Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
639/13.4TTVFR.P1
Nº Convencional: JTRP000
Relator: FERNANDA SOARES
Descritores: ACIDENTE DE TRABALHO
IPATH
IPP
ESCOLHEDORA DE ROLHAS
MÃO DIREITA DOMINANTE
FACTOR DE BONIFICAÇÃO
Nº do Documento: RP20180530639/13.4TTVFR.P1
Data do Acordão: 05/30/2018
Votação: MAIORIA COM 1 VOT VENC
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÕES EM PROCESSO COMUM E ESPECIAL(2013)
Decisão: PROVIDO
Indicações Eventuais: 4ªSECÇÃO (SOCIAL), (LIVRO DE REGISTOS N.º276, FLS.337-441)
Área Temática: .
Legislação Nacional: FACTOR DE BONIFICAÇÃO 1,5 DE TNI
Sumário: I - A incapacidade tem de ser avaliada em função da perda do lado dominante.
II - A sinistrada que depois do acidente de trabalho deixou de executar a actividade de escolhedora de rolhas que desempenhava anteriormente, por não ter condições físicas para a exercer com a mão direita, lado dominante, pois que não pode efectuar o movimento de pinça, tido por imprescindível para tal tarefa, está por isso afectada de IPATH.
III - Conclusão que não é afectada pelo facto de no parecer do IEFP se fazer apelo à mão esquerda para efectuar a dita tarefa, pois que não lhe é exigível que corra riscos acrescidos pelo facto de tentar utilizar a mão não dominante, menos treinada ou nada treinada para a tarefa que executava.
IV - O factor 1,5 deve ser aplicado quer nas situações de IPATH, quer nas de IPP.
V - De qualquer modo, estando a sinistrada afectada de IPATH, não sendo reconvertível em relação ao posto de trabalho que ocupava na data do acidente, é de aplicar o factor 1,5.
Reclamações:
Decisão Texto Integral: Processo nº639/13.4TTVFR.P1
Relatora: M. Fernanda Soares – 1544
Adjuntos: Dr. Domingos José de Morais
Dra. Paula Leal de Carvalho
Acordam no Tribunal da Relação do Porto
I
Nos presentes autos de acidente de trabalho, a correr termos no então Tribunal do Trabalho de Santa Maria da Feira – actualmente Tribunal Judicial da Comarca de Aveiro – Juízo do Trabalho de Santa Maria da Feira – Juiz 1 – em que é sinistrada B… e entidade responsável C… – Companhia de Seguros S.A., em 24.01.2018 foi proferida sentença que fixou à sinistrada a IPP de 6% e condenou a Seguradora a pagar-lhe a quantia de €30,00 referente a despesas de transporte e ainda o capital de remição da pensão anual e vitalícia de €441,95, com início em 22.08.2013, acrescido de juros de mora à taxa legal desde essa data e até integral pagamento.
A sinistrada, inconformada, veio recorrer, pedindo a revogação da decisão nos termos que indica nas conclusões do recurso, a saber:
1. Estando em causa uma situação de IPATH e/ou o benefício do factor de bonificação de 1,5 nos termos do ponto 5 das Instruções Gerais anexas à TNI, foi olvidado o estudo do posto de trabalho constante dos autos.
2. Após este, a sinistrada foi alvo de perícia de avaliação do dano corporal em direito laboral, efectuado por perito em medicina do trabalho, do IEFP, que considerou a sinistrada com IPATH, ou seja, «estar incapacitada para o seu posto de trabalho habitual de escolhedora de rolhas em contexto fabril» e que «não apresenta condições para outros postos de trabalho que impliquem a capacidade de preensão entre o polegar e os outros dedos».
3. Acresce que a sinistrada foi avaliada pelo Centro de Reabilitação Profissional D… acerca da possibilidade de exercício da profissão habitual dado estar-se ou não perante uma situação de lesão que afecte relevantemente o seu posto de trabalho, vindo este mesmo organismo, por intermédio dos seus dois peritos avaliadores (médico do trabalho e psicóloga do trabalho) concluir que «a examinada se encontra com incapacidade permanente parcial para o exercício do seu trabalho habitual de escolhedora de rolhas, uma vez que as limitações funcionais decorrentes do sinistro limitam a execução da totalidade das tarefas com o membro superior direito, lado dominante, condicionando a execução das mesmas com o membro superior esquerdo».
4. O que se passou com os laudos das Juntas Médicas foi que os mesmos não atentaram nas características específicas da profissão da sinistrada e que a sinistrada deixou mesmo de ser escolhedora.
5. Acresce que pulverizaram definitivamente os relatórios juntos aos autos, não se lhes referindo ou atentando nas suas conclusões.
6. E a tal estavam obrigados os senhores peritos, nos termos do que dispõe o artigo 106º do CPT, aliás, em sintonia com o que dispõe o artigo 586º do CPC.
7. Se por um lado, se os relatórios periciais são os únicos que se encontram devidamente fundamentados, por outro lado, é essa mesma a que corresponde à realidade objectiva da situação real e limitativa da sinistrada.
8. Importa antes de mais, concatenar a matéria de facto que deve considerar-se assente: a profissão da sinistrada, que é escolhedora; as perdas relevantes e profundamente limitativas do seu membro superior direito; o lado activo da sinistrada é o lado a mão direita.
9. Deixou de o fazer por não conseguir realizar as tarefas que importassem o desempenho de aspectos motrizes mais finos, o que seguramente não pode ser obtido com a perda (ou mesmo a dita diminuição) do membro afectado, ou seja, do polegar da mão direita.
10. Ficou ela com IPATH.
11. O que implica errada interpretação da decisão proferida em sede de matéria de facto, porquanto aderiu, acriticamente, à posição da Junta Médica, de forma seguidista, sufragando-se, assim, a posição minoritária da mesma, coadjuvada com os relatórios médicos juntos aos autos, de que a sinistrada se encontra com IPATH.
12. Mesmo que assim se não entendesse, sempre deveria a sinistrada beneficiar do factor de bonificação 1.5, por se tratar de sequela que afecta relevantemente o seu posto de trabalho.
13. E tal não foi devidamente escrutinado na sentença, atenta o carácter simplista e despido de fundamentação jurídica para o afastamento dessa possibilidade.
14. A sentença violou o disposto nos artigos 106º do CPT, 586º do CPC, ponto 5-A das Instruções Gerais da TNI e o artigo 389º do CC.
A Seguradora veio contra alegar pugnando pela manutenção da decisão recorrida.
O Exmo. Procurador-Geral Adjunto junto desta Relação emitiu parecer no sentido da improcedência do recurso.
Admitido o recurso cumpre decidir.
* * *
II
Matéria de facto dada como provada pelo Tribunal a quo.
Da decisão recorrida consta: “tendo em conta os factos em que as partes acordaram na tentativa de conciliação, o estatuído nos artigos 1º, 2º, 8º, 23º, 114º e seguintes, 111º e 79º da Lei 98/2009 e no artigo 140º do CPT, decido que a Autora se encontra, por efeito do acidente dos autos, afectada de uma incapacidade permanente parcial de 6%”.
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III
Objecto do recurso.
Da atribuição à sinistrada de IPATH ou da aplicação do factor 1.5.
A sinistrada defende estar afectada de IPATH argumentando do seguinte modo: estando em causa uma situação de IPATH e/ou o benefício do factor de bonificação de 1,5 nos termos do ponto 5 das Instruções Gerais anexas à TNI, foi olvidado o estudo do posto de trabalho constante dos autos. Após este, a sinistrada foi alvo de perícia de avaliação do dano corporal em direito laboral, efectuado por perito em medicina do trabalho, do IEFP, que considerou a sinistrada com IPATH, ou seja, «estar incapacitada para o seu posto de trabalho habitual de escolhedora de rolhas em contexto fabril» e que «não apresenta condições para outros postos de trabalho que impliquem a capacidade de preensão entre o polegar e os outros dedos». Acresce que a sinistrada foi avaliada pelo Centro de Reabilitação Profissional D… acerca da possibilidade de exercício da profissão habitual dado estar-se ou não perante uma situação de lesão que afecte relevantemente o seu posto de trabalho, vindo este mesmo organismo, por intermédio dos seus dois peritos avaliadores (médico do trabalho e psicóloga do trabalho) concluir que «a examinada se encontra com incapacidade permanente parcial para o exercício do seu trabalho habitual de escolhedora de rolhas, uma vez que as limitações funcionais decorrentes do sinistro limitam a execução da totalidade das tarefas com o membro superior direito, lado dominante, condicionando a execução das mesmas com o membro superior esquerdo». O que se passou com os laudos das Juntas Médicas foi que os mesmos não atentaram nas características específicas da profissão da sinistrada e que a sinistrada deixou mesmo de ser escolhedora. Acresce que pulverizaram definitivamente os relatórios juntos aos autos, não se lhes referindo ou atentando nas suas conclusões. E a tal estavam obrigados os senhores peritos, nos termos do que dispõe o artigo 106º do CPT, aliás, em sintonia com o que dispõe o artigo 586º do CPC. Se por um lado, se os relatórios periciais são os únicos que se encontram devidamente fundamentados, por outro lado, é essa mesma a que corresponde à realidade objectiva da situação real e limitativa da sinistrada. Importa antes de mais, concatenar a matéria de facto que deve considerar-se assente: a profissão da sinistrada, que é escolhedora; as perdas relevantes e profundamente limitativas do seu membro superior direito; o lado activo da sinistrada é o lado a mão direita. Deixou de o fazer por não conseguir realizar as tarefas que importassem o desempenho de aspectos motrizes mais finos, o que seguramente não pode ser obtido com a perda (ou mesmo a dita diminuição) do membro afectado, ou seja, do polegar da mão direita. Ficou ela com IPATH. O que implica errada interpretação da decisão proferida em sede de matéria de facto, porquanto aderiu, acriticamente, à posição da Junta Médica, de forma seguidista, sufragando-se, assim, a posição minoritária da mesma, coadjuvada com os relatórios médicos juntos aos autos, de que a sinistrada se encontra com IPATH. Que dizer?
Da matéria de facto dada como provada – e acima indicada – resulta que a adesão da Mmª. Juiz a quo ao laudo maioritário da Junta Médica.
Por isso, importa aqui descrever o que foi considerado nesses laudos – folhas 114 e 158.
No exame por Junta Médica realizado no dia 13.01.2015, os senhores peritos, responderam às seguintes perguntas: Quais as lesões resultantes do acidente? Traumatismo do dedo polegar direito; Quais as sequelas daí resultantes? Rigidez e queixas dolorosas a nível da articulação MF [Metacárpico – Falângica] do dedo polegar direito, à mobilização. As sequelas determinam uma incapacidade para o exercício da sua profissão habitual? Sim; Está a sinistrada capaz de exercer a sua profissão de escolhedora considerando a rigidez acentuada do polegar direito? Prejudicado. Concordam os senhores peritos que a sinistrada beneficia do factor de 1.5 atendendo a que mudou de posto de trabalho, não tendo sido reconvertida no anterior que desempenhava? Não. Pelo perito da sinistrada foi dito que deverá ser aplicado o factor 1,5 dado que as sequelas afectam de forma relevante o desempenho do posto de trabalho, conforme descrito em 5-b das Instruções Gerais da TNI. A sinistrada é escolhedora de rolhas e tem perda funcional de capacidade de pinça da mão direita, necessária para essa função. Qual a IPP da sinistrada? IPP de 6% (conforme quadro de páginas 61 verso). Pelo perito da sinistrada deverá ser IPP 6%x1.5.
O quadro a que os senhores peritos aludem é o constante do laudo elaborado pelo perito do INML, o qual integrou as lesões no capítulo I.8.4.1.a) da TNI [rigidez do polegar na articulação MF].
Do exame por Junta Médica realizado no dia 28.11.2017, consta: SITUAÇÃO ACTUAL (Descrição das lesões e respectiva sequelas anatómicas e disfunções) após a consulta do processo e da observação do sinistrado os peritos respondem aos quesitos de folhas 129 por maioria (perito do Tribunal e da Seguradora): A sinistrada foi ou não reconvertida no seu posto de trabalho? A sinistrada refere que nesta data está a realizar outra tarefa dentro da mesma actividade (indústria da cortiça). Deixou de ser escolhedora. A lesão de que padece a sinistrada afecta, ou não, relevantemente, o desempenho no seu posto de trabalho? Afecta na medida da IPP atribuída. Mantém função de pinça com diminuição da força. Pelo perito da sinistrada refere que afecta de forma relevante a perda da função inerente as sequelas de que é portadora (pinça da mão direita) pelo que deveria ser contemplada a aplicação do factor 1.5. A lesão de que padece a sinistrada traduz, ou não, a possibilidade de beneficiar do factor 1,5 nos termos do ponto 5 al. a) ou b) das Instruções Gerais da TNI? Não. Pelo perito da sinistrada sim.
Cumpre agora analisar os demais elementos juntos aos autos referidos pela sinistrada.
O parecer do IEPF
Após enumeração das tarefas que a sinistrada diz executar antes do acidente, procedeu-se à análise das exigências que essas tarefas implicam quanto às condições de execução do trabalho, exigências físicas, tipo de esforço, exigências sensoriais, psicomotoras e cognitivas referindo-se nesse parecer depois do acidente, que lhe causou graves lesões na mão direita (lateralidade dominante, conforme por si referido), com impossibilidade de preensão entre o polegar e os outros dedos, não mais voltou a ter condições físicas para desenvolver, com o mesmo nível de eficiência e produtividade, a actividade atrás descrita; Reconhece-se que, apesar do esforço suplementar que tem de realizar, provocando-lhe inclusivamente riscos para o seu braço esquerdo (sente, muitas vezes, dores acentuadas), com um acréscimo elevado de cansaço, a sua produtividade está, com efeito, afectada. É igualmente referido no parecer do IEFP que a nível das exigências psicomotoras era necessária uma boa coordenação visuo-motora, mais acentuadamente e coordenação dedos-mão, mão-mão e mão-braço na apanha das rolhas defeituosas no tapete rolante e o sequente acto de as depositar na respectiva alcofa; a capacidade de manipular objectos entre o polegar e o indicador, tal como a preensão entre o polegar e os outros dedos, revela-se igualmente fundamental para a execução das tarefas descritas.
O relatório de avaliação da possibilidade de exercício da profissão habitual
Refere-se no relatório – datado de 12.10.2016 – as alterações funcionais descritas interferem com a actividade profissional da examinanda, enquanto escolhedora de rolhas na indústria da cortiça, pois a sua actividade baseia-se em recolher as diferentes qualidades de exemplares de rolhas, uma a uma, quando passam num tapete rolante. O movimento de pinça, da mão dominante, é muito importante nesta função. Pelo exposto somos de parecer que a examinanda se encontra com incapacidade permanente parcial para o seu trabalho habitual, uma vez que apesar da limitação funcional da mão direita, mantem funcionalidade plena do membro superior esquerdo que mobiliza com agilidade e destreza suficientes pela experiência que já possui na função. E mais adiante é referido o maior impacto do acidente no desempenho profissional da examinanda encontra-se, como anteriormente referido, ao nível da mão direita, condicionando o desempenho por parte da examinanda de funções profissionais que necessitem do contributo pleno e funcional da mesma. Assim, o seu actual perfil funcional será compatível com a ocupação de um posto de trabalho cujo conteúdo funcional envolva a actividade dos membros superiores, mas sem grande exigência física, o que é possível na manutenção da função de escolhedora de rolhas, operando de modo privilegiado com a mão esquerda, sempre que a mão direita, se ressente, pela sintomatologia atrás apontada. Conclusão final do relatório: Somos de parecer que a examinanda se encontra com incapacidade permanente parcial para o exercício do seu trabalho habitual de escolhedora de rolhas, uma vez que as limitações funcionais decorrentes do sinistro limitam a execução da totalidade das tarefas com o membro superior direito, lado dominante, condicionando a execução das mesmas com o membro superior esquerdo.
Os elementos acabados de referir permitem concluir pela existência de IPATH?
A incapacidade permanente absoluta para o trabalho habitual (IPATH), nas palavras de Carlos Alegre, “trata-se de uma incapacidade de 100% para a execução do trabalho habitual do sinistrado, no desempenho da sua específica função, actividade ou profissão, mas que deixa uma capacidade residual para o exercício de outra actividade, laboral compatível, permitindo-lhe alguma capacidade de ganho, todavia, uma capacidade de ganho, em princípio diminuta” (…) – Acidentes de Trabalho e Doenças Profissionais, 2ª edição, página 96.
A actividade da sinistrada, à data do acidente, era a de escolhedora de rolhas.
Sabemos que actualmente a sinistrada não executa tal tarefa. Sabemos igualmente que a sinistrada não tem condições físicas para exercer a função de escolhedora de rolhas com a sua mão direita (lado dominante) por precisamente não lhe ser possível efectuar gesto imprescindível para a tarefa que executava, o movimento de pinça.
Tal circunstancialismo permite-nos concluir que ela está afectada de IPATH.
E tal conclusão não é afastada, em nosso entendimento, pelo facto de no parecer do IEFP se fazer apelo à mão esquerda da sinistrada para efectuar a indicada tarefa [aí se refere « Reconhece-se que, apesar do esforço suplementar que tem de realizar, provocando-lhe inclusivamente riscos para o seu braço esquerdo (sente, muitas vezes, dores acentuadas), com um acréscimo elevado de cansaço, a sua produtividade está, com efeito, afectada»], na medida em que era a sua mão dominante a que executava as tarefas de escolha de rolhas, não sendo exigível que a sinistrada corra riscos acrescidos pelo facto de «tentar» utilizar a mão não dominante, menos treinada, ou nada treinada, para a tarefa que executava.
Acresce dizer que a incapacidade da sinistrada tem de ser avaliada em função da perda do seu lado dominante [se acaso a sinistrada tivesse sofrido lesões na sua mão esquerda – lado não dominante – necessariamente não estaríamos a «discutir» a existência de IPATH].
Mas a apelante defende que sempre deveria beneficiar do factor de bonificação 1.5, por tratar-se de sequela que afecta relevantemente o seu posto de trabalho. Vejamos então.
O Anexo I do DL nº352/2007 contém a TNI por acidentes de trabalho e doenças profissionais. Desse Anexo consta a Instrução 5 al. a) que prescreve o seguinte: “Na determinação do valor da incapacidade a atribuir devem ser observadas as seguintes normas, para além e sem prejuízo das que são específicas de cada capítulo ou número: a) Os coeficientes de incapacidade previstos são bonificados, até ao limite da unidade, com uma multiplicação pelo factor 1.5, segundo a fórmula: IG + (IG x 0.5), se a vítima não for reconvertível em relação ao posto de trabalho ou tiver 50 anos ou mais quando não tiver beneficiado da aplicação desse factor” (…).
No sentido de que a aplicação do factor 1.5 deve ser efectuada quer nas situações de IPP quer também nas situações de IPATH é o entendimento do STJ [acórdão de 29.03.2012 em www.dgsi.pt]. No mesmo sentido é o acórdão desta Secção Social de 26.03.2012 [relator o Desembargador Ferreira da Costa sendo adjunta a aqui 2ª adjunta, publicado na CJ, ano 2012, tomo II, página 233 e seguintes], e o acórdão da Secção Social do Tribunal da Relação de Lisboa de 29.01.2014 [relatora a Desembargadora Paula Santos, publicado na CJ, ano 2014, tomo I, páginas 163 e seguintes].
Deste modo, e tendo sido dado como provado que a sinistrada está afectada de IPATH, ou seja, que não é reconvertível em relação ao posto de trabalho que ocupava na data do acidente – na medida em que não se provou ter retomado o exercício das funções correspondentes ao posto de trabalho que desempenhava antes do acidente – é de aplicar o factor 1.5.
Neste sentido é o acórdão do STJ nº10/2014, para uniformização de jurisprudência, onde se decidiu que a expressão contida na al. a) do nº5 das Instruções Gerais da TNI se a vítima não for reconvertível em relação ao posto de trabalho refere-se às situações em que o sinistrado, por virtude das lesões sofridas, não pode retomar o exercício das funções correspondentes ao concreto posto de trabalho que ocupava antes do acidente. Acresce igualmente referir, no seguimento do ora exposto, o consignado no sumário do acórdão desta Secção Social de 22.09.2014 [relatado pela aqui 2ª Adjunta em www.dgsi.pt], a saber: A irreconvertibilidade no posto de trabalho é a consequência ou corolário inevitável da incapacidade permanente absoluta para o trabalho habitual.
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IV
Da pensão devida e do subsídio por situação de elevada incapacidade permanente.
Em face da conclusão a que se chegou há que proceder ao cálculo da pensão devida à sinistrada com IPATH e com IPP de 9% [6% x 1.5] desde 21.08.2013.
Tem ela direito a uma pensão no montante anual de €2.293,93 [€10.522,60 x70% = €7.365,82; €10.522,60 x 50% = €5.261,30; €7.365,82 - €5.261,30 = €2.104,52 x 9% = €189,41; €2.104,52 + €189,41 = €2.293,93], a qual é devida a partir de 22.08.2013 – artigos 47º, nº1, al. c), 48º, nº3, al. b) e 50º, nº2 da Lei nº98/2009 de 04.09 – e actualizável em 01.01.2014 para o montante anual de €2.385,69, conforme Portarias nº378-C/2013 de 31.12 e 162/2016 de 09.06 [€ 2.293,93x4% = €91,76; €2.293,93 + €91,76], em 01.01.2017 para o montante anual de €2.504,97, conforme Portaria nº97/2017 de 07.03 [€2.385,69x0,5% = €119,28; €2.385,69 + €119,28] e em 01.01.2018 para o montante anual de €2.550,06 conforme Portaria nº22/2018 de 18.01 [€2.504,97x1,8% = €45,09; €2.504,97 + €45,09]. O pagamento da pensão é efectuado nos termos do artigo 72º, nº1 e nº2 da LAT.
Determina o artigo 67º, nº3 da LAT que “A incapacidade permanente absoluta para o trabalho habitual confere ao beneficiário direito a um subsídio fixado entre 70% e 100% de 12 vezes o valor de 1,1 IAS, tendo em conta a capacidade funcional residual para o exercício de outra profissão”. Por sua vez, o nº5 do mesmo artigo preceitua que “O valor IAS previsto nos números anteriores corresponde ao que estiver em vigor à data do acidente”.
Na data do acidente o valor do indexante dos apoios sociais era de €419,22 – DL nº323/2009 de 24.12.
Atento o disposto nos artigos 47º, nº1, al. d) e 67º, nº3 e nº5 da LAT tem a sinistrada direito a receber o referido subsídio no valor de €4.022,99 [€419,22 x 1,1 = €461,14 x 12 = €5.533,68 x 70% = €3.873,58; €5.533,68 - €3.873,58 = €1.660,10 x 9% = €149,41; €3.873,58 + €149,41].
Segundo o disposto no artigo 135º do CPT “Na sentença final o juiz considera definitivamente assentes as questões que não tenham sido discutidas na fase contenciosa, integra as decisões proferidas no processo principal e no apenso, cuja parte decisória deve reproduzir, e fixa também, se forem devidos, juros de mora pelas prestações pecuniárias em atraso”.
Independentemente da sinistrada formular o pedido de condenação nos juros, deve o Juiz, oficiosamente, fixar os juros de mora, atento o disposto no citado artigo – acórdão desta Secção Social de 03.11.2008 publicado na CJ., ano 2008, tomo 5, página 226.
Os juros são devidos desde o dia seguinte à data da alta – 22.08.2013 – atento o disposto no artigo 50º, nº2 da LAT.
Valor da causa: €38.264.00 – artigo 120, nº3 do CPT.
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Termos em que se julga a apelação procedente, se revoga a decisão recorrida, se substitui pelo presente acórdão e consequentemente
1. Declara-se estar a sinistrada afectada de IPATH.
2. Se condena a Seguradora a pagar à Sinistrada a pensão anual e vitalícia de €2.293,93, devida desde 22.08.2013, actualizável nos termos indicados no presente acórdão, a que acresce os juros de mora, à taxa legal de 4% ao ano, contados desde 22.08.2013 e até integral pagamento.
3. Se condena a Seguradora a pagar à sinistrada a quantia de €4.022,99, a título de subsídio por situação de elevada incapacidade permanente, acrescida dos juros de mora, à taxa legal de 4% ao ano, contados desde 22.08.2013 e até integral pagamento.
4. No mais se confirma a decisão recorrida.
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Custas em ambas as instâncias a cargo da seguradora.
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Porto, 30.05.2018
Fernanda Soares
Domingos Morais
Paula Leal de Carvalho (voto vencido conforme declaração que junto).
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Voto vencida porquanto:
Pese embora a A. Seja dextra e não obstante a relevância do movimento de pinça do polegar direito (mão dominante) ao desempenho da sua actividade de escolhedora de rolhas, decorre do “relatório de avaliação da possibilidade de exercício da profissão habitual” mencionado no acórdão que a incapacidade da A. Não lhe determina IPATH para o exercício de tal actividade, relatório esse do qual resulta ainda que é possível a “manutenção da função de escolhedora de rolhas, operando de modo privilegiado com a mão esquerda, sempre a mão direita, se ressente, pela sintomatologia atrás apontada.” E que a A. “apesar da limitação funcional da mão direita, mantém funcionalidade plena do membro superior esquerdo que mobiliza com agilidade e destreza suficientes pela experiência que já possui na função”. Ou seja, embora com a maior dificuldade decorrente da sua incapacidade, a A. continua a poder desempenhar a tarefa (apanhar as rolhas) com a mão direita, compensando embora, quando se mostre necessário, com a possibilidade de o fazer com a mão esquerda, “que mobiliza com agilidade e destreza suficientes” como se diz no mencionado relatório. Não se nos figura, pois, que a A. esteja de forma absoluta (a 100%) incapacitada para o exercício da sua actividade habitual de escolhedora de rolhas, pelo que não atribuiria IPATH.
Por outro lado, neste pressuposto, de que a A. não se encontra afetada de IPATH, também entenderia não ser de aplicar o fator de bonificação de 1,5, previsto no n.º5, als. A) ou b), das Instruções Gerais da TNI. Relativamente à al. A), atento o Acordão do STJ, uniformizador de jurisprudência, n.º10/2014, in DR de 30.06.2014, entenderia que não se mostram reunidos os pressupostos previstos nessa norma; e, quanto à al. B), não se vê em que medida a visibilidade do aspeto físico afete, muito menos de forma relevante, o desempenho do posto de trabalho.

Paula Leal de Carvalho