Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
475/08.0TBVLC.P1
Nº Convencional: JTRP000
Relator: PEDRO MARTINS
Descritores: EXPROPRIAÇÃO
PROVA
PERITO
APTIDÃO EDIFICATIVA
Nº do Documento: RP20150108475/08.0TBVLC.P1
Data do Acordão: 01/08/2015
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: ALTERADA
Indicações Eventuais: 3ª SECÇÃO
Área Temática: .
Sumário: I – As afirmações de facto feitas pelos peritos para cálculo do rendimento efectivo de um solo para outros fins que não a construção, a cuja fundamentação a sentença recorrida aderiu, são juízos periciais sobre factos hipotéticos, ou seja, factos que, com aquela adesão, são dados como provados.
II – A maioria da jurisprudência entende que no processo de expropriação não pode ser feita prova da discrepância entre a área a expropriar constante da DUP e a área efectivamente expropriada, impondo ao expropriado que discuta essa discrepância num outro processo (ou administrativo para corrigir a área ou civil para obtenção de indemnização por facto ilícito), enquanto que outra corrente jurisprudencial, que aqui se segue, admite que essa divergência possa ser relevante para efeitos indemnizatórios no próprio processo de expropriação (o que implica que os expropriados possam alegar e provar essa divergência, como no caso fizeram, pois que a parcela expropriada tem, na própria planta parcelar, uma área superior à declarada na DUP e até pode ser superior à pretendida pelos expropriados).
III – Admitindo-se, hoje, que a tramitação definida pelos arts. 56 e ss. do CE é compatível com a apresentação de documentos ou o oferecimento de outras provas em momento posterior ao requerimento de interposição de recurso e resposta ao mesmo (cf., por exemplo, o ac. do STJ de 11/12/2012, 179/1999.L1.S1, com um voto de vencido num conjunto de 5), têm, no entanto, pouco valor probatório, as perícias particulares extrajudiciais feitas sem observância do contraditório e sem as garantias das perícias judiciais ou da prova testemunhal produzida de acordo com as respectivas regras processuais.
IV – Um solo que não era apto para a construção (art. 25/2 do CE), não se torna apto para ela por estar englobado num conjunto de solos para onde está prevista a construção de um parque da cidade – zona verde e de lazer -, mesmo que para este se preveja a instalação de infra-estruturas e equipamentos públicos (ou seja, não se verifica a situação prevista no art. 25/2c do CE).
V – Um solo que não era apto para a construção (art. 25/2 do CE), não está abrangido na previsão do art. 26/12 do CE, pois este tem como pressuposto precisamente a situação contrária, ou seja, que o solo do prédio expropriado era apto para a construção e que um instrumento legislativo ou administrativo o tornou inapto para ela.
VI - “Quando o terreno expropriado é afectado à construção de uma [via de comunicação], não pode falar-se em aptidão edificativa: o terreno não a tinha […] e o destino que lhe é dado continua a não revelá-la.”
VII – Não equivale a uma “desafectação”, a autorização da utilização de solos da Reserva Ecológica Nacional quando essa utilização se enquadra no tipo de ecossistemas da REN em causa e se mantêm presentes os valores e funções ecológicas existentes e que levaram à definição da delimitação da REN.
VIII – Se todos os peritos, à excepção do perito do expropriado, concordaram que a taxa de capitalização do rendimento líquido tida como mais ajustável ao aproveitamento agrícola em causa, numa perspectiva de perpetuidade e constância de rendimentos, é de 4%, taxa também proposta por um parecer técnico apresentado pelos expropriados, e o perito dos expropriados propõe uma de 3% limitando-se a dizer que é a mais adequada e apropriada à situação, a taxa deve ser a de 4%.
IX – Não deve ser aplicado nenhum factor de valorização da capitalização, ao abrigo da parte final do art. 27/3 do CE, se uma das razões dadas para o efeito tem a ver com o factor de localização da parcela que facilitaria a exploração da mesma e o escoamento da produção e esse factor já foi tomado em conta na fixação do rendimento fundiário da parcela, e a outra razão tem a ver com a mais valia resultante para a zona do destino dado ao conjunto das parcelas expropriadas.
X – Se do processo não resultar que o cálculo da indemnização feito segundo os critérios dos arts. 26 e 27 do CE não corresponde ao valor justo, não há razões para recorrer ao poder concedido pelo art. 23/5 do CE.
Reclamações:
Decisão Texto Integral: Expropriação 475/08.0TBVLC do 2º Juízo do Tribunal Judicial de Vale de Cambra

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Acordam no Tribunal da Relação do Porto os juízes abaixo assinados:

A Câmara Municipal … expropriou, para a construção do parque da cidade, dois prédios rústicos pertencentes a B… e mulher C…, tendo tomado posse administrativa desses prédios em 16/08/2007, depois de a vistoria ad perpetuam rei memoriam ter sido realizada em 28/07/2007 (fls. 122 a 126).
O acórdão arbitral que veio a ser proferido no respectivo processo de expropriação fixou a indemnização no valor de 71.290,80€ (invocando o disposto no art. 26/12 do Código das Expropriações) e os prédios foram adjudicados à expropriante por decisão de 06/10/2009.
Quer a expropriante quer os expropriados recorreram daquele acórdão, a primeira para que a indemnização fosse diminuída para 28.044€ e os expropriados querendo que ela fosse elevada para 271.353,25€.
Em Maio de 2010, os peritos nomeados pelo tribunal avaliaram os prédios, nos termos do art. 26/12 do CE, em 106.940,60€, o perito da expropriante em 35.055€ classificando o solo como solo para outros fins que não a construção (fls. 435 a 446) e o perito dos expropriados em 216.455,40€ classificando o solo como apto para construção (fls. 451 a 458).
Em 19/10/2011, o tribunal recorrido entendeu que os Srs. Peritos deveriam avaliar a parcela como solo para outros fins (fls. 609).
Em Dez2011, os peritos do tribunal e dos expropriados assinaram um outro relatório do qual consta a avaliação como solo para outros fins, mas esta avaliação foi efectuada apenas pelo perito dos expropriados [que deu o valor €16,50 por m2, com o resultado global de 121.770€ ou de 134.656,50€, consoante se considerasse a área de 7380m ou de 8161m; ou, em critério alternativo, reavaliou o terreno como solo apto para construção, agora à razão de €21,25/m2, com o resultado global de 156.825€ ou 173.421,25€, consoante as áreas], tendo os peritos do tribunal declarado que mantinham o critério e o valor encontrado no anterior relatório acrescentado do que consideraram de maiores detalhes (fls. 640 a 647).
A 06/03/2012 os expropriados apresentaram uma avaliação dos solos assinada por um engenheiro agrário (fls. 665 a 669).
A 28/03/2012, o tribunal determinou de novo que os peritos do tribunal apresentassem novo relatório “onde fundament[ass]em os critérios utilizados e o valor da parcela caso esta venha a ser classificada como apta para outros fins”, tendo estes dito que se sentiam incapazes de classificar a parcela como solo para outros fins e pediram escusa do cargo, o que as partes e o tribunal aceitaram (fls. 671 a 674). A 10/04/2012, o tribunal nomeou três novos peritos e incumbiu-os de avaliarem a parcela como solo para outro fins, por já ter sido avaliada como solo apto para construção (fls. 678/679).
A 14/12/2012 foi junto um novo relatório destes 3 novos peritos do tribunal que avaliaram a parcela, nos termos pedidos, em 73.800€ (fls. 696 a 699, com esclarecimentos a fls. 712 a 715).
A 15/01/2014 os expropriados juntaram um parecer técnico elaborado pela D… (fls. 746 a 757).
A 27/03/2014 foi proferida decisão, no tribunal recorrido, sobre os recursos, elevando a indemnização para 73.800€ (a actualizar desde a data da declaração de utilidade pública).
A 01/12/2014 foi distribuído neste Tribunal da Relação do Porto recurso dos expropriados contra esta decisão, recurso que termina com as seguintes conclusões:
I - Se se entender que a parcela em causa está integrada em REN/RAN, como consta do relatório, não pode ser nela construído o Parque Urbano, tal como está projectado e, aliás, está já em adiantado estado de execução, por imposição dos arts 1 e 4 do Dec.-Lei 93/90, de 19/03, e arts. 1 e 8 do DL 196/89, de 14/06, nas redacções actualizadas, e, nesse caso, deverá o Tribunal, oficiosamente, promover os procedimentos previstos nos arts. 14, 15 e 16 do DL 93/90 e arts 34 a 40 do DL 196/89.
Caso assim se não entenda,
II - Nos termos dos arts 410, 411 e 413 do Código de Processo Civil, que, no essencial, traduzem o normativo ínsito no art. 511 do antigo CPC e por imposição do n.º 4 do art. 607 do CPC, o julgador deverá seleccionar os factos relevantes para a adequada decisão da causa segundo as várias soluções plausíveis da questão de direito, declarando quais os factos que julga provados e quais os que julga não provados.
III - Ora, da análise da sentença em apreço resulta que face à prova produzida a factualidade fixada enferma de imprecisões, erros e, até inverdades, por um lado, e por outro, verifica-se a omissão de factualidade essencial, até porque, salvo melhor opinião, os factos terão sido seleccionados, apenas no pressuposto de que a parcela era solo destinado a outros fins.
IV - Assim, deverá ser alterado o decidido no respeitante aos factos dados como provados e deverá ser considerada e dada como provada a factualidade omitida, de harmonia com o alegado em B, n.ºs 1, 2, 3 e 4, e C.
Sem conceder e, por efeito,
V - Se se entender que a parcela foi objecto de desafectação prévia do ónus REN/RAN, então, nada obstará a que o terreno seja classificado e avaliado como terreno urbanizável, aliás, de acordo com o previsto nos arts. 24, 35 e 36 do Regulamento do Plano Director Municipal de Vale de Cambra.
Assim,
VI - A parcela deverá ser classificada como solo apto para construção ou urbanizável, nos termos dos n.ºs 6 e 7 do art. 26 do CE e arts 24, 35 e 36 do Regul. do PDM de Vale de Cambra ou, se assim se não entender, como solo a avaliar segundo o critério previsto no n.º 12 do art. 26 do mesmo CE, com os fundamentos alegados supra no n.º III, seus n.ºs 1 a 6.
VII - Caso assim se não entenda e a classificar-se o terreno como destinado para outros fins, deverá o terreno ser avaliado nos termos do n.º 3 do art. 27 do CE, tendo em consideração os seus rendimentos efectivos ou possíveis e demais factores legalmente atendíveis, tendo-se em consideração o teor do parecer sobre o caso, elaborado sob responsabilidade da D…/N…, que aqui se dá por integralmente reproduzido.
Com tais fundamentos,
VIII - para o caso de se classificar a parcela como solo apto para construção ou como solo a avaliar segundo o critério previsto no art. 26/12 do CE, deverá ser fixado, como justa indemnização devida aos expropriados, o valor de 216.455,40€ (fls. 451 a 458) ou, sem conceder, para a hipótese de a parcela ser classificada como solo destinado a outros fins, deverá ser atribuída indemnização de valor nunca inferior a 205.902€ (valor médio dos valores calculados, a fls. 746 a 757, quadro I do Parecer da N…).
IX - Caso assim se não entenda, porque falham os critérios referidos, nos termos do n.º 5 do art. 23 do CE e atentas todas as circunstâncias relevantes, deverá o terreno ser avaliado, segundo o critério que o tribunal venha a considerar adequado para determinar e fixar o valor real e corrente da parcela, numa situação normal de mercado.
X - Sempre, em qualquer dos casos, actualizável, de acordo com o legalmente previsto.
[XI -] Tudo, sem deixar de se entender que o Acórdão Unificador de Jurisprudência citado na decisão exorbita e não releva para o caso sub judice, na medida em que a situação nele prevista não é idêntica à agora contemplada e se situará em âmbito de constitucionalidade problemática, na medida em que não se compagina com doutrina perfilhada por certa jurisprudência do Tribunal Constitucional.
A expropriante contra-alegou defendendo a improcedência do recurso.
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Questão que importa decidir: se a matéria de facto deve ser alterada e se o valor da indemnização deve ser elevado, de acordo com o pretendido pelos expropriados.
Por não constar quer do corpo das alegações quer das conclusões do recurso, qualquer matéria relativa à indemnização prevista no art. 31 do CE, esta não é objecto de recurso, apesar de, ao longo do processo de expropriação, a questão ter sido discutida.
Das conclusões do recurso, não resulta qualquer questão relativa aos peritos - nomeações, nulidades, competências, incompatibilidades, etc. – apesar das muitas que os expropriados levantaram no decorrer do processo e das referências críticas que foram fazendo no corpo das alegações. Nenhuma delas é, por isso, objecto deste recurso (arts. 635/4 e 639/1 do CPC).
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Os factos considerados provados pelo tribunal recorrido são os seguintes (considerando apenas aqueles que tem relevo para a fixação do valor da indemnização, excluindo pois os relativos às ocorrências processuais que, na parte que interessa, já acima foram consignados):
1. Por despacho, publicado na IIª série do Diário da República, n.º 108, de 05/06/2007, foi declarada a utilidade pública, com carácter de urgência, da parcela n.º 18, com a área total de 7380 m2, que corresponde a dois prédios rústicos, ambos no lugar de Invejas [as palavras em itálico resultam dos próprios elementos utilizados para prova deste facto – parênteses da responsabilidade deste acórdão, ao abrigo do art. 662/1 do CPC], da freguesia …, concelho de Vale de Cambra, omissos na conservatória do registo predial:
- um inscrito na matriz predial rústica com a área de 3780m2 sob o artigo 821, a confrontar do norte com E…, do nascente com levada, do sul com F… e poente com G…,
- outro inscrito na matriz predial rústica com a área de 3600m2 sob o artigo 823, a confrontar do norte com H…, do nascente com levada, do sul com I… e do poente com G… e outro [de acordo com o decidido abaixou-se, alterou-se já a redacção deste facto, deixando-se de dizer que os prédios tinham aquelas áreas, mas sim que estavam inscritos com aquelas áreas].
2. A parcela situa-se em zona agrícola, na vizinhança do …, junto ao centro cívico de ….
3. Constitui uma zona com vincados traços agrícolas, a uma cota mais baixa, em contraste com a altimetria do núcleo urbano da cidade (com uma distribuição de relevo algo pronunciada).
4. O núcleo urbano em causa apresenta um misto de casas de habitação de r/c e andar antigas e outras de lavoura, renovando-se com construções modernas, em geral de 3 e 4 pisos, existindo nas proximidades algumas áreas comerciais.
5. As vias públicas mais próximas (sempre a mais de 50 metros e, em geral, da zona onde esta parcela se integra, a mais de 100 metros) apresentam-se pavimentadas, com rede de energia eléctrica, rede domiciliária de abastecimento de água, saneamento, rede telefónica e iluminação pública.
6. Os terrenos são, em geral, de natureza agrícola, com água abundante, de levadas e orientada nas extremas dos terrenos, com ramadas a vinha nas bordaduras.
7. O PDM do concelho de Vale de Cambra classifica a zona na Reserva Agrícola Nacional (RAN) e/ou Reserva Ecológica Nacional (REN).
8. A parcela, com a área de 8161m2 [alterou-se a área, de acordo com o que será decidido abaixo], tinha a forma muito irregular, aproximadamente uma justaposição de três figuras quadrangulares [isto é, figuras com quatro ângulos e não no sentido de figuras com formas de quadrados – a interpretação é feita por este tribunal de recurso], dando um comprimento máximo da ordem de 140m, largura mínima de 10m, passando por valores médios de 60m (interessando extensão de 80m) e largura de 40m (interessando extensão de 72m), relativamente plano [a redacção deste ponto resulta da correcção introduzida com base na vistoria aprm de que o tribunal recorrido se tinha socorrido para dar como provados os factos deste ponto; o que se faz ao abrigo do disposto no art. 662 do CPC, já que, tal como estava {: “tinha a forma irregular e aproximadamente quadrangular, com o comprimento máximo de 40 metros e largura média de 60 metros, constituindo uma superfície relativamente plana”} não fazia sentido (daria uma parcela como pouco mais de 2400m2)].
9. Constituía um terreno de solo fértil e profundo, próprio para culturas agrícolas, servido por água abundante e boa exposição solar.
10. Encontrava-se inculto em cerca de 50% da sua área e a restante área estava com milho semeado.
11. O acesso à parcela [já que os dois prédios foram considerados como uma só parcela, considera-se que se quis dizer parcela onde estava escrito prédio e por isso procedeu-se a esta correcção] era efectuado através de caminho público em terra que desagua nos campos.
12. Como benfeitorias não se identificaram existências relevantes.
Na sentença recorrida considerou-se que o solo devia ser considerado como solo para outros fins (que não o da construção) e fixou-se o respectivo valor por adesão ao relatório pericial de Dez2012 subscrito pelos novos peritos do tribunal.
Desse relatório podem-se extrair os seguintes juízos periciais sobre factos hipotéticos, que são, de qualquer modo, factos (Antunes Varela, Manual de Processo civil, 2ª edição, Coimbra Editora, 1985, págs. 408-409), assim tidos como suporte da sentença, para além dos já consignados:
13. O terreno em causa tem boa textura e espessura de solo.
14. Face às características do solo, o mesmo pode ter produções por hectare e por ano e respectivos valores de:
Produtos hortícolas: 25.000kg x 0,30€ ………..7500€
Milho grão: 6.000kg x 0,25€ ………..1500€
Subprodutos e diversos: (estimativa) …………..1000€
Total…………………………………………. 10.000€
15. Os encargos médios para este rendimento serão de 60%, ponderando a localização, a distância do centro cívico de Vale de Cambra e perspectivas de facilidades de escoamento dos produtos.
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Da impugnação da decisão relativa à matéria de facto
O recurso dos expropriados começa com uma listagem dos elementos de prova produzida nos autos, que os expropriados chamam de factualidade relevante. Diga-se desde já que o fazer-se uma listagem de todos os elementos de prova produzidos, não é dar cumprimento do disposto no art. 640/1b) do CPC (CPC que será referido na redacção que lhe foi dada pela reforma de 2013 excepto se for dito o contrário) que diz, sob a epígrafe ‘Ónus a cargo do recorrente que impugne a decisão relativa à matéria de facto’, que ‘Quando seja impugnada a decisão sobre a matéria de facto, deve o recorrente obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição: […] b) Os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida.’
Pelo que os elementos de prova que serão considerados serão apenas aqueles que em concreto forem sendo invocados a propósito de cada facto que os expropriados se proponham discutir se está ou não provado.
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Quanto à área dos prédios expropriados (factos 1 e 8)
Na impugnação, os expropriados dizem:
“Os expropriados apresentaram nos autos levantamento topográfico dos terrenos do qual consta que, devida e rigorosamente configurados, têm as áreas exactas de 4132 m2 (o prédio inscrito na matriz sob o artigo 821) e de 4029 m2 (prédio inscrito na matriz sob o artigo 823).
É certo que as áreas referidas e consideradas nos próprios relatórios são as constantes das descrições matriciais, mas, tendo os expropriados suscitado a divergência logo na vistoria aprm, o certo é que o Perito Sr. Eng. J… - por coincidência, também nomeado pelo tribunal para a avaliação -, fez constar do laudo de vistoria que não identificou qualquer parcela sobrante e que a expropriação era total (fls. 132). E, apesar de se tratar de esclarecer matéria relevante e dos expropriados terem reclamado a divergência, apenas o perito dos expropriados considerou nos seus laudos a hipótese de o terreno ter a área global de 8161 m2!
E o Sr. Perito, interveniente na vistoria e na avaliação, nunca teve a preocupação de conferir as áreas dos prédios! E, instado em esclarecimentos gravados em suporte digital e prestados na audiência de julgamento, em 21/01/2014, o mes-mo perito afirmou “que não mediu o terreno, que partiu da planta parcelar e mediu a área em planta (gravação)”. Assim, e concluindo, e porque o expropriante não impugnou tal matéria, deverá fazer-se constar do n.º 1 dos factos provados, contra o que dele consta, que os prédios expropriados têm as áreas correspectivas de 4132 e 4029 m2.”
Ou seja, para os expropriados, a prova de que os prédios tinham um total de 8161m2 resulta do facto de eles terem feito a afirmação e a expropriante não ter impugnado a afirmação. O facto estaria admitido por acordo e por isso deveria ser dado como provado.
Mas sem razão. O acórdão arbitral assumiu, como facto, que os dois prédios tinham a área de 7380m. Não concordando com isso (entre o mais), os expropriados recorreram do acórdão arbitral fazendo uma afirmação contrária. A expropriante, ao recorrer também contra daquele acórdão arbitral, assumiu como certa a área que dele constava, pelo que não se pode dizer que tenha aceite a área alternativa avançada pelos expropriados. Pelo que essa área não foi admitida por acordo e os expropriados teriam de fazer prova da afirmação por eles feita, porque se tratava de um facto constitutivo do seu direito a uma indemnização superior (art. 342/1 do Código Civil).
Por outro lado, o levantamento topográfico que eles apresentaram foi feito por alguém contratado por eles, sem garantia de que os dados em que o seu autor se baseou sejam os dados correctos. E os desenhos desse levantamento (fls. 17 do processo em papel) e da planta parcelar (fls. 143) são diferentes (embora, à vista desarmada, não sejam, de modo algum, suficientemente diferentes para justificar a diferença de cerca de 10% de área, nem “tenham uma forma geométrica bastante diferente” ao contrário do que se diz na resposta ao quesito 1 do acórdão arbitral, pág. 6 ou fls. 13).
O tribunal, na fundamentação da sua convicção, quanto a todos os factos, limita-se a fazer uma resenha dos documentos: acórdão arbitral e respectivo laudo dos árbitros; auto de posse administrativa; relatório da vistoria ad perpetuam rei memoriam; publicação da declaração de utilidade pública da parcela; certidões da repartição de finanças; relatórios das avaliações efectuadas pelos peritos; resposta aos quesitos apresentados pelos peritos.
O perito na vistoria aprm diz que a parcela tem área de 7380m, conforme planta parcelar; a única planta parcelar que estava junta aos autos, a fls. 143 e nela diz-se que a área é de 7380m; os árbitros tomaram como correcta a área constante da DUP de 7380m2, medida sobre a planta parcelar; e os peritos nada dizem de útil sobre a questão.
Quer dizer que a área da parcela, dada como provada nos autos, resulta apenas da consideração, assumida pelos árbitros e peritos (à excepção dos dos expropriados), de que aquilo que se diz na planta parcelar e depois na DUP, isto é, que a área a expropriar é de 7380m, está certo. E isso decorreria da medição sobre a planta.
Mas é notório que não está certo: tendo em conta a planta parcelar de fls. 143, à escala 1/1000, bem como qualquer dos desenhos da parcela expropriada que constam dos extractos do PDM, condicionantes, ordenamento e RAN, de fls. 548 a 550, estes à escala 1/10.000, e ainda a planta de localização do parque, a fls. 573, este à escala 1/2000, tudo documentos oficiais, da própria expropriante, a parcela pode-se decompor, tendo em conta a escala da primeira, de 1cm = 1000 cm = 10 m, nas seguintes figuras geométricas, medidas à régua, tudo sem grandes precisões (viram-se, normalmente, os triângulos, como triângulos rectângulos, ou quase, pelo que a medição peca por um pouco de excesso):
1 rectângulo de 6,05cm x 1,05cm = 60,5 m x 10,5m = 635,25 m2 1 rectângulo de 7cm x 3,7cm = 70m x 37m = 2590m2
1 rectângulo de 7,5cm x 4,5cm = 75m x 45m = 3375m2
1 triângulo de 4,5cm x 0,6cm : 2 = 45m x 6m : 2 = 135m2
1 triângulo de 7cm x 0,8cm : 2 = 70m x 8m : 2 = 280m2
1 triângulo de 1cm x 0,8cm : 2 = 10m x 8m : 2 = 40m2
1 triângulo de 7,5cm x 2,8cm : 2 = 75m x 28m : 2 = 1050m2
1 triângulo de 3,8cm x 1cm : 2 = 38m x 10m : 2 = 190m2
1 triângulo de 1cm x 0,2cm : 2 = 10m x 2m : 2 = 10m2
1 triângulo de 3,8cm x 0,3cm : 2 = 38m x 3m : 2 = 57m2
1 triângulo de 2cm x 1,3cm : 2 = 20m x 13m : 2 = 130m2
1 rectângulo de 0,5cm x 0,35cm = 5m x 3,5m = 17,5m2
1 triângulo de 0,9cm x 0,35cm : 2 = 9m x 3,5m : 2 = 15,75m2
Portanto, utilizando o método de que o perito da vistoria aprm e os árbitros falam, a área a expropriar até seria de pouco menos de 8525,5m2, mais ainda do que os expropriados querem.
Por outro lado, no sítio da internet da direcção geral do território, serviço do governo e por isso um sítio oficial, http://snig.dgterritorio.pt/portal/index.php?option=com_wrapper&view=wrapper&Itemid=3&lang=pt, existem, entre outros, os ortofotomapas 1:5000 Vale de Cambra, http://sig.cm-valedecambra.pt/MunWebGis/igterritorio.aspx, que incluem os voos de 2013, 2001 e 2004 (se se copiar este link e se colocar na barra de endereço num motor de busca, os mapas de que se está a falar aparecem; depois é uma questão de utilizar as respectivas ferramentas e possibilidades de navegação pelas plantas, planos, ortofotomapas, etc); ora, utilizando as várias funcionalidades desse sítio, como a de “medição de área”, qualquer medição que tenha por base o desenho (mais impreciso do que os dos expropriados) da parcela constante de qualquer dos documentos referidos acima, todos da expropriante, correspondendo a terrenos natural e suficientemente delimitados visualmente no mapa do voo de 2004 (excepto o rectângulo mais a sul que não é tão preciso), dá uma área próxima daquela, embora um pouco menor – à roda dos 8300/8400m -, mas também superior à que os expropriados querem).
De tudo isto decorre, sem qualquer dúvida, de que a medição em planta, de que os árbitros e peritos falam no processo, esta erradas e que a área real é superior. Não se sabe, precisamente, qual é essa área, sendo evidente que as medições feitas com régua e com base em figuras imaginárias são imprecisas; mas, pelo menos, de certeza, a área invocada pelos expropriados cabe naquela que é a correcta (sendo que o levantamento topográfico apresentado pelos expropriados se mostra muito mais preciso que os desenhos feitos nos documentos juntos pela expropriante e mais correspondente com aquilo que se pode visualizar no ortofotomapa do voo de 2004).
Assim, resta alterar a área no sentido pretendido pelos expropriados, o que terá de ser feita nos factos 1 e 8.
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As áreas da DUP e as áreas reais
Note-se que estas considerações dependem de se admitir, como aqui se está a admitir, que os expropriados podem alegar e provar (pois que a prova corre por conta deles: art. 342/1 do CC), como no caso fizeram, perante os elementos supra invocados, que lhes foi expropriada uma área superior àquela que consta da DUP (o que não vai trazer, em princípio, qualquer especial complexidade probatória ao processo: a prova da maior extensão terá que ser feita pelos expropriados e, dada a natureza deste tipo de processo, a contra-prova, a cargo da expropriante, será particularmente fácil, já que a expropriante sabe do que é que precisa e deve saber o que é que expropriou, sendo que, em geral, as DUP são feitas com base em medições e descrições actuais, para além de que sempre terá de ser feita prova pericial, porque obrigatória, que se poderá pronunciar sobre a questão).
Neste sentido, entendendo que se, de facto, a área expropriada for superior à declarada na DUP com base na matriz ou no registo predial – que sempre se entendeu não fazerem prova da área real de um prédio –, então o valor da indemnização terá de ser pago tendo em conta a realidade das coisas e não aquilo que consta da DUP, vão dois acórdãos do TRP (ambos relatados pelo relator do actual: um de 14/11/2013, 12145/07.1TBMAI, não publicado, e um outro de 27/11/2014, 5547/09.0TBVNG.P1); não é de aceitar que, no decurso de uma expropriação que se destina a fixar o justo valor de um prédio, o que, entre o mais, depende da sua área, se obriguem os expropriados a intentar uma acção nos tribunais administrativos para provarem a área real desse prédio; ou noutras versões, que tenham que intentar uma outra acção para conseguirem uma indemnização do dano causado com a expropriação de uma área superior.
Embora com fundamentação diversa, o ac. do TRP de 16/06/2014, 4578/07.0TBMTS.P1, também admitiu que havendo desconformidade da área da parcela expropriada resultante da vistoria aprm com aquela que os expropriados entendem que foi de facto expropriada, essa desconformidade pode ser apreciada no âmbito do expropriação, para efeitos indemnizatórios, se os autos contiverem prova concludente nesse sentido. Acrescentando que: “Todavia, quando dos autos não exista prova concludente […] isso não impede que os expropriados possam lançar mão de uma acção comum onde, com a instrução e prova que se impõe, aleguem que a parcela expropriada tinha área diferente daquela que foi levada em consideração, e peçam a condenação da entidade expropriante a pagar-lhe o valor indemnizatório correspondente, tudo, pois, com base em responsabilidade extra-contratual – art. 483 do CC”; e acrescenta também que: não é prova concludente uma planta ou qualquer levantamento topográfico para dar como demonstrada que a área da parcela expropriada não é a que consta da vistoria aprm, mas sim essa outra que consta da citada planta ou levantamento topográfico.
Também com fundamentação diversa, o ac. do TRP de 24/02/2014, 2039/09.1TBGDM.P1, aceitou que a área a considerar para efeitos de expropria-ção fosse a que se fez constar do despacho de adjudicação e dada como provada e não a área que constava da DUP, dizendo-se: “a justa indemnização há-de corresponder ao valor do bem concreto e efectivamente expropriado (considerando, nomeadamente, a área real e concreta), não podendo ser definida com base numa ficção.” Acrescentando ainda: “Decorre do exposto que, se os peritos (nomeadamente na vistoria aprm) na avaliação da área do prédio expropriado concluírem que a mesma não corresponde (por ser superior ou inferior) à que se encontra indicada na DUP, face ao princípio constitucional da justa indemnização o Tribunal não poderá deixar de considerar a área efectiva do prédio expropriado, não invadindo assim qualquer competência de qualquer tribunal de qualquer outra jurisdição.”
Esta indiferença pela DUP para estes efeitos, com preferência, pois, para a realidade que se apurar em concreto, está patente, embora a outro propósito, no ac. do STJ de 25/11/2010, 661-A/2002.E1.S1 (: Constitui matéria de facto, da exclusiva competência das instâncias, a que se traduz em apurar se determinada parcela de terreno se deve considerar abrangida por determinado acto expropriativo, fundando-se a convicção do tribunal, não em pretenso valor probatório pleno da declaração de utilidade pública, mas numa concreta indagação, realizada nomeadamente através de prova pericial, articulada com o teor da referida declaração e com os elementos que integram as descrições prediais).
No entanto, a posição jurisprudencial maioritária vai em sentido contrário: por exemplo, o ac. do TRC de 17/01/2012, 196/09.6T2VGS.C1, diz que: I – O processo de expropriação não é claramente aquele onde se possa tomar qualquer decisão de alteração de área da parcela objecto da expropriação. II - Como forma de protecção dos legítimos interesses dos expropriados – área expropriada superior à constante da DUP e correcções cadastrais – a lei aponta-lhes o caminho de poderem exigir, em acção própria, da entidade expropriante a respectiva indemnização escorada nos artigos 483 e 1305 do CC por clara violação do direito de propriedade; o ac. do TRP de 15/10/2012, 478/08.4TBVLC.P1, que também diz respeito a uma parcela expropriada para o mesmo parque que está em causa nos autos, entende que a área de um prédio expropriado é aquela que constar da DUP e que esta só pode ser sindicada pelos tribunais administrativos, não podendo a área ser alterada no processo expropriativo; o ac. do TRP de 30/05/2011, 545/08.4TBVLC.P1, que também recaiu sobre uma parcela expropriada para o parque, também não aceita a alteração da área; o ac. do TRL de 23/10/2012, 5115/11.7TBVFX-A.L1-7, que cita no mesmo sentido o ac. do STJ de 11/7/2007 (revista nº 3035-07), entende que mesmo que a área expropriada de facto tenha sido superior à área constante da DUP, o valor da indemnização da expropriação tem de ser calculado com base na área da DUP, sendo a restante área indemnizada nos termos gerais da indemnização por actos ilícitos e danosos, consistindo o dano na ocupação da área usurpada sem expropriação (art. 483 do CC). Nestes acórdãos encontra-se a referência a muitos outros no mesmo sentido, como por exemplo, os acs. do TRG de 15/10/2009, 3841.06.1TBVCT.G, e do TRP de 13/10/2005, 0533705.
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Descrições de ocorrências processuais
Os expropriados, porque dos factos provados na decisão recorrida constava uma descrição de ocorrência processual, querem que ela seja precisada fazendo constar outros dados, o que já foi feito acima. Não se trata, pois, propriamente, de matéria de impugnação de uma decisão relativa à matéria de facto; de qualquer modo, a questão fica prejudicada.
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Do facto 5
Na impugnação dizem os expropriados:
“Não é exacto e por materialmente comprovável e insofismável deve ser retirada a referência de que as vias públicas mais próximas de situavam “sempre a mais de 50 metros e, em geral, da zona onde esta parcela se integra, a mais de 100 metros”.
Na verdade, a Rua … (a rua mais próxima) apresenta todas essas características e, embora situada a cota de nível mais elevada, está a uma distância mínima de cerca de 40 metros, sendo certo que na confinância, por poente, com os quintais e logradouros das moradias, em banda, da ala poente da dita Rua ….”
Já acima foi invocado e transcrito o artigo 640/1b) do CPC; ora, como da transcrição feita do recurso dos expropriados – que se retirou do corpo das alegações já que nas conclusões, para além do que consta de IV, nada se diz -, estes não invocam qualquer meio de prova do que afirmam, pelo que a impugnação, nesta parte, é rejeitada sem mais (note-se que, de qualquer forma, estes factos ainda serão analisados mais à frente, noutra parte do recurso dos expropriados).
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Expropriação é total
Na decisão recorrida, o tribunal deu como provado que a expropriação é total.
Os expropriados, na impugnação, dizem:
“[…C]omo foi alegado supra, sendo a área global dos prédios de 8161 m2 e a área global expropriada de 7380 m2, restará uma parcela sobrante de 781 m2.
A essa questão não respondeu o Sr. Perito do Tribunal, Eng. J…, nem nas vestes de perito nomeado para a vistoria aprm (fls. 132), nem nas vestes acumuladas de perito nomeado para a avaliação!... Como referiu e consta da gravação em suporte digital dos esclarecimentos produzidos na audiência de julgamento, o Sr. Perito “mediu a área em planta”!”
O que foi dado como provado – ‘a expropriação é total’ - tratava-se, de matéria conclusiva que não tinha de constar de “factos provados” e por isso já tinha sido retirado oficiosamente da enumeração dos factos provados.
Por outro lado, a questão subjacente está ultrapassada: a área da parcela tem de ser considerada como de 8161m2 e a indemnização terá de ser calculada com base nessa área, pelo que a expropriação terá que ser considerada como total por força das circunstâncias, visto que, como não se prova que os prédios tivessem mais área, não resta parte sobrante.
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O recurso dos expropriados segue depois - no corpo das alegações, com referência apenas genérica na conclusão IV - com 28 números subordinados à epígrafe de “não foi seleccionada e considerada toda a factualidade relevante para a justa decisão da causa”.
Passam a considerar-se esses 28 números depois da transcrição integral de cada um deles:
1 - Como resulta do teor das certidões matriciais, a fls. 408 e 409, e das escrituras públicas de fls. 618 e segs., as parcelas, objecto da expropriação, estão descritas na matriz predial rústica da freguesia …, concelho de Vale de Cambra sob os artigos 821 e 823 e foram adquiridas pelos expropriados, por compra, em 31 de Janeiro de 1983.
O que ainda não consta dos factos provados é só a parte final deste ponto. Por poder interessar à decisão da causa e estar provado pela escritura pública de fls. 618 a 621 [os expropriados referem escrituras, no plural, e juntam três escrituras, mas é apenas uma escritura em três vias diferentes…], aditar-se-á à matéria de facto que:
Os prédios expropriados foram adquiridos pelos expropriados, por compra, em 31/01/1983.
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2 - O terreno expropriado corresponde à parcela 18 - e não à parcela 85, como, por lapso manifesto, ficou referido no ponto 4.2 da sentença -, na planta parcelar e mapa de expropriações relativos às áreas a expropriar, necessários à construção do Parque Urbano - Valorização Ambiental da Envolvente do … - 1.ª fase (laudo de arbitragem).
Por poder interessar à decisão da causa e por resultar da própria declaração de utilidade pública (fls. 144 a 146), aditar-se-á à matéria de facto que:
O terreno expropriado corresponde à parcela 18 na planta parcelar e mapa de expropriações relativos às áreas a expropriar, necessários à construção do Parque Urbano/Valorização Ambiental da Envolvente … - 1.ª fase.
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3 - A área global da parcela referida nas descrições matriciais e registais dos prédios, que a integram, é de 7380 m2, mas a sua área global efectiva, como resulta do levantamento topográfico feito, é de 8161 m2 (fls.17).
É de novo a questão da área, já decidida acima.
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4 - O local, pelas suas características ambientais e naturais, pela situação quase adentro da cidade de Vale de Cambra, balizado/emparedado entre o “casco” urbano propriamente dito a nascente / sul, zonas residenciais de habitação individual dispersa incluindo alguns equipamentos a nascente/norte e norte/poente, e zona de armazenagem/indústria a sul - integrando o … -, parece consentâneo para prossecução de uma vasta zona verde e de lazer, aliás o que ora se projecta (laudo de avaliação).
Os expropriados, que tanto criticaram o acórdão arbitral, vêm agora apoiar-se no mesmo, embora sem o nomearem como tal, falando genericamente num laudo de avaliação; por outro lado, transcrevem o 2º§ do ponto 3 de tal acórdão (pág. 9 do processo em papel) com omissão de uma frase: “e classificado no PDM em zonas de RAN/REN”, para além de trocarem a expressão ‘localização’ por ‘situação’.
Seja como for, este parágrafo corresponde, no essencial, a um conjunto de considerações feitas pelos árbitros ou sobre factos dados como provados [‘local, pelas suas características ambientais e naturais, pela situação quase adentro da cidade de Vale de Cambra’] ou sem base factual [‘balizado/emparedado entre o “casco” urbano propriamente dito a nascente/sul, zonas residenciais de habitação individual dispersa incluindo alguns equipamentos a nascente/norte e norte/poente e zona de armazenagem/indústria a sul’ – não dizem qual a distância é que tais zonas e equipamentos ficam da parcela pelo que não se vê como é que podem concluir que está emparedado], e não a factos, e são estes que têm que ser dados como provados ou não, não as considerações formuladas com base neles. Estas serão tomadas em conta na fundamentação de direito deste acórdão, na medida em que convençam da sua justeza em confronto com os factos provados.
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5 - A parcela expropriada está situada na contiguidade e confinância do casco urbano de Vale de Cambra, a cerca de 40 metros da Rua … (distância mínima), rua essa que é via pública e arruamento integrante da malha urbana de Vale de Cambra, e a cerca de 200 metros do … dessa cidade, distâncias que, até, poderão ser confirmadas por medição em planta (docs. 395, 548 e 549).
A fls. 395 é um extracto da planta de ordenamento do PDM de Vale de Cambra. A fls. 548 é um extracto do PDM 1993 condicionantes. A fls. 549 é um extracto do PDM 1993 planta de ordenamento. Pode-se, de facto, confirmar que há um ponto do prédio 823 mais a nascente/sul que está a cerca de 40m da Rua …, medidos a direito, com régua, pela planta, passando por cima de prédios urbanos... que é a rua mais próxima, estando uma outra, também medida dessa maneira, a 50m, e as outras pelo menos a 100m. Em nenhum destes documentos está referenciado, pelo nome, o …, pelo que deles não é possível dizer a que distância está dos prédios expropriados. Assim, pode-se aceitar como provado apenas a primeira parte, mas com a precisão referida. E como este facto pode interessar à decisão da causa, na perspectiva dos expropriados, deve ser consignado.
A ponta nascente/sul do prédio expropriado 823 está a cerca de 40m da Rua …, medidos a direito, com régua, pela planta, passando por cima de prédios urbanos... rua essa que pertence à cidade de Vale de Cambra.
Note-se aqui que nada disto põe em causa o que foi dado como provado em 5, pois que nesse ponto 5 não se diz que as medidas foram tiradas à régua, passando por cima de prédios urbanos, mas como medidas de distâncias que se têm de percorrer na realidade.
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6 - A parcela tem ainda acesso directo ao caminho público (n.º 11 dos factos provados), denominado …, de pavimento empedrado e com iluminação pública, e pelo caminho público da …, caminhos que vão entroncar na Rua …, integrante da malha urbana de Vale de Cambra (planta, a docs. 562 e 564 e depoimento gravado da testemunha).
Tal factualidade é confirmada pela testemunha K…, como consta do teor do seu depoimento gravado em suporte digital, que diz que a parcela tinha um acesso pelo caminho da Rua … (caminho público do …) e pelo caminho da ….
Os expropriados estarão a referir-se aos documentos de fls. 572 a 574, já que fls. 562 e 564 são folhas do processo e não documentos. Note-se que os expropriados não puseram em causa o facto 11, pelo que não se vê qual a vantagem de acrescentar ao que já consta dos factos provados, que o acesso aos prédios expropriados, por caminho de terra batida, tinha, depois, continuação por outros dois caminhos até à Rua … …. Nem os expropriados dizem qual o interesse deste facto. Para além de confundirem as coisas, pois que o caminho referido em 11 dos factos provados não é “caminho público, caminho …,” mas sim um caminho de terra batida… Entretanto anote-se que qualquer dos caminhos referidos têm 3,5 cm na planta, ou seja 70m, até à Rua …, medidos tendo em conta os riscos vermelhos traçados pelos expropriados (foram eles que juntaram os documentos). Como é evidente não resulta dos documentos em causa que um dos caminhos disponha de iluminação pública e os expropriados não dizem que isso tenha sido dito pela testemunha, tal como não dizem que a testemunha tenha dito que os caminhos eram empedrados. Quanto a serem públicos é conclusivo.
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7 - A Rua … tem um estabelecimento de café e restauração, repartição de finanças e centro comercial e fica situada perto dos Paços do concelho de Vale de Cambra, a 150 / 200 m do centro da Cidade.
Não foi indicada prova, a impugnação é rejeitada.
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8 - O conjunto das parcelas expropriadas e destinadas à construção do Parque, na qual está integrada a parcela em causa (parcela 18), confronta, no seu todo, de norte, directamente, com Rua …, nascente, como foi alegado, com Rua …, pelo Caminho do Paul, sul, directamente, com … (…) e poente, directamente, com estrada municipal (frente à L…) e, a escassas dezenas de metros, com arruamentos do aglomerado urbano …, vias essas integradas na malha urbana Vale de Cambra - ….
Não só não foi indicada prova, em violação do disposto no art. 640/1b) do CPC, como nem sequer se argumenta no sentido de demonstrar a utilidade deste facto; o seja, o facto é instrumental de quê? O conjunto de parcelas expropriadas não é a parcela expropriada e os réus nem sequer disseram qual a proporção desta naquela, pelo que a confrontação do conjunto não ganha qualquer relevo. Dito de outro modo, o parque urbano terá 240.000m2 (como se verá daqui a pouco) e a parcela expropriada apenas 8161m2, pelo que, nem de perto nem de longe, as confrontações do conjunto são as mesmas da parcela.
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9 - A …, a Rua … e a Rua … são arruamentos largos e asfaltados, a primeira e segunda com passeios de ambos os lados, e a terceira, com passeios, apenas em parte da sua extensão.
Vale o que se diz para 8. É um facto que está relacionado com a confrontação do conjunto das parcelas expropriadas, não com a parcela em causa nestes autos.
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10 - Tais vias fazem parte da malha da cidade de Vale de Cambra e aglomerado urbano …, dispõem de rede de saneamento, rede de abastecimento público de água, rede de energia eléctrica, rede telefónica, rede de gás, rede de iluminação pública e rede de esgotos de águas pluviais e ETAR.
Como consta da prova gravada, a testemunha K… refere que, na parcela, está instalado tubo de ligação à ETAR, que existe na cidade de Vale de Cambra.
Vale o que se diz para 9. A invocação do depoimento da testemunha confunde o que se diz neste ponto 10 da impugnação (que se refere ao conjunto de todas as parcelas expropriadas para o parque e às ruas da cidade) com o que existe na parcela. Ou seja, invoca-se um meio de prova para um facto que não se alegou.
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11 - À data da DUP, a deliberação relativa à construção do Parque já tinha sido tomada e o projecto já tinha sido aprovado, como resulta necessário do teor da DUP de 2007, sendo certo que, por deliberação de 09/08/2004, a Câmara Municipal decidiu proceder à aprovação do projecto e abertura do concurso para a construção do parque, deliberação essa que viria a ser complementada com nova deliberação, datada de 31/01/2005, onde se decidiu proceder à abertura de concurso, apenas para uma fase.
Se a DUP foi emitida é porque a construção do Parque já tinha sido deliberada. É algo que decorre dos factos provados, sem necessidade de qualquer acrescento. Quanto ao resto, os expropriados não indicaram prova.
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12 - A parcela é expropriada, como consta da DUP, para construção do Parque Urbano de Vale de Cambra e valorização ambiental do …, o que implicará, para além de alterações na morfologia do terreno, a instalação de um lago central; a construção de um anfiteatro para actividades lúdico-recreativas; a abertura de caminhos/ligações e de arruamentos circundantes dotados de ciclo-vias e amplos passeios, com espaços para aparcamento automóvel; a construção de, pelo menos, quatro recintos para a prática desportiva; a construção de dois edifícios, para equipamentos de apoio, e de um restaurante e, para além do mais, a instalação de um monumento ao espírito valecambrense, composto por 29 elementos verticais em aço-inox, dispostos em movimento espiralado e crescente até atingir 30m de altura (docs juntos, designadamente planta, projecto e caderno de encargos e Revista da Câmara, a fls. 570, 506, 568 e 569).
À data da DUP previa-se isto tudo para o Parque, embora não exactamente nos termos referidos pelos expropriados. Pelo que se pode aceitar que o que antecede estava previsto, em termos gerais, para os terrenos que foram expropriados para o efeito, pelo que, com esta ressalva, que já resultará do teor da redacção do ponto, se pode aceitar que isto está provado (com excepção da referência ao restaurante cuja previsão de construção acaba por ser afastada pelo despacho que se vai referir de seguida, o que é também indiciado pelos outros dois documentos referidos a seguir) e como tem interesse para a construção jurídica que os expropriados fazem, deve ser aditado à matéria de facto. Mas introduzem-se outras alterações na redacção sugerida pelos expropriados para a pôr de acordo com os documentos por eles invocados (utiliza-se, para além das plantas de fls. 570 e 571, a memória descritiva de fls. 585/590, cujos termos coincidem com os utilizados pelos expropriados e não, por exemplo, aqueles que constam da folha de revista, naturalmente propagandística, também parcialmente invocados pelos expropriados).
Entretanto registe-se que no Despacho n.º 17984/2005 (publicado no DR IIª série, de 22/08/2005) do Secretário de Estado do Ordenamento do Território e das Cidades, referenciado e junto pelos próprios expropriados, se diz entre o mais:
“Pretende a Câmara Municipal … desenvolver o projecto designado por Parque Urbano de Vale de Cambra, no concelho de Vale de Cambra, utilizando para o efeito 240.000 m2 de terrenos afectos à Reserva Ecológica Nacional (REN), por força da delimitação constante da Resolução do Conselho de Ministros n.º 94/96, de 26/06.
[…]
Considerando o facto de este projecto constituir um factor de descompressão, relativamente ao edificado da cidade, garantir a protecção de um espaço muito sensível, sob o ponto de vista da sua estrutura ecológica, dotando-o de novos usos adequados às características naturais da área de intervenção, e promover a qualificação paisagística de um espaço de Vale de Cambra, que se caracteriza pela sua expressão marcadamente rural e potenciadora do direito à evasão, ao recreio e à contemplação da natureza;
[…] Considerando o parecer desfavorável da Comissão de Coordenação e Desenvolvimento Regional do Norte no que respeita à localização do restaurante em zona ameaçada pelas cheias;
[…] Considerando que os valores e funções ecológicas existentes e que levaram à definição da delimitação da REN no concelho de Vale de Cambra se mantêm presentes e que o projecto do Parque Urbano da Envolvente … se enquadra neste tipo de ecossistemas da REN;
Assim, desde que cumpridas as medidas de minimização/recomendações propostas […], considera-se estarem reunidas as condições para o reconhecimento do interesse público e consequente autorização de utilização dos solos classificados como reserva ecológica nacional:
[…]
Determina-se:
No exercício das competências que me foram delegadas pelo Ministro do Ambiente, do Ordenamento do Território e do Desenvolvimento Regional, nos termos do despacho n.º 16162/2005 (2.ª série), publicado no Diário da República, 2.ª série, n.º 141, de 25/07/2005, e nos termos e para os efeitos do disposto na alínea c) do n.º 2 do artigo 4 do Decreto-Lei 93/90, de 19 de Março, com a redacção que lhe foi dada pelo Decreto-Lei 213/92, de 12 de Outubro, é reconhecido o interesse público da construção do Parque Urbano de Vale de Cambra, no concelho de Vale de Cambra, com excepção do edifício para restaurante, nas proximidades do açude jusante da lagoa a criar.”
Na memória descritiva do projecto de execução da valorização ambiental da envolvente …, de Julho de 2004, escreve-se, no último parágrafo, pág. 590, que termina a descrição do que se refere ao Parque, que: “está também previsto um lote para implantação de um restaurante junto ao lago”.
Já na memória descrita do projecto de execução do parque urbano de Vale de Cambra, de Julho de 2009, que reproduz quase ipsi verbis os §§ do anterior, elimina-se aquele último § que se referia ao restaurante.
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13 - A realização de tais obras constitui o fim da expropriação, sendo certo que, consoante resulta dos laudos, tais obras vão ser executadas, em parte, na parcela em causa.
A soma das parcelas expropriadas para a construção do Parque-1ª fase, é de – resulta da DUP – 97769m2 e o parque terá mais de 240.000m2 (segundo o despacho supra referido; o mesmo também resulta da simples medição, através da funcionalidade já referida, nos ortofotomapas de Vale de Cambra). Os prédios dos expropriados que estão em causa neste processo têm a área total de 8161m. Logo, correspondem a menos de 3,5% da área total expropriada para o Parque, pelo que não há a mínima razão para dizer que as obras (no sentido que os executados lhes dão, ou seja, construções) vão acontecer também na parcela em causa nestes autos.
14 - A parcela situa-se entre a Cidade de Vale de Cambra e o aglomerado urbano …, estabelecendo “uma franca relação com duas frentes urbanas em colmatação”, como resulta da memória descritiva, sendo certo que, como é de conhecimento notório, se situa nas proximidades de centros urbanos com grande densidade demográfica, como são as cidades de Vale de Cambra (já dita), Oliveira de Azeméis, Santa Maria da Feira, São João da Madeira, Espinho, Ovar e Porto, etc., e, por isso, com facilidade de escoamento dos bens produzidos.
Este ponto divide-se em duas metades: quanto à primeira a referência à memória descritiva é ambígua e imprecisa. Se os expropriados se querem referir à memória descritiva da 2ª fase do projecto de execução do parque, como decorrerá da frase citada entre aspas, que consta de fls. 540 do processo em papel, repare-se que ela diz respeito a todo o parque e não à parcela.
Quanto à segunda: dizer-se que se situa nas proximidades de centros urbanos (identificados) é uma generalização sem qualquer interesse como facto que se tenha que fazer constar dos factos provados. Já como facto notório pode ser considerada, na fundamentação de direito, a distância em concreto que se sabe existir entre Vale de Cambra e aqueles centros urbanos, o que será concretizado mais à frente.
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15 - Nas proximidades da parcela existem áreas comerciais, restaurantes, bares e, designadamente, um Centro Comercial, em edifício de 5 pisos no qual, entre outros, está instalada a Repartição de Finanças (relatórios juntos e depoimento gravado da testemunha K…).
É uma repetição (de parte do que já consta dos factos provados sob 4 e 5), uma evidência e uma generalidade sem qualquer interesse – qualquer parcela que se encontre a 50, 80 ou 200 metros das ruas de uma cidade, pode ser dita estar nas proximidades – isto sem qualquer precisão - de tudo aquilo que existe numa cidade, que inclui necessariamente restaurantes, bares, centro comercial, repartição de finanças, etc…
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16 - A parcela vai ser destinada à construção do parque urbano da cidade, delimitado por arruamento envolvente dotado de espaços de parqueamento e frente urbana, e, assim, virá a ser destinada a fins diferentes de REN e RAN.
É uma conclusão (que resultará ou não dos factos provados) e em parte uma repetição de factos já dados como provados. Para além de que os expropriados não indicaram a prova,
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17 - A topologia das construções existentes ou susceptíveis de ser construídas na área envolvente cujo perímetro exterior se situa a 300 metros do limite do terreno expropriado é caracterizada por edifícios de cércea variável nas edificações existentes entre 2/4 pisos na Rua … e 5 pisos na zona central.
No concernente, os expropriados não deixarão de referir que nas plantas de fls. 548 e 549, foram desenhados círculos pretensamente definidos da área a considerar para efeito de definir a tipologia de construção, mas o certo é que o assinalado não corresponde ao legalmente previsto, na medida em que, nesse sentido, releva, não apenas a área envolvente cujo perímetro exterior se situe a 300 metros do limite (não do centro) da parcela expropriada”.
Não foi indicada prova, pelo que a impugnação é rejeitada. De qualquer modo, o conteúdo deste ponto pouco acrescentava àquilo que já está dado como provado em 4.
Acrescente-se, entretanto, que neste processo não se observou a norma do art. 39/1 do CE que impõe que haja um processo por cada imóvel. Ou seja, o processo juntou, mal, dois imóveis num só processo (questão diferente seria a apensação de processos respeitantes a dois ou mais imóveis que tenham pertencido ao mesmo proprietário: art. 39/2 do CE e acórdão do TRC de 29/02/2012, 306/10.0TBMIR-B.C1). E esses dois imóveis estão a ser tratados como se fossem um só. Mas os 300m do limite do prédio 823 são necessariamente diferentes dos 300m do limite do prédio 821. De qualquer modo, foi a expropriante que englobou os dois prédios numa só parcela, pelo que o erro corre por conta da mesma.
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18 - Seria tecnicamente possível construir no terreno quaisquer edifícios e isso poderia ser feito sem prejuízo do curso das águas do rio.
Como resulta das plantas de localização do terreno e do projecto do Parque, e é já de conhecimento público e notório, a parcela em causa vai ser afecta (aliás, já o está), em grande parte, à construção da via rodoviária circundante, por nascente, do parque, via que liga a Rua …, a norte, à …, a Sul.
A prova indicada pelos expropriados é apenas uma construção lógica: se é possível construir uma via rodoviária circundante na parcela, é também possível construir quaisquer outros edifícios no resto da parcela. Mas poder-se construir numa faixa lateral de uma parcela, não quer dizer que se possa construir em toda ela ou na maior parte dela nas condições agora invocadas pelos expropriados. Pode ser que seja verdade, mas a prova indicada é perfeitamente insuficiente para o efeito.
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19 - A parcela está inserida numa área de aluvião, com solos profundos, pertencentes à classe de capacidade de uso A, solos que não apresentam limitações ao uso agrícola, não correm risco de erosão e são susceptíveis de uso agrícola intensivo (pareceres de fls. 666 e 746 e segs.).
Os Srs. Peritos do Tribunal classificaram o terreno “entre as classes B e C”, a fls. 713, e referem em esclarecimentos orais gravados, que “não fizeram exame à composição do solo, tendo-se servido do aspecto visual dos terrenos, do relatório da vistoria a.p.r.m., algumas cartas de trabalho geográficas e análise e consulta de documentação”. “Não fizeram e acham que não tinham de fazer exame para determinar a composição do terreno”.
Instados, acabaram por afirmar que “eliminaram a classe A porque o terreno não é de cultura intensiva” e não é de cultura intensiva porque “é um terreno baixo inundável, tem neve e está junto à linha de água”.
Salvo melhor opinião, os Senhores Peritos não lograram justificar, de modo racional objectivo e convincente, a classificação por si atribuída à parcela não tendo conseguido rebater a classificação da parcela como solo da classe A, atribuída aos terrenos nos pareceres emitidos pelo Sr. Eng. Agrário M…, funcionário reformado dos Serviços RAN, a fls. 666 e segs, e, sobretudo, no proficiente Parecer elaborado pela D…, a fls 746 e segs., pareceres que elaborados por técnicos e docentes da especialidade, aqui se dão por integralmente reproduzidos.
O valor da avaliação e parecer técnico apresentados pelos expropriados
Os expropriados pretendem, assim, que determinadas afirmações feitas numa avaliação pericial e num parecer técnico que apresentaram estão provadas por esses mesmos elementos.
Note-se que não se trata de, com os elementos em causa, os expropriados tentarem confirmar ou fortalecer a prova produzida no processo, designadamente o laudo do perito por eles nomeado. Os expropriados nunca dizem, nem isso decorre do confronto deste laudo com os elementos em causa, que aquilo que foi dito pelo seu perito está confirmado ou é esclarecido e reforçado por esses elementos.
Veja-se o que tinha sido dito pelo perito dos expropriados sobre o solo dos prédios:
No seu primeiro laudo:
A zona onde se situa o prédio é de natureza agrícola, de solo fértil servido por água abundante na vizinhança …, de terrenos planos a uma quota mais baixa do que a dos núcleos urbanos que a envolvem e delimitam.
No relatório da perícia de Dez2011:
Que para o cálculo do rendimento possível em aproveitamento agrícola considera-se a sua potencialidade, pelo seu solo fértil e profundo, com abundante água de rega em plena zona agrícola, clima e boa exposição solar, à configuração do terreno, às produções potenciais médias com culturas usuais, aos valores unitários das produções e encargos normalmente considerados que referia.
Ou seja, é, na prática, o mesmo que já foi dado como provado com base no relatório pericial maioritário.
Ora, a avaliação e parecer técnico juntos pelos expropriados, fazem afirmações de facto que nunca antes tinham sido feitas no processo (à excepção, em relação a este ponto 19, da referência aos solos serem profundos, que já constava do processo e foi dado como provado, estando os 5 peritos de acordo quanto a isso).
Processualmente, estes elementos são admissíveis, pois que hoje se tem vindo a entender que a tramitação definida pelos arts. 56 e ss. do CE é compatível com a apresentação de documentos ou o oferecimento de outras provas em momento posterior ao requerimento de interposição de recurso e resposta ao mesmo não prevê (veja-se o ac. do STJ de 11/12/2012, 179/1999.L1.S1, com um voto de vencido num conjunto de cinco).
Mas tais elementos de prova não são mais que perícias particulares encomendadas pelos expropriados, realizadas sem observância das normas legais das perícias judiciais (arts. 61 a 63 do CE e 568 a 611 do CPC na parte aplicável), entre o mais sem fiscalização da perícia pela parte contrária (em violação do princípio da audiência contraditória – art. 415 do CPC), sem prestação de compromisso e sem que a parte contrária ou o tribunal tenham podido averiguar a existência de obstáculos à nomeação de peritos ou ter a garantia de que as perícias foram feitas sobre o objecto mediato da causa.
Para além disso, traduzem-se ainda numa forma de produzir prova testemunhal de forma intempestiva (art. 60/2 do CE), por escrito sem observância das regras dos depoimentos escritos e sem sujeição a juramento nem às instâncias da parte contrária (arts. 415, 513, 518 e 519 do CPC).
(nesta avaliação destes pareceres tiveram-se em conta, com a devida adaptação ao tipo de processo em causa, que é um processo de expropriação litigioso, em que vale a imposição do arrolamento de toda a prova no requerimento de recurso e de resposta ao mesmo, aquilo que é dito por Alberto dos Reis no seu CPC anotado, vol. IV, reimpressão de 1981, da Coimbra Editora, págs. 22 a 30, parte da anotação 6 ao então art. 550, actual art. 426 do CPC).
Tudo o que antecede, apesar de não afastar do processo esses elementos, desvaloriza quase totalmente o valor probatório dos mesmos, independentemente do mérito e do crédito dos seus autores.
Em concreto, em relação a este ponto 19, o tribunal nem sequer pode ter a certeza se o autor da avaliação fez o corte vertical por ele referido na parcela em causa, o que logo põe em causa as restantes afirmações que faz. O que vale também em relação ao parecer técnico, que até esclarece que, como a parcela já tinha sido integrada no parque urbano, entretanto construído, a avaliação tinha como referência terrenos agrícolas adjacentes a essa infra-estrutura, isto é, lógica e naturalmente ao parque e não à parcela em causa. Sabendo-se que o parque tem 240.000m2 e que os prédios dos expropriados correspondem a menos de 3,5% dessa área, logo se pode dizer que resulta imprecisa a referência a terrenos agrícolas adjacentes ao parque e assim, e também pelo que já se disse sob a forma como foi feita esta “perícia”, não há a garantia de que, de facto, os solos expropriados sejam de capacidade agrícola “idêntica ao que teria sido a parcela em causa”.
Por fim, os autores do parecer da N… não assumem que tenham sido eles a recolher as amostras de solo e da água, cujo “interessado”, nas folhas dos resultados laboratoriais, consta como sendo o expropriado, com o respectivo endereço, e não a N…, o que também põe em causa o valor probatório destes depoimentos testemunhais prestados por escrito sem contraditório… Mesmo admitindo-se a hipótese de a recolha das amostras ter sido feita pelos próprios autores do parecer, mesmo assim quem terá feito a entrega para análise foi o expropriado, pelo que a cadeia de custódia das amostras estaria quebrada, não garantido, pois, que as entregues fossem as recolhidas.
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20 - Apesar da sua proximidade ao …, o que garante uma superficialidade profícua ao lençol freático, trata-se de solos bem drenados, raramente sujeitos a inundações, sendo que essa proximidade possibilita a realização de culturas de regadio, mais produtivas e rentáveis (parecer de fls. 746 e segs.).
Do relatório de avaliação, a fls. 698, os Srs Peritos do Tribunal afirmam que a parcela tem “solo fértil, com boa textura e espessura de solo arável e boa exposição solar”. Só que, tal factualidade é meramente conclusiva e, instados a fundamentar tais conclusões, os Senhores Peritos evidenciaram ter-se baseado na aparência visual da parcela.
Apesar disso, em esclarecimentos gravados, em audiência colectiva, afirmam que o terreno não é de cultura intensiva, é inundável, baixo, tem neve e está junto à linha de água. Como esta afirmação contraria a feita no laudo, foram perguntados se já, alguma vez, viram qualquer inundação, tendo o Sr. Perito, Eng. J…, referido que “fez lá vistorias e molhou-se”… e, perante a observação de que o Projecto do Parque prevê a construção de edifício e até a construção de um espelho de água, respondeu que “não tinha culpa do espelho de água”… (que o que lá está agora não é o que estava antes) “hoje está tudo arejado, tudo à cota, tudo cá em cima, junto à estrada”. E, perante a observação de que “o que lá existe mostra que não houve enchimento do terreno” o Sr. Perito O… tomou a palavra a referiu que “aquilo era um vale e, há uns 12 anos, havia umas cheias muito grandes e não se passava por Vale de Cambra”!...
Salvo melhor opinião, nem o Relatório de Avaliação nem os esclarecimentos prestados pelos Senhores Peritos, no concernente têm qualquer consistência objectiva, técnico-científica ou sequer empírica, que seja idónea a abalar a credibilidade dos pareceres elaborados e acima referidos, aliás, fundamentados em dados obtidos in loco, no terreno, designadamente através de cortes verticais dos solos (fls. 668 e 669) e análises laboratoriais da composição da terra e água (fls. 754 e 755).
Vale aqui o que já se disse em relação a 19: o tribunal nem sequer pode ter a certeza se os autores da avaliação e parecer trabalharam de facto sobre o solo ou sobre solo idêntico ao solo expropriado; mas para além disso, sabido que o parque já estava construído não se vê como é que os autores da avaliação e parecer podiam saber – porque não dizem e tal não resulta dos respectivos pareceres – que se tratava de solos bem drenados, raramente sujeitos a inundações.
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21 - O clima da região é moderado, permitindo que as culturas se desenvolvam em boas condições (pareceres de fls. 666 e, sobretudo, 746 e segs.).
Em relação a este ponto não se vê qualquer óbice em aceitar que este facto está provado, até porque é isto mesmo que resulta das respostas periciais dadas no processo.
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22 - A elevada percentagem de terra fina associada ao teor da matéria orgânica médio confere não só uma boa estrutura física às partículas do solo, como permite uma boa retenção hídrica em fases de maior escassez de água, nomeadamente no pico do estio (pareceres de fls. 666 e, sobretudo, 746 e segs).
Vale aqui o que já se disse em relação ao ponto 19, salientando-se o que se disse em relação à recolha das amostras.
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23 - A amostra do solo recolhida apresenta elevados teores de fósforo e potássio assimiláveis, essenciais à produção de frutos e plantas de elevada qualidade fitossanitária e organolética; ao nível dos micronutrientes extraíveis, constata-se que, não obstante os baixos teores de manganês e boro, a terra analisada apresenta teores de cobre, zinco e ferro verdadeiramente assinaláveis (resultado da análise laboratorial, a fls. 754 e parecer de fls. 746 e segs).
Vale aqui o que já se disse em relação a 22.
24 - A água disponível (…) não revela motivos de restrições à sua utilização para rega, o que possibilita a produção de legumes e frutos de elevada qualidade e, à partida, sem restrições de segurança alimentar (resultado da análise, a fls. 755, e parecer de fls. 751 e segs.).
Vale aqui o que já se disse em relação a 22, salientando-se ainda que a recolha das amostras da água em que se basearam ocorreu mais de 6 anos depois da tomada de posse administrativa dos prédios.
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25 - Entre as actividades agrícolas com mais potencial produtivo e de rentabilidade, passíveis de implementação no local, em função das suas características geográficas, ambientais, logísticas, agronómicas e socioeconómicas, contam-se a nível de horticultura intensiva, a utilização do solo, em sucessão, de espécies diferentes, nomeadamente da couve penca, da família das borássicas, e do tomate, da família das solanáceas, ou a cultura perene do mirtilo (parecer de fls. 751 e segs.).
No seu laudo de avaliação, os Senhores Peritos calcularam o “rendimento efectivo e possível dos terrenos com base no seu aproveitamento cultural mais representativo em batata/hortaliça, milho, grão e sub-produtos. Isto, atendendo “à natureza do solo e subsolo, configuração, dimensão e condições de acesso”.
Ora, a fls. 705 e 706, os expropriados pediram esclarecimen-tos escritos sobre o teor do relatório apresentado (alíneas a), b), c) e d) do n.º 3), e, nesse sentido, os Srs Peritos classificam “o terreno da parcela entre as classes B e C, não sendo pois de utilização intensiva”. E escrevem, a fls. 714, que o terreno não é de utilização intensiva, desde logo, pelo excesso de humidade e impraticabilidade de culturas em certas alturas do ano (eventuais inundações e presença de geadas). Reconhecem, no entanto, que o terreno tem apetência para produzir couve-flor, alfaces, tomate, pepinos, cebolas e feijão verde, entre outros. No entanto, reiteram que as culturas consideradas no relatório (produtos hortícolas, milho, grão e subprodutos, v.g. ervas, pastos, palha) são as que conferem mais rentabilidade económica!
E, sendo certo que admitem que os preços dos produtos hortícolas possíveis poderão variar entre €0,20 e até mais de €0,40, os Senhores Peritos fazem o cálculo do rendimento possível tendo em consideração um preço que não é o que corresponderá ao maior preço possível! E nem sequer especificam quais os produtos considerados nem as razões que os levaram à opção tomada!...
Face ao alegado, foi pedido fossem chamados a prestar esclarecimentos em audiência de julgamento e, como da gravação em suporte digital consta, no relevante para o aspecto em apreço, como, aliás, já foi alegado, não conseguiram justificar o terem classificado o terreno entre as classes B e C, afirmaram que não era possível a cultura intensiva, afirmam que as produções consideradas no seu relatório de avaliação são as que conduziam à obtenção do rendimento máximo e reconhecem que “se pode cultivar quase tudo, é preciso é saber que rendimentos é que isso tem”.
Ora, como resultará do teor do relatório de avaliação e dos esclarecimentos escritos e orais (gravados) prestados, a avaliação feita pelos Srs. peritos do Tribunal não teve em consideração, de modo objectivo e fundado, a natureza do solo e subsolo, as verdadeiras e reais condições de acesso à parcela, as culturas que garantiriam o rendimento possível à data da DUP, a proximidade dos mercados e os preços dos produtos possíveis e mais rendíveis.
Será que o relatório de avaliação dos Srs peritos do Tribunal, que chega a ser contraditório em si, será idóneo do ponto de vista técnico científico ou, até, empírico, para afastar a credibilidade do Parecer emitido sobre a responsabilidade e competência específica da D1...?
Vale aqui o que já se disse em 19; e afastada a procedência das restantes pretensões de aditamento, esta última perde as respectivas bases de apoio. Dito de outro modo, sem os factos que constavam dos pontos 19 a 24, estes do ponto 25 não têm suporte.
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26 - A parcela fica situada em região densamente povoada e consumidora, nas proximidades e com fáceis e rápidos acessos ao Mercado Abastecedor do Porto e às cidades de Oliveira de Azeméis, S. João da Madeira, Ovar, Santa Maria da Feira, Espinho, Vila Nova de Gaia, Matosinhos e Porto (conhecimento notório e parecer de fls. 666 e segs e, sobretudo, parecer de fls. 746 e segs).
Como factos notórios podem ser tomadas em consideração na fundamentação, não tendo que constar dos factos provados. O que interessa é que sejam, realmente, notórios.
Ora, aquilo que se pode dizer que é notório é que os prédios se localizam em Vale de Cambra que tem uma densidade populacional de 151,5 pessoa por km2, cerca de 30% mais do que a média nacional que é de 114,5 p/km2, mas menos de 10% da da região do Grande Porto, e se situam na região de Entre Douro e Vouga que tem uma densidade populacional de 317,5 p/km2, cerca de 3 vezes mais do que a média nacional, embora menos 5 vezes do que a região do Grande Porto, ficando a cerca de 12,5 km de uma cidade com uma densidade populacional de 2722,5 p/km2 (São João da Madeira), a cerca de 35 km da região do Grande Porto, com uma densidade populacional de cerca de 13,6 vezes maior que a média nacional, e a cerca de 47 km do Porto que tem uma densidade populacional de 5365,8 p/km2 que é cerca de 47 vezes a da média nacional.
A notoriedade resulta de os dados agora avançados serem colhidos nos sítios na internet do Instituto Nacional de Estatísticas, viamichelin e google maps, sítios com evidente credibilidade e notoriedade.
Não é, por isso, exacto dizer-se, como o fazem os expropriados, que os prédios se localizam numa região densamente povoada; note-se que em Portugal a densidade populacional média é de 114,5 pessoas por m2; no Grande Porto - que inclui Espinho, Gondomar, Maia, Matosinhos, Porto, Póvoa do Varzim, Valongo, Vila do Conde e Vila Nova de Gaia - é de 1560,9 pessoas por km2; na unidade territorial de Entre Douro e Vouga, que inclui Arouca, Oliveira de Azeméis, Santa Maria da Feira, São João da Madeira e Vale de Cambra é de 317,5 pessoas por km2 - sendo que São João da Madeira tem 2722,5 pessoas por km2 e Vale de Cambra 151,5; por outro lado, Vale de Cambra fica a cerca de 11/12 km de Oliveira de Azeméis, 12,5/13 de São João da Madeira, 20 de Santa Maria da Feira, 31 de Ovar, 35 de Espinho, 46/50 de Vila Nova de Gaia, 47/53 do Porto e 55/57 de Matosinhos.
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27 - Segundo o parecer técnico de avaliação elaborado pela D…, “partindo de rendimentos conservativos, quer em termos de produtividade quer de preços, a sucessão tomate-couve penca gera um rendimento líquido anual de cerca de €32,20/m2 (anexo C) e a cultura dos mirtilos, embora com alguma variabilidade anual, fruto do ritmo de crescimento e envelhecimento da plantação, quando analisados os fluxos de custos e receitas anuais gerados ao longo de 20 anos de vida útil da plantação, gera um valor de rendimento de cerca de €23,60/m2 (Anexo D), valores esses que, segundo o Quadro I de tal Parecer, a fls. 753, corresponderão, como valores totais da parcela, as quantias correspectivas de 237.636€ e 174.168€, como tudo melhor consta do teor de tal documento que aqui se dá como integralmente reproduzido (fls. 745 a 757).
Vale aqui o que já se disse em relação a 25.
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Aditamento de factos em resultado da procedência parcial da impugnação:
16. Os prédios expropriados foram adquiridos pelos expropriados, por compra, em 31/01/1983.
17. O terreno expropriado corresponde à parcela 18 na planta parcelar e mapa de expropriações relativos às áreas a expropriar, necessários à construção do Parque Urbano/Valorização Ambiental da Envolvente … - 1.ª fase.
18. A ponta nascente/sul do prédio expropriado 823 está a cerca de 40m da Rua …, medidos a direito, com régua, pela planta, passando por cima de prédios urbanos... rua essa que pertence à cidade de Vale de Cambra.
19. A construção do Parque Urbano de Vale de Cambra e valorização ambiental …, 1ª fase, implicará alterações na morfologia do terreno, a instalação de um lago central; a adopção de um anfiteatro natural para actividades lúdico-recreativas; a existência de arruamentos circundantes dotados de ciclo-vias e de amplos passeios, com espaços para estacionamento automóvel; a construção de 4 recintos para a prática desportiva e dois edifícios para equipamentos de apoio e, para além do mais, a instalação de um monumento ao espírito valecambrense, com localização no plano de água, composto por 29 elementos verticais em aço-inox, dispostos em movimento espiralado e crescente até atingir 30m de altura
20. O clima da região é moderado, permitindo que as culturas se desenvolvam em boas condições.
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Da classificação do solo
Art. 25 do CE – alíneas a), b) e c) do nº. 2
Segundo o art. 25/1 do CE, para efeitos do cálculo da indemnização por expropriação, o solo classifica-se em solo apto para a construção e solo para outros fins.
E, segundo as normas do art. 25/2 do CE, considera-se solo apto para a construção apenas aquele que se encontra numa das situações previstas numa das suas alíneas, sendo que todos os outros são, por exclusão de partes, solos para outros fins (art. 25/3 do CE).
No caso dos autos, o solo dos dois prédios expropriados não se encontra em nenhuma das situações previstas nas várias alíneas do art. 25/2 do CE, pelo que o solo não pode ser considerado apto para a construção, tendo que se classificado como solo para outros fins.
Com efeito, o solo não dispõe de nenhuma das infra-estruturas exigidas para o efeito nas als. a) e b). O facto de os prédios estarem situados a 50, 70, 80 ou a 100 m de ruas que têm as infra-estruturas previstas na al. a) não quer dizer, antes pelo contrário, que os próprios prédios disponham dessas infra-estruturas.
Como o preenchimento da previsão da al. b) fica afastada pela inexistência daquelas infra-estruturas, não interessa avançar mais a análise do preceito que não tem o sentido, invocado pelo expropriados no corpo das alegações, de se bastar, por força da 2ª parte da alínea, com a integração em núcleo urbano existente. A alínea exige os dois pressupostos: i) que disponha de parte das infra-estruturas e ii) se integre em núcleo urbano existente. Os expropriados apoiam-se, para defenderem a posição contrária, num acórdão do TRC que identificam como publicado na CJ, tomo I, pág. 100, tal como já antes tinham referido um outro, do TRP apenas dizendo que estava publicado no Tomo III, pág. 82, o que é insuficiente para a respectiva identificação por falta de ano; de qualquer acrescente-se que a noção de núcleo urbano tem sido considerada idêntica à de aglomerado urbano e esta, definida nos termos do art. 62/1 do DL 794/76, de 05/11, é um “núcleo de edificações autorizadas e respectiva área envolvente, possuindo vias públicas pavimentadas e que seja servido por rede de abastecimento domiciliário de água e de drenagem de esgoto, sendo o seu perímetro definido pelos pontos distanciados 50 m das vias públicas onde terminam aquelas infra-estruturas urbanísticas”. Quer isto dizer, tendo em conta os factos provados, que apenas a ponta nascente/sul do prédio expropriado 823 estaria integrada no núcleo urbano existente, não a parcela que, no mais, está sempre a mais de 50 m de tal rua.
Quanto ao limite de uma área cujo perímetro exterior se situe a 300m do limite da parcela, o mesmo tem apenas a ver com o art. 26/12 do CE, não com o art. 25/2c) do CE, não tendo os expropriados dado razões para defenderem o contrário.
Por outro lado, o solo não possui qualquer alvará ou licença exigidos pela al. d). Os expropriados sugerem o contrário, com base no facto de o parque urbano onde a parcela está inserida dispor necessariamente dessa licença já à data da DUP, mas é evidente que a “licença” para a construção de um parque camarário de lazer e verde num conjunto de parcelas, não pode ser vista como a licença de construção de um edifício urbano na parcela expropriada, valendo, de resto, quanto a isto, tudo o que se vai dizer a seguir.
Arts. 25/2c) do CE
Falta a hipótese da al. c): sugerem os expropriados que, como o solo está destinado, como decorre dos factos 17 e 19, isto é, por força da integração no parque urbano da cidade, a adquirir tudo aquilo que consta do facto 19, entre o mais infra-estruturas previstas na al. a), ele deve ser considerado solo apto para a construção por força da al. c) do nº. 2 do art. 25.
Só que, primeiro, não consta dos factos provados, incluindo o facto 19, que tudo aquilo que estava previsto para o parque, se possa dizer também previsto para a parcela. Já se referiu que o parque terá 240.000m2 e a parcela menos de 3,5% do conjunto, pelo que o dizer-se que no parque se construirão edifícios, não quer dizer que a parcela também esteja destinada à construção de edifícios.
Segundo, a construção do parque urbano não se destina a dotar os solos de infra-estruturas para a construção de edifícios em termos gerais, como pressuposto pela al. a), parte final, mas sim a dotá-lo de uma zona verde, de lazer e com infra-estruturas e equipamentos públicos destinados a esse fim (de zona verde e/ou de lazer). Ou seja, nesse espaço não será possível construir a não ser infra-estruturas e equipamentos públicos destinados a zona verde e de lazer. Isto resultará ainda mais evidente do que se segue.
Art. 26/12 do CE
Como alternativa à classificação do solo como apto para construção, os expropriados entendem que a situação cabe na previsão do art. 26/12 do CE. Mas a situação típica do art. 26/12 diz respeito ao seguinte, como decorre da sua inserção sistemática: um determinado solo tinha as características previstas na al. a) do art. 25/2 e por isso era um solo apto para a construção mas, por força de um plano municipal de ordenamento do território, esse solo tinha sido classificado como zona verde, de lazer ou para a instalação de infra-estruturas e equipamentos públicos, tornando impossível outra construção. Ou seja, pressuposto necessário da aplicação do nº. 12 do art. 26 é que se estivesse perante um solo apto para a construção e que um PMOD viesse tornar impossível essa construção, o que, como já se viu, não é o caso
(neste sentido, por exemplo, vejam-se os acs. do TRP de 09/07/2014, 50/05.0TBLSD.P1: […] não sendo aplicável o disposto no art. 26/12 do CE […] porque a sua aplicação pressupõe a prévia classificação do solo como apto para construção […]; do TRG de 06/02/2014, 341/10.9TBAVV.G1: Os solos expropriados, desde que tenham sido adquiridos em data anterior à publicação do plano municipal que os afectou a fins de interesse público (v.g. zona verde e de lazer, implantação de infra-estruturas e equipamentos), podem ser avaliados nos termos do art. 26/12 do CE, e não do art. 27, se já possuíssem potencialidade edificativa, convocando-se e não se abdicando de qualquer um dos critérios elencados nas alíneas a), b, c), e d) do nº 2, do art. 25; do TRP de 21/01/2014, 5969/09.7TBMTS.P1; do TRP de 10/10/2013, 10033/06.8TBMTS.P1: Os terrenos integrados em RAN ou REN […] deve[m…] ser avaliados nos termos previstos no nº 12 do art. 26 do CE os que tenham sido adquiridos anteriormente à sua inclusão em RAN ou REN, desde que reúnam alguns dos requisitos exigidos pelo nº 2 do art. 25 para a sua classificação como solo apto para construção; do TRC de 07/05/2013, 2138/11.0TBFIG.C1: A eventual aplicação do art. 26/12 do CE - cálculo do valor do solo apto para construção - a parcela expropriada, inserida em zona RAN, pressupõe, necessariamente, a aptidão edificativa desse terreno expropriado, aferida por qualquer um dos elementos objectivos definidos no art. 25/2 do CE; ac. do TRP de 08/07/2010, 6617/06.2TBMTS.P1: A aplicação do critério a que alude o art. 26/12 do CE está condicionada à verificação dos seguintes pressupostos: a) […] b) – que o solo tivesse concreta aptidão construtiva, caso não tivesse sido classificado como “zona verde, de lazer ou para instalação de infra-estruturas e equipamentos públicos” II – A mencionada norma não tem, pois, como objectivo estabelecer um critério autónomo para avaliação de todo e qualquer terreno classificado como “espaço verde, de lazer ou para instalação de infra-estruturas e equipamentos públicos” […]).
Arts. 25/2c) e 26 do CE
Ora, voltando ao que se estava a dizer, o que agora expôs permite dizer que a previsão do art. 26/12 do CE serve precisamente para demonstrar o contrário do preenchimento da previsão do art. 25/2c), porque lembra que uma deliberação de classificação de uma determinada área como zona verde, de lazer ou para a instalação de infra-estruturas e equipamentos públicos, transforma o solo dos prédios impossível para construção, deste modo reforçando a conclusão a que se chegou de que não está preenchida a situação da al. c) do art. 25/2 do CE.
Em suma: não estamos nem perante um solo para outros fins que o projecto de parque da cidade tenha transformado em solo apto para a construção [art. 25/2c) do CE], nem perante um solo apto para a construção onde um qualquer plano municipal tenha tornado impossível construir.
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Jurisprudência no mesmo sentido
Neste mesmo sentido foi também o ac. do TRP de 14/03/2013, 585/08.3TBVLC.P1, precisamente para uma outra parcela expropriada para o parque em causa nestes autos; diz o acórdão: “Pela análise efectuada, não poderá também colher a argumentação no sentido de que o destino a dar à parcela expropriada deva influenciar a classificação do solo. Ou melhor, tal só seria de reconhecer se essa destinação fosse demonstrativa de anterior aptidão para a construção do solo expropriado. E, nesse aspecto, por muito que os recorrentes se esforcem por realçar os componentes a edificar do projectado parque urbano, não poderemos nunca esquecer que este mais não é do que um parque. E, sobretudo, que resulta inequivocamente dos autos que a parcela expropriada nunca teve aptidões construtivas, nomeadamente não tendo nenhuma das características previstas no nº 2 do artigo 25 do CE.”
E também o ac. do TRP de 28/10/2010, 942/08.5TBLSD.P1: Para que o terreno integrado na RAN possa ser avaliado de acordo com o critério estabelecido no art. 26/12 do CE, não basta que dela tenha sido desafectado para a construção de infra-estruturas ou equipamentos públicos, impondo-se, ainda, que o solo daquele terreno possa ser classificado como apto para construção, de acordo com os critérios estabelecidos no nº 2 do art. 25 do mesmo CE.
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A ocupação da parcela com arruamentos circundantes
Dos factos provados decorre que os arruamentos circundantes do parque urbano da cidade, porque o circudam, e dada a localização da parcela no limite do parque - como resulta do desenho da parcela na planta de ordenamento apresentada pela expropriante e junta a fls. 549 -, ocuparão, necessariamente, parte da parcela.
Pelo que a questão se podia pôr novamente: este facto permitiria o preenchimento da previsão da al. c) do nº. 2 do art. 25 do CE?
Ora, tudo o que antecede é válido também para esta questão que, no entanto, pode ser considerada autonomamente, mas sempre sem se perder de vista que, de qualquer modo, tais arruamentos circundantes são ainda parte do parque urbano e destinado aos fins deste.
É que também aqui se tem de ser em conta que tal infra-estrutura não se destina a servir a construção de edifícios na parcela. A propósito de expropriações de terrenos que já estavam previstos em PDM’s como destinados a construções de vias de comunicação, em que normalmente também existem todas aquelas infra-estruturas e outros equipamentos, como estações de serviços, sempre se entendeu que essa destinação não implicava a aplicação da al. c) do art. 25/2 do CE.
Por exemplo, no ac. do TC de 17/04/2002, nº 172/02: “quando o terreno expropriado é afectado à construção de uma auto-estrada, não pode falar-se em aptidão edificativa: o terreno não a tinha […] e o destino que lhe é dado continua a não revelá-la.”
O ac. do TRP de 01/10/2013, 4620/08.7TBMTS.P1, considerou que a expropriação não visou a construção de prédios urbanos, mas sim à construção de uma via de comunicação que não pode ser encarada como uma edificação urbana, devendo ser vista antes como uma “acessibilidade”, nos termos dos arts. 10/f) e 16 do Dec.-Lei 380/99, de 22.9 (Regime Jurídico dos Instrumentos de Gestão Territorial).
O ac. do TRP de 21/03/2013, 3431/07.1TBMTS.P1, considerou que “o valor da parcela expropriada do prédio integrado na RAN e que dela foi destacado para a construção de um equipamento rodoviário pode ser calculado nos termos do n.º 12 do art. 26 do CIRE por aplicação analógica,” mas isso “por ter ficado provado que a parcela reunia as condições referidas nas alíneas a) do n° 2 do art. 25 do CE”, já o ac. do TRP de 22/11/2012, 11122/05.1TBMTS.P1, do mesmo relator, considerou que apesar da parcela expropriada ter sido destacada do prédio para aí ser construído um equipamento rodoviário, não deve ser equiparada a solo apto para construção para efeitos de aplicação do art. 26/12 do CE, entre o mais por não satisfazer, manifestamente, nenhuma das situações previstas nas als. c) e d) do nº. 2 do art. 25. Ou seja, em qualquer destes dois acórdãos, o facto de a parcela ter sido destinada à construção de equipamento rodoviário não fez preencher a previsão da al. c) do nº. 2 do art. 25 do CE.
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O ac. do TRP de 15/12/2010
Contra tudo isto, no entanto, veja-se o ac. do TRP de 15/12/2010, 582/08.9TBVLC.P1, que também recaiu sobre uma parcela expropriada para a construção do parque urbano em causa nestes autos. Este acórdão entendeu que o solo da parcela expropriada, apesar de se inserir na RAN e na REN – o que impediria a sua classificação como solo apto para a construção -, deve ser valorizado de acordo com os critérios fixados para o solo apto para construção, nos termos do art. 26/12 do CE, uma vez que tal parcela está predestinada a “zona verde e de lazer”.
Apesar de tudo o que já se disse acima e que não se vê razões para desdizer e apesar deste ter sido o único e o mais antigo dos 5 acórdãos conhecidos sobre o caso do parque urbano em causa nestes autos que aceitou a tese de que o solo devia ser indemnizado nos termos do art. 26/12 do CE (mas, por outro motivos, sem reflexos práticos, já que a indemnização acabou por se manter), a argumentação pode ser considerada autonomamente por ter interesse e também porque o acórdão em causa assume a posição que o acórdão arbitral e os peritos iniciais do tribunal assumiram neste processo.
Com efeito, o acórdão arbitral e os peritos iniciais entenderam que como a construção do parque e valorização ambiental da envolvente … tornava a parcela um espaço verde e de lazer e para a instalação de infra-estruturas e equipamentos públicos, como é certo que transforma, o mesmo devia ser indemnizado nos termos do art. 26/12 do CE. Para o efeito os peritos iniciais consideraram que o parque se integrava na unidade operativa urbana 7 do plano de pormenor de expansão norte da Vale de Cambra (ratificado pela resolução do conselho de ministros 157/2001, publicado no DRIª série de 31/10/2001) onde é possível edificar, segundo resulta do seu art. 11/1, moradias habitacionais de tipologia familiar.
Mas para o efeito não juntaram a planta de síntese/implantação e planta de condicionantes que fazem parte desse plano de pormenor, identificando aí o parque urbano. Nem juntaram qualquer Plano de pormenor do Parque da Cidade, que referiram várias vezes, mas de cuja existência não existe qualquer prova.
Para além disso, no plano de pormenor de expansão norte diz-se, no art. 9, que as áreas incluídas na área de intervenção do Plano são classificadas, para efeitos de ocupação, nas seguintes categorias morfológicas: a) Unidades operativas urbanas (UO) do Plano; b) Edifícios e equipamentos públicos existentes a manter; c) Equipamentos lúdico-recreativos; d) Áreas verdes públicas; e) Percursos pedonais lúdicos. Perante isto, logo se diria que não faz sentido dizer que um parque urbano, destinado à instalação de equipamentos públicos, áreas verdes públicas e percursos pedonais lúdicos [alíneas b) a e)], esteja inserida numa unidade operativa urbana [alínea a)], ao menos para efeitos de construção de moradias, pelo que se torna evidente que essa integração, feita no primeiro relatório pericial, se tratou de uma aplicação analógica para efeitos de se poder dizer que a parcela tinha capacidade edificativa de moradias habitacionais de uma zona próxima (a do plano de pormenor de expansão norte).
Mas, para além de resultar da interpretação do escrito pelos peritos iniciais que de facto o parque da cidade não está situado na UO7 do plano de pormenor, isso também resulta da planta de síntese, fotocópia da pág. 6975 do DRI de 31/10/2001, apresentada pelos próprios expropriados. É que esse plano de pormenor de expansão norte nada tem a ver com o parque da cidade, não o englobando minimamente e muito menos a parcela em causa nos autos. O que é possível constatar bastando para tanto ter presente a rotunda que consta dessa planta de síntese para efeitos de melhor localização. A parcela está a oeste da zona a que o plano de pormenor de expansão norte diz respeito. E tudo isto resulta ainda mais claro utilizando a ferramenta “limite planos” que existe nos ortofotomapas de Vale de Cambra já referido.
Assim, embora se perceba que os peritos iniciais tenham integrado o parque numa área urbanizável e depois urbana - afinal de contas ele chama-se parque urbano – é evidente que no parque não está prevista – como até resulta do facto 19 dado como provado por iniciativa dos expropriados – qualquer construção de moradias habitacionais ou outro edifícios, mas apenas de infra-estruturas e equipamentos públicos para zona verde e de lazer.
Em suma: embora os peritos iniciais tenham sugerido que a parcela expropriada, integrado num parque urbano, passava a fazer parte da área urbanizável tipo B-menor densidade, não há quaisquer factos provados nos autos que permitam dizer que a parcela tenha passado a integrar qualquer área urbanizável para construção de moradias ou qualquer outro tipo de construção que não o de construção para infra-estruturas e equipamentos públicos para zona verde e de lazer, tendo-se estado a considerar este argumento apenas por ele ter estado na base do acórdão do TRP de 2010.
Também contra a posição deste ac. do TRP de 2010 e a classificação daí decorrente, vai o ac. do TRP de 07/02/2011, 549/08.7TBVLC.P1, com o argumento do perito da expropriante, de que o solo expropriado, não é [classificado] nem se vislumbra que possa vir a sê-lo em qualquer revisão futura do PDM, como apto para ocupação urbana, dado que se encontra inserido em espaço classificado como Reserva Ecológica Nacional no DRIª série, n.º 139 de 21 de Julho, pg. 4482.
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Desafectações
Nestes autos, aliás, nem sequer há prova, de que as áreas utilizadas na construção do parque urbano da cidade tenham deixado de pertencer à RAN e à REN, porque, ao contrário do que os expropriados sugerem, o facto de ser autorizada a utilização dos solos classificados na REN não equivale à desafectação de tais áreas (segundo o art. 4/2c do DL 93/90, de 19/03, na redacção que lhe foi dada pelo DL 213/93, de 12/10, regime então em vigor, tal autorização preenchia apenas a previsão de exclusão de uma proibição de acções em áreas incluídas na REN), tal como as concessões, aprovações ou autorizações relativas a utilizações não agrícolas de solos integrados na RAN não equivale a tal desafectação, como decorre por força dos arts. 8, 9 e 10 do DL 196/89, de 14/06, regime então em vigor; daí que a epígrafe dos artigos 9 e 10 fale em utilização de solos da RAN condicionadas ou não pela lei geral).
É o que também resulta do Despacho n.º 17984/2005 (publicado no DR IIª série, de 22/08/2005) do Secretário de Estado […], referenciado e junto pelos próprios expropriados, onde se diz, entre o mais: “Considerando o facto de este projecto […] garantir a protecção de um espaço muito sensível, sob o ponto de vista da sua estrutura ecológica […] Considerando que os valores e funções ecológicas existentes e que levaram à definição da delimitação da REN no concelho de Vale de Cambra se mantêm presentes e que o projecto do Parque Urbano da Envolvente … se enquadra neste tipo de ecossistemas da REN […].”
Ou seja, podendo a desafectação ser vista como aquilo que se verifica quando um terreno é excluído da REN, ou então quando, embora continuando a fazer parte da REN, é dada autorização para utilização para outros fins que não os próprios da REN, tal não se prova no caso dos autos em qualquer desses entendimentos, pelo menos em relação à REN (e tanto basta para aquilo que se está a discutir).
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Ainda quanto ao art. 26/12
De outra perspectiva, o art. 26/12 do CE existe para evitar que as câmaras municipais transformem prédios aptos para construção em zonas verdes ou de lazer ou para instalação de infra-estruturas e equipamentos públicos para mais tarde os virem a expropriar pagando indemnizações baixas por não se poder construir nesses prédios (são as classificações dolosas ou de ilegítimas manipulações de valor de mercado, referidas, por último e por exemplo, no ac. do STJ de 17/10/2013, 3431/07.1TBMTS.P1.S1). Ora, como nos prédios dos expropriados não eram aptos para a construção, não só a situação não cabe nesta previsão, como a solução não tem o carácter de imoralidade que os expropriados dizem ter, ou, alternativamente, de abuso de direito.
Também por isto, isto é, por o solo dos prédios não poder ser classificado como apto para a construção por não ter nenhuma das infra-es-truturas previstas no art. 25/2a) e b), nem estar destinado a tê-los para efei-tos de construção de edifícios, não tem influência, para estes efeito, o facto de o solo deles estar incluído em zona RAN e REN. Ou seja, não é por este facto que o solo tinha deixado de ser apto para a construção. E, por isso, também não tem sentido, no caso, defender a aplicação analógica do art. 26/12 do CE à situação. E, assim sendo, não teria qualquer relevo o facto de o solo dos prédios ter sido eventualmente desafectado – e aliás nada indicaria que o tivesse sido de forma ilegal - da RAN e da REN. Ou seja, não era por estar abrangido nestas que o solo dos prédios tinha de ser classificado como para outros fins que não a construção.
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A indemnização da expropriação tendo em conta a classificação do solo como para outros fins
Rege, aqui, o disposto no art. 27/3 do CE, não havendo dúvidas nos autos sobre a inaplicabilidade do disposto no nº. 1 desse art. 27.
Nos termos daquele número, o valor do solo terá então de ser “calculado tendo em atenção os seus rendimentos efectivo ou possível no estado existente à data da declaração de utilidade pública, a natureza do solo e do subsolo, a configuração do terreno e as condições de acesso, as culturas predominantes e o clima da região, os frutos pendentes e outras circunstâncias objectivas susceptíveis de influir no seu cálculo.”
E agora, tendo em conta os factos dados como provados em 2, 3, 6, 7, 8, 9, 10, 11, 13, 14, 15, 18 e 20, e os factos notórios acima referidos quanto à localização da parcela (relativamente à distância de populações com grande densidade populacional), pode-se acompanhar o cálculo efectuado pelos peritos do tribunal no seu último relatório, de Dez2012, tal como o fez o tribunal recorrido e concluir-se por um rendimento bruto de 10.000€ por hectare e considerar para encargos uma percentagem média de 60% - dada a localização, a distância do centro cívico de Vale de Cambra e perspectivas de facilidades de escoamento dos produtos – o que dá um rendimento líquido de 4000€ por hectare.
Note-se aqui que o rendimento líquido por hectare dado pelo perito dos expropriados era até menor do que este: 3955€, como se pode ver na fls. 644. Quer isto dizer que, em relação aos factos que permitem estabelecer o rendimento fundiário da parcela, não há divergência, no que interessa aos expropriados, entre os peritos do tribunal e o deles. Dito de outro modo, não há um único perito, dos 5, que avance factos que permitam um rendimento fundiário mais elevado do que aquele que resulta dos factos provados (já que, em relação ao que falta, que é o perito da expropriante, este diz, naturalmente, que o rendimento fundiário é muito inferior a 4000€ anuais).
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Taxa de capitalização
Achado o rendimento líquido anual dos prédios, o valor dos mesmos resultará da aplicação ao mesmo de uma taxa de capitalização e é aqui que começam as divergências.
Os peritos do tribunal e da expropriante entendem que a capitalização deve ser calculada com base numa taxa de 4% - considerando que a taxa normal de capitalização desse rendimento, tida como mais ajustável ao aproveitamento agrícola em causa (e numa perspectiva de perpetuidade e constância de rendimentos) é de 4%. E depois esclareceram – tendo em vista uma reclamação dos expropriados - que a taxa de capitalização não tem relação com o facto de se estar mais ou menos próximo da cidade (os expropriados diziam que essa tinha sido a taxa aplicada num outro processo relativamente a um prédio mais interior e mais afastado da cidade), mas com o processo produtivo, tipo do produto e rendimentos obtido e sua estabilidade no tempo/volatilidade.
Note-se que também o parecer técnico apresentado pelos expropriados aplicou uma taxa de 4% (que, noutra forma, corresponde a 0,04), considerando-se que reflecte o custo de oportunidade do capital em aplicações financeiras de idêntico risco.
Já o perito dos expropriados entende que deve ser de 3%, dizendo que é a mais adequada e apropriada à situação em causa, o que não parece muito para contrapor à posição maioritária, mais fundamentada e com apoio de um parecer técnico junto pelo próprio expropriado.
A capitalização faz-se aplicando essa taxa ao rendimento líquido anual, por exemplo, assim: [4000€/ha : 0,04] : 10.000m2, do que resulta um valor de 10€ por m2
Pelo que, se a taxa for inferior, o valor do m2 é superior e a valor do imóvel é também superior; assim: [4000€/ha : 0,03] : 10.000m2, do que resulta um valor de 13,33€ por m2.
O ac. do TRP de 15/10/2012, 478/08.4TBVLC.P1, num caso idêntico aos dos autos (por dizer respeito a outra parcela destinada ao mesmo parque e para o mesmo tipo de cultura), aplica também a taxa de capitalização de 4%. No ac. do TRP de 08/07/2010, 6617/06.2TBMTS.P1, aceitou-se a aplicação, pela decisão recorrida, de uma taxa de capitalização de 2%. No ac. do TRP de 22/01/2013, 6449/06.8TBVNG.P1, aplicou-se uma taxa de capitalização de 3%. Nenhum destes dois últimos acórdãos dá razões substanciais para a escolha da taxa, ao contrário do primeiro.
Tendo em consideração, no caso, que os expropriados, incluindo o seu perito, não dão razões substanciais para afastar a tese da maioria dos peritos, mais fundamentada e com apoio de um parecer técnico junto pelos próprios expropriados, entende-se que a taxa a aplicar deve ser a de 4%, pelo que o m2 de solo vale 10€.
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Factor de valorização – parte final do art. 27/3 do CE
A outra divergência com relevo resulta da circunstância dos peritos maioritários, tal como aliás, o parecer técnico juntos pelos expropriados, não aplicarem nenhum factor de valorização. Os peritos maioritários expli-caram mais tarde, perante reclamação dos expropriados, que: “cada parcela de terreno é um terreno com as suas particularidades próprias. Os peritos, implicitamente, já tiveram em conta uma bonificação do rendimento do terreno, tendo em conta a relativa proximidade da cidade e a facilidade do escoamento dos produtos, ao contemplaram para despesas de exploração cerca de 60%, quando o normal é termos custos de 65% ou 70% ou até mais.” (fls. 714). No caso do ac. do TRP de 14/03/2013, 585/08.3TBVLC.P1, que também respeita a uma parcela expropriada para o mesmo fim, não se aplicou esse factor.
Já o perito dos expropriados, tal como a avaliação subscrita por outro engenheiro agrário e apresentada pelos expropriados, aplicam um factor de valorização; o primeiro dizia: “no entendimento do ac. do STJ de 05/07/1963, 59338, dada a localização da parcela em plena cidade e junto ao seu centro cívico, considera-se justificável a consideração de um factor valorativo de 25% ao seu valor determinado apenas em função do seu rendimento em qualquer localização indiferenciada.” O Sr. eng. agrário disse: “O parque urbano é uma obra de grande envergadura cultural e social, que modernizará e engrandecerá a cidade, ficando a ser a sala de visitas do município, sendo por isso previsível que os preços do m2, no parque e terrenos circundantes, venham a ser deveras valorizados. Dando a sua quota parte no engrandecimento da cidade, da qual faz parte, por estar localizada no parque urbano, e destinada a adquirir as infra-estruturas urbanas, achamos justo que, ao valor calculado do m2 do solo agrícola, acima mencionado, seja considerado um factor de valorização adicional, ficando o solo da Parcela a ter um valor de 38€ o m2” (como tinha partido de 20€, o factor aplicado foi de 90%).”
Também o perito da expropriante fez a aplicação do factor de valorização de 25% (considerando tratar-se de um terreno com acesso em boas condições, permitindo, portanto, melhor aproveitamento na proximidade de um núcleo urbano – só que o rendimento fundiário anual, para este perito era apenas de 1520,50€, tudo como se pode ver a fls. 442/443).
O ac. do TRP de 15/10/2012, 478/08.4TBVLC.P1, já citado acima, aplica, para um caso idêntico, o factor de valorização de 25%, considerando que um dos factores relevantes a ter conta será a sua proximidade dos centros urbanos e de mercados abastecedores, pois que, isso significa um escoamento dos produtos e menor dispêndio de transportes.
O mesmo faz o ac. do TRP de 21/10/2014 (1147/08.0TBCHV.P2), dizendo que “Apesar do solo da parcela expropriada ter sido avaliado em função da sua aptidão agrícola, tal não impede que se considere, nessa avaliação, a localização da parcela na zona peri-urbana de um importante centro populacional, a escassa distância de equipamentos escolares, hospitalares e hoteleiros. Trata-se de circunstância objectiva susceptível de influir no cálculo da indemnização.”
O ac. do TRP de 16/09/2014, 1499/10.2TBLSD.P1, admite a majoração de 25% depois da avaliação de um prédio agrícola com custos médios de produção e colocação dos produtos no mercado; aplica a posteriori o factor correctivo desse valor, factor fundado nas vantagens propiciadas à exploração desse prédio pela sua proximidade aos mercados, pela facilidade de acessos, pela mais valia que isso propicia na rápida e mais eficaz colocação dos produtos no mercado.
O ac. do TRP de 22/01/2013, 6449/06.8TBVNG.P1, diz que nada há de ilegal na atribuição de uma mais valia de 25% (sobre o rendimento líquido que a parcela proporcionaria) em função da proximidade do terreno a uma localidade e da possibilidade, daí resultante, de o proprietário poder colocar directamente os produtos agrícolas à disposição do consumidor final sem a intervenção de intermediários [aplica uma taxa de capitalização de 3%].
Quer isto dizer que no caso não se justifica a valorização, porque os peritos maioritários explicaram ter tomado em consideração, para efeitos de cálculo do rendimento, a localização da parcela, com todas as vantagens daí decorrentes (facilidades de exploração e de colocação de produtos), que era o que justificava a valorização segundo a maior parte daqueles que a defendem, não se vendo que outras vantagens objectivas possam decorrer da localização da parcela muito próximo da cidade. Quanto à posição do Sr. Engenheiro Agrário que propôs a valorização em 90%, as razões invocadas não são atendíveis porque se estaria a valorizar um solo com base no destino que foi dado à parcela por força da DUP, contra o disposto no art. 23/2a) do CE.
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Assim sendo, tendo em conta o valor de 10€/m2 e a área da parcela, de 8161m2, o valor do solo é de 81.610€.
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Quanto ao art. 23/5 do CE
Como resulta de tudo o que antecede, pode-se agora invocar o ac. do TRP de 14/03/2013, 585/08.3TBVLC.P1, já citado, que também respeita a uma parcela expropriada para o mesmo fim, para dizer que: “não constam dos autos elementos que nos levem a concluir que, no presente caso, a aplicação do art. 27 tenha sido desadequada, havendo necessidade de lançar mão de outros critérios para a determinação do valor real da parcela expropriada […].”
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Pelo exposto, julga-se parcialmente procedente o recurso, elevando-se o montante indemnizatório de 73.800€ para 81.610€, mantendo-se, no mais, a sentença recorrida.
Custas pela expropriante e expropriados na proporção do decaimento.

Porto, 08/01/2015
Pedro Martins
Judite Pires
Teresa Santos