Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
71/12.7YRPRT
Nº Convencional: JTRP000
Relator: MARIA DE JESUS PEREIRA
Descritores: REVISÃO DE SENTENÇA ESTRANGEIRA
INTERDIÇÃO
REGULAMENTO
COMPETÊNCIA MATERIAL
Nº do Documento: RP2012052971/12.7YRPRT
Data do Acordão: 05/29/2012
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REVISÃO DE SENTENÇA ESTRANGEIRA
Decisão: INDEFERIDA
Indicações Eventuais: 2ª SECÇÃO
Área Temática: .
Legislação Nacional: REGULAMENTO (CE) Nº 2201/2003 DO CONSELHO DE 27/11
Sumário: I – O regulamento (CE) nº 2201/2003 do Conselho de 27/11 aplica-se às decisões que decretem a interdição:
II – Não compete ao Tribunal da Relação a apreciação das sobreditas decisões mas sim ao tribunal de Comarca ou Tribunal de Família e Menores.
Reclamações:
Decisão Texto Integral: Pc.71/12.7YRPRT
Revisão/Confirmação
De
Sentença Estrangeira.
Relatora Maria de Jesus Pereira
Adjuntos: Des. Henrique Araújo
Des. Fernando Samões

Acordam, em conferência, no Tribunal da Relação do Porto

1-Relatório.
O Ex.mo Procurador-Geral Adjunto intentou acção especial de revisão e confirmação de sentença estrangeira contra B…, solteiro, com residência actual em …, … – …. – …, Espanha alegando, em síntese, que:
- por sentença de 07-07-2011, proferida pelo “Juzgado de 1ª instância e Instrucción número uno – Astorga, Espanha” foi decretada a incapacidade do requerido, a qual equivale à nossa interdição;
- na mencionada sentença, foram os seus pais, C… e D…, nomeados tutores, cuja residência é a mesma do requerido;
- o requerido nasceu na freguesia e concelho de Murça no dia 06 de Novembro de 1994, estando o seu nascimento registado na CRC de Murça sob o nº 484 do ano de 2009 (sendo que o requerido nasceu a 6-1-1974);
- o réu foi regularmente citado para a acção, nos termos da lei do país do tribunal de origem e mostram-se observados os princípios do contraditório.
Conclui pela confirmação da referida decisão para que produza os seus efeitos em Portugal.

Por despacho nestes autos proferido a 17-04-2012 indeferiu-se liminarmente a petição com os seguintes fundamentos.
O nº1 do artigo 1094 do CPC manda atender ao que se encontra estabelecido nos regulamentos comunitários. Vejamos.
Como mencionado pelo Ex.mo Procurador-Geral Adjunto estamos perante uma incapacidade à qual de aplicam as disposições que fixam para os menores os meios de suprir o poder paternal, cujos meios se encontram regulados nos artigos 1921 do CC e seguintes e que é suprida através o instituto da tutela, regras estas que se aplicam à interdição – cfr. António Pais de Sousa e Carlos Frias de Oliveira Matias – Da Incapacidade Jurídica dos Menores, Interditos e Inabilitados – 2ª ed. pág. 247 a 249 – A esta situação é, pois, aplicável o regulamento (CE) nº 2201/2003 por força do seu artigo 1,nº2, alínea b).
O artigo 21, nº1, impõe o reconhecimento automático das decisões proferidas num Estado-Membro, mas, de seguida, permite a qualquer interessado a faculdade de requerer esse reconhecimento – cfr- nº 3 –
Este diploma entrou em vigor no dia 1 de Agosto de 2004 e desde de 1-03-2005 é aplicável a todos os Estados-Membros à excepção, porém, da Dinamarca – cfr. Regulamento / CE) nº 2166/2004 do Conselho de 2 de Dezembro de 2004 ponto 3 do Considerando –
Porque o Ex.mo Procurador-Geral tem interesse que seja declarada executória a decisão, tendo certamente em vista o seu averbamento no assento de nascimento do interdito, tal apreciação não é da competência desta Relação por força do artigo 68 do citado Regulamento que remete para a lista publicada no JOUE C40/02, de 17-02-2005 Lista 1, mas, sim, do tribunal de Comarca ou Tribunal de Família e Menores –
Como a acção foi proposta directamente neste Tribunal verifica-se a sua incompetência absoluta em razão da hierarquia de acordo com o disposto no artigo 101 do CPC, excepção que pode ser arguida pelas partes e deve ser suscitada oficiosamente pelo tribunal em qualquer estado do processo, enquanto não houver sentença com trânsito em julgado – art- 102 do CPC-
A incompetência absoluta em razão da hierarquia como excepção dilatória atento o estado dos autos conduz ao indeferimento liminar da petição inicial de acordo com o disposto no artigo 234-A, nº1, do CPC.

Vem agora o Ex.mo Procurador-Geral Adjunto requerer que sobre aquele despacho recaia acórdão nos termos do artigo 700, nº3, do CPC alegando, fundamentalmente, que o presente Regulamento é aplicável, independentemente da natureza do tribunal; às matérias civis relativas: a) Ao divórcio; à separação e à anulação do casamento; b) À atribuição, ao exercício, à delegação, à limitação ou à cessação da responsabilidade parental e inaplicável à incapacidade decretada ao requerido, porquanto decretada a maior, ou seja, que o referido Regulamento apenas se aplica à tutela e à curatela de crianças.
Conclui pedindo que se modifique a decisão proferida para outra que ordene a citação do requerido nos termos solicitados.

2-Delimitação dos fundamentos invocados.
- A questão colocada é a de saber se o Regulamento (CE) nº 2201/2003 do Conselho, de 27 de Novembro se aplica à presente revisão de sentença.

3-Fundamentação de direito.
Como doutamente referido pelo Ex.mo Procurador-Geral Adjunto a incapacidade resultante de interdição é apenas aplicável a maiores, pois que como nos ensina o Prof. Mota Pinto “os menores, embora dementes, surdos-mudos ou cegos, estão protegidos pela incapacidade por menoridade” – cfr. Teoria Geral do Direito Civil, 3ª ed. pág. 228 -.
Todavia este regime de incapacidade é “ idêntico ao da incapacidade por menoridade, quer quanto ao valor dos actos praticados em contravenção da proibição em que ela se cifra, quer quanto aos meios de suprir a incapacidade”- cfr. Prof- Mota Pinto obra citada pág. 229.
Daí que quando decretada são-lhe aplicáveis as disposições que regulam a incapacidade por menoridade, ou seja, que compete aos pais, no interesse dos filhos, velar pela segurança e saúde destes, prover ao seu sustento, dirigir a sua educação, e representá-los, bem como administrar os seus bens nos termos dos artigos 1878 e seguintes do CC aplicáveis por força do artigo 139 do mesmo diploma legal.
Ora, precisamente, in casu, os pais (nomeados tutores) exercem as responsabilidades parentais tal qual como se o interdito fosse menor, sendo certo que, como doutamente referido, a decisão cuja revisão se requer não pode em caso algum ser revista quanto ao mérito.
Assim, se a razão é a mesma nos dois casos, a mesma deve ser também a disposição – art. 8,nº3, do CC- cfr tb.Prof. Inocêncio Galvão Telles in Introdução ao Estudo de Direito – Coimbra Editora 2001- Vol. I. pág. 262/263-
Por isso, pensamos, salvo sempre o devido respeito, que a presente situação se enquadra no artigo 1º, nº2, alínea b) do Regulamento, porquanto aí se diz que “(..)” é aplicável (..) às matérias civis relativas à tutela, à curatela e outras instituições análogas” donde resulta , pois, a manutenção do despacho acima mencionado.
Decisão
Nestes termos, os Juízes desta secção cível do Tribunal da Relação do Porto acordam, em conferência, em manter o despacho que indeferiu liminarmente a petição.
Notifique.
Sem custas – art.4, nº1, alínea a), do RCP-

Porto, 29-05-2012
Maria de Jesus Pereira
Henrique Luís de Brito Araújo
Fernando Augusto Samões