Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
10526/19.7T8PRT-A.P1
Nº Convencional: JTRP000
Relator: MANUEL DOMINGOS FERNANDES
Descritores: PROCEDIMENTOS CAUTELARES
REMANESCENTE DA TAXA DE JUSTIÇA
Nº do Documento: RP2020011310526/19.7T8PRT-A.P1
Data do Acordão: 01/13/2020
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: REVOGADA
Indicações Eventuais: 5ª SECÇÃO
Área Temática: .
Sumário: I - Nos procedimentos cautelares a taxa de justiça devida é determinada de acordo com a tabela II anexa ao RCP, atenta a regra especial estabelecida no artigo 7.º, n.º 4, do mesmo diploma.
II - Assim, não obstante o estatuído no artigo 6.º, n.º 2, ou ainda no artigo 7.º, n.º 2, do RCP, regras previstas para recursos em processos sujeitos à tabela I anexa ao citado diploma, nos procedimentos cautelares, em primeira instância e em sede de recurso, não há lugar ao pagamento do remanescente da taxa de justiça previsto na tabela I anexa ao RCP.
Reclamações:
Decisão Texto Integral: Processo nº 10.526/19.7T8PRT.P1-Apelação
Origem: Tribunal Judicial da Comarca do Porto - Juízo Central Cível de Vila Nova de Gaia-J3
Relator: Manuel Fernandes
1º Adjunto Des. Miguel Baldaia
2º Adjunto Des. Jorge Seabra
Sumário:
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I - RELATÓRIO
Acordam no Tribunal da Relação do Porto:
B…, S.A., com sede na Av. …, ... Lisboa, intentou o presente procedimento cautelar não especificado contra C…, S.A., com sede na Rua …, nº. …, …, Vila Nova de Gaia pedindo que se ordene a cessação da actividade de servicing da requerida, a qual consubstancia uma conduta de concorrência desleal para com a requerente.
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Por despacho datado de 24/05/2019 foi a referida providência liminarmente indeferida.
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A requerente tendo sido notificada da conta de custas veio dela reclamar por entender que nos procedimentos cautelares, quer em primeira instância, quer em sede de recurso, não é aplicável o disposto no artigo 6.º do Regulamento das Custas Processuais, mas antes o disposto no artigo 7.º, nº4, com referência à Tabela II, do mesmo diploma.
Conclui que, assim sendo, mesmo que (como no caso dos autos) o valor do procedimento exceda os €300.000,01, a taxa de justiça é sempre de 8 UC, não prevendo a lei qualquer taxa adicional ou remanescente, pelo que a conta deve ser reformada, em conformidade.
Caso assim não se entenda, pretende que, sob pena de violação da Constituição da República Portuguesa, deverá ser dispensada do pagamento do remanescente da taxa de justiça no recurso, atento o princípio da proporcionalidade face à reduzida complexidade da decisão, sendo certo que só não apresentou tal pedido em momento anterior, porque considerou que o pagamento daquele remanescente não é aplicável aos procedimentos cautelares.
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A Exª Sr.ª Escrivã de Direito defendeu a legalidade da conta, por entender que a mesma foi elaborada de acordo com os impulsos processuais da parte (acção + recurso).
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O Ministério Público defendeu que aos procedimentos cautelares é aplicável, em todas as instâncias, a Tabela II do Regulamento das Custas Processuais, por via do respectivo artigo 7.º, nº 4.
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Datado de 07/10/2019 foi exarado o seguinte despacho:
De acordo com o art. 7º nº4 do Regulamento das Custas Processuais, a taxa de justiça devida pelos (…) procedimentos cautelares é determinada de acordo com a tabela II, que faz parte integrante do Regulamento. Ora, sendo o valor do presente procedimento cautelar de €2.644.950,00, resulta daquela Tabela II que a taxa de justiça devida é de 8 UC.
Porém, aquele art. 7º nº4 apenas se aplica à decisão proferida em 1ª instância, porque o Regulamento das Custas Processuais tem uma norma específica para os recursos, que é o nº 2, do mesmo art. 7º. Prevê este nº2 que nos recursos (seja, de acção, seja de incidente, seja de procedimento cautelar) a taxa de justiça é fixada nos termos da Tabela I-B (cfr. Ac. STJ de 18/1/2018, proc. 7831/16, disponível na internet, em http://www.dgsi.pt). Assim, em conformidade com esta tabela, a taxa de justiça devida pelo recurso interposto pela requerente é de 8 UC, a que acrescem, a final, 1,5 UC por cada €25.000,00 ou fracção que excedam o valor de €275.000,00. É, precisamente, o que consta da conta elaborada, pelo que esta não enferma de qualquer erro ou lapso.
Quanto ao pedido de dispensa do pagamento daquele remanescente, é de considerar que o mesmo, tendo sido apresentado após a elaboração e notificação da conta, é extemporâneo. Com efeito, não constando da condenação em custas proferida pelo Tribunal da Relação que fosse aplicável a Tabela II do Regulamento das Custas Processuais, não poderia a requerente ter assumido que iria ser aplicada tal tabela. Cabia-lhe, pois, ter pedido a dispensa antes de elaborada a conta, nomeadamente, mediante pedido de reforma do segmento do acórdão que se refere sem excepções à responsabilidade pelas custas, não podendo aguardar pela elaboração da conta, até porque o incidente de reclamação se destina a reformar a conta que “não estiver de harmonia com as disposições legais” (art.º 31º nº 2 do RCP) ou a corrigir erros materiais ou a elaboração de conta efectuada pela secretaria sem obedecer aos critérios definidos no art.º 30º nº 3 do mesmo diploma - cfr. Ac. STJ de 13/7/2017, proc. 669/10, e RC de 15/5/2018, proc. 3582/16, disponíveis na internet, em http://www.dgsi.pt. E, como se refere naquele Ac. do STJ (para cuja fundamentação se remete e que aqui se dá por reproduzida), não existe qualquer inconstitucionalidade na interpretação que preconizamos [designadamente, não existe qualquer violação dos arts. 2º, 13º, 18º nº2 e 20º da Constituição da República Portuguesa, citados pela requerente], porque não se trata de saber se é possível a redução do valor da taxa de justiça a pagar, por via da dispensa ou redução do pagamento do remanescente, a final - essa possibilidade resulta, de forma inequívoca, da redacção actual do n.º 7 do artigo 6.º do Regulamento das Custas Processuais e não está a ser negada por falta de base legal, mas sim por extemporaneidade do pedido. Ora, a requerente, ponderando as correntes jurisprudenciais, podia e devia ter contado com a interpretação agora afirmada e teve várias oportunidades, ao longo do processo, para requerer o ajustamento do valor da taxa de justiça àquilo que entende ter sido a sua actividade processual, designadamente, até ao trânsito em julgado do acórdão do Tribunal da Relação.
Se não o fez, é necessário fazer funcionar os princípios da certeza e segurança jurídicas, que são tutelados precisamente pelos mesmos arts. 2º, 13º e 20º da Constituição da República Portuguesa.
Por tudo o exposto, indefere-se o requerido”.
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Não se conformando com o assim decidido veio a requerente interpor o presente recurso, concluindo pelo seu provimento em extensas conclusões que aqui nos abstemos de reproduzir.
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O Ministério Público teve vista nos autos pugnando que aos procedimentos cautelares é aplicável, em todas as instâncias, a Tabela II do Regulamento das Custas Processuais, por via do respectivo artigo 7.º, nº 4 e que, portanto, o recurso devia ser provido nesta parte, mas se assim não se entender concluiu pelo não dispensa do remanescente do pagamento da taxa de justiça.
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Foram dispensados os vistos.
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II - FUNDAMENTOS
O objecto do recurso é delimitado pelas conclusões da alegação do recorrente, não podendo este Tribunal conhecer de matérias nelas não incluídas, a não ser que as mesmas sejam de conhecimento oficioso - cfr. artigos 635.º, nº 4, e 639.º, nºs 1 e 2, do C.P. Civil.
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No seguimento desta orientação são duas as questões que importa apreciar e decidir:
a)- saber se nos procedimentos cautelares, quer em primeira instância, quer em sede de recurso é, ou não, aplicável o disposto no artigo 6.º do Regulamento das Custas Processuais, mas antes o disposto no artigo 7.º, nº4, com referência à Tabela II, do mesmo diploma;
b)- subsidiariamente de devia, ou não, ser a recorrente dispensada do pagamento do remanescente da taxa de justiça.
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A) - FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO
A dinâmica factual a ter em conta para a apreciação das supra referidas questões é a que resulta do relatório supra e que aqui se dá integralmente por reproduzida.
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III. O DIREITO
Como supra se referiu é apenas uma a questão que cumpre apreciar e decidir:
a) - saber se nos procedimentos cautelares, quer em primeira instância, quer em sede de recurso é, ou não, aplicável o disposto no artigo 6.º, nº 7 do Regulamento das Custas Processuais, mas antes o disposto no artigo 7.º, nº 4, com referência à Tabela II, do mesmo diploma.
Como se evidencia da decisão recorrida aí se entendeu que o artigo 7.º, nº 4 apenas se aplica à decisão proferida em 1ª instância, uma vez que o Regulamento das Custas Processuais (RCP) tem uma norma específica para os recursos, que é o nº 2, do mesmo inciso onde se estatui que nos recursos (seja, de acção, seja de incidente, seja de procedimento cautelar) a taxa de justiça é fixada nos termos da Tabela I-B.
Deste entendimento dissente a recorrente para quem o nº 4 do citado artigo 7.º se aplica quer às decisões da primeira instância quer aos recursos dos incidentes e procedimentos cautelares, procedimentos de injunção, incluindo os procedimentos europeus de injunção de pagamento, procedimentos anómalos e execuções, ou seja, em todas estas situações a taxa de justiça é determinada de acordo com a tabela II.
Quid iuris?
Como é sabido, a obrigação tributária respeitante a processos judiciais compreende a taxa de justiça, os encargos e as custas de parte, conforme se preceitua nos artigos 1.º, n.º 1, e 3.º, n.º 1, do RCP, aprovado pelo Dec.-Lei n.º 34/2008, de 26-02, com as sucessivas alterações, nomeadamente a introduzida, com republicação, pela Lei n.º 7/2012, de 13-02, e se define no artigo 529.º do CPC.[1]
O regime legal dessa obrigação tributária complexa encontra-se estabelecido numa parte substancial no referido Regulamento e em menor parte, no concernente aos processos cíveis, nalgumas disposições do CPCivil.
De tal Regulamento consta, no que aqui releva, o quadro normativo sobre a fixação da taxa de justiça e sobre o modo de liquidação das custas. Por sua vez, o CPCivil contém a disciplina relativa à determinação dos responsáveis pelas custas e à repartição dessa responsabilidade em função do julgado, como se alcança dos respectivos artigos 527.º a 541.º.
Desde logo, convém reter que, segundo os artigos 6.º, n.º 1, do RCP e 529.º, n.º 2, do CPC, a taxa de justiça consiste no montante devido pelo impulso processual de cada interveniente e é fixada em função do valor e complexidade da causa nos termos daquele Regulamento.
De acordo com o n.º 2 do artigo 1.º do mesmo Regulamento, a tributação processual incide sobre cada processo autónomo tributável, considerando-se, para tal efeito, cada acção, execução, incidente, procedimento cautelar ou recurso, corram ou não por apenso.
Nesta base, a taxa de justiça encontra-se fixada, nas tabelas anexas àquele Regulamento, sendo expressa com referência à unidade de conta processual (UC), hoje equivalente a € 102,00, consoante as espécies processuais tributáveis e, em regra, de forma progressivamente escalonada em patamares delimitados por determinados valores da causa.
Postos estes breves considerandos e no que aqui releva estatui o artigo 6.º do RCP, sobre a epígrafe “Regras gerais” que:
1 - A taxa de justiça corresponde ao montante devido pelo impulso processual do interessado e é fixada em função do valor e complexidade da causa de acordo com o presente Regulamento, aplicando-se, na falta de disposição especial, os valores constantes da tabela i-A, que faz parte integrante do presente Regulamento.
2 - Nos recursos, a taxa de justiça é sempre fixada nos termos da tabela i-B, que faz parte integrante do presente Regulamento.
(…)
7 - Nas causas de valor superior a (euro) 275.000, o remanescente da taxa de justiça é considerado na conta a final, salvo se a especificidade da situação o justificar e o juiz de forma fundamentada, atendendo designadamente à complexidade da causa e à conduta processual das partes, dispensar o pagamento”.
Ora, perscrutada a tabela I anexa ao RCP, dela se extrai alcança a especificação das Unidades de Conta devidas, consoante o valor da acção, em euros, por tranches e até ao montante de €275.000,00 abrangendo 3 tipos de situações, agrupadas nas colunas A, B ou C, versadas nos artigos 6.º, n.ºs 1, 2 e 5, 7.º, n.ºs 2 e 3, 12.º, n.º 1 e 13.º, n.ºs 3 e 7, do RCP.
O artigo 7.º do mesmo RCP preceitua por sua vez, sob a epígrafe “Regras especiais” que:
1 - A taxa de justiça nos processos especiais fixa-se nos termos da tabela i, salvo os casos expressamente referidos na tabela ii, que fazem parte integrante do presente Regulamento.
2 - Nos recursos, a taxa de justiça é fixada nos termos da tabela i-B e é paga pelo recorrente com as alegações e pelo recorrido que contra-alegue, com a apresentação das contra-alegações.
3 - Nos processos de expropriação é devida taxa de justiça com a interposição do recurso da decisão arbitral ou do recurso subordinado, nos termos da tabela i-A, que é paga pelo recorrente e recorrido.
4 - A taxa de justiça devida pelos incidentes e procedimentos cautelares, pelos procedimentos de injunção, incluindo os procedimentos europeus de injunção de pagamento, pelos procedimentos anómalos e pelas execuções é determinada de acordo com a tabela ii, que faz parte integrante do presente Regulamento.
5 - Nas execuções por custas, multas ou coimas o executado é responsável pelo pagamento da taxa de justiça nos termos da tabela ii.
6 - Nos procedimentos de injunção, incluindo os procedimentos europeus de injunção de pagamento, que sigam como acção, é devido o pagamento de taxa de justiça pelo autor e pelo réu, no prazo de 10 dias a contar da data da distribuição, nos termos gerais do presente Regulamento, descontando-se, no caso do autor, o valor pago nos termos do disposto no n.º 4.
7 - Quando o incidente ou procedimento revistam especial complexidade, o juiz pode determinar, a final, o pagamento de um valor superior, dentro dos limites estabelecidos na tabela ii.
8 - Consideram-se procedimentos ou incidentes anómalos as ocorrências estranhas ao desenvolvimento normal da lide que devam ser tributados segundo os princípios que regem a condenação em custas”.
Respigando o conteúdo destas duas normas dele deflui que nos processos especiais, nos casos não especificamente previstos na tabela II, a taxa de justiça devida fixa-se com base na tabela I, sendo certo que, tratando-se de recursos, a taxa de justiça é reduzida a metade do valor da acção propriamente dita (cfr. coluna A e coluna B da tabela I).
Por outro lado a tabela II referida no artigo 7.º do RCP comporta a indicação das Unidades de Conta quer em taxa de justiça normal quer em taxa de justiça agravada por espécie de procedimento ou incidente, sendo que, no que tange a procedimentos cautelares, prevê a taxa de justiça normal de 3 UC naqueles cujo valor se cifre até €300.000 e a taxa de justiça normal de 8 UC naqueles cujo valor seja igual ou superior a €300.000,01; aos procedimentos cautelares de especial complexidade são indicadas 9 a 20 UC. Regime este que, por certo, leva em linha de conta o carácter em regra mais simplificado e menos complexo dos procedimentos e incidentes enunciados no artigo 7.º, n.º 4, do RCP.
A questão que agora se coloca é se o artigo 7.º, nº 2 se aplica aos recursos em todos os processos previstos no artigo 7º ou se, fora do seu âmbito, estão os previstos na parte final do seu nº 1 e elencados no seu nº 4, isto é, incidentes, procedimentos cautelares e processos de injunção (incluindo os procedimentos europeus de injunção de pagamento), procedimentos anómalos e processos de execução.
Na decisão recorrida propendeu-se para o entendimento que o artigo 7.º, nº 2 do RCP se aplica a todos os processos referidos neste preceito inclusive os referidos no seu nº 4.
Numa primeira leitura é possível defender tal interpretação, todavia, não cremos que esta seja a interpretação correcta do citado inciso.
Importa, desde logo, enfatizar que a citada norma contempla no seu âmbito as “regras especiais” enquanto o artigo 6.º do mesmo diploma se refere às “regras gerais”.
Ora, quando no artigo 6.º, nº 2 se estipula que “Nos recursos, a taxa de justiça é sempre fixada nos termos da tabela i-B, que faz parte integrante do presente Regulamento”, forçoso é de admitir que se refere aos recursos de decisões no âmbito do processo declarativo.
Assim sendo, como cremos que é, quando no artigo 7.º, nº 2 se refere que “Nos recursos, a taxa de justiça é fixada nos termos da tabela i-B e é paga pelo recorrente com as alegações e pelo recorrido que contra - alegue, com a apresentação das contra - alegaçõespretende abarcar no seu âmbito os recursos nos processos especiais em decorrência do estatuído no seu nº 1, isto é, que não estejam especialmente previstos na tabela II, cuja taxa de justiça, por via disso, se fixa nos termos da tabela I.
Com efeito, não faria sentido que o legislador quisesse abarcar a questão dos recursos em duas normas distintas se uma delas não fosse direccionada aos processos especiais.
Daqui decorre que o referido nº 2 do artigo 7.º, não é aplicável aos recursos interpostos dos incidentes e procedimentos cautelares, procedimentos de injunção, incluindo os procedimentos europeus de injunção de pagamento, procedimentos anómalos e execuções, pois que não sendo processos especiais é de lhe aplicar a tabela II e não já a tabela I, em consonância com o preceituado no nº 4 do artigo 7.º.
Como assim, não há, neste casos lugar a pagamento do remanescente da taxa de justiça previsto na tabela I, em consonância com o n.º 7 do artigo 6.º, que se integra nas regras gerais, razão pela qual, não se torna inócuo apreciar se é de dispensar o pagamento do remanescente, que não é, de todo, devido.
Como se diz no Ac. da Relação de Évora de 09/11/2017[2] “O acerto desta solução legal alicerça-se, desde logo, no facto de a complexidade das questões suscitadas num concreto processo não serem diversas na primeira instância e na instância recursória que, como se sabe, não conhece de questões novas (salvo questões de conhecimento oficioso); donde, não se justificaria a aplicação da tabela II aos procedimentos cautelares e a aplicação da tabela I (B) aos recursos interpostos no âmbito desses mesmos procedimentos cautelares o que culminaria no pagamento de 1,5 UC por cada tranche de €25.000,00 para além dos €275.000,00 em sede de recurso, excedendo o valor fixado para o processamento do mesmo procedimento cautelar em 1.ª instância. É que, como se demonstrou, a taxa de justiça prevista para os recursos, na tabela I, é reduzida a metade do valor previsto para a mesma acção enquanto corre termos em primeira instância.
Ora, se a concreta estrutura dos procedimentos cautelares implica na sujeição à tabela II (pois apresentam uma tramitação simplificada, assentam na análise sumária da situação de facto com vista a aferir a provável existência do direito, culminam em decisões imediatas mas provisórias) qualquer recurso que, no decurso deles, seja interposto, tendo por objecto questões neles suscitadas, apenas a essa mesma concreta tabela II pode estar sujeito”.
Evidentemente que isto não invalida que o legislador tenha pretendido eliminar a aplicação de uma taxa adicional aos processos previstos no artigo 7.º, nº4.
Efectivamente, se o incidente ou o procedimento revestirem especial complexidade[3] o juiz pode determinar, a final, o pagamento de um valor superior, dentro dos limites estabelecidos na tabela II-A, ou seja, entre 9 e 20 Uc (cfr. nº 7 do artigo 7.º), que não ocorreu.
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Destarte, tal como se defendeu no Ac. do TRE supra citado nos procedimentos cautelares, ainda que em fase de recurso, a taxa de justiça é determinada de acordo com a tabela II, pelo que não há lugar a pagamento do designado “remanescente da taxa de justiça”.
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Procedem, desta forma, as conclusões 1ª a 17ª formuladas pela recorrente e, com elas, o respectivo recurso ficando, assim, prejudicada a apreciação das demais.
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IV - DECISÃO
Pelos fundamentos acima expostos, acordam os Juízes deste Tribunal da Relação em julgar a apelação interposta procedente por provada e, consequentemente, revogam a decisão recorrida, não sendo devida pela apelante a taxa de justiça prevista no artº 6º, nº 7 do RCP.
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Sem custas.
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Porto, 13 de Janeiro de 2020.
Manuel Domingos Fernandes
Miguel Baldaia de Morais
Jorge Seabra
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[1] Lê-se no Preâmbulo do Dec.Lei n.º 34/2008, de 26 de Fevereiro, que aprovou o RCP:
“(…)
Esta reforma, mais do que aperfeiçoar o sistema vigente, pretende instituir todo um novo sistema de concepção e funcionamento das custas processuais. Neste âmbito, elimina-se a actual distinção entre custas de processo e custas de interveniente processual, cuja utilidade era indecifrável, passando a haver apenas um conceito de taxa de justiça. A taxa de justiça é, agora com mais clareza, o valor que cada interveniente deve prestar, por cada processo, como contrapartida pela prestação de um serviço.
De um modo geral, procurou também adequar-se o valor da taxa de justiça ao tipo de processo em causa e aos custos que, em concreto, cada processo acarreta para o sistema judicial, numa filosofia de justiça distributiva à qual não deve ser imune o sistema de custas processuais, enquanto modelo de financiamento dos tribunais e de repercussão dos custos da justiça nos respectivos utilizadores.
De acordo com as novas tabelas, o valor da taxa de justiça não é fixado com base numa mera correspondência face ao valor da acção. Constatou-se que o valor da acção não é um elemento decisivo na ponderação da complexidade do processo e na geração de custos para o sistema judicial.
Pelo que, procurando um aperfeiçoamento da correspectividade da taxa de justiça, estabelece-se agora um sistema misto que assenta no valor da acção, até um certo limite máximo, e na possibilidade de correcção da taxa de justiça quando se trate de processos especialmente complexos, independentemente do valor económico atribuído à causa.
(…)
[2] In www.dgsi.
[3] Dispõe o n.º 7 do artigo 530.º do CPCivil que: “Para efeitos de condenação no pagamento de taxa de justiça, consideram-se de especial complexidade as acções e os procedimentos cautelares que:
a) Contenham articulados ou alegações prolixas;
b) Digam respeito a questões de elevada especialização jurídica, especificidade técnica ou importem a análise combinada de questões jurídicas de âmbito muito diverso; ou
c) Impliquem a audição de um elevado número de testemunhas, a análise de meios de prova complexos ou a realização de várias diligências de produção de prova morosas”.