Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
3468/17.2T8PNF.P1
Nº Convencional: JTRP000
Relator: TERESA SÁ LOPES
Descritores: SANÇÃO DISCIPLINAR
SUSPENSÃO DO TRABALHO
PERDA DE RETRIBUIÇÃO E ANTIGUIDADE
ELIMINAÇÃO DA SANÇÃO
REGISTO DISCIPLINAR DA TRABALHADORA
PENDÊNCIA DE ACÇÃO
RECONHECIMENTO DO DESAJUSTE DA SANÇÃO
INDEMNIZAÇÃO
DANOS NÃO PATRIMONIAIS
Nº do Documento: RP201906033468/17.2T8PNF.P1
Data do Acordão: 06/03/2019
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: NÃO PROVIDO
Indicações Eventuais: 4ª SECÇÃO (SOCIAL) (LIVRO DE REGISTOS Nº 294, FLS 383-396)
Área Temática: .
Legislação Nacional: Nº5 DO ARTº 331º DO CT
Sumário: I - Em plena tramitação de ação instaurada pela trabalhadora para ser julgada abusiva a sanção de suspensão do trabalho com perda de retribuição e antiguidade, aplicada pela entidade patronal e para condenação desta a anulá-la do registo disciplinar daquela e a pagar à primeira determinadas importâncias correspondentes ao décuplo da retribuição perdida no período da suspensão e para o ressarcimento dos danos de natureza não patrimonial, o depósito pela entidade patronal da quantia relativa à falta de retribuição derivada da sanção pecuniária de suspensão com perda de vencimento e antiguidade, acrescida de juros, calculados à taxa legal de 4% desde o seu desconto e bem assim a eliminação da sanção do registo disciplinar da trabalhadora, apenas se compreendem como o reconhecimento do desajuste da sanção aplicada e como uma antecipação voluntária do pagamento da retribuição que em virtude da mesma sanção, aquela última deixou de auferir, acrescida dos respetivos juros.
II - Em tais circunstâncias, a sanção não deixou de se poder considerar como aplicada, nomeadamente para se aquilatar da indemnização baseada no nº5 do artigo 331º do Código do Trabalho, assim sucedendo por qualquer dos direitos da trabalhadora decorrentes da sanção disciplinar aplicada, não se terem extinguido.
III - Nos termos do disposto no artigo 331°, n°3, do CT 2009 "o empregador que aplicar sanção abusiva deve indemnizar o trabalhador nos termos gerais, (…)", aí se incluindo a indemnização por danos não patrimoniais.
IV - A lei não enumera os danos não patrimoniais que merecem a tutela do direito, “antes confia ao tribunal o encargo de apreciar, no quadro das várias situações concretas, socorrendo-se de factores objectivos, se o dano não patrimonial é merecedor de protecção jurídica”.
Reclamações:
Decisão Texto Integral: Processo nº 3468/17.2T8PNF.P1
Origem: Tribunal Judicial da Comarca do Porto Este– Juízo do Trabalho de Penafiel – Juiz 1
Recorrente: B…, S.A.
Recorrida: C…

4ª Secção
Relatora: Teresa Sá Lopes
1ª Adjunta: Desembargadora Fernanda Soares
2º Adjunto: Desembargador Domingos Morais

Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação do Porto

1. Relatório:
C… instaurou a presente ação declarativa, emergente de contrato individual de trabalho, contra B…, S.A., pedindo a declaração que a Autora se encontra isenta do pagamento de custas, que seja julgada abusiva a sanção de "suspensão do trabalho com perda de retribuição e antiguidade com início em 05/09/2017 e fim em 04/10/2017", aplicada à Autora pela Ré, condenando-se esta a anulá-la do registo disciplinar daquela e a condenação da Ré a pagar-lhe:
a) A quantia de 5.649,60 € correspondente ao décuplo da retribuição perdida no período da suspensão;
b) A quantia de 2.500,00 € em ressarcimento dos danos de natureza não patrimonial por ela sofridos.
Subsidiariamente, peticionou ainda que seja julgada nula e de nenhum efeito a sanção disciplinar de "suspensão do trabalho com perda de retribuição e antiguidade com início em 05/09/2017 e fim em 04/10/2017", aplicada à Autora pela Ré, condenando-se esta a eliminá-la do respectivo cadastro disciplinar e a condenação da Ré a pagar à Autora:
- a quantia de €564,96, correspondente à retribuição perdida no período da suspensão;
- a quantia de 2.500,00 € em ressarcimento dos danos de natureza não patrimonial por ela sofridos ".
Em qualquer dos apontados casos:
Condenar-se a Ré a pagar à Autora a quantia correspondente aos juros de mora que, à taxa legal, hoje de 4% ao ano, se vencerem desde a citação até integral e efectivo pagamento.
Para tal sustentou, em síntese:
- é filiada no Sindicato dos Trabalhadores das Indústrias Transformadoras, Energia e Actividades do Ambiente do Norte (SITE-NORTE), ex-STIENC e que o seu último rendimento ilíquido, anual, foi de 8.019,36,, encontrando-se, nos termos do disposto na alínea h) do n°1 do art°4° do RCP, conjugada com o disposto no artigo 46° da Portaria 419-A/2009, de 17 de Abril, isenta do pagamento de custas, independentemente do prévio recurso a estrutura de resolução alternativa de litígios;
- foi admitida pela Ré ao seu serviço, em 02-05-2005, para, mediante retribuição, trabalhar sob as suas ordens, direcção e fiscalização, com carácter efectivo e por tempo indeterminado;
- que desempenha tarefas diversificadas que a Ré enquadra na categoria profissional de "operária semiespecializada", o que, desde o ajuste inicial, tem vindo a fazer na unidade fabril da Ré sita na Zona Industrial …, …, Penafiel, de segunda-feira a sexta-feira, entre as 16h00 e as 00h30, com intervalo para refeição das 20h00 às 20h30;
- que como contrapartida da disponibilidade da Autora para o trabalho, a Ré paga-lhe as seguintes quantias: €557,00 mensais, a título de salário base + €6,83, por cada dia de trabalho efectivamente prestado, a título de subsídio de refeição + €46,42 mensais, correspondentes a 1/12 do subsídio de natal + €46,42 mensais, correspondentes a 1/12 do subsídio de férias;
- que para além destas referidas quantias, a Ré ao longo de toda a execução contratual, sempre pagou à Autora, com periodicidade mensal, uma parcela remuneratória denominada "horas nocturnas", cujo valor variava em função do número de horas de trabalho que, em cada mês, a Autora prestava entre as 22h00 e as 00h30 e que lhe eram pagas com um acréscimo de 25% em relação ao trabalho prestado durante o dia, assim tendo sucedido, invariável e ininterruptamente, até Fevereiro de 2017, inclusive, altura em que a Ré decidiu cessar o mencionado pagamento;
- reclamando a ilegalidade da apontada cessação do pagamento das horas de trabalho prestadas em período nocturno com o acréscimo previsto na lei, a Autora instaurou contra a Ré, em 12-05-2017, ação declarativa com processo comum que veio a ser distribuída ao Juiz 2, deste Tribunal, sob o n°1509/17.2T8PNF;
- que por carta datada de 30 de Agosto de 2017, a Ré comunicou à autora que tinha decidido aplicar-lhe a sanção disciplinar de "suspensão do trabalho com perda de retribuição e antiguidade, com início em 05/09/2017 e fim em 04/10/2017"; que inexistem razões de facto e de direito que sustentem a referida sanção, que é ilícita e abusiva, o que se presume, nos termos das disposições conjugadas da alínea d) do nºs 1 e 2, a) do artigo 331° do Código do Trabalho; que, para além da vaguidade da asserção "devidamente equipada" constante do artigo 5° da imputação factual da nota de culpa, é falso e, do ponto de vista disciplinar, tudo quanto ali se afirma, para além de erradas as conclusões extraídas; que no dia e hora concretizados, a Autora não entrou, nem pretendia fazê-lo na dita "Sala Branca"; no momento em que foi interpelada pela sua superiora, a Autora limitava-se a espreitar para o interior da dita, de modo a verificar no quadro ali existente qual o local em que iria trabalhar nesse dia, sendo certo que se lhe estivesse acometido o desempenho de funções naquela secção, rapidamente vestiria o fato adequado e daria início às suas tarefas; que foi justamente isso o que veio a suceder e se encontra espelhado no documento que a Ré anexou à acusação disciplinar: conforme determinação da sua chefia, a Autora registou a saída às 15h55m, equipou-se e entrou na "Sala Branca" 2 minutos depois, isto é, às 15h57m, ainda assim antes da hora fixada como sendo a do início da jornada de trabalho: 16h00m; que a Autora não violou nenhum dos deveres que sobre si impendem enquanto assalariada da Ré, tendo acatado as instruções da sua superiora hierárquica, esclarecendo-a, desde logo, que não se aprestava para entrar na sala sem o fato recomendado, procurando, apenas, inteirar-se do local que, nesse dia, lhe estava destinado para prestação da sua actividade, iniciando-a, antes mesmo, das horas pré-determinadas; que não se verificou qualquer ilícito disciplinar, pelo que não se encontram reunidos os pressupostos legais para a aplicação da sanção; que sempre ressaltaria uma ostensiva desproporção entre a gravidade da imputação disciplinar e o grau de culpa da Autora, por um lado, e a medida da concreta sanção aplicada, por outro: 30 dias de suspensão com perda de vencimento e antiguidade, mormente quando ponderadas as consequências dela decorrentes na economia dum trabalhador que aufere o salário mínimo nacional; que todo o processo em que a sanção foi aplicada está inquinado de nulidade, pois que assente em falsos pressupostos de facto e em erradas conclusões e qualificações jurídicas, constituindo um inadmissível desquite da Ré em relação ao que constitui o exercício legítimo de um direito por parte da Autora: ação; que, ainda que verdadeira, a conduta imputada à Autora não causou qualquer prejuízo à Ré, nem ela o invoca ou concretiza, o mesmo devendo ser dito no que tange a uma qualquer perturbação que, como decorrência dela, se tenha reflectido ou, por qualquer forma, feito sentir no vínculo laboral; que a medida da sanção aplicada (30 dias de suspensão com perda de vencimento) fere, o princípio da proibição do excesso ou da proporcionalidade, conquanto situada muito além da medida da culpa; que sob aparência de uma punição por violação de deveres a que a Autora se encontrasse adstrita, o que a Ré pretendeu, efectivamente, e fez, foi sancionar o exercício legítimo daquele apontado direito, concluindo a Autora que a sanção disciplinar que lhe foi aplicada pela Ré é ilícita e abusiva, o que implica, para aquela, a obrigação de ressarcimento de todos os prejuízos sofridos por esta – nºs 3 e 5, do citado artigo 331° do Código do Trabalho; que tendo a Autora cumprido a dita sanção de 30 dias de suspensão do trabalho com perda de vencimento entre os dias 05-09-2017 e 04-10-2017 e tendo-lhe a Ré descontado nas remunerações relativas aos meses de Setembro e Outubro as quantias de € 308,16 e € 256,80, respectivamente, no total de € 564,96, deverá, nos termos do disposto no n°5, do mesmo artigo 331º, pagar-lhe a quantia correspondente ao décuplo da retribuição perdida, isto é, € 5.649,60 €.
- Mais invocou a Autora que importa ainda equacionar a justa indemnização pelos danos de natureza não patrimonial por si sofridos em consequência da apontada conduta persecutória da Ré; que o «antecedente disciplinar» que a Ré pretendeu criar à Autora, para além de coarctar o seu direito à efectiva prestação de trabalho, à realização e valorização profissional, fez com que a mesma se tenha sentido humilhada e apoucada na sua imagem pessoal e profissional; que sempre fora uma pessoa alegre e sociável, tem vindo, agora, a isolar-se do convívio com as mais colegas de trabalho, sendo o seu discurso marcado por recorrentes alusões / preocupações sobre a sua situação laboral; que tem vindo a experimentar momentos de ansiedade, desgosto e, até, revolta, pela aplicação dum castigo manifestamente injusto, em prejuízo da sua saúde física e psíquica, v.g. dificuldade em adormecer e manter um sono reparador sem recurso a indutores, outrossim, num estado vígil asténico e abúlico, estimando como ajustada ao ressarcimento dos danos de natureza não patrimonial sofridos em consequência da conduta ilícita da Ré a quantia de € 2.500,00; que para a eventualidade de se entender que a sanção aplicada à Autora não é abusiva, ainda assim a mesma seria ilícita, quer por não ter ocorrido a violação de qualquer um dos deveres a que a mesma se encontra sujeita, quer por ostensiva violação do princípio da proporcionalidade, impendendo, em qualquer dos casos, sobre a Ré a obrigação de lhe pagar a quantia correspondente à retribuição perdida, isto é, € 564,96, à qual, e pelas mesmas razões atrás explicitadas, acresce a de € 2.500,00 em ressarcimento dos alegados danos morais.
Foi realizada a audiência de partes, não tendo sido possível a conciliação entre as mesmas.
A , notificada, veio contestar aduzindo, em suma que no dia em causa, a Autora apresentou-se para iniciar o seu dia de trabalho pelas 15h e 54 minutos; que como consta do regulamento interno e tal como é do conhecimento da Autora antes de entrar na "sala branca" a Autora terá que estar devidamente equipada, com o "fato macaco" vestido e apertado, com a touca e capuz colocado e bem assim com as protecções dos sapatos aplicadas; que antes ainda de entrar na "sala branca" a Autora deveria ter consultado o placard (vulgo, "planta da sala branca") onde se encontrava assinalado o seu posto de trabalho para aquele dia, sendo o dito placard perfeitamente avistável da antecâmera que a antecede, sem necessidade de nela ter entrado; que a Autora, ao invés do que devia, sem que tivesse apertado o fato macaco, colocado a touca, capuz e colocado as protecções dos sapatos, aprestou-se a entrar na dita "sala branca", tendo para tal picado o relógio de ponto, tendo a Autora com tal procedimento assinalado o início do seu trabalho naquele dia; que nesse instante estava presente na "sala branca" a superior hierárquica da Autora, D…, encarregada geral da unidade fabril da Ré de Penafiel, que logo se apercebeu que a Autora havia "picado" o relógio de ponto sem estar devidamente equipada, nos termos atrás referidos e antes ainda que ela entrasse na "sala branca", dirigiu-se à Autora, solicitando-lhe que não desse entrada na "sala branca" (por não reunir as condições para tal necessárias) e que regressasse ao balneário para aí se equipar de acordo com as disposições regulamentares estabelecidas no regulamento interno; que para tal a referida D… ordenou á Autora que "picasse" de novo o relógio de ponto com indicação da "saída" da "sala branca" e que só após ter envergado o equipamento atrás referido, regressasse à "sala branca", cuja nova entrada teria que assinalar com outra picagem de entrada e assim dar início ao seu período de trabalho no dia atrás referido; que é verdade que a Autora acatou as instruções da sua superior hierárquica. "Contudo só o fez depois de ter sido por ela admoestada", que o estrito cumprimento do regulamento interno tem importância fundamental para o bom desempenho e rentabilização do trabalho de todas as operárias da Ré, sendo o respectivo conteúdo objecto de permanente divulgação e explicitação por parte da Ré; que para além da imposição da observância de estritas regras de disciplina, à Ré assiste o direito (e dever) de impor a observância do tempo efectivo de trabalho por parte das trabalhadoras; que a Autora apresentava-se ao trabalho, com a violação do dito regulamento interno, nos termos atrás referidos, ao assinalar o início da sua laboração antes de efectivamente a mesma ter começado; que o controlo do tempo de trabalho, permitido pelo "relógio de ponto" pode ser manipulado caso a trabalhadora, após a picagem, não comece imediatamente a trabalhar; caso não tivesse sido imediatamente admoestada pela sua superior hierárquica, a Autora teria provocado um destas situações que com o dito controlo pro relógio de ponto pretende evitar: picava o ponto, vinha equipar-se fora da "sala branca" e só depois é que começaria a trabalhar, do que resultaria a mesma ser paga por trabalho não prestado, "embora ficticiamente assinalado no relógio de ponto como tal"; que "a sanção disciplinar em apreço foi aplicada com precedência de processo disciplinar, tendo sido concedidas à Autora todas as garantias de 'audiência prévia', isto é audição e defesa da arguida"; que "não se desconhece que o ordenamento tem particular cuidado com as sanções abusivas" e que no caso a intensidade da culpa da Autora é grande, pois tinha perfeito conhecimento de que tal comportamento lhe estava vedado e, levianamente, perante e apesar de informada do teor proibitivo do regulamento e da formação ministrada sobre o uso do relógio de ponto, optou por ter um comportamento lesivo dos interesses patrimoniais e da organização e controlo interno da Ré; por outro lado, a punição dos comportamentos desrespeitadores do dito Regulamento Interno impõe, para que a mesma alcance eficácia preventiva de futuras violações nomeadamente para evitar fraudes ao controlo do trabalho, efectivamente prestado e que no caso a escolha e tipo de sanção afigura-se como adequado, bem assim como a medida da sanção aplicada.
Concluiu a Ré pela improcedência da presente ação e pela sua consequente absolvição do pedido.
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Foi proferido despacho saneador, em que se fixou à causa o valor de € 8.149,60, a matéria de facto assente, bem como se identificou o objecto do litígio e enunciaram os temas da prova, que não foram objecto de reclamação.
Seguidamente, realizou-se o julgamento, segundo o legal formalismo, conforme se constata pelas actas de fls.161 a 166, de fls.177 a 179, de fls.192 a 196 e de fls.262 a 264, tendo a fls.171 e ss. a Ré vindo juntar DUC no montante de €580 ("quantia de €574,376, equivalente à sanção pecuniária de 30 dias de suspensão com perda de vencimento e antiguidade acrescida de juros, calculados à taxa legal de 4% desde o seu desconto, Outubro de 2017, até à presente data", pretendendo, dessa forma "revogar a dita sanção disciplinar" e assim "deixou de haver sanção e retribuição perdida", tendo a fls.189 a 191 sido junta aos autos decisão da Comissão Nacional de Protecção de Dados de autorização n°4702/2018, de 05-04-2018, do tratamento de dados biométricos que tem como finalidade o controlo de assiduidade e controlo de acessos dos trabalhadores.
Concluída a audiência de julgamento e em 22.06.2018, foi proferida sentença, em cujo dispositivo consta:
“Pelo exposto, e sem necessidade de ulteriores considerações, julgo a presente acção procedente por provada e em consequência:
a) Declaro que a autora se encontra isenta do pagamento de custas, nos termos do art°4°, n°1, al.h) do RCP;
b) Julgo abusiva a sanção de "suspensão do trabalho com perda de retribuição e antiguidade com início em 05/09/2017 e fim em 04/10/2017", aplicada à autora pela ré, determinando a sua anulação em termos de registo disciplinar;
c) Condeno a ré a pagar à autora a quantia de € 5.649,60, correspondente ao décuplo da retribuição perdida no período da suspensão;
d) Condeno a ré a pagar à autora a quantia de € 2.500,00, em ressarcimento dos danos de natureza não patrimonial por ela sofridos.
e) condeno a ré a pagar à autora a quantia correspondente aos juros de mora relativamente à quantia referida em c), à taxa legal de 4% ao ano, vencidos e vincendos desde a citação até integral e efectivo pagamento.
f) condeno a ré a pagar à autora a quantia correspondente aos juros de mora quanto á indemnização por danos não patrimoniais fixada em d) à taxa legal de 4% ao ano, que se vencerem desde a presente data em que foi proferida a presente sentença até integral e efectivo pagamento.
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As custas da acção são suportadas pela R., nos termos do artigo 527° do Código de Processo Civil.
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Não se anota qualquer litigância de má fé na presente causa.
(…)”.
Notificada a veio interpor recurso da sentença, terminando o mesmo com as seguintes conclusões:
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O objecto do recurso, delimitado pelas conclusões das alegações apresentadas, (artigo 635, nº4 e 639, nºs 1 e 2 do Código de Processo Civil, “ex vi” artigo 87, nº1, do Código de Processo do Trabalho), ressalvadas as questões do conhecimento oficioso que ainda não tenham sido conhecidas com trânsito em julgado, consubstancia-se nas seguintes questões:
- existência de sanção;
- correspondente indemnização;
- danos de natureza não patrimoniais decorrentes da sanção.
3. Fundamentação:
3.1. O Tribunal a quo procedeu à seguinte decisão sobre a matéria de facto:
“Discutida a causa, resultou provada a seguinte factualidade (alinhada de forma lógica e cronológica):
1. Em 02-05-2005 a ré admitiu a autora ao seu serviço para, mediante retribuição, trabalhar sob as suas ordens, direcção e fiscalização, (Facto Assente 3).
2. com carácter efectivo e por tempo indeterminado, (Facto Assente 4).
3. A autora desempenha tarefas diversificadas que a ré enquadra na categoria profissional de "operária semi-especializada", (Facto Assente 5).
4. o que, desde o ajuste inicial, tem vindo a fazer na unidade fabril da ré sita na Zona Industrial …, …, Penafiel, (Facto Assente 6).
5. de segunda a sexta-feira, entre as 16h00 e as 00h30, com intervalo para refeição das 20h00 às 20h30, (Facto Assente 7).
6. A autora é filiada no Sindicato dos Trabalhadores das Indústrias Transformadoras, Energia e Actividades do Ambiente do Norte (SITE-Norte), ex-STIENC, o qual, por sua vez, integra a FIEQUIMETAL-Federação Intersindical das Indústrias Metalúrgica, Química, Farmacêutica, Eléctrica, Energia e Minas (ex-FSTIEP), (Facto Assente 1).
7. Como contrapartida da disponibilidade da A. para o trabalho, a R. pagava-lhe, com a periodicidade e pelas proveniências adrede indicadas as seguintes quantias:
a) 557,00 €, mensais, a título de salário base;
b) 6,83 €, por cada dia de trabalho efectivamente prestado, a título de subsídio de refeição;
c) 46,42 €, mensais, correspondentes a 1/12 do subsídio de natal; e,
d) 46,42 €, mensais, correspondentes a 1/12 do subsídio de férias, (cfr.B1), com o esclarecimento de que a Autora foi despedida da Ré em Janeiro de 2018.
8. Para além destas quantias, a R., ao longo de toda a execução contratual, sempre pagou à autora, com periodicidade mensal, uma parcela remuneratória denominada "Horas Nocturnas", (B2).
9. cujo valor variava em função do número de horas de trabalho que, em cada mês, a autora prestava entre as 22h00 e as 00h30, (B3).
10. e que lhe eram pagas com um acréscimo de 25% em relação ao trabalho prestado durante o dia, (B4).
11. assim tendo sucedido, invariável e ininterruptamente, até Fevereiro de 2017, inclusive, (B5).
12. altura em que a ré decidiu cessar o mencionado pagamento, (B6).
13. Reclamando a ilegalidade da apontada cessação do pagamento das horas de trabalho prestadas em período nocturno com o acréscimo previsto na lei, a autora instaurou, contra a ré, em 12-05-2017, acção declarativa com processo comum que veio a ser distribuída ao Juiz 2, deste Tribunal, sob o n.° 1509/17.2T8PNF, (Facto Assente 8).
14. tendo a respectiva audiência de julgamento ocorrido no passado dia 13 de Novembro de 2017, (Facto Assente 9).
15. e tendo sido proferida Sentença em 05 de Dezembro de 2017, conforme fls.62 a 92, (Facto Assente 10).
16. O pagamento do trabalho nocturno e as suas repercussões contratuais e legais é objecto do litígio judicial referido em 13. a 15., (Facto Assente 13).
17. Como consta do Regulamento Interno e é do conhecimento da A. antes de entrar na "Sala Branca" a A. terá que estar, devidamente equipada, o "fato-macaco" vestido e apertado, a touca, capuz colocado, bem assim como as protecções dos sapatos aplicadas, (B35).
18. No dia 20 de Junho de 2017, a A. apresentou-se para iniciar o seu dia de trabalho (cfr. B34), com o esclarecimento de que a Autora fez a "picagem" do relógio de ponto às 15h54mn.
19. No dia 20 de Junho de 2017, aquando da passagem de turno (15H25mn-16h15mn), a autora não entrou, nem pretendia fazê-lo na dita "Sala Branca", (B7).
20. tendo picado o relógio de ponto, sem que tivesse apertado o fato-macaco, colocado a touca, capuz e colocado as protecções dos sapatos (cfr. B37), com o esclarecimento de que a Autora fez a "picagem" do relógio de ponto ás 15h54mn, que o aludido relógio de ponto utiliza dados biométricos e que apenas por decisão de autorização n°4702/2018, de 05-04- 2018, a Comissão Nacional de Protecção de Dados deu autorização à ré para o tratamento de dados biométricos que tem como finalidade o controlo de assiduidade e controlo de acessos dos trabalhadores,
21. após o que foi consultar o placar onde se encontrava assinalado o seu posto de trabalho (vulgo: "planta da "Sala Branca") para aquele dia, sendo o dito placar perfeitamente avistável da antecâmara que a antecede, sem necessidade de entrar na "Sala Branca" (cfr. B36).
22. com o procedimento referido em 20. a A. assinalou o início do seu trabalho naquele dia. (B38)
23. Nesse instante estava presente na "Sala Branca" a superior hierárquica da A., D…, encarregada Geral da Unidade Fabril da R. de Penafiel. (B39)
24. No momento em que foi interpelada pela sua superiora, a autora limitava-se a espreitar para o interior da dita, de modo a verificar no quadro ali existente qual o local em que iria trabalhar nesse dia, (B8).
25. não se aprestava para entrar na sala sem o fato recomendado, (cfr.B16).
26. procurando, apenas, inteirar-se do local que, nesse dia, lhe estava destinado para prestação da sua actividade, (B17).
27. Se lhe estivesse acometido o desempenho de funções naquela secção, rapidamente vestiria o fato adequado e daria início às suas tarefas, (B9).
28. Foi isso o que veio a suceder e se encontra espelhado no documento que a ré anexou à acusação disciplinar, (cfr. B10).
29. A encarregada geral D…, logo se apercebeu que a A. havia "picado" o relógio de ponto sem estar devidamente equipada, nos termos atrás referidos, dirigiu-se à A. e disse-lhe que só podia picar o relógio de ponto quando estivesse devidamente equipada e ordenou-lhe que, "picasse" de novo o relógio de ponto com indicação da "saída", que se fosse equipar e que após ter envergado o equipamento atrás referido, "picasse" de novo o relógio de ponto, assinalando outra picagem de entrada e entrasse para a "Sala Branca" (cfr. B40 e cfr. B41), com o esclarecimento de que a "picagem" de saída foi efectuada às 15h55mn e a "picagem" de entrada foi efectuada às 15h57mn.
30. Conforme determinação da sua chefia, a autora registou a saída às 15h55m, (B11).
31. equipou-se, (B12).
32. e entrou na "Sala Branca" 2 minutos depois, isto é, às 15h57m, (B13).
33. antes da hora fixada como sendo a do início da jornada de trabalho: 16h00m (B14).
34. iniciando-a, antes mesmo, das horas pré-determinadas, (B18).
35. A A. acatou as instruções da sua superiora hierárquica, (B15).
36. No art°12° da sua contestação a Ré admite que "é verdade que a A. acatou as instruções da sua superior hierárquica. Contudo, só o fez depois de ter sido por ela admoestada", (Facto Assente 14).
37. Por carta datada de 30 de Agosto de 2017, a R. comunicou à autora que tinha decidido aplicar-lhe a sanção disciplinar de "suspensão do trabalho com perda de retribuição e antiguidade, com início em 05/09/2017 e fim em 04/10/2017", (Facto Assente 11).
38. É a seguinte, a imputação factual constante da nota de culpa: "5.°. No dia 20 de Junho do ano corrente, aquando da passagem de turno (15h45m - 16h15m) a arguida foi surpreendida no acto em que registava a sua entrada ao serviço sem que, todavia, se encontrasse devidamente equipada para entrar na "Sala Branca", (Facto Assente 12).
39. A conduta imputada à autora não causou qualquer prejuízo à ré, nem ela o invoca ou concretiza. (B20).
40. A conduta imputada à autora não causou qualquer perturbação que, como decorrência dela, se tenha reflectido ou, por qualquer forma, feito sentir no vínculo laboral, nem ela a invoca ou concretiza. (B21).
41. Com o processo disciplinar instaurado pela Ré à Autora sob a aparência de uma punição por violação de deveres a que a autora se encontrasse adstrita, o que a ré pretendeu, efectivamente, e fez, foi sancionar o exercício pela autora do seu direito de acção nos termos referidos em 13. a 16. (cfr. B22 e B19).
42. A ré teve uma conduta persecutória da autora, (B24)
43. A autora cumpriu a dita sanção de 30 dias de suspensão do trabalho com perda de vencimento entre os dias 05-09-2017 e 04-10-2017, tendo-lhe a ré descontado nas remunerações relativas aos meses de Setembro e Outubro as quantias de € 308,16 e € 256,80, respectivamente, no total de €564,96. (B23)
44. A quantia correspondente á retribuição perdida pela autora foi de € 564,96. (B32).
45. O último rendimento ilíquido, anual, da autora foi, como se evidencia da respectiva declaração de IRS, de 8.019,36€, (Facto Assente 2).
46. A sanção disciplinar em apreço foi aplicada com precedência de processo disciplinar, tendo sido concedidas à A. todas as garantias de "audiência prévia", isto é audição e defesa da arguida, (B47)
47. O «antecedente disciplinar» que a ré pretendeu criar à autora, coarctou o seu direito à efectiva prestação de trabalho e à realização e valorização profissional, (B25).
48. E fez com que a mesma se tenha sentido humilhada e apoucada na sua imagem pessoal e profissional (B26)
49. A autora, que sempre fora uma pessoa alegre e sociável, tem vindo, agora, a isolar-se do convívio com as demais colegas de trabalho, ensimesmando-se, (B27).
50. sendo o seu discurso marcado por recorrentes alusões e preocupações à sua situação laboral (B28).
51. A autora tem vindo a experimentar momentos de ansiedade, desgosto e, até, revolta, pela aplicação dum castigo injusto, (B29).
52. em prejuízo da sua saúde física e psíquica, tendo dificuldade em adormecer e manter um sono reparador sem recurso a indutores, (B30)
53. outrossim, num estado vigil asténico e abúlico (B31)
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Não se provaram quaisquer outros factos para além ou em contrário dos anteriormente referidos, designadamente:
- que a Autora tenha esclarecido a sua superiora hierárquica que não se aprestava para entrar na sala sem o fato recomendado, (cfr.B16).
- o teor do tema da prova B33) ( "Se o horário actual da autora é das 9h às 13h e das 14h às 18h, com intervalo para refeição das 12h às 14h ");
- que a A. tenha entrado na "sala branca" sem estar devidamente equipada e sem que antes tivesse consultado o placar onde se encontrava assinalado o seu posto de trabalho (vulgo: "planta da "Sala Branca"") (cfr. B36);
- que a A., tendo picado o relógio de ponto sem que tivesse apertado o fato-macaco, colocado a touca, capuz e colocado as protecções dos sapatos, se tenha aprestado a entrar na dita "Sala Branca", (cfr. B37);
- que quando a encarregada geral D… se apercebeu que a A. havia "picado" o relógio de ponto sem estar devidamente equipada, a A. se preparasse para entrar na "Sala Branca", que a encarregada geral D… se tenha dirigido à A. solicitando-lhe que não desse entrada na "Sala Branca" (por não reunir as condições para tal necessárias), (cfr. B40);
- o teor do tema da prova B42) ("Se a A. só acatou as instruções da sua superior hierárquica depois de ter sido por ela admoestada");
- o teor do tema da prova B43) ("Se o estrito cumprimento do Regulamento Interno, tem importância fundamental para o bom desempenho e rentabilização do trabalho de todas as operárias da R., sendo o respetivo conteúdo objeto de permanente divulgação e explicitação por parte da Ré ");
- o teor do tema da prova B44) ("Se a A. se apresentava a trabalho, com a violação do dito Regulamento Interno nos termos atrás referidos, ao assinalar o inicio da sua laboração antes de efectivamente a mesma ter começado");
- o teor do tema da prova B45) ("Se o controlo do tempo de trabalho, permitido pelo "relógio de ponto" pode ser manipulado caso a trabalhadora, após a picagem não comece imediatamente a trabalhar");
- o teor do tema da prova B46) ("Se a A., caso não tivesse sido imediatamente admoestada pela sua superior hierárquica, nos termos e condições atrás referidos, teria provocado uma destas situações que com o dito controlo por relógio de ponto pretende evitar: "picava o ponto vinha equipar-se cá fora da "Sala Branca" e só depois é que começaria a trabalhar, do que resultaria a mesma a ser paga por trabalho não prestado, embora ficticiamente assinalado no relógio de ponto, como tal");
- o teor do tema da prova B48) ("Se a A. tinha perfeito conhecimento de que tal comportamento lhe estava vedado e, levianamente e apesar de informada do teor proibitivo do Regulamento e da formação ministrada sobre o uso do relógio de ponto, optou por ter um comportamento lesivo dos interesses patrimoniais e da organização e controlo interno da R.").
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3.2. Fundamentação de direito:
3.2.1. A primeira questão a conhecer, nesta sede, prende-se com a invocada revogação da sanção abusiva.
Entende a Ré que revogou a dita sanção disciplinar pelo que que a sanção disciplinar que aplicara à Autora deixou de subsistir.
Concluiu para tal que não há norma legal que impeça a entidade patronal de anular, por sua iniciativa, qualquer sanção disciplinar aplicada, o que fez em 09/03/2018, procedendo ao depósito autónomo à ordem dos presentes autos da quantia de €580,00, equivalente à sanção pecuniária, de 30 dias de suspensão com perda de vencimento e antiguidade, acrescida de juros, calculados à taxa legal de 4% desde o seu desconto, até àquela data.
Ainda que o pagamento dessa quantia e a remoção do seu cadastro disciplinar da Autora da sanção com reflexo na contabilização da antiguidade, descaracterizam automaticamente a qualificação de abusiva da sanção disciplinar em apreço.
Assim e já não se mantendo a sanção disciplinar aplicada e não havendo retribuição perdida, a Recorrente não pode ser condenada no pagamento de uma indemnização baseada no n°5 do artigo 331° do Código de Trabalho.
Por seu turno, a Autora veio alegar que a Ré, por força do princípio da irrevogabilidade da declaração negocial, a Ré não podia retirar/anular a sanção de suspensão do trabalho, pelo período de 30 dias, com perda de retribuição, sem a sua concordância, numa altura em que já nem se encontrava investida no poder disciplinar sobre si.
Concluiu que o depósito efectuado pela apelante, só produz efeitos atinentes a um pagamento parcial antecipado, da quantia em que veio posteriormente a ser condenada.
Finalmente, a Ex.ª Procuradora acompanhou a posição da Trabalhadora.
Deixamos transcrita a fundamentação constante da sentença do Tribunal a quo a este propósito “já após ter intentado a presente acção, a autora foi despedida pela Ré em Janeiro (…) por requerimento entrado em Juízo no dia 09 de Março de 2018, a Ré (…) procedeu ao depósito autónomo à ordem dos presentes autos, da quantia de €580,00 "equivalente à sanção pecuniária de 30 dias de suspensão com perda de vencimento e antiguidade, acrescida de juros, calculados á taxa legal de 4% desde o seu desconto, Outubro de 2017, até à presente data (…) Ou seja, a Ré vem, em plena tramitação da presente ação e estando a mesma pendente, pretender revogar a sanção disciplinar que integra a causa de pedir dos presentes autos, depositando á ordem dos autos a retribuição perdida pela autora com tal sanção (acrescida de juros) e pretendendo a remoção da aludida sanção do cadastro disciplinar da autora e "assim, e já não se mantendo a sanção disciplinar aplicada e não havendo retribuição perdida, não pode condenar-se a entidade patronal numa indemnização baseada no n.°5 do art. 331.°do Cod. do Trabalho", (sic-fls.172).
Porém, na data em que tal requerimento deu entrada em Juízo já cessara o contrato de trabalho entre autora e ré, tendo-se consequentemente extinto o poder disciplinar da ré sobre a autora, incluindo o poder de revogar sanções disciplinares.
Destarte, nenhum efeito pode ter o requerimento apresentado a fls.170 e ss. sobre a presente causa, que não seja o reconhecimento pela Ré de que não deveria ter aplicado a sanção disciplinar posta em crise nos presentes autos, tendo inclusivamente a Ré já devolvido aos autos o montante que deixou de pagar à autora, a título de retribuição, devido á aplicação da sanção disciplinar in causam”, (sublinhado e destaque nossos).
Avançamos que acompanhamos a conclusão a que chegou o Tribunal a quo.
Desde logo e atenta a factualidade assente no item 7º que o contrato de trabalho celebrado entre a Autora e a Ré cessou por despedimento levado a cabo pela Ré em Janeiro de 2018, ou seja, em data anterior ao depósito autónomo à ordem dos presentes autos, efectuado por aquela última, em 09/03/2018, da quantia de €580,00, relativo à sanção pecuniária, de 30 dias de suspensão com perda de vencimento e antiguidade, aplicada à primeira.
Com efeito, nos termos do disposto no artigo 357º, nº7 do Código do Trabalho, a decisão de despedimento por facto imputável ao trabalhador «determina a cessação do contrato logo que chega ao trabalhador ou é dele conhecida».
Não nos revemos porém na 13ª conclusão da Ré no sentido de que com a notícia do despedimento da Autora, os autos continham já todos os elementos probatórios respeitantes à aplicação da sanção em apreço.
Igualmente não se compreende em que medida o prosseguimento dos autos após o despedimento da Autora, inviabilizou o exercício do direito do contraditório e de impugnação sobre o carácter lícito ou ilícito da sanção, abusivo ou desproporcionado em relação aos factos que visou punir (conclusão 16ª).
A Apelante invoca o facto de a Autora ter movido uma ação de impugnação judicial da regularidade e licitude do despedimento de que foi alvo, pendente à data da realização do referido depósito.
Não obstante, nada a esse propósito foi alegado e resultou provado, sendo que a Apelante não impugnou a decisão relativa à matéria de facto.
É certo que nos termos do artigo 72º, nº 1, do Código de Processo do Trabalho, se no decurso da produção da prova surgirem factos que, embora não articulados, o tribunal considere relevantes para a boa decisão da causa, deve ampliar a base instrutória ou, não a havendo, tomá-los em consideração na decisão da matéria de facto (aqui cabendo tanto os factos instrumentais, como os complementares ou de concretização, bem como factos fundamentais).
Exige-se, porém, para a consideração de tais factos, como resulta do mesmo preceito e bem assim do disposto no artigo 5º, nº2, alínea b) do Código de Processo Civil, a observância do princípio do contraditório, sendo necessário que sobre eles seja facultada a possibilidade das partes se pronunciarem.
Trata-se porém de uma faculdade que incumbe à 1ª instância e que não é sindicável por esta Relação.
Aliás, se a Apelante assim o tivesse entendido aquando da produção de prova, teria de nesse momento, suscitar tal questão, caso assim o pensasse necessário, não sendo em sede de recurso, o momento para o fazer.
Neste sentido lê-se no recente Acórdão desta secção proferido no processo nº 5231/16.T8MTS.P1 (relatora Rita Romeira e em que foi 1ª adjunta a aqui relatora) “Ora, a consideração de factos não alegados para integrarem a base instrutória, ou não a havendo, tomá-los em consideração na decisão da matéria de facto, só é possível por via do disposto no art. 72º, nº 1 do CPT, nesse caso pressupondo que se dê cumprimento ao disposto no nº 2, ou nas circunstâncias referidas no nº 4, do mesmo artigo, nomeadamente, possibilitando-se às partes indicarem as respectivas provas, requerendo-as imediatamente ou, em caso de reconhecida impossibilidade, no prazo de cinco dias.
Precisamente por isso, como é entendimento pacífico da jurisprudência, desta secção social, nomeadamente, (Ac. de 11 de Junho de 2012, relatora Desembargadora Fernanda Soares, Proc. nº 2/10.9TTMTS.P1 e Ac. de 13 de Junho de 2018, Proc. nº 5333/17.4T8PRT.P1, relator Desembargador Nelson Fernandes), a segunda instância não pode fazer uso do disposto no art. 72º do CPT, visto que não pode ser dado cumprimento ao nº2 do mesmo”.
Acresce referir que a invocada ação de impugnação judicial da regularidade e licitude do despedimento e o próprio desfecho da mesma nenhuma implicação directa e necessária podiam ter com a questão a conhecer nos presentes autos, nos quais está em causa aferir se a sanção disciplinar de 30 dias de suspensão com perda de vencimento e antiguidade foi abusivamente aplicada pela Ré à Autora e nesse caso, se justifica a condenação da Ré no pagamento das quantias reclamadas pela Autora.
Não aderimos assim também às conclusões da Apelante, no sentido de que o depósito da referida quantia e a remoção do cadastro disciplinar da Autora da sanção disciplinar em causa, com reflexo na contabilização da antiguidade, tenham descaracterizado automaticamente a qualificação de abusiva da mesma sanção, a qual ao ser assim revogada deixou de subsistir, deixou de haver sanção e retribuição perdida (conclusões 5ª e 6ª).
Na verdade, o depósito pela Ré, na pendência dos autos, da quantia de € 580,00 relativa à falta de retribuição derivada da sanção pecuniária de 30 dias de suspensão com perda de vencimento e antiguidade, acrescida de juros, calculados á taxa legal de 4% desde o seu desconto, Outubro de 2017 e bem assim a eliminação da sanção do registo disciplinar da Autora, apenas se compreendem como o reconhecimento por parte da Ré do desajuste da sanção que aplicou à Autora – do injustificado dessa sanção - e como uma antecipação voluntária do pagamento da retribuição que em virtude da mesma sanção a Autora deixou de auferir, acrescida dos respetivos juros.
Não têm contudo o resultado almejado pela Ré, ou seja que a sanção deixou de se poder considerar como aplicada, nomeadamente para se aquilatar da indemnização baseada no nº5 do artigo 331º do Código do Trabalho, onde se prevê que o empregador que aplicar sanção abusiva deve indemnizar o trabalhador nos termos gerais e, nomeadamente, «Em caso de sanção pecuniária ou suspensão do trabalho, a indemnização não deve ser inferior a 10 vezes a importância daquela ou da retribuição perdida».
Assim sucede por qualquer dos direitos da Autora decorrentes da sanção disciplinar aplicada, não se terem extinguido.
Impunha-se pois aquilatar da natureza abusiva da sanção aplicada, tal como foi efetuado pelo Tribunal a quo, uma vez que a Autora reclamou também, nomeadamente, o pagamento da indemnização correspondente e uma indemnização a título de danos morais, o que não foi satisfeito pela Ré.
Concluímos assim que a sanção disciplinar não deixou de existir – inexistindo causa para a extinção da instância por inutilidade superveniente da lide, a partir do momento em que a Ré, na pendência dos autos, procedeu ao depósito da quantia de € 580,00 relativa à falta de retribuição derivada da sanção pecuniária de 30 dias de suspensão com perda de vencimento e antiguidade que aplicou à Autora, acrescida de juros, calculados á taxa legal de 4% desde o seu desconto, Outubro de 2017 e bem assim à eliminação da sanção do registo disciplinar da Autora.
Improcede nesta parte a apelação.
3.2.2. Em sede do presente recurso a Ré não pôs em causa o carácter abusivo da sanção aplicada.
Questiona sim, caso não sendo entendido que a sanção ficou revogada que ao valor da indemnização fixado, não tenha sido descontado o valor do depósito que efetuou.
Trata-se porém de coisas distintas. Uma é o valor da indemnização devida pela Ré segundo o critério legal previsto no n°5 do artigo 331° do Código de Trabalho. Outra o que a Ré “adiantou” do pagamento de tal valor, mediante o depósito que fez e que pode/deve ser destinado a esse fim.
Não merece pois qualquer reparo nessa parte a sentença do Tribunal a quo.
Improcede nesta parte a apelação.
3.2.3. Analisemos agora, por último, a indemnização por danos não patrimoniais fixada.
A este propósito concluiu a Apelante que o montante a que se reporta a alínea d) da decisão, deve ser considerado como não devido à Autora, face à inexistência de danos não patrimoniais decorrentes da revogação da sanção disciplinar que lhes poderia ter dado causa.
Caso ainda assim se não entenda deve a mesma ser reduzida a montante a fixar pelo tribunal, tendo em conta os critérios dos artigos 496° e 494° do Código Civil.
Por seu turno, a Autora alegou que não foi questionado o julgamento da matéria de facto.
Ainda que o quantum indemnizatório se mostra adequado e proporcional, quer à ilicitude do comportamento da Apelante e à intensidade da culpa, quer às decorrentes consequências verificadas na pessoa da apelada.
Deixamos transcrita a fundamentação constante da sentença do Tribunal a quo a este propósito: “Peticiona ainda a Autora a condenação da Ré a pagar-lhe a quantia de €2.500 como indemnização por danos não patrimoniais.
Nos termos do disposto no art°331°, n°3, do CT2009 "o empregador que aplicar sanção abusiva deve indemnizar o trabalhador nos termos gerais, com as alterações constantes dos números seguintes".
Na referida indemnização prevista nos termos gerais, inclui-se a indemnização por danos não patrimoniais.
Para tanto, como é consabido, importa ter presente que, tendo a obrigação de indemnizar como resulta do disposto no artigo 483.° do Código Civil como pressupostos fundamentais a verificação de um facto ilícito e culposo do qual em termos de nexo de causalidade decorreram danos, estabelece por sua vez o artigo 496.°, do mesmo Código, que na fixação da indemnização se deve atender aos danos não patrimoniais que, pela sua gravidade, mereçam a tutela do direito.
No caso, estando já afirmada anteriormente a ilicitude do facto (sanção disciplinar aplicada) e a culpa, impõe-se verificar apenas se ocorreram danos decorrentes daquele facto (nexo de causalidade) e, se for esse o caso, como o exige o artigo 496.°, se os referidos danos são indemnizáveis.
Na verdade, a gravidade do dano, pressuposta pela citada norma, como a doutrina e a jurisprudência têm afirmado, deve medir-se, embora tendo em conta as circunstâncias do caso concreto, por um padrão objectivo e não em função de factores subjectivos, donde que os vulgares incómodos, contrariedades, transtornos ou indisposições, por não atingirem um grau suficientemente elevado, não confiram direito a indemnização.
Dito de outro modo, não basta a mera verificação de um qualquer dano não patrimonial para que se tenha por justificado o pagamento de indemnização, impondo-se, noutros termos, que o mesmo revista gravidade, sendo que "a gravidade do dano há-de medir-se por um padrão objectivo (conquanto a apreciação deva ter em linha de conta as circunstâncias de cada caso), e não à luz de factores subjectivos (de uma sensibilidade particularmente embotada ou especialmente requintada). Por outro lado, a gravidade apreciar-se-á em função da tutela do direito: o dano deve ser de tal modo grave que justifique a concessão de uma satisfação de ordem pecuniária ao lesado" (cfr. Antunes Varela, "Das Obrigações em Geral", volume I, 4.a edição, Almedina, pág. 532).
Acresce que "em direito laboral, para se reconhecer direito ao trabalhador a indemnização com fundamento em danos não patrimoniais, terá aquele de provar que houve violação culposa dos seus direitos por parte do empregador, causadora de danos que, pela sua gravidade, mereçam a tutela do direito, o que se verificará, em termos gerais, naqueles casos em que a culpa do empregador seja manifesta, os danos sofridos pelo trabalhador se configurem como objectivamente graves e o nexo de causalidade não mereça discussão razoável.," (Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 25 de Janeiro de 2012: www.dgsi.pt.jstj-Proc. n°4212/07.8TTLSB.L1.S1).
Ora, a esse propósito provou-se in casu que o «antecedente disciplinar» que a ré pretendeu criar à autora, coarctou o seu direito à efectiva prestação de trabalho e à realização e valorização profissional e fez com que a mesma se tenha sentido humilhada e apoucada na sua imagem pessoal e profissional; que a autora, que sempre fora uma pessoa alegre e sociável, tem vindo, agora, a isolar-se do convívio com as demais colegas de trabalho, ensimesmando-se, sendo o seu discurso marcado por recorrentes alusões e preocupações à sua situação laboral; que a autora tem vindo a experimentar momentos de ansiedade, desgosto e, até, revolta, pela aplicação dum castigo injusto, em prejuízo da sua saúde física e psíquica, tendo dificuldade em adormecer e manter um sono reparador sem recurso a indutores, outrossim, num estado vígil asténico e abúlico, (factos provados 47 a 53).
Verificando-se assim um dano imputável à Ré, afigura-se que o mesmo atinge o patamar de gravidade exigido pelo art°496° do CC e consequentemente merece a tutela do direito para efeitos indemnizatórios por danos de natureza não patrimonial.
Com efeito, os referidos danos sofridos pela trabalhadora aqui autora integram uma lesão grave, que vai para além daquela que sempre acontece em situações similares de sanção disciplinar conduzindo à conclusão segura da necessidade de reparar uma lesão que restaria apodicticamente não satisfeita.
O que implica concluir pela procedência da presente acção também quanto a esse pedido, fixando-se a peticionada quantia de €2.500, a título de danos não patrimoniais, por se afigurar, atenta a factualidade provada e o grau de ilicitude e de culpa da conduta da Ré que os autos demonstram, adequada e razoável”.
Vejamos:
Conforme supra ficou referido, a Apelante não impugnou a matéria de facto e qualquer dos direitos da Autora decorrentes da sanção disciplinar aplicada, não se extinguiram, com o depósito efectuado pela Ré, na pendência dos autos.
Por outro lado e como se lê no Acórdão desta secção de 8 de Abril de 2013 (Relatora Maria José Costa Pinto, in www.dgsi.pt) que “(...) A lei não enumera os danos não patrimoniais que merecem a tutela do direito, “antes confia ao tribunal o encargo de apreciar, no quadro das várias situações concretas, socorrendo-se de factores objectivos, se o dano não patrimonial é merecedor de protecção jurídica”.
Assim o fez o Tribunal a quo na decisão recorrida, concluindo também nós perante a respectiva fundamentação transcrita, com a qual concordamos que da factualidade provada resulta um dano não patrimonial objectivo que se reveste de manifesta gravidade e deve ser compensado.
A Apelante questiona a final quantum indemnizatório fixado na sentença.
Não merece porém o mesmo reparo.
Não sendo os danos não patrimoniais susceptíveis de avaliação pecuniária, foi na sentença equitativamente bem ponderada a forma como a Autora se ressentiu da lesão causada e os sentimentos que dela lhe advieram, não encontrando nós razões para concluir de modo diverso, sobre a medida adequada da indemnização - a justa indemnização - para compensar os danos que se provaram neste caso.
Com efeito, temos como de gravidade não diminuta os danos sofridos pela Autora, como resulta dos factos dos itens 47º a 53º e é bem salientado na sentença, a ponto de abalarem e fragilizarem não só o seu bem-estar – nomeadamente a sua saúde -, como de se reflectirem ainda na sua forma de estar e de se relacionar com os demais colegas de trabalho.
De considerar é também o facto de a Autora trabalhar na Ré há mais de 12 anos, (item 1º dos factos assentes).
Não pode ignorar-se ainda aqui, por se reflectir no grau de ilicitude a ponderar, a direta relação entre o exercício de um direito pela Autora – a ação que interpôs reclamando a ilegalidade da cessação do pagamento das horas de trabalho prestadas em período nocturno com o acréscimo previsto na lei - e a situação a que a Ré sujeitou a Autora, aplicando-lhe de forma persecutória uma sanção abusiva, impedindo-a de prestar o seu trabalho, com a realização e valorização profissional inerentes e de auferir a respectiva retribuição por 30 dias.
Igualmente a culpa da Ré não é diminuta, nada se tendo apurado que em alguma medida indulgenciasse a respectiva actuação.
Com um juízo de equidade e perante os critérios estabelecidos no artigo 496º, nº 3 do Código Civil, atento o valor a que chegou o Tribunal a quo, de € 2.500,00, não descortinamos motivos para não o considerar como justo e adequado para ressarcir os danos não patrimoniais sofridos pela Autora, em consequência da descrita actuação ilícita da Ré, considerando ainda a própria função que a fixação da indemnização nesta sede visa alcançar.
Improcede assim também nesta parte a apelação.
3. Decisão:
Nesta conformidade, acordam os Juízes da Secção Social do Tribunal da Relação do Porto, em julgar improcedente a apelação.
Custas da apelação pela Ré.

Porto, 03 de Junho de 2019.
Teresa Sá Lopes
Fernanda Soares
Domingos Morais