Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
112/14.3T2AND.P1
Nº Convencional: JTRP000
Relator: JOÃO PROENÇA
Descritores: DESTITUIÇÃO DE GERENTE
JUSTA CAUSA
INDEMNIZAÇÕES
Nº do Documento: RP20220517112/14.3T2AND.P1
Data do Acordão: 05/17/2022
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: REVOGADA
Indicações Eventuais: 2. ª SECÇÃO
Área Temática: .
Sumário: I - Na ação ressarcitória movida pelo gerente destituído contra a sociedade basta-lhe invocar a inexistência de justa causa.
II - Configurando a justa causa de destituição do gerente circunstância impeditiva do direito à indemnização pelo gerente destituído, cabe à sociedade o ónus da prova dos respetivos factos.
III - Constitui justa causa de destituição do gerente:
- Qualquer circunstância, facto ou situação em face da qual e segundo a boa fé, não seja exigível à sociedade a continuação da relação contratual com o seu gerente;
- Todo o facto capaz de fazer perigar o fim do contrato ou de dificultar a obtenção desse fim;
- Qualquer conduta que possa fazer desaparecer os pressupostos, pessoais ou reais, essenciais ao desenvolvimento da relação contratual societária;
- Toda a atuação que, pela sua gravidade, importe, por razões justificadas, a quebra de confiança entre a sociedade e o gerente.
IV - Na falta de estipulação contratual, o direito de indemnização implica a comprovada existência de danos, exigindo-se a demonstração, pelo lesado, de factos reveladores de que a situação real do lesado é, após a destituição, mais gravosa do que aquela em que se encontraria sem ela.
V - Só há prejuízo se o gerente não tiver oportunidade de exercer outra atividade remunerada, com idêntico nível económico, social e profissional.
Reclamações:
Decisão Texto Integral: Processo n. 112/14.3T2AND.P1 – Apelação


Acordam no Tribunal da Relação do Porto:

AA propôs contra N..., Lda., ambos com os sinais dos autos, acção de processo comum pedindo:
a) Seja declarado que a deliberação constante da acta de 28/3/2011 consubstancia uma destituição sem justa causa, quer pelo facto de não constar da referida acta as razões concretas e factuais dessa destituição, quer pelo facto das imputações constantes do relatório elaborado pelo sócio gerente Dr. BB serem vagas, imprecisas e conclusivas, para além de falsas, com as legais consequências, e
b) Seja a ré condenada a pagar ao autor uma indemnização a título de danos patrimoniais e não patrimoniais no valor de €122.000,00, a que acresce os, respectivos, juros de mora, calculados à taxa legal, desde a citação, até integral e efectivo pagamento.
Alega, para tanto, no essencial, que foi por deliberação de 30 de Novembro de 2009 nomeado gerente da ré, auferindo remuneração mensal de €2.000,00, e subsídio de férias e de Natal, e não tendo sido estipulado prazo para o exercício do cargo. Em 28/03/2011, foi destituído da gerência sem justa causa, por deliberação tomada por Assembleia Geral. Sempre exerceu de forma diligente e com zelo o cargo. Face a tal destituição, e da conjuntura económica que o país atravessava, não lhe foi possível encontrar outro emprego, a não ser noutra empresa, onde auferia a quantia de €750,00 por mês, pelo que reclama o montante indemnizatório de €112.000,00. Sentiu-se, ainda, vexado, difamado, e humilhado, com a deliberação da ré de destitui-lo sem justa causa, e de lhe ter sido retirado grande parte das suas funções durante o exercício de tal cargo até à sua destituição provocaram nele enorme ansiedade e angústia, pelo que reclama, ainda, uma indemnização de €10.000,00, por danos não patrimoniais.
Citada, a ré contestou, no essencial excepcionando a incompetência material do tribunal e a prescrição do direito indemnizatório fundado na destituição; e invocando as razões pelas quais o autor foi destituído da gerência, que considera integrarem justa causa para tal. Conclui pela improcedência da acção, pedindo ainda a condenação do autor como litigante de má-fé no pagamento de multa e indemnização.
O autor respondeu às excepções deduzidas pela ré, pugnando pela sua improcedência.
Realizou-se a audiência prévia e foi proferido despacho saneador, julgando as excepções de incompetência absoluta, em razão da matéria e de prescrição, prosseguindo com a delimitação do objecto do litígio e enunciação dos temas da prova.
Realizada a audiência de julgamento, foi proferida sentença, que decidiu:
I) julgar a acção improcedente, por não provada, e consequentemente absolveu a ré do pedido.
II) julgar o incidente de litigância de má-fé do autor deduzido pela ora ré improcedente e, consequentemente, absolvendo o autor da pretensão incidental.
Inconformado, interpôs o autor recurso de apelação da decisão, formulando as seguintes conclusões:
1) Na sentença, ora em crise, na parte decisória, o Tribunal a quo decidiu julgar a acção improcedente por não provada e consequentemente absolver a ré do pedido, com custas a suportar pelo autor.
2) Contudo, na acção o autor deduziu dois pedidos, pedidos esses que foram analisados autonomamente pelo Tribunal a quo.
3) Sendo que, quanto ao primeiro pedido – a Destituição sem justa causa -, o Tribunal considerou e decidiu que o autor foi destituído sem justa causa.
4) Ora, e com o devido respeito, a sentença, ora em crise, é nula porquanto decide pela improcedência da acção, quando, na sua fundamentação, julgou procedente o primeiro pedido do autor, isto é, que o mesmo foi destituído sem justa causa.
5) Ao julgar a destituição sem justa causa, o Tribunal a quo teria de julgar a acção parcialmente procedente por provada, responsabilizando o autor, apenas, pelas custas na proporção do seu decaimento, o que não fez.
6) Termos em que a sentença é nula, nos termos do disposto na al. c) do nº 1 art. 615º do CPC, uma vez que os seus fundamentos estão em oposição com a decisão.
7) Nulidade que se arguiu e que deve ser julgada procedente e consequentemente ser alterada a parte decisória, em consonância com os fundamentos da sentença, ora em crise, com as legais consequências, nomeadamente que o Tribunal ad quem decida ele próprio, nos termos do disposto no art. 665º do CPC proferir a decisão definitiva corrigida, porquanto esta acção corre há 7 anos, inexplicavelmente, no Tribunal a quo.
8) Além disso, vem o Recorrente recorrer, com reapreciação da matéria de facto, da sentença que decidiu julgar a acção improcedente por não provada, nomeadamente quanto ao pedido indemnizatório deduzido pelo autor/Recorrente, em virtude de ter considerado que o autor não provou que a destituição lhe causou prejuízos.
9) Em primeiro lugar, o Recorrente requer a reapreciação da motivação ao ponto XVIII dos factos dados como não provados, em virtude da violação do disposto no nº 4 do art. 607º do CPC.
10) No caso da sentença, ora em crise, nomeadamente quanto à fundamentação da matéria de facto, verifica-se uma violação do dever de fundamentação, porquanto não resulta da mesma uma justificação sobre os motivos da decisão, nomeadamente com a indicação concreta por que razão deu mais credibilidade a uns depoimentos e não a outros, que prova mais valorou, etc.
11) A sua fundamentação, na sua maior parte, é genérica, sem concretizar a que depoimentos se refere, porque motivo são ou não credíveis uns depoimentos e outros não.
12) A motivação do ponto XVIII é contraditória com a decisão, pois, por um lado não concretiza que depoimentos não se mostraram espontâneos, assertivos e objectivos,
13) Bem como não se entende a motivação na parte em que refere que os factos provados não são demonstrativos que o autor desempenhou cabalmente as suas funções na ré e que as razões invocadas na assembleia para a destituição eram falsas e inverdadeiras,
14) Concluindo não ser possível presumir, com recurso a regras de experiência comum que o autor se sentisse vexado, humilhado e difamado no seu bom nome, imagem, reputação.
15) Salvo o devido respeito, que é muito, não se entende, de todo, esta motivação.
16) Alguém que é nomeado gerente, por tempo indeterminado, de repente é acusado de não exercer correctamente as suas funções, que é destituído com fundamento em justa causa, provando-se, a posteriori, nomeadamente em sede judicial, que os motivos invocados não se enquadram no conceito de justa causa,
17) Tal não é suficiente para presumir, naturalmente, com recurso às regras da experiência comum, que o Recorrente se sentiu vexado, humilhado e difamado no seu bom nome, imagem e reputação durante todo o processo da destituição encetada pela Recorrida? Se não for, então nada o será!
18) Aliás, ao decidir que a destituição encetada pela Recorrida foi sem justa causa, não pode o Tribunal a quo afirmar que os factos provados não demonstram que o Recorrente desempenhou cabalmente as suas funções na ré.
19) Tal afirmação é totalmente contraditória com a decisão de julgar a destituição sem justa causa.
20) Termos em que se considera, face ao supra exposto, que a motivação da matéria de facto não cumpre o disposto no nº 4 do art. 607º do CPC, quanto aos pontos supra referidos.
21) Uma vez que não permite perceber quais os meios de prova que, em concreto, e relativamente à matéria de facto supra referida, terá sido ou não determinante para convencer o Tribunal a quo a dar como provado ou não provado determinados factos, para além da contradição existente entre a fundamentação e a decisão.
22) Ora, uma das funções da fundamentação da decisão de facto reside precisamente em facilitar o reexame da causa pelo tribunal superior.
23) O que, no caso dos presentes autos, parece se encontrar inviabilizada, cabendo ao Tribunal ad quem reapreciar este ponto, dando-o como provado, com as legais consequências.
24) O Recorrente, vem, igualmente, requerer a reapreciação dos pontos 22, 41, 8 dos factos provados e II e XVIII dos não provados.
25) Em primeiro lugar, verifica-se uma repetição dos factos dados como provados, nomeadamente os pontos 22 e 41, que têm a mesma redacção, apenas havendo uma diferença quanto a datas: 8 e 9 de Março de 2010.
26) Termos em que deve ser eliminado o ponto 41, dada a repetição, com as legais consequências.
27) O Tribunal a quo deu como provado o ponto 8, dando como não provado o ponto II, o que não se pode aceitar dada a contradição existente.
28) Ora, se em 15/11/2010, o sócio-gerente afirma que o autor/Recorrente tem exercido a sua função em termos idênticos aqueles que o nortearam desde a sua nomeação, terá, forçosamente, de se concluir que estava a cumprir as suas funções sem reparo dos sócios.
29) É uma conclusão lógica e decorre das regras de experiência comum, como é óbvio.
30) Pelo que, e em face da contradição notória, deve o ponto II dos factos não provados ser julgado como provado, com as legais consequências.
31) O Tribunal a quo considerou, igualmente, como não provado o ponto XVIII, decisão que não se pode aceitar.
32) E, nesse sentido veja-se o depoimento da testemunha CC, prestado no dia 6/2/2019, ficheiro 20190206110740, de 8:20 a 8:54 e de 11:18 a 12:41.
33) Contrariamente ao constante da motivação, ora em crise, foi feita a prova que o autor se sentiu humilhado e vexado no seu bom nome, reputação e imagem, conforme resulta do depoimento desta testemunha, que afirmou que o autor/recorrente ficou desorientado com a decisão de despedimento com os motivos nela invocados, tendo ficado muito em baixo.
34) Além disso, e apesar de não existir qualquer referência ao depoimento da testemunha DD, pai do ora Recorrente, a verdade é que o mesmo afirmou que o filho, ora Recorrente, necessitou de ajuda psicológica especializada, para além de todo o apoio da família.
35) Alias, ainda afirmou que, apesar de ter sido necessária ajuda monetária, o autor necessitou de ajuda dos familiares para o apoiarem nesta fase difícil que atravessou.
36) E, nesse sentido veja-se o depoimento da testemunha DD, prestado no dia 6/2/2019, no ficheiro 20190206103301, de 16:58 a 19:48.
37) O Tribunal a quo não pode vir afirmar que não foi feita a prova de que o autor se sentiu vexado, humilhado e difamado.
38) Alguém que é acusado de algo que não praticou, tem de se sentir, forçosamente, humilhado, vezado e difamado, ainda para mais quando tais factos não são dados como provados.
39) Utilizando uma regra da experiência comum, “quem não se sente não é filho de boa gente”!
40) Obviamente que o autor/Recorrente, perante o modus operandi da ré, sentiu-se humilhado, vexado, difamado, uma vez que foi acusado da prática de factos que não os praticou.
41) Perante quer os colaboradores da Empresa, perante a família e perante terceiros, o Recorrente sentiu-se humilhado, tendo ficado desorientado, necessitando de apoio psicológico.
42) Pelo que, não se entende qual o motivo para o Tribunal a quo não ter tido em conta esta parte dos depoimentos supra transcritos e muito menos porque não os considerou credíveis.
43) Nestes termos, deve o ponto XVIII dos factos não provados ser dado como provado, com a seguinte redacção “Com a decisão da ré, o autor sentiu-se vexado, humilhado e difamado no seu bom nome, imagem e reputação, porquanto a deliberação social da sua destituição assente em factos inverdadeiros deixou-o desorientado, triste e angustiado, tendo necessitado de apoio psicológico, bem como de apoio familiar”, com as legais consequências.
44) Em conclusão, deve a sentença, ora em crise, ser revogada e consequentemente, ser alterada a seguinte matéria de facto, nos seguintes termos:
a) Por repetição dos pontos 22 e 41 dos factos provados, ser eliminado o ponto 41;
b) Em face do teor do ponto 8 dos factos provados, deve ser dado como provado o ponto II dos não provados;
c) O ponto XVIII dos factos não provados deve ser dado como provado, com a seguinte redacção: “Com a decisão da ré, o autor sentiu-se vexado, humilhado e difamado no seu bom nome, imagem e reputação, porquanto a deliberação social da sua destituição assente em factos inverdadeiros deixou-o desorientado, triste e angustiado, tendo necessitado de apoio psicológico, bem como de apoio familiar”.
45) No que concerne ao pedido de danos não patrimoniais, o Tribunal a quo considerou que não é devida nenhuma indemnização a esse título, uma vez que o ponto XVIII foi dado como não provado.
46) Como supra alegado, e no que concerne a esse ponto, o mesmo deve ser dado como provado, uma vez que foi feita a prova por parte do Recorrente, nomeadamente que o mesmo se sentiu humilhado, vexado e difamado com a decisão de destituição com os motivos nela invocados.
47) Os depoimentos supra transcritos são demonstrativos desse estado anímico do Recorrente, que necessitou de apoio moral, monetário e até especializado, nomeadamente psicólogo.
48) Se o Tribunal a quo deu como provado que a destituição foi sem justa causa, como pode afirmar que os factos provados não são demonstrativos que o autor desempenhou cabalmente as suas funções na ré? E que as razões invocadas na assembleia eram falsas e inverdadeiras?
49) Se considera que a destituição não é com justa causa, não pode concluir que os factos provados não são demonstrativos de um exercício cabal por parte do Recorrente, nem que as razões invocadas são falsas e inverdadeiros e, muito menos que o recorrente não se tenha sentido humilhado, vexado e difamado.
50) Ainda para mais, e como já supra demonstrado, e tendo em conta os depoimentos supra transcritos, relativamente aos quais o Tribunal a quo não lhes faz qualquer referência, ignorando-os totalmente, ficou demonstrado que o Recorrente sofreu danos com a destituição encetada pela ré/Recorrida, na qual lhe imputaram várias acusações, que vieram a demonstrar-se infundadas e que não se enquadram num conceito de justa causa.
51) E, por esse facto, considera o Recorrente que, tendo sido feita a prova necessária, deve ser ressarcido, a título de danos não patrimoniais,
52) E, consequentemente, deve a ser sentença ser revogada, no sentido de, ao dar-se como provado o ponto XVIII dos factos não provados, ser arbitrada uma indemnização, por danos não patrimoniais, no valor, pelo menos, do peticionado pelo ora Recorrente, com as legais consequências.
53) O Tribunal a quo também julgou improcedente a pretensão indemnizatória de danos patrimoniais peticionada pelo Recorrente.
54) Na sentença, ora em crise, estão dados como provados os pontos 1, 2, 3, 16, 17, 36 e 52.
55) Da motivação da sentença, ora em crise, nesta parte, entendeu o Tribunal a quo que o Recorrente não provou que a destituição lhe causou prejuízos, porquanto considera que a perda de remuneração devida pelo exercício da gerência não é prova suficiente desse prejuízo.
56) Salvo o devido respeito, não se pode aceitar esta posição do Tribunal a quo, pois, e em primeiro lugar, e como resulta da sentença, de facto, quando o Recorrente foi nomeado gerente na Recorrida, já era e continuou a ser sócio-gerente da empresa C..., na qual auferia um vencimento de 750,00€.
57) No entanto, foi, igualmente, demonstrado, através das declarações de IRS junta aos autos, que, após a destituição, o Recorrente manteve, apenas e tão só, a remuneração da dita empresa C....
58) Pelo que, e numa primeira análise, como é óbvio, verifica-se um prejuízo bem concreto decorrente da destituição sem justa causa, porquanto, e para além de deixar de auferir mensalmente a quantia de 2.000,00€, deixou, igualmente, de auferir subsídio de férias e natal e, ainda, subsídio de almoço, no valor diário de 5,25€.
59) Além disso, não deixa de ser relevante chamar à colação o depoimento da testemunha CC que esclareceu que a empresa C... era uma empresa que raramente dava lucro, que fosse distribuível, bem como o Recorrente pouco trabalho tinha para fazer, dada a dimensão da empresa, até porque as tarefas estavam concentradas naquela testemunha (depoimento de 6/2/2019 de 10:45 a 11:18).
60) A testemunha DD, pai do Recorrente, esclareceu que este, antes de ir para a N..., chegou a colaborar na actividade da testemunha, mas com a ida para a Recorrida, tal não voltou a acontecer.
61) Bem como referiu que, após a destituição, a testemunha DD ajudou o Recorrente, quer monetariamente, quer moralmente. (Depoimento 6/2/2019 de 16:58 a 17:51)
62) Contrariamente à conclusão retirada pelo Tribunal a quo, foi feita a prova que:
- Após a destituição, o Recorrente, apenas, auferia um rendimento de 750,00€
- Que, na empresa C..., na qual era sócio e gerente, raramente havia distribuição de lucros,
- Que, nessa mesma empresa, poucas tarefas tinha a desempenhar,
- Que, após a destituição, apenas esteve na empresa C..., o que significa que não conseguiu outro emprego/trabalho,
- Que necessitou de ajuda dos seus familiares, dadas as suas dificuldades financeiras e psicológicas.
63) Além disso, não se pode aceitar o entendimento de que a indemnização não é uma consequência imediata da destituição sem justa causa, porquanto o art. 257º nº 7 do CSC apenas estipula um limite para a indemnização, sendo claro quando refere que o gerente destituído sem justa tem direito a ser indemnizado, sem a estipulação de uma condição para sua atribuição.
64) Aliás, e de acordo com a melhor doutrina, nos termos do disposto no art. 257º nº 7 do CSC, a natureza dos prejuízos indemnizáveis são os resultantes da perda de proventos do gerente.
65) Bem como entende a melhor doutrina que o gerente destituído sem justa causa, apenas, tem de provar as remunerações que auferia pelo exercício da gerência, não havendo que aplicar os princípios da responsabilidade civil, dado que, para as sociedades por quotas, existe a disposição especial que estabelece que, com excepção da destituição com justa causa, haverá sempre lugar à atribuição de indemnização e qual o montante a indemnizar.
66) Pelo que, e feita a prova do valor das remunerações auferidas, o gerente, neste caso, o Recorrente, destituído sem justa causa, não tem de fazer outra prova dos danos sofridos resultantes da destituição.
67) No caso dos presentes autos, e não se podendo aceitar, de todo, a tese defendida na sentença ora crise, o Recorrente cumpriu o seu ónus da prova quanto aos valores auferidos, cfr. ponto 3 dos factos provados.
68) E, consequentemente, de acordo com o supra exposto, deve ser cumprido o disposto no nº 7 do art. 257º do CSC e ser-lhe arbitrada a competente indemnização, com as legais consequências.
69) Acrescentando-se que, ainda de acordo com a tese expendida na sentença, ora em crise, o Recorrente, ainda, conseguir provar e demonstrar os prejuízos decorrentes da sua destituição, apesar do Tribunal a quo não ter valorado essa prova, motivo pelo qual a mesma foi objecto, supra, de reapreciação.
70) Nestes termos e nos demais de direito, deve a sentença, ora em crise, ser revogada, por erro de julgamento e por erro de aplicação do direito e, consequentemente, ser julgado procedente por provado o pedido do Recorrente, sendo-lhe atribuída a indemnização prevista no art. 257º nº 7 do CSC, com as legais consequências.
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Respondeu a ré ao recurso e interpôs Igualmente recurso subordinado de apelação, formulando as seguintes conclusões:
1- Não existe qualquer elemento de prova nos autos que demonstre que o A. não se encontrava obrigado a exercer a sua função a tempo inteiro, deslocando-se de segunda a sexta às instalações da empresa por si gerida.
II- A remuneração do A. e demais componentes salariais aliados à dimensão da R. (nº de trabalhadores, volume de facturação, dimensão da rede de clientes e fornecedores) demonstram que a sua função não se compadecia com um exercício intermitente ou a meio termo.
III- Os sócios da ré ouvidos em Tribunal, cujos depoimentos se consideram reproduzidos, foram unânimes em afirmar que num primeiro momento foi concedida ao A. a flexibilidade para gerir a sua vida, uma vez que morava em Lisboa e as instalações da ré são em Aveiro.
IV- Contudo, tal seria apenas num momento inicial, porquanto o A. foi contratado para assegurar a gestão corrente da empresa e obviar ao eventual impedimento de qualquer outro gerente.
V- Apenas o A. alega que houve um acordo no sentido de que jamais teria que se deslocar mais que 2 a 3 dias por semana à empresa, o que se revela um contra-senso, contrariando, inclusive, as finalidades que ditaram a sua nomeação.
VI- Devendo, por conseguinte, considerar-se não provado o ponto 6 dos factos provados constante da douta sentença recorrida, cujo teor é: “O autor ficou obrigado a comparecer na ré 2 a 3 dias por semana, sem prejuízo de comparecer noutros dias sempre que fosse para esse efeito convocado ou sempre que se mostrasse necessário ao cabal desempenho das suas funções
VII- Na assembleia geral da ré de 28/03/2011 a comunicação escrita remetida pelo A., contendo os motivos pelos quais se opunha à sua destituição, foi debatida pelos sócios presentes na Assembleia, o que resulta, desde logo, do teor da própria acta, que constitui um documento autêntico.
VIII- Inquiridos em Tribunal os sócios que estiveram presentes reiteraram justamente essa realidade, referindo, inclusive, ter havido uma interrupção para que o sócio EE pudesse inteirar-se do conteúdo da mesma.
IX- Devendo, por conseguinte, considerar-se não provado o ponto 36 dos factos provados constante da douta sentença recorrida, cujo teor é: “Na sessão da Assembleia Geral da ré de 28/03/2011, na qual foi aprovada a sua destituição, a sua comunicação escrita não foi discutida por parte dos sócios”.
X- Inquiridos em Tribunal diversos trabalhadores da ré, o TOC da empresa, e os sócios, foi produzida ampla prova reveladora de que o A., ao longo do tempo, reduziu de forma acentuada a sua presença física na empresa.
XI- Adicionalmente, os aludidos trabalhadores referiram que além da diminuta assiduidade do A., o mesmo foi igualmente diminuindo o tempo de permanência na empresa, em cada vez que lá se deslocava.
XII- É o próprio A. que refere, na carta por si redigida expondo a sua discórdia quanto aos motivos invocados para a sua destituição, que o número de dias em que se encontrava presente na empresa “foram reduzindo”.
XIII- Na mesma resposta o A. refere ainda que “Mesmo estando ausente do espaço física da N..., sempre dei inteira e pronta resposta às necessidades da empresa”, o que revela, justamente, a sua ausência.
XIV- Devendo, atentos os elementos probatórios dos autos conjugados com as afirmações do A., considerar-se não provado o ponto 37 dos factos provados constante da douta sentença recorrida, cujo teor é: “O autor deslocou-se pelo menos, dois/três dias, por semana, desde o início das suas funções, até à data da sua destituição, à empresa”
XV- Como consequência lógica do referido e demonstrado acerca da assiduidade do A., e justamente com base nos mesmos elementos probatórios aliados à experiência e senso comum, deverá ser considerado provado o ponto XX dos factos considerados não provados da douta sentença recorrida, cujo teor é: “A partir de Abril de 2010, o autor passou a estar na ré 1 ou 2 dias por semana e houve semanas em que não apareceu, nomeadamente, em Dezembro de 2010, foi à ré, apenas, no dia 6/12
XVI- Sendo certo que, no que concerne à falta de assiduidade do A. no mês de Dezembro de 2010, tal se encontrar demonstrado pelos depoimentos transcritos.
XVII- Os depoimentos de FF, GG, BB, HH, II, JJ, KK, LL, MM, que se consideram reproduzidos, dão conta, quer da perspectiva dos gerentes, mas sobretudo dos trabalhadores, que as ausências do A. eram notadas e comentadas por todos na empresa.
XVIII- Devendo, por conseguinte, ser considerado provado o ponto XXI dos factos considerados não provados da douta sentença recorrida, cujo teor é: “As ausências do autor eram notadas pelos trabalhadores
XIX- As circunstâncias que culminaram com a destituição do A. radicam no fim do seu casamento, após a separação da sua mulher, a sócia da R. NN, após Março de 2010.
XX- Essas circunstâncias ditaram que o A., logo em Março de 2010 manifestasse a sua intenção em abandonar, de imediato, a gerência da ré.
XXI- Contudo, por insistência dos sócios-gerentes, respectivamente pai e irmão da ex-cônjuge do A., GG e BB, o A. viria a permanecer no cargo durante mais alguns meses.
XXII- Não obstante, a verdade é que a sua postura foi se degradando com o passar do tempo, o que levou a um gradual afastamento do A. em relação ao que eram as suas responsabilidades e obrigações.
XXIII- Esta realidade resulta dos depoimentos de trabalhadores e gerentes da ré, que se consideram reproduzidos.
XXIV- Resulta, igualmente e em particular, dos depoimentos de HH e JJ, que descrevem de forma pormenorizada as explicações dadas pelo A., demonstrando, igualmente, interpretarem tal facto como explicação para o distanciamento que vinham observando por parte do A.
XXV- O que coincide com os relatos dos sócios gerentes, que igualmente aqui se reproduzem.
XXVI- Impondo-se, por conseguinte, que se considere provado o ponto XXII dos factos considerados não provados da douta sentença recorrida, cujo teor é: “O autor foi-se afastando por sua exclusiva vontade das suas funções a partir de Junho de 2010”
XXVII- Dadas as ausências e negligência da parte do A., o gerente BB assumiu a negociação dos preços da matéria-prima a partir de Junho de 2010, até aí incumbência do A.;
XXVIII- Realidade esta que resulta provada pelos depoimentos de HH e LL, trabalhadores com conhecimento de causa acerca dos factos em questão.
XXIX- Devendo, por conseguinte, considerar-se provado o ponto XXIII dos factos considerados não provados da douta sentença recorrida, cujo teor é: “Dadas as ausências ou desconhecimento da situação por parte do autor, o gerente, ao tempo, BB assumiu a negociação dos preços da matéria-prima, até aí pertencente ao autor, a partir de Junho de 2010”
XXX- As restantes componentes da área funcional do A. foram sendo progressivamente absorvidas pelas trabalhadoras da área administrativa e financeira e pelo próprio gerente BB, o que resulta dos depoimentos de JJ, KK, II, MM, BB e GG
XXXI- Devendo, em consequência, considerar-se provado o ponto XXIV dos factos considerados não provados da douta sentença recorrida, cujo teor é: “ E tudo o que era da área funcional do autor era tratado pelas funcionárias da empresa, com exclusiva supervisão do gerente BB”
XXXII- Em virtude das sucessivas omissões e ausências do A., o gerente BB teve, entre várias outras, uma reunião com o A. em Julho de 2010, referindo a necessidade de maior apoio na gerência.
XXXIII - O que resulta do depoimento de BB conjugado com o depoimento do A., em que este reconhece terem ocorrido diversas reuniões.
XXXIV - No depoimento do A., o mesmo reconhece que se abordou a sua saída da empresa e a necessidade de contratação de alguém que assumisse as suas funções.
XXXV - Nessa reunião, tendo em atenção o crescente alheamento do A. face à gerência, com a consequente distribuição das suas funções pelos restantes membros da empresa, foi-lhe transmitido ser necessário um maior apoio da sua parte, ou seja, que o mesmo cumprisse as suas funções.
XXXVI- Ao A., igualmente, foi pedido que se mantivesse no cargo durante uns meses para permitir a sua substituição, pedido este que apenas faria sentido caso o A. efectivamente cumprisse as suas funções e alterasse a postura relapsa que se vinha acentuando.
XXXVII- Assim, tendo em consideração os depoimentos do A. e do gerente BB, a par com os elementos instrumentais que integram o processo, nomeadamente o comprovado desleixo e desmoralização do A., em conjugação com a sua vontade de sair da empresa (que foi reiterando ao longo do tempo, veja-se o email do A de 23.Setembro.2010), e ainda com os pedidos formulados pela gerência para que se mantivesse na função até a sua substituição estar ultimada,
XXXVIII- Torna-se forçoso concluir que em Julho de 2010 foi solicitado ao A. que prestasse um maior apoio à gerência, pois de outro modo não faria sentido pedir-lhe que permanecesse no cargo durante mais tempo dadas as omissões que vinha revelando (vide facto dado como provado na assentada descrita no texto).
XXXIX- Atento o exposto, deverá considerar-se provado o ponto XXVI dos factos considerados não provados na douta sentença recorrida, cujo teor é: “Em virtude do aludido em v) a ix), o gerente da ré BB teve uma reunião com o autor, em Julho de 2010 explicando-lhe a necessidade de maior apoio
XL- Ao decidir como decidiu acerca do ponto XXVI dos factos considerados não provados, o Tribunal cometeu uma evidente contradição entre os fundamentos e decisão, porquanto, ouvido o A. em Tribunal acerca do facto em questão, foi elaborada assentada que continha a confissão de tal facto, não tendo havido qualquer oposição da parte do A. ou do seu mandatário.
XLI- Assim sendo, ao decidir considerar não provado o aludido facto, o Tribunal violou o disposto no art. 607.º n.º 4 do CPC, ignorando a confissão plena do A.
XLII- Em 23 de Setembro de 2010 o A. envia um email dirigido à sua ex-mulher onde refere que pretendia abandonar de imediato a ré (o aludido doc.).
XLIII- Assim, dado que o A. referiu em Março de 2010 que pretendia sair de imediato da empresa (facto provado nº 54), reiterando tal vontade em Setembro (doc. referido), e se em Julho, como o próprio reconhece, falaram da sua intenção em sair e da necessidade de contratar alguém para o seu lugar, é forçoso concluir que nesse momento o A. reiterou aquela que era a sua vontade antes e depois de tal data: pretendia sair da gerência pois não tinha condições para se manter no cargo, e, como o próprio A. afirma “Teria que se contratar alguém para me substituir”.
XLIV - Devendo, nesta sequência, considerar-se provado o ponto XXVII dos factos considerados não provados da douta sentença recorrida, cujo teor é: “Nessa ocasião, o autor respondeu-lhe que era melhor contratar outra pessoa e que iria sair da empresa, pois não tinha condições emocionais para continuar em consequência do agravamento da sua situação pessoal
XLV- Em Outubro de 2010 o A. recusou assinar duas convocatórias para assembleias gerais da ré, referindo, em Tribunal, não o ter feito “porque não tinha que o fazer”, mas que, não obstante o motivo alegadamente invocado, “lembrou” os outros sócios de que havia uma pretensa dívida por saldar da parte da sua mulher para com o seu pai.
XLVI- Ora, se o A., em relação a uma questão da empresa, “lembra” os sócios de que existe uma dívida completamente alheia à mesma, recusando a assinatura das convocatórias, coisa que nunca fizera, então é forçoso concluir que de facto se tratou de uma condição por si imposta.
XLVII- De outro modo não teria qualquer sentido a invocação de tal facto! O A. “lembrou” os outros sócios de um facto alheio à empresa, num momento em que esta pretendia a sua colaboração, pois tinha a convicção de que poderia usar esse facto como moeda de troca, coisa que viria a fazer pouco mais tarde.
XLVIII- É o próprio Tribunal que dá como provado no ponto 58 que o A. em Dezembro de 2010 afirmou que só sairia da empresa se “lhe fosse paga uma indemnização correspondente a quatro anos de mandato e a sua ex-mulher, irmã do gerente BB, pagasse uma dívida que tinha para com o seu pai, dele autor”.
XLIX- Aliás, esta postura do A., recusando assinar as convocatórias para as assembleias “porque não tinha que o fazer”, coisa que nunca fizera até ao momento, é bem reveladora da postura “colaborante” e “disponível” que alega ter mantido até ao momento da sua destituição.
L- Assim, em homenagem às regras da experiência e do senso comum, em conjugação com o depoimento do gerente BB e do sócio GG, deverá considerar-se provado o ponto XXIX dos factos considerados não provados da douta sentença recorrida, cujo teor é: “Foi após a contratação da pessoa para substituir o autor, em Outubro de 2010, que se agravaram os problemas com o autor que disse que não assinava as convocatórias para as duas Assembleias Gerais que foram convocadas, por existir uma dívida da sua mulher e sócia da ré para com o seu pai
LI- Em função do email de 23 de Setembro de 2010 remetido pelo A. à sua então mulher NN, deverá acrescentar-se ao elenco dos factos dados por provados o seguinte ponto:
“(ii) Na sequência da vontade manifestada pelo A. no sentido de abandonar imediatamente a gerência, foi-lhe solicitado pelos sócios Dr. GG e BB que se mantivesse no exercício das funções durante cerca de 2/3 meses de modo a permitir assegurar a transição de funções, tendo o A. anuído invocando o respeito pelos trabalhadores da empresa e a imagem dos avós da sua mulher, fundadores da empresa R..”
LII- Em função da prova produzida, nomeadamente depoimentos das testemunhas e dos legais representantes da ré, a par com a documentação relevante, deverá, igualmente, considerar-se provado o seguinte ponto:
“(i) O A. não cumpriu cabalmente as suas funções, pondo em causa o exercício da funções de gerente, o que motivou a sua destituição assente em motivos configuradores de justa causa.”
LIII- As referidas alterações no elenco da matéria de facto impõem-se perante uma análise crítica global da matéria probatória constante dos autos, com particular ênfase nos depoimentos testemunhais e declarações dos legais representantes.
LIV- Ao julgar como julgou, o Tribunal a quo não valorou devidamente a prova, não tirando as ilações devidas dos factos instrumentais constantes dos autos, o que comporta a violação do art.º 607.º nº 4 do CPC.
LV- Por outro lado, o juízo probatório deverá ter igualmente em conta o facto de a audiência de discussão e julgamento ter ocorrido quase 6 anos (e 9 anos) após a ocorrência dos factos, o que implica necessariamente uma menor exactidão dos depoimentos no momento de relembrar o passado.
LVI- Efectivamente, o período crítico da actuação do A. situa-se entre Junho de 2010 e Março de 2011.
LVII- Em suma, o Tribunal, no momento de apreciar a prova, não poderá deixar de ter em conta o decurso do tempo entre os factos e o depoimento, impondo-se, salvo melhor opinião, uma exigência crítica atenuada face ao que é expectável que as testemunhas consigam descrever, com precisão, dado o tempo que passou entre a ocorrência dos factos e o momento de serem ouvidos em Tribunal.
LVIII- Ou seja, não pode confundir-se a dificuldade das testemunhas em circunscrever os factos no tempo e no espaço por não terem conhecimento de causa, com essa mesma dificuldade devida ao decurso do tempo que, como é sabido, “tudo leva”.
LXI-“…Os administradores (gerentes) no exercício do seu cargo , desempenharão as suas funções com o máximo de cuidado e zelo. Devem aplicar o seu esforço, o seu tempo, os seus conhecimentos, as suas competências técnicas a favor da sociedade e procurar estar sempre ao corrente do quotidiano da mesma e das circunstâncias que a envolvem”.
LX- O dever de cuidado deve ter em consideração a disponibilidade, a competência técnica e o conhecimento da actividade da sociedade. De referir que este dever de cuidado ao mencionar a” disponibilidade e as competências técnicas”, que o administrador deve possuir implica que as pessoas nomeadas para o cargo devem logo à partida fazer uma auto-avaliação em relação às suas capacidades e ao tempo que têm para dedicar à sociedade, antes de aceitarem.
LXI– Os gerentes devem verificar se têm condições pessoais e profissionais para assegurar as funções para as quais foram designadas. Devem fazer essa avaliação logo no momento da aceitação das funções de administração, sob pena de incorrer, eventualmente, na denominada “culpa in acceptando”, como bem chama a atenção alguma doutrina.
LXII - O administrador tem, assim, a obrigação de acompanhar e vigiar a actividade social da empresa – o designado duty to monitor.
LXIII- “I. A deliberação que destituiu o gerente, mesmo que não haja justa causa, não é anulável e, por conseguinte, não lhe é aplicável a alínea b) do n.º 1 do artigo 58.º do CSC.
II. A ideia subjacente ao conceito de justa causa de destituição dos gerentes é o da inexigibilidade, ou seja, em face da violação grave de deveres estatutários, de deveres legais específicos ou gerais que impendem sobre o gerente no exercício da suas funções, ou mesmo da incapacidade para as exercer, não é exigível que a sociedade mantenha com o mesmo a relação orgânica que caracteriza o exercício da gerência.(Ac Tribunal da Relação de Lisboa de 4.6.2019, in processo 1573/10.5TYLSB.L1-1)”
LXIV – “…
V- O artº 257º do CSC não fornece o conceito de justa causa de destituição de gerente, limitando-se apontar, exemplificativa e genericamente, como tal a violação grave dos deveres do gerente e a sua incapacidade para o exercício normal das respectivas funções.
VI– Justa causa é qualquer circunstância, facto ou situação em face da qual, e segundo a boa fé, não seja exigível a uma das partes a continuação da relação contratual, todo o acto capaz de fazer perigar o fim do contrato ou de dificultar obtenção desse fim; na destituição de gerente, a verificação de um comportamento na actividade deste – ou a prática de actos por sua parte – que impossibilite a continuação da relação de confiança que o exercício do cargo pressupõe.
VII– Sendo certo que à apreciação da questão da existência ou não de justa causa interessam os factos trazidos ao processo e neste comprovados ainda que não explicitados, na deliberação de destituição, embora insertos nas razões genéricas dessa deliberação”( AC STJ de 2.2.2006, processo 05B2682 .dgsi.net)
LXV“
I- Nos termos do artigo 257.º, nº 6, do CSC, constituem justa causa de destituição, designadamente, a violação grave dos deveres do gerente e a sua incapacidade para o exercício normal das respectivas funções. São noções orientadoras e meramente exemplificativas, das quais resulta que a justa causa tanto possa ser subjectiva como objectiva.
II– A justa causa de destituição do gerente relaciona-se com os princípios da confiança e a boa fé que devem ser observados por quem detém essa função na sociedade, princípios muito relevantes nas relações com os credores sociais, sócios e terceiros, de modo a que a transparência dos comportamentos e o rigor ético das condutas, possam ser valorados objectivamente e subjectivamente. (Ac TRGuimarães de 5.11.2020, in processo 3999/19.0T8GMR.G1)”
LXVI - “
I- É entendimento que cremos pacífico após a entrada em vigor do actual artigo 155.º, n.º 4, do CPC, que decorrido o prazo de dez dias a contar do momento em que a gravação é disponibilizada, sem que seja arguido o vício da sua falta ou deficiência, o mesmo fica sanado, não podendo oficiosamente ser conhecido pela Relação, nem podendo tal nulidade ser arguida sequer nas alegações de recurso.
II- Tal como já resultava do disposto no artigo 563.º, n.º 1, do regime pretérito, o actual artigo 463.º, n.º 1, do CPC, continua a impor a redução a escrito do depoimento de parte na sua vertente confessória.
III- A formalidade da assentada na acta da audiência de discussão e julgamento encontra-se reservada para a confissão judicial provocada, a qual, de acordo com o disposto no n.º 2 do artigo 356.º do CC, pode ser feita tanto em depoimento de parte como em prestação de informações ou esclarecimentos ao tribunal.
IV- Mas, havendo confissão judicial, a força probatória plena contra o depoente depende da sua redução a escrito, isto porque, se o não for, é livremente apreciada pelo tribunal, mesmo que se encontre gravada.
V- De facto, a desconsideração da indicada formalidade da assentada implica que a declaração da parte, mesmo que se encontre gravada, e ainda que seja confessória, ao invés de ter o valor probatório de prova plena contra o confitente, que lhe atribui o n.º 1 do artigo 358.º do CC, passa a ser livremente apreciada pelo tribunal, nos termos do n.º 4 do mesmo normativo. (Ac Tribunal da Relação de Évora de 12.04.2018, in processo 1004/16.7T8STR.E1)”
LXVII – Sob pena de violação inequívoca do plasmado nos artigos 607º do CP Civil e 64º e 257º do Código das Sociedades Comerciais, deve o recurso proceder, com a revogação da sentença na parte que considerou que a destituição não assentou em justa causa, absolvendo-se a ré, fazendo-se, assim, a costumada JUSTIÇA!
com as demais consequências legais.
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O autor apresentou contra-alegações, sustentando a improcedência do recurso interposto pela ré.
Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.
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O objecto do recurso é delimitado pelas conclusões da alegação do recorrente não podendo este tribunal conhecer de matérias nelas não incluídas, sem prejuízo das de conhecimento oficioso (artigos 635º, nº 3 e 639º, nºs 1 e 3, ambos do Código de Processo Civil). Quanto ao recurso interposto pela ré, tratando-se decisão que lhe é favorável, não pode como tal ser apreciado, não existindo, nessa medida, uma pretensão recursória a decidir. Não obstante, constata-se que o aquilo que a ré pretende é a ampliação do âmbito do recurso a requerimento do recorrido, e a tal nada obsta, nos termos do art.º 636.º do CPCivil
Face às conclusões de ambas as recorrentes, as questões a decidir são as seguintes:
- Reapreciação da prova e eventual alteração da matéria de facto quanto aos pontos sob impugnação;
- Se foi demonstrada justa causa para a destituição do recorrente autor, a quem competia o ónus da prova de tal justa causa e se há lugar à fixação de indemnização por danos patrimoniais e não patrimoniais a favor do gerente destituído;
- forma de cálculo de tal indemnização:
***
A 1.ª instância declarou provados e não provados os seguintes factos:
A) - Factos provados:
1- Conforme resulta da acta junta como doc. nº 1, junto com a petição inicial, o autor, em 30/10/2009, por deliberação da Assembleia Geral Extraordinária da ré, foi nomeado gerente, com efeitos a partir de 1 de Novembro de 2009 (art. 1º da petição inicial).
2- Através de tal deliberação, foi aprovado que o exercício do cargo de gerente por parte do autor era remunerado. (art.2º da petição inicial).
3- Sendo essa remuneração composta pelas seguintes verbas:
- Vencimento: 2.000,00€x14
- Subsídio de almoço: 5,25€/dia
- Cartão SIM de telemóvel
- Despesas de deslocação (combustível e portagens) e estadia (refeições e dormida) mediante apresentação de factura/recibo.(mesmo doc. 1 e doc. 2 a 11) (art.3º da petição inicial).
4- Conforme resulta do teor da acta da Assembleia Geral Extraordinária de 30/10/2009 (cf. doc. nº1 junto com a petição inicial), a nomeação do autor como gerente da ré teve por objectivo “uma maior agilização da gerência e assegurar o seu funcionamento em caso de impedimento de algum dos gerentes”. (art. 4º da petição inicial).
5- O autor, para além das funções inerentes ao cargo de gerente, tinha a seu cargo todas as funções/tarefas relacionadas com a área financeira da ré (art. 5º da petição inicial).
6- O autor ficou obrigado a comparecer na ré 2 a 3 dias por semana, sem prejuízo de comparecer noutros dias sempre que fosse para esse efeito convocado ou sempre que se mostrasse necessário ao cabal desempenho das suas funções (art. 6º da petição inicial).
7- Conforme resulta do teor da acta junta como doc. nº 12 com a petição inicial, em 15/11/2010, foi realizada uma Assembleia Geral da ré, na qual foi deliberado nomear como gerente o sócio GG (art. 8º da petição inicial).
8- Durante a referida Assembleia, o sócio-gerente BB, em resposta às questões colocadas pelo sócio EE, esclareceu o seguinte, como se passa a transcrever:“(…) O gerente em causa (o autor) tem exercido a sua função em termos idênticos àqueles que o nortearam desde a sua nomeação.(…)” (art.9º da petição inicial).
9- Conforme resulta do teor do doc. nº 13 junto com a petição inicial, com data de 4 de Março de 2011, foi enviada convocatória para Assembleia Geral, a realizar no dia 21 de Março, do referido ano, com a seguinte ordem de trabalhos:
“Ponto 1: Análise da situação do gerente Senhor Dr. AA, no que concerne a comportamentos que tem assumido e em prejuízo da sociedade.
Ponto 2: Análise das medidas a adoptar:
Ponto 2.1: Destituição com justa causa do gerente Dr. AA; ou
Ponto 2.2: propositura de acção judicial visando a sua suspensão e destituição, bem como da pertinente providência cautelar.” (art. 10º da petição inicial).
10- Através da carta datada de 22 de Março de 2011, a ré enviou ao autor um Relatório junto como doc. nº 14 com a petição inicial onde constava o seguinte:
“1º A eleição do Senhor Dr. AA visou reforçar a gerência da N..., com a sua presença efectiva na empresa;
2.º No início de Janeiro de 2010, na sequência da renúncia à gerência do sócio Senhor EE, ocorreu uma reunião com a presença dos actuais gerentes Dr. BB e Dr. AA e do sócio Dr. GG. Nessa reunião foi comunicado ao gerente Dr. AA que teria de estar mais tempo na N...;
3.º O Dr. AA respondeu que naquele momento não podia dar mais, pois tinha as empresas do pai e que não lhe restava mais tempo, tendo-lhe sido comunicado que teria de encontrar esse tempo, por se revelar absolutamente necessário;
4.º Em finais de Março/início de Abril de 2010, o Senhor Dr. AA disse que pretendia sair da N..., invocando razões do seu foro pessoal;
5.º Nessa ocasião foi-lhe dito que deveria repensar a sua situação;
6.º Em Julho de 2010, em virtude da situação do Dr. AA ter-se agravado, pois antes vinha três dias por semana e a partir dessa data vinha apenas um dia ou dois por semana e houve semanas que nem apareceu, o gerente Dr. BB teve uma reunião com o Dr. AA, explicando-lhe da necessidade de mais apoio;
7.º Nessa ocasião o Dr. AA respondeu que era melhor contratar outra pessoa e que iria sair da empresa, pois não tinha condições emocionais para continuar em consequência do agravamento da sua situação pessoal;
8.º Foi-lhe então solicitado que ficasse mais dois ou três meses, de modo a ser assegurada a contratação de uma pessoa para o substituir;
9.º A partir desta altura, finais de Julho, foram contactadas diversas empresas de recrutamento de recursos humanos para apresentarem um orçamento e uma shortlist com pessoas possíveis para contratar;
10.º No início de Agosto, foi definida a empresa que iria efectuar a shortlist e, início de Setembro, após as férias, essa empresa apresentou a shortlist;
11.º Em finais de Setembro, efectuaram-se as entrevistas aos diversos candidatos;
12.º Em finais de Outubro, foi contratada a pessoa que iria substituir o Dr. AA que, de imediato, comunicou que só estaria disponível para entrar na empresa no início de 2011;
13.º Todo este processo foi concretizado com o conhecimento do Dr. AA, pois as reuniões com as diversas empresas de recursos humanos tiveram lugar na empresa e só as entrevistas se realizaram fora da empresa por motivos de confidencialidade;
14.º Logo após ter sido contratado essa pessoa, em finais de Outubro, foram convocadas duas Assembleias Gerais;
15.º Foi neste momento que agravaram os problemas com o Dr. AA que disse que não assinava as convocatórias para as Assembleias Gerais por existir uma dívida da sua mulher e também sócia da N... para com o pai dele;
16.º Foi-lhe dito que não deveria misturar assuntos da empresa com assuntos pessoais;
17.º Nesta altura, surgiu outro problema que foi a acta da Assembleia Geral de aprovação de contas. O Dr. AA negou-se a assinar a acta, pois invocou que estava mal redigida, uma vez que as afirmações que lhe eram imputadas, por ter estado presente nessa reunião de 31 de Março de 2010, não deviam referir o seu nome mas o de outro sócio, esquecendo em absoluto que havia confirmado o teor da minuta que havia sido preparada pelo advogado;
18.º Numa reunião havida com o Dr. AA, para ultrapassar o impasse narrado anteriormente, o gerente Dr. BB aceitou que essas afirmações lhe fossem imputadas, tendo o gerente Dr. AA referido, de novo, que queria sair da N..., pois ir-se-ia divorciar da mulher;
19.º O imbróglio criado pelo Dr. AA na assinatura da acta deu origem a aplicação judicial de uma multa à sociedade;
20.º Em resposta ao referido no ponto 18, o gerente Dr. BB informou o gerente Dr. AA de que a pessoa que iria substituí-lo só iria entrar no início do ano e, por isso, que no início de Dezembro apresentaria a carta de renúncia;
21.º Após o registo da nomeação do Dr. GG como gerente em meados de Dezembro, o gerente Dr. BB abordou o Dr. AA, referindo que em Janeiro deveria, então, renunciar à gerência, dado que o colaborador contratado iniciaria funções;
22.º Em resposta o Dr. AA referiu que só “abandonaria” a N... desde que lhe fosse paga uma indemnização correspondente a 4 anos de mandato e que a sua mulher, irmã do gerente Dr. BB, pagasse uma dívida que tinha para com o seu pai, dele Dr. AA;
23.º Em síntese:
O gerente Dr. AA tem vindo a exercer a sua gerência de modo reprovável, pois:
-Aparecia na empresa por períodos curtíssimos e em muitas semanas nem sequer comparecia;
-Em termos da área financeira, apenas falava com os bancos, mas quando os bancos apresentavam uma proposta nova, ignorava o assunto, “passando-o” ao gerente Dr. BB;
-Na negociação com os clientes tinha que ser o gerente Dr. BB a tratar, dadas as ausências do visado ou desconhecimento sobre a situação;
-Cheques de clientes datados para mais de 200 dias e sem controlo, só no final do ano quando foi solicitada essa relação foi possível conhecer a realidade;
-As empresas que ficaram insolventes não foram objecto de estudo prévio por parte do Dr. AA, ficando a cargo do gerente Dr. BB a tentativa de recuperação de créditos;
-Até um simples financiamento automóvel passou a ser tratado pelo gerente Dr. BB, dado que o gerente Dr. AA não estudava as propostas, afirmando ser mais favorável a do Banco 1..., sem atentar nos custos do IVA
-Tudo, no que concerne à área funcional do gerente Dr. AA é tratado pelas funcionárias da empresa com a exclusiva supervisão do gerente Dr. BB;
-Em termos jurídicos, nunca acompanhou nenhum processo que a empresa tem, pois neste último ano e quatro meses nunca teve uma reunião com o Dr. OO. Disse que tinha alguma incompatibilidade com o Dr. OO por não lhe ter respondido a um e-mail;
-Recusou-se a assinar a acta da Assembleia Geral de aprovação de contas, conforme resulta do presente relatório, só o tendo feito depois de satisfeitas as exigências infundadas que determinou, com a consequente aplicação judicial de uma multa;
-Não obstante ter solicitado a sua renúncia à gerência aceitou manter-se até à contratação de um técnico superior nessa área;
-Efectivada a contratação de uma colaboradora a tempo integral e dos serviços de um auditor, em regime de prestação de serviços, recusa-se agora, a renunciar, exigindo o pagamento de uma indemnização correspondente a quatro anos e o pagamento de uma pretensa dívida do seu cônjuge para com o seu pai.”
12- Conforme resulta do teor do doc. nº 15 junto com a petição inicial, no dia 27 de Março de 2011, o autor respondeu ao relatório que lhe foi remetido pela ré nos termos a saber:
“Exmos. Senhores,
No passado dia 23 de Março de 2011 recebi uma comunicação em papel timbrado da N..., que é subscrita pelo Dr. BB.
Nesta comunicação consta o carimbo de “os gerentes”.
Por esta razão, estendo esta resposta ao Dr. GG.
Apesar de desconhecer o teor da deliberação da Assembleia Geral que é aí referida, trata-se de uma comunicação sem qualquer sustentação jurídica não se descortinando qual o seu alcance.
Na verdade, se, como V.Exas. referem, a deliberação da Assembleia Geral foi no sentido de proceder à minha destituição, então a obrigação de V.Exas. teria sido avançar com essa destituição, sujeitando-se às consequências legais. Não vejo, pois, qual a razão para este relatório e para que eu seja ouvido a factos que são falsos.
Face à gravidade do que é aí apontado, decidi responder a alguns dos factos, os mais relevantes, sem prejuízo de neste momento não tomar posição quanto ao mais que é aí insinuado.
Gostaria de deixar claro que a gravidade do que me é imputado leva a que V.Exas., na qualidade de gerentes (mas também de sócios), tenham colocado seriamente em crise o exercício do meu cargo de gerente, por factos que são, única e exclusivamente, imputáveis a V.Exas. com as legais consequências.
Como a comunicação de V.Exas. versa e tem por assunto uma deliberação da Assembleia Geral, reservo-me no direito de entregar cópia desta comunicação ao Presidente da Mesa da Assembleia Geral.
Relativamente aos que de mais relevante é insinuado, tenho a esclarecer o seguinte:
1 – Antes de mais, impõe-se salientar que, no âmbito do meu casamento com a filha do Dr. GG, conheço a empresa N... desde os anos 90, tendo, por via do que sempre me foi transmitido pelo Dr. GG e família, acompanhado o seu desenvolvimento e funcionamento. Sempre tive conhecimento da maior parte das questões de maior importância relacionadas com a família e com a empresa, sempre de acordo com relatos que me foram sendo transmitidos pelo Dr. GG. Era do meu conhecimento a posição do Sócio gerente Sr. EE perante a empresa, perante o gerente Sr. PP e perante o funcionário Dr. BB, com a aprovação e aval do sócio gerente Dr. GG.
Tomei conhecimento, sempre de acordo com o que me era transmitido pelo Dr. GG que, a determinada altura, as relações com o sócio Sr. EE (titular de 49% do capital social) e o sócio Dr. GG (51%) passaram a ser de hostilidade. É, conforme me relataram, nessa altura que é feita a transmissão da quota comum do casal Dr. GG e Dr.ª QQ para os seus filhos, Dr. BB e Dr.ª NN, ficando estes sócios da empresa sendo o usufruto da quota pertencente ao Dr. GG.
Em 1-08-2009 recebi um email do Dr. GG, reencaminhado pelo Dr. OO (advogado da empresa e amigo pessoal do Dr. GG) com a minuta da carta de representação da Sr.ª NN e do Dr. BB dirigida ao seu pai, o sócio gerente Dr. GG, para uma Assembleia Geral a realizar a 7 de Agosto de 2009, onde o Dr. GG renunciava à gerência da empresa e nomeava seu filho Dr. BB para gerente.
Posteriormente, o Dr. GG convocou-me para uma reunião em Anadia, a realizar no gabinete do Dr. OO, onde também estaria presente o Dr. BB e um colega do Dr. OO e que iria representar e aconselhar, o Dr. RR. Nesta reunião, o Dr. GG e o Dr. BB apresentaram os factos graves que a seu ver estavam a condicionar a gestão e o futuro da empresa, que nesta carta não interessa relatar, e fizeram-me ver que seria benéfico a minha vinda para a empresa como trabalhador. Foi assim que fui convidado para começar a trabalhar na empresa, de modo a assegurar a componente de gestão económico-financeira.
Depois disso fui convocado para comparecer noutra reunião com o Dr. GG, que se realizou nos escritórios da B.... Nesta reunião o Dr. GG anunciou que a solução para a N... passaria pela minha nomeação como gerente pois a empresa obriga-se, segundo os estatutos, com a intervenção de dois gerentes, pelo que, passando a gerência a ser composta pelo Sr. EE, pelo Dr. BB e por mim, tal facto iria enfraquecer a posição do Sr. EE o que poderia levar a que este fosse forçado a renunciar à gerência ou a comprar ou a vender as quotas. O Dr. GG propôs-me a remuneração de € 2.000,00 brutos, acrescido de despesas de estadia, de deslocações e de representação, mais telemóvel, mais almoço e com a obrigação de me deslocar á empresa no mínimo de 2 dias e no máximo de 3 dias por semana.
Nesta reunião – e já anteriormente – o Dr. GG comunicou-se saber e estar consciente que o Dr. BB não queria ficar a trabalhar na N..., que não tinha capacidade e perfil para esse efeito e, para além disso, estava a começar um novo projecto em Lisboa, a B... que seria para o Dr. BB gerir. Inclusivamente, o Dr. GG até me convidou para director geral da filial da B... que iriam abrir em Espanha.
O Dr. GG tinha - e tem – integral conhecimento da minha situação profissional. Foi com esse conhecimento que me foi apresentada a proposta de exercer actividade na N... no mínimo de 2 dias e no máximo de 3 dias por semana.
Aceitei a proposta nos exactos moldes em que me foi apresentada pela N..., tendo acrescentado que iria fazer um esforço inicial nos primeiros dois meses para estar o máximo tempo possível na N... de modo a inteirar-me dos assuntos.
Em 03-10-2009 recebo um email do Dr. GG com a minuta da convocatória que o Dr. BB devia enviar ao Sr. EE para a Assembleia Geral de 30-10-2009 onde se iria por em prática a estratégia delineada.
Em 26-10-2009 recebo email do Dr. BB com a minuta da carta de representação da sócia Dr.ª NN para a referida reunião da Assembleia Geral.
A Assembleia Geral realizou-se em 30-10-2009 e onde a respectiva acta deveria ser lida novamente por todos os sócios. Gostaria de referir em relação às mesmas os seguintes parágrafos
«”Desde o dia da minha nomeação como gerente até à presente data, deparei-me com inúmeros entraves colocados pelo Sr. EE.
Desde recusar a debater assuntos fundamentais ao bom funcionamento da empresa – só aceitou realizar uma reunião após oficialização do meu cargo como gerente, apesar da Assembleia Geral realizada no dia 07/08/2009 me nomear como gerente e ser um órgão soberano;
Nas reuniões que tivemos debatemos algumas vezes sobre as minhas actuais funções como Director de Produção. Na minha opinião, é fulcral para o bom desempenho das minhas funções como gerente desta firma, não esteja a acumular funções de director de produção e de gerente em simultâneo, visto que a produção é muito exigente e pouco tempo sobra do dia para me colocar a par das situações referentes à gestão da firma.
Foi dito pelo Sr. EE que eu não riscava nada. Diversas vezes eu contrapus, dizendo que as decisões devem ser analisadas, discutidas e tomadas em conjunto.
Foi-me entregue um orçamento de uma máquina de corte italiana no dia 07/10/2009.
A firma italiana enviou o orçamento no dia 24/09/2009 com as características da máquina e condições de pagamento. Ou seja, pressupõe-se que o Sr. EE já estava em conversações algum tempo e pretendia que desse uma resposta particamente nesse dia. A minha resposta é que iria analisar e só depois é que dava a minha resposta.
Sei que teve diversas reuniões com alguns fornecedores, onde nada me foi dito nem comunicado. Na nossa primeira reunião, comuniquei ao Sr. EE que pretendia estar presente nas reuniões com fornecedores, clientes e instituições bancárias e que o agendamento teria de ser combinado entre os gerentes.
Como também, deparei-me com algumas situações de agressão verbal para com a minha pessoa à frente de diversos funcionários. É fundamental para o bom funcionamento da firma que haja entre os gerentes uma certa cordialidade e respeito e trabalho de equipa, o que se verifica é simplesmente o inverso.
Posto isto, a marcação desta Assembleia Geral tem como objectivo dar a conhecer aos sócios todos estes acontecimentos atrás descritos, assim como definir regras básicas a observar pelos Gerentes no desempenho das suas funções para fomentar o bom funcionamento desta firma.”»
«sócio GG que propôs seja votado o seguinte: “tendo em vista uma maior agilização da gerência e assegurar o seu funcionamento em caso de impedimento de algum dos gerentes proponho o Dr. AA, já acima identificado, para o lugar de gerente, cargo que passará a assumir a partir de um de Novembro de dois mil e nove.”».
Em 9-03-2010 recebo um email do Dr. GG em que o conteúdo é o email enviado ao Advogado Dr. RR, em 20-12-2009, em resposta ao fax de 16-12-2009 do Sr. EE do qual gostaria de transcrever as seguintes palavras do Dr. GG
«Quero também referir-lhe que a nomeação do Dr. AA para o cargo de gerente não foi pelos motivos que na altura pressupôs mas antes porque já sabíamos qual seria o movimento seguinte do Sr. EE, que seria abandonar a gerência para nos deixar em dificuldades, ameaça que aliás não era virgem, pois já a tinha formulado noutras ocasiões. Assim tal nomeação foi apenas para prevenir o futuro e para a empresa não ficar em grandes dificuldades e inclusive com problemas financeiros com uma saída abrupta do Sr. EE que demoraria sempre algum tempo a colmatar. Desta maneira foi muito mais simples anular os efeitos da sua saída».
2. No final do mês de Novembro de 2009 o sócio gerente Sr. EE renunciou à gerência da N... criando uma enorme situação de stress à empresa, deixando todos em sobressalto, em especial aos trabalhadores, clientes, fornecedores e instituições de crédito. Foi um período onde foi necessário visitar os principais clientes, receber os fornecedores e instituições de crédito, bem como responder a telefonemas e emails todos os dias sobre o que seria o futuro da empresa. Esta situação prolongou-se por vários meses após a saída do gerente EE. Desde a primeira reunião que tive com o Dr. GG e o Sr. BB para vir para a N..., muitas se seguiram em diversos locais, sendo que a N... sempre contou com a minha total disponibilidade, como facilmente se poderá verificar. Fui contratado para exercer as minhas funções num mínimo de 2 dias e no máximo de 3 dias por semana.
Porém, nunca me foi solicitado para estar mais tempo na N.... Tudo o que fiz, e sempre estive disponível para o fazer e efectivamente fiz, foi por minha iniciativa.
3. É totalmente falso que em Janeiro de 2010, ou em data anterior ou posterior, me foi proposto ou exigido uma presença com maior assiduidade na N..., para além do que estava contratado: mínimo de 2 dias e no máximo de 3 dias por semana. Não respondi a quaisquer factos de Janeiro de 2010 simplesmente porque nunca fui abordado para estar mais tempo na N.... Em 8-03-2010 recebi um email do Dr. GG que aqui transcrevo apenas a parte relevante: «AA é necessário rapidamente dar inicio ao processo de preparação dos documentos…Assim sugeria-te que amanhã e de uma maneira informal perguntasses ao TOC que eu também vou fazer o mesmo aqui com o Dr. EE se conhece alguém ou algum gabinete a quem se possa encomendar rapidamente um estudo económico da empresa. É também necessário pedir aos vários bancos, propostas e quais os limites do financiamento proposto dizendo que se pretende fazer um investimento na ordem dos 1.250… E em instalações e equipamentos. Todo este processo deverá ser posto em marcha rapidamente pois não vai haver muito tempo para o fazermos. Se te lembrares de alguma coisa mais diz-me. Vai também ser necessário oficializar as propostas das máquinas e de mais algo que achem importante, bem como contactar de novo o construtor para saber se os orçamentos se mantem ainda válidos ou se é necessário fazer uma reavaliação Um abraço e vamos falando mas é muito importante que mantenhas agora muito atento GG».
Ora, o teor deste email é um bom exemplo, um mero exemplo, da falsidade agora inovada, quando se alega que haveria falta de disponibilidade da minha parte.
4. Os problemas do foro pessoal em nada influíram na relação com a N... nem podem ser invocados como factos para o que agora se pretende com a descrição dos factos que me foi apresentada.
5. Como sempre aconteceu, mantive conversas informais com o Dr. GG e sempre mostrei total disponibilidade para continuar a prestar os meus serviços e trabalho à N....
6. Sempre me desloquei dois dias por semana à empresa, nos termos que sempre estiveram acordados. É totalmente falso que tenha estado semanas sem aparecer, como é facilmente demonstrável. É totalmente falso vir invocar que não me preocupava com os deveres e responsabilidade da empresa. O número de dias em que me encontrava presente na empresa foram reduzindo nos exactos termos que foram acordados com o Dr. GG com conhecimento do Dr. BB, mas continuando a desenvolver o meu trabalho de forma zelosa e em benefício da empresa. Mesmo estando ausente do espaço física da N..., sempre dei inteira e pronta resposta às necessidades da empresa, falando e trocando emails com os funcionários, clientes, fornecedores, instituições bancárias bem como com os advogados, Dr. OO e Dr. SS. Foram várias as ocasiões em que se realizaram conferências telefónicas, em alta voz, entre mim, o Dr. BB juntamente com trabalhadores, tendo por objectivo a resolução de problemas ou aquisições de material. Fui diversas vezes a Madrid para a compra de uma máquina extrusora, reuni com fornecedores, instituição bancárias e advogados, visitei clientes pois estava a chegar a altura da venda de sacos de vindima e celhas, e dentro das minhas responsabilidades assegurei o funcionamento da empresa.
Aliás, é possível contabilizar que cumpri muito mais que os dois a três dias por semana, o correspondente ao mínimo e máximo de dias semanais que tinham sido acordados aquando da minha contratação.
7. O agravamento da situação do foro pessoal registou-se no dia 30-09-2010, sem qualquer relevância para o que me pretendem agora imputar, porque nunca afectou a prestação dos meus serviços e trabalho à N..., sendo que, mesmo nesta situação, em nada alterei o meu comportamento, atitude e responsabilidade para com a N....
8. A principal razão pela qual foi sempre exigida a minha inserção, primeiro como trabalhador e depois como gerente, era realizar parte da gestão da N..., em especial a nível das questões económico-financeiras. Não fui contratado como trabalhador a prazo.
Não fui nomeado como gerente para alguns meses, em que o meu “despedimento” poderia ser decidido em qualquer momento. A minha nomeação como gerente também se ficou a dever à necessidade de haver dois gerentes para obrigar a empresa e a manter em funcionamento, sendo que, como me foi várias vezes transmitido, o advogado informou o Dr. GG que não era nada conveniente à data nomear o Dr. GG. A minha permanência na N... nunca teve nada a ver com a futura contratação de um novo funcionário.
No dia 15-12-2010 comuniquei ao sócio gerente Dr. BB que o sócio recém-nomeado gerente, o Dr. GG, já estava registado na conservatória do registo comercial e constava da certidão permanente. Ficou espantado por eu estar a afirmar esse facto pois não tinha recebido o novo código da certidão permanente do advogado, Dr. OO, pessoa responsável pelo registo. Expliquei que um código tem uma validade temporal e todas as alterações que ocorram desde que esteja válida constam lá. A data da contratação da nova funcionária é posterior a este dia e é assinada pelo sócio gerente Dr. BB e pelo sócio gerente Dr. GG. Neste dia 15-12-2010, o sócio gerente Dr. BB exigiu-me a minha saída imediata da empresa, pretendendo que eu apresentasse a minha carta de renúncia à gerência. Respondi que não o faria. Desde então o sócio gerente Dr. BB não manteve para comigo qualquer tipo de diálogo, de relação ou de educação, arredando-me das compras de material e de todas as decisões da empresa, como é fácil de comprovar. Continuei a estar presente na empresa os dois a três dias por semana. Nos demais dias da semana continuei, como sempre fiz, a responder às necessidades da empresa. O Dr. BB retirou-me grande parte das funções, tendo-as reduzido ao controlo de pagamentos de clientes e fornecedores bem como dar a minha assinatura. Esta redução das minhas competências foi propositada e surgiu como reacção ao facto de não ter aceite um despedimento sumário, o que é fácil de comprovar pela mudança de atitude de fornecedores, instituições bancárias e alguns procedimentos de trabalhadores.
9.10.11.12.13. A certa altura, e por interpostas pessoas, tive conhecimento que o sócio gerente Dr. BB, numa altura em que já tinha deixado de contactar comigo como retaliação ao facto de eu não aceitar a minha imediata saída, tinha a intenção de contratar alguém, mas somente isso. Na forma como me foi relatado, tratava-se de mais um trabalhador para a empresa, e nada mais.
Nunca tive conhecimento das empresas contactadas, do orçamento, da short list, das entrevistas nem das reuniões tidas na empresa. Nunca participei em nenhuma reunião. Nunca tive conhecimento das reuniões fora da empresa e nem entendo quais foram os motivos de confidencialidade. Tudo isto é totalmente falso. Aliás, durante o período de gestão desta gerência foram contratados vários novos trabalhadores e o procedimento nunca foi este. Nem percebo qual a razão, de que agora tomei conhecimento, para que “as entrevistas se realizaram fora da empresa por motivos de confidencialidade”.
Confidencialidade para com quem? Verifico agora que foi para comigo, precisamente para que não tivesse conhecimento desta contratação., o que é bem revelador da falsidade quando se invoca que tive conhecimento desta contratação. Sendo eu gerente, este tipo de procedimento é revelador do incumprimento que os outros dois gerentes tiveram para comigo, ao decidirem admitir um novo trabalhador sem que nada me fosse revelado. O único facto de que tive conhecimento foi, a posteriori, o seguinte: no controlo de factura de fornecedores a que procedo, detectei a existência de uma factura de uma empresa de recursos humanos, e questionando a chefe administrativa sobre o assunto disse-me que era um assunto do sócio gerente Dr. BB e que este daria, na altura certa, ordem de pagamento.
14. A data do contrato assinado com a nova funcionária é em 17-12-2010 posterior a Outubro e assinado pelo sócio gerente Dr. BB e pelo sócio gerente Dr. GG, sendo que estes dois sócios gerentes nunca me deram conhecimento desta contratação.
15.16. Não tive conhecimento das convocatórias para as Assembleias Gerais.
Recordo que sou somente gerente, sem ser sócio. Estava em Lisboa e era véspera da partida para a Feira Internacional ..., em Dussseldorf. De salientar que, mais tarde, em Novembro, acabei por ter conhecimento de que se iriam realizar em 15 de Novembro de 2010, duas assembleias gerais, o que me foi dado a conhecer por uma carta do sócio Sr. EE. Tratava-se duma comunicação dirigida à N... em que aquele sócio exigia documentos à empresa para poder tomar a decisão de voto nas Assembleias Gerais. O sócio gerente Dr. BB nunca me informou sobre quaisquer destas assembleias gerais. Nesta altura percebi que os comportamentos do sócio gerente Dr. BB e do sócio Dr. GG continuavam, de forma evidente e propositada, a estar substancialmente alterados. Para terminar confirmo que existe uma dívida da sócia NN aos Pais de AA sendo a mesma reconhecida pela sócia Dr.ª NN em sms enviado aos Pais de AA. Porém este facto não tem qualquer relevância para o objectivo e o intuito da comunicação que me foi enviada.
17.18.19. Em 31-03-2010 realizou-se a AG para aprovação das contas de 2010.
Estavam presentes todos os sócios ou os seus representantes bem como os dois advogados que assessoravam as duas partes. Em 12-07-2010 enviei um email ao Dr. SS dizendo que dia 15-07-2010 era a data limite do envio do IES e que o TOC e o ROC da N... apenas o enviariam se houvesse acordo das duas partes em relação à assinatura da acta da AG de 31-03-2010.
Em 13-07-2010 o Dr. SS envia email dizendo que está de acordo com o envio e que a acta terá sempre data de 31-03-2010. Nesse mesmo dia volto a enviar email ao Dr. SS por estar a ser pressionado pelo TOC e pergunto se há acordo.
Também ainda nesse dia o Dr. SS responde o que passo a citar
«Caro Dr. AA
Acredite que para mim só considerarei ter havido acordo quando a acta for assinada.
Penso, no entanto, que o acordo é viável, em face da referida reunião.
Cptos, do SS»
Em 17-11-2010 recebo email do sócio gerente Dr. BB com a acta corrigida da AG de 31-03-2010.
A razão pela qual demorou tanto tempo a chegar à versão final foi por pura estratégia dos sócios gerentes Dr. GG e Dr. BB, estratégia que desconheço e à qual sou totalmente alheio. Em 17-11-2010 respondi a todos por email fazendo os meus comentários à acta, pois o Dr. SS tinha falado em nome de todos e estava na acta a seguinte menção: “tendo o “sócio” AA dito; o “sócio” AA referiu. Ora, não percebia o porquê de assinatura estar, primeiro porque não sou sócio (nem nunca fui) e depois porque foi o Dr. SS que falou naquela reunião em nome de todos e somente usou a referência ao meu nome, nunca tendo referido o nome dos outros sócios, esses sim sócios. Foram trocados emails com o sócio Dr. GG e alguns telefonemas com o sócio gerente Dr. BB mas nunca explicaram o porquê da referência ao “sócio AA”, em vez de constar a referência a qualquer um dos outros, esses sim sócios. Em 20-11-2010, Sábado, recebi um email do Dr. SS com a acta em que trocaram o nome de AA por BB nos pontos em que se referia o meu nome. Em 22-11-2010, segunda-feira, enviei um email ao Dr. SS com a minha aprovação em relação à acta da AG de 31-03-2010.
Esta decisão não sei quando foi nem em que moldes foi tomada. Apenas tive conhecimento da mesma através de email do Dr. SS. O sócio EE assinou a acta no dia 25-11-2010.
Face ao exposto, não existe, nem nunca existiu, qualquer fundamento para me imputarem a culpa na aplicação de uma coima à sociedade. De acordo com os emails que possuo e com os comentários do sócio Sr. EE e do seu advogado Dr. TT, podemos presumir que se tratou de uma estratégia do sócio gerente Dr. BB, do sócio Dr. GG e dos respectivos advogados para promoverem o arrastamento da situação. Desconheço com que finalidades.
20. Não mantive com o Dr. BB qualquer tipo de reunião ou conversa com este teor.
21. Como acima referi, no dia 15-12-2010 o sócio gerente Dr. BB tomou conhecimento de que o Dr. GG já constava da certidão permanente como sócio gerente da empresa. Ora, tendo tomado conhecimento disto, o sócio gerente Dr. BB exigiu-me que apresentasse a minha carta de renúncia, o que recusei fazer.
22. Se o sócio gerente Dr. BB e o sócio gerente Dr. GG não querem nem precisam mais que eu exerça funções e pretendem a minha saída deverão levar a que a N... assuma as normas legais imperativas.
23. A N... nunca parou ou teve prejuízos que me possam ser imputados.
Cumpri com o acordo que foi estabelecido com a empresa. Sempre estive inteiramente disponível, estivesse onde estivesse, para resolver os assuntos da empresa. Abstenho-me aqui de relatar o que fiz, os contributos que dei para a empresa, o que implementei e o que continuo a fazer, porque o conhecimento destes factos é uma obrigação dos demais gerentes da sociedade.
São ainda apontados outros factos a que, de forma sumária, passo a responder.
É caricato, e totalmente falso, que se invoque que a negociação com clientes é feita pelo sócio gerente Dr. BB por causa das minhas ausências. Até Dezembro de 2010 sempre estive presente nas negociações.
É irrisória a referência a cheques datados a mais de 200 dias e sem controlo e que o sócio gerente Dr. BB só teve conhecimento no final do ano. A ser assim, tal facto só demonstra que o sócio gerente Dr. BB não quis saber sobre o que acontecia na empresa durante um ano, que as funcionárias administrativas, incluindo a competente e dedicada chefe administrativa JJ, não fez o seu trabalho. Isto quer dizer que os indicadores da qualidade que são da responsabilidade do sócio gerente Dr. BB não eram dada a importância que era exigida a este gerente.
Concluo então que quando da auditoria da APCER, para obter a certificação ISO..../2008, que se falou sobre o prazo de pagamentos muito dilatado o sócio gerente Dr. BB não fazia a mínima ideia do que isso é. Os objectivos da qualidade são da competência do gerente Dr. BB que nada fez durante mais de um ano, conforme reconhece de forma expressa.
É de fácil demonstração que o saldo dos cheques datados pouco se alterou durante o tempo em que sou gerente. São factos concretos. Sempre foi e continua a ser um problema os prazos de pagamento na N... e que a saída de bons clientes que faziam os seus pagamentos por transferências bancárias em prazos inferiores aos 100 dias, foram colmatados pelo incremento de volume de clientes que pagam por cheque e com prazos muito dilatados. Desenvolvi um grande esforço para se alterar isso. Para combater isto até cheguei, entre outras diligências, criei um campo novo nas tabelas de cheques datados, o que sempre foi usado para emitir um aviso para cheques com mais de 100 dias.
Sempre mantive um acompanhamento próximo sobre os processos de cobrança.
Em 10-02-2010 tive uma reunião no escritório do Dr. OO para ficar a par dos processos que envolviam a N.... O processo mais importante era o da Banco 2... que acompanhou e a N... ganhou. Durante este espaço temporal continuei a acompanhar os processos antigos bem como alguns novos, como se pode comprovar todos os emails trocados. Em relação ao sócio gerente Dr. BB estar envolvido em recuperação de créditos apenas sabia em relação a empresas/funcionários ou pessoas que deviam dinheiro à N... e ao Sr. PP ou só a este com acompanhamento do Dr. OO. Este ano tive conhecimento que foi entregue à empresa A... mercadoria já com a empresa em insolvência e que o sócio gerente Dr. BB tentou recuperar a mercadoria indo lá à empresa. Após ter tido conhecimento desta situação liguei de diversos números de telemóvel diferentes para o gerente e dei ordem à funcionária JJ para sugerir ao Dr. OO uma operação para recuperação da mercadoria.
O financiamento automóvel foi tratado em grande parte por mim, como se pode comprovar pelos emails e factos existentes. A decisão final acabou por ser tomada em conjunto pelos dois outros gerentes, os quais optaram pela opção do Banco 3..., precisamente quando esta não era a proposta financeiramente mais vantajosa, tendo em conta outros factores sendo totalmente descabida a referência ao IVA e ao Banco 1....
As referências à “área funcional” são totalmente incompreensíveis, desconhecendo-se do que se trata.
É totalmente falso que nunca tenha acompanhado os processos judiciais da empresa assim como tenha criado qualquer incompatibilidade com o Dr. OO.
São inúmeras as provas de que disponho, que contrariam mais esta falsidade.
Cumpre ainda salientar o seguinte facto: o sócio gerente Dr. BB na AG de 15-11-2010, intervindo em representação de 51% do capital da N... fez a seguinte declaração: «o gerente Dr. AA tem exercido a sua função em termos idênticos àqueles que o nortearam desde a sua nomeação.»
(…)” (art.13º da petição inicial).
13- Conforme decorre do teor da acta junta como doc. nº 16 com a petição inicial, no dia 28 de Março de 2011, a ré reuniu-se em Assembleia Geral, na qual se deliberou a destituição do autor, com justa causa e com efeitos imediatos, constando aí o seguinte:
“(…)Este pôs então à discussão o ponto um da ordem de trabalhos e deu a palavra ao sócio gerente BB que, no seu uso, referiu, até por economia procedimental, considerar reproduzido in totum o teor do relatório que fundamenta os comportamentos por acção e omissão, imputados ao gerente Dr. AA. Pelo sócio Dr. GG, nas qualidades em que participa na presente, foi dito, por ter conhecimento cabal daqueles factos, considerando a sua gravidade, sufraga também a declaração do sócio BB.
Seguidamente e por iniciativa do presidente passou-se à discussão do ponto dois um, tendo referido que as condutas imputadas ao gerente AA são muito graves e revelam a violação inequívoca dos deveres de cuidado, diligência e lealdade, consagrados no artigo 64 do CSC, porquanto o mesmo gerente praticou esses comportamentos e omitiu acções, que põem em causa o interesse da sociedade e dos sócios, revelando, sobretudo nos últimos meses, absoluta indisponibilidade, falta de comparência e de zelo, bem como negligência pelas situações prementes que a gestão da empresa impõe diariamente. Por tudo isto, entende que o mesmo deve ser destituído da gerência, atentos os motivos justos invocados e que são assim causa directa e necessária da proposta sancionatória que suscita. Dada a palavra ao sócio gerente BB, por este foi dito acompanhar na íntegra a argumentação suscitada pelo seu consócio. Posta a questão à votação foi deliberado, com os votos favoráveis dos sócios presentes e representada, a destituição, assente em justos motivos/justa causa do gerente Dr. AA. Mais foi ainda decidido pelos sócios que a gerência deve, de imediato, notificar o gerente em apreço, dando-lhe notícia de que a presente deliberação produz efeitos a partir deste momento.
(…)”. (arts. 15º e 16º da petição inicial).
14- Conforme resulta do teor da acta junta como doc. nº 16 com a petição inicial, durante a Assembleia Geral de destituição do autor como gerente, o sócio EE e na qualidade de Presidente da Mesa da Assembleia Geral considerou que, face à resposta apresentada pelo autor, e de forma a que a sociedade tomasse uma deliberação consciente, apresentou como proposta a suspensão dos trabalhos nos termos do disposto no art. 387º do CSC de forma a que o autor fosse convocado para comparecer na Assembleia, a fim de esclarecer vários pontos da sua resposta, sendo que os sócios Dr. GG e Dr. BB não concordaram com a proposta, invocando a ilegalidade da decisão por falta de legitimidade e por que a norma não tem aplicação directa às sociedades por quotas, acrescentando que as suspensões para serem válidas e legais dependiam da deliberação dos sócios (arts. 17º, 18º, 27º, 28º, 29º da petição inicial)
15- Nesta data, o autor, já estava separado de facto da sua esposa, sócia da ré, Dra. NN (art. 19º da petição inicial).
16- Conforme resulta do teor da acta junta como doc. nº16 com a petição inicial, apesar da posição dos outros dois sócios aludida em 14), o sócio EE, e simultaneamente, Presidente da Mesa da Assembleia Geral, decidiu suspender a sessão nos termos do disposto no art. 387º, nº1, do CPC, e designar o dia 07 de Abril de 2011 para a sua continuação, e após se ter ausentado da referida Assembleia, os outros dois sócios, e em representação da sócia NN, retomaram os trabalhos, assumindo a Presidência da Mesa, o sócio GG, e aprovaram a destituição do autor (arts. 20º, 31º e 32º da petição inicial)
17- Conforme resulta do teor dos docs. nºs 17 e 18 juntos com a petição inicial, no dia 29/3/2011, a ré enviou ao autor, quer através de carta, quer através de e-mail, a comunicação da decisão de destituição com justa causa e informou-o de que deveria comparecer nas instalações daquela, no dia 4/4/2011, a fim de proceder à entrega dos bens e equipamentos da empresa. (arts. 21º e 22º da petição inicial).
18- O autor, em face da recepção do e-mail da ré, respondeu, pela mesma via, no dia 30/3/2011, que, perante aquela comunicação, não iria no dia seguinte à empresa como sempre acontecia, conforme decorre do teor do doc. nº18 junto com a petição inicial (art. 23º da petição inicial).
19- Conforme decorre do teor do doc. nº 19 junto com a petição inicial, no dia 1 de Abril de 2011, quer através de carta registada com AR, quer através de email, o autor enviou à ré a seguinte missiva, que se passa a transcrever:
Na passada 4ª feira, 30.03.2011, recebi uma carta de V.Exas. (datada de 29.03.2011), em que V.Exas. comunicam a minha “destituição com justos motivos/justa causa, com efeitos imediatos”.
Nos termos que constam desta comunicação, esta decisão terá sido adoptada na reunião da Assembleia Geral realizada em 28 de Março de 2011.
Apesar de não constar desta comunicação, parto do princípio de que se trata da destituição como gerente. E isto porque, na anterior comunicação (a que respondi) V.Exas. imputavam-me um conjunto de factos que alegadamente seriam motivo para a minha destituição como gerente.
Uma vez tomada a decisão dessa destituição, desconheço quais foram os motivos para a mesma, já que não me foi enviada qualquer outra comunicação ou qualquer anexo àquela carta de V.Exas. de 29 de Março de 2011.
Por outro lado, e como é do inteiro conhecimento de V.Exas, sou trabalhador da N..., assim sendo efectuados os competentes descontos e contribuições para a segurança social.
Face a isto, agradeço que me informem se poderei retomar as minhas funções como trabalhador da N... ou se V.Exas. procederam à minha “destituição com justos motivos/justa causa, com efeitos imediatos” relativamente à minha condição de trabalhador.
Fico a aguardar pela resposta de V.Exas. a esta questão.
Conforme exigido por V.Exas., estou totalmente disponível “para proceder à entrega dos bens e equipamentos da empresa que estão em meu poder”. Estes bens e equipamentos resumem-se ao seguinte:
- cartão de telemóvel:
- chaves das instalações da N...;
- Comando do portão da N...;
- Cartões de acesso aos bancos, senhas e matrizes;
Como alguns destes bens e equipamentos são necessários para continuar a exercer as minhas funções de trabalhador, agradeço que V.Exas. me confirmem se deverei entregar a totalidade do aqui indicado, também em função da resposta à questão acima colocada.
Fico a aguardar pela resposta de V.Exas. a esta questão até às 12 horas de 2ª feira, dia 04.04., data limite que me foi conferida “para proceder à entrega dos bens e equipamentos da empresa que estão em meu poder”. Na falta de qualquer resposta a esta questão, procederei, conforme me foi ordenado na carta de V.Exas. de 29.03., à entrega de tudo o que está acima relacionado.
Aproveito para informar que também irei proceder à entrega das despesas referentes ao mês de Março de 2011.
(…)” (art.24º da petição inicial)
20- O autor não obteve qualquer resposta por parte da ré, pelo que, no dia 4/4/2011, deslocou-se às instalações da ré, entregando os bens e equipamentos da empresa em seu poder (arts. 25º e 26º da petição inicial).
21- Conforme resulta do teor do doc. nº 20 junto com a petição inicial, em 9/03/2010, o autor recebeu um email do Dr. GG no qual respondeu ao fax de 16/12/2009 do sócio EE, no qual refere:
«Quero também referir-lhe que a nomeação do Dr. AA para o cargo de gerente não foi pelos motivos que na altura pressupôs mas antes porque já sabíamos qual seria o movimento seguinte do Sr. EE, que seria abandonar a gerência para nos deixar em dificuldades, ameaça que aliás não era virgem, pois já a tinha formulado noutras ocasiões. Assim tal nomeação foi apenas para prevenir o futuro e para a empresa não ficar em grandes dificuldades e inclusive com problemas financeiros com uma saída abrupta do Sr. EE que demoraria sempre algum tempo a colmatar. Desta maneira foi muito mais simples anular os efeitos da sua saída». (art.96º da petição inicial).
22-Em 08/03/2010, o autor recebeu e-mail do sócio Dr. GG no qual referia que:
“AA é necessário rapidamente dar inicio ao processo de preparação dos documentos…Assim sugeria-te que amanhã e de uma maneira informal perguntasses ao TOC que eu também vou fazer o mesmo aqui com o Dr. EE se conhece alguém ou algum gabinete a quem se possa encomendar rapidamente um estudo económico da empresa. É também necessário pedir aos vários bancos propostas e quais os limites do financiamento proposto dizendo que se pretende fazer um investimento na ordem dos 1.250… E em instalações e equipamentos. Todo este processo deverá ser posto em marcha rapidamente pois não vai haver muito tempo para o fazermos. Se te lembrares de alguma coisa mais diz-me. Vai também ser necessário oficializar as propostas das máquinas e de mais algo que achem importante, bem como contactar de novo o construtor para saber se os orçamentos se mantem ainda válidos ou se é necessário fazer uma reavaliação. Um abraço e vamos falando mas é muito importante que mantenhas agora muito atento GG”. (art. 98º da petição inicial).
23- Em 31/03/2010, realizou-se a Assembleia Geral para aprovação das contas de 2010, no qual estiveram presentes todos os sócios ou seus representantes e dois advogados que assessoravam as duas partes (arts. 146º e 147º da petição inicial).
24- Em 12/07/2010, o autor enviou um email ao Dr. SS, advogado, no qual o alertou que o dia 15/07/2010 era a data limite do envio do IES, e informou de que o TOC e o ROC apenas o enviariam se houvesse acordo das duas partes em relação à assinatura da acta da AG de 31/03/2010 (art. 148º da petição inicial).
25- Em 13/07/2010, Dr. SS enviou um email através do qual referiu que estava de acordo com o envio e que a acta teria sempre a data de 31/03/2010 (art. 149º da petição inicial).
26- Nesse mesmo dia, o autor enviou o email ao Dr. SS em virtude de estar pressionado pelo TOC a perguntar se havia acordo (art.150º da petição inicial).
27-E nesse mesmo dia, o Dr. SS respondeu, referindo:
Caro Dr. AA
Acredite que para mim só considerarei ter havido acordo quando a acta for assinada.
Penso, no entanto, que o acordo é viável, em face da referida reunião.
Cptos, do SS”. (art. 151º da petição inicial).
28- Em 17/11/2010, o autor recebeu o email do sócio-gerente Dr. BB com a acta corrigida da AG de 31/03/2010 (art. 152º da petição inicial).
29- Em 20/11/2010, Sábado, o autor recebeu um email do Dr. SS acompanhado da acta, na qual estava trocado o nome de AA por BB nos pontos em que se referia ao nome do autor (art. 157º da petição inicial).
30- Em 22/11/2010, Segunda-Feira, o autor enviou um email ao Dr. SS, com a sua aprovação em relação à acta da AG de 31/03/2010 (art.158º da petição inicial).
31- O contrato com a nova funcionária que foi assinado em 17/12/2010 e assinado por parte da ré através dos sócios gerentes GG e BB e que assumiu funções, em Janeiro de 2011 (art. 179º da petição inicial).
32- Era o gerente BB que assumia desde o final de 2009 o sector das compras (art. 85º da contestação).
33- O autor estava incumbido de negociar preços da matéria-prima (art. 86º da contestação).
34- Pertencia ao outro gerente ao tempo, BB, a definição dos materiais, quantidades e fornecedores (art. 87º da contestação).
35- Ulteriormente, a área da produção foi delegada no Engº UU (art. 88º da contestação).
36 - -Na acta da sessão da Assembleia Geral da ré de 28/03/2011, na qual foi aprovada a sua destituição, não consta que a sua comunicação escrita tenha sido discutida por parte dos sócios (item i) do ponto 1) dos temas da prova/art. 48º da petição inicial; alterado por esta Relação conforme fundamentação infra).
37- O autor deslocou-se pelo menos, dois/três dias, por semana, desde o início das suas funções, até à data da sua destituição, à empresa (item ii) do ponto 1) dos temas da prova/art. 80º da petição inicial).
38- Durante a ausência do espaço físico da ré, o autor dava pontualmente resposta a algumas das necessidades da empresa, falando ao telefone ou trocando e-mails com os funcionários, clientes, fornecedores, instituições bancárias e os advogados da ré, Dr. OO e Dr. SS (resposta restritiva ao item iv) do ponto 1) dos temas da prova/art. 82º da petição inicial).
39- Pelo menos, em duas ocasiões realizaram-se conferências telefónicas, em alta voz, entre autor, o gerente BB e o trabalhador/responsável pela secção de extrusão, HH, tendo por objectivo a resolução de problemas ou aquisições de material (resposta explicativa e restritiva ao item v) do ponto 1) dos temas da prova/art. 83º da petição inicial).
40- Pelo menos, em fins de Agosto/princípios de Setembro de 2010, o autor esteve, por duas ocasiões, em Madrid, com o gerente BB e o trabalhador HH para a compra de uma máquina extrusora (resposta explicativa e restritiva ao item vi-a) do ponto 1) dos temas da prova/art. 84º da petição inicial).
41- Em 9/3/2010, o autor recebeu email do sócio Dr. GG, no qual referia que:
«AA é necessário rapidamente dar início ao processo de preparação dos documentos…Assim sugeria-te que amanhã e de uma maneira informal perguntasses ao TOC que eu também vou fazer o mesmo aqui com o Dr. EE se conhece alguém ou algum gabinete a quem se possa encomendar rapidamente um estudo económico da empresa. É também necessário pedir aos vários bancos, propostas e quais os limites do financiamento proposto dizendo que se pretende fazer um investimento na ordem dos 1.250… E em instalações e equipamentos. Todo este processo deverá ser posto em marcha rapidamente pois não vai haver muito tempo para o fazermos. Se te lembrares de alguma coisa mais diz-me. Vai também ser necessário oficializar as propostas das máquinas e de mais algo que achem importante, bem como contactar de novo o construtor para saber se os orçamentos se mantem ainda válidos ou se é necessário fazer uma reavaliação Um abraço e vamos falando mas é muito importante que mantenhas agora muito atento GG» (item xi) do ponto 1) dos temas da prova/art. 98º da petição inicial – eliminado pelas razões infra).
42- Os objectivos da qualidade eram da competência do gerente Dr. BB (resposta restritiva ao item xv) do ponto 1) dos temas da prova/art. 121º da petição inicial).
43- O autor desenvolveu um esforço para proceder à alteração desta situação, nomeadamente, criou um campo novo nas tabelas de cheques datados, para emitir um aviso para cheques com mais de 100 dias, e que sempre foi usado (resposta restritiva ao item xviii) do ponto 1) dos temas da prova/art. 125º da petição inicial).
44- No ano de 2011, o autor teve conhecimento que foi entregue à empresa A..., empresa já, em insolvência, a mercadoria (item xix) do ponto 1) dos temas da prova/art. 128º da petição inicial).
45- E teve conhecimento que o sócio gerente Dr. BB deslocou-se a essa empresa para tentar recuperar a mercadoria (item xx) do ponto 1) dos temas da prova/art. 129º da petição inicial).
46O autor acompanhou alguns processos de cobrança (resposta restritiva ao item xxii) do ponto 1) dos temas da prova/art. 133º da petição inicial).
47- A decisão final quanto ao financiamento automóvel foi tomada em conjunto pelos dois outros gerentes, Drs. GG e BB (parte do item xxiv) do ponto 1) dos temas da prova/arts. 136º e 137ºº da petição inicial).
48- O autor acompanhou alguns processos judiciais da ré, nomeadamente, trocado e-mails com o advogado OO, (item xxv) do ponto 1 dos temas da prova/art. 142º da petição inicial).
49- O autor respondeu através de e-mails a todos os intervenientes, fazendo os seus comentários à acta corrigida de 31/03/2010, pois o Dr. SS tinha falado em nome de todos e estava na acta a seguinte menção: «tendo o sócio AA dito; o sócio AA referiu» (item xxvi) do ponto 1) dos temas da prova/art. 154º da petição inicial).
50- Por não entender o motivo pelo qual existia, na acta, a referência à sua pessoa, porque, em primeiro lugar, o autor não era, nem nunca foi sócio, e, em segundo lugar, quem tinha usado da palavra em nome de todos tinha sido o Dr. SS, foram trocados e-mail com o sócio Dr. GG e havido uma reunião com o sócio gerente Dr. BB (item xxvii) do ponto 1) dos temas da prova/art. 155º da petição inicial).
51- O autor teve conhecimento da decisão de corrigir a acta nos termos apontados no art. 157º da petição inicial através do “email” aí mencionado do Dr. SS (item xxix) do ponto 1) dos temas da prova/art. 160º da petição inicial).
52- Após a sua destituição, o autor continuou a exercer o cargo de gerente da empresa C... que desempenhava, à data em que foi nomeado gerente da ré e até à sua destituição do cargo de gerente da ré, na qual (C...) auferia e auferiu uma retribuição mensal liquida de €750,00 (resposta explicativa e restritiva ao item xxxii) do ponto 1) dos temas da prova/arts. 206º e 207º da petição inicial).
53- No dia 28/03/2011, o autor esteve na “sede” da ré, tendo ali chegado pelas 17,30 horas, limitando-se a entregar à gerência a sua resposta, através de uma trabalhadora da empresa (item i) do ponto 2) dos temas da prova/arts. 54º e 55º da contestação).
54- Em final de Março/princípio de Abril de 2010, o autor disse ao sócios GG e BB que pretendia afastar-se da gerência, invocando razões de foro pessoal (item iii) do ponto 2) dos temas da prova/art. 2º da contestação).
55- Em Março de 2010 na preparação dos documentos da prestação de contas do exercício de 2009, o autor entrou em colisão com o TOC da ré, FF, por pretender “abandonar” a reunião onde se ultimavam todos esses documentos, com o argumento que era muito tarde (resposta restritiva do item iv) do ponto 2) dos temas da prova/art. 67º da contestação).
56- O processo de contratação de uma pessoa para o substituir finalizou-se, em Outubro de 2010, cujas reuniões da ré com as diversas empresas de recursos humanos tiveram lugar na empresa e as entrevistas foram realizadas fora da empresa por motivos de confidencialidade (resposta explicativa/restritiva ao item xiv) do ponto 2) dos temas da prova/parte do art. 74º da contestação).
57- Após o registo da nomeação de GG como gerente, em meados de Dezembro 2010, o gerente BB abordou o autor, referindo-lhe que, em Janeiro de 2011, deveria renunciar à gerência, dado que o colaborador contratado iniciaria funções (item xix) do ponto 2) dos temas da prova/parte do art. 74º da contestação).
58- Em resposta, o autor referiu que só abandonaria a ré desde que lhe fosse paga uma indemnização correspondente a quatro anos de mandato e a sua ex-mulher, irmã do gerente BB, pagasse uma dívida que tinha para com o seu pai, dele autor (item xx) do ponto 2) dos temas da prova/parte do art. 74º da contestação).
59- (aditado por esta Relação pelas razões infra) Aquando da deliberação social da sua destituição o autor sentia-se angustiado, tendo necessitado de apoio psicológico, bem como de apoio familiar”.
60- (aditado por esta Relação pelas razões infra) Na sequência da vontade manifestada pelo A. no sentido de abandonar imediatamente a gerência, foi-lhe solicitado pelos sócios GG e BB que se mantivesse no exercício das funções durante cerca de 2/3 meses de modo a permitir assegurar a transição de funções, o A., através de email de 23 de Setembro de 2010 remetido pelo A. à sua então mulher NN, disse anuir, por respeito pelos trabalhadores da empresa e a imagem dos avós da sua mulher, fundadores da empresa R..
B) - Factos não provados:
I- Os números de dias em que o autor se encontrava presente na empresa foram reduzidos a dois dias por semana na sequência do acordado com o Dr. GG, com conhecimento do Dr. BB (item iii) do ponto 1 dos temas da prova/art. 81º da petição inicial).
II- Em 15/11/2010, o autor estava a cumprir as suas funções sem reparo dos sócios (item vi-b) do ponto 1) dos temas da prova/art. 86º da petição inicial).
III- Em 15/12/2010, data em que o autor comunicou ao sócio gerente Dr. BB que o sócio recém-nomeado gerente, o Dr. GG, já estava registado na conservatória do registo comercial e constava da certidão permanente, aquele exigiu ao autor que apresentasse, de imediato, a sua carta de renúncia à gerência, e não entendendo a alteração de comportamento daquele sócio gerente, o autor respondeu que não o faria (item vii) do ponto 1) dos temas da prova/art. 87º da petição inicial) (item viii) do ponto 1) dos temas da prova/art. 88º da petição inicial).
IV- Perante a resposta do autor, e desde essa data, o sócio gerente Dr. BB não manteve para com o autor qualquer tipo de diálogo, de relação ou de educação, arredando-o das compras de material e de todas as decisões da empresa; reduzindo-as ao controlo de pagamentos de clientes e fornecedores, e, bem assim, a assinar documentação necessária (item ix) do ponto 1 dos temas da prova/art. 89º da petição inicial).
V- O sócio Dr. GG, numa reunião com o autor, anunciou que a solução para a ré passaria pela sua nomeação como gerente, pois a ré obrigava-se, segundo os estatutos, com a intervenção de dois gerentes, pelo que, passando a gerência a ser composta pelo Sr. EE, pelo Dr. BB e pelo autor, tal facto iria enfraquecer a posição do sócio EE o que poderia levar a que este fosse forçado a renunciar à gerência ou a comprar ou a vender as quotas (item x) do ponto 1) dos temas da prova/art. 95º da petição inicial).
VI- O autor, até Dezembro de 2010, sempre esteve presente nas negociações (item xii) do ponto 1) dos temas da prova/art. 110º da petição inicial).
VII- Pelo menos, até final do ano de 2010, o sócio gerente Dr. BB não quis saber sobre o que acontecia na empresa esse ano (item xiii) do ponto 1) dos temas da prova/art. 118º da petição inicial).
VIII- Aquando da auditoria da APCER, para obter a certificação ISO..../2008, na qual se falou sobre o prazo de pagamentos muito dilatado, o sócio gerente Dr. BB não fazia a mínima ideia do que se estava a falar (item xiv) do ponto 1) dos temas da prova/art. 120º da petição inicial).
IX- O gerente BB nada fez durante mais de um ano (ou seja, até finais de 2010) (parte do item xv) do ponto 1) dos temas da prova/art. 121º da petição inicial).
X- O saldo dos cheques datados pouco se alterou durante o tempo em que o autor foi gerente (item xvi) do ponto 1) dos temas da prova/art. 122º da petição inicial).
XI- A saída de bons clientes, que faziam os seus pagamentos por transferências bancárias em prazos inferiores aos 100 dias, foi colmatada pelo incremento de volume de clientes que pagavam por cheque e com prazos muito dilatados (item xvii) do ponto 1) dos temas da prova/art. 124º da petição inicial).
XII- Após ter conhecimento dessa situação, o autor tentou de várias formas contactar a empresa insolvente, tendo inclusivamente chegado a transmitir ao advogado da ré para avançar com uma operação de recuperação do material (item xxi) do ponto 1) dos temas da prova/art. 130º da petição inicial).
XIII- O autor tinha conhecimento que o sócio-gerente BB estava envolvido na recuperação de créditos de empresas/trabalhadores que deviam à ré e ao Sr. PP
(item xxiii) do ponto 1) dos temas da prova/art. 134º da petição inicial).
XIV- Os quais optaram pela proposta do Banco 3..., quando esta não era a proposta financeiramente mais vantajosa, tendo em conta outros factores (parte do item xxiv) do ponto 1) dos temas da prova/arts. 136º e 137ºº da petição inicial).
XV- Os quais nunca explicaram a razão da referência ao “sócio AA”, em vez de constar a referência a qualquer um dos outros sócios (parte do item xxviii) do ponto 1) dos temas da prova/parte do art. 156º da petição inicial).
XVI- O autor teve conhecimento, “a posteriori”, da contratação do funcionário que iria substituir o autor quando ao realizar o controlo de factura de fornecedores, detectou a existência de uma factura de uma empresa de recursos humanos, e questionando a chefe administrativa sobre o assunto, aquela transmitiu que era um assunto do sócio gerente Dr. BB e que este daria, na altura certa, ordem de pagamento (item xxx) do ponto 1) dos temas da prova/art. 177º da petição inicial).
XVII- O autor teve conhecimento de que se iriam realizar em 15 de Novembro de 2010, duas assembleias gerais, em princípios de Novembro de 2010, através de uma carta do sócio EE, dirigida à ré, mediante o qual exigia documentos à empresa para poder tomar a decisão de voto nas Assembleias Gerais (item xxxi) do ponto 1) dos temas da prova/art. 184º e 185 da petição inicial).
XVIII - Com a decisão da ré, o autor sentiu-se vexado, humilhado e difamado no seu bom nome, imagem e reputação porquanto e para além de lhe ter sido retirado grande parte das suas funções e afastado das tomadas de decisões, a deliberação social da sua destituição assente em factos inverdadeiros provocou nele angústia e ansiedade ((tens xxxiii) e xxxiv) do ponto 1) dos temas da prova/arts. 211º e 212º da petição inicial – transita, em parte, para a matéria provada, conforme fundamentação infra).
XIX- Tendo-se reunido antes na “sede” da ré, num dos gabinetes do rés-do-chão, com o EE (item ii) do ponto 2) dos temas da prova/art. 56º da contestação).
XX- A partir de Abril de 2010, o autor passou a estar na ré 1 ou 2 dias por semana e houve semanas em que não apareceu, nomeadamente, em Dezembro de 2010, foi à ré, apenas, no dia 6/12 (item v) do ponto 2) dos temas da prova/arts. 78º a 81º da contestação).
XXI- As ausências do autor eram notadas pelos trabalhadores (item vi) do ponto 2) dos temas da prova/art. 82º da contestação).
XXII- O autor foi-se afastando por sua exclusiva vontade das suas funções a partir de Junho de 2010 (item vii) do ponto 2) dos temas da prova/art. 84º da contestação).
XXIII- Dadas as ausências ou desconhecimento da situação por parte do autor, o gerente, ao tempo, BB assumiu a negociação dos preços da matéria-prima, até aí pertencente ao autor, a partir de Junho de 2010 (item viii) do ponto 2) dos temas da prova/arts. 89º e 90ºº da contestação).
XXIV- E tudo o que era da área funcional do autor era tratado pelas funcionárias da empresa, com exclusiva supervisão do gerente BB (item ix) do ponto 2) dos temas da prova/parte do art. 74º da petição inicial).
XXV- Os financiamentos automóveis passaram a ser tratados pelo gerente BB, dado que o autor não estudava as propostas, nomeadamente, não atentava nos custos do IVA de tais financiamentos (parte do item x) do ponto 2) dos temas da prova/parte do item 74º da contestação).
XXVI- Em virtude do aludido em v) a ix), o gerente da ré BB teve uma reunião com o autor, em Julho de 2010 explicando-lhe a necessidade de maior apoio (item xi) do ponto 2) dos temas da prova/parte art. 74º da contestação).
XXVII - Nessa ocasião, o autor respondeu-lhe que era melhor contratar outra pessoa e que iria sair da empresa, pois não tinha condições emocionais para continuar em consequência do agravamento da sua situação pessoal (item xii) do ponto 2) dos temas da prova/parte do art.74º da contestação).
XXVIII- Foi-lhe, então, solicitado que ficasse mais dois ou três meses de modo a ser assegurada a contratação de uma pessoa para o substituir (item xiii) do ponto 2) dos temas da prova/parte do art. 74º da contestação).
XXIX- Foi após a contratação da pessoa para substituir o autor, em Outubro de 2010, que se agravaram os problemas com o autor que disse que não assinava as convocatórias para as duas Assembleias Gerais que foram convocadas, por existir uma dívida da sua mulher e sócia da ré para com o seu pai (item xv) do ponto 2) dos temas da prova/parte do art. 74º da contestação).
XXX- Em termos jurídicos, o autor nunca acompanhou nenhum processo que a empresa tinha e desde princípios do ano de 2010 até Março de 2011 não teve nenhuma reunião com o advogado da ré Dr. OO, invocando que tinha alguma incompatibilidade com o mesmo por não lhe ter respondido a um email (item xvi) do ponto 2) dos temas da prova/parte do art. 74º da contestação).
XXXI- Numa reunião havida com o autor para ultrapassar o impasse relacionado com a recusa do autor assinar a acta da Assembleia Geral de aprovação das contas, o autor referiu de novo ao gerente BB que queria sair da ré, pois ia divorciar-se da mulher (item xvii) do ponto 2) dos temas da prova/parte do art. 74º da contestação).
XXXII - Em resposta, o gerente BB informou o autor de que a pessoa que ia substitui-lo, iria entrar no início do ano, e por isso, no início de Dezembro de 2010, o autor apresentaria a carta de renúncia (item xviii) do ponto 2) dos temas da prova/parte do art. 74º da contestação).
***
Pretende o recorrente que a sentença recorrida enferma da nulidade prevista na al. c) do nº 1 art. 615º do Código de Processo Civil (CPC), sustentando que conclui que a ré não provou qualquer facto subsumível ao conceito de justa causa para destituir o autor de gerente da ré e, todavia, quanto ao segundo pedido, decidiu que não merecia acolhimento a pretensão indemnizatória deduzida pelo autor. A alínea c) do nº 1 do artigo 615º do CPC fulmina de nulidade a sentença quando os fundamentos estejam em oposição com a decisão. Tal norma contempla os casos em que a sentença enferma de vício lógico que a compromete. A construção da sentença é, então, viciosa, pois os fundamentos invocados pelo juiz conduziriam logicamente, não ao resultado expresso na decisão, mas a resultado oposto (cfr. Alberto dos Reis, Cód. de Processo Civil Anotado, vol. V, p. 141). "A oposição referida na alínea c) do nº 1 é a que se verifica no processo lógico, que das premissas de facto e de direito que o julgador tem por apuradas, este extrai a decisão a proferir" (Rodrigues Bastos, "Notas ao CPC", vol. III, p. 246); a fundamentação aponta num sentido, e a decisão segue caminho oposto ou, pelo menos, direcção diferente (Antunes Varela, J. Miguel Bezerra e Sampaio e Nora, "Manual de Processo Civil", 2ª edição, 1985, p. 690). As nulidades de decisão são vícios intrínsecos (quanto à estrutura, limites e inteligibilidade) da peça processual que é a própria decisão (trata-se, pois, de um error in procedendo), nada tendo a ver com os erros de julgamento (error in judicando) seja em matéria de facto seja em matéria de direito. As nulidades da sentença são vícios formais, intrínsecos de tal peça processual, taxativamente consagrados no nº 1, do art. 615º, sendo tipificados vícios do silogismo judiciário, inerentes à sua formação e à harmonia formal entre premissas e conclusão, não podendo ser confundidas com hipotéticos erros de julgamento (error in judicando) de facto ou de direito (cfr., entre vários, Acs. do STJ de 1/4/2014, Processo 360/09: Sumários, Abril /2014, e Ac. da RE de 3/11/2016, Processo 1070/13, todos in www.dgsi.pt). Como seus vícios intrínsecos, são apreciadas em função do texto e do discurso lógico desenvolvidos na sentença, não se confundindo com a errada aplicação das normas jurídicas aos factos, erros de julgamento, nem com desconformidades entre aquele texto e discurso e os de outros anteriores actos processuais, tudo a sindicar noutro âmbito. Há nulidade da sentença quando a sua parte dispositiva está em contradição com as premissas efectivamente adoptadas pelo juiz e não com aquelas premissas que, no entender de uma das partes, ele deveria ter adoptado, mas não adoptou.
Assim traçado o correspondente enquadrado normativo, não ocorre aqui semelhante nulidade. Lida a douta sentença recorrida, constata-se que efectivamente descarta que a ré tivesse provado qualquer facto subsumível ao conceito de justa causa, nos termos previstos no art. 257.º n.º 6, do Código das Sociedades Comerciais (CSC), proclamando que destituiu o autor sem justa causa de gerente da ré. No entanto, e segundo o entendimento de direito aí acolhido, tal não basta para a procedência da pretensão indemnizatória deduzida, não é sua condição suficiente:
Por isso se tem julgado que o direito de indemnização implica forçosamente a comprovada existência de danos, exigindo-se a demonstração de factos reveladores de que a situação real do lesado é após a destituição mais gravosa do que aquela em que se encontraria sem ela - artºs 562º e 566º, nº 2, do Código Civil.
(…)
Ora, deflui da apreciação critica conjunta dos factos provados e dos factos não provados que é inegável que o autor - ao arrepio do “ónus probandi” que sobre si impendia - cf. art. 342º, nº1, do C.CIV - não provou que lhe advieram quaisquer dos invocados danos não patrimoniais alegadamente sofridos, em resultado da destituição sem justa causa de gerente (cf. ponto XVIII dos Factos Não Provados).
Como, assim - e sem maiores considerações, por manifestamente inúteis - impõe-se inelutavelmente concluir que não é devida ao autor pela ré uma indemnização, a título de danos não patrimoniais, e por inerência lógica, o autor decai, nessa parte, da pretensão ora deduzida.
Quanto aos invocados danos não patrimoniais, ajuizou a sentença sob recurso:
Não se provou, porém - como é bom de ver, e ao invés do ora invocado pelo autor - que por causa da conjuntura económica, e face à destituição de gerente da ré, que obteve o emprego na dita empresa C..., Lda. na qual auferia o vencimento mensal de €750.00.
Resulta do exposto atrás que é inequívoco que, na linha do entendimento perfilhado nos doutos Acs. do STJ de 14.12.2006 e de 07/07/2010, disponíveis, in www.dgsi.pt., tal factualidade provada, não é reveladora de que a situação económica real do gerente é, após a destituição, pior do que aquela em que se encontrava, se ela não tivesse ocorrido, não bastando a prova da perda da remuneração devida pelo exercício da gerência, pelo que o gerente não os alegou, ou se não os provou, não há que fixar indemnização.
Ou seja, cabia ao autor a alegação e o correspondente ónus de prova de que a destituição de gerente lhe havia causado prejuízos, para que pudesse ser fixada uma indemnização, por não se verificar a justa causa constitui direito a indemnização, mas tal indemnização só poderia ocorrer, caso se verificassem prejuízos, os quais o autor não provou.
Forçosamente se conclui, em face do exposto, portanto, que in casu” não merece acolhimento a pretensão indemnizatória deduzida pelo autor em resultado da sua destituição de gerente da ré, sem justa causa.
Como se apura dos transcritos excertos, a rejeição da pretensão indemnizatória, quer quanto aos danos patrimoniais, quer quanto aos danos não patrimoniais, baseia-se na falta de demonstração do pressuposto dano, nunca aí se tendo dado por verificada a existência de damos indemnizáveis. Sem prejuízo da apreciação do mérito de tal posição, a articulação lógica entre os fundamentos – premissas – e a decisão – conclusão – não sofre aqui qualquer quebra. Assim, inexistindo a apontada contradição ou incompatibilidade lógica, impõe-se desatender a nulidade arguida.
Ambos os recursos têm como escopo impugnar a decisão recorrida sobre matéria de facto, pretendendo o autor a eliminação do ponto 41, por repetição com o ponto 22, e a inversão para provados dos pontos II (por contradição com o ponto 8 julgado provado) e XVIII julgados não provados. Por sua vez, a ré sustenta a inversão para não provados dos pontos 36 e 37 julgados provados, bem como a inversão em sentido afirmativo do pontos XX , XXI , XXII , XXIII , XXIV , XXVI , XXVII , XXIX, bem como o aditamento aos factos julgados provados de dois novos pontos, com a seguinte formulação:
“(i) O A. não cumpriu cabalmente as suas funções, pondo em causa o exercício da funções de gerente, o que motivou a sua destituição assente em motivos configuradores de justa causa.”
“(ii) Na sequência da vontade manifestada pelo A. no sentido de abandonar imediatamente a gerência, foi-lhe solicitado pelos sócios Dr. GG e BB que se mantivesse no exercício das funções durante cerca de 2/3 meses de modo a permitir assegurar a transição de funções, tendo o A. anuído invocando o respeito pelos trabalhadores da empresa e a imagem dos avós da sua mulher, fundadores da empresa R..”
A decisão sobre matéria de facto pode ser alterada pela Relação, nos termos do art. 662º, n.º 1 CPC quando, tendo ocorrido gravação dos depoimentos prestados, como foi o caso nos autos, “(…) os factos tidos como assentes, a prova produzida ou um documento superveniente impuserem decisão diversa”. Os recorrentes cumprem os pressupostos de ordem formal para se proceder à reapreciação da decisão da matéria de facto, tendo transcrito excertos dos depoimentos de testemunhas e declarações de parte que, no seu entender, apoiam a sua tese. Em conformidade, a Relação reaprecia a prova, tendo-se, para tal, procedido à audição integral dos registos fonográficos dos depoimentos produzidos em audiência.
Preliminarmente, e constatando-se a patente repetição da matéria do ponto 22) julgado provado no ponto 41), vai este eliminado, por manifesta redundância.
Não há, salvo melhor opinião, qualquer relação de implicação necessária entre a matéria do ponto II) julgado não provado e o vertido sob 8) do factos provados. Em primeiro lugar, o aludido ponto 8) reproduz apenas uma afirmação do sócio o sócio-gerente BB, e não não dos restantes, Depois, ter “exercido a sua função em termos idênticos àqueles que o nortearam desde a sua nomeação” não implica que nesses anteriores termos não possa ter existido algum reparo desse e dos demais sócios, ainda que pontual. Mantém-se, por isso, inalterada a não prova do ponto II) sob impugnação, bem como a formulação do ponto 8).
No tocante ao ponto XVIII julgado não provado, fundamentou o Mmo. Juiz a sua convicção negativa nos seguintes termos:
Relativamente aos factos constantes dos pontos XVIII), deveu-se à manifesta insuficiência probatória, pois que não só os depoimentos prestados pelas testemunhas indicadas pelo autor quanto a tal matéria, ou não responderam à mesma ou evidenciaram não terem conhecimento de tal realidade dos factos, nomeadamente, os trabalhadores da ré, ou então, os depoimentos prestados pelas testemunhas que responderam a tal matéria, nomeadamente, CC, amigo próximo de longa data do autor e o qual foi sócio-gerente da empresa C..., Lda. em que o autor também era e é sócio – gerente até uns anos depois de o autor ter sido destituído de gerente da ré; DD, pai do autor, e EE, o qual desempenhou o cargo de gerente na ré até Dezembro de 2009, e foi sócio da ré até uns anos depois da destituição do autor, em Março de 2011, também não evidenciaram que os mesmos tinham conhecimento directo e sólido da vida da empresa ré e dos moldes em que o autor desempenhou o cargo de gerente durante o período compreendido entre Novembro de 2009 até à sua destituição, em Março de 2011, e ao mesmo tempo, os depoimentos ora prestados pelos mesmos também não se mostraram espontâneos, assertivos e objectivos, e em face disso, não nos mereceram a credibilidade devida ao ponto de nos convencerem, sem margem para dúvidas, da veracidade da matéria, em apreço, assim como os factos provados também não são demonstrativos que o autor desempenhou cabalmente as suas funções na ré, e portanto, as razões aí invocadas na assembleia geral em que os sócios deliberaram aí a sua destituição eram falsas e inverdadeiras, e em face disso, não se nos afigura legítimo presumir-se naturalmente, com recurso às regras da experiência comum, que o autor se sentisse vexado, humilhado e difamado no seu bom nome, imagem e reputação, e muito menos, que provocasse nele ansiedade e angústia.
Sendo entendimento do autor que o Mmo. Juiz deveria ter conferido todo o crédito às testemunhas em questão, que confirmaram toda a matéria aí vertida, inclusive porque tal se mostra conforme à reacção natural de qualquer pessoa perante semelhante situacção de destituição. Ora, da prova produzida não resulta um quadro tão nítido quanto aquele que o autor pretende configurar. Que à época da destituição o autor se encontrava triste e angustiado, necessitado de apoio psicológico e de apoio familiar, parece inquestionável. No entanto, não é tão claro que tudo isso se devesse ao facto da destituição em si mesmo. Em Março do mesmo ano de 2010 o autor tinha-se separado de NN, filha e irmã dos gerentes da ré, em circunstâncias que lhe causaram profundo desgosto e amargura, conforme relataram as testemunhas HH, KK e JJ que o autor lhes havia confidenciado, a última das quais mencionou até a palavra “traição”. Esses depoentes condizem em afirmar que o autor se encontrava cabisbaixo, desgostoso, passando a ser menos assíduo na empresa e encarando a ideia de a abandonar. O que faz todo o sentido e deixa sérias interrogações sobre a causa profunda do estado de espírito do autor, não sendo líquido imputá-lo in totum à destituição, admitindo-se, porém, que a mesma possa não ajudado e que tivesse somado desgostos a desgostos. Assim, afigurando-se que a matéria em questão colheu, em parte demonstração, que não quanto ao nexo de causalidade, transita, nessa parte para o elenco dos factos provados, nos seguintes termos: “aquando da deliberação social da sua destituição o autor sentia-se angustiado, tendo necessitado de apoio psicológico, bem como de apoio familiar”.
Passando às questões de prova introduzidas pelo recurso da ré, no tocante ao ponto 36, baseou o Mmo. Juiz a sua convicção “na apreciação critica do teor da acta junta com a petição inicial respeitante a tal Assembleia Geral da ré, do qual resulta que não se mostra aí consignado que a comunicação escrita/defesa do autor houvesse sido discutido entre os sócios na Assembleia Geral da ré, e apoiados, ainda, nas regras da experiência comum e critério da normalidade e lógica das coisas, pois que, tendo, ainda, em consideração a natureza e o valor legal de uma acta que é o registo escrito sobre todos os acontecimentos e assuntos debatidos durante uma reunião ou uma Assembleia Geral, e por mor do qual se comprovam plenamente os assuntos e acontecimentos debatidos numa reunião ou numa Assembleia Geral, e bem assim, a relevância material da matéria, em apreço, dentro do contexto da assembleia geral, em questão (comunicação escrita/defesa/resposta do autor), se tal matéria (comunicação escrita/defesa/resposta do autor) houvesse sido discutida, em Assembleia Geral, entre os sócios aí presentes, o que seria imperioso/compreensível/lógico/natural é que tal acontecimento ficasse registado em tal acta – o que não sucedeu, e portanto, e por mero raciocínio lógico, só se poderá extrair daí lógica e compreensivelmente a ilação de que tal matéria não foi discutida entre os sócios, e ao mesmo tempo, que o depoimento de parte prestado pelo sócio – gerente da ré BB e o depoimento de parte e declarações de parte prestadas pelo sócio-gerente da ré GG, na primeira e na última sessão da audiência final por via da qual afirmaram aí que discutiram tal matéria na Assembleia Geral não mereceram qualquer credibilidade, por contrariar frontalmente a lógica das coisas, e por maioria de razão, tais depoimentos/declarações não encerrarem quaisquer virtualidades probatórias idóneas a abalar a convicção do tribunal fundada nos elementos mencionados atrás”. Ora, sendo certo que a comunicação em apreço é omissa da acta e que os depoimentos em questão não garantem que tenha sido discutida, não há, por outro lado, elementos de prova da versão oposta. Vai, assim, tal ponto 36) alterado, em conformidade, no local próprio, mediante a simples menção ao conteúdo da acta.
A matéria do ponto 37 dos factos provados está conforme aos depoimentos condizentes das testemunhas JJ e MM, funcionárias administrativas da ré, que mencionaram que dois dias semanais eram a assiduidade mínima do autor. Na mesma linha depôs ainda HH. Repare-se que não vem dado como assente que tivesse sido desde o número de presenças desde o início, que era então maior. Não há, por outro lado, prova da ausência consecutiva do autor durante semanas. Vai, assim, confirmada a prova do ponto 37 e a não prova do ponto XX, XXI, e 23 julgados não provados. Do mesmo modo, no tocante ao ponto XXII dos factos considerados não provados, não pode dar-se como assente mais do que o constante do que vem provado sob 54, ou seja, que era àquela época intenção manifestada do A. vir a afastar-se da gerência. A matéria do ponto XXIV dos factos considerados não provados tão pouco pode ser considerada provada pela forma irrestrita pretendida, não havendo prova de qualquer genérica deslocação de atribuições. Vai ainda confirmada a não prova dos pontos XXVI, XXVII e XXIX considerados não provados, que não têm qualquer suporte para além da versão de BB, negada pela versão do A..
Relativamente aos pontos cujo aditamento aos factos considerados provadosa ré propugna, é de excluir o ponto (i), dada a sua natureza conclusiva e valorativa, encerrando conclusões de direito. Já o ponto (iii), ele colhe demonstração no email de 23 de Setembro de 2010 remetido pelo A. à sua então mulher NN, pelo que, encontrando-se plenamente provado, deverá acrescentar-se, no local próprio, ao elenco dos factos julgados provados.
Assim modificada, ainda que não substancialmente, a factualidade considerada provada e não provada, terá de concluir-se, com a 1.ª instância, pela ausência de demonstração de justa causa para a destituição do recorrente autor. Já não aceita, porém, a rejeição do consequente direito à indemnização a favor do gerente destituído, face ao princípio geral consignado no artigo 342.º do CCivil, segundo o qual, quem invoca um direito a prova dos respectivos “factos constitutivos” e, à parte contrária, a dos “factos impeditivos, modificativos ou extintivos” desse direito. Não sendo unânime a resposta dada pela doutrina e pela jurisprudência sobre a questão de saber a quem cabe o ónus da prova da existência de justa para a destituição, prevalece a orientação de que, configurando a justa causa de destituição do gerente circunstância impeditiva do direito à indemnização pelo gerente destituído, o ónus da prova dos respectivos factos cabe à sociedade. Neste sentido, João Labareda (cfr. Direito Societário Português, Algumas Questões, Quid Juris, pág. 92) refere que ao destituído basta “invocar a inexistência de justa causa na acção ressarcitória movida contra a sociedade, cabendo a esta destruir a pretensão através da invocação e prova de factos que fundamentem o afastamento compulsivo do gestor”; na jurisprudência, Ac. desta Relação do Porto de 11-01-2016, Processo 554/09.6TVPRT.P1, in www.dgsi.pt.
A lei não contém qualquer definição taxativa do conceito de “justa causa” de destituição do gerente, fazendo apenas a menção genérica constante do nº 6 do indicado artigo 257.º para as sociedades por quotas. Têm sido a jurisprudência e a doutrina a levar a cabo tal tarefa, indicando como justa causa:
- qualquer circunstância, facto ou situação em face da qual e segundo a boa fé, não seja exigível à sociedade a continuação da relação contratual com o seu gerente;
- todo o facto capaz de fazer perigar o fim do contrato ou de dificultar a obtenção desse fim;
- qualquer conduta que possa fazer desaparecer os pressupostos, pessoais ou reais, essenciais ao desenvolvimento da relação contratual societária;
- toda a actuação que, pela sua gravidade, importe, por razões justificadas, a quebra de confiança entre a sociedade e o gerente.
É em concreto e objectivamente que se afere se a conduta imputada ao gerente constitui motivo de destituição com justa causa, ou seja, se o facto ou situação imputados prejudicam de tal modo o interesse social que impõem a ruptura do vínculo. Ora, e como acertadamente concluiu a douta sentença recorrida, a ré não provou justa causa para a destituição do autor da sua gerência, não se mostrando claramente evidenciado qualquer comportamento do autor integrador de violação grave dos deveres de lealdade zelo, cuidado, diligência ou assiduidade no desempenho das suas funções inerentes à gerência, susceptíveis de justificarem a sua destituição. Mesmo considerando ter ocorrido alguma redução da sua assiduidade e presença nas instalações da ré, por um lado não vem provado que o autor se tivesse vinculado perante a sociedade a horários ou uma obrigação de presencialidade estrita para além do que vem provado sob 6), nem, por outro, que a sua menos assídua comparência tivesse tido repercussões negativas ou de qualquer modo fosse causa de lesão de interesses patrimoniais da ré.
Não tendo a factualidade que vem provada adesão aos motivos indicados na deliberação de destituição, ao autor é devida indemnização pelos prejuízos decorrentes da destituição. A tal respeito dispõe o art.º 257º, n.º 7 do CSC que “Não havendo indemnização contratual estipulada, o gerente destituído sem justa causa tem direito a ser indemnizado dos prejuízos sofridos, entendendo-se, porém, que ele não se manteria no cargo ainda por mais de quatro anos ou do tempo que faltar para perfazer o prazo por que fora designado”. Este preceito prevê duas hipóteses, consoante o montante da indemnização haja ou não sido contratualmente estipulado. No caso vertente, não tendo sido contratual fixado o montante da indemnização, vem o autor reclamar a sua fixação no valor corresponde aos rendimentos que poderia auferir em 4 anos a exercer o cargo de gerência, calculados sobre uma remuneração de € 2.000 X 14 meses contratualmente fixada. Invoca, para tal, o disposto no artigo 257.º, n.º 7, do Cód. Sociedades Comerciais. Com o devido respeito, não é essa a interpretação que a doutrina e a jurisprudência vêm fazendo do normativo em causa, que não fixa um valor exacto devido na falta de estipulação contratual, mas antes um limite máximo no cálculo da indemnização. Como se escreveu no Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 07-07-2010 (Processo 5416/07.9TBVNG, in www.dgsi.pt), “constitui entre nós doutrina e jurisprudência que podem dizer-se unânimes a de que o gerente destituído sem justa causa tem direito ao pagamento de indemnização pelos danos sofridos (cfr. Raul Ventura, Sociedades por Quotas, III, pág. 118; Luís Brito Correia, Os Administradores das Sociedades Anónimas pág. 705 e segs; João Labareda, A Cessação da Relação de Administração, Direito Societário Português, págs 72 e segs; A. Pereira de Almeida, Sociedades Comerciais, págs 122/123; Código das Sociedades Comerciais Anotado, coordenação de Menezes Cordeiro, pág. 675; Acórdãos do STJ de 15-2-00, BMJ 494º, 359, de 14/12/04 (Revª 4701/04-6ª), de 11/7/06 (Revª1884/06-6ª) e de 14/12/06 (Revª 063803). A indemnização, porém, não é uma consequência por assim dizer automática da destituição. Na verdade, o nº 7 do artº 257º do CSC não estabelece a indemnização devida na falta de estipulação contratual; apenas fixa um limite máximo para ela ao dizer que se entende que o gerente destituído não se manteria no cargo por mais de quatro anos ou do tempo que faltar para perfazer o prazo por que fora designado. Por isso se tem julgado que o direito de indemnização implica forçosamente a comprovada existência de danos, exigindo-se a demonstração de factos reveladores de que a situação real do lesado é após a destituição mais gravosa do que aquela em que se encontraria sem ela (artºs 562º e 566º, nº 2, do CC); tem-se julgado quanto à questão em análise, mais precisamente, - cfr. os arestos citados - não bastar à atribuição da indemnização a mera invocação da perda da remuneração devida pelo exercício da gerência; é preciso, para além disso, demonstrar ainda que o gerente destituído não teve a oportunidade de exercer outra actividade remunerada de idêntico nível económico, social e profissional”. No mesmo sentido, os acs. da Relação do Porto de 16-03-2004 (Processo 0420808) e de 11-01-2016 (Processo 554/09.6TVPRT.P1) e da Relação de Coimbra de 21-05-2013 (Processo 160/08.2TBPMS.C1), todos in www.dgsi.pt.
A indemnização será a que resultar da teoria da diferença, consagrada no º 2 do art.º 566º do CC, nos termos do qual o montante da indemnização pecuniária se mede pela diferença entre a situação (real) em que o lesado se encontra e a situação (hipotética) em que ele se encontraria se não tivesse ocorrido o facto gerador do dano (cfr., ainda, Pires de Lima e Antunes Varela, Código Civil Anotado, vol. I, 3ª ed., pág. 551). Daqui resulta a necessidade de se alegarem e provarem os factos que permitam utilizar este método de cálculo e o dano verificado. É ao lesado que compete esse ónus, visto se tratar de factos constitutivos do direito à indemnização (art.º 342º, n. 1 do C. Civil). A simples invocação da perda de remuneração pelo exercício da gerência não é sinónimo de prejuízos. O dano não é necessário, pois deixando de trabalhar perde o direito à retribuição. Esta consequência representa um efeito natural, sem haver prejuízos. Estes só existirão se o gerente não tiver oportunidade de exercer outra actividade remunerada, com idêntico nível económico, social e profissional.
Conforme vem provado sob 53), o autor, após a destituição continuou a exercer actividade profissional remunerada, mas de nível remuneratório inferior ao que auferia pela ré, pelo que é fixar em € 70.000 o montante indemnizatório, correspondente à diferença do rendimento auferido num período de 4 que seguiu ao momento da destituição (€ 2.000-750 X 14 X 4). Tal solução colhe fundamento e mostra-se conforme à doutrina da 2.ª parte do n.º 1 do artigo 815.º do CC, que determina que, se o devedor tiver tido algum benefício com a desoneração da sua obrigação, deve o valor do benefício ser descontado na contraprestação. Benefício com a exoneração é a vantagem que o devedor obteve em consequência da desoneração, como a disponibilidade para angariar outros rendimentos, que foi possibilitada ou facilitada em virtude de ter deixado de cumprir as obrigações inerentes ao cargo de gerente por recusa do credor. Configurando-se o benefício obtido pelo devedor com a exoneração da sua obrigação um facto parcialmente extintivo do direito à contraprestação, cabe ao credor aduzir os factos necessários à quantificação do benefício obtido pelo devedor (artigo 342.º, n.º 2, CC).
Deverá, assim, acrescer ao quantitativo indemnizatório arbitrado o montante do efectivo prejuízo sofrido após a data da propositura, a relegar para incidente de liquidação, correspondente à diferença entre a remuneração mensal de €900 e os rendimentos efectivamente auferidos pela autora, ou que, deles tendo prescindido, tenha tido efectiva possibilidade de auferir, até à data da sentença recorrida.
Discorda ainda o autor não da fixação de indemnização por danos não patrimoniais. O gerente destituído sem justa tem o direito a ser indemnizado pelos danos morais, em particular quando seja atingida a sua dignidade pessoal e profissional, conforme foi já entendido no acórdão desta Relação do Porto de 05-07-2006, Processo 0427197, in www.dgsi.pt O n.° 3 do artigo 496.° C.Civil manda fixar o montante da indemnização por danos não patrimoniais de forma equitativa, ponderadas as circunstâncias mencionadas no art. 494º do mesmo diploma. A sua apreciação deve ter em consideração a extensão e gravidade dos prejuízos, bem como o grau de culpabilidade do responsável, sua situação económica e do lesado e demais circunstâncias do caso. A satisfação dos danos não patrimoniais não é uma verdadeira indemnização, visto não ser um equivalente do dano, tratando-se antes de atribuir ao lesado uma satisfação ou compensação que não é susceptível de equivalente. "Os interesses cuja lesão desencadeia um dano não patrimonial são infungíveis, não podem ser reintegrados mesmo por equivalente. Mas é possível, em certa medida, contrabalançar o dano, compensá-lo mediante satisfações derivadas da utilização do dinheiro” (Mota Pinto, Teoria Geral do Direito Civil, 1980, pág. 86). É, assim, razoável que no seu cálculo, se tenham em atenção, além da natureza e intensidade do dano causado, as outras circunstâncias do caso concreto que a equidade aconselha sejam tomadas em consideração e, em especial, a situação patrimonial das partes e o grau de culpa do lesante. E será ainda de atender aos padrões de indemnização geralmente adoptados na jurisprudência. A efectiva compensação dos danos não patrimoniais só será alcançada se a indemnização for significativa e não meramente simbólica. O montante pecuniário da compensação deve fixar-se equitativamente, tendo em atenção as circunstâncias a que se reporta o artigo 494º do Código Civil (artigo 496º, n.º 3, 1ª parte, do Código Civil). Na determinação da mencionada compensação atender-se-á ao grau de culpabilidade do responsável, à sua situação económica e à do lesado e às demais circunstâncias do caso, nomeadamente à gravidade do dano, sob o critério da equidade envolvente da justa medida das coisas (artigo 494º do Código Civil). A apreciação da gravidade do referido dano, embora tenha de assentar, como é natural, no circunstancialismo concreto envolvente, deve operar sob um critério objectivo, num quadro de exclusão, tanto quanto possível, da subjectividade inerente a alguma particular sensibilidade humana.".
A sentença recorrida não fixou qualquer indemnização por danos não patrimoniais ao autor por ter considerado que o autor “ ao arrepio do “ónus probandi” que sobre si impendia não provou que lhe advieram quaisquer dos invocados danos não patrimoniais alegadamente sofridos, em resultado da destituição sem justa causa de gerente”. Atenta a modificação por esta Relação do ponto XVIII dos factos não provados, demonstra o autor que efectivamente os sofreu embora já não que os mesmos possam, pelo menos na totalidade, imputar-se causalmente à destituição. Havendo certamente a considerar angústias e aborrecimentos importantes, com necessidade de apoio psicológico e de apoio familiar, os quais, ainda que possam ter tido origem causa principal na situação conjugal, são susceptíveis de serem agravados pela situação da destituição. Danos de reputação a reparar, não resulta da factualidade considerada que tenham existido - a destituição ocorreu num círculo fechado, daí não advindo necessariamente qualquer afronta à dignidade pessoal e profissional do autor, a menos que a divulgação seja acompanhada por referências desabonatórias feitas por representantes da ré, do que a factualidade provada não dá conta.
Tudo visto, impõe-se fixar um valor indemnizatório para os danos não patrimoniais, que tomando em consideração o quadro danoso e a proporção em que deve haver-se ter a ré para ele concorrido, não deverá exceder os 1.000,00 euros.
Procedendo, nessa medida a apelação

Decisão.
Em face do exposto, acordam os juízes desta Relação, na procedência parcial da apelação do autor, em revogar a sentença recorrida, condenando a ré a pagar ao autor a quantia total de €71.000,00 (setenta e um mil euros), acrescida de juros de mora à taxa legal, desde a citação até integral e efectivo pagamento.

Custas em ambas as instâncias na proporção do decaimento.

Porto, 17/5/2022
João Proença
Maria Graça Mira
Anabela Dias da Silva