Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
393/14.2TTMTS-A.P1
Nº Convencional: JTRP000
Relator: PAULA LEAL DE CARVALHO
Descritores: PROCEDIMENTO CAUTELAR
AÇÃO PRINCIPAL
RELAÇÃO DE DEPENDÊNCIA E INSTRUMENTALIDADE
Nº do Documento: RP20160407393/14.2TTMTS-A.P1
Data do Acordão: 04/07/2016
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: NEGADO PROVIMENTO
Indicações Eventuais: 4ª SECÇÃO (SOCIAL), (LIVRO DE REGISTOS N.º238, FLS.187-206)
Área Temática: .
Sumário: Entre o procedimento cautelar e a respetiva ação principal terá que existir, entre ambos, uma relação de dependência ou instrumentalidade de tal sorte que o direito acautelado no procedimento o seja também na ação principal caso esta venha a proceder.
Reclamações:
Decisão Texto Integral: Procº nº 393/14.2TTMTS-A.P1
Relator: Paula Leal de Carvalho (Reg. nº 878)
Adjuntos: Des. Rui Penha
Des. Maria José Costa Pinto

Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação do Porto:

B…, instaurou, na pendência da ação n.º 393/14.2TTMTS e por apenso a esta, o presente procedimento cautelar comum contra C…, S.A. e D…, S.A., pedindo a suspensão da cessação da comissão de serviço até decisão final da ação principal, mantendo-se a requerente nas funções de supervisora.
Para tanto, alegou que:
Assinou contrato de comissão de serviço com a 1ª Requerida no dia 15.01.2009, conforme contrato que junta, para o desempenho das “funções de Supervisor de Departamento de Assistência a Passageiros, na Direcção de Unidade de Handling do …”, tendo contudo efeitos salariais apenas a partir da data de 16/06/2010, data essa que se reporta à altura em que a Requerente assinou contrato de trabalho a termo incerto com a 1ª Requerida, para a categoria de assistente de passageiros de mobilidade reduzida.
Até essa data, e desde 16.06.2008, a Requerente tinha um contrato de trabalho temporário, assinado com a empresa E…, Lda, devendo prestar serviço na empresa da 1ª Requerida, com a categoria profissional de Supervisora, e desempenhando as seguintes funções: “Fazer o planeamento diário, operação em conjunto com o coordenador, distribuir tarefas e dirigir a equipa de assistentes de F… em função da informação enviada pelas companhias aéreas, acolher, encaminhar e acompanhar F…, articular o serviço e os meios técnicos e humanos do lado-ar com os lado-terra, dirigir o trabalho dos assistentes junta às aeronaves, colaborar com a equipa na execução de tarefas de apoio ao serviço, gerir as equipas de assistentes a passageiros de mobilidade reduzida, distribuir os assistentes pelas várias áreas de serviço operacionais, proceder à correcta distribuição de meios humanos e técnicos no trabalho de assistência a F…”.
A responsabilidade que a 1ª Requerida afirma ter assumido relativamente à assistência de passageiros de mobilidade reduzida (F…), não se iniciou à data da assinatura do contrato de comissão de serviço, responsabilidade essa que começou com a transposição do Regulamento comunitário (CE) 1107/2006 para o nosso ordenamento jurídico, que obrigou todas as empresas responsáveis pela gestão dos aeroportos (sendo no caso português a segunda requerida) a ter um serviço gratuito para apoio a passageiros de mobilidade reduzida a partir de Julho de 2008.
Tendo sido criado, para o efeito, o serviço C… – Assistência a Passageiros de Mobilidade Reduzida da D… (segunda requerida), que, apesar de ter sido diretamente “entregue” à sua subsidiária (a primeira requerida), sempre foi efetivamente gerido por aquela.
A Requerente, desde 16.06.2008 até à presente data, sempre desempenhou as funções de Supervisora do serviço de apoio a passageiros de mobilidade reduzida.
Sucede que, no dia 30.09.2015, foi à requerente verbalmente comunicado que o seu contrato de comissão de serviço cessaria com efeitos imediatos (devendo começar, desde já a desempenhar funções de assistente de passageiros de mobilidade reduzida), continuando contudo a auferir a compensação remuneratória até ao mês de Novembro de 2015, passando o seu nome a constar dos horários de Dezembro dos assistentes de passageiros de mobilidade reduzida.
Tal facto, bem como a “pressão excecional” e assédio moral de que tem vindo a ser alvo por parte das Requeridas, que descreve, fazem supor que tal se deva à circunstância de haver, conjuntamente com outros colegas, intentado a ação principal.

Atentas as funções desempenhadas pela Requerente - receber os pedidos de assistência das companhias aéreas e designar os colegas que irão efetuar a mesma -, bem como face ao demais que invoca, não se verifica nenhuma das situações legalmente previstas suscetíveis de permitirem a sua execução em regime de comissão de serviço, nem se prevendo no Acordo de Empresa da D… S.A. a existência de contratos de comissão de serviço. Ademais, nem sequer existe, pelas razões que invoca, a relação de confiança necessária e que está na base dos contratos de comissão de serviço.
Conclui assim que não foram observados os requisitos materiais exigidos pela lei para a celebração do contrato de comissão de serviço, pelo que a decisão de retirar a requerente das funções de supervisora para passar a desempenhar funções de assistente de passageiros de mobilidade reduzida consiste numa verdadeira despromoção da carreira e consequentemente, consubstancia violação gravosa dos direitos dos trabalhadores (designadamente o princípio da irreversibilidade da carreira).
Sem prescindir, caso se considere que o cargo de supervisor é um cargo de chefia, ainda assim não se poderá considerar que o contrato de comissão de serviço haja produzido os seus efeitos, pois que:
A requerente assinou um contrato de trabalho temporário com a empresa E.., sendo a 1ª requerida a beneficiária do trabalho, para o exercício das funções correspondentes à categoria de supervisora; quando assinou o contrato de comissão de serviço, estava ainda vinculada ao contrato de trabalho temporário e as suas funções em nada se alteraram. Ou seja, diz, assinou a requerente um contrato de comissão de serviço que previa exatamente as mesmas funções que já fazia há meio ano.
Na ação principal é peticionado que a Requerente seja reconhecida como trabalhadora do grupo D… desde o primeiro contrato com a E… – ou seja, desde Junho de 2008.
Deste modo, tendo a requerente sido contratada como supervisora e tendo sempre exercido as mesmas funções até ao presente, forçosamente terá de ser aquela a sua verdadeira categoria profissional, nunca tendo, consequentemente, o contrato de comissão de serviço produzido os seus efeitos, caracterizando-se a suposta cessação daquele contrato como uma verdadeira despromoção e violando os princípios da segurança no emprego e da irreversibilidade da carreira profissional.
Conclui no sentido da existência da probabilidade séria de existência do direito por o contrato de comissão de serviço não ter respeitado os requisitos materiais impostos pelo Código do Trabalho e por a categoria profissional ser a de supervisora, não se demonstrando que tal cargo seja apenas decorrente do contrato de comissão de serviço, mas antes da sua efetividade desde Julho de 2008.
Mais alega o “periculum in mora”, acrescentando que, como supervisora, sempre recebeu um subsídio de chefia, auferindo retribuição superior à dos colegas com a categoria de assistentes de passageiros de mobilidade reduzida e acarretando a despromoção um efetivo prejuízo que apenas poderá ser assegurado em tempo útil pela presente providência cautelar.

O Mmº Juiz indeferiu liminarmente o procedimento cautelar e fixou-lhe o valor de €30.000,01.

Inconformada, veio a Requerente recorrer, tendo formulado, a final das suas alegações, as seguintes conclusões:
“1 – Não pode a recorrente conformar-se com a decisão proferida pelo Meritíssimo Juiz “a quo”, que decidiu pelo indeferimento liminar da providência requerida pela mesma não se encontrar numa relação de instrumentalidade ou dependência da acção principal.
2 – A acção principal é uma acção laboral, proposta na vigência do contrato de trabalho por vários trabalhadores do serviço G… (serviço imposto pela União Europeia desde 2008 ás entidades gestoras dos aeroportos) da D…, S.A., onde se inclui da recorrente, e é peticionado:
- a nulidade dos termos dos contratos celebrados – desde o primeiro contrato de trabalho temporário, celebrado com a empresa E…, por inexistência de motivo legal que fundamentasse o recurso a tais contratos;
- o reconhecimento dos AA. como trabalhadores da D… – estando preenchidos os requisitos do método indiciário, ou, caso assim não se entenda, o reconhecimento da existência de uma situação de pluralidade de empregadores (diga-se que a D… detém 100% da C…), sem que para o efeito tenha sido cumprida a forma legal imposta, originando o direito dos AA. optarem pelo empregador – optando no caso pela D….
- o reconhecimento que é aplicável aos AA. o Acordo de Empresa D… – com todas as regalias que daí advêm;
- o reconhecimento de que a categoria profissional dos AA. é de TIRP – Técnico de Informação e Relações Públicas;
- a nulidade dos protocolos que a requerida C… diz ter celebrado com os sindicatos, por não estarem publicados no BTE; ou, caso assim não se entenda, que os mesmos não sejam aplicados aos AA. uma vez que nunca foram os mesmos informados da existência do protocolo, nem pela requerida C…, nem pelo Sindicato (I…), não estando o mesmo disponível em sítio algum, invocando assim o vício de vontade, na forma de erro.
3 – Estando a acção a correr os seus termos com normalidade, foi a recorrente surpreendida com a decisão de cessação do contrato de comissão de serviço – comunicado verbalmente no dia 30 de Setembro deste ano, pelo Dr. J… – produzindo tal cessação efeitos imediatos, não obstante manter-se o valor remuneratório até Novembro.
4 – Confrontada com tal situação, a recorrente viu-se obrigada a recorrer à providência cautelar que foi requerida por apenso à acção principal.
5 – Não entendendo, contudo, o Meritíssimo Juiz “a quo” que tal providência seja instrumental ou dependente da acção principal – o que no nosso modesto entendimento não pode ser aceite.
Ora,
6 – Celebrou a recorrente os seguintes contratos de trabalho:
1) Contrato de trabalho temporário, celebrado com a E…, tendo como entidade beneficiária a requerida C… - a 16/06/2008, para a categoria de supervisora;
2) Adenda ao contrato de trabalho temporário celebrado a 14/07/2008, alterando o horário trabalho e remuneração;
3) Contrato de comissão de serviço, celebrado com a requerida C… em 15/01/2009 - contrato esse assinado na vigência do contrato de trabalho temporário e produzindo os seus efeitos remuneratórios a partir de 16/06/2010, para desempenhar funções de supervisora;
4) Contrato de trabalho a termo incerto, celebrado a 15/06/2010 com a requerida C…;
7 – Ora, vem a recorrente invocar na acção principal a nulidade dos termos de todos estes contratos devendo a mesma ser considerada efectiva desde a celebração do primeiro contrato – a 16 de Junho de 2008.
8 – Na verdade, como já referido, no primeiro contrato assinado, foi a recorrente contratada para exercer funções de supervisora.
9 – Pelo que, ao ser dada razão à recorrente na acção principal naquela parte do pedido, isto é, ao ser reconhecida como trabalhadora efectiva desde 16 de Junho de 2008, por vício do contrato de utilização e do contrato de trabalho temporário (vide artigo 180º n.º 3 do C.T.), os contratos subsequentes nunca chegaram a produzir os seus efeitos.
10 – Consequentemente tem a recorrente a categoria profissional de supervisora por força do contrato de trabalho temporário celebrado (que se apresenta como um verdadeiro contrato de trabalho a tempo indeterminado) e não por força do contrato de comissão de serviço.
(Até porque não é concebível a celebração de um contrato de comissão de serviço para desempenhar funções de supervisora, quando assinou contrato de trabalho para exercer aquela categoria)
11 – Configurando-se assim a passagem da recorrente da categoria profissional de supervisora para assistente de passageiros de mobilidade reduzida como uma verdadeira despromoção da carreira.
12 – Ao arrepio do princípio constitucional da segurança do emprego (artigo 53º da CRP) e do princípio da irreversibilidade da carreira profissional (artigo 129º, n.º 1 al. e) do C.T.).
13 – Estando todavia, tal despromoção camuflada pela cessação de um suposto contrato de comissão de serviço – que pode nunca ter produzido os seus efeitos.
14 – Assim há uma dependência clara entre a providência cautelar e a acção principal: ambas versam (não só, mas também) sobre a nulidade do contrato de trabalho temporário.
15 – Não obstante o pedido na acção principal ser mais abrangente, há uma clara identidade parcial do pedido.
16 – Esclareça-se que não é possível ser a recorrente considerada efectiva desde 2008 e não ser considerada como supervisora.
17 – Tendo pouca relevância o facto desta ter requerido na acção principal o reconhecimento da categoria profissional de TIRP, uma vez que tal pedido não é dependente do pedido de nulidade dos termos dos contratos celebrados – mas figurar-se antes como pedidos cumulativos.
Mais,
18 – Quanto ao objecto da comissão de serviço, apesar de não ter sido requerida a sua apreciação judicial, a verdade é que resulta da prova junta (nomeadamente o contrato e definição das funções da recorrente) que as funções da recorrente não justificam o recurso ao contrato de comissão de serviço, previsto no artigo 161º do C.T.
19 – Existindo assim uma violação clara do requisito material para existência de tal contrato – em clara violação dos princípios fundamentais dos trabalhadores.
20 – Podendo a mesma ser decidida pelo Exmo. Sr. Juiz ao abrigo do princípio ultra vel extra petitium.
21 – Concluindo-se assim:
- que há uma clara dependência entre a providência cautelar e a acção principal, nomeadamente no pedido de nulidade do contrato de trabalho temporário com a consequente manutenção da categoria de supervisora – ao contrário do que foi entendido pelo Meritíssimo Juiz “a quo”; e
- estão, no caso, reunidos todos os princípios exigíveis para a decretação da providência cautelar, existindo sério perigo da recorrente ver-se despromovida na sua carreira, não podendo esperar pela decisão final do processo principal, sob pena de graves prejuízos, quer emocionais, quer patrimoniais, com a diminuição da retribuição.
Resta ainda dizer,
22 – Que não é concebível que tal providência corra separada da acção principal sob pena de litispendência.
23 – Pois, ao ser proposta em separado, e sendo uma providência de carácter conservatória (impedido assim o recurso à inversão do contencioso), obrigará à propositura de nova acção (que não correrá os seus termos na terceira secção de trabalho por questões de competência territorial) com a mesma autora, os mesmos réus, o mesmo pedido e causa de pedir: nulidade dos contratos de trabalho assinados, no qual se inclui o contrato de trabalho temporário, com a consequente manutenção da categoria profissional para a qual foi contratada: supervisora.
24 – Contrariando assim os princípios orientadores do novo C.P.C. – princípio da economia e celeridade processual.
25 – Nesta senda, dando provimento ao presente recurso, V. Exas. farão verdadeira justiça, garantindo o cumprimento dos direitos constitucionais da trabalhadora.
Nestes termos e nos melhores de direito (…), devem dar provimento à presente Apelação, e consequentemente considerar a providência cautelar requerida instrumental ou dependente da acção principal, devendo ser decretada, (…)”

A Recorrida, citada para os termos da causa e do recurso (art. 641º, nº 7, do CPC/2013), contra-alegou, tendo formulado as seguintes conclusões:
“1. O presente recurso tem como objeto o despacho que indeferiu liminarmente a providência cautelar apresentada pela aqui Recorrente com fundamento no facto de ter sido apresentada como apenso dos presentes autos sem que, no entanto, se verifique qualquer relação de instrumentalidade ou dependência entre o procedimento cautelar e a ação à qual foi apensada pela Recorrente.
2. Nesse sentido, bem andou o Tribunal a quo ao decidir no sentido em que decidiu.
3. Não obstante, nas alegações de recurso apresentadas, vem a Recorrente tentar demonstrar que se verifica a necessária relação de dependência e instrumentalidade entre as duas ações judiciais, o que manifestamente não acontece.
4. Resulta do despacho recorrido que “entre a providência cautelar e a ação principal deve existir uma relação que permita afirmar que o direito acautelado será provavelmente reconhecido na ação definitiva”. Acrescenta ainda que “a dependência que tem de existir entre procedimento cautelar e ação principal implica, necessariamente, que apenas possam ser protegidos, por via cautelar, aqueles direitos suscetíveis de serem tutelados através da ação principal”.
5. Tal entendimento plasmado no despacho recorrido é efetivamente aquele que impera na jurisprudência que se tem vindo a pronunciar sobre o tema, como resulta, por exemplo, do acórdão proferido, em 28.11.2006, pelo Tribunal da Relação de Lisboa e, bem assim, do acórdão proferido, em 28.02.2005, pelo Tribunal da Relação do Porto (ambos disponíveis em www.dgsi.pt).
6. Ora, em suma e tal como salientado pelo Tribunal a quo, o direito acautelado ou tutelado deve ser o mesmo na providência cautelar e respetiva ação principal, ainda que o objeto da ação principal seja mais amplo que o da providência cautelar, exigindo-se, no mínimo, uma coincidência quanto à causa de pedir.
7. Tal como resulta evidente de uma análise do teor (i) da petição inicial da ação principal e (ii) do requerimento inicial da providência cautelar, tal identidade não existe, nem quanto aos pedidos formulados nas duas ações em causa, nem entre as causas de pedir subjacentes a esses mesmos pedidos, afigurando-se evidente que nos encontramos perante uma providência cautelar e uma ação principal com objetos e alcances distintos.
8. Basta uma leitura perfunctória dos pedidos e causas de pedir acima descritos para constatarmos que se encontram em causa direitos totalmente distintos numa e noutra ação.
9. Se na ação principal a aqui Recorrente pretende, em suma, ser reconhecida como trabalhadora da Recorrida D…, com vista à aplicação do AE da mesma e ao seu reconhecimento numa das categorias previstas nesses AE, já na providência cautelar a Recorrente pretende sujeitar à apreciação do Tribunal a validade do contrato de comissão de serviço celebrado com a Ré C… e, bem assim, a sua recondução à categoria profissional correspondente às funções que, alegadamente, diz ter sempre exercido. Neste último caso, encontram-se em causa direitos manifestamente distintos dos da ação principal, que a Recorrente não conseguirá fazer valer com a sentença que vier a ser proferida no âmbito dessa mesma ação principal.
10. Pese embora a clareza do exposto, vem a Recorrente sustentar, nas suas alegações de recurso, que “subjacente ao pedido de nulidade dos termos, com a consequente efetividade desde 16 de junho de 2008, está a manutenção da categoria profissional para a qual aquela foi contratada no contrato de trabalho temporário: supervisora”, razão pela qual conclui pela “identidade parcial de pedidos e causa de pedir – podendo a recorrente ver a sua pretensão satisfeita com a sentença final da ação principal”.
11. Sucede que não lhe assiste qualquer razão, na medida em que o pedido (formulado na ação principal) de declaração da nulidade dos termos dos contratos de trabalho celebrados, tem como propósito a recondução a uma categoria profissional prevista no AE da Recorrida D… - de TIRP, não se encontrando tal pedido relacionado com a manutenção da categoria profissional que resulta dos contratos de trabalho celebrados entre a Recorrente e a Recorrida C….
12. Mais, nem na petição inicial que deu origem à ação principal, nem em momento posterior, se fez qualquer referência ao contrato de comissão de serviço que a aqui Recorrente pretendeu submeter à apreciação do Tribunal a quo, mediante apresentação da providência cautelar em apreço.
Nestes termos e nos mais de Direito aplicáveis, deve o recurso interposto ser considerado integralmente improcedente, mantendo-se a decisão recorrida, que não merece qualquer censura.”

A Exmª Srª Procuradora Geral Adjunta emitiu douto parecer no sentido do não provimento do recurso, parecer sobre o qual apenas a Recorrente se pronunciou, dele discordando.

Deu-se cumprimento ao disposto no art. 657º, nº 2, 1ª parte, do CPC/2013.
***
II. Matéria de facto que se tem como assente:

Para além do que consta do precedente relatório, tem-se como assente a seguinte factualidade:

1. A or a Requerente, então aí Autora, e outros 25 Autores, aos 04.05.2014, intentaram contra as RR., C…, S.A., D…, S.A., L…, S.A. e I…, a ação declarativa de condenação, com processo comum, nº 393/14.2TTMTS, em dependência do qual o presente procedimento cautelar foi deduzido.

2. Na petição inicial apresentada em tal ação, e que consta de fls. 110 vº a 169, foi alegado o seguinte[1]:
“(…)
I) LEGITIMIDADE PASSIVA
(…)
II) LEGITIMIDADE ATIVA
43º
Os AA. são trabalhadores do Grupo D…, tendo como empregador formal a 1º R. – C…, com quem celebraram contrato de trabalho escrito e de quem recebem o vencimento.
44º
Os AA. trabalham no handling do Grupo D…, desenvolvido pela empresa subsidiária aqui 1º R.
45º
Os AA. foram contratados para exercer funções de assistência a passageiros mas no âmbito do serviço G…, criado pela 2º R. D…, em 2008 por imposição legal quer europeia quer nacional.
(…)
III) NULIDADE DOS TERMOS APOSTOS NOS CONTRATOS DE TRABALHO A TERMO CELEBRADOS ENTE AA. E 1º R.
47º
A 1º R. no exercício da sua atividade contratou os AA., atribuindo-lhes a categoria de assistente de passageiros.
48º
Primeiramente, contratou-os através das empresas de trabalho temporário e de recrutamento de recursos humanos – M…, E…, N… e O….
Assim,
49º
Os AA. respetivamente, exercem funções no handling do Grupo D… – nomeadamente no P…, sito no Porto, desde as datas abaixo indicadas:
a)1ºAutora: B…
a.1) Data início funções na E… - 16 de Junho de 2008 até 15 de Junho 2010;
a.2) Primeiro Contrato C… celebrado a termo incerto data de 15 de Junho de 2010;
a.3) Foi também e ainda pela empresa de trabalho temporário admitida para a supervisão do serviço G… (vide doc. 19 – 15 fls.)
b) 2º Autor: (…)
(…)
50)
Todos os AA., desde a celebração do primeiro contrato com as empresas de trabalho temporário – trabalham formalmente para a 1º R. e efetivamente para a 2ºR. – ininterruptamente,
51º
Sob suas ordens, direção e de forma subordinada.
52º
Não obstante ter-lhes sido comunicado – em alguns contratos – a cessação destes por caducidade,
53º
O certo é que nunca os AA. deixaram de trabalhar nas mesmas funções, no mesmo local – P… e para as mesmas entidades.
54º
Não recebiam as correspondentes indemnizações pela cessação dos Contratos de trabalho com as empresas de trabalho temporário.
55º
Nunca ficaram sequer um dia sem vínculo laboral, exercendo sempre as mesmas funções.
56º
Atento o número de contratos a termo e o número de contratações em causa (“in casu” 26 contratações) importa verificar, sob a validade da fundamentação invocada para celebração de tantos contratos por tempo indeterminado e com duração superior a cinco anos.
Vejamos,
57º
Os vinte e seis trabalhadores supra – aqui AA. - integram o serviço G…, do P…, num universo de cerca trinta e seis trabalhadores afetos a este serviço, trinta dos quais são assistentes e os restantes seis assistentes com função de supervisão.
(…)
59º
Os trabalhadores identificados – B…, (…), foram contratados primeiramente a termo certo pelas diversas empresas de trabalho temporário, com o seguinte fundamento: "Acréscimo temporário (ou excepcional) da atividade do utilizador resultante de: I) necessidade de mão-de-obra para a realização de projeto com carácter temporal limitado, designadamente instalação e reestruturação das empresas e estabelecimentos, montagens e reparações industriais, particulares, por prestação de novos serviços de apoio aos passageiros com mobilidade reduzida, que consubstancia necessidade de mão-de-obra para realização de um projeto de carácter temporal limitado de acordo com o contrato assinado entre a D… e C….”
60º
Posteriormente assinaram contrato a termo incerto com a 1ª R, com o seguinte fundamento:
Foi celebrado um contrato de prestação de serviços, para assistência a pessoas com mobilidade reduzida (F…), nos aeroportos de …, … e …, que se consubstancia na necessidade de mão-de-obra para realização de um projeto com carácter temporal limitado de acordo com o contrato assinado entre D… S.A. e a C… S.A.” (...)
(...)Cláusula 3ª) O contrato é celebrado ao abrigo da alínea h) do n.º 2 do art. 140º da Lei n.º 7/2009, de 12 de Fevereiro (Código do Trabalho), e fundamenta-se na prestação e manutenção, a vigorar pelo tempo necessário, da atividade e projetos indicados no Considerando único na medida das necessidades.”
(…)
90º
Conclui-se, assim que, não existe nem nunca existiu um verdadeiro projeto com carácter temporário e sazonal associado á atividade desenvolvida pelos AA.
(…)
92º
Por último, refira-se que os motivos descritos nos itens 61º e 63º supra para contratação a termo não pode considerar-se ainda assim válidos.
Isto porque,
(…)
96º
Nesta medida são aqueles termos apostos nos contratos de trabalho dos AA. nulos.
(…)
101º
Em suma, deverá este Tribunal considerar os AA. trabalhadores com contrato por tempo indeterminado (e não contrato a termo incerto) desde a data da celebração do primeiro contrato com as empresas de trabalho temporário, especificados individualmente no item 49º deste articulado, nomeadamente reconhecendo-se a antiguidade dos mesmo no Grupo D… reportar-se àquela data, alargando-se ainda tal reconhecimento aos AA. atualmente efetivos.
IV - DA ENTIDADE PATRONAL
102º
Importa agora debruçarmo-nos sobre a verdadeira entidade patronal dos AA.
103º
Na verdade têm os AA., como supra já se disse, contratos de trabalho com a 1ª R..
104º
Levando assim, á primeira vista, a acreditar que esta é a verdadeira entidade patronal.
105º
Contudo tal não pode ser aceite pelos AA.
(…)
107º
Dúvidas não restam, nem nunca as houve, que têm os AA. um contrato de trabalho - e que este foi formalmente celebrado com a 1ª R..
108º
Não podem é os AA. aceitar que trabalham no âmbito de organização e sob autoridade daquela R.
Isto porque,
(…)
126º
Pelo que, claramente se percebe que a verdadeira entidade patronal dos AA. é a 2ª R. – D….
127º
Já que é aquela a entidade que beneficia do serviço prestado pelos AA. e é esta a detentora do poder de direção, e, em última instância do poder disciplinar – sendo a 2ª R. a real detentora da subordinação jurídica dos AA.
128º
Afigura-se, então claro, que os AA.:
- prestam a sua atividade num local pertencente à 2ª R. e em beneficio daquela;
- utilizam equipamentos e instrumentos de trabalho que pertencem à 2ª R., e
- é a 2ª R. que desempenha as funções de direção e chefia na estrutura orgânica da empresa.
129º
A 1ª R. apenas é responsável pelo pagamento dos salários dos AA. – nunca olvidando, todavia, a relação societária existente entre a 1ª e 2ª RR., e pelas questões relacionadas com os horários, turnos e trocas de turnos.
130º
Assim, e de acordo com o artigo 12º do C.T., claramente se percebe que os AA. têm na verdade um contrato de trabalho com a 2ª R.,
131º
Aparecendo a 1ª R. apenas como entidade patronal formal, meramente por ter sido aquela R. a efetuar o contrato de trabalho,
132º
Sendo contudo todo o trabalho prestado à 2ª R. – entidade patronal real.
133º
Pelo que são os AA. verdadeiramente funcionários da D…, S.A. – aqui 2ª R. – o que aqui expressamente de invoca e se requer.
Sem prescindir, sempre se dirá por mera cautela de raciocínio,
134º
Caso não se entenda que apenas existe subordinação jurídica para com a 2ª R. – D…, existindo também para a 1ª R.,
135º
Uma vez que é esta última que efetua o pagamento das retribuições, que trata dos horários e detém, em primeira mão, o poder disciplinar,
136º
Sempre se dirá, então, que estamos perante uma pluralidade de Empregadores
(…)
138º
Assinaram os AA. contratos de trabalho com a 1ª R., para prestarem serviço como assistentes de passageiros de mobilidade reduzida, com as funções descritas no anexo ao contrato cujo teor se dá aqui por reproduzido.
(…)
152º
Mostrando-se claro que estamos perante uma situação de pluralidade de Empregadores.
(…)
161º
Assim, dúvidas não há que foram violados os artigos 101º, n.ºs 1, 2 al. a) e c) e 106º n.º 3 al. a), 107 n.ºs 1 e 4 e 109º n.º 1. do C.T.
162º
Não cumprido a 1ª e 2ª RR. os requisitos legalmente impostos para a contratação no caso de pluralidade de empregadores.
163º
Pelo que, e como dispõe o artigo 101º n.º 5 do C.T., têm os AA. o direito de optar pela entidade patronal à qual ficam vinculados.
164º
Optando os AA. pela 2º R. – D…, S.A..
165º
Nessa medida, deverão os AA. ser reconduzidos à categoria profissional correspondente às funções que exercem,
166º
Que, no AE aplicável aos trabalhadores D…, se reporta à categoria de TIRP – Técnico de Informação e Relações Públicas, com o seguinte descritivo funcional:
“Assegura o conjunto das actividades destinadas à informação, acolhimento, atendimento e encaminhamento dos utentes do P…, utilizando os meios técnicos e de informação disponíveis. Assegura as assistências especiais, em coordenação com outros serviços internos ou externos à Empresa, conforme normas estabelecidas. Assegura e controla a qualidade do serviço prestado ao cliente/utilizador, propondo procedimentos que visem a melhoria da qualidade.”
167º
Mais, devem em consequência ser colocados no nível salarial correspondente a tal categoria, caso contrário, violar-se-ia o princípio constitucional de trabalho igual, salário igual.
168º
Diga-se ainda que os AA. auferem neste momento um vencimento correspondente a metade do valor que deviam estar a auferir.
169º
Nesta medida, reconhecendo este tribunal razão aos AA., deverão a 1ª a 3ª RR. solidariamente serem condenadas pelo pagamento das diferenças salariais e subsídios referentes aos anos das prestações de serviço de cada A., a liquidar e reclamar em ação de liquidação posterior.
(…)
V - Dos Protocolos
Caso não se entenda que os AA. são trabalhadores da 2ª RR. – o que apenas por mera hipótese académica se coloca, sempre se dirá que,
170º
A R. C… estipulou nos contratos celebrados com os AA. que, ao contrato de trabalho celebrado aplicar-se-ia o AE D… – aliás, o qual se comprometeu a aplicar perante o INAC (doc. xx), e também diversos protocolos celebrados entre a R. e os sindicatos.
171º
Ora, é sobre os referidos protocolos que os AA. se vão pronunciar, não podendo de todo aceitar que os mesmos se apliquem a eles.
172º
Na verdade, nunca os AA. conheceram quaisquer dos protocolos que se encontram enumerados nos seus contratos de trabalho,
Isto porque,
(…)
181º
Conclui-se assim que os protocolos não têm eficácia normativa, já que não foram publicados.
182º
Pelo que se requer que seja determinada a nulidade dos mesmos por não cumprirem as obrigações legais inerentes á negociação colectiva.
Sem prescindir,
183º
Contudo, mesmo que se entenda que os protocolos, apesar de não terem eficácia normativa, aplicam-se às partes, sempre se dirá que não podem ser aplicados aos AA.
Senão vejamos,
184º
Como já foi dito, aquando da assinatura do contrato de trabalho, desconheciam – e desconhecem ainda, os AA. o conteúdo dos referidos protocolos.
202º
Assim, claro resulta que não estavam os AA. devidamente esclarecidos quando assinaram o contrato de trabalho com a 1ª R.,
203º
Uma vez que, como já foi dito, desconhecem os AA. o teor dos protocolos referidos pela 1ª R., nem nunca os trabalhadores participaram das negociações do mesmo.
204º
Aliás, resulta do próprio contrato de trabalho que os mesmos não estavam publicados, pelo que, legitimamente acreditaram os AA. que não era possível aplicar-lhes protocolos ainda não publicados.
205º
Assim, claro resulta que existiu, na formação contratual, vício da vontade, na modalidade de erro, previsto no artigo 251º do C.C..
Senão vejamos,
(…)
212º
Facilmente se conclui que, relativamente ao IRCT aplicável aos contratos de trabalho dos AA. existiu o erro previsto no artigo 251º do C.C..
(…)
217º
A cláusula contratual que refere os protocolos nos contratos de trabalho dos AA. é anulável, não podendo os protocolos serem aplicados aos AA, o que desde já se invoca.
218º
Tendo como consequência a aplicação exclusiva do AE D….
Acresce que,
219º
Fundamenta a 1ª R. que tais protocolos foram necessários para criar novas categorias profissionais fruto da sua actividade secundária.
220º
Ora, muito estranham os AA. a existência dessa necessidade, uma vez que a 1ª R. apenas tem uma actividade – tendo apenas um CAE – que é o handling, inexistindo completamente uma actividade secundária.
221º
Assim, claro resulta, que não existiu verdadeiramente necessidade de criar novas categorias, uma vez que a AE D… que a 1ª R., unilateralmente, comprometeu-se a aplicar, contém as reais categorias existentes no único serviço prestado pela 1ª R. – o handling.
222º
Sendo esse argumento totalmente falso.
(…)
225º
Tendo como consequência a anulabilidade daquela cláusula contratual dos contratos de trabalho dos AA. e a aplicação exclusiva do AE D…, com as legais consequências peticionadas pelos AA. nos itens 165º a 169º relativamente às categorias.”

3. E, em tal ação, os aí AA., incluindo a ora Requerente, formularam os seguintes pedidos:
“Nestes termos, e nos melhores de direito, que V. Exa. doutamente suprirá, requerem os AA. que:
a) Reconheçam a 1ª e 2ª RR. que pertencem ao grupo D…, e que juntamente com a 3ª R. formam sociedades coligadas em relação de domínio total, em que é a empresa mãe a D…, e fruto da privatização, atualmente a L…, reconhecendo-se a responsabilidade solidária das RR. perante os AA. relativamente aos créditos e obrigações decorrentes dos contratos de trabalho;
b) Seja declarada a nulidade dos termos apostos nos contratos, condenando-se as RR. a reconhecer a efetividade e antiguidade dos AA. desde a celebração do 1º contrato de trabalho com a empresa de trabalho temporário, nas datas especificadas individualmente no item 49º deste articulado;
c) Serem a 1ª a 3ª RR. condenadas a reconhecer que os AA. são trabalhadores da empresa D…, desde o início da prestação laboral, por se verificarem relativamente à 2ª R. os requisitos de laboralidade, estando os AA. juridicamente subordinados aquela;
d) E por mera cautela de raciocínio, subsidiariamente, reconhecer-se a situação de pluralidades de empregadores entre a 1ª e 2ª RR. – e atualmente também com a 3ª R, e a violação dos requisitos legais para existência de contrato naquele regime, e em consequência serem os AA. enquadrados na empresa D… por opção prevista no art.º 101 n.º 5 do CT.;
e) Condenar a 1ª a 3ª RR. a reconhecer a aplicabilidade do AE D… aos trabalhadores, como consequência de serem reconhecidos como trabalhadores D…;
f) Declarar nulos os protocolos celebrados pelos sindicatos por não estarem depositados e publicados;
ou
g) Subsidiariamente, declarar os mesmos não aplicáveis aos trabalhadores por se verificar vício de forma – no caso, erro, na celebração do contrato individual de trabalho.
h) Reconhecer-se como categoria dos AA. TIRP, por aplicação do AE D…, condenando solidariamente a 1ª a 3ª RR. pelo pagamento das diferenças salariais e subsídios referentes aos anos das prestações de serviço de cada A., a liquidar e reclamar em acção de liquidação posterior .”

4. Com o requerimento inicial (do procedimento cautelar) a Requerente juntou o documento de fls. 19/20, denominado “Acordo de Comissão de Serviço”, em que nele figuram como 1ª outorgante, C…, SA e, como 2ª outorgante, a Requerente, datado de 15.01.2009 e do qual consta o seguinte:
“As partes acima identificadas acordam entre si, nesta data, o seguinte:
As funções de Supervisor de Departamento de Assistência a Passageiros, na Direcção de Unidade de Handling do …, serão exercidas pelo 2º Contratante, em regime de Comissão de Serviço, com produção de efeitos salariais a 16/06/2010, com o seguinte estatuto remuneratório:
(…)
Ocorrendo a cessação da Comissão de Serviço, ambas as partes aceitam desde já que a integração do 2º Contratante seja efectuada para a categoria base de Assistente a ….
a) Caso a presente Comissão de serviço seja denunciada por uma das partes, o 2º contratante regressará, salvaguardando as evoluções previstas no AE, à Fase da sua categoria profissional e respectivo nível salarial, em que se encontrava, aquando da assinatura desta.
À data da cessação da Comissão de Serviço, a 1ª Contratante atribuirá ao TRABALHADOR o nível de qualificação mencionado no respectivo Contrato de Trabalho, do Acordo de Empresa em vigor na C… – Acordo de Empresa da D…, SA, assinado (…) com o SQAC, I…, SINDOPA (…), publicado (…) no BTE nº 29 de 08.08.02, bem como pelas alterações introduzidas em (…) com o (…), em 21/03/03 o Protocolo com o I…, (…), em 25/01/2008 o Protocolo com o I…, (…), em 30/06/2008 com o I…, (…), em 03/08/09 com o (…) I…, (…), estas catorze últimas alterações já no âmbito da C…, SA, e enquanto não exista regulamentação específica para esta empresa, alterações essas que se encontram a aguardar a sua publicação oficial.”.
***
III. Do Direito

1. Nos termos do disposto nos arts 635º, nº 4, e 639º, nº 1, do CPC aprovado pela Lei 41/2013, de 26.06, aplicável ex vi do art. 1º nº 2 al. a) do CPT (redação do DL 295/2009), as conclusões formuladas pelo recorrente delimitam o objeto do recurso, não sendo lícito ao tribunal ad quem conhecer de matérias nelas não incluídas, salvo as de conhecimento oficioso.
Assim, a única questão a decidir consiste em saber se o presente procedimento cautelar não deveria ter sido indeferido liminarmente.

2. Na decisão recorrida concluiu-se no sentido da inexistência da necessária relação de instrumentalidade ou dependência entre o procedimento cautelar e a ação principal (em relação à qual aquele foi intentado como incidente), o que determina a não verificação dos requisitos legais previstos no art. 364º, nº 3, do CPC/2013. E, daí, o procedimento cautelar haver sido indeferido liminarmente.
De tal decisão discorda a Recorrente pelas razões invocadas no recurso, mormente por, em síntese: haver uma relação de dependência entre a providência cautelar e a ação principal, já que, pese embora esta seja mais abrangente, ambas versam sobre a nulidade do contrato de trabalho temporário; apesar de, na ação principal, não ter sido requerida a apreciação da validade da comissão de serviço, esta ser materialmente inválida (por as funções da recorrente não justificarem o recurso à comissão de serviço), o que poderá ser decidido pelo Mmº Juiz ao abrigo do princípio extra vel ultra petitum; não é concebível que o procedimento seja intentado como preliminar de uma outra ação principal, sob pena de litispendência desta e contrariando os princípios da economia e celeridade processuais.

3. Na decisão recorrida referiu-se o seguinte:
“Segundo a formulação do Código de Processo Civil de 1939, as providências cautelares estavam inseridas na categoria geral de ações, sendo integradas na espécie de ações conservatórias, cujo fim era o de "acautelar um prejuízo que se receia" (cfr. art. 4º, al. c) do citado preceito legal).
Após a reforma do Código de Processo Civil operada pelo Dec. Lei n.º 44 129, de 28 de Dezembro de 1961, este tipo de ações foi abolido e as providências cautelares passaram a ser consideradas simples instrumentos jurídicos destinados a acautelar o efeito útil das ações de que dependem (arts. 2º, parte final e 384º, n.º 1 do Código de Processo Civil na redação anterior à entrada em vigor do Dec. Lei n.º 329-A/95, de 12/12).
Dispõe o atual art. 2º, n.º 2 do Código de Processo Civil (aprovado pela Lei n.º 41/2013, de 26/06 - diploma a que se reportarão todas as referências legislativas adiante citadas, salvo menção em contrário) que “a todo o direito, exceto quando a lei determine o contrário, corresponde a ação adequada a fazê-lo reconhecer em juízo (...), bem como os procedimentos necessários para acautelar o efeito útil da ação”.
As providências cautelares têm a sua justificação naquele princípio do nosso sistema processual civil segundo o qual a demora de um processo não deve prejudicar a parte que tem razão[2] ou naquela consideração de que "o processo deve dar ao Autor, quando vencedor, a tutela que ele receberia se a decisão fosse proferida no preciso momento da instauração da lide" [3]
As providências cautelares são o tipo de medidas que são requeridas e decretadas, tendo em vista acautelar o efeito útil da ação, mediante a composição provisória dos interesses conflituantes, mantendo ou restaurando a situação de facto necessária à eventual realização efetiva do direito. “Tais medidas visam precisamente impedir que, durante a pendência de qualquer ação declarativa (...), que a situação de facto se altere de modo a que a sentença nela proferida, sendo favorável, perca toda a sua eficácia ou parte dela. Pretende-se deste modo combater o pericullum in mora (o prejuízo da demora inevitável do processo) a fim de que a sentença se não torne uma decisão puramente platónica”[4]
Segundo o explícito ensinamento de Alberto dos Reis[5], que apesar do tempo entretanto já decorrido se mantém plenamente atual, «o traço típico do processo cautelar está, por um lado, na espécie de perigo que ele se propõe conjurar ou na modalidade dano que pretende evitar e, por outro, no meio de que se serve para conseguir o resultado a que visa».
«0 perigo especial que o processo cautelar remove é este: pericullum in mora, isto é, o perigo resultante da demora a que está sujeito um outro processo (o processo principal) ou, por outras palavras, o perigo derivado do caminho, mais ou menos longo, que o processo principal tem de percorrer até à decisão definitiva, para se dar satisfação à necessidade impreterível de justiça, à necessidade de que o julgamento final ofereça garantias de ponderação e acerto».
«Uma vez que o processo cautelar nasce para ser posto ao serviço dum processo principal, a fim de dar ensejo a que este processo siga o seu curso normal sem o risco da decisão final chegar tarde e ser, por isso, ineficaz, vê-se claramente que a função do processo cautelar é nitidamente instrumental; o processo cautelar é um instrumento apto a assegurar o pleno rendimento do processo definitivo ou principal. Não satisfaz, por isso mesmo, o interesse da justiça; não resolve definitivamente o litígio; limita-se a preparar o terreno, a tomar precauções para que o processo principal possa realizar completamente o seu fim».
No preâmbulo do Dec. Lei n.º 329-A/95, de 12/12, refere-se que com a última revisão do Código de Processo Civil foram extintas as providências cautelares não especificadas e que, em sua substituição, se instituiu um verdadeiro processo cautelar comum, “comportando a regulamentação dos aspectos comuns a toda a justiça cautelar.
Institui-se, por esta via, uma verdadeira ação cautelar geral para a tutela provisória de quaisquer situações não especialmente previstas e disciplinadas, comportando o decretamento das providências conservatórias ou antecipatórias adequadas a remover o pericullum in mora concretamente verificado e a assegurar a efectividade do direito ameaçado, que tanto pode ser um direito já efetivamente existente, como uma situação jurídica emergente de sentença constitutiva, porventura ainda não proferida”.
Quer isto dizer que, de acordo com a nova sistematização do Código de Processo Civil, foi criado um verdadeiro procedimento cautelar comum, de âmbito residual, quer no plano das regras adjetivas, quer no plano das providências que nele se podem integrar [6].
Com a reforma processual laboral, operada através do Dec. Lei n.º 489/99, de 9/11, que aprovou o anterior Código de Processo do Trabalho, pretendeu-se harmonizar o processo laboral com as alterações introduzidas na legislação processual civil através do citado Dec. Lei n.º 329-A/95, de 12/12, e do Dec. Lei n.º 180/96, de 25/09[7].
O atual Código de Processo do Trabalho, aprovado pelo Dec. Lei n.º 295/2009, de 13/10, embora mantendo uma remissão genérica para a legislação processual civil, consagra, com as especialidades constantes do art. 32º, o procedimento cautelar comum.
O procedimento cautelar comum, previsto nos arts. 32º e 33º do Código de Processo do Trabalho, surge, assim, como um procedimento base ou modelar, aplicável sempre que à pretensão não caiba um procedimento cautelar especificado.
Assim, ao procedimento cautelar comum laboral aplica-se, em primeiro lugar, o disposto no art. 32º do CPT, que prescreve as especialidades e, subsidiariamente, as normas processuais civis para o procedimento cautelar comum, ou seja, os arts. 362º a 376º do Código de Processo Civil.
Dispõe o n.º 1 do artigo 362º que “sempre que alguém mostre fundado receio de que outrem cause lesão grave e dificilmente reparável ao seu direito, pode requerer a providência conservatória ou antecipatória, concretamente adequada a assegurar a efetividade do direito ameaçado”.
O interesse do requerente pode fundar-se num direito já existente ou em direito emergente de decisão a proferir em ação constitutiva, já proposta ou a propor” – n.º 2 do citado preceito legal.
Não são aplicáveis as providências referidas no n.º 1 quando se pretenda acautelar o risco de lesão especialmente prevenido por alguma das providências tipificadas na secção seguinte”. – n.º 3 do mesmo preceito legal.
A providência é decretada desde que haja probabilidade séria da existência do direito e se mostre suficientemente fundado o receio da sua lesão”. – n.º 1 do art. 368º.
A providência pode, não obstante, ser recusada pelo tribunal, quando o prejuízo dela resultante para o requerido exceda consideravelmente o dano que com ela o requerente pretende evitar” – n.º 2 do citado preceito legal.
Daqui resulta que são requisitos (de fundo e de forma) necessários ao decretamento desta providência:
§ 1. - Probabilidade séria da existência de um direito (aparência do direito - «fumus bonis juris»).
§ 2. - Fundado receio de que a demora natural na solução do litígio lhe causará uma lesão grave e dificilmente reparável (ao direito que se pretende fazer valer em ação pendente ou a instaurar) - «pericullum in mora».
§ 3. - Desde que o prejuízo resultante de um tal recurso não exceda consideravelmente o dano que, através da providência, se pretenda evitar.
§ 4. - E não cabimento da possibilidade de recorrer a qualquer outro tipo de procedimento cautelar nominado.
Por sua vez, prescreve o art. 364.º, sob a epígrafe “Relação entre o procedimento cautelar e a ação principal”, que:
«1 - Exceto se for decretada a inversão do contencioso, o procedimento cautelar é dependência de uma causa que tenha por fundamento o direito acautelado e pode ser instaurado como preliminar ou como incidente de ação declarativa ou executiva.
2 - Requerido antes de proposta a ação, é o procedimento apensado aos autos desta, logo que a ação seja instaurada e se a ação vier a correr noutro tribunal, para aí é remetido o apenso, ficando o juiz da ação com exclusiva competência para os termos subsequentes à remessa.
3 - Requerido no decurso da ação, deve o procedimento ser instaurado no tribunal onde esta corre e processado por apenso, a não ser que a ação esteja pendente de recurso; neste caso a apensação só se faz quando o procedimento estiver findo ou quando os autos da ação principal baixem à 1.ª instância.
(…)».
Resulta deste normativo que as providências cautelares estão necessariamente dependentes de uma ação já pendente ou a instaurar posteriormente, acautelando ou antecipando provisoriamente os efeitos da providência definitiva, na pressuposição de que venha a ser favorável ao requerente a decisão a proferir no processo principal[8].
Entre a providência cautelar e a ação principal deve existir uma relação que permita afirmar que o direito acautelado será provavelmente reconhecido na ação definitiva[9].
Ou seja, através desta ação principal deve procurar-se tutela para o mesmo direito que se pretendeu preservar por via cautelar.
Como refere António Abrantes Geraldes[10], o objeto da providência há-de, por conseguinte, ser conjugado com o objeto da causa principal, embora tal dependência não imponha perfeita identidade A identidade entre o direito acautelado e o que se pretende fazer valer no processo definitivo impõe, pelo menos, que o facto que serve de fundamento àquele integre a causa de pedir da ação principal.
Esta identidade objetiva, no entanto, não tem de ser total, sendo admissível que o objeto da ação principal seja mais amplo que o do procedimento cautelar, abrangendo mesmo outros direitos não salvaguardados pela providência cautelar não especificada.
Além disso, a dependência que tem de existir entre procedimento cautelar e ação principal implica, necessariamente, que apenas possam ser protegidos, por via cautelar, aqueles direitos suscetíveis de serem tutelados através da ação principal[11].
Analisando a ação principal – de que este procedimento cautelar é alegadamente dependente ?! - instaurada pela ora requerente e por outros Autores contra C…, S.A., D…, S.A., e I…, pedem aqueles:
a) O reconhecimento de que a 1ª e 2ª RR. pertencem ao grupo D…, e que juntamente com a 3ª R. formam sociedades coligadas em relação de domínio total, em que é a empresa mãe a D…, e fruto da privatização, atualmente a L…, reconhecendo-se a responsabilidade solidária das RR. perante os AA. relativamente aos créditos e obrigações decorrentes dos contratos de trabalho;
b) A declaração de nulidade dos termos apostos nos contratos, condenando-se as RR. a reconhecer a efetividade e antiguidade dos AA. desde a celebração do 1º contrato de trabalho com a empresa de trabalho temporário, nas datas especificadas individualmente no item 49º da p.i.;
c) A condenação da 1ª a 3ª RR. a reconhecer que os AA. são trabalhadores da empresa D…, desde o início da prestação laboral, por se verificarem relativamente à 2ª R. os requisitos de laboralidade, estando os AA. juridicamente subordinados aquela;
d) E por mera cautela de raciocínio, subsidiariamente, o reconhecimento da situação de pluralidades de empregadores entre a 1ª e 2ª RR. – e atualmente também com a 3ª R, e a violação dos requisitos legais para existência de contrato naquele regime, e em consequência serem os AA. enquadrados na empresa D… por opção prevista no art.º 101 n.º 5 do CT.;
e) A condenação da 1ª a 3ª RR. a reconhecer a aplicabilidade do AE D… aos trabalhadores, como consequência de serem reconhecidos como trabalhadores D…;
f) A declaração de nulidade dos protocolos celebrados pelos sindicatos por não estarem depositados e publicados;
ou
g) Subsidiariamente, a declaração de que os mesmos não são aplicáveis aos trabalhadores por se verificar vício de forma – no caso, erro, na celebração do contrato individual de trabalho.
h) O reconhecimento como categoria dos AA. TIRP, por aplicação do AE D…, condenando solidariamente a 1ª a 3ª RR. pelo pagamento das diferenças salariais e subsídios referentes aos anos das prestações de serviço de cada A., a liquidar e reclamar em ação de liquidação posterior .
E, como causa de pedir para estribar tais pedidos, invocam os Autores que:
- Os termos apostos nos contratos de trabalho a termo celebrados ente os AA. e a 1º R. são nulos por a remição genérica para a celebração de novos contratos entre a D… e C… não permitir aferir da sua validade, não provando a entidade patronal a necessidade excecional e transitória de tal contratação.
- Apesar de os AA. terem formalmente celebrado um contrato de trabalho com a 1ª R., a verdade é que todo o trabalho é prestado à 2ª R. – entidade patronal real -, pelo que são os AA. verdadeiramente funcionários da D…, S.A. –2ª R..
- Caso não se entenda que apenas existe subordinação jurídica para com a 2ª R. – D…, existindo também para a 1ª R., estaremos perante uma pluralidade de empregadores.
- Não cumpriram a 1ª e 2ª RR. os requisitos legalmente impostos para a contratação no caso de pluralidade de empregadores, pelo que, como dispõe o art. 101º n.º 5 do C.T., têm os AA. o direito de optar pela entidade patronal à qual ficam vinculados, optando pela 2º R. – D…, S.A..
- Nessa medida, deverão os AA. ser reconduzidos à categoria profissional correspondente às funções que exercem, que, no AE aplicável aos trabalhadores D…, se reporta à categoria de TIRP – Técnico de Informação e Relações Públicas.
- Em consequência, devem ser colocados no nível salarial correspondente a tal categoria, caso contrário violar-se-ia o princípio constitucional de trabalho igual, salário igual.
- Caso não se entenda que os AA. são trabalhadores da 2ª RR., os protocolos referidos nos contratos de trabalho são nulos por não cumprirem as obrigações legais inerentes à negociação coletiva.
- Os AA. não tiveram conhecimento do teor dos protocolos que são referidos nos seus contratos de trabalho, pelo que não estavam devidamente esclarecidos quando assinaram o contrato de trabalho com a 1ª R., existindo, na formação contratual, vício da vontade, na modalidade de erro, previsto no artigo 251º do C.C..
Ora, conforme se evidencia da enunciação que antecede, o âmbito do presente procedimento cautelar não coincide – sequer parcialmente - com o objeto da ação principal a que a mesma foi apensada [quer na vertente de causa de pedir, quer dos efeitos jurídicos pretendidos (pedidos)], pois que a ação definitiva n.º 393/14.2TTMTS não tem por fundamento o(s) direito(s) que a requerente pretende acautelar com o decretamento da providência cautelar.
Dito de outro modo, ainda que a presente providência cautelar viesse a ser decretada, a requerente não lograria obter na ação n.º 393/14.2TTMTS decisão final que tutelasse a situação jurídica que através daquela pretende acautelar. Veja-se, aliás, que na ação n.º 393/14.2TTMTS não está sequer em discussão a validade/nulidade do contrato de comissão de serviço invocado neste procedimento cautelar (e que lhe serve de fundamento ou pressuposto). Por outro lado, na referida ação a requerente também não requereu a condenação das Rés no reconhecimento da sua categoria profissional como de supervisora, mas sim a sua recondução à categoria profissional correspondente às funções que exerce, que diz reportar-se à categoria de TIRP – Técnico de Informação e Relações Públicas, o que é algo distinto.
Ou seja, o direito que a requerente pretende ver acautelado através deste procedimento cautelar é estranho e alheio ao âmbito de discussão da ação n.º 393/14.2TTMTS, pelo que aquele jamais poderá vir a ser reconhecido (a título definitivo) nesta ação.
O que equivale a dizer que inexiste verificada a referida relação de instrumentalidade ou de dependência entre este procedimento cautelar e a ação à qual foi apensada pela requerente (n.º 393/14.2TTMTS), o que nos leva a concluir pela inverificação dos requisitos legais estabelecidos no n.º 3 do art. 364º.
Nesta conformidade, impõe-se a rejeição do presente procedimento cautelar, uma vez que a providência cautelar requerida não é instrumental dos direitos substantivos discutidos na ação n.º 393/14.2TTMTS.”.

4. Estamos integralmente de acordo com o referido na decisão recorrida, que faz correta aplicação do direito, apenas cabendo tecer algumas considerações adicionais tendo, designadamente, em conta a argumentação aduzida pela Recorrente que, diga-se desde já, é improcedente.
Como é sabido, o pedido e a causa de pedir delimitam o objeto da ação.
O pedido é o meio de tutela jurisdicional pretendido pelo A. e a causa de pedir é o facto jurídico concreto (simples ou complexo) que serve de fundamento ao efeito jurídico pretendido.
Para a indispensável relação de instrumentalidade ou de dependência entre a ação principal e o procedimento cautelar deduzido como incidente daquela não é necessário, como também se diz na decisão recorrida, uma absoluta identidade ou uma exata coincidência entre o objeto de ambos os processos. É todavia necessário que o direito que se pretende acautelar no procedimento seja também acautelado na ação principal ou, dito de outro modo, é necessário que o direito esteja contido no objeto da ação principal de tal sorte que nesta também encontre a sua sustentação e fundamento.
Ora, no caso, basta a leitura comparativa do que consta do requerimento inicial do procedimento cautelar e da petição inicial da ação principal para se concluir que não só o objeto de ambos é totalmente distinto, como a pretensão cautelar não encontra suporte na ação principal que, mesmo que fosse julgada procedente, não conduziria, muito menos necessariamente, à procedência do direito que se pretende acautelar na providência.
Para além dos pedidos serem diferentes, também o são a causa de pedir e o direito acautelado em ambas.
No procedimento cautelar pretende-se que seja decretada a suspensão da decisão proferida pela empregadora de fazer cessar a comissão de serviço e que seja a Requente mantida nas funções de supervisora, pedido este que tutela o direito da trabalhadora ao exercício da atividade contratada (art. 118º, nº 1, do CT/2009) e o de não ver baixar a categoria profissional (art. 129º, nº 1, al. e) do CT/2009) e que, no caso, tem como causa de pedir a factualidade de onde decorra, designadamente: o exercício de funções de supervisão, o direito à correspondente categoria profissional, a alteração das funções e da categoria, e sua ilegalidade, e a invalidade do acordo relativo à comissão de serviço.
Ora, compulsada a petição inicial da ação principal, facilmente se verifica que ela não visa a tutela do direito que se pretende acautelar no procedimento, sendo o seu objeto – quer considerando os vários pedidos formulados, quer a causa de pedir – totalmente distinto. O que com ela se visa é a garantia de outros alegados direitos que não os que estão em causa no procedimento cautelar, não estando o pedido, nem a causa de pedir constantes do procedimento contidos nos pedidos e respetivas causas de pedir constantes da ação principal, nem a procedência desta determinaria a procedência do procedimento cautelar.
Diz a Recorrente que ambos os processos versam sobre a nulidade do contrato de trabalho temporário, questão esta na qual sustenta a existência da relação de dependência entre a providência cautelar e a ação principal. Tal argumento é, todavia, insuscetível de sustentar a alteração da decisão recorrida.
Com efeito:
Esse argumento é, na verdade, um “ponto comum” entre as duas ações (principal e cautelar). Mas é o único e é, manifestamente, insuficiente. Ainda que na ação principal seja declarada a nulidade do contrato de trabalho temporário e a Requerente seja considerada como trabalhadora das Requeridas desde a data da celebração de tal contrato, o que se admite como mera hipótese de raciocínio, tal não leva, nem determina, necessariamente e sem mais, a procedência da pretensão formulada no procedimento cautelar, nem o eventual deferimento desta encontraria sustentação nas pretensões, e respetivas causas de pedir, formuladas na ação principal. A eventual invalidade do contrato de trabalho temporário é apenas um dos pressupostos de que poderá depender a procedência do procedimento, mas não o único, pois que, como referido, nele não se esgota a sua causa de pedir. E, na ação principal, nada se alega (quiçá porque, precisamente, isso não constitui o objeto dessa ação) quanto, designadamente, ao direito à categoria de supervisora e ao exercício das correspondentes funções de supervisão, à alteração das funções e à baixa da categoria, ao acordo relativo à comissão de serviço e à sua invalidade. Aliás, e quanto à categoria, na petição inicial (da ação principal) apenas se faz uma referência genérica a trabalhadores que “são assistentes” e a “seis assistentes com função de supervisão” (cfr. art. 57º), nada se concretizando sequer no que à aí A., ora Requerente, respeita; nem se faz, tão pouco, qualquer alusão ao “contrato de comissão de serviço” e à sua invalidade.
Refira-se que a questão da categoria profissional suscitada no procedimento cautelar nada tem a ver com o pedido formulado na ação principal que tem por objeto o reconhecimento da categoria profissional aos aí AA. de Técnico de Informação e Relações Públicas (“TIRP”), assentando a causa de pedir deste pedido no pretendido enquadramento das funções de assistência a passageiros no âmbito do serviço G… (sejam elas, ou não, de supervisão) no AE aplicável à D… e que, pelas razões invocadas na petição inicial, os aí AA. entendem dever-lhes ser aplicável integralmente. Nem na ação principal se invoca e reclama o reconhecimento do direito à categoria de supervisora e a reposição nas funções correspondentes.
Alega ainda a Recorrente que, pese embora na ação principal não tenha sido requerida a apreciação da validade da comissão de serviço, esta não é materialmente válida (por, em síntese, as funções da recorrente não a justificarem), o que poderá ser decidido pelo Mmº Juiz ao abrigo do princípio da condenação extra vel ultra petitum.
O procedimento cautelar está dependente de uma causa que tenha por objeto o direito acautelado e, quando essa causa – principal - já exista, será intentado como incidente da mesma (art. 364º, nº 1, do CPC/2013).
A relação de instrumentalidade ou de dependência entre ambas as ações deverá verificar-se ou ser aferida em função do que delas consta efetivamente e não em função do que, eventual ou “virtualmente”, delas poderia ou poderá, futuramente, vir (ou não) a ocorrer. Ambos os processos têm tramitação e andamento processuais diferentes, sendo o procedimento cautelar mais célere do que a ação principal, não podendo, designadamente e quando como incidente, vir a ser deferida uma providência, que não encontra acolhimento no âmbito da ação principal já proposta, com o fundamento de que o juiz poderá vir, futuramente, a conhecer oficiosamente da questão. Trata-se, esse eventual conhecimento, de um facto futuro e incerto que não poderá justificar a admissibilidade processual do procedimento como incidente da ação principal.
Por outro lado, o principio da condenação extra vel ultra petitum tem acolhimento no art. 74º do CPT nos termos do qual “[o] juiz deve condenar em quantidade superior ao pedido ou em objecto diverso dele quando isso resulte da aplicação à matéria provada, ou aos factos de que possa servir-se nos termos do artigo 514º do Código de Processo Civil, de preceitos inderrogáveis de leis ou instrumento de regulamentação colectiva de trabalho.”
Tal preceito confere ao juiz uma maior amplitude nos seus poderes de decisão (que não fica espartilhado pelos limites impostos pelo art. 609º, nº 1, do CPC/2013). Essa possibilidade coloca-se, todavia, em sede de interpretação e aplicação do direito à matéria de facto que haja ficado provada ou de que o juiz possa conhecer nos termos do art. 412º do atual CPC (art. 514º do CPC revogado). No caso, não só o direito que se pretende acautelar no procedimento cautelar não foi invocado na petição inicial da ação principal, como nesta não foi alegada a matéria de facto que consubstancia a causa de pedir da providência (nem foi invocado pela Recorrente que o haja sido posteriormente), para além de que não se nos afigura que o preceito, ou o poder inquisitório do juiz, lhe consinta a introdução, de motu próprio, na ação principal de um (outro) litígio com objeto (pedido e causa de pedir) totalmente distintos como, no caso, ocorre com o pedido formulado no procedimento cautelar.
Alega ainda a Recorrente que não é concebível que o procedimento cautelar corra como dependência de outra ação que viesse a ser proposta, sob pena de litispendência entre ações principais (essa outra ação e a ação principal ora em causa), mais invocando os princípios da economia e celeridade processuais.
Como decorre do disposto no art. 580º, nº 1, do CPC/2013, o conceito de litispendência pressupõe a repetição de uma causa, repetição que, como é sabido, ocorre quando exista identidade de partes, de pedido e de causa de pedir.
No caso e como decorre do que já se deixou dito, não se verifica identidade de pedidos, nem de causas de pedir. Resulta de forma evidente da petição inicial da ação principal e do requerimento inicial do procedimento cautelar que não existe identidade nem de pedidos, nem de causas de pedir, pelo que não se verificaria qualquer situação de repetição de ações principais caso, porventura, fosse proposta nova ação (principal) visando o reconhecimento do direito invocado no procedimento cautelar.
Por outro lado, e quanto aos mencionados princípios da economia e celeridade processuais se são, como são, relevantes, existem normas e regras processuais que não podem ser preteridas em nome dos referidos princípios. Para além de que, tendo o procedimento cautelar natureza provisória e sendo, como é, dependência de uma ação principal, de tal sorte que será esta que deverá julgar, de modo definitivo, a questão em litígio, não poderá o procedimento cautelar, por muito relevantes que sejam tais princípios, correr como incidente de uma ação que não tenha por objeto o direito que é acautelado no procedimento.
Assim sendo, e pelo que ficou referido, improcedem as conclusões do recurso, sendo de confirmar a decisão recorrida.
***
IV. Decisão
Em face do exposto, acorda-se em negar provimento ao recurso, confirmando-se a decisão recorrida.
Custas pela Recorrente.

Porto, 07.04.2016
Paula Leal de Carvalho
Rui Penha
Maria José Costa Pinto
____
[1] Transcrever-se-á o que se poderá mostrar útil à compreensão do objeto da ação principal e omitindo-se o que não tenha qualquer relevância para a apreciação do presente recurso, designadamente a matéria relativa à legitimidade passiva, às condições específicas relativas a cada um dos AA, que não a ora Requerente, e matéria e argumentação que sustentam as conclusões e questões suscitadas na petição inicial que se transcreveram.
[2] Cfr. Anselmo de Castro, in Direito Processual Civil Declaratório, vol. 1, pág. 130 e segs.
[3] Cfr. Autor e obra citada, pág. 106.
[4] Cfr. Antunes Varela e Outros, in Manual de Processo Civil, 2ª ed., pág. 23 e ss.
[5] Cfr. Boletim do Ministério da Justiça, n.º 3, págs. 42 e 45.
[6] 5 Cfr. António Abrantes Geraldes, in Temas da Reforma do Processo Civil, Procedimento Cautelar Comum, Vol. III, pág. 56.
[7] Cfr. Maria Adelaide Domingos, in Estudo do Instituto de Direito do Trabalho, Vol. V, in Procedimentos Cautelares Laborais, pág. 37 e segs.; para mais desenvolvimentos, Paulo Sousa Pinheiro, in O Procedimento Cautelar Comum no Direito Processual do Trabalho, 2ª ed..
[8] Cfr. António Abrantes Geraldes, in Temas da Reforma do Processo Civil, Procedimento Cautelar Comum, Vol. III, pág. 120.
[9] Cfr. Joel Timóteo, Prontuário de Formulários e Trâmites – Vol. II – Procedimentos e Medidas Cautelares (com incidentes conexos), novembro - 2002, pp. 16.
[10] Cfr. in obra citada, pp. 120 e 121.
[11] Cfr. Rita Lynce de Faria, in A Função Instrumental da Tutela Cautelar Não especificada, pág. 98.