Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
2398/18.5T8VFR.P1
Nº Convencional: JTRP000
Relator: DOMINGOS MORAIS
Descritores: IMPUGNAÇÃO DA MATÉRIA DE FACTO
REJEIÇÃO
SUBSÍDIO DE ALIMENTAÇÃO
AMPLIAÇÃO DO RECURSO
Nº do Documento: RP201911042398/18.5T8VFR.P1
Data do Acordão: 11/04/2019
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: PARCIALMENTE PROCEDENTE, ALTERADA A SENTENÇA
Indicações Eventuais: 4ª SECÇÃO (SOCIAL)
Área Temática: .
Sumário: I - Para que o Tribunal da Relação conheça da impugnação da matéria de facto deve o recorrente, nas conclusões da sua alegação, indicar os concretos pontos de facto incorrectamente julgados, bem como a decisão a proferir sobre aqueles concretos pontos de facto, conforme impõe o artigo 640.º, n.º 1, alíneas a) e c) do CPC.
II - O subsídio de alimentação, não tendo natureza retributiva, não é devido durante o período da suspensão de facto do contrato de trabalho, entre a data do despedimento e o trânsito da sentença que o declarou ilícito.
III – Para que o subsídio de alimentação possa ser considerado como dano patrimonial indemnizável, deve o trabalhador concretizar, na causa de pedir, os factos e/ou as circunstâncias em que ocorreu o facto ilícito que lhe deu causa.
IV - A ampliação do recurso, prevista no artigo 636.º do CPC, apenas tem lugar quando verificado o pressuposto da prevenção, isto é, a apreciação do objecto da ampliação no recurso principal.
Reclamações:
Decisão Texto Integral: Proc. n.º 2398/18.5T8VRF.P1
Origem: Comarca Aveiro-SMFeira-Juízo Trabalho J2.
Relator - Domingos Morais – Registo 835
Adjuntos – Paula Leal de Carvalho
Jerónimo Freitas

Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação do Porto:

IRelatório
1. – B… apresentou o formulário a que reportam os artigos 98.º-C e 98.º-D, do Código de Processo de Trabalho (CPT), na Comarca Porto-Matosinhos-Juízo Trabalho-J3.
C…, Ld.ª, frustrada a conciliação na audiência de partes, apresentou o articulado motivador do despedimento com justa causa, alegando, em resumo, que:
A autora celebrou com a ré um contrato de estágio, formalizado com o IEFP, com o nº …./RT/.., classificado no nível VI, que só foi formalizado atento o subsídio atribuído à Ré por aquele organismo, contrato esse que teve a duração de 6 meses, de 11.10.2016 a 10.04.2017, período não suficiente para validar se a empresa tinha capacidade financeira de suportar os custos com a autora.
A admissão da autora teve um outro motivo, que foi o comprometimento desta em promover o produto no exterior, alegando possuir conhecimentos suficientes de marketing adquiridos em anteriores empregos, o que não correspondeu às expectativas e a empresa começou a definhar e as margens de comercialização não eram suficientes para colmatar todos os custos da actividade.
Numa primeira abordagem, tentaram-se reduzir as despesas no que era possível, mas mesmo assim os resultados não foram satisfatórios. Estas tentativas tiveram a colaboração permanente da autora.
Acrescido a tudo isto, também se reduziram os clientes, o que significa quebra de receitas, sendo que a actividade principal é a venda de perfumes. A contabilidade já vinha alertando para algum desencontro entre créditos e débitos.
Por uma questão de boa gestão e normalização comercial, a ré não teve outra alternativa que não fosse despedir a autora, sendo que esta acompanhou todo o processo, participando em várias reuniões. Não subsiste, pois, a necessidade de manutenção do posto de trabalho da autora, com a categoria de técnica comercial, face à actual conjuntura de mercado, sobretudo no sector da perfumaria e similares e à necessidade de reorganização e racionalização do serviço de distribuição, para manter a competitividade.
Terminou, concluindo:
“a) Deve a presente acção ser considerada improcedente por não provada e a R. absolvida do pedido;
b) Ou ainda quando assim não se entenda, quanto ao que não se concede;
c) Que não causou qualquer dano patrimonial, antes e pelo contrário, dilatou no tempo aquilo que deveria ter já formalizado há mais tempo;
d) Ou quando assim não se entenda deve a ora R ser absolvida, tudo com as consequências legais.”.
2. - Notificada, a autora apresentou contestação/reconvenção, alegando, em resumo, que:
Após a realização do estágio, a autora e a ré assinaram um contrato de trabalho por tempo indeterminado, com início a 11 de abril de 2017.
Desde que a autora iniciou o estágio, a facturação da ré, sem IVA, subiu cerca de 120% e o lucro cerca de 100%; a facturação passou de €3.800 em média por mês, para €8.300 e o lucro de €2.200/mês para €4.400; no fim do estágio e início do contrato, abril de 2017, a facturação foi de cerca de €12.700, sem IVA, e o lucro de €6.400; quando a ré abordou, pela 1ª vez a autora, informando-a de que ponderava despedi-la, tinha facturado no mês de abril cerca de €20.600, sem IVA, e um lucro de €8.800, pelo que os lucros subiram significativamente; não ser verdade que o número de clientes tenha começado a reduzir.
A ré dedica-se à venda de produtos de estética, na área da manicure, directamente a esteticistas profissionais e realiza cursos de formação profissional também para profissionais;
Os alertas da contabilidade tinham a ver com o facto de o gerente da ré ter decidido que os serviços prestados no âmbito do projecto de uma marca de que é proprietário, que nada tem a ver com o objecto social da ré, seriam pagos com o dinheiro da ré, o que se verificou.
A ré gozava de boa saúde financeira, tendo decidido, em novembro de 2017, abrir uma nova loja, dedicada a pédicure.
Até ao mês de abril, o gerente da ré nunca lhe falou da hipótese de a despedir; sendo que o motivo do despedimento foi a pressão que a sócia e esposa do gerente fez nesse sentido.
Terminou, concluindo:
Neste termos e nos melhores de direito deve ser:
a) Declarada a Ilicitude do despedimento da Autora Consequentemente, condenada a Ré:
b) Na reintegração da Autora, ou, caso esta opte pela indemnização, no pagamento da mesma, a ser calculada de acordo com o limite máximo de 45 dias e com base da remuneração mensal de €1.583,89 a que corresponde o montante de €2.374,50;
c) No pagamento dos direitos indisponíveis supra identificados e melhor discriminados nas alíneas a) a f) do art.º 65.º, num montante global de €17.210,61;
d) Na realização dos descontos para a segurança social referentes aos prémios de desempenho de acordo com o valor mensal que era devido à Autora, e que corresponde no total a quantia de €11.346,51;
e) No pagamento das retribuições e de outros direitos implícitos à relação de trabalho que a Autora deixou de auferir desde o despedimento ilícito até ao transito em julgado da ação;
f) no pagamento de indemnização pelos danos não patrimoniais causados à Ré em valor nunca inferior a €2.000,00;
g) condenada no pagamento daqueles montantes acrescidos da taxa de juro legal em vigor, contados a partir da citação até efetivo e integral pagamento;
3. - No despacho saneador, a Mma Juiz admitiu a reconvenção deduzida pela autora e fixou o objecto do litígio.
4. – Realizada a audiência de discussão e julgamento, a Mma Juiz proferiu decisão:
“Decide-se julgar a presente acção parcialmente procedente por provada e, em consequência:
a)- declarar a ilicitude do despedimento de que B… foi alvo por parte de “C…,Ldª”;
b)- condenar a Ré a reintegrar a A. na empresa, sem prejuízo da sua categoria e antiguidade;
c)- condenar a Ré/entidade empregadora a pagar à A./trabalhadora as retribuições que deixou de auferir desde 31.05.2018 e até ao trânsito em julgado da decisão que declarou a ilicitude do despedimento, à razão mensal de €920,00 (novecentos e vinte euros), incluindo férias, subsídio de férias e subsídio de Natal, deduzidas do subsídio de desemprego atribuído à trabalhadora no período referido, cujo valor deve ser liquidado em execução de sentença, e que a entidade empregadora deverá entregar à segurança social;
d)- condenar a Ré a pagar à A. as férias e subsídio de férias vencidas em 01.01.2018, no valor de €1.840 (mil, oitocentos e quarenta euros);
e)- condenar a Ré a pagar à A. o pagamento dos prémios de desempenho, num total ilíquido de €10.764,04 (dez mil, setecentos e sessenta e quatro euros e quatro cêntimos), respeitante ao mês de abril de 2017: €638,24; mês de maio de 2017: €739,38; mês de junho de 2017: €609,77; mês de julho de 2017: €600,00; mês de agosto de 2017: €683,58; mês de setembro de 2017: €615,13; mês de outubro de 2017: €1.008,90; mês de novembro de 2017: €757,14; mês de dezembro de 2017: €544,56; Prémio 2017 – Cumprimento a 110% = 3 Médias de 10% Lucro Anual: (3x€688)=€2.064; mês de janeiro de 2018: €411,35; mês de março de 2018: €700,82; mês de abril de 2018: €727,52; mês de maio de 2018: €613,89; Prémio 2018 – Assumindo Média do ano de 2017: €688,00, devendo a Ré proceder aos descontos devidos para a S.Social.
f) - condenar a Ré no pagamento à A. da quantia respeitante ao subsídio de alimentação que deixou de receber em virtude do despedimento, à razão diária (dias úteis) de €4,52, desde a data do despedimento (31.05.2018 até ao trânsito em julgado da presente decisão.
g) - absolver a Ré do demais peticionado;
h)- às quantias supra acrescem juros de mora à taxa legal de 4%, desde a data de vencimento e até integral pagamento.
Custas a cargo do A. e Ré, na proporção do decaimento (artigo 527º, nºs 1 e 2, do CPC).
Fixo à ação o valor de €12.464,00 nos termos do artigo 98º-P, nº2, do CPT.”.
5. – A ré, inconformada, apresentou recurso de apelação, concluindo:
“1 – Vem o presente recurso interposto da sentença sobre os concretos meios probatórios que, impunham decisão diferente sobre os pontos da matéria de facto ora impugnados, pela R.
5 - Dando-lhe assim garantia da continuidade minimizando eventuais efeitos colaterais, económicos, psíquicos e sociais e sobrevivência `continuidade da empresa.
7 – De que, conforme se apurou pelos depoimentos, houve a existência do documento escrito do pagamento, do prémio convencionado no contrato de trabalho, da não obrigação legal do pagamento de subsídio de alimentação nem da obrigação das férias e dos subsídios de féria e de natal, por que encontrarem liquidados e provados junto aos autos. Se as questões suscitadas, do pedido formulado e da contestação vertida, dos depoimentos prestados e respectivas alegações foram convenientes interpretadas e tomadas em juízo de valoração sobre os mesmos princípios pelo Tribunal “a quo” ou eventualmente deu maior ênfase sobre determinados aspectos do que outros.
78 – Nomeadamente, pelas declarações das testemunhas algumas sobrevaloradas em prole de outras desvalorizadas.
80 - De que ao contrário, os mapas de férias (juntos aos autos) indicam o gozo de férias.
83 - Que a caducidade do contrato promovida pela Ré foi uma situação que se colocava sobretudo quanto à continuidade e sobrevivência da empresa.
- De que não aumentou ou contratou alguém para substituir a ora Autora.
84 – Antes, e pelo contrário, até se traduziu numa redução de custos (remuneração, férias e subsídios de férias e de natal e os correspondentes impostos), melhor execução, porquanto passou o sócio-gerente da R e os restantes trabalhadores a completar o serviço e porque não uma melhor distribuição de tarefas.
85 - Assim, considerando as circunstâncias atinentes ao caso, e, mormente, as que foram apuradas em sede de audiência e julgamento, defendemos e opinamos que a sentença proferida pelo Tribunal “a quo” não traduz, salvo a respeitada opinião, o que de efetivamente se apurou em sede própria e pelos juntos aos autos.
12 – De que sobre as remunerações, supra referidas, sempre foram pagas as correspondentes contribuições, não devendo qualquer tributo ao Estado ou à Social, referente à remuneração referenciada.
17 – Ou caso assim não se entenda, anulando-se a decisão do Tribunal “a quo”, repetindo-se o julgamento e reapreciando-se a matéria facto ora impugnada sem prejuízo da ponderação do art. 662.º n.º 2, alínea a) do CPC
18 – E, em consequência, ser a ora apelada R absolvida nos termos aplicáveis supra referidos, destas conclusões.
19 – Sem que, no entanto e sem conceder, em caso de a hipótese ser outra no entendimento desses respeitado Tribunal “ad quem”, em face das circunstâncias e tendo em atenção o disposto no art.º 391.º n.º 1 do CT, fixar-se em 15 dias a eventual indemnização de antiguidade.
20 – Dado o presente recurso de apelação também versar sobre matéria de direito, indicam-se, nos termos do art.º 639.º n.º 2 alínea a) do CPC, as normas jurídicas que se consideram violadas a saber: art. 607.º n.ºs 3 e 4, do CPC, (art 366.º n.º 4 do CT por força da alteração vigente art 366.º n.ºs 4 e 5 da Lei n.º 69/2013, 30 de agosto, (art.245.º n.º 3 do CT) a ora Autora apenas tem direito à proporcionalidade de férias e de subsídio de férias referente à antiguidade em articulação com o art 264 n.ºs 1 e 2 do CT., de que mais uma vez o tribunal “a quo”, também andou mal, e subsidio de alimentação de que não era devido, nos termos dos art. 258.º n.º 2 em articulação com o art 260.º n.º 2, ambos do CT não é retribuição.
- Se não é retribuição então é uma prestação dada ao trabalhador, em função do trabalho realizado e desde que seja superior a cinco de horas trabalho efectivo, por remissão ao art 154.º n.º 3 alínea b), do CT. Vejam-se os acórdãos do Tribunal da Relação do Porto n.º s 1351/11.4TTBRG-AP1, de 060/2014 e n.º 40/13.0TTBRG.P1, de 9/07/2014.
21 – Tais normas supra referidas deveriam ter sido interpretadas e aplicadas no sentido de serem tomadas em consideração, na fundamentação de sentença pelo Tribunal “a quo”, todos os meios probatórios, constantes do processo ou da gravação nele realizada, designadamente os depoimentos gravados pelas testemunhas, meios probatórios esses cujo exame crítico impunha decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida.
22 – Bem como interpretadas e aplicadas no sentido de ser relegada, para eventual liquidação de sentença, a quantificação certa das eventuais quantias e respectivos juros por acertos compensatórios finais.
Termos em que deverá ser julgada procedente a presente apelação e em consequência
a) - A sentença, desde já revogada na parte objecto de recurso ou, caso assim não se entenda, o que só por mera hipótese académica se admite,
b) - Anulando-se e repetindo-se a prova quantos aos alegados pontos concretos da matéria de facto considerados incorrectamente julgados, e assim fazendo-se a costumada JUSTIÇA!” –
[Transcrição ipsis verbis das - CONCLUSÕES – da recorrente que constam do Histórico do processo.]
6. – A autora contra-alegou, “com ampliação do âmbito do recurso, a requerimento da Recorrida-Autora, parte vencedora, nos fundamentos em que decaiu na causa (636.º do Código de Processo Civil, aplicável por força dos artigos 1.º, n.º 2 e art.º 87.º, n.º 1, ambos do Código de Processo de Trabalho)”, concluindo:
“1. A Autora e Recorrida nos presentes autos apresenta as suas contra-alegações, nos termos do artigo 81.º, n.º 2 do Código do Trabalho, com ampliação do âmbito do recurso, a requerimento da Recorrida-Autora, parte vencedora, nos fundamentos em que decaiu na causa (636.º do Código de Processo Civil, aplicável por força dos artigos 1.º, n.º 2 e art.º 87.º, n.º 1, ambos do Código de Processo de Trabalho);
2. A sentença recorrida não merece censura nos pontos apontados pela Recorrente, não acolhendo, pese embora doutos, os argumentos, aduzidos pela mesma nas suas alegações de apelação.
3. A Ré-Recorrente não põe em crise a sentença recorrida em concreto, designadamente indicando quais os factos que, no seu entender e face à prova produzida, foram mal julgados e/ou os concretos meios probatórios, constantes do processo, registo ou gravação que impunham decisão diversa, em obediência ao art.º 640.º do Código de Processo Civil (aplicável por força dos artigos 1.º, n.º 2 e art.º 87.º, n.º 1, ambos do Código de Processo de Trabalho), limitando-se a realizar meras indicações de conclusões suas acerca do que alegadamente quatro das testemunhas disseram em audiência de julgamento mas não realizando transcrições, totais ou parciais, dessas mesmas afirmações de modo a que se possa extrair tais conclusões, até porque a Ré omitiu partes dos depoimentos que lhe foram mais desfavoráveis e só realçou determinados aspectos que poderão parecer mais favoráveis à Ré, se forem interpretados de forma descontextualizada, sem as restantes declarações das mesmas testemunhas e sem atender às questões que lhes foram colocadas pelos advogados e pela Meritíssima Juíza, que a Ré não indicou.
4. Legalmente está vedada à parte recorrente a possibilidade de realizar recursos genéricos contra errada decisão da matéria de facto, que pudesse reconduzir-nos a uma repetição do julgamento, tendo o legislador optado por restringir a possibilidade de revisão de concretas questões de facto controvertidas relativamente às quais sejam manifestadas e concretizadas divergências por parte do recorrente.
5. O recurso apresentado pela Recorrente relativamente à matéria de facto apresenta-se assim sem a suficiente justificação substancial e não respeita as exigências, legalmente previstas, e requisitos de ordem adjectiva, para a impugnação da decisão sobre a matéria de facto, pelo que, tais incumprimentos deverão ter como consequência a rejeição do recurso de apelação na parte de impugnação da decisão da matéria de facto, recusando-se a apreciação do mérito da impugnação da decisão da matéria de facto, o que aqui a Autora/Recorrida expressamente requer, nos termos do art.º 640.º do C.P.C..
6. Por outro lado, a Recorrente também não indicou em relação às normas jurídicas que considera violadas, de forma suficiente e cabal, o sentido com que, no seu entender, as normas que constituem fundamento jurídico da decisão deviam ter sido interpretadas e aplicadas e/ou invocando erro na determinação da norma aplicável, a norma jurídica que, no entendimento da Recorrente, devia ter sido aplicada, conforme o preceituado no art.º 639.º do C.P.C..
7. A Recorrente não apresentou quaisquer apelações no estrito sentido material com que tal conceito se encontra vertido no Código de Processo Civil: limita-se a repetir, em súmula, o que alegou nos requerimentos que foi juntando aos autos, pelo que deve o presente recurso ser liminarmente rejeitado. – vide Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra de 24/10/2000.
8. A sentença recorrida não merece qualquer censura relativamente à Decisão da Matéria de Facto (com exceção do primeiro ponto dos factos dados por provados, que se deverá a mero lapso), à Fundamentação de Facto e Motivação apresentada, pois faz uma explanação pormenorizada e profunda de todos os elementos probatórios que serviram de base à formação da livre convicção do tribunal e que foram valorados para efeitos de decisão da matéria de facto, fazendo apelos a critérios de normalidade.
9. As declarações da testemunha D…, não justificam alterações da decisão da matéria de facto, com exceção do ponto 1.º dos factos “Provados” «1º - A Ré é uma empresa, onde prestam serviço uma trabalhadora sócia e uma estagiária, para além do único gerente da sociedade», pois que a mesma testemunha referiu que a empresa tem dois trabalhadores, uma trabalhadora sócia, a E…, esposa do Sr. F… (o gerente) e ela própria, a trabalhadora D…, que estava a prestar declarações, assim como uma estagiária, G…, pelo que tal facto dado como provado deve ser alterado, para a seguinte redação: «1º - A Ré é uma empresa, onde prestam serviço dois trabalhadores e dois estagiários, para além do único gerente da sociedade», porque a testemunha H… também fez referência a outro estagiário, sendo portanto dois os estagiários a trabalhar na empresa.
10. A testemunha H…, nas declarações que prestou em audiência de julgamento, a 26 de novembro de 2018, das 10:25:38 às 11:03:59, quando inquirida pela mandatária da Autora, respondeu também ter visto um outro estagiário, de nome I…, a trabalhar na empresa, para além da estagiária G…, o que sustenta a alteração pretendida pela Recorrida/Autora, de se reconhecer que a empresa tinha ao seu serviço duas trabalhadoras e dois estagiários, para além do gerente da sociedade.
11. A Recorrente aponta directa ou indirectamente que o tribunal recorrido não valorou convenientemente os depoimentos das restantes testemunhas e os restantes meios probatórios mas não foi capaz de apontar nenhum depoimento testemunhal ou algum documento que impusesse decisão diversa, aliás relativamente à prova testemunhal só foi capaz de fazer referência e apontar algumas afirmações de quatro testemunhas (mais nenhuma prova testemunhal apontou).
12. Não foi apresentado pela Recorrente nenhum vício, deficiência, nem invocada nenhuma nulidade, da prova produzida em sede de audiência de julgamento, assim como da gravação da mesma prova, pelo que se terá de entender por infundado, despropositado e totalmente improcedente o pedido de anulação e repetição da prova produzida em audiência de julgamento, realizado pela Recorrente no final das suas Conclusões e pedidos finais, nomeadamente na alínea b).
13. No entendimento da Recorrida/Autora dos presentes autos o tribunal «a quo» apenas não esteve tão bem em alguns pontos da Fundamentação de Direito e na Decisão final, nomeadamente nos que se indicam de seguida:
14. Quanto ao pedido de Indemnização em substituição da reintegração - requer-se a alteração da sentença recorrida, quanto à alínea b) da Decisão, no sentido de ser fixada a indemnização em substituição da reintegração, quer porque a mesma é pedida pela trabalhadora, que não apresenta atualmente condições físicas nem psíquicas necessárias e adequadas para tal reintegração, uma vez que ficou extremamente abalada com toda a situação vivenciada com a presente cessação ilícita do seu contrato de trabalho, com perda de confiança na sua antiga entidade patronal, conforme ficou provado nos autos, vide factos dados por provados, 43.º a 45.º, e situação psicológica (depressão profunda) que tem vindo a agravar-se, mesmo após o encerramento da audiência de julgamento, correspondendo a danos supervenientes, conforme comprovam os documentos supervenientes juntos em anexo, declarações e prescrições médicas do foro psiquiátrico, que aqui se dão por integralmente reproduzidos para todos os efeitos legais.
15. A própria Recorrente-Ré também requereu a Vossas Excelências a alteração da sentença recorrida nessa parte, atente-se ao ponto 19 das Conclusões da Recorrente, em que esta requereu que se fixe em 15 dias a eventual indemnização de antiguidade em substituição da reintegração.
16. Existe assim acordo entre as partes em litígio, Recorrente/Ré e Recorrida/Autora, no sentido de ambas pretenderem e requererem a fixação de uma indemnização em substituição da reintegração, por virtude do art.º 391.º ou 392.º do Código do Trabalho, pelo que não deverá ser imposta à trabalhadora, que nem está em condições físicas nem psíquicas para tal, uma decisão de reintegração na empresa, quando estão completamente abaladas as relações de confiança entre as partes. 17. Discorda-se igualmente da decisão recorrida relativamente à Retribuição mensal fixada e às Férias e Subsídio de Férias: requer-se a alteração da sentença recorrida quanto à alínea c) da decisão passando-se a referir e condenar a Ré no pagamento à Autora «às retribuições que a trabalhadora deixou de auferir desde 31-05-2018 e até ao trânsito em julgado da decisão que declarou a ilicitude do despedimento, à razão mensal de €970,00 (novecentos e setenta euros)(…)»
18. Por outro lado mas ainda quanto às retribuições da trabalhadora despedida ilicitamente, considerou o tribunal, na apreciação que fez “Dos pedidos formulados pela A.” relativamente às “Retribuições Intercalares” que «a retribuição mensal deve calcular-se por referência ao valor da remuneração mensal ilíquida contratualmente prevista, excluindo-se o subsídio de alimentação e os prémios de desempenho, não incluídos na retribuição (cfr. artigos 258.º e 260.º, alínea c) do CT).». No entanto, a trabalhadora deveria auferir mensalmente «10% sobre a margem bruta líquida de custos diretos sobre as vendas designadamente: encargos com comissões desembolsadas cumulativamente a comissionistas externos não incluídas na margem bruta. Entende-se por margem bruta: margem bruta liquida sobre as vendas recolhida do mapa de vendas mensal de produtos faturados e cobrados; e 50% do valor da formação mensal (prestação de serviços) paga e realizada», conforme Doc. n.º 2 junto com a Contestação da Autora de 20-08-2018.
19. Ora, tais valores agora mencionados correspondem a comissões mensais independentes do desempenho da trabalhadora, pois apenas são relacionados com os lucros da entidade patronal, pelo que, devem ser considerados retribuição variável, nos termos do n.º 3 do art.º 261.º do Código do Trabalho.
20. Neste sentido, requer-se a alteração do mencionado na sentença relativamente à retribuição mensal, de modo a nela serem incluídas as mencionadas comissões mensais, nos termos do n.º 3 do art.º 261.º do CT, e consequentemente alterado o valor calculado a título de pagamento de férias e subsídio de férias já vencidos e de proporcionais de férias, subsídio de férias e de Natal, nos termos do n.º 2 do art.º 264.º e 263.º do CT.
21. A sentença recorrida, apesar de, na alínea d) da Decisão ter condenado a Ré a pagar à Autora as férias e subsídios de férias vencidas em 01-01-2018 omitiu a condenação no pagamento à Autora dos proporcionais de férias, subsídio de férias e de Natal desde o início do ano de 2018 (01-01-2018) até à data 30-05-2018, data efectiva do despedimento, apesar de tal ter sido bem mencionado na Fundamentação de Direito relativamente a férias e subsídio de férias.
22. Pelo que, a alínea d) da decisão final deverá ser alterada de modo a nela serem incluídos os proporcionais de férias, subsídio de férias e de Natal desde o início do ano de 2018 (01-01-2018) até à data 30-05-2018, data efectiva do despedimento, em obediência ao artigo 245.º n.º 1, alínea b) do Código do Trabalho, calculados em função da retribuição fixada em respeito pelo n.º 3 do art.º 261.º do Código do Trabalho, como supra se invocou.
23. Apesar do tribunal recorrido ter julgado “Provados” os factos 43.º a 45.º, relativos aos danos morais alegados pela Autora, relativamente aos quais apresentou Motivação justificativa de tal entendimento, não condenou a final a Ré no pagamento de uma indemnização por tais danos não patrimoniais causados à Ré, conforme se impunha e conforme peticionado pela Autora, em valor nunca inferior a €2.000,00.
24. A Recorrida-Autora discorda dessa parte da Decisão por entender que tais danos deveriam ter sido atendidos e valorados pelo tribunal, por forma a lhe ser atribuída uma indemnização capaz de a compensar de todo o sofrimento, angústias e tristeza que a afectou pela cessação ilícita do seu contrato de trabalho, pelos danos não patrimoniais sofridos, que tiveram por única causa o seu despedimento ilícito, tanto mais, que tais danos se têm vindo a agravar, com o agravamento do seu estado de saúde físico e psíquico, conforme comprovam os documentos e prescrições médicas que se juntam em anexo, por serem documentos supervenientes.
25. Por tais motivos, deverá ser alterada a decisão recorrida por forma à Ré ser também condenada no pagamento à Autora de uma indemnização pelos danos não patrimoniais, em valor não inferior a €2.000,00, dois mil euros, conforme peticionado inicialmente, mas que atenda também aos danos não patrimoniais futuros, que continuam a verificar-se até ao momento do cumprimento pela Ré da decisão judicial, após a mesma transitar em julgado.
Termos em que, e nos melhores de direito que Vossas Excelências mui doutamente suprirão, deve o recurso da Recorrente ser julgado totalmente improcedente, em relação à matéria de facto e de direito apontada pela Recorrente e deve a sentença recorrida ser mantida em todos os pontos não colocados em causa pela aqui Recorrida/Autora, com as presentes alegações, que ampliam o âmbito do recurso, a requerimento da Recorrida-Autora, parte vencedora, nos fundamentos em que decaiu na causa (636.º do Código de Processo Civil, aplicável por força dos artigos 1.º, n.º 2 e art.º 87.º, n.º 1, ambos do Código de Processo de Trabalho), mas a sentença recorrida deverá ser alterada nos termos supra apontados e relativamente apenas às questões supra demarcadas pela Recorrida-Autora.”.
7. - O M. Público, junto deste Tribunal, pronunciou-se pela improcedência do recurso de apelação da ré.
8. - Corridos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir.

II. - Fundamentação de facto
1. - Na 1.ª instância foi proferida a seguinte decisão sobre a matéria de facto:
“Factos provados:
Da discussão da causa resultaram provados os seguintes factos com relevo para a decisão de mérito:
Do articulado motivador
1º- A Ré é uma empresa, onde prestam serviço uma trabalhadora sócia e uma estagiária, para além do único gerente da sociedade.
2º- Que se encontra sediada em Santa Maria da Feira, o que acarreta algumas despesas, nomeadamente quanto ao arrendamento de €450,00 (quatrocentos e cinquenta euros) e despesas normais inerentes de funcionamento.
3º - A A transitou de um contrato de estágio formalizado com o Instituto de Emprego e Formação Profissional, ao abrigo da Portaria n.º 86/20015, de 20 de março, contrato esse com o n.º …./RT/.., classificado no nível VI, atendendo às habilitações académicas da A (licenciada), que teve uma duração de 6 meses, de 11 de outubro de 2016 a 10 de abril de 2017.
4º- A admissão da A teve um outro motivo que foi o comprometimento desta em colaborar e promover o produto no exterior, alegando possuir conhecimentos suficiente de marketing adquiridos em anteriores empregos, concretamente de instituições financeiras.
5º- A contabilidade vinha alertando para algum desencontro entre créditos e débitos.
6º- Na sequência da cessação do contrato de trabalho, foram postos à disposição da A. os documentos necessários à obtenção do subsídio de desemprego.
*
Da contestação
7º- A Autora iniciou funções ao serviço da Ré com um contrato de estágio e formação profissional, com duração de seis Meses, de 11 de outubro de 2016 a 10 de abril de 2017.
8º- Terminado o estágio, a Autora emitiu certificado comprovativo de conclusão do estágio com indicação das competências técnicas adquiridas: “Desenvolveu competências comerciais de marketing digital no da cosmética e de beleza feminina”.
9º- Depois de realizado o estágio, a Autora e a Ré assinaram um contrato de trabalho por tempo indeterminado, com início a 11 de abril de 2017, junto a fls. 23 verso a 24, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido.
* Desse teor, transcrevemos a cláusula 3.ª (Remunerações e Subsídios), por necessário ao conhecimento do objecto da causa:
“1. Como contrapartida da actividade prestada, A PRIMEIRA CONTRAENTE obriga-se a pagar à SEGUNDA CONTRAENTE, cm função do cumprimento do seu período normal de trabalho, uma remuneração mensal ilíquida de EUR 920,00 (novecentos vinte euros), sujeito às contribuições e impostos obrigatórios devidos por lei.
2. A título de subsídio de Refeição, a SEGUNDA CONTRAENTE receberá, por cada dia útil de trabalho efectivo, a quantia de EUR: 4,52 (quatro euros e cinquenta dois euros}.
3. A título de retribuição de férias A SEGUNDA CONTRAENTE tem direito à retribuição que auferiria se estivesse em serviço efectivo,
4. A título de subsídio de Férias, será atribuído à SEGUNDA CONTRAENTE montante igual à retribuição base dos dias de férias a que tenha direito e às demais prestações que sejam unicamente contrapartida do modo específico da execução do contrato.
5. A título de subsídio de Natal, a SEGUNDA CONTRAENTE receberá um montante igual à retribuição base, sendo o mesmo proporcional ao número de meses de serviço efectivo prestado no ano de admissão da trabalhadora.
6. Será atribuído um aumento de 50 € na remuneração bruta mensal sempre que a meta comercial de volume de negócios semestral orçamentada acordada entre as partes tiver sido atingida. A actualização deverá comunicada até 15 de janeiro e l5 de junho relativa ao semestre anterior e reflectida no mês subsequente ao semestre.”
10º- E assinou, nesse mesmo dia, um acordo de pagamento de prémios de desempenho, com reconhecimento da assinatura por notário.
* Aqui transcrevemos o teor desse acordo, junto a fls. 40-41 verso dos autos, por necessário ao conhecimento do objecto da causa:
“ACORDO DE PRÉMIOS DE DESEMPENHO
O presente acordo visa estabelecer as regras de atribuição de prémios com carácter irregular de acordo com as metas estabelecidas e acordadas entre a C…, Lda e a trabalhadora B… até ao dia 31 de dezembro do período contabilístico anterior. O acordo é válido apenas no âmbito dos negócios relativos às CAE ….; CAE …. e CAE …...
PRÉMIO MENSAL
• 10 % sobre a margem bruta líquida de custos directos sobre as vendas designadamente:
- encargos com comissões desembolsadas cumulativamente a comissionistas externos não incluídas na margem bruta
• Entende-se por margem bruta:
- margem bruta liquida sobre as vendas recolhida do mapa de vendas mensal de produtos faturados e cobrados; e
- 50% do valor da formação mensal {prestação de serviços) paga e realizada.
PRÉMIO ANUAL.
- 1 prémio mensal médio se meta orçamental de vendas totais anuais alcançada a + 80% da meta
- 2 prémios mensais médio se meta orçamental de vendas totais anuais alcançada a +100%
- 3 prémios mensais médio se meta orçamental de vendas totais anuais alcançada a +110%”.
11º- A Ré decidiu celebrar com a Autora um contrato de trabalho por tempo indeterminado para exercer funções como Técnica de Marketing.
12º- Desde que a Autora iniciou o estágio, a faturação da Ré, sem IVA subiu, cerca de 120%, e o lucro cerca de 100%. A faturação passou de €3.800,00 em média por mês para €8.300,00 e o lucro de €2.200,00/mês para €4.400,00.
13º- No fim do estágio e início de contrato (abril de 2017) a faturação foi de cerca de €12.700,00, sem IVA, e o lucro de cerca de €6.400,00.
14º- Quando a Ré abordou pela primeira vez a Autora, informando-a de que ponderava despedi-la, a Ré tinha acabado de faturar, no mês de abril, cerca de €20.600,00, (sem IVA) e atingido um lucro de €8.800,00.
15º- Desde que a Ré contratou a Autora os lucros desta subiram.
16º- Os gastos eram apenas os indispensáveis à realização da atividade e as margem e lucro cresceram de forma muito significativa – cerca de 150%, desde que a Autora iniciou funções, em regime de estágio e até à data em que lhe foi comunicado o despedimento.
17º- Até à data em a Autora exerceu funções, a Ré contava com uma rede fixa de 774 clientes localizados em todos os pontos do país.
18º- A estes, acresciam todos os que os procuravam no dia a dia da loja e os que faziam nas feiras de cosmética de Lisboa e Porto, que se realizam anualmente como foi o caso da última do Porto (que decorreu de 7 a 9 de abril deste ano), em que a Autora esteve e onde se realizaram em vendas de produtos e de equipamentos cerca de €15.500,00.
19º- Consta da certidão comercial da empresa R., com o NIPC ………, como objeto social: “Comercialização de produtos de estética e respetivos acessórios”.
20º- A Ré nunca se dedicou à venda de perfumes e nunca teve perfumes para venda.
21º- A Ré dedica-se à venda de produtos de estética, da área de manicure, directamente a esteticistas profissionais e realiza cursos de formação profissional nessa área, também para profissionais.
22º- O Gerente da Ré decidiu que os serviços prestados no âmbito do projecto designado J…, seriam pagos com o dinheiro da Ré, que se verificou.
23º- Para além do espaço que designa de “Academia” pelo qual paga €450,00/mês - onde funciona a loja de venda de produtos e equipamentos e se realizam alguns dos cursos de formação profissional, a gerência decidiu abrir uma nova loja, esta por sua vez dedicada à pedicure, em local muito próximo da “Academia”.
24º- A Ré mudou o programa de facturação da Ré, de “Sage” para “Moloni”.
25º- A Autora foi surpreendida pelo Gerente da Ré, quando este lhe disse, depois de terem realizado a Feira de Cosmética do Porto, no mês de Abril do corrente ano, que teria de a despedir.
26º- Até esse mês o gerente da Ré nunca lhe falou nessa hipótese. 27º- Desde há algum tempo atrás que o sentia nervoso, dirigindo-se à Autora muitas vezes em tom ríspido e agressivo.
28º- A Autora nesses momentos perguntava ao Gerente o que se estava a passar até porque estranhava esse comportamento e o gerente referia-lhe que vivia bastante pressionado para tomar decisões pela sua sócia, com quem é casado.
29º- Enquanto trabalhadora, a Autora limitou-se a receber as notificações que lhe foram entregues sobre o assunto e que foram as que juntou no seu requerimento de impugnação da decisão ilícita de despedimento.
30º- Por essa razão, a partir da data em que foi abordada pela primeira vez pediu sempre à Ré que a notificasse por escrito sobre a matéria.
31º- A primeira notificação que recebeu e que juntou como doc. nº 1 ao seu requerimento de impugnação de despedimento, tem data de 23 de abril de 2018 e como assunto: “Cessação do contrato por extinção do posto de trabalho”.
32º- A Ré, por via dessa carta, notificou a Autora que era sua intenção proceder ao despedimento desta, por extinção do posto de trabalho, referindo – “vimos comunicar-lhe, nos termos e para os efeitos previstos no artigo 369.º do Código do Trabalho, a referida necessidade e que foi dado início ao processo de cessação do seu contrato individual de trabalho, por extinção de posto de trabalho”.
33º- No entanto, a Ré nunca notificou a Autora da decisão de extinção de posto de trabalho.
34º- A estagiária estava a ter formação com a Autora para lhe dar apoio em muitas áreas da sua atuação e mantém-se ao serviço da Ré.
35º A Ré nunca colocou à disposição da Autora todos os créditos vencidos para efeitos de cessação do contrato.
36º- Depois de ter recebido a comunicação com intenção de a despedir por extinção do seu posto de trabalho, regressada de um curto período de férias, a Autora apresentou-se ao serviço no dia 30 de abril de 2018 e o gerente disse à Autora no dia 3 de maio de 2018 que a partir do dia seguinte esta podia ir para casa.
37º- E nesse mesmo dia entregou-lhe um documento a dispensá-la da comparecência ao posto de trabalho.
38º- Em conjunto com esse documento, a Ré entregou outro, com data de 23 de abril de 2018, com o título – Declaração nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 74.º do decreto-Lei nº 220/2006, de 3 de Novembro, de acordo de revogação do contrato individual de trabalho, com efeitos a partir de 31 de maio de 2018.
39º- Na declaração subscrita pela Ré consta efetivamente, uma remissão para um alegado acordo de revogação do contrato e que “foi efetuada ao abrigo do Decreto-Lei nº 220/2006, de 3 de Novembro”.
40º- A Autora não assinou nenhum acordo de revogação do contrato.
41º- No dia 6 de junho de 2018 a Autora recebeu, por carta registada com aviso de receção, o documento n.º 3 que esta juntou ao seu requerimento inicial (correspondente à declaração da situação de desemprego), o recibo de vencimento com a quantia que a Ré entendeu pagar à Autora e um comprovativo de que transferiu a quantia que consta no recibo.
42º- A Ré não pagou à A. as seguintes quantias computadas até à data da apresentação da contestação: os salários: junho, julho e agosto de 2018: €970x3 = €2.910; Subsídio de alimentação: junho julho e agosto: 95,4x3= €286,2; férias e subsídio de férias vencidos a 1 de janeiro de 2018: €970x2= €1940;proporcionais das férias, subsídio de férias e de Natal, desde o mês de junho, e neste momento até ao mês de agosto: €80,83/mês x 3 meses = 242,5 x 3 (F, SF, SN) =€727,5; Prémios de desempenho calculados de acordo e que não foram pagos:
a) Referentes a todos os meses de trabalho desde a assinatura do contrato, à exceção do mês de fevereiro de 2018, que foi pago no mês de março, por transferência bancária:
b) Mês de abril de 2017: €638,24
c) Mês de maio de 2017: €739,38
d) Mês de junho de 2017: €609,77
e) Mês de julho de 2017: €600,00
f) Mês de agosto de 2017: €683,58
g) Mês de setembro de 2017: €615,13
h) Mês de outubro de 2017: €1.008,90
i) Mês de novembro de 2017: €757,14
j) Mês de dezembro de 2017: €544,56
k) Prémio 2017 – Cumprimento a 110% = 3 Médias de 10% Lucro Anual: (3x€688)=€2.064
l) Mês de janeiro de 2018: €411,35
m) Mês de março de 2018: €700,82
n) Mês de abril de 2018: €727,52
o) Mês de maio de 2018: €613,89
p) Prémio 2018 – Assumindo Média do ano de 2017: €688,00
43º- A Autora viveu e vive ainda por causa de todo este processo a que foi sujeita numa profunda tristeza e desânimo, sem vontade de conviver socialmente e procurando o isolamento
44º- Tudo porque tem consciência de que trabalhou muito para conseguir os bons resultados que a Ré alcançou e, ao invés de ser reconhecida e valorizada, quando a Ré sentiu que já tinha condições para dar continuidade ao trabalho cujos métodos foram criados e implementados pela Autora, com resultados visíveis, a Ré quis despedi-la.
45º- Podendo a Ré agora tirar proveito dos métodos de trabalho que foi a Autora que implementou, dando-lhes continuidade, sem que a Autora possa continuar a beneficiar desse seu empenho e investimento profissional.
*
Factos não provados:
Com relevo para a decisão de mérito, da discussão da causa não resultou provado, designadamente que:
- o contrato de estágio com o n.º …./RT/.., só foi formalizado atento ao subsídio atribuído por aquele organismo à R.;
- o tempo de duração do contrato de estágio não foi tempo suficiente para validar se a empresa teria capacidade financeira para suportar os custos com a A.;
- o que efectivamente não correspondeu às expectativas e a empresa começou a definhar que as margens de comercialização não eram suficientes para colmatar todos os custos inerentes ao desenvolvimento da actividade;
- numa primeira abordagem e em diálogo aberto e franco com a trabalhadora ora A se tentaram reduzir as despesas no que era possível, sem prejuízo do desenvolvimento da actividade;
- mesmo assim os resultados não foram satisfatórios, minimizaram, mas não chegaram;
- estas tentativas tiveram a participação e colaboração permanente da ora A.;
- discutindo e ouvindo sugestões plurais para minimizar qualquer outro efeito negativo;
- só que acrescido a tudo isto também se reduziram os clientes, que nem sempre estão vocacionados para comprarem mais do que é estritamente necessário;
- note-se que a principal actividade é a venda de perfumes e estes não são consumíveis de primeira necessidade nem para todas as bolsas dos hipotéticos consumidores; - já que anexante a toda esta actividade, os centros comerciais de hoje são os locais onde mais se consome já que com a deslocação a estes, por outros motivos complementares, se adquirem os citados produtos;
- por uma questão de boa gestão e normalização comercial a gerência chegou a um ponto que não encontrou alternativa senão promover o despedimento por extinção do posto de trabalho;
- a Autora acompanhou todo o processo da intenção da Extinção do Posto de Trabalho;
- iniciadas tais conversações já em fevereiro, p.p., do ano em curso de que a A. foi abordada quanto a uma possível cessação do contrato de trabalho;
- que se foram efectivando durante algum tempo, até que, concretamente nos primeiros dias de março, p.p. do ano em curso, foram determinadas;
- alegando e fundamentando sempre a ora R que teria que reestruturar a empresa internamente no sector da área comercial e de distribuição, sob pena de não conseguir sobreviver nos tempos mais próximos;
- motivado pela quebra de clientes e sobretudo pelas dificuldades na recepção quanto a recebimentos pela mercadoria vendida;
- tentando encurtar prazos de recebimento e fazendo maiores descontos a pronto pagamento;
- ou seja com redução de clientes, significa quebra de receitas, que origina menos margem de ganho;
- que não comparativo com as despesas que se mantêm e normalmente fixas; - por outro lado e em todas as conversações foi referido, que as empresas não sobrevivem só com capital, sendo o factor humano muito mais importante e necessário na longevidade das empresas;
- a decisão foi tomada sempre em total e aberto diálogo com a ora A.;
- prestando-lhe todos os esclarecimentos, reuniões diversas e formalização escrita que a ora A a dado momento se recusou a receber aquando da intenção da formalização do processo, alegando dispensar qualquer documento porque tinha perfeito conhecimento dos trâmites processuais;
- face à atual conjuntura de mercado, sobretudo no setor de comércio, concretamente do sector da perfumaria ou similares e seus componentes; à reorganização, concentração e racionalização do serviço de distribuição, por forma a manter a competitividade, imperioso se torna, sob pena de rutura ou colapso económico, da redução de custos inerentes na actividade da signatária, pelo que não subsiste a necessidade de manutenção do posto de trabalho da ora A., com a categoria profissional de Técnica Comercial;
- não possui a entidade empregadora, ora R outro posto de trabalho compatível ou similar com a categoria profissional ora extinta;
- não lhe é possível suportar os custos decorrentes do seu contrato de trabalho, pelo que se torna impossível da subsistência da relação laboral;
- na sequência da cessação do contrato de trabalho, foi posta à disposição da A. a correspondente compensação prevista no artigo 366.º ex vi do artigo 372.º, ambos do CT;
- a relação laboral, mantida entre a ora A e a firma e, de acordo com o exposto, lhe foi indicada a data da cessação, respeitando o pré-aviso estipulado no n.º 3 do artigo 371.º do CT;
- durante a vigência daquele pré-aviso, se encontrava em pleno gozo de férias, minimizando os custos directos acaso não fossem gozadas;
- durante a vigência contratual com a ora A sempre foram pagas, atempadamente todas as remunerações vencidas e muito superiores ao convencionalmente estipulado para o sector de actividade.
- o projeto denominado J…, de comércio eletrónico para relacionamento e encontros, nada têm a ver com o objeto social da Ré;
- o gerente da Ré cedeu perante a pressão que a sua sócia e esposa foi fazendo para que este despedisse a Autora, a quem se referia dizendo que esta ia ganhar muito dinheiro às custas deles;
- a nova loja foi aberta em novembro de 2017;
- que o programa de faturação foi mudado, porque só desta forma poderia ter uma só licença e realizar duas contabilidades: a de manicure onde a Autora sempre trabalhou e a de pédicure que a Ré decidiu abrir em Novembro de 2017;
- nesta nova loja, que abriu durante o mês de maio deste ano, a Ré investiu cerca de €10.000, com obras de adaptação do espaço, formação e viagens que o gerente e a sua mulher realizaram à Alemanha para representação da marca K…, compra de equipamentos e recheio para iniciar as vendas, aos quais se somam o valor da renda mensal e uma avença com uma consultora para fazer o processo de registo no INFARMED para venda de produtos de nível médico.”.

III. – Fundamentação de direito
1. - Atento o disposto nos artigos 635.º, n.º 4 e 639.º, n.ºs 1 e 2, ambos do Código de Processo Civil (CPC), aplicáveis por força do artigo 1.º, n.º 2, alínea a) e artigo 87.º do Código de Processo do Trabalho (CPT), e salvo questões de conhecimento oficioso, o objecto do recurso está delimitado pelas conclusões do recorrente, supra transcritas, restrito a matéria de direito.
Mas essa delimitação é precedida de uma outra, qual seja a do reexame de questões já submetidas à apreciação do tribunal recorrido, isto é, o tribunal de recurso não pode criar decisões sobre matéria nova, matéria não submetida ao exame do tribunal de que se recorre.

2. - Objecto dos recursos:
Da ré:
- A modificabilidade da decisão de facto
- A (i)licitude do despedimento da autora por extinção do posto de trabalho e respectivos créditos.
Da autora (ampliado):
- A indemnização em substituição da reintegração;
- Dos valores das retribuições intercalares, incluindo férias, subsídio de férias e de natal.

3. - A modificabilidade da decisão de facto.
3.1. - Atento o disposto no artigo 662.º, n.ºs 1 e 2, do CPC, o Tribunal da Relação deve alterar a decisão da 1.ª instância sobre a matéria de facto, “se os factos tidos como assentes, a prova produzida ou um documento superveniente impuserem decisão diversa”.
Para o efeito da alteração da decisão de facto, o artigo 640.º, do novo CPC, dispõe:
1 - Quando seja impugnada a decisão sobre a matéria de facto, deve o recorrente obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição:
a) Os concretos pontos de facto que considera incorrectamente julgados;
b) Os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida.
c) A decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas.
2 - No caso previsto na alínea b) do número anterior, observa-se o seguinte:
a) Quando os meios probatórios invocados como fundamento do erro na apreciação das provas tenham sido gravados, incumbe ao recorrente, sob pena de imediata rejeição do recurso na respetiva parte, indicar com exactidão as passagens da gravação em que se funda o seu recurso, sem prejuízo da possibilidade de poder proceder à respectiva transcrição dos excertos que considere relevantes; (…)”.
3.2. - Em comentário ao citado artigo, António Abrantes Geraldes, in Recursos no Novo Código de Processo Civil, 2013, páginas 126, 127 e 129, escreve que “(…) O recorrente deve indicar sempre os concretos pontos de facto que considera incorrectamente julgados, com enunciação na motivação do recurso e síntese nas conclusões; quando a impugnação se fundar em meios de prova constantes do processo ou que nele tenham sido registados, o recorrente deve especificar aqueles que, em seu entender, determinam uma decisão diversa quanto a cada um dos factos; relativamente a pontos da decisão da matéria de facto cuja impugnação se funde, no todo ou em parte, em provas gravadas, para além da especificação obrigatória dos meios de prova em que o recorrente se baseia, cumpre ao recorrente indicar com exactidão as passagens da gravação relevantes e proceder, se assim o entender, à transcrição dos excertos que considere oportunos (…); (…), pretendendo o recorrente a modificação da decisão da 1.ª instância e dirigindo uma tal pretensão a um tribunal que nem sequer intermediou a produção da prova, é compreensível uma maior exigência no que concerne à impugnação da matéria de facto, impondo, sem possibilidade de paliativos regras muito precisas (…)”, acrescentado ainda que “(…) as referidas exigências devem ser apreciadas à luz de um critério de rigor. Trata-se, afinal, de uma decorrência do princípio da auto-responsabilidade das partes, impedindo que a impugnação da decisão da matéria de facto se transforme numa mera manifestação de inconsequente inconformismo (…)”.
A jurisprudência do STJ, quanto ao ónus que recai sobre o recorrente que pretenda ver impugnada a matéria de facto, defende que se exige do recorrente que dê cumprimento ao ónus de alegação, devendo obrigatoriamente especificar:
a) Os concretos pontos de facto que considera incorrectamente julgados;
b) Os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida;
c) A decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas.
Quer isto dizer que recai sobre a parte Recorrente um triplo ónus:
Primo: circunscrever ou delimitar o âmbito do recurso, indicando claramente os segmentos da decisão que considera viciados por erro de julgamento;
Secundo: fundamentar, em termos concludentes, as razões da sua discordância, concretizando e apreciando criticamente os meios probatórios constantes dos autos ou da gravação que, no seu entender, impliquem uma decisão diversa;
Tertio: enunciar qual a decisão que, em seu entender, deve ter lugar relativamente às questões de facto impugnadas.
Ónus tripartido que encontra nos princípios estruturantes da cooperação, da lealdade e boa fé processuais a sua ratio e que visa garantir, em última análise, a seriedade do próprio recurso instaurado, arredando eventuais manobras dilatórias de protelamento do trânsito em julgado da decisão.
[Cf., também, sobre esta matéria, Lopes do Rego, in “Comentários ao Código de Processo Civil”, pág. 465 e que, nesta parte, se mantém actual].
No acórdão do STJ, de 09.07.2015, in www.dgsi.pt, foi escrito:
“Como também se teve já a ocasião de observar (cfr. “Notas sobre o novo regime dos recursos no Código de Processo Civil”, in O Novo Processo Civil, Contributos da doutrina para a compreensão do novo Código de Processo Civil, caderno I, Centro de Estudos Judiciários, Dezembro de 2013, pág. 395 e segs)., a reforma do Código de Processo Civil de 2013 não pretendeu alterar o sistema dos recursos cíveis, aliás modificado significativamente pouco tempo antes, pelo Decreto-Lei nº 303/2007, de 24 de Agosto; mas teve a preocupação de “conferir maior eficácia à segunda instância para o exame da matéria de facto”, como se pode ler na Exposição de Motivos da Proposta de Lei nº 113/XII apresentada à Assembleia da República, de cuja aprovação veio a resultar o actual Código de Processo Civil, disponível em www.parlamento.pt.
Essa maior eficácia traduziu-se no reforço e ampliação dos poderes da Relação, no que toca ao julgamento do recurso da decisão de facto; mas não trouxe consigo a eliminação ou, sequer, a atenuação do ónus de delimitação e fundamentação do recurso, introduzidos em 1995. Com efeito, o nº 1 do artigo 640º vigente:
- Manteve a indicação obrigatória “dos concretos pontos de facto” que o recorrente “considera incorrectamente julgados” (al. a),
- Manteve o ónus da especificação dos “concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos de facto impugnados diversa da recorrida” (al.b),
- Exigiu ao recorrente que especificasse “a decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas” (al. c), sob pena de rejeição do recurso de facto.”.
A interpretação desta nova alínea c), do artigo 640.º, do CPC, é-nos dada por Abrantes Geraldes, podendo ler-se a este propósito que:
O Recorrente deixará expressa a decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas, como corolário da motivação apresentada, tendo em conta a apreciação crítica dos meios de prova produzidos, exigência nova que vem no reforço do ónus de alegação, por forma a obviar à interposição de recursos de pendor genérico ou inconsequente…”.
[Cf. António Santos Abrantes Geraldes, in “Recursos no Novo Código de Processo Civil”, 2014, 2ª Edição, pág. 133].
Neste sentido, o acórdão STJ, de 07.07.2016, in www.dgsi.pt, considerou que:
“I.- Para que a Relação conheça da impugnação da matéria de facto é imperioso que o recorrente, nas conclusões da sua alegação, indique os concretos pontos de facto incorrectamente julgados, bem como a decisão a proferir sobre aqueles concretos pontos de facto, conforme impõe o artigo 640º, nº 1, alíneas a) e c) do CPC.
II. - Não tendo o recorrente cumprido o ónus de indicar a decisão a proferir sobre os concretos pontos de facto impugnados, bem andou a Relação em não conhecer da impugnação da matéria de facto, não sendo de mandar completar as conclusões face à cominação estabelecido naquele nº 1 para quem não os cumpre.”. (negrito nosso).
Apreciemos.
3.3. - No corpo das alegações de recurso, a ré/recorrente escreveu:
II - Da reapreciação da prova gravada
Impugnação da decisão proferida sobre a matéria de facto e sobre a matéria de direito
2 - Dos concretos pontos de facto que se consideram incorrectamente julgados e dos concretos meios probatórios, constantes do processo e (ou) gravados que impunham decisão diferente da recorrida sobre os pontos da matéria de facto impugnados. (negrito nosso).
3 - A Autora / trabalhadora, foi alvo, de um procedimento de extinção do posto de trabalho, que decorreu informal e formalmente, durante algum tempo, pelas razões expostas, na resposta à peticionada ilicitude do despedimento, concretamente, (…).
II A - Fundamentação de facto
Factos Provados
1 - A Ré é uma empresa, onde prestam serviço uma trabalhadora sócia e uma estagiária, para além do único gerente da sociedade.
2 – Que se encontra sediada em Santa Maria da Feira o que acarreta algumas despesas, nomeadamente quanto ao arrendamento de €450,00 (quatrocentos e cinquenta euro) e despesas normais inerentes ao funcionamento.
3 – A A. transitou de um contrato de estágio formalizado com o Instituto de Emprego e Formação Profissional, ao abrigo da Portaria n.º 86/2015, de 20 de março, contrato esse com o n.º …./RT/.., classificado no nível VI, atendendo às habilitações académicas da A (licenciada), que teve uma duração de 6 meses, de 11 de outubro de 2016 a10 de abril de 2017.
4 – A admissão da A. teve um outro motivo que foi o comprometimento desta em colaborar e promover o produto no exterior, alegando possuir conhecimentos suficientes de marketing adquiridos em anteriores empregos, concretamente de instituições financeiras.
5 – A contabilidade vinha alertando para algum desencontro entre créditos e débitos.
6 – Na sequência da cessação contrato de trabalho, foram postos à disposição da A. os documentos necessários à obtenção do subsídio de desemprego.”.
[A recorrente transcreveu os seis primeiros factos dados como provados na sentença recorrida].
“4 - O Tribunal “a quo”, com o devido respeito que nos merece e é muito, não valorizou o prémio atribuído e acordado que conta do respectivo contrato de trabalho, cfr cl.ª 3.ª n.º 6, onde é especificado que haverá um aumento de €50,00 na remuneração bruta mensal sempre que a meta comercial de volume de negócios semestral orçamentada acordada entre as partes tiver sido atingida……., celebrado a 11 de abril de 2017.
- Ou seja este prémio teve vigência e foi cumprido, cfr os documentos juntos aos autos e mais não era do que um documento que não foi preciso reconhecer as assinaturas.
- Curiosamente o documento de que a Autora ora vem argumentar também é da mesma data (11 de abril de 2017), com alguns esclarecimentos adicionais de que fala em prémio mensal e anual, mas de que se desconhece em concreto, quais os reais valores de base para que possam ser atribuídos.
- De que questionamos se alguma vez o valor de vendas foi atingido para se obter o cumprimento na liquidação.
- Até porque se um estava a ser pago atempadamente e que não refere qual a meta comercial de volume de negócios semestral, de que ficou na omissão externa, pela mesma razão o outro seria cumprido se os objectivos de meta fossem atingidos.
- E tanto assim que a Autora não provou o seu pagamento em momento algum (art.º 342.º n.º 1 do CC).
- A testemunha – D… - o referiu no seu depoimento que tinha conhecimento “Sabe da existência de um prémio porque foi falado entre o gerente e a B…” e efectivamente esse prémio estava a ser cumprido”.
- A própria testemunha – L… - arrolada pela Autora, também versou o documento reconhecido pelo notário, mas curioso é que os documentos, contrato de trabalho e acordo de prémios de desempenho são ambos da mesma data (11 de abril de 2017) e resta saber se não serão complementares no seu conteúdo.
- Ora esta situação não foi valorada como facto provado, pelo tribunal “a quo”, ou seja, menosprezou tal evidência pela sua não relevância, de que não aceitamos.
Ou seja uma situação é fundamental e delineada contratualmente, que não mereceu qualquer dúvida ou suscitou receio no seu cumprimento e de que não houve reconhecimento.
- A outra a existir o documento, como nos parece da sua veracidade, não teve consistência, porque as metas não foram atingidas e como tal não houve qualquer pagamento.
- Mas mais, de que incomodava a firma em cumpri-lo acaso fossem atingidos aqueles objectivos?
- Seria salutar e engrandecimento económico, financeiro e de robustez de tesouraria.
- Nem o tribunal “a quo” encontrou documentação ou fundamentação legal e contabilística para sentenciar a firma na condenação, de que se entende que andou mal ao efectivar a condenação da Ré neste preciso meio.” – fim de citação.
“II B - Fundamentação de facto
Factos Não Provados”.
[A recorrente transcreveu todos os factos dados como não provados na sentença recorrida].
E alegou:
“- De que existe uma contradição entre os factos provados e não provados, pelo tribunal “a quo” concretamente, quando refere no “art 5 – A contabilidade vinha alertando para algum desencontro entre créditos e débitos” e o referido - Alegando e fundamentando sempre, a ora R que teria que reestruturar a empresa internamente no sector da área comercial e de distribuição, sob pena de não conseguir sobreviver nos tempos mais próximos, pelo que se entende que o tribunal “a quo” andou mal ao não dar este factos como provados.
- Outro facto provado e que o tribunal “a quo” deu como não provado, quando refere “Durante a vigência contratual com a ora A. sempre foram pagas, atempadamente, todas as remunerações vencidas e muito superiores ao convencionalmente estipulado para o sector de actividade ” Dado que estamos a falar de retribuições.
Veja-se inclusivamente o subsídio de alimentação que ora Ré actualizou, de modus próprio e sem qualquer imposição legal ou administrativa.
7 - Sendo estes os factos essenciais vertidos e dados pelo Tribunal “a quo” como provados e não provados, vamos então às declarações recolhidas em gravação de audiência, sem contudo desperdiçarmos ou desatendermos toda a dinâmica processual subjacente à causa.”.
De seguida, transcreveu algumas passagens dos depoimentos das testemunhas D…, M…, H…, L…, mas sem nunca especificar os concretos pontos de facto que considera incorrectamente julgados, nem, muito menos, apresentar qualquer proposta de decisão que, no seu entender, devesse ser proferida sobre as questões de facto impugnadas.
A recorrente limitou-se a considerações genéricas sobre várias questões, como por exemplo: o gozo de férias; o pagamento de férias e respectivos subsídios (férias e de natal); a natureza retributiva do subsídio de alimentação, “do prémio convencionado” e a “indemnização e efectiva extinção do posto de trabalho”.
Mas mais: lidas as conclusões de recurso, supra transcritas, verifica-se que das mesmas também não consta a indicação de qualquer facto impugnado, nem, muito menos, a proposta de decisão que devesse ser proferida.
Por todo o exposto, é de rejeitar a impugnação da matéria de facto, nos termos deduzidos pela ré/recorrente.

4. - Da (i)licitude do despedimento da autora por extinção do posto de trabalho e respectivos créditos.
4.1. - A apreciação das questões de direito suscitadas pela recorrente – licitude do despedimento por extinção do posto de trabalho (ou “caducidade do contrato promovida pela ré”, na versão da recorrente) e respectivos créditos salariais - estava dependente da eventual alteração da matéria de facto.
Ora, mantida a decisão da 1.ª instância sobre a matéria de facto, nada mais temos a acrescentar ao decidido na sentença recorrida sobre a declaração da ilicitude do despedimento da autora, quer por razões formais – “não tendo a Ré comunicado por escrito à A. a decisão final de despedimento, com as menções que a lei exige, verifica-se que foi incumprida uma formalidade legal, o que era suficiente para sustentar um juízo de ilicitude do despedimento nos termos previstos na alínea c) do artigo 381º do CT”, e “a Ré não pôs à disposição da A. todos os créditos vencidos e exigíveis por efeito da cessação do contrato de trabalho, designadamente o valor das férias e subsídio de férias vencidos em 01.01.2018 e o valor dos prémios de desempenho a que a A. tinha direito. Pelo que, por força do artigo 384º, d), do CT, o despedimento da A. sempre seria de considerar ilícito, por preterição desta formalidade legal”, quer por razões substantivas – “A Ré empregadora não provou os motivos que invocou, para fundamentar a decisão de extinção do seu posto de trabalho e atinentes aos dados económicos e financeiros, como também não provou a impossibilidade da manutenção do posto de trabalho da A., ou seja, que não existia posto de trabalho compatível, ónus que lhe competia, que era seu. Conclui-se, pois, que o despedimento da A. foi ilícito, nos termos do artigo 381º, b), do CT.” -, bem como sobre a condenação da ré no pagamento, à autora, das férias e subsídio de férias e de natal – “a A. tem ainda direito ao pagamento das férias e subsídio de férias já vencidos a 01.01.2018, no valor de €1.840 (920x2), por si peticionados e aos proporcionais de férias, subsídio de férias e de Natal, que se venceram e a que a A. tinha direito e deixou de receber em virtude do despedimento, incluídos nas retribuições intercalares a que tem direito. Como é sabido, os trabalhadores têm direito, em cada ano civil, a um período de férias remuneradas, o qual se vence no dia 1 de Janeiro de cada ano, e a receber um subsídio de montante igual ao valor da retribuição correspondente ao período de férias – arts. 237º, nº1, 238º, nº 1, e 264º, nº 1, do Código do Trabalho.”.
Como escrevemos no acórdão de 21.02.2018, proferido no processo n.º 26918/15.8T8PRT.P2, in www.dgsi.pt, “a não verificação do requisito mencionado no artigo 368.º, n.º 1, alínea b), do CT – “a impossibilidade da manutenção do posto de trabalho da A.” -, torna ilícito o despedimento, já que o despedimento por extinção do posto de trabalho pressupõe a verificação cumulativa dos requisitos previstos no n.º 1 do citado normativo – cf. artigo 384.º, alínea a) do mesmo diploma.”.

4.2. - Do subsídio de alimentação.
4.2.1. - No ponto 20 das conclusões de recurso, a ré/recorrente alegou:
“(…), e subsídio de alimentação de que não era devido, nos termos dos art. 258.º n.º 2 em articulação com o art 260.º n.º 2, ambos do CT não é retribuição.
- Se não é retribuição então é uma prestação dada ao trabalhador, em função do trabalho realizado e desde que seja superior a cinco de horas trabalho efectivo, por remissão ao art 154.º n.º 3 alínea b), do CT”.
A sentença recorrida consignou:
“Quanto ao pagamento do subsídio de alimentação, a título de danos patrimoniais.
Alega a A. que recebia um subsídio de alimentação no valor diário de €95,4 e que, em consequência do despedimento, deixou de receber tal quantia.
A este propósito, apurou-se que a A. recebia um subsídio de alimentação no valor diário de €4,52 e deixou de receber em virtude do despedimento.
Sob a rubrica ‘Prestações incluídas ou excluídas da retribuição’, dispõe o art. 260.º, n.º 1, a) e n.º 2 do Cód. Trabalho/2009 que não se consideram retribuição as importâncias recebidas a título de ajudas de custo, abonos de viagem, despesas de transporte, abonos de instalação e outras equivalentes, devidas ao trabalhador por deslocações, novas instalações ou despesas feitas em serviço do empregador, salvo quando, sendo tais deslocações ou despesas frequentes, essas importâncias, na parte que exceda os respectivos montantes normais, tenham sido previstas no contrato ou se devam considerar pelos usos como elemento integrante da retribuição do trabalhador.
O disposto em tal preceito aplica-se, com as necessárias adaptações, ao subsídio de alimentação, por força do nº2 do citado artigo 260º.
A doutrina vem-se pronunciando geralmente no sentido de que o subsídio de refeição não constitui, em princípio, retribuição. - cfr. Joana de Vasconcelos, anotando a norma no Código do Trabalho Anotado, Almedina, 2016, 10ª edição, pág. 637/638, e não constitui retribuição precisamente porque se traduz na assunção das despesas com a alimentação em que o trabalhador incorre por causa da prestação do trabalho.
Ao subsídio de refeição, tal como ao abono para falhas, não deve ser conferido carácter retributivo, apesar da regularidade/periocidade da sua atribuição. A lei admite a sua consideração como tal se/quando o seu valor exceda um montante dito normal ou o mesmo seja tido, pelo contrato ou pelos usos, como elemento integrante da retribuição.
Entendemos, pois, que não sendo de reconhecer à prestação em causa natureza retributiva, tal prestação não se inclui nos salários intercalares, ainda que se reconheça que, porque conexa com a execução do trabalho, pode representar um benefício ou vantagem para o trabalhador.
Ora, sendo o despedimento declarado ilícito, verifica-se uma situação de impossibilidade de cumprimento do contrato imputável ao credor e, como estamos perante um contrato bilateral, aplica-se o disposto no artigo 795º do Código Civil, nos termos do qual, o credor não fica desobrigado da sua contraprestação.
Assim sendo, consideramos que assiste à A. o direito de receber o valor de subsídio de alimentação que deixou de receber em virtude do despedimento, por se tratar de um dano patrimonial efetivamente sofrido, já que deixou de receber tal quantia a que tinha direito se executasse o seu trabalho (o que apenas deixou de fazer por razões imputáveis à R.), à razão diária (dias úteis) de €4,52, desde a data do despedimento até ao trânsito em julgado da presente decisão.
Nessa medida, o pedido procede.”
E decidiu:
“f) - condenar a Ré no pagamento à A. da quantia respeitante ao subsídio de alimentação que deixou de receber em virtude do despedimento, à razão diária (dias úteis) de €4,52, desde a data do despedimento (31.05.2018 até ao trânsito em julgado da presente decisão.”.
4.2.2. – Quid iuris?
Nos termos do artigo 390.º - Compensação em caso de despedimento ilícito -, n.º 1, do CT, “Sem prejuízo da indemnização prevista na alínea a) do n.º 1 do artigo anterior, o trabalhador tem direito a receber as retribuições que deixar de auferir desde o despedimento até ao trânsito em julgado da decisão do tribunal que declare a ilicitude do despedimento.”.
O artigo 260.º - Prestações incluídas ou excluídas da retribuição -, n.º 1, alínea a), do CT, estabelece: “Não se consideram retribuição: a) As importâncias recebidas a título de ajudas de custo, abonos de viagem, despesas de transporte, abonos de instalação e outras equivalentes, devidas ao trabalhador por deslocações, novas instalações ou despesas feitas em serviço do empregador, salvo quando, sendo tais deslocações ou despesas frequentes, essas importâncias, na parte que exceda os respectivos montantes normais, tenham sido previstas no contrato ou se devam considerar pelos usos como elemento integrante da retribuição do trabalhador;
E o n.º 2 acrescenta: “O disposto na alínea a) do número anterior aplica-se, com as necessárias adaptações, ao abono para falhas e ao subsídio de refeição.”.
Por sua vez, o artigo 389.º - Efeitos da ilicitude de despedimento -, n.º 1, alínea a), do CT, estatui: “Sendo o despedimento declarado ilícito, o empregador é condenado: a) A indemnizar o trabalhador por todos os danos causados, patrimoniais e não patrimoniais;”.
Neste particular, está apenas provado o seguinte:
“Como contrapartida da actividade prestada, A PRIMEIRA CONTRAENTE obriga-se a pagar à SFGUNDA CONTRAENTE, cm função do cumprimento do seu período normal de trabalho, uma remuneração mensal ilíquida de EUR 920,00 (novecentos vinte euros), sujeito às contribuições e impostos obrigatórios devidos por lei.
A título de subsídio de Refeição, a SEGUNDA CONTRAENTE receberá, por cada dia útil de trabalho efectivo, a quantia de EUR: 4,52 (quatro euros e cinquenta dois euros)” - cf. ponto 9.º dos factos provados.
A Ré não pagou à A. as seguintes quantias computadas até à data da apresentação da contestação: os salários: junho, julho e agosto de 2018: €970x3 = €2.910; Subsídio de alimentação: junho julho e agosto: 95,4x3= €286,242º; (…)” – cf. ponto 42.º dos factos provados.
Sobre a inclusão do subsídio de alimentação nas retribuições a pagar aos trabalhadores, nos termos do artigo 390.º, n.º 1 do CT, já se pronunciou o Tribunal da Relação do Porto nos dois sentidos: negativo e positivo.
No sentido negativo, os acórdãos de 09.07.2014, de 06.10.2014 – “Não tendo no caso o subsídio de refeição natureza retributiva, o mesmo não faz parte da componente retributiva a que alude o nº 1 do artigo 390º do CT. Assim, o recorrente/trabalhador não tem direito a receber o subsídio de alimentação que deixou de auferir desde o despedimento até ao trânsito em julgado da decisão do tribunal que declarou a ilicitude do despedimento.” -, e de 21.01.2019.
No sentido positivo, o acórdão de 16.12.2015 - “Atendendo à coerência e unidade do sistema jurídico não limitadamente laboral mas no contexto mais geral da reparação civilística do dano, o subsídio de refeição integra a compensação a que se refere o artigo 390º do Código do Trabalho justamente pela natureza compensatória das consequências advindas ao trabalhador por via dum despedimento ilícito” -, todos publicados in www.dgsi.pt.
No acórdão de 09.07.2014, depois de citar os artigos 390.º, n.º 1 e 260.º, n.º 1, alínea a) e n.º 2, supra transcritos, concluiu:
“Ora, assim sendo e salvo estas situações, afigura-se-nos que, pelo menos desde o CT/2003, o subsídio de refeição deixou de se integrar no conceito de retribuição mesmo que para os efeitos previstos no art. 390º, nº 1. Neste sentido se pronuncia também Pedro Furtado Martins, in Cessação do Contrato de Trabalho, 3ª Edição, Principia, págs. 440/441, bem como, designadamente, o Acórdão do STJ de 01.04.2009, in www.stj/ficheiros/jurisp-sumarios/social/social2009.pdf. No caso, os AA. não fizeram prova de que, por virtude do previsto na última parte do citado art. 260º, nº 1, os subsídios de alimentação devessem ter caráter retributivo. E, assim sendo, entende-se que os mesmos não se incluem nas retribuições intercalares previstas no art. 390º, nº 1, do CT/2009.”.
E no acórdão de 16.12.2015, foi consignado:
“A génese da negação da integração do subsídio de refeição faz-se a partir da disciplina do artigo 260º nº 2 do Código do Trabalho de 2003, que inovou, excluindo expressamente o subsídio de refeição do conceito de retribuição. Então, uma interpretação sistemática coerente da disciplina da compensação em sede de despedimento ilícito, onde se mandavam pagar as “retribuições”, daria o resultado da mencionada exclusão. Simplesmente, esse apelo à sistemática e à coerência e unidade do sistema jurídico, falha na exacta medida em que também o DL nº 64-A/89, que regulava os despedimentos no período antecedente ao Código do Trabalho, no seu artigo 13º, também não dizia outra coisa: havia que pagar “as retribuições” que o trabalhador tivesse deixado de auferir em consequência do despedimento. E o conceito legal de retribuição, à época do DL nº 64-A/89, não excluía o subsídio de refeição.
A questão não é saber se o subsídio de refeição é ou não retribuição, nem jogar com as regras de prova do excesso em que ele pode ser retribuição, a questão é que estamos no domínio reparatório, senão mesmo sancionatório, da ilicitude da conduta do empregador: quem despede ilicitamente torna-se responsável pelos prejuízos que com essa conduta causou – artigo 389º CT, actualmente. A questão é que, o trabalhador, por via do despedimento ilícito que o impediu de trabalhar, de se deslocar para o trabalho, perdeu não só a retribuição correspondente ao actual conceito legal de retribuição, como perdeu o subsídio de refeição que por força do contrato, se este tivesse sido cumprido, teria recebido. É nesta perspectiva que tem de ser interpretado o artigo 390º, em coerência com a unidade do sistema, não só do Código do Trabalho, mas mais além dele, dos princípios gerais do Direito Civil para que o artigo 389º do CT remete.”.

Como escrevemos no acórdão de 21.01.2019, o ressarcimento dos danos patrimoniais e não patrimoniais decorrentes de despedimento ilícito está previsto no artigo 389.º, n.º 1, al. a) do CT, mas “o legislador laboral não prevê qualquer tratamento distinto em relação ao regime geral”.
Assim, considerando os princípios gerais do Direito Civil, o dano patrimonial –quer o dano emergente ou o lucro cessante - deve ser avaliado caso a caso, em função da sua concretização pelo credor na causa de pedir, face ao facto ilícito que tenha invocado para o sustentar. Ou seja, cabe ao trabalhador alegar, e provar, os factos e/ou as circunstâncias com base nos quais pede o concreto dano patrimonial.
No caso dos autos, a autora limitou-se a alegar na contestação/reconvenção que o valor do “subsídio de alimentação era de € 95.4 em cada um dos meses de junho, julho e agosto de 2018” – cf. artigo 70.º, alínea b) da contestação/reconvenção.
Por outro lado, a autora acordou, no contrato de trabalho que celebrou com a ré, em 11 de abril de 2017, que receberia a quantia de € 4,52 a título de subsídio de refeição, por cada dia útil de trabalho efectivo - cf. ponto 9 dos factos provados.
Neste particular, escrevemos no citado acórdão de 21.01.2019:
“(…), comunicada ao trabalhador, pelo empregador, a decisão de despedimento, a lei laboral ficciona a total suspensão de facto do contrato de trabalho existente entre ambos, até à decisão judicial transitada que for proferida no âmbito da acção de impugnação de despedimento que, entretanto, o trabalhador, eventualmente, intentar.
(…), tomando em consideração essa circunstância - a total suspensão de facto do contrato de trabalho -, após a comunicação ao trabalhador, pelo empregador, da decisão de despedimento, não podemos concordar com o decidido na primeira instância sobre o reconhecimento do direito, à autora, a receber o valor do custo da refeição do almoço no período compreendido de (…).
Na verdade, no caso em apreço, constituindo o almoço, fornecido pelo réu, uma contrapartida em espécie - sem natureza retributiva -, pela prestação efectiva de trabalho, não tendo a autora prestado trabalho, não lhe assiste o direito a receber o valor equivalente ao dito almoço”. – fim de citação.
Em resumo: não tendo o subsídio de alimentação natureza retributiva e não tendo a autora alegado, nem provado, qualquer outro facto ou circunstância, para efeito de avaliação do concreto dano patrimonial sofrido, para além do que consta no contrato de trabalho, não lhe é devido o subsídio de alimentação, no valor de € 4,52, durante o período da suspensão de facto do contrato de trabalho – entre 31.05.2018, data do despedimento, e o trânsito da sentença recorrida -, precisamente, porque acordou com a ré que apenas lhe era devido em caso de “trabalho efectivo”.
Em conclusão: o recurso da ré/recorrente improcede na parte relativa à impugnação da matéria de facto, mas procede na parte referente ao subsídio de alimentação.

5. - Recurso ampliado da autora.
5.1. - O artigo 636.º - Ampliação do âmbito do recurso a requerimento do recorrido – do CPC, dispõe:
1 - No caso de pluralidade de fundamentos da ação ou da defesa, o tribunal de recurso conhece do fundamento em que a parte vencedora decaiu, desde que esta o requeira, mesmo a título subsidiário, na respetiva alegação, prevenindo a necessidade da sua apreciação.”.
2 - Pode ainda o recorrido, na respetiva alegação e a título subsidiário, arguir a nulidade da sentença ou impugnar a decisão proferida sobre pontos determinados da matéria de facto, não impugnados pelo recorrente, prevenindo a hipótese de procedência das questões por este suscitadas.”.
5.2. - Nos pontos 14. a 16. das conclusões de recurso, a recorrida/autora alegou:
“14. Quanto ao pedido de Indemnização em substituição da reintegração - requer-se a alteração da sentença recorrida, quanto à alínea b) da Decisão, no sentido de ser fixada a indemnização em substituição da reintegração, quer porque a mesma é pedida pela trabalhadora, que não apresenta atualmente condições físicas nem psíquicas necessárias e adequadas para tal reintegração (…)”, quer porque,
“15. A própria Recorrente-Ré também requereu a Vossas Excelências a alteração da sentença recorrida nessa parte, atente-se ao ponto 19 das Conclusões da Recorrente, em que esta requereu que se fixe em 15 dias a eventual indemnização de antiguidade em substituição da reintegração.
16. Existe assim acordo entre as partes em litígio, Recorrente/Ré e Recorrida/Autora, no sentido de ambas pretenderem e requererem a fixação de uma indemnização em substituição da reintegração, por virtude do art.º 391.º ou 392.º do Código do Trabalho (…).”.
Na contestação/reconvenção, a autora, além do mais, pediu:
Deve a ré ser condenada:
b) Na reintegração da Autora, ou, caso esta opte pela indemnização, no pagamento da mesma, a ser calculada de acordo com o limite máximo de 45 dias e com base da remuneração mensal de €1.583,89 a que corresponde o montante de €2.374,50; (negrito nosso)
c) No pagamento dos direitos indisponíveis supra identificados e melhor discriminados nas alíneas a) a f) do art.º 65.º, num montante global de €17.210,61;”.
A sentença recorrida decidiu:
“b)- condenar a Ré a reintegrar a A. na empresa, sem prejuízo da sua categoria e antiguidade;”.
Em requerimento de rectificação da sentença, a autora pediu:
“No entanto, foi referido pela mandatária da Autora, em sede de alegações finais, que a Autora pretende em primeiro lugar e preferencialmente o ressarcimento ou indemnização pelo seu despedimento ilícito, cumprindo o preceituado no n.º 1 do art.º 391.º do Código do Trabalho – conforme alegações finais da mandatária da Autora, gravadas através do sistema integrado de gravação digital, disponível na aplicação informática do tribunal do dia 13 de dezembro de 2018, com início pelas 14:09h até às 14:33h, mais concretamente a partir do minuto 27 e 5 segundos até ao minuto 27 e 32 segundos.
Pelo que, requer-se a rectificação da sentença, considerando que a trabalhadora efectivamente optou, nos termos do n.º 1 do art.º 391.º do Código do Trabalho, pela indemnização em substituição da reintegração, e consequentemente decidindo condenar a Ré no pagamento da referida indemnização, a ser calculada pelo limite máximo previsto por lei, a fixar nos 45 dias por cada ano de trabalho, atendendo ao grau de ilicitude/má-fé do despedimento, conforme peticionado no ponto 68 da Contestação da Autora, e ainda ser calculada tendo em conta a remuneração mensal base somada à média das remunerações variáveis dos prémios de desempenho, conforme peticionado na alínea h) dos “III – Dos Direitos Indisponíveis” da Contestação”.
No consequente despacho, foi consignado:
“Quanto à questão da reintegração: ouvida de novo a gravação contendo as alegações finais proferidas pela ilustre mandatária da A., atento o por si alegado no requerimento em apreço, reafirmamos que a sentença não padece de qualquer inexatidão no que a esse particular respeita. De facto, nessas alegações a A. não optou preferencialmente pela indemnização, pedindo sim o ressarcimento de uma indemnização como foi peticionado ou a sua reintegração; e só se o empregador optar por não reintegrá-la (que a mesma alega poder acontecer em determinadas circunstâncias) é que pede a indemnização.
Ora, o empregador não alegou nem fez prova de nenhum dos requisitos legais previstos no artigo 392º, nº1, do CT, que permitissem ao tribunal excluir a reintegração da trabalhadora, pelo que não tendo a trabalhadora optado pela indemnização, deve ser reintegrada. Nenhum lapso, e muito menos manifesto, se verifica a esse propósito na sentença.”.
5.3. - Nos pontos 17. a 22. das conclusões de recurso, a autora pugna pela alteração das alíneas c) e d) da parte decisória da sentença recorrida, requerendo que “na retribuição sejam incluídas as mencionadas comissões mensais, nos termos do n.º 3 do art.º 261.º do CT, e consequentemente alterado o valor calculado a título de pagamento de férias e subsídio de férias já vencidos e de proporcionais de férias, subsídio de férias e de Natal, nos termos do n.º 2 do art.º 264.º e 263.º do CT”, e que nela sejam incluídos os proporcionais de férias, subsídio de férias e de Natal desde o início do ano de 2018 (01-01-2018) até à data 30-05-2018, data efectiva do despedimento, em obediência ao artigo 245.º n.º 1, alínea b) do Código do Trabalho, calculados em função da retribuição fixada em respeito pelo n.º 3 do art.º 261.º do Código do Trabalho.
Nesta parte, a sentença recorrida consignou:
“No caso dos presentes autos foi o A. despedida a 31-05-2018, sendo que a acção foi proposta no dia 22-06-2018. Assim, tem a A. direito às retribuições que deixou de auferir, no valor mensal de €920,00, desde 31-05-2017 até ao trânsito em julgado da presente decisão, deduzindo-se o montante do subsídio de desemprego que entretanto haja recebido, a liquidar em execução de sentença, nos termos expressamente previstos no artigo 390º, nº1 e 2, c), do Código do Trabalho.
A retribuição mensal deve calcular-se por referência ao valor da remuneração mensal ilíquida contratualmente prevista de €920,00, excluindo-se o subsídio de alimentação e os prémios de desempenho, não incluídos na retribuição (cfr. artigos 258º e 260º, alínea c) do CT).”.
5.4. – Nos pontos 23. a 25. das conclusões de recurso, a autora alega que “deverá ser alterada a decisão recorrida por forma à Ré ser também condenada no pagamento à Autora de uma indemnização pelos danos não patrimoniais, em valor não inferior a €2.000,00, dois mil euros, conforme peticionado inicialmente, mas que atenda também aos danos não patrimoniais futuros, que continuam a verificar-se até ao momento do cumprimento pela Ré da decisão judicial, após a mesma transitar em julgado.”.
Nesta parte, a sentença recorrida concluiu:
“(…). Com efeito, no enquadramento factual apurado, não cremos que a lesão possa ser considerada grave e para além daquela que sempre acontece em situações similares de despedimento, razão pela qual se considera improcedente o pedido da Autora no que se reporta ao pedido de indemnização por danos não patrimoniais.”.
5.5. - A questão da “indemnização em substituição da reintegração” não está incluída no objecto do recurso principal da ré, embora nas conclusões de recurso tenha dito, por mera hipótese: “19 – Sem que, no entanto e sem conceder, em caso de a hipótese ser outra no entendimento desse respeitado Tribunal “ad quem”, em face das circunstâncias e tendo em atenção o disposto no art.º 391.º n.º 1 do CT, fixar-se em 15 dias a eventual indemnização de antiguidade”.
Assim, nos termos descritos, a autora só poderia ver satisfeita tal pretensão por via de recurso próprio, e não no âmbito do recurso apresentado pela ré.
Do mesmo modo, a questão do valor da retribuição base mensal da autora e da inclusão dos “prémios/comissões de desempenho” nas retribuições intercalares também não está incluída no objecto do recurso principal da ré, e nem podia estar, já que a sentença lhe é favorável, nesta parte. E sobre o valor da retribuição base mensal, consta do ponto 9.º dos factos provados – contrato de trabalho subscrito pela autora - que era de € 920,00.
De igual modo, a questão dos danos não patrimoniais também não consta do objecto do recurso principal da ré, pela simples razão de que também, nesta parte, a sentença lhe é favorável.
Assim sendo, à autora só restava apresentar recurso próprio e não usar o mecanismo processual da ampliação, previsto no citado artigo 636.º, por não verificado o pressuposto da prevenção, isto é, a apreciação do objecto da ampliação, no recurso principal da ré, precisamente, porque todas essas questões da ampliação não constam do seu objecto.
Em conclusão: pelos fundamentos expostos, não se admite a ampliação do âmbito do recurso apresentado pela ré.

IV.Decisão
Atento o exposto, acordam os juízes, que compõem esta Secção Social do Tribunal da Relação do Porto, em julgar o recurso da ré parcialmente procedente, na parte relativa ao subsídio de alimentação, e, em consequência, revogar a alínea f) da parte decisória da sentença recorrida.
No mais, é confirmada a sentença.
As custas são a cargo da autora e da ré, na proporção de 15% e 85%, respectivamente.

Porto, 4 de Novembro de 2019
Domingos Morais
Paula Leal de Carvalho
Jerónimo Freitas