Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
335/15.8T8AVR.P1
Nº Convencional: JTRP000
Relator: PAULA LEAL DE CARVALHO
Descritores: TRABALHO SUPLEMENTAR
INVERSÃO DO ÓNUS DA PROVA
JUSTA CAUSA DE DESPEDIMENTO
DIREITO DE RESPOSTA
LIBERDADE DE EXPRESSÃO
DIREITO À HONRA E BOM NOME
Nº do Documento: RP20160620335/15.8T8AVR.P1
Data do Acordão: 06/20/2016
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: NEGADO PROVIMENTO
Indicações Eventuais: 4ª SECÇÃO (SOCIAL), (LIVRO DE REGISTOS N.º242, FLS.114-167)
Área Temática: .
Sumário: I - Porque constitutivo do direito de que se arroga titular [retribuição por férias não gozadas e por trabalho suplementar], é ao trabalhador que compete o ónus da prova do não gozo dos dias de férias e da prestação de trabalho suplementar (art. 342º, nº 1, do Cód. Civil), sendo que a dúvida sobre a realidade de um facto deve ser resolvida contra a parte a quem o facto aproveita (art. 414º do CPC/2013).
II - Não tenho o trabalhador requerido a notificação da Ré para junção de determinados documentos, nem a 1ª instância ordenado essa junção é, desde logo por isso, inaplicável a inversão do ónus da prova decorrente de recusa de colaboração a que se reportam os arts. 417º, nº 2, do CPC/2013 e 344º, nº 2, do CC, assim como é inaplicável tal inversão caso, pese embora a junção haja sido requerida e ordenada pelo tribunal, o não haja sido com a advertência dessa cominação e o empregador, juntando outros documentos que não satisfazem o ordenado, o trabalhador nada mais requer, nem o tribunal nada mais determina.
III - A existência de justa causa para o despedimento pressupõe comportamento do trabalhador suscetível de constituir infração disciplinar e que esse comportamento, pela sua própria gravidade e/ou das suas consequências, determine a inexigibilidade da manutenção da relação laboral pelo empregador, devendo o despedimento mostrar-se adequado e proporcional à gravidade da infração.
IV - O direito à liberdade de expressão é reconhecido no art. 14º do CT/2009, assim como, em corolário do exercício de direito de defesa, é reconhecido ao trabalhador o direito de resposta às acusações que lhe sejam imputadas em sede de procedimento disciplinar, tanto mais com vista ao despedimento. Tais direitos deverão ser exercidos dentro do quadro legal que tutela outros direitos de personalidade de igual relevância, designadamente o direito à honra e bom nome do empregador, restrições que, contudo, deverão mostrar-se adequadas e proporcionais à salvaguarda destes outros direitos, devendo a ponderação efetuar-se por critérios objetivos.
Reclamações:
Decisão Texto Integral: Procº nº 335/15.8T8AVR.P1
Relator: Paula Leal de Carvalho (Reg. nº 884)
Adjuntos: Des. Maria José Costa Pinto
Des. António José Ramos

Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação do Porto:

I. Relatório

B…, litigando, na fase de recurso, com o benefício de apoio judiciário nas modalidades de dispensa de pagamento de taxa de justiça e demais encargos com o processo e de nomeação e pagamento de honorários a patrono[1], aos 28.01.2015 apresentou requerimento de impugnação judicial da regularidade e licitude do despedimento com invocação de justa causa, de que foi alvo (art. 98º-C do CPT, na redação do DL 295/2009, de 13.10), contra C…, Ldª[2].
Frustrada a tentativa de conciliação que teve lugar na audiência de partes, a empregadora apresentou articulado a motivar o despedimento com invocação de justa causa (art. 98º-J do CPT), para tanto alegando, como e bem foi sintetizado pela 1ª instância no relatório da sentença recorrida, que: “no dia 29 de Dezembro de 2014, decidiu proceder ao despedimento por justa causa do A., na sequência de um procedimento disciplinar que lhe moveu, onde foram cumpridos todos os formalismos legais.
Essa decisão fundamentou-se:
- No facto do A., na resposta à nota de culpa que apresentou, no âmbito de um anterior procedimento disciplinar que lhe havia instaurado em 11 de Setembro de 2014, ter referido expressões que tiveram como escopo único denegrir a imagem e o bom nome da R. e do seu sócio-gerente, procurando criar uma imagem, para terceiros, de uma empresa negligente na sua actividade económica.
- Ter emitido ou imprimido uma guia para pagamento especial por conta de IRC pela R., numa altura em que encontrava suspenso das suas funções, acedendo à área pessoal da R. nas Finanças, através da “password” da empresa, sem que tivesse ordem ou indicação da R. para o fazer e sem o conhecimento desta. Tendo-lhe com isso causado prejuízo, porque o imposto foi mal calculado, em valor superior àquele que a R. deveria pagar (que era de €2.187,89 e não de € 2.231,09, como constava da guia emitida pelo A.).
- Ter enviado uma carta a “D… e Outra”, durante o período de tempo em que se encontrava suspenso de funções, invocando a qualidade de contabilista da R. e sem informar que se encontrava suspenso, solicitando os contractos celebrados com a R., para verificar a conformidade patrimonial expressa nas demonstrações financeiras da empresa. Tendo como objectivo, com isso, indiciar ou criar a aparência junto de terceiros, de que a R. estava a cometer irregularidades e procurando difamar, denegrir a imagem e a idoneidade civil e moral da R., bem como quem a gere.
Comportamentos esses que pela sua gravidade e consequências, levaram à irremediável quebra da relação de confiança subjacente ao contrato de trabalho, tornando imediatamente impossível a sua subsistência, nos termos do art. 351º n.ºs 1 e 2, als. a), d), e i) e 3 do art. 351º do Código do Trabalho, constituindo justa causa de despedimento.
Invocando no entanto “para os devidos efeitos”, sem prescindir, a responsabilidade do Estado pelo pagamento de retribuições intercalares, previsto no n.º 1 do artigo 98º-N, bem como as deduções previstas no artigo 98º-O, ambos do CPT.
E opondo-se à reintegração do A., nos termos do n.º 2 do art. 98º-J do Código do Trabalho, caso o despedimento não seja julgado válido e regular.
Pedindo, a final, que seja declarada a regularidade e licitude do despedimento.”.

O A. contestou e reconveio, impugnando, em parte, a factualidade invocada pela Ré e, no que importa ao recurso, tal como também bem sintetizado no relatório da sentença recorrida, dizendo:
“(…) que se limitou a defender-se, na resposta à nota de culpa do anterior procedimento disciplinar, resposta essa vertida num articulado, subscrito por mandatário/advogado, enviada exclusivamente a esse procedimento disciplinar, que não é público. Não ocorrendo como tal quaisquer danos na imagem, honra e bom-nome da R. que possam ser assacados ao A..
E quanto à prática de actos de TOC, durante a suspensão, o A. tem obrigações declarativas fiscais e estatutárias das quais não se pode desvincular, sob pena de ser responsabilizado pelo pagamento de multas e coimas de natureza fiscal, pela falta ou entrega extemporânea das obrigações fiscais a que está adstrito.
Tendo sido nesse contexto que pediu documentação de conciliação contabilística a “D… e Outra”, sendo que antes tinha solicitado tais documentos à R., que não lhos facultou.
Tendo emitido a guia para pagamento antecipado por conta por parte da R., não através da área reservada desta no Portal da Finanças, mas através do seu próprio portal das finanças. Fazendo-o por ser sua obrigação contratual e estatutária, apesar de suspenso, convencido de que agia em abono da R., sua entidade patronal. Não tendo daí resultado qualquer prejuízo para a R., porque o imposto estava bem calculado, além de que, mesmo que não estivesse, tratando-se de um pagamento especial por conta, o valor já não lhe iria ser cobrado mais adiante. Existindo, quando muito, um pagamento de mais € 43,20, uns meses antes. Sem conceder, caso se entendesse a verificação de um lapso, a R. teria dele conhecimento desde a 1.ª prestação do pagamento por conta, ou seja, há mais de 60 dias, em relação ao início do procedimento disciplinar, pelo que se verifica a prescrição, nos termos do art.º 329º n.º 2 do Cód. Trabalho.
Acresce que durante esse mesmo período de suspensão, enviou à R. declarações de retenções de IRS, que a mesma aceitou e pagou. Tendo-lhe a R. solicitado elementos contabilísticos e a confirmação de balancetes, depois de o suspender.
Sendo o despedimento ilícito e uma vez que a R. já se opôs à reintegração, o A. tem direito, nos termos do art.º 392º n.º 3 do CTrabalho, a indemnização proporcional a 60 dias por cada ano, no valor de € 20.583,35.
(…).
E a todas as retribuições vincendas até ao trânsito em julgado da decisão que declare a ilicitude do despedimento, nos termos do art.º 390.º n.º 1 do CTrabalho.
No ano de admissão (2007), a R não lhe pagou o subsídio de férias, no valor de €916,66.
Não gozou os seguintes dias de férias: No ano de 2008, 5 dias, no valor de € 166,67; no ano de 2009, 5 dias, no valor de € 166,67; no ano de 2010, 3 dias, no valor de € 110,00; no ano de 2011, 6 dias, no valor de € 260,00; no ano de 2012, 7 dias, no valor de € 303,33; no ano de 2013, 7 dias, no valor de € 303,33; no ano de 2014, 5 dias, no valor de € 216,66.
A R. pagou-lhe os proporcionais de férias, subsídio de férias e subsídio de Natal respeitantes ao ano de cessação e que se venceriam no ano de 2015, tendo por base o vencimento de € 1.100,00, que não é o correcto, porque o salário a considerar é de €1.300,00, que o A. tinha direito a receber e que lhe foi reduzido ilegalmente. Assim, a título de proporcionais de férias, subsídio de férias e subsídio de Natal, tem ainda a receber o diferencial de € 600,00.
(…)
Desde a sua admissão, foi obrigado a trabalhar as 9 horas diárias, quando nos termos do art. 8.º do CCT aplicável (convenção colectiva de trabalho entre a AECOPS – Assoc. de Empresas de Construção e Obras Públicas e outras e a FEDER Portuguesa dos Sindicatos da Construção, Cerâmica, Vidro e Outros, publicada no BTE n.º 13 de 8 de Abril de 2005), sendo um profissional administrativo, teria como período normal de trabalho as trinta e sete horas e meia semanais. O que só por si, representa 7,5 horas semanais de trabalho suplementar. (…)”.
Assim, diz o A., efetuou as seguintes horas suplementares, que não foram remuneradas:
“a) Ano de 2007: 310,5 horas o que perfaz a quantia de 2862,70€
b) Ano de 2008: 345 horas o que perfaz a quantia de 3.182,62€
c) Ano de 2009: 346,5 horas o que perfaz a quantia de 3.196,46€
d) Ano de 2010: 342 horas o que perfaz a quantia de 3.660,54€
e) Ano de 2011: 345 horas o que perfaz a quantia de 3.916,47€
f) Ano de 2012: 354 horas o que perfaz a quantia de 4.136,00€
g) Ano de 2013: 358,5 horas o que perfaz a quantia de 3.704,50€
h) Ano de 2014: 189 horas o que perfaz a quantia de 1.953,00€
No total de 2590,5 horas, pelas quais em direito ao valor global de € 26.612,29.”.
Mais alega que auferia o vencimento mensal de € 1.300,00, quando a R., no mês de Janeiro de 2014, sem que nada o justificasse e sem comunicar o que quer que fosse ao A., reduziu o seu vencimento para € 1.100,00. Assim, tem direito a receber as diferenças salarias (€ 200,00), desde a data da redução ilegal do seu vencimento, que até à data da resolução do contrato se computam em € 2.800,00.
Termina pedindo que seja declarada a ilicitude do despedimento e em consequência, a condenação da R. a pagar-lhe:
“A) € 916,66, de subsídio de férias de 2007;
B) € 1.526,66, de férias não gozadas nos anos de 2008 a 2014;
C) € 600,00 de proporcionais de férias, subsídio de férias e de Natal, em função da diferença salarial;
D) € 2.216,00, de horas de formação não prestada;
E) € 26.612,29, de horas de trabalho suplementar prestadas de 2007 a 2014;
F) € 2.800,00, de diferenças salariais desde a data da redução ilegal do vencimento;
G) € 20.583,35, de indemnização, nos termos do artigo 392º, n.º 3 do CT;
H) € 5.000,00, de indemnização por danos morais;
I) As retribuições vincendas até ao trânsito em julgado da decisão que declare a ilicitude do despedimento;
J) Juros vencidos e vincendos, até integral pagamento.”.

A Ré respondeu, alegando, em síntese, que: a redução do salário do A., teve lugar com o seu acordo escrito, como sucedeu em relação aos demais trabalhadores da empresa; o A. não realizou qualquer trabalho suplementar, não sendo de resto aplicável o CCT que invoca uma vez que o A. não é filiado em sindicato subscritor do mesmo; ainda que se considere ter o A. créditos laborais emergentes do contrato de trabalho, nos termos do ar. 337º do C. Trabalho, esses eventuais créditos, correspondentes à compensação por violação do direito a férias ou pagamento de trabalho suplementar, vencido há mais de cinco anos, só podem ser provados por documento idóneo.
Concluiu pela absolvição da R. do pedido reconvencional.

O A. respondeu invocando a inadmissibilidade da resposta da Ré à contestação e, caso assim se não entenda, respondendo à matéria da resposta.

Foi proferido: despacho a admitir a resposta da Ré (à exceção do que consta dos arts. 46 a 49, que se tiveram como não escritos) e a não admitir a resposta do A. àquela, determinando o seu desentranhamento; despacho saneador tabelar, com dispensa da seleção da matéria de facto.

Realizada a audiência de julgamento, com gravação da prova pessoal, e decidida a matéria de facto, foi proferida sentença que julgou a ação nos seguintes termos:
“Em face de todo o exposto, julgando a acção parcialmente procedente, decide-se:
I. Declarar ilícito o despedimento do A.;
II. Condenar a R. a pagar ao A.:
a) Indemnização pelo despedimento ilícito, no valor actual de € 11.267,00 (onze mil, duzentos e sessenta e sete euros);
b) As retribuições vencidas e vincendas desde o despedimento até à data do trânsito em julgado da presente sentença, no valor actual de € 13.650,00 (treze mil, seiscentos e cinquenta euros) – deduzidas porém das importâncias que porventura tenha auferido ou venha a auferir a título de subsídio de desemprego, em resultado do despedimento em discussão, cujo valor a R. deverá entregar à Segurança Social.
c) € 750,00 (setecentos e cinquenta euros), a título de subsídio de férias do ano de 2007;
d) 2.800,00 (dois mil e oitocentos euros), respeitantes a diferenças no pagamento de salários, férias e subsídio de férias do ano de 2014;
e) € 600,00 (seiscentos euros), relativos a diferenciais de retribuição por férias vencidas em 01/01/2015 e respectivo subsídio de férias, e subsídio de Natal de 2014.
f) Juros de mora à taxa legal (actualmente de 4%) sobre tais quantias, até efectivo e integral pagamento, contabilizados desde a presente data, no que respeita à aludida em II. a); desde o vencimento de cada uma das retribuições, quanto à referida em II. b), excepto no que se refere às vencidas antes da notificação à R. da contestação/reconvenção, em que são devidos a contar da data dessa notificação; e desde a notificação à R. da contestação/reconvenção, no tocante às referenciadas em II. c), d) e e).
III. No mais, absolver a R. do pedido.
*
Custas por A. a R., na proporção do respectivo decaimento (art.º 527º n.ºs 1 e 2 do Cód. de Processo Civil), sem prejuízo do que vier a ser decidido quanto ao pedido de apoio judiciário formulado pelo A..
*
Registe e notifique.
*
Após trânsito em julgado, comunique ao Instituto da Segurança Social, I.P..
*
Fixo em € 60.254,96 o valor da acção – art. 98º-P, n.º 2 do Cód. de Processo do Trabalho.”.

Inconformada, a Ré recorreu, tendo formulado, a final das suas alegações, as seguintes conclusões:
“A- São duas as questões a decidir por V. Excelências:
1. Existiu ou não justa causa no despedimento do Autor B…;
2. Que direitos assistem ao Autor em resultado disso.
B- O Tribunal a quo deveria ter julgado e decidido que se verificou justa causa no despedimento do trabalhador/A., devendo ter, em consequência, decidido pela improcedência da acção de impugnação da regularidade e licitude do despedimento do referido trabalhador, com consequente absolvição da Ré no pagamento de quaisquer direitos e compensações por não se te verificado a ilicitude no despedimento.
C- O Tribunal a quo considerou que, apesar de toda a prova produzida e mesmo considerando como provado terem sido proferidas aquelas expressões pelo A. na resposta à nota de culpa (relativo ao processo disciplinar anterior) e ainda apesar de considerar provados todos os atos praticados pelo A. enquanto se encontrava suspenso das suas funções, todos estes fatos não são molde para justificar a existência de justa causa de despedimento do Autor.
D- Segundo o Tribunal recorrido, no que concerne às expressões utilizadas na resposta à nota de culpa, as mesmas foram proferidas no específico contexto do exercício de direito de defesa em relação aos fatos de que que era acusado na nota de culpa no âmbito do processo disciplinar anterior,
E- com exceção, diz o mesmo tribunal a quo, «dos pontos 82 e 83, onde o A. pretende ilustrar a ideia de que o gerente da R. e a filha deste o vinham pressionando para que se despedisse, alegando que para isso chegaram a comprar três cabras, deixando-as à solta no sítio onde passava para tomar as refeições, pretendendo afeta-lo psicologicamente e causando incómodo e queixas de dois estabelecimentos vizinhos».
F- A sentença recorrida considerou, que mesmo sendo verdadeiras ou falsas, estas últimas afirmações não se trataram de afirmações puramente gratuitas, feitas sem qualquer causa que justificasse a sua produção, pois foram produzidas no âmbito de um processo disciplinar que em princípio não é público, não se permitindo concluir que tais expressões tiveram como única finalidade denegrir a imagem e o bom nome da sociedade e do seu sócio gerente e criar uma imagem para terceiros de uma empresa negligente na sua atividade, uma vez que não se provou que mais alguém para além das partes e do instrutor do procedimento tiveram conhecimento do teor da resposta à nota de culpa apresentada pelo A.
G- A R. não se conforma com este entendimento do Tribunal a quo. As expressões proferidas pelo A., do modo e no teor em que foram produzidas não foram a forma que o A. utilizou para se defender na nota de culpa. Se a R. acusava o A. da prática de determinado fato, a única forma de se defender dessa acusação seria tão só demonstrar que esses fatos não se verificaram ou não foram efetuados por ele. Não se defendia acusando pura e simplesmente a R. com outros fatos que ao caso nada tinham a ver.
H- O A. ao dizer que - a R. através do seu sócio gerente e sua filha queriam afeta-lo psicologicamente tendo comprado três cabras deixando-as à solta no local onde o A. passava para tomar a suas refeições - estas afirmações foram proferidas não para o A. se defender das acusações que lhes eram proferidas, pois o A. nunca foi acusado de estar afetado psicológica ou de andar com cheiro nauseabundo, como insinuou, para além de que não foi sequer dado como provado que esses fatos tinham acontecido e tais fatos foram invocados pelo próprio A.
I- O próprio Tribunal a quo considerou que estes fatos, estavam para lá do amplo direito de defesa do A., referiu mesmo que excecionavam esse direito, mas como nada se provou, tais fatos, invocados pelo A. não aproveitaram a parte contrária, como manda o regime da prova, mas sim a própria parte que os invocou, o que não se compreende.
J- Os fatos invocados pelo A. proferidas na resposta à nota de culpa apenas serviram para afetar a credibilidade, a honra e a boa-fé da R. e dos seus corpos sociais, de forma gratuita e fora do contexto dos fatos vertidos na nota de culpa que foi enviada ao A. em sede de procedimento disciplinar anterior.
K – A sentença recorrida, apesar de dar como provado que o A. «no decurso da suspensão preventiva de funções», (no âmbito de processo disciplinar anterior), «emitiu/imprimiu guia para pagamento pela R. da 2ª prestação do Pagamento Especial por Conta (PEC), acedendo para tanto à área pessoal da R. nas Finanças, através da “password” da Ré, sem o seu conhecimento, ordem ou consentimento e enviou uma carta (…) a solicitar a terceiros contratos por estes elaborados com a R, invocando para tanto a qualidade de contabilista desta, sem mencionar estar suspenso e indicando ter em vista verificar a conformidade de declarações que certificou com base em elementos fornecidos pela Ré», tais fatos não consubstanciam um incumprimento por parte do A. dos seus deveres laborais de tal forma grave, culposo e danoso para a Ré que torne particamente impossível a subsistência da relação laboral, não se justificando a aplicação da sanção disciplinar máxima.
L- O Tribunal a quo fundamentou este seu entendimento essencialmente nos direitos e deveres dos Técnicos Oficiais de Contas, função que exercia o A. perante a R., dizendo que nos termos estatutários e deontológicos da ordem dos técnicos oficiais de Contas (EOTOC) os mesmos, perante as especificidades das funções desempenhadas, tem determinados direitos e obrigações, relativamente às entidades a quem prestam serviços, nomeadamente o direito do obter todos os documentos, informações e demais elementos de que necessitem no exercício das suas funções (n.º 1 do art. 51 do EOTOC).
M- O Tribunal recorrido fundamentou ainda que os técnicos oficiais de contas têm o dever com a administração fiscal, entre outros, de “assegurar, nos casos em que a lei o preveja, o envio por via eletrónica das declarações fiscais dos seus clientes ou entidades patronais – art. 55º, n.º 1, al. d) do EOTOC» (sublinhado nosso).
N- O Tribunal recorrido não pode aplicar, tout court, tais normativos. Os direitos e deveres dos técnicos oficiais de contas aplicam-se, e a lei é clara nesse sentido, quando os respetivos técnicos se encontram a prestar serviço para essas entidades, ou seja, estejam no exercício da suas funções, o que não acontecia no caso do Autor, cujos fatos foram praticados enquanto se encontrava suspenso das suas funções em virtude de suspensão preventiva em sede de procedimento disciplinar contra ele instaurado.
O – O Autor não se encontrava no âmbito das situações em que a lei prevê que os técnicos oficiais de contas assegurem o envio por via eletrónica das declarações fiscais referente aos seus clientes.
P- Os técnicos oficiais de contas, podem desempenhar as suas funções para determinado cliente, com ou sem plenos poderes declarativos perante a Autoridade Fiscal e Aduaneira. Quando atuam com plenos poderes declarativos (poderes estes declarados pelo respetivo cliente perante a finanças) os contabilistas certificados podem, e devem, assegurar o envio por via eletrónica de declarações fiscais, através da sua página pessoal, com a sua própria password e com o seu próprio número de utilizador no sítio da Autoridade Tributária e Aduaneira. Quando os contabilistas atuam sem plenos poderes declarativos, apenas conseguem emitir com o seu número de utilizador e password determinados documentos da Autoridade Fiscal e Aduaneira, como por exemplo declarações de não dívida do cliente. Mas, para emitir uma guia para pagamento especial por conta (PEC) como é no caso em apreço, o contabilista sem plenos poderes declarativos tem necessariamente de entrar com o número de utilizador e password do cliente, na área pessoal desse cliente no sítio da Autoridade Tributária e Aduaneira.
Q- O Autor como contabilista certificado da Ré, não tinha plenos poderes declarativos, em relação à R., junto da Autoridade Tributária, não podia emitir a guia de pagamento especial por conta. Encontrava-se numas das situações em que a lei prevê que o Autor não assegura o envio por via eletrónica das declarações fiscais dos seus clientes ou entidades patronais – art. 55º, n.º 1, al. d) do EOTOC.
R- O Tribunal a quo, deu como provado em sede de resposta aos art. 53º a 61º do articulado motivador do despedimento que «o A. não tinha, enquanto TOC da R., plenos poderes declarativos que seriam necessários para poder emitir tal guia sem ser mediante uso do n.º de utilizador e senha da R.», e assim deu por provado (ponto 49. dos factos provados) que «o A. emitiu/imprimiu a referida guia para pagamento da 2ª prestação do Pagamento Especial por Conta enquanto se encontrava suspenso das suas funções de TOC da R. acedendo à área pessoal da R. nas Finanças, através da “password” (palavra passe) da R. sem conhecimento, ordem ou consentimento desta.»
S- Estando o A. suspenso das suas funções em sede de procedimento disciplinar, não estando por isso, no exercício das suas funções e não tendo plenos poderes declarativos em relação à R. junto da Autoridade Tributária, não assegurava, nem podia assegurar, o envio por via eletrónica das declarações fiscais da sua entidade patronal.
T- A Sentença recorrida julgou ainda que não foi de tal forma grave a violação dos deveres laborais do A. que justificasse o seu despedimento, quando enviou a carta a terceiro (referida em 63. 64.e 65. dos fatos provados), solicitando-lhe os contratos que tinha celebrado com a R., estando o mesmo suspenso das suas funções, mas não informando esse terceiro dessa circunstância, arrogando-se na qualidade de contabilista da empresa.
U – No entanto, as funções de contabilista não estavam a ser exercidas na data do envio da referida carta para além de que, conforme se provou em 41.:«pelo menos até à semana anterior a 07.08.2014, o A. teve acesso no seu local de trabalho, que era o escritório da empresa, a toda a documentação contabilista referente à R.»
V- O A. não tinha na data de envio da carta ao referido D…, qualquer legitimidade ou razão para pedir quaisquer documentos referentes à contabilidade da R., uma vez que até ser suspenso sempre teve acesso a toda a documentação contabilística da R. O verdadeiro objetivo do A. ao pedir a terceiros documentos dos quais sempre teve acesso foi lançar dúvidas junto dos seu clientes sobre a imagem, a honra e a idoneidade da R!!
W- A noção de justa causa de despedimento, consagrada no artigo 351.º, n.º 1, do Código de Trabalho de 2009, pressupõe um comportamento culposo do trabalhador, violador de deveres estruturantes da relação de trabalho, que pela sua gravidade e consequências, torne imediata e praticamente impossível a subsistência do vínculo laboral. São elementos do conceito de justa causa de despedimento: a) a existência de uma conduta do trabalhador que evidencie uma violação culposa dos seus deveres contratuais; b) que essa conduta seja objetivamente grave em si mesma e nas suas consequências; c) e que por força dessa gravidade seja imediata e praticamente impossível a manutenção da relação laboral.
X- Entre a entidade patronal e seu trabalhador, mais ainda como no caso dos autos em a entidade patronal é o cliente e o seu trabalhador é o TOC da empresa, deve existir reciprocamente uma elevada exigência de boa fé e de confiança. Toda a relação juslaboral pressupõe a integridade, lealdade, mútua cooperação e absoluta confiança da e na pessoa contratada, mas essa exigência torna-se maior quando se trata da relação entre a empresa e o seu TOC, pois este é necessariamente conhecedor de toda a situação societária, económica, bancária e fiscal da empresa. Se é necessária absoluta confiança entre a entidade patronal e o seu trabalhador essa absoluta confiança revela-se ainda maior e mais necessária entre a sociedade e o seu TOC.
Y- Os fatos praticados pelo Autor evidenciaram a violação culposa dos seus deveres contratuais, sendo estas condutas objetivamente graves em si mesmas e nas suas consequências, sejam por si, sejam em conjugação com as demais, sendo que por força da gravidade dessas condutas é imediata e praticamente impossível a manutenção da relação laboral entre o A. e a R.
Z- As condutas do A. perante a R. praticadas enquanto se encontrava suspenso das suas funções quebraram de forma irreparável a relação de absoluta confiança que é essencial na relação de trabalho, mais ainda no âmbito da sociedade e o seu Técnico Oficial de Contas, como sucede no caso dos autos. Os fatos praticados pelo A. enquanto se encontrava suspenso, ao abrigo de um procedimento disciplinar anterior instaurado também contra ele, foram de tal forma graves que a manutenção da relação laboral, a subsistência do contrato de trabalho entra A. e R. representa uma insuportável e injusta imposição ao empregador.
AA- Não se pode impor à R. que mantenha absoluta confiança no A. como seu trabalhador, imprescindível igualmente na relação da sociedade com o seu Técnico Oficial de Contas, quando esta toma conhecimento que o A., enquanto suspenso das suas funções e virtude de processo disciplinar contra ele instaurado:
1. utiliza sem o conhecimento da R., sem a sua ordem, sem o seu consentimento, o número de utilizador da R., para com ela aceder à página pessoal da R. da Autoridade Tributária e Aduaneira, através da password da própria R., para emitir declarações fiscais para pagamento de impostos que o A. sabia que não podia só por ele emitir, pois não tinha plenos poderes declarativos;
2. utilizou, fora das instalações da R., pois estava suspenso, os códigos pessoais de acesso que são confidenciais mas aos quais o A. tinha acesso apenas e tão só, porque era também o TOC da empresa, e sempre teve acesso até ser suspenso, no seu local de trabalho, que era também o escritório da empresa, a toda a documentação contabilista da R.;
3. enviou carta a um terceiro, cliente da R., pedindo-lhe os contratos de permuta que celebrou com ela, arrogando-se contabilista da R., não mencionando que estava suspenso, para segundo ele poder conferir verificar a conformidade patrimonial nas demonstrações financeiras da empresa que tinha certificado, apesar do A. ter tido sempre acesso, até ser suspenso das suas funções, a todos os documentos contabilísticos da empresa, no escritório desta, onde era também o seu local de trabalho, tinha tido todo o tempo para conferir tudo o que quisesse;
4. proferiu as expressões que proferiu em sede de resposta à nota de culpa no procedimento disciplinar anterior;
5. invocou fatos fora do contexto da nota de culpa, que não consegue provar, de forma a dar a ideia, a insinuar, que entre o sócio gerente da Ré e a filha havia um conluio para o afastar psicologicamente, comprando três cabras com o propósito de o obrigar a passar por elas quando ia almoçar.
BB- Não é razoável que, tendo sido provado nos autos que todos os fatos foram praticados pelo A. enquanto suspenso de funções em sede de procedimento disciplinar anterior, se imponha a obrigação da R. em manter em vigor o contrato de trabalho com o A, mais ainda quando este último continuaria a ser o TOC da empresa.
CC- Não é razoável que se imponha à R. que continue a depositar no A. absoluta confiança, necessária para o manter no seu local de trabalho. É que essa absoluta confiança foi irremediavelmente perdida, quebrada. Não há possibilidade da R. permitir que o A. mantenha o acesso no seu local de trabalho de toda a documentação contabilística da empresa, sem que paire sempre a desconfiança.
DD- Impor à R. a manutenção da relação laboral com o A. seria permitir, como referiu o já supra citado MONTEIRO FERNANDES, «uma insuportável e injusta imposição ao empregador» e que «[n]as circunstâncias concretas, a permanência do contrato e das relações (pessoais e patrimoniais) que ele supõe seria de molde a ferir de modo desmesurado e violento a sensibilidade e a liberdade psicológica de uma pessoa normal colocada na posição do empregador».
Deverão V. Excelências ordenar a revogação da sentença recorrida na parte em que declarou ilícito o despedimento do A., substituindo-a por decisão que declare improcedente a acção de impugnação judicial da regularidade e licitude do despedimento do A., de forma a considera-lo lícito e regular, por justa causa, tendo como consequência a absolvição da R. do pedido nessa parte, ordenando ainda a revogação da sentença na parte em que condenou a R. no pagamento do valor da indemnização pelo despedimento ilícito, bem como do pagamento das retribuições vencidas e vincendas desde o despedimento até à data do trânsito em julgado da sentença recorrida, absolvendo a R. desses pedidos, (…)”.

O A. contra-alegou, tendo formulado as seguintes conclusões:
“1- Considerando os factos dados como provados e não provados na D. Sentença recorrida, e elencados supra, para onde se remete, resulta claro que nenhum reparo há a fazer à dita sentença por ter julgado, e bem no entender, o despedimento como ilícito.
2- Na verdade, o que está em causa é a apreciação do comportamento do Autor, que, sinteticamente se subsume a estas duas factualidades: a) Proferiu expressões no âmbito da resposta à nota de culpa com a intenção de denegrir a imagem, honra e bom nome da Ré. b) A actuação do Autor após a sua suspensão no âmbito do processo disciplinar.
3- Quanto às expressões usadas pelo trabalhador recorrido na resposta à nota de culpa, bem andou o Tribunal a quo ao considerá-las como proferidas dentro do contexto específico do seu amplo exercício do seu direito de defesa face aos factos que lhe eram imputados na nota de culpa do processo disciplinar.
Outro decidir seria coarctar a liberdade de defesa e condicionar o exercício de tal direito pelo medo, pelo garrote da punição, deixando o trabalhador num sufoco argumentativo já iniciado pela entidade patronal ao promover contra si um processo disciplinar, face ao que, o trabalhador, se apresentava claramente diminuído e o considerava injusto. Seria, ainda, calar a boca do trabalhador e reduzir à ineficiência o direito de defesa, o qual se quer livre e expresso de acordo, também, com as impressões e convicções formadas pelo trabalhador, destinatário que é do processo disciplinar quanto à matéria que lhe era imputado no seu âmbito. Pelo que, por exemplo, a ideia expressa pelo trabalhador recorrido de que as cabras foram compradas com o intuito de o pressionar e levar ao despedimento, resultou da convicção do mesmo face a uma dinâmica laboral que vivenciou de modo directo e quase diária, que lhe inculcaram tal convicção que expressou na resposta à nota de culpa. E independentemente de o ter ou não conseguido provar, a verdade é que nunca se poderia retirar de tal facto que houve a intenção de atingir na honra e consideração quem quer que fosse.
Fê-lo no circunscrito exercício do seu direito de defesa e não de um modo gratuito, público, e fora dos cânones da sua defesa, e apenas porque se viu obrigado a defender. E essa amplitude de defesa é permitida pela lei: art. 355º CT, que, quanto à resposta à nota de culpa, pode deduzir por escrito “(…) os elementos que considera relevantes para esclarecer os factos e a sua participação nos mesmos (…)”
4-Sendo o processo disciplinar um processo sem cariz público, ao qual têm acesso um limitadíssimo número de intervenientes, fica por justificar como podem ter as expressões, nomeadamente, afectado a imagem comercial da Ré.
5-Acresce que, para efeitos de apreciação judicial da regularidade da ilicitude do despedimento, o que importa não é saber o que disseram as pessoas ouvidas no processo disciplinar, mas, sim, a prova produzida no âmbito da acção laboral – Vide acórdão da Relação do Porto de 12/10/2011 (Proc. 34/10.7TTCLD.L1-4).
Aliás, a D. Sentença recorrida é pródiga na sua fundamentação e nas referências doutrinais e jurisprudenciais que a sustentam.
6-Já quanto ao factos praticados pelo Autor recorrido no decurso da suspensão preventiva, bem salientou o tribunal a quo que o foram no exercício do seu dever enquanto TOC, imposto, tal dever, pelo estatuído no art. 6º, nº 1 do Estatuto da Ordem dos Técnicos Oficiais de Contas.
E, ele continuou, apesar da suspensão, a ser o TOC da empresa Ré. E, portanto, responsável directo pela sua contabilidade e seu processamento, enquanto não fosse afastado de TOC – e NÃO estava, então, afastado como TOC da Ré. Não houve substituição de TOC. Logo, continuava a ser, perante a empresa e a Administração Fiscal, o responsável e a quem, em caso de incumprimento, seriam assacadas responsabilidades fiscais e civis. Por isso actuou. Também, nos termos desse dever, e em conformidade com o disposto no art. 51º, nº 1 do EOTOC (Estatuto da Ordem dos TOC) pode, nomeadamente, obter todos os documentos, informações e demais elementos de que necessite para o exercício das suas funções; e, nos termos do nº 7 do mesmo artigo, pode, ainda, solicitar a entidades públicas ou privadas competentes as informações necessárias para verificação da conformidade da contabilidade com a realidade patrimonial expressa nas demonstrações financeiras da contabilidade pela qual é responsável: foi neste contexto que ocorreu o contacto com D… e outra.
7-Por último acrescenta-se que o Código Deontológico dos TOC, no seu art. 4, nº 1, que trata da “Independência e conflito de deveres”, refere que “O contrato de trabalho celebrado pelo técnico oficial de contas não pode afectar a sua isenção nem a sua independência técnica perante a entidade patronal, nem violar o Estatuto ou o presente Código Deontológico”. Ora, é evidente que resulta um dever de acção por parte do Autor, e justificado legalmente o seu procedimento.
8- Assim, e como bem refere a D. Sentença recorrida, “O preenchimento do conceito de justa causa pressupõe desse modo a verificação dos seguintes requisitos cumulativos:
1- Um comportamento culposo do trabalhador, violador dos deveres de conduta ou de valores inerentes à disciplina laboral, que seja grave em si mesmo e nas suas consequências;
2-A impossibilidade de subsistência da relação laboral;
3-O nexo de causalidade entre aquele comportamento e essa impossibilidade.”
Porém, isso não se verificou nem se provou!
Termos em que o presente recurso deve ser julgado improcedente, com as legais consequências, (…)”.

E, também inconformado, o A. interpôs “recurso (não subordinado)” da sentença, tendo formulado as conclusões que a seguir se transcreverão.
Previamente, importa, contudo, esclarecer o seguinte: o A., nas conclusões, transcreve extensos excertos dos depoimentos das testemunhas, que já constavam das alegações. As conclusões devem consistir em preposições sintéticas do que consta das alegações, sendo perfeitamente desnecessária e desapropriada a repetição, nas mesmas, das ditas transcrições, as quais, consistindo na fundamentação da impugnação da decisão da matéria de facto, deverão constar das alegações, mas não já das conclusões, cujo aperfeiçoamento não se determinou apenas para evitar maior morosidade na tramitação do recurso. Não obstante, na transcrição que faremos de seguida das conclusões, omitiremos, pelas razões apontadas, a transcrição dos excertos dos depoimentos que delas constam.
Assim, formulou o A/Recorrente as seguintes conclusões:
“1- Depois da análise dos factos dados como provados e não provados, há que dizer que, ao ter-se dado como provado, na matéria da Contestação, no Art. 8º, que o ora Recorrente apenas auferia € 5,64 por dia de subsídio de alimentação, e não os alegados € 5,65, o Meritíssimo Juiz do tribunal a quo laborou num compreensível lapso/erro de leitura do Recibo de remunerações a fls 279, 470 e 471, onde se evidencia, sem margem para erro, que os € 5,64 se referem à quadrícula da remuneração hora. Sendo, no mesmo recibo, referido que o subsídio de refeição é de € 5,65 (4.270+1.380 = 5,65€): valor peticionado (e em conformidade com o a cláusula 41 da CCT da construção civil, IRCT publicado no BTE nº 13 de 08/08/2005, que lhe é aplicável, na redacção dada ao mesmo IRCT publicado no BTE nº 29, de 08/08/2011 – a R/Recorrida menciona este IRCT nos mapas de pessoal, que a mesma apresentou aos autos a fls. 498 a 511).
2- Art. 10º da Contestação: ao dar-se Provado que o vencimento do A., desde que foi admitido na Ré, foi sendo aumentado, de tal forma que aquando da sua admissão era no valor de € 750.00, passando depois, ainda em 2007 para € 900.00; em 2008, para €1.100.00; em 2013, para € 1.300,00; e em Janeiro de 2014, para € 1.100.00, foi-o apenas com base no depoimento de parte do legal representante (cfr. Acta da audiência de 06/05/2015), o qual faltou à verdade. A verdade, porém, é outra: Encontra-se na listagem da Segurança Social a fls 282 e 283 dos autos (Doc. 7 da Contestação/Rec), conjuntamente com a análise dos documentos (Quadro de Pessoal dos anos 2007 a 2009, e outros) juntos pela Ré aos autos em requerimento de 05/05/2015, com a Referência 19531524. Nesses documentos, tem-se a informação precisa, verificando-se que: em 2007 o salário foi aumentado para 1.000,00€ em Junho, havendo remunerações no mapa do pessoal, no mês de Outubro, de 1.000,00€; e foi aumentado para 1.100,00€ em Janeiro de 2011; e actualizado para 1.300.00€ em Setembro de 2011. Os dados dessa listagem foram entregues pela própria Ré/Recorrida à Segurança Social, não podendo vir alegar contra factos próprios. Tudo como foi alegado na Contestação/ Reconvenção.
3- Já quanto aos Artigos 133 a 139 da Contestação, ao não se dar como provados esses factos alegados colide-se com o estatuído no art. 127º, nº1, j), do CT, já que do mesmo resulta um dever da entidade patronal de “ Manter actualizado, em cada estabelecimento, o registo dos trabalhadores com indicação de nome, datas de nascimento e admissão, modalidade de contrato, categoria, promoções, retribuições, datas de início e termo das férias e faltas que impliquem perda da retribuição ou diminuição de dias de férias”. Sendo este um dever da entidade patronal, não pode considerar-se haver inversão do ónus da prova; e não tendo a entidade patronal, aqui Ré/Recorrida, como era seu dever, conseguido demonstrar o contrário do alegado pelo A/Recorrente, logo essa matéria terá que ser dada, necessariamente, como provada, com as consequências legais.
4- Por sua vez, ao se considerar como não provada a matéria do Art. 150º da Contestação, e quanto ao Art. 153º da mesma peça processual, “provado apenas que pelo menos num sábado, de manhã, o A prestou trabalho numa obra da R. em …, ajudando na reparação das varandas” é ir contra a prova testemunhal e contra o ónus da prova que impendia sobre a entidade patronal, à qual incumbe o dever de registo dos tempos de trabalho (art. 202º CT); não podendo o período normal de trabalho exceder a oito horas diárias e quarenta semanais (art. 203º CT), podendo sim ser reduzidos por IRCT, sem que possa resultar prejuízo na remuneração do trabalhador (nº 4 do art. 203º CT). Acontece que, na data de assinatura do contrato de trabalho e de acordo com a CCT aplicável ao caso em apreço, a Convenção Colectiva de Trabalho da Construção Civil e Obras Públicas, o IRCT publicado no BTE nº 13 de 08/04/2005, o horário de trabalho é de 37.5 semanais de acordo com o nº 2 da Clausula 8ª Duração e organização do tempo de trabalho.
Assim, na gravação dos depoimentos das testemunhas arroladas, e que responderam sobre a matéria em apreço, resultou o seguinte:
E… – Ficheiro 20150708175208
Do minuto 9:07 ao 10:15
(…)
F… – Ficheiro 20150708180614
Do minuto 2:54 ao 3:27
(…)
e do minuto 3:55 ao 4:30
(…)
E do minuto 7:24 ao minuto 8:45
(…)
G… – Ficheiro 20150909153644
Minuto 3:26 aos 5:44
(…)
Minuto 15:42 a 16:02
(…)
Minuto 16:29 a 19:03 questionado pelo Dr. Juiz
(…)
H… Ficheiro 20150909155839
Minuto 1:49 a 4:24:
(…)
I… Ficheiro 20150909160631
Minuto 1:55 ao 5:55
(…)
J… Ficheiro 20150909162217
Do minuto 4:02 ao minuto 5:10
(…)
5- Estes depoimentos são esclarecedores e apontam todos no sentido de que o Recorrente trabalhava horas extraordinárias, que, como os demais trabalhadores da empresa, já estava ao serviço da mesma pelas 8horas da manhã, almoçava, como todos, das 12h às 13h, e depois estava até às 18h pelo menos. Era esta, sempre, a prática da empresa.
6- Por outro lado, há uma verdade insofismável: havia trabalho suplementar! Porém, a entidade patronal não fazia o registo do trabalho suplementar como lhe impunha a lei, e manter durante 5 anos a relação nominal dos trabalhadores que o prestaram (art. 231º CT).
7- E face a esta falha grosseira da entidade patronal (sancionada com contra-ordenação grave: nº 9 do art. 231º CT), o tribunal a quo foi do entendimento que cabia ao trabalhador o ónus da prova do que alegava no art. 150 e 153 da sua Contestação.
Premiando, assim, uma falha provocada pela própria entidade patronal para se favorecer a si mesma, em detrimento do trabalhador e lançando para este último, como se o prejuízo já não fosse bastante (pois nada recebeu de trabalho suplementar), o odioso de ainda ter que provar os factos que justamente alegou. Sendo que nestas situações o ónus da prova recai sobre a entidade patronal faltosa.
8- Em relação ao Pedido Indemnizatório, foi peticionado pelo A/Recorrente, nos termos do art. 392º CT, tendo em consideração de que se tratava, a Ré, de uma microempresa (menos de 10 trabalhadores – art. 100º CT). E não resultou dúvida alguma no julgamento de que a Ré é uma microempresa.
Desde logo pelos Docs. 5 e 6 juntos com a Contestação/Reconvenção, com assinatura da Gerência da Ré, tratando-se do documento de processamento de salários de Janeiro de 2014, em que se apresenta apenas quatro trabalhadores (K…; L…; B… e M…); e também pelo depoimento de parte do legal representante da Ré, K…, registado no Ficheiro 2015050611404, entre os minutos 32:24 e 32:42, em que este refere o seguinte: “É, verdade, é verdade, foi reduzido a todos os quatro funcionários.” Deste modo a indemnização concedida violou o art. 392º, nº 3 do CT, sendo que o valor correcto a atribuir deveria ser o peticionado: 20.583,35€.
9- Quanto ao subsídio de férias de 2007, o A. peticionou 916,66€, porém apenas lhe foi atribuída da D. sentença recorrida a quantia de 750,00€, sendo que este valor, como resulta da mesma: “No tocante aos € 916,66 peticionados a título de subsídio de férias de 2007 (ano de admissão do A.), a R. sustentou que o direito a férias e a subsídio de férias relativo ao ano de 2007 só se vencia em Janeiro de 2008, ano em que procedeu ao respectivo pagamento.
Como decorre do art. 212º do Cód. do Trabalho então vigente, aprovado pela Lei n.º 99/2003, de 27 de Agosto. “ 1. O direito a férias adquire-se com a celebração do contrato de trabalho e vence-se no dia 1 de Janeiro de cada ano civil, salvo o disposto nos números seguintes.
3. No ano da contratação, o trabalhador tem direito, após seis meses completos de execução do contrato, a gozar 2 dias úteis de férias por cada mês de duração do contrato, até ao máximo de 20 dias úteis. (…)”.
O A. foi admitido ao serviço da R. em 31/01/2007, pelo que teria nesse ano direito a 20 dias de férias e respectivo subsídio.
Provou-se apenas, a tal respeito, que em Julho de 2008, a R. pagou ao A. € 1.000,00, a título de subsídio de férias. Em 2008, o A. ganhava € 1.100,00/mês, pelo que os €1.000,00 que pagou ao A. em Julho desse ano, a título de subsídio de férias, não chegam sequer para liquidar o subsídio de férias desse mesmo ano de 2008.
Está assente que aquando da sua admissão, em 31/01/2007, a retribuição do A. era no valor de € 750,00, passando depois, ainda em 2007 (sem que se saiba em que mês), para € 900,00. Sendo portanto de admitir uma retribuição média de € 825,00, no referido ano.
Devendo a R. ao A., a título de subsídio de férias correspondente aos 20 dias de férias a que o A. tinha direito em 2007, a quantia de € 750,00”.
O tribunal fundamentou o seu cálculo do subsídio de férias no depoimento de parte do legal representante da ré, K…, (Ficheiro 2015050611404). Ora, se está provado que o A. foi admitido a 31/01/2007, com a retribuição de 750,00€ (cfr. depoimento de parte do legal representante da Ré do min. 10.50 ao min 11.27, que diz o seguinte: “quando se vem dizer deve-me férias, subsídio de férias de 2007, o Sr. B… começou a trabalhar e quando eu o entrevistei na empresa perguntei ao Sr. B… quanto é que o Sr. quer ganhar, e ele disse assim eu quero ganhar salvo erro 700. E eu paguei-lhe 750. no primeiro mês no 2º e 3º mês começou a ganhar 900.00€”) passando depois para 900,00€ ainda em 2007..” Portanto, em Março de 2007 já o A. auferia 900,00€ mês. E, em Outubro de 2007 auferia 1.000,00€ (cfr. Doc. a fls 498 dos autos, entregue com o requerimento da Ré de 05/05/2015 com a Refª 19531524). Deste modo resulta um salário médio de 909,09€, e não de 825,00€.
Deste modo, e seguindo o cálculo da sentença recorrida, o subsídio de férias de 2007 deveria ser de 826,45€, usando-se a seguinte fórmula: 909.09 / 22 * 20 = 826.45€. E é esta diferença dos 750,00€ para os 826,45€ que se reclama (i.e. 76,45€).
10- Resultaram violadas, entre outras, as seguintes normas jurídicas: a cláusula 41 da CCT da construção civil, IRCT publicado no BTE nº 13 de 08/08/2005, que lhe é aplicável, na redacção dada ao mesmo IRCT publicado no BTE nº 29, de 08/08/2011; art. 127º, nº1, j), do CT; art. 202º CT; art. 203º CT; art. 231º CT; 392º, nº3 CT.
Termos em que o presente recurso deve ser julgado procedente, alterando-se, por consequência, a D. Sentença recorrida, atribuindo-se ao recorrente os valores que lhe foram negados em consequência dos factos considerados não provados da sua Contestação, e aqui supra expostos, (…)”.

A Ré/Recorrida contra-alegou, tendo formulado as seguintes conclusões [também a Ré procede, em sede de conclusões, à transcrição de excertos de depoimentos, pelo que, pelas mesmas razões acima referidas a propósito do recurso do A., omitiremos a transcrição de tais excertos]:
“A - Da intempestividade do recurso apresentado pelo Autor: Ao Autor foi-lhe concedido o benefício de proteção jurídica na modalidade de dispensa de taxa de justiça e demais encargos com o processo e nomeação e pagamento de compensação de patrono, tendo o benefício por finalidade o recurso no âmbito dos presentes autos.
B- Por despacho proferido em 18.01.2016, foi decidido que o prazo do Autor para interpor recurso nos presentes autos ou para contra alegar o recurso já apresentado pela Ré em 26.10.2015, se tinha por reiniciado tendo por referência a data de 12.01.2016.
C- o prazo para o Autor recorrer nos presentes autos reiniciou-se na data em que lhe foi nomeado defensor oficioso, isto é, em 12.01.2016, data esta em que se considera notificado ao Autor e sua defensora oficiosa.
D- Nos termos do art. 248 e art. 255º do C. Processo Civil, por remissão do art. 23º do C. Processo do Trabalho tendo a defensora oficiosa do A. sido notificada da sua nomeação nos autos em 12.01.2016, bem como do reinício do prazo para apresentação do recurso na mesma data de 12.01.2016, presume-se que a mesma foi notificada em 15.01.2016 (uma sexta-feira).
E - As presentes alegações de recurso apresentadas pelo Autor são delimitadas à não condenação da Ré no pagamento de determinados valores pecuniários. Tendo o presente recurso por objecto a não condenação da Ré no pagamento de uma obrigação pecuniária, com a reapreciação da prova gravada, o prazo de interposição do recurso era de 10 dias acrescido, no entanto, do prazo de mais 10 dias nos termos do n.º 2 e n.º e do art. 80º do C. Processo do Trabalho.
F - Estando o Autor notificado em 15.01.2016, o prazo de 20 dias (10 + 10 dias) de interposição do recurso, na parte em que o mesmo se considera prejudicado, terminou em 06.01.2016, dia sábado em que os tribunais se encontram encerrados, transferindo-se assim para o primeiro dia útil seguinte, segunda-feira, dia 08.01.2016.
G - O último dia para o Autor apresentar as suas alegações de recurso terminou em 08.01.2016. Mas, o A., apresentou as suas alegações de recurso no dia 10.02.2016, - dois dias após o termo da data interposição do recurso.
H - Nos termos da alínea b) do n.º 5 do art. 139 do C. Processo Civil, por remissão do art. 23 do C. Processo do Trabalho, a validade das alegações apresentadas pelo Autor no 2º dia útil após o termo do prazo da prática do ato, dependia do pagamento imediato de uma multa fixada em 25% da taxa de justiça correspondente aos recursos prevista no Regulamento da Custas Processuais.
I - O fato do A. ser beneficiário do apoio judiciário na modalidade de dispensa de taxa de justiça e demais encargos com o processo não se aplica à multa pela prática do ato no 2º dia útil posterior, uma vez que nos termos do n.º 4 do art. n.º 28º do Regulamento das Custas Processuais, independentemente dos benefícios concedidos pela isenção de custas ou pelo apoio judiciário ou do vencimento na causa, as multas são sempre pagas pela parte que as motivou, pelo que o Autor teria de ter pago o valor da multa simultaneamente com a apresentação das suas alegações de recurso, juntando às mesmas o respetivo comprovativo.
J- Não tendo pelo Autor sido efetuado o pagamento simultâneo da respetiva multa aquando da apresentação das alegações de recurso, nem posteriormente, e sendo esse pagamento condição de validade do ato – apresentação de alegações, deve considerar-se que as mesmas foram a apresentadas para além do prazo legal para o efeito, devendo em consequência ser julgado intempestiva a interposição do recurso apresentado pelo Autor, com a consequente ordem de não subida do mesmo para a Instância superior, nos termos do n.º 1 e n.º 2 do art. 82º do C. Processo do Trabalho.
K - O art. 10º da Contestação/reconvenção foi corretamente julgado ao por julgar provado que o vencimento do A. desde que foi admitido na R. foi sendo aumentado, de tal forma que aquando da sua admissão era no valor de 750,00€, passando depois, ainda em 2007 para 900,00€; em 2008 para €1.100,00e; em 2013 para € 1.300,00€ e em Janeiro de 2014 para 1.100,00€;
L - No presente recurso apresentado pelo A. discutem-se eventuais créditos laborais que foram peticionados por ele na reconvenção que apresentou, pelo que o ónus da prova desses fatos recaem sobre o próprio Autor, nos termos do art. 342º, n.º 1 do Código Civil.
M - O A. apenas juntou aos autos recibos de vencimento do ano de 2014 e a listagem da Segurança Social junta aos autos por ele aquando da contestação reconvenção como documento n.º 7, apenas enumera os vencimentos a partir de julho de 2009, enquanto que os documentos juntos pela R., em 05.05.2015, referentes ao quadro de pessoal de 2007, 2008 e 2009 em nada colide com o julgado provado pelo tribunal, ou seja, que efetivamente o vencimento do A., desde que foi admitido na R. foi sendo aumentado, de tal forma que aquando da sua admissão era no valor de 750,00€, passando depois, ainda em 2007 para 900,00€; em 2008 para €1.100,00€; em 2013 para € 1.300,00 e em Janeiro de 2014 para 1.100,00€.
N- Deverá assim manter-se a resposta dada pelo Tribunal a quo ao art. 10º da Contestação/reconvenção, bem como a Sentença recorrida nesta parte.
O – As respostas de “não provado” dadas pela Sentença recorrida aos art. 133º a 139º da Contestação, onde o A. peticiona o pagamento de férias não gozadas, não merecem qualquer reparo.
P - O ónus da prova destes fatos incumbia ao A. é não à R. nos termos do n.º 1 do 342º do Código Civil, sendo que nenhuma prova foi feita no que diz respeito a eventuais férias não gozadas pelo A.
Q - Nenhuma das testemunhas arroladas pelo A. fez referência ou tinha conhecimento sobre as férias que o A. teria gozado ou não.
R- Em momento algum houve qualquer inversão do ónus da prova, nem sequer foi alegado ou peticionado pelo A., ou sequer foi notificada a R. para fornecer os registos de férias dos trabalhadores: o A. peticionou férias não gozadas e a ele incumbia legalmente o ónus de provar esse crédito laboral, o que não conseguiu provar nos autos, nem por documentos, nem por testemunhas, sendo que a Sentença recorrida expressamente refere que: «No que se refere aos € 1.526,66 peticionados pelo A. por conta de férias alegadamente não gozadas nos anos de 2008 a 2014 (…) cabia ao A. o ónus da respetiva prova, à luz do disposto no art. 342º n.º 1 do Código Civil. Não se tendo demonstrado que não tenha na realidade gozado os dias de férias que discrimina nos art. 133º a 139º da contestação/reconvenção», pelo que deverá manter-se a Sentença recorrida nesta parte.
S- Nenhum reparo merece igualmente a Sentença recorrida no que se refere à não condenação da R. no pagamento ao A. de trabalho suplementar alegadamente prestadas de 2007 a 2014 - o art. 150º e art. 153º da Contestação
T- Como bem refere o Tribunal a quo, mais uma vez, estamos perante créditos emergentes de contrato de trabalho peticionados pelo A. na Contestação/reconvenção. Nos termos do n.º 1 do art. 342º do Código Civil, àquele que invocar um direito cabe fazer a prova dos factos constitutivos do direito alegado. Logo, cabia ao Autor o ónus respetiva prova, não se tendo demonstrado que desde a sua admissão foi obrigado a trabalhar 9 horas diárias e que tenha prestado as horas de trabalho suplementar referidas no art. 153º da contestação/reconvenção.
U- Aliás, o tribunal a quo fundamenta de forma precisa o que efetivamente se provou quanto ao trabalho suplementar: «Especificamente quanto ao trabalho suplementar, provou-se apenas que de acordo com o contrato de trabalho celebrado entre A. e R., o horário de trabalho do A. era de 40 horas semanais, sendo os sábados e domingos dias de descanso. E que pelo menos num sábado de manhã, em data não apurada, o A. prestou trabalho numa obra da R. em …, ajudando na reparação de varandas.
Sucede que, para além de lhe caber demonstrar que trabalhou para além do respectivo horário, impendia de igual modo sobre o A. o ónus de alegar e provar que esse trabalho suplementar prestado foi prévia e expressamente determinado pela R., ou realizado de modo a não ser previsível a oposição desta (cfr. arts. 258º n.º 5 do anterior Cód. do Trabalho, aprovado pela Lei n.º 99/2003, de 27 de Agosto e 268º n.º 2 do actual Cód. do Trabalho, aprovado pela Lei n.º 7/2009, de 12/01). Prova essa que não foi feita, quanto à tal manhã de sábado em que o A. trabalhou numa obra da R. em …, ajudando na reparação de varandas. Donde se conclui nada ter o A. a haver da R., relativamente a férias, formação e trabalho suplementar» (sublinhado nosso).
V- O Tribunal a quo não decidiu em contrário ao alegado em sede de prova testemunhal e o ónus da prova da prestação de eventual trabalho suplementar não cabia à R., mas sim ao A. Para além disso, a R., notificada para o efeito, juntou aos autos o registo de horas do A. não tendo os mesmos sido impugnados nos autos.
W- As testemunhas arroladas pelo A., e nomeadamente o I… (testemunha que ficou a constar em ata guardar ressentimento contra a Ré) e o G… referiram o horário de trabalho praticado pelos trabalhadores da obra e não o horário praticado pelo A., sendo que nunca concretizaram com o mínimo de certeza, mas porque achavam ou porque algumas vezes viam o A. qual era o horário que o mesmo praticava e se prestava trabalho suplementar. As restantes assim responderam:
a. E… ficheiro 20150708175208 e no que concerne apenas ao alegado trabalho suplementar prestado pelo Autor e no minuto:
(…)
b. F… ficheiro 20150708180614 e no que concerne apenas ao alegado trabalho suplementar prestado pelo Autor e no minuto:
(…)
c. H… - ficheiro 20150909155839 e no que concerne apenas ao alegado trabalho suplementar prestado pelo Autor e no minuto:
(…)
d. J… ficheiro 20150909162217 e no que concerne apenas ao alegado trabalho suplementar prestado pelo Autor e no minuto:
(…)
X- O Tribunal a quo nas respostas à matéria controvertida no que concerne a alegada prestação de trabalho suplementar faz expressamente referência à prova testemunhal dizendo que: «No que respeita ao trabalho suplementar alegadamente prestado pelo A. embora a testemunha H… (que conhece o A., morando por cima do escritório onde este trabalhava) tenha dito que achava que viu o A. trabalhar algumas vezes ao sábado, não foi capaz de concretizar com o mínimo de certeza exigível quando é que isso terá acontecido, que trabalho o A. fazia e em que circunstâncias. O mesmo sucedendo em relação à testemunha J… (que também conhece o A. por ter comprado um apartamento naquele local, em 2007), que disse ter visto o A. no escritório nalguns sábados, que não consegue situar no tempo, não sendo capaz de afirmar se estava ou não a trabalhar».
Y- Não foi feita qualquer prova de que o A. tenha prestado trabalho suplementar, com consequente não condenação da Ré não pagamento desse alegado trabalho suplementar, pelo que nenhum reparo merece a Sentença recorrida nesta parte.
Z- No que concerne ao Pedido Indemnizatório peticionado pelo A. em virtude do despedimento ilícito: no dia 26.10.2015, a Ré interpôs recurso da douta Sentença proferida nos autos, na parte em que julgou ilícito o despedimento do Autor com consequente condenação da Ré, no pagamento, entre outros, de indemnização pelo despedimento ilícito, no valor atual de €11.267,00 (onze mil, duzentos e sessenta e sete euros), bem como as retribuições vencida e vincendas desde o despedimento até ao trânsito em julgado da sentença;
AA- O referido recurso interposto pela Ré dessa parte da Sentença tem como objeto, conforme as conclusões apresentadas, duas questões a decidir:
a. Existiu ou não justa causa no despedimento do Autor B…;
b. Que direitos assistem ao Autor em resultado disso, ou seja, o pagamento ou não de indemnização, seu valor e retribuições vencidas e vincendas.
BB- A R. no referido recurso pugna pela revogação da sentença recorrida na parte em que declarou ilícito o despedimento do A., substituindo-a por decisão que declare improcedente a ação de impugnação judicial da regularidade e licitude do despedimento do A., de forma a considera-lo lícito e regular, por justa causa, tendo como consequência a absolvição da R. do pedido nessa parte, ordenando ainda a revogação da sentença na parte em que condenou a R. no pagamento do valor da indemnização pelo despedimento ilícito, bem como do pagamento das retribuições vencidas e vincendas desde o despedimento até à data do trânsito em julgado da sentença recorrida, absolvendo a R. desses pedidos.
CC- Ao recurso interposto em 26.10.2015 pela R., respondeu o A. em 01.02.2016, concluindo que: « 1- Considerando os factos dados como provados e não provados na D. Sentença recorrida, e elencados supra, para onde se remete, resulta claro que nenhum reparo há a fazer à dita sentença por ter julgado, e bem no entender, o despedimento como ilícito.(negrito e sublinhado nosso)», peticionando a final pela improcedência do recurso apresentado pela Ré.
DD- Estando já a ser discutido em sede de anterior recurso apresentado pela Ré, a ilicitude ou não do despedimento do A. e suas consequências, que seriam obviamente o pedido indemnizatório, o seu quantum e ainda as prestações vencidas e vincendas e tendo o A. já respondido a esse recurso onde expressamente considerou que nessa parte da sentença proferida «nenhum reparo há a fazer à dita sentença», não pode agora este, a pretexto do recurso que agora apresentou, “querer dar o dito por não dito”, como que numa espécie de segunda oportunidade após arrependimento ou esquecimento, vir agora querer que seja apreciado apenas e tão só o quantum indemnizatório. Esse pedido indemnizatório já está a ser discutido no recurso apresentado pela Ré. A oportunidade do A. em responder a essa parte da sentença que está a ser discutida em sede de recurso interposto pela R. já foi exercida pelo A. e nele expressamente considerou nenhum reparo havia a fazer à sentença recorrida.
EE- Apesar disso e por uma questão de economia processual, a R., no recurso que apresentou em 26.10.2015, suas alegações e conclusões, para os quais remete, dando-os por reproduzidos, refere que não ser razoável que, tendo sido provado nos autos que todos os fatos foram praticados pelo A. enquanto suspenso de funções em sede de procedimento disciplinar anterior, se imponha a obrigação da R. em manterem vigor o contrato de trabalho com o A. mais ainda quando este último continuaria a ser o TOC da empresa.
Não é razoável que se imponha à R. que continue a depositar no A. absoluta confiança, necessária para o manter no seu local de trabalho. É que essa absoluta confiança foi irremediavelmente perdida, quebrada. Não há possibilidade da R. permitir que o A. mantenha o acesso no seu local de trabalho de toda a documentação contabilística da empresa, sem que paire sempre a desconfiança.
FF- Não se pode impor à R. que mantenha absoluta confiança no A. como seu trabalhador, imprescindível igualmente na relação da sociedade com o seu Técnico Oficial de Contas, quando esta toma conhecimento que o A., enquanto suspenso das suas funções e virtude de processo disciplinar contra ele instaurado:
a. utiliza sem o conhecimento da R., sem a sua ordem, sem o seu consentimento, o número de utilizador da R., para com ela aceder à página pessoal da R. da Autoridade Tributária e Aduaneira, através da password da própria R., para emitir declarações fiscais para pagamento de impostos que o A. sabia que não podia só por ele emitir, pois não tinha plenos poderes declarativos;
b. utilizou, fora das instalações da R., pois estava suspenso, os códigos pessoais de acesso que são confidenciais mas aos quais o A. tinha acesso apenas e tão só, porque era também o TOC da empresa, e sempre teve acesso até ser suspenso, no seu local de trabalho, que era também o escritório da empresa, a toda a documentação contabilista da R.;3.envioucarta a um terceiro, cliente da R., pedindo-lhe os contratos de permuta que celebrou com ela, arrogando-se contabilista da R., não mencionando que estava suspenso, para segundo ele poder conferir verificar a conformidade patrimonial nas demonstrações financeiras da empresa que tinha certificado, apesar do A. ter tido sempre acesso, até ser suspenso das suas funções, a todos os documentos contabilísticos da empresa, no escritório desta, onde era também o seu local de trabalho, tinha tido todo o tempo para conferir tudo o que quisesse;4.proferiuas expressões que proferiu em sede de resposta à nota de culpa no procedimento disciplinar anterior;
c. invocou fatos fora do contexto da nota de culpa, que não consegue provar, de forma a dar a ideia, a insinuar, que entre o sócio gerente da Ré e a filha havia um conluio para o afastar psicologicamente, comprando três cabras com o propósito de o obrigar a passar por elas quando ia almoçar.
GG- No presente recurso, o A. defende que o quantum indemnizatório deveria ter sido fixado nos termos do art. 392º do Código do Trabalho uma vez que se tratava de uma microempresa. Mas, o tribunal a quo fundamentou que nos presentes autos, o art. 392º do Código do Trabalho não pode ser aplicável «posto que nem o A. ocupava na R. cargo de administração ou direcção, nem se apurou quantos trabalhadores esta teve ao seu serviço, em média, no ano civil anterior, não podendo consequentemente concluir-se que se trata de microempresa –cfr. também o art. 100º n.º 1, al. a). Ademais, o A., logo na contestação/reconvenção, optou pela indemnização, em detrimento da reintegração, pelo que a questão tão pouco se coloca. Não sendo consequentemente de fixar a indemnização por referência ao n.º 3 do art. 392º (entre 30 a 60 dias de retribuição base e diuturnidades), como pretende o A
HH- Quanto ao pagamento do subsídio de férias no valor de 750,00€ a que foi condenada a R., nenhum reparo merece a sentença recorrida. O Tribunal a quo expressamente refere que está assente nos autos que aquando da sua admissão, em 31/01/2007, a retribuição do A. era no valor de € 750,00, passando depois, ainda em 2007 (sem que se saiba em que mês), para €900,00. Sendo portanto de admitir uma retribuição média de € 825,00, no referido ano. Devendo a R. ao A., a título de subsídio de férias correspondente aos 20 dias de férias a que o A. tinha direito em 2007, a quantia de € 750,00 (€825,00:22dias) x 20 dias= €750,00.
Deverão assim V. Ex.as julgar o presente recurso interposto pelo Autor improcedente, com as suas devidas consequências, mantendo a Sentença recorrida na parte em que nestes autos se discute, excecionando a parte referente ao quantum indemnizatório, cuja questão deverá ser decidida por V. Exas. no recurso interposto pela R. da parte da Sentença que julgou o despedimento do A. como ilícito, com consequente condenação no pagamento da respetiva indemnização e retribuições vencidas e vincendas, (…)”.

Por despacho de 09.03.2016, o Mmº Juiz, considerando que o recurso interposto pelo A. o havia sido no 3º dia útil subsequente ao termo do prazo, determinou a notificação do mesmo para cumprimento do disposto no art. 139º, nº 5, al. c), do CPC/2013, na sequência do que o A. veio pagar a multa aí prevista.

Os recursos interpostos pela Ré e pelo A. foram admitidos pela 1ª instância.

O Exmº Sr. Procurador Geral Adjunto emitiu douto parecer no sentido de que a decisão impugnada não merece reparo, o qual, notificado às partes, não foi objeto de resposta.

Colheram-se os vistos legais.
***
II. Matéria de facto provada

Na 1ª instância foi dada como provada a seguinte matéria de facto:

“1. A R. é uma sociedade por quotas, cujo escopo social é a construção civil.
2. O A. é Técnico Oficial de Contas (TOC), devidamente inscrito na Ordem dos Técnicos Oficiais de Contas.
3. O A. celebrou com a R. um contrato de trabalho por tempo indeterminado, com início da prestação da actividade laboral em 31.01.2007, o qual se vinha mantendo em vigor até à decisão do procedimento disciplinar ora impugnado.
4. No referido contrato de trabalho, foi atribuída ao A. a categoria profissional de TOC da R..
5. Só no 2.º semestre de 2008 o A. foi promovido pela R. à função de TOC, funções que mantinha ainda enquanto adstrito a tais competências representativas da R. junto da Administração Tributária, encontrando-se registado oficialmente e pelo menos até tal decisão como TOC da R..
6. O A. auferia a remuneração mensal base de € 1.100,00 (ilíquidos), a que acresciam € 5,64 por dia de subsídio de alimentação (rondando os € 124,30 mensais), perfazendo uma remuneração mensal média líquida de € 912,65.
7. O vencimento do A., desde que foi admitido na R., foi sendo aumentado, de tal forma que aquando da sua admissão era no valor (ilíquido) de € 750,00, passando depois, ainda em 2007, para € 900,00; em 2008, para € 1.100,00; e em 2013, para € 1.300,00.
8. A R., no mês de Janeiro de 2014, reduziu o salário do A. de € 1.300,00 para €1.100,00.
9. No dia 21 de Novembro de 2014, a R., através do seu sócio-gerente, decidiu instaurar procedimento disciplinar contra o A., com intenção de proceder ao seu despedimento com justa causa.
10. Essa decisão foi notificada na mesma data ao instrutor nomeado para o efeito, Dr. N….
11. O instrutor nomeado tomou declarações ao sócio gerente da R., K…, no dia 25 de Novembro de 2014.
12. Elaborada a nota de culpa, no dia 27 de Novembro de 2014, foi a mesma entregue ao A., em mão, acompanhada de carta, comunicando-lhe a instauração do procedimento disciplinar com intenção da entidade patronal proceder ao despedimento por justa causa, comunicando-lhe ainda a suspensão preventiva e imediata, sem perda de retribuição.
13. Acompanhavam a comunicação de instauração de procedimento disciplinar com justa causa e a respectiva nota de culpa, os seguintes documentos: Doc. n.º 1: Cópia de notificação à entidade patronal, contendo cópia de resposta à nota de culpa em sede de outro procedimento disciplinar anteriormente instaurado ao A.; Doc. n.º 2: Guia para pagamento de IRC - Modelo P1, documento n.º ….- ……….., emitido à R.; Doc. n.º 3: Cópia de comprovativo de entrega da declaração IES/DA (Informação Empresarial Simplificada), com código de validação …………; Doc. n.º 4: Guia para pagamento de IRC – Modelo P1, documento n.º ….-……….., emitido à R.; Doc. n.º 5: Cópia de carta enviada pelo A. a D… e Outra, datada de 18 de Outubro de 2014.
14. O A. consultou o processo, tendo-lhe sido entregue uma cópia das declarações tomadas ao sócio-gerente da R..
15. No dia 11 de Dezembro de 2014, o A. remeteu ao instrutor nomeado, através de carta regista com aviso de recepção, a resposta à nota de culpa, tendo junto dois documentos.
16. No final da resposta à nota de culpa apresentada pelo A. no âmbito do procedimento disciplinar em questão nos presentes autos, consta:
Prova
A) Por documentos:
- Desde já se requer a junção aos autos do balancete analítico relativo ao mês de Dezembro de 2013, assim como os extractos da classe 7 (Vendas e prestações de serviços);
B) Por testemunhas:´
1. Sr. G…;
Junta: 2 documentos; (…)”.
17. O instrutor nomeado no procedimento disciplinar em questão nos presentes autos, notificou a R. em 17/12/2014, nos seguintes termos:
Serve a presente para remeter a V. Exas. cópia da Resposta a nota de culpa enviada pelo trabalhador B….
Na sequência da referida Resposta à nota de culpa e nos termos do n.º 1 do artigo 356.º do Código de Trabalho, ficam V. Exas. notificados, para proceder no prazo de 10 dias à junção aos autos do balancete analítico relativo ao mês de Dezembro de 2013, bem como os extractos da classe 7 (vendas e prestação de serviços)”.
Junta: cópia da resposta à nota de culpa.”.
18. No dia 18 de Dezembro de 2014, a R. procedeu à junção ao procedimento disciplinar, do balancete analítico referente à R., relativo ao mês de Dezembro de 2013, contendo a conta 71, referente a vendas e a conta 72, referente a prestações de serviços.
19. A R. não juntou aos autos de procedimento disciplinar quaisquer “extractos da classe 7”.
20. Foi designado o dia 22 de Dezembro de 2014 para a tomada de declarações da testemunha identificada pelo A. apenas como “Sr. G…”, tendo disso o A. sido notificado através de carta registada simples, que lhe foi enviada em 17 de Dezembro de 2014 e também através de carta registada com aviso de recepção, que o A. recebeu em 22/12/2014.
21. Foram tomadas declarações à testemunha G…, que foi inquirida sobre a matéria do ponto 1 – nomeadamente o que se refere ao ponto 3 da nota de culpa e ao ponto 17 da resposta à nota de culpa, cumprindo assim as indicações do A. em requerimento que apresentou aos autos em 22 de Dezembro de 2014.
22. No âmbito do procedimento disciplinar em questão nos presentes autos, a única pessoa ouvida, para além da testemunha arrolada pelo A. na resposta à nota de culpa, foi o legal representante da R., K….
23. Concluídas as diligências probatórias, foi elaborado em 26 de Dezembro de 2014, pelo instrutor nomeado, o Relatório e Parecer Final, através de documento escrito, que após indicação dos factos, da prova e respectiva defesa do trabalhador/A., propôs como adequada a sanção de despedimento do A., com invocação de justa causa.
24. Na mesma data (26 de Dezembro de 2014), foi a R. notificada do Relatório e Parecer elaborado pelo referido Instrutor.
25. Em 29 de Dezembro de 2014, a R. proferiu decisão final, elaborada em documento escrito, decidindo o despedimento imediato do A..
26. Essa decisão foi notificada ao A. através de comunicação com data de 29 de Dezembro de 2014, remetida por carta registada com aviso de recepção, que o A. assinou em 05 de Janeiro de 2015.
27. Em 11 de Setembro de 2014, a R. já havia instaurado ao A. procedimento disciplinar com intenção de proceder ao seu despedimento por justa causa.
28. Esse procedimento disciplinar é um procedimento anterior ao que está em causa nos presentes autos, tendo a final sido proferida pela R. a decisão, notificada ao A., de aplicação da sanção disciplinar de suspensão pelo período de 6 dias úteis, com perda de retribuição e antiguidade, agravada pela divulgação no âmbito da empresa da sanção aplicada.
29. A resposta à nota de culpa apresentada pelo A. no âmbito do anterior procedimento disciplinar, que lhe foi instaurado pela R. em 11 de Setembro de 20143, é feita sob a forma de articulado, sendo subscrita pelo A. e por mandatários/advogados.
30. Os pontos 82. e 84. da resposta à nota de culpa apresentada pelo A. no âmbito do anterior procedimento disciplinar têm o seguinte teor:
- 82. “Desde algum tempo que o Sr. K… em concluo com a sua filha, também ela sócia da C…, Lda., vinham fazendo pressão constante com o arguido com o intuito de que aquele se despedisse, chegando ao ponto de terem comprado três cabras e deixa-las soltas no sítio onde o arguido tinha que passar para chegar ao contentor onde tomava as suas refeições, pretendendo afecta-lo psicologicamente pois tinha que passar por cima dos dejectos dos animais, ficando com um cheiro nauseabundo”.
- 84. “E do incómodo causado à P… e à Q… com os proprietários e os clientes a queixarem-se constantemente”.
31. O sócio-gerente da R., K…, em declarações prestadas em 25/11/2014, no âmbito do procedimento disciplinar em questão nos presentes autos, disse não ser verdade o alegado pelo A., declarando que “as cabras existem e a compra delas até foi sugestão do trabalhador B…, porque era uma forma de elas comerem as ervas que por lá crescessem sem haver necessidade de comprar remédio ou pesticidas para as queimar”. E que “(…) quando leu que os vizinhos, a Q… e a P… e os seus clientes andavam a queixar-se do cheiro nauseabundo, foi ele próprio falar com os donos e com a funcionaria da P…, a Sra. S…, sobre se havia queixas deles e dos clientes a respeito das cabras. O dono da Q… disse que nem sequer sabia que a empresa tinha no terreno as cabras e na P… disseram-lhe que o trabalhador tinha lá ido para pedir que se testemunhasse contra a empresa dizendo que por causa das cabras o cheiro era nauseabundo e os clientes andavam queixar-se, mas foi recusado, porque não era verdade e nem sabiam que a empresa tinha la as cabras.”.
32. Por sua vez, a testemunha arrolada pelo A., G…, refere ter tido conhecimento da existência das cabras, referindo que as mesmas faziam as necessidades no corredor entre o armazém e as chapas perto do contentor onde o A. almoçava.
33. Na decisão final proferida no âmbito do procedimento disciplinar em questão nos presentes autos, escreveu-se a propósito de tal questão que “O arguido não logrou fazer a contraprova necessária de forma a se provar, por um lado, que a entidade patronal havia adquirido as cabras para que o arguido passasse por cima dos dejectos dos animais, pretendendo afectá-lo psicologicamente e, por outro, não logrou fazer prova do incomodo causado à “P…” e “Q…” com os proprietários e clientes a queixarem-se. Na verdade, os mesmos não sabiam sequer da existência das cabras. Não tendo feita a necessária contraprova, terá de considerar-se como verdadeiro o alegado pela entidade patronal, ou seja, que existem efectivamente as cabras mas as mesmas foram adquiridas por sugestão do arguido como forma de manterem os terrenos limpos e não com a intenção de afectar psicologicamente o arguido. Assim sendo, as declarações do arguido em sede de defesa, tem de ser consideradas como tendo sido proferidas não com intenção de reposição da verdade dos factos, mas como intenção de denegrir a imagem e o bom nome da entidade patronal junto de terceiros. Não poderia ser entendido de outra forma”.
34. Os pontos 129., 131., 151., 153., 169. e 201. da resposta à nota de culpa apresentada pelo A. no âmbito do anterior procedimento disciplinar, têm o seguinte teor:
- 129. “Se por algum motivo os mesmos (os dados da empresa) estavam incorrectos é porque alguém, possivelmente que não sabia trabalhar como o programa, foi mexer no mesmo depois do último dia efectivo de trabalho do arguido e o desconfigurou”.
- 131. “Alguém, que não o arguido, andou a tentar usar o programa, desconfigurou-o e tornou necessário o auxílio de um técnico”.
- 151. “Ou seja, depois do último dia de trabalho do arguido já diversas pessoas utilizaram o programa para fins inclusive que não deviam”.
- 153. “Pelo que se por algum motivo o programa se encontra desconfigurado, o que o arguido desconhece e só avença devido ao que está na nota de culpa, tal se deve à má utilização efectuada depois do último dia de trabalho do arguido”.
- 169. “Nomeadamente devido ao facto de várias pessoas terem acesso ao software e poderem efectuar alterações às bases de dados sem o conhecimento do arguido”.
- 201. “Salvo alteração do nome da pasta ou eliminação de que a mesma tenha sido alvo uma vez que o computador da recepção não tem password de acesso, toda a gente acede como utilizador geral e os documentos estão partilhados na rede”.
35. O A. refere em sua defesa que mantém tudo o referido na resposta à nota de culpa de 11 de Setembro de 2014, alegando que proferiu aquelas expressões apenas e só para repor a verdade dos factos.
36. Na decisão proferida no procedimento disciplinar em questão nos presentes autos, deu-se como provado que o A. proferiu essas expressões não com a intenção de repor a verdade dos factos, mas sim com intenção de denegrir a imagem, a honra e o bom nome da R..
37. Os pontos 178. e 183. da resposta à nota de culpa apresentada pelo A. no âmbito do anterior procedimento disciplinar têm o seguinte teor:
- 178. “Não basta o sócio-gerente dizer se deve ou não deve, tem que apresentar documentos que comprovem tais factos pelo que todos os balancetes analíticos e sintéticos, até ao último dia de trabalho do arguido se encontravam correctos e de acordo com os documentos contabilísticos que lhe haviam sido facultados”.
- 183. “Pelo exposto, a existirem diferenças entre as facturas, os extractos bancários e os cheques emitidos devem-se certamente às razões supra elencadas, oriundas de pagamentos efectuados em períodos posteriores aos que foram relevados na contabilidade, salvo erro, omissão ou até mesmo ocultação de documentos a que o arguido tenha estado sujeito”.
38. O sócio-gerente da R., K…, em declarações prestadas em 25/11/2014, no âmbito do procedimento disciplinar em questão nos presentes autos, disse que “(…) não fazia qualquer sentido que a empresa ocultasse documentos contabilísticos, nomeadamente pagamentos a fornecedores para que esses pagamentos não constassem nos balancetes da empresa, uma vez isso era muito prejudicial para a Ré, nomeadamente junto das entidades bancárias onde a mesma tem vários financiamentos”. E que “(…) qualquer empresa faria obviamente o contrário, ou seja, assim que pagasse uma determinada dívida, pretendia que a mesma logo constasse do respectivo balancete analítico”.
39. Na decisão final proferida no âmbito do procedimento disciplinar em questão nos presentes autos, escreveu-se a propósito de tal questão que “Por tudo o exposto, tendo sido proferidas pelo arguido as expressões do ponto 178 e do ponto 183, da referida defesa em sede de processo disciplinar, sendo as mesmas confessadas pelo próprio arguido nestes autos de processo disciplinar, sem qualquer prova da veracidade do seu conteúdo, não podem ser consideradas com tendo servido para repor qualquer veracidade de factos pois o arguido nada provou nesse sentido e devem ser consideradas serem expressões de grande gravidade, com o intuito de denegrir o bom nome da entidade patronal e do seu socio gerente, pretendendo assim criar uma imagem para terceiros de uma empresa negligente na sua actividade económica”.
40. No âmbito do anterior procedimento disciplinar que lhe foi instaurado pela R. com intenção de proceder ao seu despedimento por justa causa, o A. foi suspenso preventivamente das suas funções de TOC, em 12 de Agosto de 2014, o que lhe foi devidamente comunicado.
41. Pelo menos até à semana anterior a 07/08/2014, o A. teve acesso no seu local de trabalho, que era o escritório de empresa, a toda a documentação contabilística referente à R..
42. O A. tinha conhecimento das “passwords” da R. de acesso à Segurança Social e à Autoridade Tributária.
43. O A. vem ainda acusado, no procedimento disciplinar em causa nos presentes autos, de no dia 21.10.2014, entre as 18:30 e as 19:00, se ter deslocado ao escritório da R., sito na Rua …, n.º … em ….
44. O referido escritório tinha a porta de acesso temporariamente fechada, por isso, o A., através da ranhura existente na porta para entrega de correio, inseriu e depois empurrou para dentro da porta uma folha azul escura.
45. Nesse momento, chegou o sócio gerente da Empresa, Sr. K…, que lhe perguntou se queria alguma coisa, ao que o A. respondeu que tinha ido ali para lhe entregar a guia para o Pagamento Especial por Conta da R..
46. Foi o A. que procedeu à impressão da referida guia para pagamento pela R. da 2ª prestação do Pagamento Especial por Conta, guia essa com o número ….- ……….. e com a referência para pagamento ……….........., nela se indicando o valor a pagar de €2.231,09.
47. Na nota de culpa referente ao procedimento disciplinar em questão nos presentes autos, o A. foi acusado de ter emitido ou impresso a referida guia para pagamento da 2ª prestação do Pagamento Especial por Conta, enquanto se encontrava suspenso das suas funções de técnico oficial de contas da R., acedendo à área pessoal desta, nas Finanças, através da “password” (palavra passe) da R..
48. Como TOC, o A. consegue, através do acesso ao seu próprio portal das finanças, verificar e emitir alguns documentos dos contribuintes dos quais é contabilista.
49. O A. emitiu/imprimiu a referida guia para pagamento da 2ª prestação do Pagamento Especial por Conta enquanto se encontrava suspenso das suas funções de TOC da R. e acedendo à área pessoal da R. nas Finanças, através da “password” (palavra passe) da R., sem conhecimento, ordem ou consentimento desta.
50. O A., na nota de culpa referente ao procedimento disciplinar em questão nos presentes autos, foi acusado de ter emitido a referida guia de forma incorrecta, designando para pagamento por parte da R. um valor de imposto superior àquele que a R. entende ser devido e de lhe causar com isso prejuízo.
51. No balancete analítico referente à R., de Dezembro de 2013, junto pela R. ao procedimento disciplinar, consta na conta 71 (vendas) o valor de € 1.787.085,27 e na conta 72 (prestações de serviços), o valor de € 44.000,00. Enquanto na Informação Empresarial Simplificada (IES) relativa ao ano de 2013 consta, no campo A5001 (Vendas e serviços prestados), o valor de € 1.787.885,27.
52. Na rúbrica 26 do referido balancete analítico de Dezembro de 2013, constam os “accionistas sócios” com um valor de € 1.281.332,27 e na IES relativa ao ano de 2013, os “accionistas sócios” figuram com um valor de € 1.083.332,27.
53. A referida IES foi submetida à Autoridade Tributária e Aduaneira em 2014-07-04.
54. De acordo com a IES, o volume de negócios da R. no exercício anterior, ou seja no ano de 2013, foi de € 1.787.885,27.
55. A primeira prestação do Pagamento Especial por Conta foi paga pela R. em 31.03.2014, pelo valor de € 2.231,09.
56. O preenchimento e a entrega da referida IES é da competência do TOC da entidade a que diz respeito, sendo que no caso da R., era o A. o TOC, constando na folha de rosto do referido documento a indicação do número de identificação fiscal do mesmo.
57. O cálculo a apurar para o Pagamento Especial por Conta tem por referência o volume de negócios da R. no ano de 2013.
58. A R., em 2013, facturou mais de € 1.700.000,00.
59. Na nota de culpa referente ao procedimento disciplinar em questão nos presentes autos, o A. foi também acusado de, durante o período em que se encontrava suspenso, ter enviado uma carta a “D… e Outra” – invocando a qualidade de contabilista da R., mas não informando que se encontrava suspenso das suas funções – onde lhes solicitava os contractos que tinham com a R., com vista a “verificar a conformidade patrimonial expressa nas demonstrações financeiras da empresa, que tendo em conta os elementos fornecidos pela empresa executei e certifiquei”, pretendendo com isso criar junto desses terceiros a aparência de que alguma irregularidade a R. estava a efectuar.
60. O A., na sua defesa, confessou expressamente ter enviado a carta constante da nota de culpa como doc. n.º 5, alegando porém que o fez porque foi obrigado pela R. a fazê-lo, uma vez que esta última se tinha recusado a entregar os elementos que na carta solicitava.
61. Para prova do alegado, o A. juntou em sede de resposta aos autos, os documentos n.º 1 e n.º 2, sendo: a) O documento n.º 1, uma cópia de uma carta, datada de 28 de Outubro de 2014, que o Autor dirigiu à R.; b) O documento n.º 2, uma cópia de uma carta, datada de 05 de Novembro de 2014, enviada pela R. ao A..
62. O A., durante o período em que se encontrava suspenso, enviou uma carta dirigida a “D… e Outra”, datada de 18 de Outubro de 2014, com o seguinte teor:
Correio registado c/AR
Assunto: Pedido de informações
Exmos. Srs. sou contabilista da empresa C…, Lda. Com Nif ………, com a qual julgo que V. Exas. têm ou tiveram relações contratuais até Junho de 2014, e usando a faculdade que a lei me reconhece, à luz do Estatuto da Ordem dos Técnicos Oficiais de Contas venho solicitar os contractos que tenham com esta empresa, nomeadamente o contrato de permuta dos terrenos que eram da quinta sita em …, Aveiro, na qual tenho conhecimento que já efectuaram várias permutas com a empresa. Tal informação terá como fim verificar a conformidade patrimonial expressa nas Demonstrações Financeiras da empresa, que tendo em conta os elementos fornecidos pela empresa executei e certifiquei.
Para qualquer esclarecimento podem contactar-me para o telemóvel acima apresentado, para marcar reunião no sentido de poder esclarecer qualquer questão que tenham por conveniente. (…)”.
63. A referida carta, dirigida pelo A. a “D… e Outra”, datada de 18 de Outubro de 2014, foi remetida em 19/11/2014 e recebida em 20/11/2014.
64. A R. tomou conhecimento da carta enviada pelo A., porque um dos destinatários da mesma – na circunstância, T…, viúva de D… –, causando-lhe estranheza a carta em apreço, telefonou ao sócio-gerente da R., K…, questionando-o sobre o que era aquilo.
65. O A. enviou à R. em 29/10/2014 uma carta (constante, em cópia, a fls. 173 dos autos), datada de 28/10/2014, solicitando-lhe vários documentos, carta essa que a R. recebeu em 31/10/2014.
66. O sócio gerente da R., em resposta à carta que recebeu do A. em 31/10/2014, onde este lhe solicitava diversos documentos, respondeu por missiva datada de 05/11/2014, onde diz, além do mais, que “(…) nesta data entre V. Exa. e a C…, Lda. está a decorrer um processo disciplinar com intenção de despedimento por justa causa, estando V. Exa. suspenso. Até à data em que V. Exa. foi suspenso, teve livre acesso a toda a documentação referente à C…, Lda., com todo o tempo para cumprir as obrigações a que estava adstrito, pelo que não iremos fornecer a V. Exa. quaisquer documentos”.
67. A R. não forneceu ao A. quaisquer documentos, na sequência da carta enviada pelo A., nomeadamente os contractos de permuta alegadamente efectuados com a família U….
68. Após ter suspendido o A. de funções, a R. procurou um outro Contabilista, que exercesse as funções de TOC.
69. Só depois de ter sido proferida a decisão de despedimento do A. é que o Contabilista contactado pela R. assumiu funções.
70. Durante a suspensão do A., a R. nunca o substituiu por outro TOC.
71. Durante esse período de suspensão, o A. emitiu e enviou à Autoridade Tributária, em 19.08.2014, as declarações de retenções de IRS relativas à R. e reportadas ao mês de Julho de 2014 – que a R. aceitou e pagou.
72. A R., depois de suspender o A. e no decurso dessa suspensão, solicitou-lhe a confirmação de balancetes, respeitante a um período anterior à data da suspensão do A., tendo-lhe a R. pedido que os corrigisse – o que o A. não fez.
73. A R. pagou ao A. as respectivas retribuições, enquanto o mesmo esteve suspenso.
74. Em Julho de 2008, a R. pagou ao A. € 1.000,00, a título de subsídio de férias.
75. A R. pagou ao A. os proporcionais de férias, subsídio de férias e subsídio de Natal respeitantes ao ano de cessação e que se venceriam no ano de 2015, com base num vencimento de € 1.100,00.
76. O A. tinha grande liberdade e autonomia na marcação das suas férias, de acordo com as suas próprias conveniências.
77. Quando a R. tinha obras a executar e trabalhadores “de obra”, como pedreiros e ajudantes, o período normal de férias desses funcionários eram as últimas 3 semanas de Agosto de cada ano, uma semana pelo Natal, compreendendo sempre o Natal e a passagem de ano e ainda a Segunda-feira de Páscoa.
78. O A., que era o único funcionário a trabalhar no escritório da R., tanto podia gozar férias nesses dias, como noutros que lhe fossem mais convenientes.
79. O A. deixava sempre um ou dois dias de férias para ajudar os pais nas vindimas, o que a R. aceitava.
80. O A. assinou o recibo de vencimento de Janeiro de 2014.
81. O A., enquanto trabalhou para a R., frequentou algumas formações por iniciativa própria, e pelo menos uma promovida pela R., aquando da compra de software de Facturação/Gestão Cliente, em Fevereiro de 2011.
82. Quando estava ausente nas acções de formação, a R. não marcava falta ao A. e pagava-lhe a respectiva retribuição.
83. Do contrato de trabalho celebrado entre A. e R. consta que o horário de trabalho a praticar pelo A. é de 40 horas semanais e que “O descanso é ao domingo e o Complementar ao Sábado”.
84. Os trabalhadores da R. que prestavam funções nas obras, trabalhavam 9 horas diárias.
85. Pelo menos num sábado, de manhã, o A. prestou trabalho numa obra da R. em …, ajudando na reparação de varandas.
86. A R. nunca acusou o A. de não cumprir o horário de trabalho.
87. O sócio-gerente da R. tinha uma relação de confiança com o A..”.
*
O A., com a contestação, juntou o contrato de trabalho que, por escrito, celebrou com a Ré e a que se reporta o nº 3 dos factos provados, contrato esse que consta do documento que constitui fls. 277 e que não foi impugnado por esta.
Assim, adita-se à matéria de facto provada o nº 3-A, que passará a ter a seguinte redação:
3-A. O contrato referido no nº 3 dos factos provados foi celebrado por escrito, datado de 31.01.2007, que consta do documento que constitui fls. 277 dos autos, nele se referindo que: “1. O segundo outorgante é admitido ao serviço do primeiro outorgante a partir de 1 de Fevereiro de 2007 por tempo indeterminado. 2. O segundo outorgante desempenhará as funções inerentes à categoria profissional de Técnico de Contas. 3.O seu vencimento mensal ilíquido é de750,00€ acrescido do subsídio de alimentação previsto para o sector de actividade. 4. O horário de trabalho a praticar pelo trabalhador é de 40 horas semanais. 5. O descanso é ao Domingo e o Complementar ao Sábado. 6. O local de trabalho é no escritório da primeira outorgante, na Rua ..., em …, concelho de Aveiro. (…)”.
***
III. Da alegada extemporaneidade do recurso do A.

A Ré, recorrida no recurso interposto pelo A., alega que este é extemporâneo, para tanto e em síntese, dizendo que o recurso foi interposto no 2º dia útil após o termo do prazo para o efeito sem que tivesse sido paga a multa devida nos termos do art. 139º, nº 5, al. b), do CPC/2013.
Na 1ª instância, previamente ao despacho de admissão do referido recurso, foi proferida, aos 09.03.2016, decisão a considerar que o recurso foi interposto no 3º dia útil subsequente ao termo do prazo e, por consequência, a determinar o cumprimento do disposto no art. 139º, nº 6, do CPC, na sequência do que o A., aos 11.03.2016, juntou aos autos documento comprovativo da multa devida e liquidada pela 1ª instância, nos termos do citado art. 139º, nº 5, al. c), e c), do CPC/2013.
Dispõe o art. 139º, nº 5, que, independentemente de justo impedimento, o ato processual poderá ser praticado dentro dos três primeiros dias úteis subsequentes ao termo do prazo, ficando a sua validade dependente do pagamento da multa prevista nas alíneas desse número. E, por sua vez, determina o nº 6 desse preceito que “[p]raticado o ato em qualquer dos três dias úteis seguintes sem ter sido paga imediatamente a multa devida, logo que a falta seja verificada, a secretaria, independentemente de despacho, notifica o interessado para pagar a multa, acrescida de uma penalização de 25% do valor da multa, (…)”.
No caso, foi dado cumprimento, pela 1ª instância, ao disposto no citado art. 139º, nº 6, na sequência do que foi paga, pelo A./Recorrente, a multa nele prevista.
E, assim sendo, não é o recurso interposto pelo mesmo extemporâneo, mas sim tempestivo.
***
IV. Fundamentação

1. Salvas as matérias de conhecimento oficioso, o objeto do recurso é delimitado pelas conclusões formuladas pelo recorrente, não sendo lícito ao tribunal ad quem conhecer de matérias nelas não incluídas (arts. 635, nº 4, e 639º, nº 1, do CPC aprovado pela Lei 41/2013, de 26.06, aplicável ex vi do art. 1º, nº 2, al. a), do CPT aprovado pelo DL 295/2009, de 13.10).
Assim, são as seguintes as questões a apreciar:
Do recurso interposto pela Ré:
- Existência de justa causa para o despedimento do A. e, em caso de procedência de tal questão, das consequências daí decorrentes.
Do recurso interposto pelo A.:
- Alteração da decisão da matéria de facto [questão pela qual começaremos];
- Do pagamento de dias de férias não gozadas;
- Do trabalho suplementar;
- Do valor da indemnização de antiguidade;
- Do subsídio de férias de 2007.

2. Alteração da decisão da matéria de facto [recurso do Autor]

A parte que impugne a decisão da matéria de facto deverá dar cumprimento aos requisitos previstos no art. 640º, nºs 1 e 2, do CPC/2013.
O A. impugna a decisão da matéria de facto, fazendo-o por referência aos arts. 8, 10 e 150 a 153 da contestação. E, ainda que a propósito da quarta questão que suscita no recurso [valor da indemnização de antiguidade], acaba também por impugnar a matéria de facto, na medida em que alega que da prova produzida resulta que a Ré teria ao seu serviço menos de 10 trabalhadores [concretamente, 4 trabalhadores], pelo que deveria ser considerada como microempresa [para concluir que, tendo-se a Ré oposto à sua reintegração, a indemnização de antiguidade deveria ter tido em conta o disposto no art. 392º, nº 3, do CT/2009].
Conquanto a Recorrente não impugne a decisão da matéria de facto por referência aos concretos pontos dos factos dados como provados, entendemos, todavia, que deu cumprimento mínimo ao requisito previsto no art. 640º, nº 1, als. a) e c), [indicação dos concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados e sentido da decisão que deveria ter sido proferida], na medida em que o faz por referência aos artigos da contestação e /ou referindo o facto de que discorda e o que, em seu entender, resultaria da prova que invoca, percebendo-se a matéria de que discorda e o que, em seu entender, deveria ter sido decidido.
Por outro lado, conquanto, em relação a alguns dos pontos impugnados, misture argumentação de cariz essencialmente jurídico com a indicação dos meios de prova que, em seu entender, sustentariam diferente decisão, deu também cumprimento ao requisito previsto na al. b) do mesmo preceito, permitindo perceber os meios de prova e argumentação em que sustenta as alterações pretendidas, bem como cumpriu o requisito constante do seu nº 2, al. a), tendo indicado a prova testemunhal e documental que tem por pertinente e, quanto àquela, havendo indicado os concretos tempos de início e termo dos excertos dos depoimentos que invoca.
Quanto à impugnação tendo por objeto a matéria dos arts. 133 a 139 da contestação tem a mesma por fundamento, apenas, considerações de natureza jurídica, pelo que também sobre ela nos pronunciaremos.

2.1. Quanto ao art. 8º da contestação, a que se reporta o nº 6 dos factos provados, entende o Recorrente que o montante do subsídio de refeição é de €5,65 e não de €5,64, invocando “lapso/erro de leitura do Recibo de remunerações a fls 279, 470 e 471, onde se evidencia, sem margem para erro, que os € 5,64 se referem à quadrícula da remuneração hora. Sendo, no mesmo recibo, referido que o subsídio de refeição é de € 5,65 (4.270+1.380 = 5,65€)”.
Assiste razão ao Recorrente, como decorre dos recibos de remunerações invocados, designadamente do recibo de remuneração do A. referente ao mês de janeiro de 2014, junto pela própria Ré com o requerimento de 22-04.2015 como documento nº 5, resultando dos recibos que a referência a “5,64” se reporta à “R. Hora”, sendo que deles consta, a título de “Sub refeição s/d” e “Sub. Refeição c/d” as quantias de, respetivamente, €4,270 e €1,380, o que totaliza €5,65. Aliás, os €124,30 mensais a que se refere o nº 6 dos factos provados, se dividido por 22 dias úteis, totaliza €5,65 diários.
Assim, altera-se, nessa parte, o nº 6 dos factos provados, que passará a ter a seguinte redação:
6. O A. auferia a remuneração mensal base de € 1.100,00 (ilíquidos), a que acresciam € 5,65 por dia de subsídio de alimentação (rondando os € 124,30 mensais), perfazendo uma remuneração mensal média líquida de € 912,65.

2.2. Quanto ao art. 10 da contestação
O A. Recorrente invoca o art. 10º da contestação e pretende que seja dado como provado que a sua retribuição foi a seguinte: €1.000,00 a partir de junho de 2007; €1.100,00 a partir de janeiro de 2011; €1.300,00, a partir de setembro de 2011.
No art. 10 da contestação o A. refere o seguinte: “Na verdade o vencimento do A. foi sendo actualizado até que chegou à quantia de 1.300,00€.”.
Relativamente a esse artigo, na resposta à matéria de facto, o Mmº Juiz deu como provado que: “Art. 10º: Provado que o vencimento do A., desde que foi admitido na R., foi sendo aumentado, de tal forma que aquando da sua admissão era no valor de € 750,00, passando depois, ainda em 2007, para € 900,00; em 2008, para € 1.100,00; em 2013, para € 1.300,00; e em janeiro de 2014, para € 1.100,00”, facto este que passou a integrar os nºs 7 e 8 dos factos provados, com o seguinte teor: “7. O vencimento do A., desde que foi admitido na R., foi sendo aumentado, de tal forma que aquando da sua admissão era no valor (ilíquido) de € 750,00, passando depois, ainda em 2007, para € 900,00; em 2008, para € 1.100,00; e em 2013, para € 1.300,00. 8. A R., no mês de Janeiro de 2014, reduziu o salário do A. de € 1.300,00 para €1.100,00.”.
O Recorrente sustenta a alteração no depoimento de parte do legal representante da Ré e nas declarações de remunerações à Segurança Social (fls. 282/283), que correspondem ao documento nº 7 junto com a contestação, e nos mapas relativos aos quadros de pessoal de 2007 a 2009, juntos pela Ré aos 05.05.2015.
Desde logo, importa referir que, como se constata do art. 10º da contestação, o A., ao contrário do que deveria, não alegou a concreta evolução salarial que se foi verificando. Não obstante, a 1ª instância sobre ela se pronunciou, pelo que nada impede a reapreciação do que foi decidido pelo tribunal a quo.
Na fundamentação da decisão da matéria de facto, em relação ao facto ora em apreço foi referido que a resposta assentou “Nas declarações quanto a essa matéria prestadas pelo legal representante da R., K…, em sede de depoimento de parte.”.
Relativamente aos extratos de remunerações da Segurança Social que constam do documento nº 7 juntos com a contestação (fls. 282 /283) e a que o A./Recorrente se refere, deles constam apenas as remunerações relativas aos períodos de julho de 2009 até novembro de 2010 (constando a remuneração de €1.000,00), janeiro de 2011 a agosto de 2011 (constando a remuneração de 1.100,00€), de setembro de 2011 até abril de 2012 (constando a remuneração de €1.300,00) e de janeiro de 2014 até dezembro de 2014 (constando a remuneração de €1.100,00).
Relativamente aos quadros de pessoal juntos pela Ré com o requerimento de 05.05.2015 (fls. 497 a 505, 508 a 510), reportam-se eles aos anos de 2007, 2008, 2009, 2011 e 2013, constando as seguintes remunerações por referência ao mês de outubro de cada um desses anos: €1.000,00, em 2007; €1.000,00, em 2008; €1.000,00, em 2009; €1.300,00, em 2011 e €1.300,00, em 2013.
Da conjugação do que decorre dos mencionados documentos resulta que a seguinte evolução salarial: a partir de outubro de 2007 até dezembro de 2010, €1.000,00; €1.100,00 de janeiro a agosto de 2011; €1.300,00 de setembro de 2011 a dezembro de 2013 [a qual foi diminuída para €1.1000,00, em janeiro de 2014, como foi dado como provado, e não impugnado].

As declarações do legal representante da Ré não consubstanciam a confissão de facto que haja sido alegada pela A., sendo de salientar que a concreta evolução salarial não foi alegada pelo A., pelo que tais declarações estão sujeitas à livre apreciação do julgador, assim como o estão as declarações contidas nos extratos de remunerações e nos mapas de quadro de pessoal, pois que, na medida em que tais documentos têm como destinatário terceiro – a Segurança Social – elas não fazem prova plena da veracidade dos factos contidos nas declarações constantes desses documentos. Não obstante, e sem prejuízo do que se dirá quanto ao ano de 2007 (até setembro), não vemos qualquer razão para privilegiar as declarações do legal representante prestadas no julgamento em detrimento do que, então, foi declarado pela Ré nos mencionados documentos. No confronto, afiguram-se-nos mais fidedignos os factos contidos nas declarações constantes de tais documentos, também provenientes da ré, o que se salienta. E, isto, tendo em conta, por um lado, que tais documentos consubstanciam comunicações obrigatórias a entidades oficiais, não havendo razão para duvidar que, a cada uma das datas a que os mesmos se reportam, representassem a realidade do auferido pelo A. e, por outro, tendo em conta o tempo decorrido entre as datas em questão e as declarações prestadas pelo legal representante em julgamento, cuja memória poderá ser afetada pelo decurso do tempo.
Quanto ao período desde a admissão do A. até setembro de 2007, do contrato de trabalho consta ter sido acordada a retribuição mensal de €750,00. Por outro lado, o legal representante da Ré declarou que essa remuneração passou para 900€ no final de 2007 [e não já que tal tivesse ocorrido no 2º ou no 3º mês após a admissão como alega o A./Recorrente] e que, também em final desse ano, lhe pagou uma gratificação de €1.000,00. O pagamento desta quantia de €1.000,00 apenas em final de 2007 não é corroborado pelo que consta do quadro de pessoal da ré de 2007. Por outro lado, o pagamento de €900,00 logo no segundo ou terceiro mês (de 2007) não tem apoio na prova produzida.
Assim, altera-se o nº 7 dos factos provados, que passará a ter a seguinte redação:
7. O vencimento do A., desde que foi admitido na R., foi sendo aumentado, de tal forma que aquando da sua admissão era no valor (ilíquido) de € 750,00, passando depois a ser, pelo menos, de €1.000,00 mensais a partir de outubro de 2007 até dezembro de 2010; de €1.100,00 mensais de janeiro a agosto de 2011; de €1.300,00 mensais de setembro de 2011 a dezembro de 2013.
O nº 8 dos factos provados mantém-se inalterado [que aliás não foi impugnado].

2.3. Quanto aos arts. 133 a 139 da contestação
De tais artigos consta o seguinte:
“133.º
No ano de 2008 o A. não gozou 5 dias de férias a que tinha direito, tendo consequentemente os mesmos que lhe ser pagos, o que não aconteceu o que se computa no valor de 166,67€ (cento e sessenta e seis euros e sessenta e sete cêntimos).
134.º
No ano de 2009 o A. voltou a não gozar 5 dias de férias a que tinha direito, o que se computa no valor de 166,67€ (cento e sessenta e seis euros e sessenta e sete cêntimos).
135.º
No ano de 2010 o A. não gozou 3 dias de férias a que tinha direito, o que se computa no valor de 110,00€ (cento e dez euros).
136.º
No ano de 2011 o A. não gozou 6 dias de férias a que tinha direito, o que se computa no valor de 260,00€ (duzentos e sessenta euros).
137.º
No ano de 2012 o A. não gozou 7 dias de férias a que tinha direito, o que se computa no valor de 303,33€ (trezentos e três euros e trinta e três cêntimos).
138.º
No ano de 2013 o A. voltou a não gozar 7 dias de férias a que tinha direito, o que se computa no valor de 303,33€ (trezentos e três euros e trinta e três cêntimos).
139.º
No ano de 2014 o A. não gozou 5 dias de férias a que tinha direito, o que se computa no valor de 216,66€ (duzentos e dezasseis euros e sessenta e seis cêntimos).”.

A 1ª instância deu como não provada tal matéria, entendendo o A./Recorrente que a mesma deveria ser dada como provada, para o que alega que tal colide “com o estatuído no art. 127º, nº1, j), do CT, já que do mesmo resulta um dever da entidade patronal de “ Manter actualizado, em cada estabelecimento, o registo dos trabalhadores com indicação de nome, datas de nascimento e admissão, modalidade de contrato, categoria, promoções, retribuições, datas de início e termo das férias e faltas que impliquem perda da retribuição ou diminuição de dias de férias”. Sendo este um dever da entidade patronal, não pode considerar-se haver inversão do ónus da prova; e não tendo a entidade patronal, aqui Ré/Recorrida, como era seu dever, conseguido demonstrar o contrário do alegado pelo A/Recorrente, logo essa matéria terá que ser dada, necessariamente, como provada, com as consequências legais.”.

Como decorre do alegado pelo A./ Recorrente, este não fundamentou a alteração em qualquer meio de prova que haja, porventura, sido produzido, limitando-se a considerações de natureza jurídica, invocando o disposto no art. 127º, nº 1, al. j), do CT/2009 para concluir que competia à Ré o ónus da prova de que o A. teria gozado tais dias de férias.
Diga-se que, na lógica do A./Recorrente, não faz sentido o mesmo afirmar “que não pode considerar-se haver inversão do ónus da prova”. É que, porque constitutivo do direito de que se arroga titular, era ao A. que competia o ónus da prova do não gozo dos dias de férias (art. 342º, nº 1, do Cód. Civil) e não à Ré que competia o ónus da prova de que o A. as gozou, pelo que a afirmação, na sentença recorrida, de que é ao A. que compete o ónus da prova de não ter gozado os dias de férias não decorre de qualquer inversão do ónus da prova. Talvez o que o Recorrente pretendesse dizer ou, pelo menos, seria isso que poderia fazer sentido (em abstrato) seria precisamente o contrário, ou seja, que, por via do (eventual) incumprimento do disposto no art. 127º, nº 1, al. j), do CT/2009, haveria que se considerar invertido o ónus da prova.
Feita esta observação, prossigamos.
O referido pelo A., e o mais que é alegado, não consubstancia fundamentação suscetível de determinar, sem mais, a alteração da decisão da matéria de facto por inversão do ónus da prova, consubstanciando matéria de direito que adiante será apreciada, no âmbito da 2ª questão que constitui objeto do recurso do A.
As regras relativas à repartição do ónus da prova e à sua eventual inversão não significam que, perante a falta de prova de determinado facto, este, não obstante essa falta de prova, deva ser dado como provado. Se da prova produzida não resulta a prova da ocorrência de um determinado facto, este, naturalmente, não poderá ser dado como provado ao arrepio dessa falta de prova.
O que as regras relativas à repartição do ónus da prova significam, em termos de decisão da matéria de facto, é que a dúvida sobre a realidade de um facto deve ser decidida contra a parte a quem o facto aproveita (art. 414º do CPC/2013). E significam também, em termos de decisão de direito, que, perante a falta de prova de determinado facto, a causa deve ser julgada, conforme for de direito, contra a parte que estava onerada com a prova do facto correspondente.
Carece pois de fundamento a alegação do A./Recorrente de que, por causa do disposto no art. 127º, nº 1, al. j), do CT/2009, deva ser dado como provado que aquele não gozou os dias de férias que invoca.
Por outro lado, perante a falta de prova de que o A. não gozou tais dias de férias e mesmo que, porventura e como mera hipótese de raciocínio, se entendesse, ao abrigo do disposto no art. 344º, nº 2, do Cód. Civil, que haveria inversão do ónus da prova [já que o ónus da prova de tal facto impende sobre o trabalhador por ser constitutivo do seu direito – art. 342º, nº 2, do mesmo], a consequência não seria dar como provado que o A. não gozou esses dias de férias; a consequência seria, sim, em sede de decisão de direito, julgar em conformidade com a regra relativa à repartição do ónus da prova decorrente dessa (eventual) inversão, ou seja, julgar a causa como se o A. não tivesse gozado esses dias de férias uma vez que a Ré não teria logrado provar que aquele as teria gozado, prova essa que lhe competiria por virtude da inversão do ónus da prova,
Tais considerações não prejudicam, todavia, a livre apreciação do julgador, para efeitos probatórios, da recusa de colaboração devida pela parte, como decorre do disposto no art. 417º, nºs e e 2, do CPC/2013 [similar ao art. 519º, nº 2, do CPC revogado], nos termos do qual as partes têm o dever de prestar a sua colaboração para a descoberta da verdade, designadamente, respondendo ao que lhes for perguntado, facultando o que for requisitado e praticando os atos que forem determinados, sob pena de, sendo o recusante parte, o tribunal apreciar livremente a recusa para efeitos probatórios [sem prejuízo da possibilidade de inversão do ónus da prova a que se reporta o art. 344º, nº 2, do Cód. Civil e que acima acabámos de abordar].
E, no que se reporta à apreciação do comportamento da Ré para efeitos probatórios, nem tão pouco se poderá dizer que houve recusa de colaboração por parte da mesma, desde logo porque nem o A. requereu a notificação da Ré para junção aos autos dos elementos a que se reporta o art. 127º, nº 1, al. j), do CT/2009, nem o Tribunal ordenou a notificação da Ré para tal efeito.
Assim, no que se reporta aos alegados dias de férias não gozados, nada há a alterar quanto à decisão da matéria de facto.

2.4. Quanto aos arts. 150 e 153 da contestação:
Em tais artigos refere-se que:
“150.º. O A. desde a sua admissão que foi também ele obrigado a trabalhar as 9 horas diárias, fazendo a R. letra morta da lei e da CCT aplicável.”
153.º. O A. além do seu horário de trabalho, prestou ao longo dos anos horas de trabalho suplementar, nos termos do art.º 226.º do Ctrabalho, os quais não foram remunerados e assim discriminados:
a) Ano de 2007: 310,5 horas o que perfaz a quantia de 2862,70€
b) Ano de 2008: 345 horas o que perfaz a quantia de 3.182,62€
c) Ano de 2009: 346,5 horas o que perfaz a quantia de 3.196,46€
d) Ano de 2010: 342 horas o que perfaz a quantia de 3.660,54€
e) Ano de 2011: 345 horas o que perfaz a quantia de 3.916,47€
f) Ano de 2012: 354 horas o que perfaz a quantia de 4.136,00€
g) Ano de 2013: 358,5 horas o que perfaz a quantia de 3.704,50€
h) Ano de 2014: 189 horas o que perfaz a quantia de 1.953,00€
- cfr. DOCUMENTOS 29 a 36, idem”.
Alega o A./ Recorrente que da prova produzida decorre que entrava às 8h00 e saía, pelo menos, às 18h00, com período de almoço das 12h00 às 13h00, o que sustenta nos depoimentos de E…, F…, G…., H…, I… e J….
Mais diz que tinha a Ré a obrigação de proceder ao registo do trabalho suplementar, pelo que não deveria a sentença ter posto o encargo da prova da prestação de trabalho suplementar sobre o A.

2.4.1. Começando por esta última alegação, pelo que acima se disse quanto ao ónus da prova e sua inversão (ponto 2.3., a propósito da pretendida alteração da resposta dada aos arts. 133 a 139 da contestação), a apreciação dessa eventual inversão e o julgamento de direito da causa em função das regras de repartição do ónus da prova não deve ter lugar em sede de decisão da matéria de facto, pelo que adiante, em sede de direito, será apreciado.

Assim, o que, agora em sede de reapreciação da decisão da matéria de facto, importa apreciar é se a matéria constante dos arts. 150º e 153º deveria ter sido dada como provada.

2.4.2. Relativamente ao art. 150 da contestação, o mesmo foi dado como não provado e, quanto ao art. 153, foi a seguinte a resposta dada: “ Art. 153º: Provado apenas que pelo menos num sábado, de manhã, o A. prestou trabalho numa obra da R. em …, ajudando na reparação de varandas.”, resposta essa que veio a constituir o nº 85 dos factos provados.
E, na fundamentação da decisão da matéria de facto, consta o seguinte:
“- No que respeita a trabalho suplementar alegadamente prestado pelo A., embora a testemunha H… (que conhece o A., morando por cima do escritório onde este trabalhava) tenha dito que achava que viu o A. trabalhar algumas vezes ao sábado, não foi capaz de concretizar com o mínimo de certeza exigível quando é que isso terá acontecido, que trabalho o A. fazia e em que circunstâncias. O mesmo sucedendo em relação à testemunha J… (que também conhece o A. por ter comprado um apartamento naquele local, em 2007), que disse ter visto o A. no escritório, nalguns sábados, que não consegue situar no tempo, não sendo capaz de afirmar se estava ou não a trabalhar.”.

2.4.2.1. O A., na contestação, não alegou [ao contrário do que deveria, o que se consigna por dever de ofício] qual o seu concreto horário de trabalho, o que apenas veio a fazer no requerimento de 11.05.2015 (fls. 535/536) apresentado em “resposta” à junção de documentos pela Ré, conforme adiante melhor se dirá. No entanto, alegou o A., na contestação e em síntese que: nos termos do CCT que considera aplicável (CCT para a construção civil e obras públicas celebrado entre a AECOPS e outras, e a Federação Portuguesa dos Sindicatos da Construção, Cerâmica, Vidro e outras, in BTE 13, de 08.04.2005), o período normal de trabalho semanal era, para os trabalhadores administrativos, de 37h30m; que do contrato de trabalho, ao prever um período normal de trabalho semanal de 40 horas, logo decorre a existência da prestação de trabalho suplementar. Mais alegou que trabalhava 9 horas diárias e que prestou o número de horas de trabalho suplementar referidas no art. 153º da contestação, resultando dos denominados documentos 29 a 36, para os quais se remete nesse artigo [que mais não são do que uma listagem, por ano, dos dias e do correspondente número de horas – num total diário de 9 horas - de prestação de trabalho nesses dias], que o A. teria, de segunda a sexta-feira, trabalhado 9 horas diárias.
Ou seja, serve isto para concluir que o trabalho suplementar reclamado pelo A. não tem a ver com trabalho prestado ao sábado (dia de descanso complementar), mas sim de 2ª a 6ª feira, dias úteis. E, daí, que não deixe de nos causar alguma estranheza, o que se consigna por dever de ofício, a fundamentação da decisão da matéria de facto aduzida pela 1ª instância, já que, pelo menos ao que parece, reporta-se tão-só a trabalho suplementar prestado ao sábado, quando este nem sequer foi peticionado. E, por não ter sido reclamado o pagamento de trabalho suplementar eventualmente prestado ao sábado, é também irrelevante a reapreciação da decisão da matéria de facto no que a este se reporta. Atento o princípio do dispositivo, tal (eventual) trabalho (ao sábado) carecia de ser alegado e peticionado, o que não sucedeu. Assim, nunca poderia a sentença recorrida, nem, muito menos, a Relação, no recurso ora em apreço, condenar em qualquer quantia por esse (eventual) trabalho. Sendo proibida a prática de atos inúteis (art. 130º do CPC/2013), não se conhecerá da (eventual) prestação de trabalho suplementar ao sábado, limitando-se a reapreciação da decisão da matéria de facto ao alegado trabalho suplementar prestado em dias úteis.

2.4.3. Nos termos do disposto nos arts. 381º, nº 2, do CT/2003 e 337º, nº 2, do CT/2009, aplicáveis respetivamente, aos factos ocorridos até 16.02.2009 e a partir de 17.02.2009, os créditos resultantes da realização de trabalho suplementar vencidos há mais de cinco anos apenas podem ser provados por documento idóneo. Tendo embora o A., aos 28.01.2015, impugnado judicialmente a regularidade e licitude do despedimento através da ação especial prevista nos arts. 98º-C e segs do CPT, apenas com a apresentação da contestação [atenta a estrutura própria dessa ação especial e que, na ação de processo comum, equivale à petição inicial], aos 20.03.2015, é que veio a ser reclamado o pagamento de alegado trabalho suplementar, sendo esta a data por reporte à qual se deverá atender ao determinado nos citados arts. 381º, nº 2, e 337º, nº 2. Ou seja, tendo em conta os mencionados preceitos, o trabalho suplementar alegadamente prestado até 19.03.2010, apenas se prova por documento idóneo, podendo o prestado após 20.03.2010 ser provado por qualquer meio de prova.
No caso, está provado e encontra-se assente por meio de prova documental - contrato de trabalho escrito celebrado entre as partes e que consta do documento nº 1 junto com a contestação – que o período normal de trabalho semanal acordado entre as partes era o de 40 horas semanais (cfr. nº 83 dos factos provados). Aliás, é a própria Ré quem expressamente aceita, na resposta à contestação, que o período normal de trabalho diário seria o de 8 horas diárias, este o acordado entre as partes no contrato de trabalho (correspondente a 40 horas semanais) – cfr. art. 130º da resposta à contestação, no qual se refere que “(…) entre o Autor e a Ré foram convencionadas 8 horas de trabalho diárias, horas estas referidas no contrato de trabalho que o Autor aceitou e assinou sem reparo.”.
Ora, assim sendo e desde logo, afigura-se-nos, no que se reporta ao período anterior a 20.03.2010, que se encontra provado por documento idóneo que o período normal de trabalho semanal do A. era, pelo menos, o de 40 horas semanais, pelo que deverá ser aditada à matéria de facto provada o nº 88 com o seguinte teor:
88. Entre a data da sua admissão e até 19.03.2010, inclusive, o A., conforme convencionado com a Ré, prestou, pelo menos, 40 horas de trabalho semanal.
Quanto à prestação, nesse período, de 9 horas de trabalho diário não consta dos autos documento idóneo dessa alegada prestação, pelo que não poderá a mesma ser dada como provada.
2.4.4. No que se reporta à questão de saber se o A., no período desde 20.03.2010 (últimos cinco anos) prestava 9 horas de trabalho diário:
Na contestação, o A. requereu a notificação da Ré para juntar aos autos o registo do trabalho suplementar, junção essa que foi determinada por despacho de fls. 473. Em tal sequência, a Ré, por requerimento de 05.05.2015 (fls. 478 a 494), juntou o que denominou de “registo de horas mensais do Autor como funcionário da Ré”, registos esses a que se reportam os documentos de fls. 480 a 493 referentes aos meses de agosto de 2013 a setembro de 2014 e de onde constam como horas de entrada e saída: “Entrada – 8h00; Saída – 12h00; Entrada – 13h30; Saída – 18h00”.
Notificado de tais documentos, o A. veio impugná-los [requerimento de 11.05.2015, fls. 536/537] dizendo que: tais documentos foram preenchidos pelo legal representante da Ré, com a sua caligrafia e com os dizeres que entendeu; o horário efetivamente praticado pelo A. era das 8h00 às 12h00 e das 13h00 às 18h30; que o que foi ordenado à Ré foi que juntasse aos autos o registo do trabalho suplementar, o que não aconteceu.
Não obstante a referida impugnação do A., do confronto entre o que consta de tais documentos e da posição do A. retira-se que estão ambos em consonância no que se reporta às horas de entrada e saída no período da manhã, ou seja, entrada às 8h00 e saída às 12h00, radicando a divergência apenas na hora de entrada e saída no período da tarde: segundo os documentos o A. entraria às 13h30, enquanto que o A. afirma que era às 13h00 e, sairia às 18h00, enquanto que o A. afirma que seria às 18h30.
Ou seja, do referido poder-se-á extrair como assente que o A., no período da manhã, entrava às 8h00 e saía às 12h00 e que, no período da tarde, entrava pelo menos às 13h30 e saía pelo menos às 18h00 [salienta-se que o horário invocado pelo A. no requerimento de fls. 536/537 nem está sequer em consonância com o número de horas de trabalho diárias que, segundo o próprio A., seriam por ele prestadas, já que o que invocou na contestação foram 9 horas diárias e não 9h30].
Procedeu-se também à audição integral dos depoimentos prestados pelas testemunhas invocadas pelo Recorrente [E… e F…, testemunhas comuns, G…, H…, I… e J…, estas arroladas pelo A]. De referir que os depoimentos de E…, F…, H… e J… foram também invocadas pela Recorrida nas contra-alegações.
E…, pedreiro, trabalhou para a Ré de 1998 a junho de 2013, tendo afirmado, em síntese, que: o seu, da testemunha, horário de trabalho era das 8h00 às 12h00, e das 13h00 às 18h00; de manhã, saía das instalações da Ré para as obras cerca das 8 horas, que não via o A. e que não sabia a que horas este entrava ao trabalho, nem podendo garantir se, quando a testemunha saía, às 8h00, o A. já teria ou não chegado.
F…, servente, trabalhou para a Ré cerca de 8 anos, tendo saído em julho de 2013, afirmou, em síntese, que: o seu, da testemunha, horário de trabalho era das 8h00 às 12h00 e das 13h00 às 18h00; a última obra foi em Aveiro, durante cerca de um ano, ano e meio, até que cessou o seu contrato; ia buscar a carrinha às instalações da Ré cerca das 7h30, encontrando o gerente desta, mas não vendo o A., pelo que não pode garantir que o A. lá estivesse às 8h00; quando, no regresso, trazia a carrinha, cerca das 18h00 e “qualquer coisa”, 18h30, o A. estava no escritório, “era o que via”.
G…, pedreiro, trabalhou na Ré de 2005 até junho de 2013, referiu, em síntese, que: o seu, da testemunha, horário de trabalho era das 8h00 às 12h00 e das 13h00 às 18h00; aquando das obras em …, saíam pelas 7h30, pelo que a essa hora não chegou a ver o A.; mas, quando trabalhavam em …, durante cerca de 4, 5 anos, o A. chegava cerca das 8h00, o que por vezes via e que ele (A.) ia muitas vezes, cerca dessa hora, levar a marmita ao local, nas instalações da Ré, onde almoçavam; o A. estava no escritório até depois das 18h00, quando os trabalhadores regressavam das obras era o A. quem muitas vezes abria o portão; quando os trabalhadores iam para as obras em … e … encontravam-se [os trabalhadores das obras] no estaleiro [na obra de Aveiro a testemunha ia diretamente para a obra].
H…, conhece o A. e a Ré por as instalações desta se situarem no mesmo prédio (andar de baixo) onde a testemunha reside desde, pelo menos, 2002, referiu, em síntese, que: a testemunha sai para o trabalho por volta das 8h30, vendo por vezes o A., mas não podendo dizer que o via sempre; assim como, quando chegava a casa, entre as 18h00 e as 19h00, por vezes também via o A..
I…., trabalhou para a Ré de 1988 a junho de 2013 [tendo tido um processo contra a Ré, em relação a quem ainda “guarda ressentimento”], referiu em síntese que: o seu (da testemunha) horário de trabalho era das 8h00 às 12h00 e das 13h00 às 18h00, mas tinham (reportando-se aos trabalhadores das obras) que chegar antes das 8h00 e entregavam as ferramentas depois das 18h00; não pode garantir que o A., todos os dias, entrasse às 8h00 pois que iam para as obras, mas viu muitas vezes o A. a chegar de manhã, pelas 8h00 e, bem assim, que também estava no escritório depois das 18h00, o que viu quer porque, nalgumas situações, quando chegavam das obras e, noutras, quando a testemunha passava pelas instalações a caminho de casa. Tiveram obras em …, depois em … e Aveiro.
J…, conhece o A. e a Ré porque comprou, em 2007, um apartamento a esta, apartamento esse que se situa no mesmo prédio das instalações da Ré e, embora não residindo lá, a ele por vezes se deslocava. Referiu, em síntese, que o horário de trabalho do A. era das 8h00 às 12h00 e das 13h00 às 19h00, que “toda a gente” sabe qual era o horário de trabalho do A., que esteve afixado na porta de entrada do escritório, durante sete anos, o horário das 8h00 às 12h00 e das 13h00 às 19h00, que “só um cego que não passa lá é que não vê que esse horário estava lá” e que agora é que a Ré o retirou de lá.

À exceção de E…, que nada adiantou por alegadamente nada saber, a conjugação dos demais depoimentos é no sentido, também, da corroboração de que o A., de manhã, entrava às 8h00 e à tarde não sairia antes das 18h00. Não obstante, quanto à concreta hora de saída, depois das 18h00, não são os mesmos suficientemente concludentes e precisos, designadamente se tal ocorreria às 18h30, pelo que apenas se poderá dar como provado que o A. saía, pelo menos, às 18h00. Aliás, esta é a pretensão do A. no recurso.
Quanto ao período do almoço, pese embora o horário das testemunhas fosse das 12h00 às 13h00, no que se reporta ao concreto horário do A., dos depoimentos das testemunhas E…, F…, G… e I…, não resulta, ao menos com a necessária segurança, se no período da tarde a hora de entrada do A. seria às 13h00 ou às 13h30. As testemunhas reportavam-se, no essencial, ao seu (das testemunhas) horário de almoço, tanto mais que elas também prestavam trabalho em obras, designadamente fora de …. Assim, apenas se poderá dar como provado que o A. saía às 12h00 e entrava (no período da tarde) às, pelo menos, 13h30.
Por sua vez, H… não era trabalhador da ré, saindo de casa pelas 8h30 e regressando ao fim da tarde, assim desconhecendo o período de almoço do A.
Há que dizer, quanto ao depoimento de J… que, embora ele se tenha referido à afixação na porta do escritório da ré do horário das 8h00 às 12h00 e das 13h00 às 19h00, afigura-se-nos que tal horário reportar-se-á ao horário de funcionamento dos escritórios e não já, necessariamente, ao horário de trabalho do A., que são realidades distintas. Não faz sentido, nem está de acordo com as regras da experiência comum, que, à porta dos escritórios, estivesse afixado o horário de trabalho do A.; o que é normal e faz sentido é a afixação do horário de funcionamento. Até porque nem o próprio A. alegou que o seu horário de saída fosse às 19h00.
Tendo ainda presente o que a Ré alega, designadamente, quanto à credibilidade das testemunhas, refira-se o seguinte:
Em relação ao depoimento de I…, desvalorizado pela Recorrida dado o mesmo ter declarado que mantinha ressentimento em relação a esta, há que dizer que tal ressentimento não está patente no depoimento que prestou, o qual, ao cabo e ao resto, está em consonância com o prestado pelos seus demais colegas de trabalho; para além de que não é ele o único que sustenta o relatado.
Quanto ao depoimento de E… sobre o horário efetivamente praticado pelo A., o que nos pareceu, no essencial, foi a sua intenção de não se comprometer com a posição do A. De todo o modo, ele não contraria o referido pelas demais testemunhas na medida em que, no essencial, o que dele resulta é que não sabia a que horas chegava o A., alegando que saía para as obras por volta das 8h00 e que não o via.
Resta dizer que, tendo em conta que o sócio gerente da Ré estava, de manhã, presente (como disse E…, quando este chegava `de manhã e antes de sair para as obras só via o sócio gerente) e que, saindo o A. às 18h00, é de concluir que o referido sócio gerente não poderia deixar de ter conhecimento do horário praticado pelo A. e bem assim, que a ele não se opôs. Aliás, esse conhecimento decorre dos registos que a própria Ré juntou com o requerimento de fls. 478 e segs. E decorre também das regras da experiência comum, que o empregador, no caso a Ré, não desconhece o horário de trabalho efetivamente praticado pelo trabalhador, tanto mais em empresa em que existe uma relação de proximidade física entre o local onde o trabalhador e o legal representante desempenham as respetivas atividades (no caso, nas próprias instalações da empresa).
Assim, e em conclusão, afigura-se-nos ser de aditar à matéria de facto provada o nº 89, com o seguinte teor:
89. Pelo menos desde 20.03.2010, o A., com o conhecimento da Ré, e sem oposição desta, no período da manhã, entrava às 8h00 e saía às 12h00 e, no período da tarde, entrava, pelo menos, às 13h30 e saía, pelo menos, às 18h00, de segunda a sexta feira.

2.5. Alega o A. que a Ré tinha 4 trabalhadores, o que sustenta nas declarações do legal representante da Ré (32:24 a 32:42) e nos documentos 5 e 6 juntos com a contestação.
A dimensão da empresa para efeitos da sua classificação como micro, pequena, média ou grande empresa constava do 91º do CT/2003 a que corresponde, no CT/2009, o art. 100º. E, como microempresa, considera-se, nos termos do nº 1 das referidas normas, a empresa que empregar no máximo 10 trabalhadores (CT/2003) e a que emprega menos de 10 trabalhadores (na redação do CT/2003), dispondo o nº 2 de ambos os preceitos que, para efeitos do número anterior, o número de trabalhadores é calculado com recurso à média do ano civil antecedente.
No excerto do depoimento indicado, o legal representante da Ré, a propósito da redução da retribuição do A., limitou-se a dizer que em janeiro de 2014 a retribuição de todos os 4 trabalhadores foi reduzida. Ora, tal é manifestamente insuficiente para a determinação do número médio de trabalhadores, seja no ano de 2014, seja no ano antecedente, 2013.
Quanto aos documentos invocados, são eles também insuficientes. Os documentos nºs 5 e 6 – estes os invocados pelo A./Recorrente - juntos com a contestação são elaborados pela Ré e reportam-se, segundo a sua designação, a “Recolha de elementos para processamento de salários relativos a Janeiro de 2014” e “Recolha de elementos para processamento de salários relativos a Janeiro de 2015”, de onde constam os nomes de 4 pessoas, entre os quais o A., sendo datados de 27 de fevereiro dos anos de 2014 e 2015 e encontrando-se assinados pela Ré. Tratam-se, desde logo e sem necessidade de considerações adicionais, de documentos que não reportam o número médio de trabalhadores nos anos de 2013 e de 2014 (nem de 2015).
Acrescente-se que o facto em causa não foi, sequer, alegado por qualquer das partes.
Assim, e nesta parte, improcede o aditamento pretendido.

2.6. Sintetizando, são as seguintes as alterações que se introduzem à matéria de facto provada:
- Aditamento do nº 3-A, com redação:
3-A. O contrato referido no nº 3 dos factos provados foi celebrado por escrito, datado de 31.01.2007, que consta do documento que constitui fls. 277 dos autos, nele se referindo que: “1. O segundo outorgante é admitido ao serviço do primeiro outorgante a partir de 1 de Fevereiro de 2007 por tempo indeterminado. 2. O segundo outorgante desempenhará as funções inerentes à categoria profissional de Técnico de Contas. 3.O seu vencimento mensal ilíquido é de750,00€ acrescido do subsídio de alimentação previsto para o sector de actividade. 4. O horário de trabalho a praticar pelo trabalhador é de 40 horas semanais. 5. O descanso é ao Domingo e o Complementar ao Sábado. 6. O local de trabalho é no escritório da primeira outorgante, na Rua …, em …, concelho de Aveiro. (…)”.
- Alteração do nº 6 dos factos provados, que passará a ter a seguinte redação:
6. O A. auferia a remuneração mensal base de € 1.100,00 (ilíquidos), a que acresciam € 5,65 por dia de subsídio de alimentação (rondando os € 124,30 mensais), perfazendo uma remuneração mensal média líquida de € 912,65.
- Alteração do nº 7 dos factos provados, que passará a ter a seguinte redação:
7. O vencimento do A., desde que foi admitido na R., foi sendo aumentado, de tal forma que aquando da sua admissão era no valor (ilíquido) de € 750,00, passando depois a ser, pelo menos, de €1.000,00 mensais a partir de outubro de 2007 até dezembro de 2010; de €1.100,00 mensais de janeiro a agosto de 2011; de €1.300,00 mensais de setembro de 2011 a dezembro de 2013.
- Aditamento do nº 88, com a seguinte redação:
88. Entre a data da sua admissão e até 19.03.2010, inclusive, o A., conforme convencionado com a Ré, prestou, pelo menos, 40 horas de trabalho semanal.
- Aditamento do nº 89, com a seguinte redação:
89. Pelo menos desde 20.03.2010, o A., com o conhecimento da Ré, e sem oposição desta, no período da manhã, entrava às 8h00 e saía às 12h00 e, no período da tarde, entrava, pelo menos, às 13h30 e saía, pelo menos, às 18h00, de segunda a sexta feira.

3. Da existência de justa causa para o despedimento e, em caso de procedência de tal questão, das consequências daí decorrentes [recurso interposto pela Ré]:

Na sentença recorrida considerou-se que não existia justa causa para o despedimento do A., razão pela qual se julgou o despedimento ilícito e se condenou a Ré nas consequências legais decorrentes dessa ilicitude (indemnização de antiguidade e retribuições intercalares).
Discordando, entende a Ré/Recorrente, pelas razões que profusamente alega, que existe justa causa para o despedimento. Mais invoca, como segunda questão a decidir, a relativa à alteração da decisão recorrida em consequência da procedência do seu recurso quanto àquela 1ª questão.
Diga-se, quanto a esta denominada 2ª questão, que ela não mais é do que uma “extensão” da 1ª, consubstanciando-se, em caso de (eventual) procedência desta, nas consequências legais que necessariamente se terão que extrair da existência de justa causa do despedimento (revogação da sentença na parte em que condenou a Ré nas consequências legais do despedimento que considerou ilícito).

3.1. Dispõe o artº 351º, nº 1, do CT/2009 que constitui justa causa do despedimento “o comportamento culposo do trabalhador que, pela sua gravidade e consequências, torne imediata e praticamente impossível a subsistência da relação de trabalho”, elencando-se no nº 2, a título exemplificativo, comportamentos suscetíveis de a integrarem: designadamente a desobediência ilegítima às ordens dadas por responsáveis hierárquicos [al. a)], a violação de direitos e garantias de trabalhadores da empresa [al. b)], a provocação repetida de conflitos com trabalhadores da empresa [al. c)], o desinteresse repetido pelo cumprimento, com a diligência devida, de obrigações inerentes ao exercício do cargo ou posto de trabalho a que está afeto [al. d)]; lesão de interesses patrimoniais sérios da empresa [al. e)]; (…); e a prática, no âmbito da empresa, de violências físicas, injúrias ou outras ofensas punidas por lei sobre trabalhador da empresa, elemento dos corpos sociais ou empregador individual não pertencente a estes, seus delegados ou representantes [al. i)]; (...)”.
É entendimento generalizado da doutrina e jurisprudência[3] que são requisitos da existência de justa causa do despedimento: a) um elemento subjetivo, traduzido no comportamento culposo do trabalhador violador dos deveres de conduta decorrentes do contrato de trabalho; b) um elemento objetivo, nos termos do qual esse comportamento deverá ser grave em si e nas suas consequências, de modo a determinar (nexo de causalidade) a impossibilidade de subsistência da relação laboral, reconduzindo-se esta à ideia de inexigibilidade da manutenção vinculística[4].
Quanto ao comportamento culposo do trabalhador, o mesmo pressupõe um comportamento (por ação ou omissão) imputável ao trabalhador, a título de culpa, que viole algum dos seus deveres decorrentes da relação laboral.
O procedimento do trabalhador tem de ser imputado a título de culpa, embora não necessariamente sob a forma de dolo; se o trabalhador não procede com o cuidado a que, segundo as circunstâncias está obrigado e de que era capaz, isto é, se age com negligência, poderá verificados os demais requisitos, dar causa a despedimento com justa causa (Abílio Neto, in Despedimentos e contratação a termo, 1989, pág. 45).
Porém, não basta um qualquer comportamento culposo do trabalhador, mostrando-se necessário que o mesmo, em si e pelas suas consequências, revista gravidade suficiente que, num juízo de adequabilidade e proporcionalidade, determine a impossibilidade da manutenção da relação laboral, justificando a aplicação da sanção mais gravosa.
Com efeito, necessário é também que a conduta seja de tal modo grave que não permita a subsistência do vínculo laboral, avaliação essa que deverá ser feita, segundo critérios de objetividade e razoabilidade, segundo o entendimento de um bom pai de família, em termos concretos, relativamente à empresa, e não com base naquilo que a entidade patronal considere subjetivamente como tal, impondo o art. 351º, n.º 3, que se atenda ao quadro de gestão da empresa, ao grau de lesão dos interesses da entidade empregadora, ao caráter das relações entre as partes ou entre o trabalhador e os seus companheiros e às demais circunstâncias que ao caso se mostrem relevantes.
Quanto à impossibilidade prática de subsistência da relação laboral, a mesma verifica-se por deixar de existir o suporte psicológico mínimo para o desenvolvimento da relação laboral, quando se esteja perante uma situação de absoluta quebra de confiança entre a entidade patronal e o trabalhador, de tal modo que a subsistência do vínculo laboral representaria uma exigência desproporcionada e injusta, mesmo defronte da necessidade de proteção do emprego, não sendo no caso concreto objetivamente possível aplicar à conduta do trabalhador outras sanções, na escala legal, menos graves que o despedimento.
Diz Monteiro Fernandes, in Direito do Trabalho, 8ª Edição, Vol. I, p. 461, que se verificará a impossibilidade prática da manutenção do contrato de trabalho “sempre que não seja exigível da entidade empregadora a manutenção de tal vínculo por, face às circunstâncias concretas, a permanência do contrato e das relações pessoais e patrimoniais que ele implica, representem uma insuportável e injusta imposição ao empregador.”
E, conforme doutrina e jurisprudência uniforme, tal impossibilidade ocorrerá quando se esteja perante uma situação de absoluta quebra de confiança entre a entidade patronal e o trabalhador, porquanto a exigência de boa-fé na execução contratual (arts. 126º, nº 1, do CT/2009 e 762º do C.C.) reveste-se, nesta área, de especial significado, uma vez que se está perante um vínculo que implica relações duradouras e pessoais.
Assim, sempre que o comportamento do trabalhador seja suscetível de ter destruído ou abalado essa confiança, criando no empregador dúvidas sérias sobre a idoneidade da sua conduta futura, poderá existir justa causa para o despedimento. Como se diz no Acórdão do STJ de 03.06.09 (www.dgsi.pt, Processo nº 08S3085) existe tal impossibilidade quando ocorra uma situação de absoluta quebra de confiança entre o empregador e o trabalhador, susceptível de criar no espírito do primeiro a dúvida sobre a idoneidade futura da conduta do último, deixando de existir o suporte psicológico mínimo para o desenvolvimento dessa relação laboral.
O apontado nexo de causalidade exige que a impossibilidade da subsistência do contrato de trabalho seja determinada pelo comportamento culposo do trabalhador.
Importa, também, ter em conta de entre o leque de sanções disciplinares disponíveis, o despedimento representa a mais gravosa, por determinar a quebra do vínculo contratual, devendo ela mostrar-se adequada e proporcional à gravidade da infração.
Por fim, dispõe o art. 128º, nº 1, que constituem deveres do trabalhador os de respeitar e tratar o empregador, os superiores hierárquicos, os companheiros de trabalho e as pessoas que se relacionem com a empresa com urbanidade e probidade [al. a)], realizar o trabalho com zelo e diligência [al. c)] e cumprir as ordens e instruções do empregador respeitantes a execução ou disciplina do trabalho, que não sejam contrárias aos seus direitos e garantias [al. e)]; guardar lealdade ao empregador, nomeadamente não negociando por conta própria ou alheia em concorrência com ele, nem divulgando informações referentes à sua organização, métodos de produção ou negócios [al. f)].
O dever de respeito e de urbanidade prende-se com a necessidade de observância de regras de conduta social adequadas em matéria de tratamento e conduta do trabalhador, consubstanciadas num dever de tratamento cordato designadamente a nível de linguagem verbal e gestual e devendo o mesmo ser apreciado tendo presente o contexto empresarial em que se desenvolve o vínculo laboral[5].
O dever de lealdade, genérica e sumariamente, para o que importa ao recurso, impede a prática, pelo trabalhador, de atos lesivos ou prejudiciais à empresa, designadamente os que afetem a sua boa imagem e credibilidade perante os clientes da mesma.

3.2. Na sentença recorrida entendeu-se não existir justa causa de despedimento do A., tendo-se, para tanto, referido o seguinte:
«Regressando à situação que nos ocupa, dos factos invocados para sustentar a decisão de despedimento, provou-se apenas, com relevo para o caso:
- Quanto às expressões vertidas na resposta à nota de culpa apresentada pelo A. no âmbito do anterior procedimento disciplinar, instaurado pela R. em 11 de Setembro de 2014, que da referida resposta à nota de culpa consta:
82. “Desde algum tempo que o Sr. K… em concluo com a sua filha, também ela sócia da C…, Lda., vinham fazendo pressão constante com o arguido com o intuito de que aquele se despedisse, chegando ao ponto de terem comprado três cabras e deixa-las soltas no sítio onde o arguido tinha que passar para chegar ao contentor onde tomava as suas refeições, pretendendo afecta-lo psicologicamente pois tinha que passar por cima dos dejectos dos animais, ficando com um cheiro nauseabundo”.
84. “E do incómodo causado à P… e à Q… com os proprietários e os clientes a queixarem-se constantemente”.
129. “Se por algum motivo os mesmos (os dados da empresa) estavam incorrectos é porque alguém, possivelmente que não sabia trabalhar como o programa, foi mexer no mesmo depois do último dia efectivo de trabalho do arguido e o desconfigurou”.
131. “Alguém, que não o arguido, andou a tentar usar o programa, desconfigurou-o e tornou necessário o auxílio de um técnico”.
151. “Ou seja, depois do último dia de trabalho do arguido já diversas pessoas utilizaram o programa para fins inclusive que não deviam”.
153. “Pelo que se por algum motivo o programa se encontra desconfigurado, o que o arguido desconhece e só avença devido ao que está na nota de culpa, tal se deve à má utilização efectuada depois do último dia de trabalho do arguido”.
169. “Nomeadamente devido ao facto de várias pessoas terem acesso ao software e poderem efectuar alterações às bases de dados sem o conhecimento do arguido”.
201. “Salvo alteração do nome da pasta ou eliminação de que a mesma tenha sido alvo uma vez que o computador da recepção não tem password de acesso, toda a gente acede como utilizador geral e os documentos estão partilhados na rede”.
178. “Não basta o sócio-gerente dizer se deve ou não deve, tem que apresentar documentos que comprovem tais factos pelo que todos os balancetes analíticos e sintéticos, até ao último dia de trabalho do arguido se encontravam correctos e de acordo com os documentos contabilísticos que lhe haviam sido facultados”.
183. “Pelo exposto, a existirem diferenças entre as facturas, os extractos bancários e os cheques emitidos devem-se certamente às razões supra elencadas, oriundas de pagamentos efectuados em períodos posteriores aos que foram relevados na contabilidade, salvo erro, omissão ou até mesmo ocultação de documentos a que o arguido tenha estado sujeito”.
- E em relação aos actos praticados pelo A. no decurso da suspensão preventiva que lhe foi comunicada pela R. em 12/08/2014, no âmbito do anterior procedimento disciplinar:
Que pelo menos até à semana anterior a 07/08/2014, o A. teve acesso no seu local de trabalho, que era o escritório da R., a toda a documentação contabilística referente à empresa (visto que o acesso ao local de trabalho lhe terá sido vedado alguns dias antes da suspensão); que o A tinha conhecimento das “passwords” da R. de acesso à Segurança Social e à Autoridade Tributária; que o A. emitiu/imprimiu a guia para pagamento da 2ª prestação do Pagamento Especial por Conta enquanto se encontrava suspenso das suas funções de TOC da R. e acedendo à área pessoal da R. nas Finanças, através da “password” (palavra passe) da R., sem conhecimento, ordem ou consentimento desta; e que o A., durante o período em que se encontrava suspenso, enviou uma carta dirigida a “D… e Outra”, datada de 18 de Outubro de 2014, remetida em 19/11/2014 e recebida em 20/11/2014, com teor transcrito no n.º 62º dos factos provados.
Salvaguardando o respeito devido por diferente entendimento, parece-nos que tais factos não são de molde a justificar a existência de justa causa no despedimento do A..
Com efeito, no que se refere às expressões utilizadas na resposta à nota de culpa, importa preliminarmente salientar que foram produzidas em articulado subscrito também por mandatários/advogados constituídos pelo A. e no específico contexto do exercício de direito de defesa em relação a factos de que o A. era acusado na nota de culpa proferida no âmbito de um procedimento disciplinar instaurado pela R. com vista ao seu despedimento, estando directamente relacionadas com as acusações que nessa nota da culpa lhe eram dirigidas (cfr. cópia da nota de culpa de fls. 302 a 317) – com excepção dos pontos 82 e 83, onde o A. pretende ilustrar a ideia de que o gerente da R. e a filha deste o vinham pressionando para que se despedisse, alegando que para isso chegaram a comprar três cabras, deixando-as à solta no sítio onde passava para tomar as refeições, pretendendo afectá-lo psicologicamente e causando incómodo e queixas de dois estabelecimentos vizinhos.
Ou seja, sendo verdadeiras ou falsas, não se trataram de afirmações puramente gratuitas, feitas sem qualquer causa que justificasse a sua produção, nada permitindo concluir que, como defende a R., tiveram como única finalidade denegrir a imagem e bom nome da sociedade e do seu sócio-gerente e criar uma imagem, para terceiros, de uma empresa negligente na sua actividade económica. Tanto mais que (como se faz notar na contestação/reconvenção) o procedimento disciplinar não é em princípio público, não tendo o teor das declarações nele prestadas que ser conhecido por terceiros alheios ao procedimento, nem sendo suposto que o seja. Sem que se tenha neste caso provado que mais alguém para além das partes e do instrutor do procedimento tiveram conhecimento do teor da resposta à nota de culpa apresentada pelo A..
De resto, o art. 355º n.º 1, ao estabelecer que o trabalhador, na resposta à nota de culpa, pode deduzir por escrito “(…) os elementos que considera relevantes para esclarecer os factos e a sua participação nos mesmos (…)”, confere uma assinalável latitude ao direito de defesa do trabalhador, que não nos parece ter sido excessivamente ultrapassado pelo A., porque mesmo a inusitada história das cabras é (mal ou bem) invocada como exemplo da alegada pressão de que o A. diz ter sido alvo para se despedir, não sendo como tal algo de absolutamente alheio ao que se discutia no procedimento disciplinar.
Sendo certo que nada se provou em julgamento, no que se refere à veracidade (ou falta dela) do que é dito nas transcritas passagens da resposta à nota de culpa.
Salientando-se que o que aqui importa não é saber o que as pessoas ouvidas no procedimento disciplinar nele disseram e o que é que o instrutor entendeu da prova nele produzida (cfr. factos provados n.ºs 31, 32, 33, 36, 37 e 39), pois como se escreveu no acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 12/10/2011[6], para efeitos de apreciação judicial da regularidade e licitude do despedimento, o que conta é a prova que se produz no âmbito da respectiva acção, não cumprindo ao tribunal “(…) apreciar se, no âmbito do processo disciplinar, foi feita a prova dos factos imputados ao trabalhador na nota de culpa, cabendo-lhe apenas apreciar a prova produzida no âmbito do processo judicial, ou seja, em audiência de discussão e julgamento, devendo para o efeito as partes indicarem as respectivas provas”.
Também não nos parece que os actos praticados pelo A. no decurso da suspensão preventiva que lhe foi comunicada pela R. no âmbito do anterior procedimento disciplinar, por si só ou conjugados com as ditas expressões produzidas na resposta à nota de culpa, encerrem em si mesmo e nas suas consequências, uma gravidade tal que justifique a aplicação ao A. da sanção disciplinar máxima, de entre as previstas na lei.
Na verdade, o que se apurou a tal respeito foi que o A., no decurso da referida suspensão preventiva de funções, emitiu/imprimiu guia para pagamento pela R. da 2ª prestação do Pagamento Especial por Conta (PEC), acedendo para tanto à área pessoal da R. nas Finanças, através da “password” da R., sem conhecimento, ordem ou consentimento desta; e enviou uma carta (com o teor que consta do n.º 62 dos factos provados) a solicitar a terceiros, contractos por estes elaborados com a R., invocando para tanto a qualidade de contabilista desta, sem mencionar estar suspenso e indicando ter em vista verificar a conformidade de declarações que certificou, com base em elementos fornecidos pela R..
A suspensão preventiva de funções, prevista no art. 354º, pode ser imposta pela entidade empregadora, quando a presença do trabalhador na empresa se mostre inconveniente, implicando em princípio, por natureza, que o trabalhador deixe de prestar o seu trabalho, mantendo no entanto o direito à retribuição.
Casos há porém em que as especificidades inerentes às funções desempenhadas pelo trabalhador suspenso podem colidir com a total inactividade que essa suspensão implica, gerando situações de potencial dúvida acerca daquilo que é legítimo ou não o trabalhador fazer, em determinadas circunstâncias.
O que o A. defende é que emitiu as guias porque mesmo suspenso de funções, a sua qualidade de TOC implica que existam actos que não pode deixar de praticar, sob pena de incorrer em responsabilidade pessoal, incluindo pelo pagamento de multas e coimas de natureza fiscal, em resultado da falta ou entrega extemporânea de declarações fiscais que está adstrito a entregar. Sendo também nesse contexto que pediu documentação de conciliação contabilística a “D… e outra” – que antes tinha solicitado à R., que não lhos facultou.
Nos termos do art. 6º n.º 1 do Estatuto da Ordem dos Técnicos Oficiais de Contas (EOTOC)[7], são atribuídas aos TOC, entre outras, as funções de “b) Assumir a responsabilidade pela regularidade técnica, nas áreas contabilística e fiscal”, das entidades que possuam ou devam possuir contabilidade regularmente organizada; c) Assinar, conjuntamente com o representante legal das referidas entidades, “(…) as respectivas demonstrações financeiras e declarações fiscais, fazendo prova da sua qualidade, nos termos e condições definidos pela Ordem, sem prejuízo da competência e das responsabilidades cometidas pela lei comercial e fiscal aos respectivos órgãos”; “d) Com base nos elementos disponibilizados pelos contribuintes por cuja contabilidade sejam responsáveis, assumir a responsabilidade pela supervisão dos actos declarativos para a segurança social e para efeitos fiscais relacionados com o processamento de salários. Entendendo-se por “regularidade técnica”, para efeitos da al. b) do n.º 1, “(…) a execução da contabilidade, nos termos das disposições previstas nos normativos aplicáveis, tendo por suporte os documentos e as informações fornecidos pelo órgão de gestão ou pelo empresário, e as decisões do profissional no âmbito contabilístico, com vista à obtenção de uma imagem fiel e verdadeira da realidade patrimonial da empresa, bem como o envio para as entidades públicas competentes, pelos meios legalmente definidos, da informação contabilística e fiscal definida na legislação em vigor”, nos termos do n.º 3 do mesmo artigo.
Sendo direito dos TOC, relativamente a quem prestam serviços, de acordo com o artigo 51º n.º 1 do EOTOC, “a) Obter todos os documentos, informações e demais elementos de que necessitem para o exercício das suas funções; b) Exigir a confirmação, por escrito, de qualquer instrução, quando o considerem necessário; c) Assegurar que todas as operações ocorridas estão devidamente suportadas e que foram integralmente transmitidas;”.
Acrescentando o n.º 7 do mesmo artigo que “Quando o julguem necessário para a construção da imagem fiel e verdadeira da contabilidade, os técnicos oficiais de contas podem solicitar a entidades públicas ou privadas competentes as informações necessárias à verificação da sua conformidade com a realidade patrimonial expressa nas demonstrações financeiras das contabilidades pelas quais são responsáveis”.
E sendo deveres dos TOC para com a administração fiscal, entre outros, os de “Assegurar, nos casos em que a lei o preveja, o envio por via electrónica das declarações fiscais dos seus clientes ou entidades patronais” [cfr. art. 55º n.º 1, al. d) do EOTOC]. Dever esse cuja violação, para além de poder acarretar responsabilidade disciplinar, é punível de acordo com as normas do Regime Jurídico das Infracções Fiscais não Aduaneiras, nos termos do n.º 2 do mesmo artigo.
Estabelecendo por seu turno o art. 4º n.º 1 do Código Deontológico dos Técnicos Oficiais de Contas (CDTOC), publicado como Anexo II ao diploma legal em referência, sob a epígrafe “Independência e conflito de deveres”, que “O contrato de trabalho celebrado pelo técnico oficial de contas não pode afectar a sua isenção nem a sua independência técnica perante a entidade patronal, nem violar o Estatuto ou o presente Código Deontológico”.
E o art. 12º do CDTOC, que para além dos direitos previstos no EOTOC, os TOC têm, no exercício das suas funções, direito a obter das entidades a quem prestam serviços toda a informação e colaboração necessárias à prossecução das suas funções com elevado rigor técnico e profissional.
Infere-se dos transcritos normativos que, apesar de suspenso, é no mínimo duvidoso que o A. ficasse automaticamente desonerado de determinadas obrigações perante a Administração Fiscal, como sejam as de remeter atempadamente as declarações fiscais referentes à R. e emitir as guias para liquidação de impostos devidos, tanto mais que até ao despedimento, nenhum outro TOC o substituiu nas respectivas funções.
Nesse contexto, é para nós compreensível que o A., embora suspenso pela R., tenha tido o cuidado de emitir/imprimir a guia da 2ª prestação do PEC, mesmo sem ter previamente pedido à R. autorização para o efeito, tanto mais que esta tinha já pago a 1ª prestação do PEC, em 31.03.2014, por igual valor (€ 2.231,09), não sendo até por essa razão previsível que se viesse a opor à emissão da 2ª prestação, tendo para o efeito o A. que recorrer ao n.º de utilizador e “password” da R., pois como esta afirma no articulado motivador, não o poderia fazer doutra maneira.
Não se vendo, em boa verdade, o que é que existe de verdadeiramente censurável em tal comportamento do A. ou que intenção malévola poderia ter, mesmo dando de barato que tenha existido o erro que a R. diz ter ocorrido na indicação do valor da prestação, que se traduziria numa diferença de € 43,20 pagos a mais adiantadamente, que seriam certamente considerados na liquidação final do imposto, caso existisse efectivamente erro, por excesso, no pagamento antecipado. Não acarretando por essa razão prejuízo patrimonial para a R., segundo se julga.
Acresce que, como se demonstrou, durante o mesmo período de suspensão em que o A. emitiu a 2ª guia do PEC, também emitiu e enviou à Autoridade Tributária, em 19.08.2014, as declarações de retenções de IRS relativas à R. e reportadas ao mês de Julho de 2014 – que a R. aceitou e pagou. Tendo-lhe a R. solicitado a confirmação de balancetes, respeitante a um período anterior à data da suspensão do A., pedindo-lhe que os corrigisse (o que o A. não fez).
Dando ideia que a R. tem dois pesos e duas medidas em relação aos actos praticados pelo A. no decurso da suspensão, admitindo alguns e não aceitando outros, quando de acordo com a sua tese, estando o A. suspenso, viola o dever de obediência, ao praticar actos relativos ao exercício das suas funções.
Quanto aos documentos solicitados por carta a “D… e Outra”, é de frisar que o art. 51º n.ºs 1 e 7 do EOTOC confere aos TOC o direito a obter da entidade empregadora todos os elementos de que necessitem para o exercício das suas funções, bem como de solicitar a terceiros “(…) as informações necessárias à verificação da sua conformidade com a realidade patrimonial expressa nas demonstrações financeiras das contabilidades pelas quais são responsáveis”.
Tendo sido justamente essa a finalidade indicada pelo A. na parte final da missiva em apreço, sendo certo que antes disso, tinha pedido à R. tal documentação, que esta não lhe facultou. Sem que se tenha provado ou se possa concluir dos factos provados que o objectivo do A. era, como defende a R., indiciar ou criar a aparência junto de terceiros, mormente dos destinatários da carta, de que a R. estava a cometer irregularidades, e difamar e denegrir a imagem e a idoneidade civil e moral da R. e de quem a gere.
Tudo ponderado, não nos parece que o que se provou consubstancie um incumprimento por parte da A. dos seus deveres laborais de tal forma grave, culposo e danoso para a R. que torne praticamente impossível a subsistência da relação laboral, nos termos exigidos pelo art. 351º n.º 1, não se justificando por conseguinte a aplicação da sanção disciplinar máxima.
Estando em causa como tal uma sanção desproporcionada e, por conseguinte, um despedimento sem justa causa e ilícito, nos termos do art. 381º, al. b).”. [fim de transcrição]

3.3. Do assim decidido discorda a Recorrente, para tanto e em síntese, alegando que:
- as expressões constantes da resposta à nota de culpa deduzida em anterior procedimento disciplinar extravasam o exercício do direito de defesa: a forma de o A. se defender seria demonstrar que os factos imputados não se verificaram ou não foram praticados pelo A., e não acusar a Ré de outros factos que nada tinham a ver com as imputações contra ele deduzidas, comportamento com o qual o A. afetou a honra, credibilidade e boa-fé da Ré.
- Os direitos e deveres dos TOC apenas se mantêm quando os trabalhadores estão em exercício de funções, o que não era o caso do A., que se encontrava suspenso; o A. não tinha plenos poderes declarativos perante a Autoridade Fiscal e Aduaneira (apenas neste caso poderia e deveria assegurar o envio de declarações fiscais, utilizando password própria), pelo que não poderia ter enviado a declaração relativa ao pagamento da 2ª prestação do Pagamento Especial por Conta, o que fez fora das instalações da Ré e utilizando a password desta, sem autorização ou conhecimento da Ré;
- Por estar suspenso de funções, não podia pedir ao cliente da Ré os contratos que pediu, tanto mais sem referir que estava suspenso; pelo menos até à semana anterior a 07.08.2014 (antes da sua suspensão), o A. tinha tido acesso a toda a documentação contabilística da Ré, pelo que o seu propósito foi lançar dúvidas junto do cliente da Ré sobre a imagem e idoneidade desta.
- Os mencionados comportamentos do A. comprometem a necessária confiança da Ré no comportamento do A.

3.4. Pese embora o esforço argumentativo da Ré/Recorrente, não lhe assiste razão, sufragando-se a decisão recorrida e respetiva argumentação, que faz um correto enquadramento dos factos ao direito e dá cabal resposta à argumentação da Recorrente, pelo que pouco ou nada mais haveria, até, a acrescentar.
De todo o modo, sempre se tecerão algumas considerações.
No que se reporta às afirmações feitas pelo A. na resposta à nota de culpa deduzida em anterior procedimento disciplinar, elas contêm-se dentro do exercício do direito de defesa que a lei consagra, o qual não passa, apenas, pela demonstração de que o trabalhador não praticou os factos imputados, nela se inserindo ainda a alegação de que o propósito do empregador seria “pressionar” o trabalhador a rescindir o contrato de trabalho, nesta se inserindo a referência à colocação das cabras no trajeto que o A. efetuava e que, em última análise, visa a alegação de que não ocorre justa causa para o despedimento. E a isso não obsta a circunstância de o A., pese embora provada a existência das cabras, não ter feito prova do intuito que, com as mesmas, imputa à Ré. Não raras vezes a entidade empregadora, no exercício do poder disciplinar, imputa ao trabalhador a prática de determinados factos para justificar o despedimento que, depois, não logra provar e, não obstante, não constituirá isso motivo para que seja reconhecido ao trabalhador o direito, por exemplo, de resolver o contrato de trabalho com invocação de justa causa…
No que se reporta à demais defesa, o A., no essencial, limita-se a reagir às acusações, declinando a sua responsabilidade e, acaso se tenha verificado o que lhe é imputado, atribuindo a responsabilidade a alguém que não ele.
O direito à liberdade de expressão é reconhecido no art. 14º do CT/2009, assim como, em corolário do exercício de direito de defesa, é reconhecido ao trabalhador o direito de resposta às acusações que lhe sejam imputadas em sede de procedimento disciplinar, tanto mais com vista ao despedimento. Naturalmente que tais direitos deverão ser exercidos dentro do quadro legal que tutela outros direitos de personalidade de igual relevância, designadamente o direito à honra e bom nome do empregador, restrições que, contudo, deverão mostrar-se adequadas e proporcionais à salvaguarda destes outros direitos, devendo a ponderação efetuar-se por critérios objetivos. Como diz Paula Quintas, “O Direito à palavra no mundo do trabalho: liberdade de expressão ou delito de opinião?”, in Prontuário do Direito do Trabalho, 76-78, pág. 165, “[a] restrição da esfera jurídica do trabalhador será, no entanto admissível no contexto laboral e atenta a forma de execução da prestação laboral, de acordo com critérios objectivos de ponderação.”.
No caso, as afirmações feitas pelo A. não poderão ser desenquadradas do contexto em que foram proferidas, qual seja no exercício do seu direito de defesa em procedimento disciplinar e, de modo algum e numa ponderação minimamente objetiva das afirmações, do contexto das mesmas e dos interesses em jogo, extravasam os limites ou restrições decorrentes da salvaguarda do direito ao bom nome e honra da Ré, nem tão pouco violam os deveres de respeito e urbanidade. Apenas uma sensibilidade acentuada ou exacerbada por parte da Ré poderia descortinar nas afirmações feitas pelo A. a violação do direito à honra ou ao seu bom nome, para além de que o alegado intuito ofensivo não decorre de tais afirmações nem, muito menos, da matéria de facto provada. Acresce que tais afirmações não são do domínio público e/ou de terceiros, circunscrevendo-se o seu conhecimento no âmbito do procedimento disciplinar, ou seja, à ré e ao instrutor do mesmo.
Consideramos, pois e até, que tais afirmações não consubstanciam, tão-pouco, a violação de qualquer dever laboral e, mesmo que assim se não entendesse, nunca constituiriam gravidade a justificar a aplicação da sanção do despedimento.
No que se reporta à 2ª prestação do Pagamento Especial por Conta e à carta remetida pelo A. a cliente da Ré solicitando determinados elementos quando, em ambas as situações, se encontrava suspenso de funções, bem analisou a sentença recorrida a relação “triangular” entre o A., enquanto trabalhador e técnico oficial de contas, a Ré, enquanto entidade empregadora e sujeito passivo de determinadas obrigações de natureza fiscal, e a autoridade tributária, relação essa da qual decorre que o vínculo entre a autoridade tributária e o A., por um lado, e entre este e a Ré, por outro, não se confundem, nem os direitos e obrigações do A. enquanto TOC se esgotam nos que decorrem, apenas, do seu vínculo laboral, antes extravasando-o. A suspensão preventiva do Autor determinada pela Ré não é pois causa da suspensão do A. na sua relação, enquanto TOC da Ré, com as autoridades fiscais, como bem decorre do Estatuto da Ordem dos Técnicos Oficiais de Contas (EOTOC), aprovado pelo DL 452/99, de 5.11, alterado pelo DL 310/2009, de 26.10, mormente das disposições citadas na sentença recorrida e que nos dispensamos de reproduzir, realçando-se, no entanto: o elenco dos deveres para com a administração fiscal constante do art. 55 [nos termos do qual:” 1. Nas suas relações com a administração fiscal, constituem deveres dos técnicos oficiais de contas: a) Assegurar que as declarações fiscais que assinam estão de acordo com a lei e as normas técnicas em vigor; b) Acompanhar, quando para tal forem solicitados, o exame aos registos e documentação das entidades a que prestem serviços, bem como os documentos e declarações fiscais com elas relacionados;
c) Abster-se da prática de quaisquer actos que, directa ou indirectamente, conduzam a ocultação, destruição, inutilização, falsificação ou viciação dos documentos e das declarações fiscais a seu cargo;
d) Assegurar, nos casos em que a lei o preveja, o envio por via electrónica das declarações fiscais dos seus clientes ou entidades patronais. 2 - A violação dos deveres referidos no número anterior é, além da responsabilidade disciplinar a que haja lugar, punível de acordo com as normas do Regime Jurídico das Infracções Fiscais não Aduaneiras, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 20-A/90, de 15 de Janeiro, ou de um regime que o venha a substituir..”]; a sujeição a responsabilidade disciplinar [Art. 59, dispondo o nº 2 que “Considera-se infracção disciplinar a violação, pelo técnico oficial de contas, por acção ou omissão, de algum dos deveres gerais ou especiais consignados no presente Estatuto, no Código Deontológico, ou noutras normas ou deliberações aprovadas pela Ordem, ainda que a título de negligência.”].
No que se reporta à emissão da guia relativa à 2ª prestação do pagamento especial por conta, ainda que o A. não tivesse plenos poderes declarativos perante a Autoridade Tributária, atuou no interesse da Ré, cumprindo uma obrigação fiscal. E a utilização da password da Ré, ainda que sem o conhecimento ou consentimento desta, foi-o para tal efeito. Por outro lado, sendo o pagamento de tal obrigação fiscal objeto de acerto posterior, nem se vê que tal cause prejuízo à Ré, para além de que o montante em excesso, em relação a esse pagamento, é de reduzido montante (€43,20). A sentença recorrida fez, a este propósito, uma correta avaliação e ponderação do comportamento do A., para onde se remete. Quando muito, poder-se-ia dizer que o A., ao levar a cabo a emissão de tal guia, e se a isso não estava obrigado, teria atuado com excesso de zelo. Mas nada mais do que isso, não constituindo isso, de forma alguma, justa causa para despedir o A. Como se diz na sentença e que se realça “Nesse contexto, é para nós compreensível que o A., embora suspenso pela R., tenha tido o cuidado de emitir/imprimir a guia da 2ª prestação do PEC, mesmo sem ter previamente pedido à R. autorização para o efeito, tanto mais que esta tinha já pago a 1ª prestação do PEC, em 31.03.2014, por igual valor (€ 2.231,09), não sendo até por essa razão previsível que se viesse a opor à emissão da 2ª prestação, tendo para o efeito o A. que recorrer ao n.º de utilizador e “password” da R., pois como esta afirma no articulado motivador, não o poderia fazer doutra maneira.”
E também se concorda com a sentença recorrida no que se refere aos documentos solicitados por carta a “D… e Outra”, Como nela se diz, é de frisar que o art. 51º n.ºs 1 e 7 do EOTOC confere aos TOC o direito a obter da entidade empregadora todos os elementos de que necessitem para o exercício das suas funções, bem como de solicitar a terceiros “(…) as informações necessárias à verificação da sua conformidade com a realidade patrimonial expressa nas demonstrações financeiras das contabilidades pelas quais são responsáveis”. E, por outro lado, é irrelevante que o A., antes de ser suspenso, pudesse ter acesso à documentação. Nada o impedia, tendo em conta as funções e responsabilidade enquanto TOC, de solicitar os elementos em questão no momento em que considerou oportuno, sendo de salientar que antes de os solicitar às referidas entidades, havia-os pedido à Ré, que não lhos forneceu. Tivessem sido fornecidos pela Ré, não tinha aquele necessidade de os requerer ao mencionado cliente. Não pode, pois, a Ré imputar ao A. a intenção de, com esse seu comportamento, pretender denegrir a sua imagem e bom nome, intuito este que aliás não consta dos factos provados. Para além de que, acrescente-se, não se vê que do teor da referido pedido conste qualquer circunstância passível de denegrir a imagem e bom nome da Ré [em tal carta, cujo teor consta do nº 62 dos factos provados, o A. refere o seguinte: “Exmos. Srs. Sou contabilista da empresa C…, Ldª com Nif (…), com a qual julgo que V.Exs. têm ou tiveram relações contratuais até Junho de 2014, e usando a faculdade que a lie me reconhece, à luz do Estatuto da Ordem dos Técnicos Oficiais de Contas venho solicitar os contractos que tenham com esta empresa, nomeadamente o contrato de permita dos terrenos que eram da quinta sita em …, Aveiro, na qual tenho conhecimento que já efectuaram várias permutas com a empresa. Tal informação terá como fim verificar a conformidade patrimonial expressa nas Demonstrações financeiras da empresa, que tendo em conta os elementos fornecidos pela empresa executei e certifiquei. Para qualquer esclarecimento podem-me contactar para o telemóvel acima apresentado, para marcar reunião no sentido de poder esclarecer qualquer questão que tenham por conveniente.”]. E também não vê qualquer infração na circunstância de o A. não ter referido que se encontrava suspenso de funções pela Ré. Como se disse, as funções do A. e a sua responsabilidade enquanto técnico oficial de contas extravasam os limites restritos à relação laboral entre o A. e a Ré.

A terminar, diga-se que nem descortinamos, no comportamento do A., matéria suscetível de constituir infração disciplinar. Mas ainda que assim não fosse, nunca a referida factualidade, sozinha ou conjugada, poderia ser apta a constituir justa causa para o despedimento, não sendo ela suscetível de, objetivamente, determinar quebra de confiança tal que tornasse inexigível a manutenção da relação laboral, para além de que o despedimento se apresentaria como manifestamente excessivo e desproporcional à gravidade das alegadas infrações.
Assim, e nesta parte, improcedem as conclusões do recurso.

4. Do pagamento de dias de férias não gozadas [recurso do A.]

O A. reclamou o correspondente a dias de férias que, diz, não gozou nos anos de 2008 a 2014.
A esta questão reportam-se as considerações, em sede de matéria de facto, tecidas no ponto IV.2.3. do presente acórdão, daí resultando que não foi feita prova de que o A. não haja gozado os dias de férias que invocou não haver gozado.
A falta de gozo de dias de férias constitui pressuposto do direito do A. ao pagamento que reclama, pelo que, nos termos do art. 342º, nº 1, do Cód. Civil, é sobre ele que impende o respetivo ónus da prova.
Alegou o A. que, nos termos do art. 127º, nº 1, al. j), do CT/2009, tinha a Ré a obrigação de manter atualizado o registo, para além do mais, das datas de início e termo das férias para daí concluir que, por assim ser, sobre ela impenderia o ónus da prova de que o A. teria gozado os dias de férias.
Discordamos de tal entendimento. A repartição das regras sobre ónus da prova decorre do disposto no art. 342º do CC, nos termos do qual a quem invocar um direito cabe fazer a prova dos factos constitutivos do direito alegado (nº 1), cabendo àquele contra quem a invocação é feita o ónus da prova dos factos impeditivos, modificativos ou extintivos do direito invocado (nº 2).
A obrigação da Ré de manter um registo das datas de início de termo das férias a que se reporta o citado preceito [também prevista no CT/2003, no art. 120º, nº 1, al. j)] não consubstancia qualquer facto impeditivo, modificativo ou extintivo do direito de que o A. se arroga titular, pelo que não se enquadra no art. 342º, nº 2, do CC.
Só por via de uma (eventual) inversão do ónus da prova poderia caber à Ré o ónus de provar que o A. teria gozado os dias de férias em questão e não já ao A. provar que os não gozou. E essa inversão apenas poderia ter lugar no quadro do disposto nos arts. 344º, nº 1, do CC ou do nº 2 do citado preceito conjugado com o 417º, nº 2, do CPC/2013.
Com efeito, dispõem tais preceitos que:
Artigo 344º [do Código Civil]
Inversão do ónus da prova
1. As regras dos artigos anteriores invertem-se, quando haja presunção legal, dispensa ou liberação do ónus da prova, ou convenção válida nesse sentido, e, de um modo geral, sempre que a lei o determine.
2. Há também inversão do ónus da prova, quando a parte contrária tiver culposamente tornado impossível a prova ao onerado, sem prejuízo das sanções que a lei de processo mande especialmente aplicar à desobediência ou às falsas declarações.
Artigo 417º [do CPC/2013]
Dever de cooperação para a descoberta da verdade
1 - Todas as pessoas, sejam ou não partes na causa, têm o dever de prestar a sua colaboração para a descoberta da verdade, respondendo ao que lhes for perguntado, submetendo-se às inspeções necessárias, facultando o que for requisitado e praticando os atos que forem determinados.
2 - Aqueles que recusem a colaboração devida são condenados em multa, sem prejuízo dos meios coercitivos que forem possíveis; se o recusante for parte, o tribunal aprecia livremente o valor da recusa para efeitos probatórios, sem prejuízo da inversão do ónus da prova decorrente do preceituado no n.º 2 do artigo 344.º do Código Civil.
3 – (…)
No caso, não se verifica nenhuma das circunstâncias previstas no art. 344º, nº 1, do CC.
Por outro lado, no que se reporta ao disposto no nº 2 do citado art. 344º, conjugado com o art. 417º, nºs 1 e 2, do CPC/2013, há que, desde logo, referir que a aplicabilidade de tais preceitos nem se coloca.
Com efeito, para além de que o A. ora recorrente, no recurso nem invoca a aplicabilidade de tais preceitos, decorre também dos autos que o A. não requereu a notificação da Ré para juntar o registo dos dias de férias gozados pelo A. [a que se reportam os arts. 120º, nº 1, al. j), do CT/2003 e 127º, nº 1, al. j), do CT/2009], assim como a 1ª instância não determinou a notificação da Ré para tal junção e, muito menos o fez com a advertência da cominação prevista no art. 417º, nº 2, designadamente da eventual aplicabilidade da inversão do ónus da prova nos termos previstos nesse preceito em conjugação com o disposto no art. 344º, nº 2.
Ora, tanto basta, sem necessidade de outras considerações, para que não haja também lugar à inversão do ónus da prova a que se reporta tais preceitos. O disposto no art. 417º, nº 2, pressupõe a recusa injustificada da colaboração que haja sido determinada, pelo que, nada havendo sido determinado pelo Tribunal, nem de recusa se poderá, sequer, falar. Por outro lado, a eventual inversão do ónus da prova seria uma questão nova, que não é de conhecimento oficioso, que carece de ser trazida à colação em sede de 1ª instância, sob pena de preterição do direito de defesa da Ré, e, bem assim, nela apreciada e decidida, não podendo a Relação, oficiosamente, dela conhecer.
Deste modo, e concluindo, cabia ao A. o ónus da prova de não ter gozado os dias de férias que alegou não haver gozado.
Não tendo feito tal prova, improcedem nesta parte as conclusões do recurso.

5. Do trabalho suplementar [recurso do A.]

O A. reclamou o pagamento de trabalho suplementar realizado ao longo de toda a relação laboral, para tanto alegando que, nos termos do CCT aplicável, era de 37h30m o período normal de trabalho semanal e que prestava nove horas de trabalho diário, de segunda a sexta-feira, conforme decorre dos quadros anexos à petição inicial. Mais diz que a ré tinha a obrigação de manter o registo de trabalho suplementar pelo que lhe competiria a ela o ónus da prova da não realização do alegado trabalho suplementar.

5.1. Na sentença recorrida referiu-se o seguinte:
“No que se refere (…) aos € 26.612,29 reclamados com fundamento em horas de trabalho suplementar alegadamente prestadas de 2007 a 2014, cabia ao A. o ónus da respectiva prova, à luz do disposto no art. 342º n.º 1 do Cód. Civil. Não se tendo demonstrado (…) que prestou as horas de trabalho suplementar referenciadas no art. 153º da contestação/reconvenção.
Especificamente quanto ao trabalho suplementar, provou-se apenas que de acordo com o contrato de trabalho celebrado entre A. e R., o horário de trabalho do A. era de 40 horas semanais, sendo os sábados e domingos dias de descanso. E que pelo menos num sábado de manhã, em data não apurada, o A. prestou trabalho numa obra da R. em …, ajudando na reparação de varandas.
Sucede que, para além de lhe caber demonstrar que trabalhou para além do respectivo horário, impendia de igual modo sobre o A. o ónus de alegar e provar que esse trabalho suplementar prestado foi prévia e expressamente determinado pela R., ou realizado de modo a não ser previsível a oposição desta (cfr. arts. 258º n.º 5 do anterior Cód. do Trabalho, aprovado pela Lei n.º 99/2003, de 27 de Agosto e 268º n.º 2 do actual Cód. do Trabalho, aprovado pela Lei n.º 7/2009, de 12/01). Prova essa que não foi feita, quanto à tal manhã de sábado em que o A. trabalhou numa obra da R. em …, ajudando na reparação de varandas.
Donde se conclui nada ter o A. a haver da R., relativamente a (…) trabalho suplementar.”.

5.2. Começando pela questão relativa à repartição do ónus da prova, já no ponto anterior deixámos transcritas as disposições legais relativas ao ónus da prova e sua inversão – arts. 342º e 344º do CC e 417º do CPC/2013 -, pelo que para elas se remete. E, concretamente em relação ao registo dos tempos de trabalho e do trabalho suplementar, relevam, até 30.11.2003, os arts. 162º e 204º CT/2003 e, a partir de 17.02.2009 (data da entrada em vigor do CT/2009), os arts. 202º e 231º do CT/2009.
De acordo com os citados preceitos de ambos os Códigos, o empregador deve manter, durante cinco anos, um registo de onde conste os tempos de trabalho (com indicação das horas de início e termo do tempo de trabalho, incluindo as interrupções ou intervalos), bem como deve manter, também durante cinco anos, um registo do trabalho suplementar que seja prestado pelo trabalhador.
Porque constitutivo do direito ao pagamento de que se arroga titular, é ao trabalhador que compete o ónus da prova dos factos integradores da alegada prestação de trabalho suplementar (art. 342º, nº 1, do CC) e não ao empregador o ónus da prova de que o trabalho suplementar não foi prestado.
Tal como acima se disse a propósito do não gozo de dias de férias, a obrigação da Ré de manter um registo dos tempos de trabalho e do trabalho suplementar que seja prestado não consubstancia qualquer facto impeditivo, modificativo ou extintivo do direito de que o A. se arroga titular, pelo que não se enquadra no art. 342º, nº 2, do CC. E, daí, que apenas por via de uma (eventual) inversão do ónus da prova poderia caber à Ré o ónus de provar que o A. não prestou o trabalho suplementar que alega, inversão que apenas poderia ter lugar no quadro do disposto nos arts. 344º, nº 1, do CC ou do nº 2 do citado preceito conjugado com o 417º, nº 2, do CPC/2013, que não se verificam no caso em apreço.
No caso, o A. requereu que a Ré juntasse o registo do trabalho suplementar prestado, havendo a 1ª instância, por despacho de fls. 473, determinado a notificação da Ré para tal efeito, na sequência do que esta veio juntar, por requerimento de 05.05.2015 (fls. 478 a 494), o que denominou de “registo de horas mensais do Autor como funcionário da Ré”, registos esses a que se reportam os documentos de fls. 480 a 493 referentes aos meses de agosto de 2013 a setembro de 2014 e de onde consta como horas de entrada e saída o seguinte: “Entrada – 8h00; Saída – 12h00; Entrada – 13h30; Saída – 18h00”, conforme já o referimos em sede de impugnação da decisão da matéria de facto (cfr. ponto 2.4.4.).
Tal junção não dá cumprimento ao que então havia sido requerido pelo A. e determinado pela 1ª instância. Todavia, aquando da notificação para essa junção, a 1ª instância não determinou qualquer cominação para o caso da não junção, mormente a eventual inversão do ónus da prova nos termos conjugados dos arts. 344º, nº 2, do CC e 417º, nº 2, do CPC/2013, assim como, perante a junção pela Ré do requerimento e documentos a ele anexos de fls. 478 a 494, nem o A. requereu que se insistisse por essa junção, nem a 1ª instância fez qualquer reparo e/ou determinou fosse o que fosse, mormente nova notificação para tal efeito, muito menos fazendo qualquer alusão à cominação decorrente da eventual aplicação do disposto no art. 344º, nº 2, do CC [inversão do ónus da prova], ex vi da aplicabilidade do art. 417º, nº 2, do CPC/2013.
Ora, o não cumprimento da junção determinada pela 1ª instância não basta para a aplicabilidade da inversão do ónus da prova a que se reporta o citado art. 344º, nº 2. Como acima se disse, tal aplicabilidade, também agora, constituiria até questão nova, que não é de conhecimento oficioso, que carece de ser trazida à colação em sede de 1ª instância, sob pena de preterição do direito de defesa da Ré, e, bem assim, nela apreciada e decidida, não podendo a Relação, oficiosamente, dela conhecer.
Deste modo, e concluindo, cabia ao A. o ónus da prova de ter prestado o trabalho suplementar que alegou, cumprindo de seguida apreciar, perante a matéria de facto provada, se tal prova foi, ou não, feita e se o A. tem direito ao pagamento do alegado trabalho suplementar.
De todo o modo, dir-se-á o seguinte:
Para que, de harmonia com o art. 344º, nº 2, do Cód. Civil, se verifique a inversão do ónus da prova, é necessário que a parte contrária tenha culposamente tornado impossível a prova ao onerado.
No que se reporta ao trabalho suplementar alegadamente prestado há mais de cinco anos e cuja prova, nos termos dos arts. 381º, nº 2, do CT/2003 e 337º, nº 2, do CT/2009, apenas poderá ser feita por documento idóneo, é a própria lei que impõe ao empregador a obrigação de manter um registo desse trabalho porém apenas durante cinco anos. Ou seja, para além desses cinco anos, não está o empregador legalmente obrigado a manter esse registo, pelo que nem se poderá dizer que, ao não o manter por período superior a esse, haja culposamente tornado impossível a prova.
No que se reporta ao trabalho suplementar prestado há menos de cinco anos, a sua prova pode ser feita por qualquer meio de prova legalmente admissível, pelo que, não sendo a existência de registo desse trabalho o único meio de prova admissível, não se poderá dizer que a sua inexistência haja tornado impossível a prova ao onerado.

5.3. O A. invoca a aplicabilidade do CCT celebrado entre a AECOPS – Associação de Empresas de Construção e Obras Públicas e outras e a Federação Portuguesa dos Sindicatos da Construção, Cerâmica, Vidro e Outros, publicado no BTE nº 13, de 18.04.2005 e, por consequência, a sua clª 8ª, nº 2, nos termos da qual o período normal de trabalho semanal para os trabalhadores administrativos é de 37h30m.
Contrapondo, diz a Ré que tal instrumento não é aplicável, uma vez que o A. não é filiado em sindicato outorgante de tal CCT e que acordou com o A., nos termos do contrato individual de trabalho escrito que celebraram, que o período normal de trabalho semanal era o de 40 horas por semana.

Pese embora o princípio da filiação [nos termos do qual a convenção coletiva de trabalho é aplicável às empresas associadas em associação outorgante da convenção e aos trabalhadores filiados em sindicato subscritor da mesma – arts. 552º do CT/2003 e 496º do CT/2009], no caso o referido CCT foi objeto da Portaria de Extensão [então designada, no CT/2003, de Regulamento de Extensão, designação aquela que foi depois retomada no CT/2009] nº 1124/2005, de 28.10, a qual estendeu a regulamentação dela constante: “a) Às relações de trabalho entre empregadores não filiados nas associações de empregadores outorgantes que se dediquem às actividades de construção civil ou de obras públicas e trabalhadores ao seu serviço das profissões e categorias profissionais nelas previstas; b) Às relações de trabalho entre empregadores filiados nas associações de empregadores outorgantes que prossigam as actividades referidas na alínea anterior e trabalhadores ao seu serviço das profissões e categorias profissionais previstas nas convenções não representados pelas associações sindicais outorgantes.”.
Ora, assim sendo, o mencionado CCT, por via da referida Portaria de Extensão, é também aplicável à relação jurídico-laboral mantida entre o A. e a Ré, pelo que é aplicável a sua Clª 8ª.
Tal Clª dispõe que: “1. O período normal de trabalho terá a duração máxima de oito horas por dia e de quarenta horas por semana, distribuído por cinco dias consecutivos. 2. Para os profissionais administrativos, técnicos de desenho, cobradores e telefonistas o período normal de trabalho semanal é de trinta e sete horas e meia. (…)”. [sublinhado nosso]
O A., atenta-se as suas funções, integra-se no pessoal administrativo pelo que, nos termos do nº 2 da citada cláusula, o seu período normal de trabalho semanal não poderia exceder as 37h30m.
Diga-se que é irrelevante que o A. e a Ré hajam, por contrato individual de trabalho, acordado num período normal de trabalho semanal de 40 horas. É que, tanto nos termos do CT/2003 (art. 4º, nº 3, e 531º), como do CT/2009 (art. 3º, nºs 1, 4 e 5, e 476º), as disposições de instrumento de regulamentação coletiva de trabalho só podem ser afastadas por contrato individual de trabalho quando este estabeleça condições mais favoráveis para o trabalhador, o que não é o caso. Não poderiam, pois, as partes, por via do contrato individual de trabalho, alagar o período normal de trabalho semanal das 37h30 para as 40horas.
Ora, assim sendo, e desde logo por isso, o A., ao prestar 40 horas de trabalho semanal, assim excedendo o limite máximo das 37h30, prestou, desde o início da sua atividade para a ré, duas horas e trinta minutos semanais de trabalho suplementar. E, como se disse em sede de impugnação da decisão da matéria de facto, a prova de tal trabalho suplementar, bem como do seu conhecimento e consentimento da Ré, no que se reporta aos cinco anos anteriores (tendo como referência a data da contestação, em que o mesmo foi peticionado), foi feita por documento idóneo, como decorre do contrato de trabalho escrito, sendo por consequência devido o correspondente pagamento desde a data do início da sua atividade para a Ré.

Quanto ao demais trabalho suplementar alegado:
Da matéria de facto provada, por nós alterada, decorre ter ficado provado que o A. pelo menos desde 20.03.2010, com o conhecimento da Ré, e sem oposição desta, no período da manhã, entrava às 8h00 e saía às 12h00 e, no período da tarde, entrava, pelo menos, às 13h30 e saía, pelo menos, às 18h00, de segunda a sexta feira.
Ou seja, decorre do referido horário de trabalho praticado pelo A. que este, para além dos 30 minutos diários de trabalho suplementar, decorrentes da diferença, acima referida, entre as 8horas de trabalho diário (correspondentes a 40 horas de trabalho semanal) e as 7h30m estipuladas no CCT aplicável (correspondentes a 2h30m semanais), prestava ainda mais meia hora de trabalho diário (de 2ª a 6ª feira), pois que, no total diário prestava 8h30m. Ou seja, no período desde 20.03.2010 o horário de trabalho do A. comportava a prestação de uma hora de trabalho suplementar diário, o qual era prestado com o conhecimento e sem oposição da Ré, trabalho suplementar esse que, assim, lhe é devido pela Ré, já que esta não demonstrou que o haja pago.
Desconhecendo-se, designadamente, eventuais ausências do A., as quais é de supor que se tenham verificado ao longo de toda a relação laboral, até porque o esteve suspenso preventivamente [período em que, por consequência, não prestou trabalho suplementar], deverá a liquidação do mesmo, nos termos dos arts. 609º, nº 2, e 358º, nº 2, ambos do CPC/2013, ser relegada para o respetivo incidente.
Ou seja, e em conclusão, procedem nesta parte, parcialmente, as conclusões do recurso, em consequência do que deverá a Ré ser condenada a pagar ao A., desde 01.02.2007 [nos termos do contrato de trabalho escrito a efetiva prestação da atividade laboral iniciou-se nesta data] e até 19.03.2010, a retribuição correspondente a 30 minutos diários de trabalho suplementar e, a partir de 20.03.2010, até final do contrato de trabalho, a retribuição correspondente a uma hora diária de trabalho suplementar, sem prejuízo, em ambas as situações, do desconto de ausências do A. ao serviço, tudo a liquidar, nos termos dos arts. 609º, nº 2, e 358º, nº 2, ambos do CPC/2013, no respetivo incidente de liquidação.
O A. tem ainda direito, sobre as quantias que se mostrem ainda em dívida, a juros de mora, à taxa legal, desde a data da liquidação das mesmas até efetivo e integral pagamento – arts. 559º, 804º, 805º, nº 3 e 806º todos do Cód. Civil.

6. Do valor da indemnização de antiguidade [recurso do A.]

Na sentença recorrida, a propósito da indemnização de antiguidade, referiu-se o seguinte:
“II. Sendo o despedimento ilícito, assiste ao trabalhador o direito a ser indemnizado de todos os danos sofridos, de ordem patrimonial e não patrimonial, bem assim como à reintegração no mesmo estabelecimento da empresa, mantendo a categoria e antiguidade, podendo todavia optar (como em concreto sucedeu, logo na contestação/reconvenção), até ao termo da discussão em audiência de julgamento e em detrimento da reintegração, por uma indemnização a fixar pelo tribunal entre 15 e 45 dias de retribuição base e diuturnidades por cada ano completo ou fracção de antiguidade (com o limite mínimo correspondente a 3 meses de retribuição base e diuturnidades), atendendo ao valor da retribuição e ao grau de ilicitude decorrente da ordenação estabelecida no art. 381º – cfr. arts. 389º n.º 1, als. a) e b) e 391º, n.ºs 1, 2 e 3.
Indemnização essa que, tendo em conta o valor (mediano) da retribuição auferida e o grau de ilicitude do despedimento (que se reputa também de mediano, tendo em conta os seus contornos, já acima analisados), se entende fixar em 30 dias de retribuição base e diuturnidades, por ano de antiguidade, conduzindo a uma indemnização que se cifra, nesta data, no montante de € 11.267,00[8].
Sendo de notar a este respeito que apesar da R. se ter oposto à reintegração do A., nos termos do art. 392º n.º 1, não é no caso aplicável tal normativo, posto que nem o A. ocupava na R. cargo de administração ou direcção, nem se apurou quantos trabalhadores esta teve ao seu serviço, em média, no ano civil anterior, não podendo consequentemente concluir-se que se trata de microempresa – cfr. também o art. 100º n.º 1, al. a). Ademais, o A., logo na contestação/reconvenção, optou pela indemnização, em detrimento da reintegração, pelo que a questão tão pouco se coloca. Não sendo consequentemente de fixar a indemnização por referência ao n.º 3 do art. 392º (entre 30 a 60 dias de retribuição base e diuturnidades), como pretende o A..”.
O A. discorda do assim decidido pois que, segundo entende e sendo a Ré uma microempresa, a indemnização de antiguidade deveria ter sido fixada tendo em conta o disposto no art. 392º, nº 3, do CT/2009, pretendendo que a mesma seja ficada em €20.583,35.

6.1. Previamente, importa contudo, apreciar do alegado pela Ré/Recorrida nas al. CC) e DD) das contra-alegações, em que refere, na primeira, que o A., na resposta ao recurso interposto pela Ré, referiu que “nenhum reparo há a fazer à dita sentença por ter julgado, e bem no entender, o despedimento ilícito” e, na segunda, que: “DD- Estando já a ser discutido em sede de anterior recurso apresentado pela Ré, a ilicitude ou não do despedimento do A. e suas consequências, que seriam obviamente o pedido indemnizatório, o seu quantum e ainda as prestações vencidas e vincendas e tendo o A. já respondido a esse recurso onde expressamente considerou que nessa parte da sentença proferida «nenhum reparo há a fazer à dita sentença», não pode agora este, a pretexto do recurso que agora apresentou, “querer dar o dito por não dito”, como que numa espécie de segunda oportunidade após arrependimento ou esquecimento, vir agora querer que seja apreciado apenas e tão só o quantum indemnizatório. Esse pedido indemnizatório já está a ser discutido no recurso apresentado pela Ré. A oportunidade do A. em responder a essa parte da sentença que está a ser discutida em sede de recurso interposto pela R. já foi exercida pelo A. e nele expressamente considerou nenhum reparo havia a fazer à sentença recorrida.”.
O alegado pela Ré/Recorrida é, manifesta e totalmente, destituído de fundamento.
O modo de a parte que, total ou parcialmente, decaiu na ação é a interposição de recurso, para o que detém legitimidade, sendo que as conclusões do recurso delimitam o seu objeto, não podendo a Relação conhecer para além dele, mormente não podendo conhecer de questão que extravase o seu âmbito, sob pena de nulidade do acórdão por excesso de pronúncia – art. 615º, nº 1, al. d), do CPC/2013.
O recurso da Ré tinha por objeto a existência de justa causa para o despedimento e, por consequência, a licitude do mesmo e a revogação da sentença recorrida na parte em que considerou o despedimento ilícito e em que a condenou na indemnização de antiguidade e no pagamento das retribuições intercalares.
Ora, como é evidente, tal recurso não tinha por objeto a discussão do montante da indemnização de antiguidade que foi fixada na sentença recorrida e, muito menos, a sua fixação em montante superior. Entendendo o A. que a indemnização de antiguidade deveria ter sido fixada em montante superior ao atribuído na sentença, mormente por aplicação do art. 392º, nº 3, do CT/2009, a única forma de o A. impugnar nessa parte a sentença e de suscitar a possibilidade da Relação conhecer de tal questão era a interposição do recurso. É óbvio que esta Relação, não tivesse o A. interposto recurso, não poderia apreciar de tal questão e que, se o fizesse, certamente não deixaria a Ré de vir invocar a nulidade do acórdão desta Relação por excesso de pronúncia.
E, por outro lado, a concordância do A. com a sentença recorrida manifestada nas contra-alegações tem como objeto, evidentemente, a parte da decisão que julgou ilícito o despedimento, esta a que estava em questão em tal recurso, e não já o montante da indemnização fixada.
Assim, e sem necessidade de considerações adicionais, por manifestamente desnecessárias, improcede o alegado pela Ré/Recorrida na als. CC) e DD) das suas contra-alegações.

6.2. Apreciando a questão ora em apreço, objeto do recurso do A., desde já se dirá que se concorda com o decidido na sentença recorrida.
Como consequência da ilicitude do despedimento, o trabalhador tem direito à reintegração, podendo, todavia e em alternativa, optar pela indemnização de antiguidade a que se reporta o art. 391º do CT/2009. Caso o trabalhador pretenda a reintegração, a lei faculta ao empregador a possibilidade de a ela se opor, porém desde que verificadas alguma das situações previstas no art. 392º, nº 1, do mesmo, no qual se dispõe que: “1. Em caso de microempresa ou de trabalhador que ocupe cargo de administração ou de direcção, o empregador pode requerer ao tribunal que exclua a reintegração, com fundamento em factos e circunstâncias que tornem o regresso do trabalhador gravemente prejudicial e perturbador do funcionamento da empresa.”. Determinam ainda os nºs 2 e 3 do citado preceito que: “2. O disposto no número anterior não se aplica sempre que a ilicitude do despedimento se fundar em motivo político, ideológico, étnico ou religioso, ainda que com invocação de motivo diverso, ou quando o fundamento da oposição à reintegração for culposamente criado pelo empregador. 3. Caso o tribunal exclua a reintegração, o trabalhador tem direito a indemnização, determinada pelo tribunal entre 30 e 60 dias de retribuição base e diuturnidades por cada ano completo ou fracção de antiguidade, nos termos estabelecidos nos nºs 1 e 2 do artigo anterior, não podendo ser inferior ao valor correspondente a seis meses de retribuição base e diuturnidades.”.
Sem prejuízo do disposto no nº 2 do citado art. 392º, são pois quatro os pressupostos para que o tribunal exclua a reintegração e, em substituição, atribua ao trabalhador a indemnização de antiguidade prevista no art. 392º, nº 3, de verificação cumulativa:
1º - Que a consequência do ilicitude do despedimento seja a reintegração por o trabalhador não ter exercido o direito de opção pela indemnização de antiguidade;
2º - Que o empregador requeira ao Tribunal que a reintegração seja excluída;
3º - Que o empregador seja uma microempresa ou que o trabalhador ocupe cargo de administração ou de direção;
4º - Que ocorram factos e circunstâncias que tornem o regresso do trabalhador gravemente prejudicial e perturbador do funcionamento da empresa.
De referir ainda que, nos termos do art. 100º, nºs 1 e 2, do CT/2009, considera-se microempresa aquela que empregue menos de 10 trabalhadores, número este que, para tal efeito, deverá ser determinado pelo número médio de trabalhadores no ano civil antecedente. E importa também salientar que pedido do empregador de exclusão da reintegração apenas se justifica caso o trabalhador não opte pela indemnização de antiguidade.
No caso, o A. não ocupa cargo de administração ou de direção. E, por outro lado, não foi feita prova do número médio de trabalhadores da Ré no ano anterior à decisão do despedimento, número esse que, aliás, não foi alegado por nenhuma das partes, não se encontrando, por consequência, provado que a Ré seja uma microempresa.
Importa, quanto ao número de trabalhadores da Ré, esclarecer o seguinte:
A Ré, com o requerimento de 05.05.2015, juntou aos autos os mapas de quadro de pessoal de fls. 497 a 505 e 506 a 510, referentes aos anos de 2007, 2008, 2009, 2011 e 2013, que reportam o número de trabalhadores no mês de outubro de cada um desses anos, a saber: 15, 15, 14, 12 e 4 trabalhadores. Acontece que o A./Recorrente, no recurso, não só não invocou tais documentos com vista à prova do número de trabalhadores da Ré como, no requerimento de 11.05.2015, de fls. 536/537, em resposta à junção de tais documentos [bem como de outros juntos com o citado requerimento], referiu impugnar todos os documentos juntos pela Ré, pelo que não poderá o número de trabalhadores deles constante ter-se como provado.
De todo o modo, sempre se diga que se mostra irrelevante que do mapa de quadro de pessoal referente ao ano de 2013 constem, tão-só, quatro trabalhadores. Com efeito, o mapa de quadro de pessoal tem por objeto o número de trabalhadores por reporte ao mês de outubro, pelo que tanto não basta para que se possa concluir que em 2013 o número médio de trabalhadores seja inferior a dez. Como diz Luís Miguel Monteiro, in Código do Trabalho Anotado, 4ª edição, Almedina, de Pedro Romano Martinez e outros, a pág. 222, “[o] número de trabalhadores relevante é o correspondente à média anual – e não o número existente em Outubro de cada ano (…)”.
Por outro lado, na contestação, o A. (apenas) referiu que, em consequência da ilicitude do despedimento “tem direito ao pagamento das importâncias devidas, acrescidas da respectiva indemnização laboral que a ilicitude do despedimento proporciona, nos termos do art. 392º da supra citada Lei” [art. 131º da contestação]. Ou seja, e ainda que o A. faça referência ao art. 392º, o certo é que o mesmo logo optou por uma indemnização, não decorrendo do por si alegado que pretendesse a reintegração. E só em caso de reintegração, é que faz sentido a (eventual) oposição à mesma pelo empregador, para além de que, apenas em caso de procedência dessa oposição, é que seria devida a indemnização agravada a que se reporta o nº 3 do art. 392º.
Aliás, no recurso, o A./Recorrente nem tão pouco se insurge contra o facto de não ter sido determinada a sua reintegração, mas apenas se insurge contra a circunstância da indemnização não ter sido fixada de acordo com os parâmetros do art, 392º, nº 3.
De todo o modo, sempre se dirá que, para que a oposição à reintegração fosse admissível, sempre seria necessário que ocorressem factos e circunstâncias que tornassem o regresso do trabalhador gravemente prejudicial e perturbador do funcionamento da empresa. Para tanto, a Ré, no essencial, limitou-se a invocar as razões que motivaram o despedimento e, por isso, a quebra de confiança, o que é, no caso, insuficiente tendo em conta as considerações tecidas a propósito da inexistência da justa causa e não se mostrando que a factualidade praticada pelo A. fosse suscetível de determinar grave prejuízo ou perturbação do funcionamento da empresa. Ou seja, sempre inexistiria fundamento para a oposição à reintegração e, por consequência, carecendo de fundamento a indemnização agravada constante do art. 392º, nº 3,
Assim, e nesta parte, improcedem as conclusões do recurso.

7. Do subsídio de férias de 2007 [recurso do A.]

Na sentença recorrida, a este propósito, referiu-se o seguinte:
“No tocante aos € 916,66 peticionados a título de subsídio de férias de 2007 (ano de admissão do A.), a R. sustentou que o direito a férias e a subsídio de férias relativo ao ano de 2007 só se vencia em Janeiro de 2008, ano em que procedeu ao respectivo pagamento.
Como decorre do art. 212º do Cód. do Trabalho então vigente, aprovado pela Lei n.º 99/2003, de 27 de Agosto. “1. O direito a férias adquire-se com a celebração do contrato de trabalho e vence-se no dia 1 de Janeiro de cada ano civil, salvo o disposto nos números seguintes. 2. No ano da contratação, o trabalhador tem direito, após seis meses completos de execução do contrato, a gozar 2 dias úteis de férias por cada mês de duração do contrato, até ao máximo de 20 dias úteis. (…)”.
O A. foi admitido ao serviço da R. em 31/01/2007, pelo que teria nesse ano direito a 20 dias de férias e respectivo subsídio.
Provou-se apenas, a tal respeito, que em Julho de 2008, a R. pagou ao A. € 1.000,00, a título de subsídio de férias.
Em 2008, o A. ganhava € 1.100,00/mês, pelo que os € 1.000,00 que pagou ao A. em Julho desse ano, a título de subsídio de férias, não chegam sequer para liquidar o subsídio de férias desse mesmo ano de 2008.
Está assente que aquando da sua admissão, em 31/01/2007, a retribuição do A. era no valor de € 750,00, passando depois, ainda em 2007 (sem que se saiba em que mês), para €900,00. Sendo portanto de admitir uma retribuição média de € 825,00, no referido ano.
Devendo a R. ao A., a título de subsídio de férias correspondente aos 20 dias de férias a que o A. tinha direito em 2007, a quantia de € 750,00[9].”.
Do assim decidido discorda o A./Recorrente pois que, segundo diz, em Março de 2007, já auferia €900,00 e, em Outubro de 2007, €1.000,00, donde resulta um salário médio de €909,00 e não os €825,00 considerados na sentença recorrida. Assim, e seguindo o cálculo efetuado na sentença, o subsídio de férias de 2007 ascenderia, não aos €750,00 considerado na sentença, mas sim a €826,45 [909,09 : 22 x 20], reclamando, em consequência a diferença, no montante de €76,45.
Do nº 7 dos factos provados, na redação por nós introduzida, resulta que desde a admissão até setembro de 2007, a retribuição mensal do A. foi de €750,00, não tendo sido feita prova de que, a partir de março ou abril, haja sido aumentada para €900,00, e que, de outubro a dezembro de 2007, foi de €1.000,00 mensais. Ou seja, a retribuição média mensal do A., em 2007, foi de €818,18 [(750 x 8) + (1000,00 x 3) : 11]. Daí que, e utilizando a mesma forma de cálculo considerada na sentença, fosse de de €743,38 o valor do subsídio de férias devido nesse ano. Tendo a sentença condenado no pagamento, a esse título, da quantia de €750,00, verifica-se que condenou em quanta superior à que seria devida. E, assim sendo, improcede nesta parte o recurso.
Importa esclarecer que a Ré não recorreu do segmento decisório ora em causa – em que a condenou, a esse título, a pagar €750,00, pelo que não pode a Relação conhecer de tal questão, baixando o montante dessa condenação, sob pena de nulidade de acórdão por excesso de pronúncia relativamente ao objeto do recurso interposto pelo Autor.
Assim, e nesta parte, improcedem as conclusões do recurso do A.
***
V. Decisão

Em face do exposto, acorda-se:
A. Em negar provimento ao recurso interposto pela Ré, confirmando-se, na parte nele impugnada, a sentença recorrida.

B. Conceder parcial provimento ao recurso do A. e, em consequência, revogar a decisão recorrida na parte em que absolveu a Ré do pedido relativo ao pagamento de trabalho suplementar, a qual é substituída pelo presente acórdão em que se decide condenar a Ré, C…, Ldª, a pagar ao A., B…, a retribuição correspondente a 30 (trinta) minutos diários de trabalho suplementar no período compreendido entre 01.02.2007 até 19.03.2010 e, bem assim, a pagar a retribuição correspondente a uma hora diária de trabalho suplementar no período desde 20.03.2010 até à data do despedimento, sem prejuízo, em ambas as situações, do desconto dos períodos de ausências do A. ao serviço, tudo a liquidar, nos termos dos arts. 609º, nº 2, e 358º, nº 2, ambos do CPC/2013, no respetivo incidente de liquidação, sendo as quantias que, a tal título, se mostrem devidas acrescidas de juros de mora, à taxa legal, desde a data da liquidação das mesmas até efetivo e integral pagamento.

C. No mais, negar provimento ao recurso interposto pelo A., confirmando-se a sentença recorrida.

Custas do recurso interposto pela Ré, por esta.
Custas do recurso interposto pelo A., por este e pela Ré na proporção do decaimento que se fixa, provisoriamente, em ¾ para o A. e em ¼ para a Ré, sem prejuízo do apoio judiciário concedido ao A.

Porto, 20.06.2016
Paula Leal de Carvalho
Maria José Costa Pinto
António José Ramos
_______________
[1] Apoio concedido após revogação e renúncia do mandato conferido a anterior mandatário e ocorrida após a notificação da sentença recorrida.
[2] O legislador, no processo especial denominado de “Ação de impugnação judicial da regularidade e licitude do despedimento” introduzido pelo DL 295/2009, de 13.10 (que alterou o CPT) e a que se reportam os arts. 98º-B e segs, não definiu ou indicou a posição processual dos sujeitos da relação material controvertida; isto é, não indicou quem deve ser considerado, na estrutura dessa ação, como Autor e Réu, recorrendo, para efeitos processuais, à denominação dos sujeitos da relação material controvertida (trabalhador e empregador) – cfr., sobre esta questão Albino Mendes Batista, in A nova ação de impugnação do despedimento e a revisão do Código do Processo de Trabalho, Coimbra Editora, págs. 96 e segs. e Hélder Quintas, A (nova) ação de impugnação da regularidade e licitude do despedimento, in Prontuário do Direito do Trabalho, 86, págs. 144/145, nota 25. De todo o modo, por facilidade e tal como também a 1ª instância, quando nos referirmos ao Autor (A.) e Ré (R.) estaremos a reportar-nos, respetivamente, ao trabalhador e à empregadora.
[3] Cfr., por todos, os Acórdãos do STJ, de 25.9.96, CJ, Acórdãos do STJ, 1996, T 3º, p. 228, de 12.03.09, 22.04.09, 12.12.08, 10.12.08, www.dgsi.pt (Processos nºs 08S2589, 09S0153, 08S1905 e 08S1036), da Relação do Porto de 17.12.08, www.dgsi.pt (Processo nº 0844346).
[4] Acórdão do STJ de 12.03.09, www.dgsi.pt (Processo 08S2589).
[5] Cfr., designadamente, Diogo Vaz de Marecos, Código do Trabalho Anotado, Wolters Kluwer/Coimbra Editora, pág. 328/329, Maria do Rosário Palma Ramalho, Tratado de Direito do Trabalho, Parte II – Situações Laborais Individuais, 4ª Edição, Almedina, pág. 283.
[6] Proferido no processo n.º 34/10.7TTCLD.L1-4 e disponível em www.dgsi.pt.jtrp.
[7] Aprovado pelo Decreto-Lei n.º 452/99, de 5 de Novembro e alterado pelo Decreto-Lei n.º 310/2009 de 26 de Outubro.
[8] [(€ 1.300,00 x 8 anos) + (€ 1.300,00 : 12 meses x 8 meses)].
[9] (€ 825,00 : 22 dias) x 20 dias.