Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
1246/14.0YYPRT-A.P1
Nº Convencional: JTRP000
Relator: VIEIRA E CUNHA
Descritores: INJUNÇÃO
NULIDADE DA CITAÇÃO
ARGUIÇÃO NO PROCESSO EXECUTIVO
Nº do Documento: RP201611221246/14.0YYPRT-A.P1
Data do Acordão: 11/22/2016
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: CONFIRMADA
Indicações Eventuais: 2ª SECÇÃO, (LIVRO DE REGISTOS N.º 741, FLS.83-85)
Área Temática: .
Sumário: I – Sendo o título executivo um requerimento de injunção ao qual foi aposta a fórmula executória, a validade e a regularidade desse título aferem-se no procedimento da sua formação (artº 11º nº1 do diploma anexo ao D-L nº 269/98 de 1/9).
II – A fórmula executória aposta nos termos do artº 14º do diploma anexo vale por si, não carecendo de ser acompanhada de quaisquer outros documentos, e faz presumir a existência da obrigação cuja prestação se pretende obter coercivamente, com autonomia face à obrigação exequenda.
III – Nos termos do artº 729º al.d) CPCiv, adaptado ao procedimento de injunção como o permite o disposto no artº 731º CPCiv, na oposição à execução pode ser arguida a invalidade ou a falta da notificação no procedimento de injunção.
IV – Todavia, tal invalidade ou falta de notificação não pode ser conhecida no processo de execução, independentemente de oposição por embargos, se não for patente como causa de indeferimento liminar do título – artºs 726º nº2 al.a) e 734º nº1 CPCiv.
Reclamações:
Decisão Texto Integral: Rec. 1246/14.0YYPRT-A.P1. Relator – Vieira e Cunha. Adjuntos – Des. Maria Eiró e Des. João Proença Costa. Decisão recorrida de 25/2/2015.
Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Súmula do Processo
Recurso de apelação interposto na acção com processo de execução sumária nº1246/14.0YYPRT-A, da Instância Central da Comarca do Porto (1ª Secção de Execução).
Apelante/Executado – B….
Exequente – C…, S.A..

O Exequente intentou o presente processo de execução, na sequência de requerimento de injunção, que apresenta como título executivo, ao qual foi aposta fórmula executória.
Reclama um total de € 5.248,83.
Por requerimento avulso no processo, o Executado veio invocar nunca ter recebido qualquer notificação no procedimento de injunção, designadamente por inexistir a invocada convenção de domicílio, não sendo de aplicar o disposto no artº 12º-A D-L nº 269/98 de 1/9.
Tal inexistência de convenção pode ser provada através da junção aos autos do contrato celebrado.
Deve assim ser anulado todo o processado posterior ao citado requerimento de injunção, nulidade que é de conhecimento oficioso e pode ser arguida em qualquer estado do processo.
Em consequência, deve ser julgada extinta a execução e ordenado o levantamento das penhoras efectuadas.
Despacho Recorrido
Na decisão recorrida, o Mmº Juiz “a quo” indeferiu o requerido, com base em que os fundamentos invocados apenas caberiam como fundamentos de embargos de executado.
Conclusões do Recurso de Apelação:
(…)
C – Alguns dos fundamentos previstos no artº 729º CPCiv, por consubstanciarem nulidades, têm regime próprio de arguição, que extravasa o próprio âmbito dos embargos de executado, sendo mesmo de conhecimento oficioso, não tendo de estar confinados, quanto ao prazo e ao momento da sua alegação, aos embargos de executado.
D – É o caso da invocada falta de notificação do requerimento de injunção, pois se trata de nulidade processual de conhecimento oficioso – artº 196º CPCiv – e pode ser arguida em qualquer estado do processo, desde que se não considere sanada – artº 198º nº2 CPCiv – e o mesmo se aplica à nulidade, igualmente invocada, da notificação do requerimento de injunção, nos termos em que a mesma ocorreu.
E - O Executado, ora Apelante não teve qualquer intervenção no procedimento de injunção e o requerimento de invocação das nulidades foi a sua primeira intervenção nos Autos executivos.
F)- O Executado, ora Apelante, já reside na morada onde foi citado para a execução há mais de um ano.
G)- Na data que consta no requerimento de injunção como sendo a da sua entrega, já o Executado, ora Apelante, não residia na morada para onde foi endereçada a notificação.
H)- Não tendo ocorrido a convenção de domicílio, não havia que aplicar o disposto no artigo 12°-A do Decreto-Lei n.º 269/98 de 1 de Setembro.
I)- Assim tendo sucedido, aplicando-se, indevidamente, devido à falta de domicílio convencionado, o disposto no artigo 12°-A do Decreto-Lei n.º 269/98 de 1 de Setembro, tal notificação é ineficaz, não produzindo qualquer efeito, sendo considerada como inexistente;
J)- A notificação do requerimento injuntivo equivale, no procedimento de injunção, à citação na acção declarativa.
K)- Pelo que, não ocorrendo a notificação no procedimento de injunção, deve ser anulado todo o processado posteriormente ao respectivo requerimento (artigo 187°, alínea a) CPC).
L)- Esta nulidade processual, que advém da falta de notificação do requerimento de injunção é de conhecimento oficioso pelo Tribunal e pode ser arguida em qualquer estado do processo, não se considerando sanada na medida em que foi invocada na primeira intervenção processual do Executado, ora Apelante, após aquela omissão arguindo-a de imediato.
M)- Concomitantemente com a nulidade processual arguida, subsiste a própria nulidade daquela notificação do requerimento de injunção nos termos do previsto no nº1 do artigo 191º do Código de Processo Civil.
N)- Efectivamente, ao terem sido indevidamente observadas as formalidades prescritas na lei para o caso de domicílio convencionado, não tendo ocorrido qualquer convenção de domicílio, o mesmo é dizer que não foram observadas as formalidades prescritas na lei para este caso concreto.
O)- Nestes termos é nula a notificação do requerimento de injunção ocorrida, nos termos em que a mesma se operou.
P)- Ambas estas nulidades, de conhecimento imediato, provocam a inexistência do título executivo em que se fundamenta a presente execução pois, na prática, provocam a inexistência da fórmula executória aposta no requerimento executivo, sem a qual aquele não é considerado título executivo, levando à extinção da presente execução e levantamento das penhoras concretizadas e respectiva devolução dos valores penhorados ao Executado, ora Apelante.
Q)- Deve a Douta decisão ser revogada e substituída por decisão que considere procedentes e provadas as nulidades invocadas e declare extinta a execução e ordene o levantamento das penhoras e respectiva devolução dos valores penhorados ao Executado, ora Apelante.
Factos Provados
Encontram-se provados os factos relativos à tramitação processual e ao conteúdo da petição executiva e da decisão recorrida, supra resumidamente expostos.
Fundamentos
Em função das conclusões do recurso e do despacho em crise, a questão a apreciar no presente recurso será a de saber se a invocação de nulidade de citação no procedimento injuntivo, cuja fórmula executória é apresentada como título, caberia apenas ser suscitada em embargos de executado, ou, como pretende o Apelante, se poderia ser suscitada a todo o momento no processo executivo.
Vejamos então.
I
Não corroboramos a opinião do Recorrente, salvo o devido respeito.
Desde logo porque, sendo o título um documento que incorpora um requerimento de injunção ao qual foi aposta a fórmula executória, a validade e a regularidade do título aferem-se no procedimento da sua formação, razão pela qual, v.g., no artº 11º nº1 al.h) do diploma anexo ao D-L nº 269/98 de 1/9 se prevê a possibilidade de recusa do requerimento de injunção quando o pedido se não ajustar ao montante ou à finalidade do procedimento.
Por outro lado, a forma e o conteúdo do requerimento são regulados, na fase pré-judicial, designadamente pelo disposto no artº 10º nº2 do mesmo diploma anexo, onde se lê que no requerimento “o requerente deve indicar o lugar onde deve ser feita a notificação, devendo mencionar se se trata de domicílio convencionado, nos termos do nº1 do artº 2º do diploma preambular” – al.c).
Cumpridos, como foram, no caso concreto, estes requisitos, a fórmula executória aposta nos termos do artº 14º do diploma anexo vale por si, não carecendo de ser acompanhada de quaisquer outros documentos – cf. Dr. Joel T. Ramos Pereira, Julgar, 18º/115.
O título assim constituído é condição necessária e suficiente para a acção executiva e “faz presumir a existência da obrigação cuja prestação se pretende obter coercivamente, gozando de autonomia face à obrigação exequenda” – Ac.R.P. 3/4/08, pº 0831849, relator: Desemb. Freitas Vieira, na base de dados oficial.
De resto, o indeferimento liminar só poderia ocorrer – o que, acrescente-se, não integraria de qualquer forma a hipótese dos autos – se fosse manifesta a falta ou a insuficiência do título, nos termos do artº 726º nº2 al.a) CPCiv, e não existe falta ou insuficiência aparente no título executivo dos autos, nem essa é matéria do recurso.
Note-se que, independentemente da apresentação de embargos à execução, nos termos do artº 734º nº1 CPCiv, “o juiz pode conhecer oficiosamente, até ao primeiro acto de transmissão dos bens penhorados, das questões que poderiam ter determinado, se apreciadas nos termos do artº 726º, o indeferimento liminar ou o aperfeiçoamento do requerimento executivo” – mas encontramo-nos, uma vez mais, remetidos para as causas de indeferimento liminar que, como visto, não ocorrem relativamente ao título executivo dos autos.
II
No artº 729º al.d) CPCiv prevê-se que a oposição à execução possa ter como fundamento a “falta ou a nulidade da citação para a acção declarativa, quando o réu não tenha intervindo no processo”.
Adaptada ao procedimento de injunção, conforme o permite o disposto no artº 731º CPCiv, a norma deve ser interpretada como permitindo, na oposição à execução, arguir a invalidade ou a falta da notificação no procedimento de injunção – cf. Ac.R.P. 26/6/2012, pº 2856/11.2YYPRT-A.P1, relatado pela Desembª Mª Cecília Agante.
Entre as causas desta falta de notificação encontra-se precisamente a invocação de domicílio convencionado efectuada abusivamente, isto é, sem correspondência à realidade, podendo ainda o Executado demonstrar que nunca chegou a tomar conhecimento da notificação, designadamente por não residir, ou até nunca ter residido no local para onde a carta simples foi remetida, nos termos gerais do artº 188º nºs 1 al.e) e 2 CPCiv.
Trata-se aí porém, como afirmámos, de fundamentos de oposição à execução, posto que não existem ou existiram, no caso dos autos, fundamentos para o indeferimento liminar da execução, os quais teriam permitido, e apenas eles, o conhecimento da matéria invocada nos autos pelo Executado, nos próprios autos de execução. Veja-se, no mesmo sentido, o Despacho TRC 7/5/2013 Col.III/7 (Desembª Mª Domingas Simões).
Impõe-se, desta forma, a confirmação do despacho recorrido.
Resumindo a fundamentação:
I – Sendo o título executivo um requerimento de injunção ao qual foi aposta a fórmula executória, a validade e a regularidade desse título aferem-se no procedimento da sua formação (artº 11º nº1 do diploma anexo ao D-L nº 269/98 de 1/9).
II – A fórmula executória aposta nos termos do artº 14º do diploma anexo vale por si, não carecendo de ser acompanhada de quaisquer outros documentos, e faz presumir a existência da obrigação cuja prestação se pretende obter coercivamente, com autonomia face à obrigação exequenda.
III – Nos termos do artº 729º al.d) CPCiv, adaptado ao procedimento de injunção como o permite o disposto no artº 731º CPCiv, na oposição à execução pode ser arguida a invalidade ou a falta da notificação no procedimento de injunção.
IV – Todavia, tal invalidade ou falta de notificação não pode ser conhecida no processo de execução, independentemente de oposição por embargos, se não for patente como causa de indeferimento liminar do título – artºs 726º nº2 al.a) e 734º nº1 CPCiv.
Dispositivo (artº 202º nº1 CRP):
Na improcedência do recurso de apelação, confirmar o douto despacho recorrido.
Custas pelo Recorrente, sem prejuízo de Apoio Judiciário.

Porto, 22/XI/2016
Vieira e Cunha
Maria Eiró
João Proença