Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
2724/12.0TBPVZ-A.P1
Nº Convencional: JTRP000
Relator: MANUEL DOMINGOS FERNANDES
Descritores: PROCEDIMENTO JUDICIAL
PROMOÇÃO E PROTECÇÃO DE MENORES
PROCESSO DE REGULAÇÃO DE RESPONSABILIDADES PARENTAIS
COMPETÊNCIA POR CONEXÃO
PROCESSO ARQUIVADO
Nº do Documento: RP20130218272724/12.0TBPVZ-A.P1
Data do Acordão: 02/18/2013
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: CONFIRMADA A DECISÃO
Indicações Eventuais: 5ª SECÇÃO
Área Temática: .
Legislação Nacional: ARTº 154º E 155º DO OTM
ARTº 79º, 80º, 81º DA LPCJP
Sumário: I - Como decorre das disposições constantes dos arts. 79.º, 80.º e 81.º da LPCJP e dos arts. 154.º e 155.º da OTM, a competência por conexão constitui um desvio à regra da competência territorial e, como excepção que é, o seu âmbito não deve ir além das situações ali expressamente previstas.
II - Quando nos artigos 154.º nº 1 e da OTM e 81.º nº 1 da LPCJP se fala em processos instaurados sucessivamente isso quer significar processos que sejam instaurados simultaneamente, uns a seguir aos outros ou em intervalos de tempo curto.
III - Assim o procedimento judicial de promoção e protecção só deve seguir os seus termos por apenso a um processo de regulação das responsabilidades parentais existente anteriormente, relativo ao mesmo menor, caso o mesmo ainda esteja ainda pendente e não também quando esteja findo e, portanto, arquivado há cerca de seis anos.
Reclamações:
Decisão Texto Integral: Processo nº 2724/12.0TBPVZ-A.P1-Apelação
Origem: Tribunal Judicial da Comarca de Vila do Conde-2º Juízo Cível.
Relator: Manuel Fernandes
1º Adjunto Des. Caimoto Jácome
2º Adjunto Des. Macedo Domingues
5ª Secção

Sumário:
I- Como decorre das disposições constantes dos arts. 79.º, 80.º e 81.º da LPCJP e dos arts. 154.º e 155.º da OTM, a competência por conexão constitui um desvio à regra da competência territorial e, como excepção que é, o seu âmbito não deve ir além das situações ali expressamente previstas.
II- Quando nos artigos 154.º nº 1 e da OTM e 81.º nº 1 da LPCJP se fala em processos instaurados sucessivamente isso quer significar processos que sejam instaurados simultaneamente, uns a seguir aos outros ou em intervalos de tempo curto.
III- Assim o procedimento judicial de promoção e protecção só deve seguir os seus termos por apenso a um processo de regulação das responsabilidades parentais existente anteriormente, relativo ao mesmo menor, caso o mesmo ainda esteja ainda pendente e não também quando esteja findo e, portanto, arquivado há cerca de seis anos.
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I-RELATÓRIO

Acordam no Tribunal da Relação do Porto:

O Ministério Público vem interpor recurso do despacho proferido em 10/12/2012, proferido nos autos do processo de promoção e protecção por intentado a favor do jovem B…, nascido a 11/01/2001, o qual indeferiu a sua apensação ao processo de regulação do poder paternal com o nº 2515/05.5TBPVZ que correu termos no 3º Juízo de Competência Cível do mesmo tribunal e que já se encontra arquivado.
Concluiu a respectiva alegação de recurso com as seguintes conclusões:
1) O presente recurso visa o despacho proferido pela Mma. Juiz a quo, datado de 10.12.2012, que indeferiu a autuação de um processo de promoção e protecção a favor de B… por apenso a um processo de regulação do exercício das responsabilidades parentais que correu, a favor do mesmo, mas que já se encontra arquivado.
2) As razões que determinam a apensação a processos pendentes mantêm-se plenamente válidas para a apensação a processos arquivados, tal como defendido numa Declaração de Princípio, do Exmo. Sr. Procurador da República, Rui Jorge Guedes Faria de Amorim, do Tribunal de Família e Menores do Porto, Declaração essa que seguiremos de perto.
3) De acordo com o Despacho n.° 3512010, do Exmo. Senhor Procurador-Geral Distrital do Porto, datado de 25.05.2010, ‘Devem assim os Senhores Magistrados do Ministério Público interpretar os artigos 154.°, n.° 1 da Organização Tutelar de Menores e 81.°, n.° 1 da Lei de Promoção e Protecção de Crianças e Jovens em Perigo, no sentido de que se deve requerer a apensação de um processo de promoção (...) a favor de um menor a qualquer outro processo já arquivado, assim propiciando uma visão de conjunto e uma melhor ponderação dos interesses do menor.” (negrito nosso).
4) Dos referidos textos legais, resulta que o legislador pretendeu que todos os Processos sucessivamente instaurados quanto à mesma criança fossem apensos ao mais antigo, independentemente do seu estado.
5) De acordo com o n.° 3 do artigo 9.° do Código Civil, “Na fixação do sentido e alcance da lei, o intérprete presumirá que o legislador consagrou as soluções mais acertadas e soube exprimir o seu pensamento em termos adequados.”.
6) Pelo que, não devemos presumir que o legislador se esqueceu de mencionar a expressão pendente no n.° 1 do artigo 154.° da Organização Tutelar de Menores, quando a inseriu no n.° 4 do mesmo artigo, antes devendo presumir que o legislador soube exprimir-se em termos adequados, uma vez que ubi lex non distinguit, nec nos distinguire debemus.
7) O entendimento constante do Despacho do Exmo. Sr. Procurador-Geral Distrital, ao qual aderimos na íntegra, faz cessar, quase por completo, os conflitos negativos quer entre os diferentes Magistrados do Ministério Público quer entre os diferentes Juízes.
8) Por outro lado, é o entendimento mais consentâneo com a defesa do Superior Interesse destas crianças pois, determinando que os vários e sucessivos processos sejam apreciados pelo mesmo Juiz e pelo mesmo Procurador-Adjunto, permite uma visão global da problemática e das especiais necessidades das mesmas e proporciona uma solução integrada e unitária dessa problemática,
9) evita a duplicação de diligências, exames/perícias e avaliações,
10) evitando, de igual modo, a duplicação de intervenções e de decisões eventualmente contraditórias.
11) Evitando-se a duplicação de diligências, simplificam-se as diligências e a tramitação processual. Se um Juiz e um Procurador-adjunto conhecem profundamente a realidade de um determinado agregado que acompanham no âmbito de um Processo de Promoção e Protecção, em caso de instauração de novo Processo de Promoção e Protecção (como acontece in casu), podem agilizar as diligências e evitar repetir algumas que já tenham sido realizadas no primeiro Processo.
12) Numa perspectiva interna, de organização do Ministério Público, o entendimento por nós perfilhado, cria uma cultura de responsabilização, uma vez que cada Magistrado sabe que o caso daquela criança em concreto tem que ser acompanhado por si e por mais ninguém, sabendo também que tem que ser ele a propor a providência tutelar cível adequada à estabilização da medida de protecção aplicada no Processo de Promoção e Protecção,
13) imprimindo-se, deste modo, não apenas celeridade processual, mas também possibilitando a definição de forma atempada do projecto de vida de cada criança, designadamente nas situações de encaminhamento para adopção.
14) Adoptando o entendimento da Mma. Juiz a quo, vai ser necessário averiguar se um determinado Processo está ou não findo porque tal elemento vai passar a ser decisivo para a aceitação da apensação, colocando-se ainda a questão de definir o conceito de “processo findo”.
15) Por outro lado, importará precisar há quanto tempo tal processo se encontra findo, se terminou por acordo ou por sentença, se se encontra muito ou pouco instruído, ... ou seja, um grande número de variáveis que, parece-nos, determinarão conflitos negativos de competência.
16) O entendimento por nós perfilhado é aquele que melhor realiza o Superior Interesse das Crianças, uma vez que de acordo com o mesmo, o processo de promoção e protecção que corre a seu favor, deve ser tramitado pelos Magistrados que já os conhecem.
17) Tal Princípio está na base não apenas dos artigos 154.°, n.° 1 da Organização Tutelar de Menores e 8l.°. n.° 1 da Lei de Promoção e Protecção de Crianças e Jovens em Perigo, mas também dos artigos 78.° e 80.°, ambos da Lei de Promoção e Protecção de Crianças e Jovens em Perigo.
18) Os argumentos supra esgrimidos não são elimináveis com o argumento que «a competência por conexão constitui um desvio à regra da competência territorial e como excepção que é o seu âmbito não deve ir além das situações ali expressamente previstas (crf. Acórdão da Relação de Coimbra de 16.11.2004, em www.dgsi.pt/jtrc.nsfl proc.n.° 1606/04)», uma vez que a competência territorial sempre pertencerá a este Tribunal.
19) A decisão recorrido viola o nº 1 do artigo 154.° da Organização Tutelar de Menores e o n.° 1 do artigo 81.° da Lei de Promoção e Protecção de Crianças e Jovens em Perigo.
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Não foram apresentadas contra-alegações.
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Colhidos os vistos, cumpre decidir.
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II- FUNDAMENTOS

O objecto do recurso é delimitado pelas conclusões da alegação do recorrente, não podendo este Tribunal conhecer de matérias nelas não incluídas, a não ser que as mesmas sejam de conhecimento oficioso-cfr. arts. 684º, nº 3, e 685º-A, nº 1 e 2, do C.P.Civil.
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No seguimento desta orientação é apenas uma questão a decidir:
a)- saber se é competente, por conexão, para conhecer a matéria do presente processo de promoção e protecção o 3º Juízo Cível do Tribunal de Vila do Conde, por aí já ter corrido um processo de regulação do poder paternal relativo ao mesmo menor-como defende o Digno Apelante-, ou se tem que ir à distribuição autónoma, por esse anterior processo já estar findo e arquivado-como decidiu a M.ª Juíza a quo.
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A)- FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO

É a seguinte a matéria de facto provada com interesse para a decisão:
1º)- O Ministério Público veio, por apenso ao processo de regulação do poder paternal que sob o nº 2515/05.5TBPVZ correu termos no 3º Juízo de Competência Cível do Tribunal de Vila do Conde, requerer procedimento judicial de promoção e protecção a favor do jovem B…, nascido a 11/01/2001;
2º)- Após a referida apensação a Srª juiz lavrou o seguinte despacho:
“Atenta a natureza da acção supra aludida os elementos-escassos-que ali se mostram juntos, pois tal acção terminou desde logo por acordo-,bem como o facto de tal processo se encontrar no arquivo e findo desde Junho de 2006, e, finalmente, a natureza destes autos de promoção e protecção, não se vislumbra fundamento legal para a apensação destes autos àqueles autos findos há mais de 6 anos.
Pelo que, remeta, de imediato, os presentes autos à distribuição, para serem sujeitos às normais regras de distribuição entre os juízos cíveis.
D.N.
P.V., d.s”.
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III. O DIREITO

Estatui o artigo 154.º da Organização Tutelar de Menores (OTM), aprovada pelo Decreto-Lei n.º 314/78, de 27 de Outubro (e na redacção que lhe foi introduzida pelo artigo 1.º da Lei n.º 133/99, de 28 de Agosto), sob a epígrafe de “Competência por conexão” que:
“1 – Se forem instaurados sucessivamente processo tutelar cível e processo de protecção ou tutelar educativo relativamente ao mesmo menor, é competente para conhecer de todos eles o tribunal do processo que tiver sido instaurado em primeiro lugar.
2 – No caso previsto no número anterior os processos correm por apenso.
(…)
5 – A incompetência territorial não impede a observância do disposto nos nºs 1 e 4”.
Por sua vez, dispõe o artigo 81.º, n.º 1, da Lei de Protecção de Crianças e Jovens em Perigo (LPCJP), aprovada pelo artigo 1.º da Lei n.º 147/99, de 01 de Setembro e a ela anexa, sob a epígrafe de “Apensação de processos”:
“1 – Quando relativamente à mesma criança ou jovem forem instaurados sucessivamente processos de promoção e protecção, tutelar educativo ou relativos a providências tutelares cíveis, devem os mesmos correr por apenso, sendo competente para deles conhecer o juiz do processo instaurado em primeiro lugar.
(…)”.
Face ao estatuído nos presentes normativos, a questão que agora se coloca é saber se a apensação só pode ocorrer relativamente a processos que estejam pendentes ou também deve ser aplicada a processos que já estejam findos e arquivados.
Deve, desde logo, reconhecer-se que a letra de ambos os preceitos não é suficientemente precisa no sentido de, sem qualquer dúvida, resolver a questão colocada.
Cremos, porém, que, ainda assim, a terminologia utilizada nos preceitos em causa, nos leva a concluir que a apensação só deve ocorrer quando os processos estejam pendentes.
Vejamos.
Quer num quer noutro normativo fala-se em processos “instaurados sucessivamente”.
Ora, o vocábulo “sucessivamente”significa “um a seguir ao outro sem interrupção” e também “várias vezes num período de tempo relativamente curto”[1], isto é, processos que são instaurados entre eles em intervalos de tempo curto, mas sempre de todo modo a pressupor que estejam pendentes, ou seja, activos e não arquivados, sendo pois, esse o sentido que decorre do texto da lei.[2]

No fundo e sem quaisquer rodeios, o que resulta dos preceitos em causa, quando lidos sem procurar que neles caiba uma ideia forçada, é que se forem instaurados simultaneamente ou em tempos relativamente curtos, vários processos em relação ao mesmo menor devem todos correr por apenso ao que for instaurado em primeiro lugar.
Esse é, de facto, o sentido que resulta das citadas normas quando lidas sem qualquer pretensão interpretativa que, de uma forma rebuscada, procure que nelas caiba um outro sentido técnico-jurídico que não esteve na mente do legislador, terreno, aliás, onde de um modo geral somos bastante férteis.
Acresce que, a teleologia dos preceitos em causa, parece-nos, que não comporta que se atribua ao regime de apensação de processos um âmbito de tal modo amplo que também abranja os processos findos e arquivados, com preterição das regras relativas à determinação do tribunal competente e da distribuição de processos.
Com efeito, como decorre das disposições constantes dos arts. 79.º, 80.º e 81.º da LPCJP e dos arts. 154.º e 155.º da OTM, a competência por conexão constitui um desvio à regra da competência territorial e, como excepção que é, o seu âmbito não deve ir além das situações ali expressamente previstas.[3]
Concentrar num só processo e perante o mesmo tribunal ou juízo todos os processos pendentes relativos à mesma criança ou jovem justifica-se neste âmbito, não só ou não tanto por razões de economia processual mas sobretudo por exigência dos princípios do “interesse superior da criança e do jovem” e da “proporcionalidade e actualidade da intervenção” previstos e definidos nas als. a) e e) do art. 4.º da LPCJP, os quais impõem a apreciação em conjunto e de forma harmonizada e actualizada de todas as situações que justificaram a sua instauração.
A norma do art. 80.º (e de algum modo também a norma do art. 81.º) da LPCJP é complementadora do princípio sobre o “processo individual e único” instituído no art. 78.º da LPCJP, segundo o qual deve ser organizado “um único processo para cada criança ou jovem”.
Significa, isto, portanto, que tanto a instauração de processo único, como a apensação de todos os processos que respeitem à mesma criança ou jovem visam, concentrar num só e mesmo processo, a apreciação em conjunto e globalmente de todas as situações que justificaram a sua instauração, e permitir uma decisão harmonizada e adequada ao momento e necessidades actuais da criança ou jovem em perigo.
É neste sentido e contexto que a apensação se configura como um acto aglutinador, necessário e útil às finalidades dos processos de promoção e protecção pendentes, de modo a justificar um desvio às regras de competência territorial e/ou da distribuição entre Juízes do mesmo tribunal territorialmente competente, a que o superior interesse da criança e do jovem que caracteriza e domina este tipo de intervenção judicial terá sempre que sobrepor-se.
Acontece que, pensamos, que as mesmas razões de utilidade e necessidade não se colocam, pelo menos com a mesma acuidade, relativamente à interdependência entre processos novos e processos findos.
Na realidade, nestes casos, a eventual necessidade e/ou utilidade para a decisão a proferir no novo processo de elementos já existentes em processos findos carece sempre de uma pré-avaliação ao seu conteúdo, não se assumindo com o mesmo cariz necessário e automático como ocorre entre processos pendentes.
Efectivamente, o processo findo até pode ter sido arquivado liminarmente ou não conter qualquer elemento relevante sobre a criança ou jovem para as finalidades concretas do novo processo, como sucederá nas situações referidas nos arts. 74.º e 111.º da LPCJP.
Todavia, a verificar-se tal utilidade de alguns dos elementos que constam do processo arquivado, sempre tais elementos podem ser juntos ao novo processo, através de certidão ou por avocação do próprio processo findo.
Resulta, assim, do exposto que não ocorrem relativamente aos processos findos as mesmas razões de utilidade e necessidade que justifiquem o desvio das regras de competência e de distribuição dos processos.
Contra esta ideia, argumenta-se que quando a lei pretendeu, para este efeito da apensação, fazer tal distinção entre processos ainda a correr termos e processos já findos, a mesma O.T.M.–e logo naquele artigo 154.º, mas n.º 4–veio fazê-lo, prevendo que as providências tutelares cíveis relativas à regulação do exercício do poder paternal, à prestação de alimentos e à inibição-do poder paternal corram por apenso à acção de divórcio ou de separação judicial litigiosos, mas pendente.
Não nos parece que este argumento seja consistente, uma vez que o mesmo se filia, quanto a nós, noutra ordem de razões.
Na verdade, toda a OTM, designadamente a parte atinente à regulação do exercício do poder paternal, tem como princípio enformador supremo, a defesa dos interesses e direitos dos menores.- art. 2.º e 180.º da OTM.
Ora, o Tribunal que mais bem colocado se encontra para a defesa dos direitos dos menores é aquele que tenha ou possa ter maior conhecimento do ambiente familiar em que foram criados os menores, quer pela vivência do drama que os articulados do divórcio já por si são susceptíveis de proporcionar, quer pelos trâmites desse próprio processo, que começa com uma tentativa de conciliação-art. 1407.º do CPC-, que, em caso de êxito, poderá vir a resultar:
- na cessação do processo de Regulação do exercício das responsabilidades parentais, por conciliação dos cônjuges- art. 1407.º-2, 1.ª parte do CPC e 1779.º nº 1 do C.Civil;
- no acordo obrigatório a respeito da regulação do exercício das responsabilidades parentais a que terá de chegar-se no caso de conversão do divórcio litigioso em divórcio por mútuo consentimento–art. 1419.º do CPC e 1779.º nº 2 do CC- , e para cuja tentativa de conversão pode ajudar sobremaneira o conhecimento dos factos já apurados ou as diligências em curso no processo de regulação, evitando duplicidade de processos;
- no conhecimento mais aprofundado das condições do casal, seus problemas, dramas e vicissitudes, que, em caso de sentença a decretar o divórcio, permitirá ao juiz regular com dados mais seguros o respectivo exercício, pois que, mais bem colocado para decidir esse exercício uma vez conhecidas as razões que levaram ao divórcio.
Desta forma, a regulação das responsabilidades parentais, no âmbito de uma acção de divórcio, pode assumir e muitas vezes assume carácter incidental, mas de suprema importância, sendo de trazer à colação-como acima se deixou dito-que se encontra legalmente previsto o seu funcionamento dentro da própria acção de divórcio (ou separação judicial de pessoas e bens) quando haja filhos menores.
Por outro lado, e para além de evitar a repetição de meios e diligências, ajudará, como já se disse, a uma visão mais panorâmica das vicissitudes e problemas do casal, designadamente no seu relacionamento com os filhos menores, podendo assim estabelecer-se uma regulação de exercício muito mais fundamentada e alicerçada em dados concretos que só o entrelaçar de acções permite divisar.
Ora, toda esta panóplia de vantagens apenas se alcança estando ainda pendente, quando as outras acções são instauradas, a acção de divórcio, e por isso, é que, nestes casos, o legislador, e bem, mandou proceder à sua apensação.
De resto, a competência por conexão, imprimida ao Tribunal do divórcio para o conhecimento da acção de regulação do exercício do poder paternal já estava intrinsecamente admitida no próprio processo de divórcio, na medida em que não pode haver divórcio litigioso sem que previamente se proceda à tentativa de conciliação ou ao menos à sua conversão para divórcio por mútuo consentimento; e não pode haver divórcio por mútuo consentimento–havendo filhos menores-sem que antes haja acordo ou se mostre regulado o exercício das responsabilidades parentais.[4]
Reunir ambos os processos num único Tribunal ou Juízo quando ambos estejam pendentes, é assim um acto útil, senão mesmo, necessário.
Nos termos legais, e em nome da economia processual e dos interesses dos menores, o Juízo onde corra o processo de divórcio deve aglutinar o processo de regulação, que por isso deve ser apensado àquele.
É por estas razões e não outras que, nestas situações, se revela de utilidade a apensação dos processos, utilidade essa que por exemplo na situação em apreciação não se verifica, tendo a acção de regulação do poder paternal terminado logo, no seu início, por acordo.
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Face ao exposto, salvo outro e melhor entendimento, a apensação das acções a que se referem os artigos 154.º nº 1 da OTM e 81.º da LPCJP apenas deve ocorrer entre processos que estejam pendentes, sendo isso mesmo que resulta dos citados normativos quando se referem a processos instaurados sucessivamente.
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Improcedem, assim, todas as conclusões formuladas pelo Digno apelante e, com elas, o respectivo recurso
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IV - DECISÃO

Termos em que acordam os Juízes nesta Relação em negar provimento ao recurso mantendo-se, assim, o despacho recorrido.
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Sem custas [artigo 4.º nº 1 al. a) DO RCP)].

Porto, 18/02/2013
Manuel Domingos Alves Fernandes
Manuel José Caimoto Jácome
Carlos Alberto Macedo Domingues
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[1] Dicionário da Língua Portuguesa Contemporânea, Academia das Ciências de Lisboa, Verbo, pág. 3474.
[2] O texto da lei é o ponto de partida da interpretação, sendo que, quando as normas (fórmulas legislativas) comportam mais que um significado, então a função positiva traduz-se em dar mais forte apoio ou a sugerir mais fortemente, um dos sentidos possíveis. É que, de entre os sentidos possíveis, uns corresponderão ao significado mais natural e directo das expressões usadas, ao passo que outros só caberão no quadro verbal da norma de uma maneira forçada, contrafeita. Ora, na falta de outros elementos que induzam à eleição do sentido menos imediato do texto, o intérprete deve optar em princípio por aquele sentido que melhor e mais imediatamente corresponde ao significado técnico-jurídico, no suposto (nem sempre exacto) de que o legislador soube exprimir com correcção o seu pensamento-Baptista Machado in Introdução ao Direito e ao Discurso Legitimador, Almedina pág. 182.
[3] Cfr. Ac. da Relação de Coimbra de 16-11-2004, em www.dgsi.pt/jtrc.nsf/ proc. n.º 1606/04.
[4] Embora noutro contexto legislativo, esta dependência já havia sido justificada no Assento do STJ de 24/7/79 ( BMJ 289, pág.140 ), que entretanto caducara, ao fixar a seguinte doutrina- “Em caso de divórcio ou separação judicial de pessoas e bens decretados por um Tribunal de Família a este compete a regulação consequente do exercício do poder paternal“.
Mais recentemente e no âmbito do direito comunitário, também a propósito da competência judicial para o poder paternal, o Regulamento (CE) nº 2201/2003 de 27/11 relativo à competência, ao reconhecimento e à execução de decisões em matéria matrimonial e em matéria de responsabilidade parental veio consagrar a interdependência entre ambas as acções, prescrevendo o art. 12.º nº 1 que os tribunais do Estado-Membro competentes para melhor decidir de um pedido de divórcio, de separação ou de anulação do casamento são competentes para decidir qualquer questão relativa à responsabilidade parental relacionado com esse pedidos quando se verifique qualquer da condições enunciadas nas alíneas a) e b), prevendo-se como única causa de cessação da competência o trânsito em julgado de qualquer das decisões ou um dos processos findar por outra razão [art. 12.º nº 3º als. a) e b) o que significa ser também suficiente para a conexão a pendência do processo de divórcio.