidade emocional.
Não estando ao alcance do tribunal impor laços afetivos ou “sentimentos e afetos” [nas palavras de Clara Sotto Mayor in “Regulação do Exercício das Responsabilidades Parentais nos Casos de Divórcio”, 5ª edição, 2011, Almedina, p. 193/194], antes e na medida do superior interesse da menor criar para o seu desenvolvimento condições com amplas oportunidades de contacto, justifica-se a pretendida alteração do regime de visitas, eliminando apenas pernoitas em casa do pai.

No mais e mantendo-se o regime antes estabelecido, deverá a menor conviver com o pai em semanas alternadas, de 3ª a domingo, sem prejuízo de e aqui sim de acordo com o desenvolver da relação, sendo essa a vontade da menor a mesma retomar as pernoitas
Termos em que procede o recurso apresentado.
***
IV. Decisão.
Pelo exposto, acordam os Juízes do Tribunal da Relação do Porto em julgar procedente o recurso interposto por B….
Em consequência e revogando na parte sob recurso a decisão proferida:
- Decide-se eliminar as pernoitas em casa do pai do regime de regulação das responsabilidades parentais mencionado em 17 e 18 dos factos provados, sem prejuízo de em função do desenvolver da relação e sendo essa a vontade da menor, a mesma retomar as pernoitas.

Custas pelo recorrido.

Porto, 2018-01-24.
Fátima Andrade
Oliveira Abreu
António Eleutério