Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
72/14.0TTOAZ.P1
Nº Convencional: JTRP000
Relator: RUI PENHA
Descritores: IRREDUTABILIDADE DA RETRIBUIÇÃO
ABUSO DE DIREITO
CLÁUSULA PENAL
INDEMNIZAÇÃO
Nº do Documento: RP2015070872/14.0TTOAZ.P1
Data do Acordão: 07/08/2015
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO.
Decisão: NEGADO PROVIMENTO.
Indicações Eventuais: SOCIAL - 4ª SECÇÃO.
Área Temática: .
Sumário: I- A nulidade do acórdão, por contradição entre os fundamentos e a decisão, verifica-se, apenas, quando ocorre um vício real no raciocínio expresso na decisão, consubstanciado na circunstância da fundamentação explicitada na mesma apontar num determinado sentido, e, por seu turno, a decisão que foi proferida seguir caminho oposto, ou, pelo menos, diferente.
II- Salvo convenção expressa, a cláusula penal não se cumula com a indemnização legal.
III- A diminuição da retribuição apenas é possível nas específicas situações previstas no Código do Trabalho ou em instrumento de regulamentação colectiva de trabalho.
IV- Da circunstância de a um trabalhador, director geral da empresa, ao longo de três anos ter sido paga retribuição inferior à devida e de o mesmo não ter reclamado de tal situação não se pode concluir pela aceitação da retribuição que lhe foi paga, pois esta situação envolveria uma violação do princípio da irredutibilidade da retribuição.
V- Por isso, não age com abuso do direito o trabalhador que, decorridos esses três anos e na sequência da resolução do contrato de trabalho com outro fundamento, vem pedir o pagamento das diferenças entre a retribuição que lhe foi paga e a devida.\
VI- Mostra-se ajustada a fixação de uma indemnização de 15 dias de retribuição base e diuturnidades, por cada ano de antiguidade ou fracção, a um trabalhador, director geral da empresa, que resolveu o contrato de trabalho com justa causa, e em que, de relevante, apenas se apura que ocorreu falta de pagamento da retribuição mensal de € 5.884,00 durante três meses seguidos, sendo que tinha de antiguidade cerca de 10 anos, sendo deficitária a situação económica da empresa.
Reclamações:
Decisão Texto Integral:
Processo nº 72/14.0TTOAZ.P1

Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação do Porto

I- Relatório
B......., residente na Rua …., nº .., …, Oliveira de Azeméis, com patrocínio judiciário, veio intentar a presente acção declarativa de condenação, com processo comum, contra C......., Lda., com sede na Rua …, nº …, …, Águeda.
Formula o seguinte pedido:
a) Reconhecendo-se que assiste ao A. justa causa à resolução do contrato de trabalho operada por escrito pelo A. e que produziu efeitos em 4 de Dezembro de 2013 e, em consequência, declarando-se resolvido com justa causa o contrato de trabalho em 4 de Dezembro de 2013 e condenando-se a R. a pagar uma indemnização por danos patrimoniais e não patrimoniais no montante de €94.087,58 (noventa e quatro mil e oitenta e sete euros e cinquenta e oito cêntimos), bem como a quantia de €881,01 a título de ressarcimento dos danos emergentes do facto da R., com culpa, haver recusado a recepção da comunicação de resolução e não haver emitido e entregue ao A. a declaração da entidade patronal para efeito da candidatura do A. ao subsídio de desemprego;
sem conceder,
b) A considerar-se que a resolução produziu efeitos em data posterior a 4 de Dezembro de 2013, designadamente na data da comunicação por fax (09 de Dezembro de 2013) ou da realização da notificação judicial avulsa (10 de Janeiro de 2014), reconhecendo-se, declarando-se e condenando-se nos mesmos termos constantes da alínea a) deste petitório, apenas com os acréscimos que resultarão da dilatação temporal, nestas hipóteses, da data da eficácia da declaração resolutória, em termos de retribuição de férias, subsídio de férias e de Natal e de indemnização por danos patrimoniais e não patrimoniais emergentes da resolução do contrato de trabalho e do dano provocado ao A. pela R. em sede de subsídio de desemprego ao não emitir e enviar ao A. a declaração necessária para a candidatura do A. ao subsídio de desemprego, cuja liquidação deverá ser relegada para incidente de liquidação ou execução de sentença, condenando-se a R., nestas hipóteses, a pagar o que se vier a liquidar;
Em qualquer dos casos
c) Declarando-se nulo o abaixamento do salário mensal do A. de €5.884,00 para €1.500,00 e reconhecendo-se o direito do A. àquela retribuição base mensal de €5.884,00 também a partir de 1 de Janeiro de 2011, data até à qual foi paga ao A. a retribuição mensal base de €5.884,00 e na qual se operou a transmissão do estabelecimento industrial para a sociedade R.
d) Condenando-se a R. a pagar ao A. a quantia de € 509.147,14 (quinhentos mil cento e quarenta e sete euros e catorze cêntimos), a título de créditos de salário, subsídio de alimentação, de férias, subsídio de férias e de Natal discriminados no art. 59º da p.i., das diferenças de retribuição do período de 1 de Janeiro de 2011 a 04 de Dezembro de 2013, das retribuições em dívida referentes a 50% do subsídio de Natal de 2013, de férias proporcionais ao tempo de serviço em 2013, do subsídio de férias proporcional respectivo, da retribuição de Novembro de 2013 e de 4 dias de Dezembro de 2013, de diferença dos 50% de férias referente às férias vencidas em 1 de Janeiro de 2013, de diferença do subsídio de Natal de 2013 pago em duodécimos e de indemnização sob a forma de cláusula penal referida na cl. 6ª do contrato de trabalho (art. 12º desta p.i.).
e) Condenando-se a R. a pagar juros de mora, à taxa legal:- desde a data do seu vencimento e até integral pagamento quanto às prestações retributivas vencidas até à data da cessação do contrato de trabalho;- desde a data de citação, quanto às demais prestações retributivas e indemnizatórias já liquidadas;- desde a data do pedido de liquidação, quanto às prestações retributivas e ou indemnizatórias liquidandas.
Alega, em síntese:
1. O A. foi admitido ao serviço pela sociedade D......., S.A..
2. Para trabalhar sob as ordens e instruções dessa sociedade,
3. Mediante retribuição mensal ilíquida de €5.712,50 (cinco mil setecentos e doze euros e cinquenta cêntimos), susceptível de actualização anual mínima de 5%, a entrar em vigor a partir de 01 de Janeiro de 2004, subsídio de alimentação por cada dia de trabalho efectivamente prestado, bem como por férias, subsídio de férias e de Natal iguais, cada um e em cada ano, à retribuição de um mês.
4. Ficou também convencionado que integraria a retribuição a atribuição ao A. de uma viatura automóvel (carrinha da marca e modelo Audi A4) para uso permanente, profissional e pessoal do A., com direito a substituição por nova viatura, no mínimo de categoria equivalente, em cada período máximo de 4 anos.
5. No âmbito da retribuição contratualmente atribuída ao A. foi a este concedido o benefício de seguro de vida num montante de €1.500,00 como entrada de capital por cada ano.
6. O A. foi admitido ao serviço com contrato de trabalho sem termo e a tempo completo, prescindindo ambas as partes de período experimental, sendo o horário diário convencionado de 7,5 horas, cinco dias por semana.
7. Para exercer as funções de director-geral da empresa, reportando directamente à administração da sociedade e exercendo poder hierárquico sobre todos os departamentos da empresa.
8. O contrato de trabalho foi reduzido a escrito e assinado pelas partes.
9. Na cláusula 6ª do contrato de trabalho ficou expressamente consagrado o seguinte:
“1 – O presente contrato de trabalho é celebrado nos seguintes pressupostos e circunstâncias:
a) Foi a Primeira Outorgante que tomou a iniciativa de apresentar uma proposta ao Segundo Outorgante com vista à celebração deste contrato de trabalho;
b) Fê-lo sabendo que o segundo outorgante se encontrava vinculado por contrato de trabalho a outra entidade patronal há 17 anos;
c) Este contrato só podia ser celebrado se o Segundo Outorgante promovesse a cessação unilateral desse outro contrato de trabalho;
d) A denúncia do contrato de trabalho subsistente implicava prejuízo para o Segundo Outorgante emergente da perda da antiguidade adquirida ao serviço da sua anterior entidade patronal e das vantagens decorrentes da evolução consolidada da carreira profissional na respectiva empresa;
e) A Primeira e o Segundo Outorgantes acordam, como condição para a celebração do presente contrato de trabalho, que a Primeira pague ao Segundo a compensação indemnizatória prevista no número seguinte desta cláusula para o ressarcir dos já aludidos prejuízos.
2 – Os outorgantes acordam que, na eventualidade deste contrato de trabalho cessar por virtude de facto ou decisão exteriores à vontade do Segundo Outorgante, sejam de natureza objectiva (designadamente extinção do posto de trabalho, despedimento colectivo, caducidade, insolvência) ou culposa, ou em resultado despedimento com invocação de justa causa declarado ilícito judicialmente, a Primeira Outorgante obriga-se a pagar ao Segundo Outorgante a quantia de €300.000,00, a título de compensação indemnizatória prevista na alínea e) do número anterior, indemnização essa que se vencerá na data da cessação do contrato de trabalho em qualquer das circunstâncias referidas, salvo no caso de despedimento ilícito, em que se vencerá na data em que transitar em julgado a decisão judicial.”
10. Dois a três meses antes da sua admissão ao serviço da R., o A. foi contactado pessoalmente pelo Sr. E….., Administrador da sociedade D......., S.A., que o convidou para ir trabalhar na já referida empresa desta sociedade para exercer as funções acima especificadas, que se reconduziam ao “cargo” de director-geral da empresa.
11. O A. estava ao serviço da F......., S.A. desde 01 de Janeiro de 1987 e, quando lhe foi feito este convite, era, desde Abril de 1999, o Gestor da Plataforma Logística de Vila do Conde desta sociedade.
12. A posição do A. era sólida na “F.......” e ascendente em termos de remuneração e responsabilidade, sendo considerado um quadro com grande futuro na empresa.
13. Sair da F......., S.A. para ir trabalhar para a sociedade D......., S.A. implicava para o A. a perda da antiguidade adquirida ao serviço da “F.......” de já mais de 17 anos, a segurança e perspectivas de progressão profissional que tinha na “F.......” e a solidez desta empresa que lhe dava a expectativa legítima de emprego com futuro, pelo que só sairia da “F.......” se fosse assegurada uma compensação pecuniária para estes prejuízos e riscos, o que foi aceite pela contraparte.
14. Foi também considerado e aceite por ambas as partes que o montante da aludida compensação pecuniária devia ser dum valor que, por um lado, ressarcisse devidamente tais prejuízos e riscos e que, por outro lado, tivesse força compulsória no sentido de melhor garantir que a entidade patronal cumpriria de boa fé e integralmente o acordado tal como consta do contrato de trabalho.
15. As dificuldades da empresa da sociedade D......., S.A. acumularam-se e tornaram-se insuperáveis, acabando por esta sociedade ser declarada insolvente por sentença de 07 de Janeiro de 2008, já transitada em julgado.
16. Por escritura de 30 de Dezembro de 2010, foi realizada a alienação do estabelecimento industrial em liquidação da massa insolvente onde o A. prestava trabalho como director geral da empresa.
17. Nessa escritura a Sra. Administradora de Insolvência da sociedade “D......., S.A. – Em Liquidação” declarou que vendia o estabelecimento industrial à sociedade R. “C......., Lda.”.
18. Em resultado deste contrato, o estabelecimento industrial da insolvente, com todos os seus bens, direitos, créditos e trabalhadores foi transmitido à sociedade R..
19. Em resultado desta transmissão do estabelecimento industrial que se operou no final do ano de 2010, o A. passou a prestar o seu trabalho à sociedade R. como director-geral da empresa tal como antes o fazia.
20. A R. a partir de 1 de Janeiro de 2011 e até à cessação do contrato de trabalho retribuiu o A. com base na retribuição ilíquida mensal de €1.500,00, acrescida de subsídio de alimentação.
21. Esta redução da retribuição do A. ocorreu por decisão unilateral da sociedade R..
22. O A. não deu o seu acordo ao abaixamento da sua retribuição mensal.
23. O A. não interveio na escritura de transmissão acima referida.
24. Por carta datada de 22 de Novembro de 2013, enviada à R. por correio registado com aviso de recepção em 25 desse mesmo mês, o A. comunicou à R. que procedia à resolução com justa causa do contrato de trabalho.
25. Até à data da comunicação de resolução, não lhe tinham sido ainda pagas retribuições.
26. A conduta da R. alegada na comunicação de resolução do contrato de trabalho com justa causa foi adoptada pela R. para discriminar e humilhar o A..
27. Efectivamente o A. sentiu-se humilhado perante os colaboradores da empresa,
28. Que souberam do tratamento discriminatório adoptado pela gerência da R. em relação ao director-geral da empresa.
29. Tendo o assunto sido motivo de conversas onde se observou que o A. fora destituído de poderes na empresa e era tratado sem consideração.
30. O A. ficou nervoso e tenso,
31. Passou noites sem dormir.
32. E sente-se inseguro quanto ao futuro face à crise económica e à dificuldade de obter emprego.
33. Sendo certo que o A., face à conduta da R., não tinha quaisquer condições para continuar ao serviço da R..
Procedeu-se a audiência das partes, revelando-se infrutífera a tentativa de conciliação.
A ré veio contestar, alegando em síntese:
1. O A., desde 1 de Janeiro de 2011, até à data em que denunciou o contrato de trabalho, em 4/12/2013, bem sabia que o montante do seu salário mensal era de 1.500,00€, acrescido do subsídio de alimentação.
2. O A. nunca contestou o montante deste salário que lhe foi pago pela Ré durante quase 3 anos nem interpelou a Ré para lhe pagar as eventuais diferenças de vencimento.
3. É o salário mensal de 1.500,00€ que consta da Lista de Trabalhadores ao Serviço do Estabelecimento, documento complementar à Escritura Notarial realizada em 30/12/2010, constando do mesmo documento uma nota, referindo expressamente, que os salários ali indicados tiveram o acordo dos trabalhadores.
4. Dos muitos trabalhadores ao serviço da empresa D......., S.A., após a sua insolvência, só passaram a prestar serviço para a Ré os que quiseram e com o salário constante da referida Lista de Trabalhadores ao Serviço do Estabelecimento.
5. Quando o A. trabalhava para a sociedade comercial D......., S.A., usava o veículo automóvel de matrícula ..-LX- .. ,sua propriedade, e não um veículo pertencente á referida sociedade.
6. O contrato de trabalho que o A. juntou evidencia fortes indícios de ser falso.
7. O referido contrato está datado de 07 de Abril de 2003.
8. Porém, na Cláusula Nona do referido contrato está escrito textualmente: “Nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 98º da Lei nº 99/2003, de 27 de Agosto (Código do Trabalho), consigna-se que: …
9. Não foi encontrado o original do contrato na pasta de arquivo onde estão todos os outros contratos de trabalho elaborados pela sociedade comercial D......., S.A, nas datas próximas a Abril de 2003.
10. O contrato de trabalho junto aos autos pelo A. não tem o carimbo da Repartição de Finanças de Águeda comprovativo do pagamento do Imposto de Selo dos contratos.
11. Desde 06 de Janeiro de 2014, o A. já tinha deferido o Subsídio de Desemprego no montante diário de €32,63.
12. A Ré reconhece a falta de pagamento pontual das retribuições nos quantitativos e períodos de tempo constantes do art. 59º da p.i.
13. A Ré reconhece também que o A. tem direito ao pagamento dos créditos emergentes da cessão do contrato de trabalho.
14. A Ré reconhece que o A. trabalha para a Ré desde o dia 1 de Janeiro de 2011.
Pede a condenação do autor como litigante de má fé.
O autor respondeu pugnando pela improcedência das excepções e do pedido de condenação por litigância de má fé.
Realizou-se audiência prévia, tendo sido proferido despacho saneador, no qual se relegou para final o conhecimento das excepções, e fixado o objecto do litígio.
Foi fixado à acção o valor de € 603.234,72.
Procedeu-se à audiência de discussão e julgamento, com gravação da prova testemunhal nela produzida.
Foi proferida sentença, na qual se fixou a matéria de facto provada, que decidiu afinal: julgar parcialmente procedente a presente acção e, consequentemente, condena-se a R. “C......., Lda.” a pagar ao A.:
i) 50% do subsídio de férias correspondente às férias vencidas em 01.01.2013 e um duodécimo de subsídio de férias, vencidos em 31.08.2013, no montante de €812,50.
ii) a retribuição do mês de Agosto de 2013, vencida em 31.08.2013, no montante de €1.697,11 (salário mensal – €1.500,00 + subsídio de alimentação - €134,61 + duodécimo de subsídio de Natal de 2013 - €62,50);
iii) a retribuição do mês de Setembro de 2013, vencida em 30.09.2013, no montante de €1.759,61 (salário mensal – €1.500,00 + subsídio de alimentação - €134,61 + duodécimo de subsídio de férias - €62,50 + duodécimo de subsídio de Natal - €62,50);
iv) a retribuição do mês de Outubro de 2013, vencida em 31.10.2013, no montante de €1.772, 43 (salário mensal – €1.500,00 + subsídio de alimentação - €147,43 + duodécimo de subsídio de férias - €62,50 + duodécimo de subsídio de Natal - €62,50).
v) 50% do subsídio de Natal de 2013 no montante de €2.724,37.
vi) As férias proporcionais ao tempo de serviço prestado em 2013 no montante de€5.448,56.
vii) O subsídio de férias referentes às férias proporcionais ao tempo de serviço prestado em 2013, no montante de €5.448,56.
viii) O salário do mês de Novembro de 2013, acrescido do subsídio de alimentação e duodécimo de subsídio de férias e de Natal, no montante global de € 6.521,72.
ix) 4 dias de Dezembro de 2013 no montante global de €875,55.
x) As diferenças salarias do ano de 2011 e 2012, respectivamente, no valor de €61.376,00.
xi) As diferenças salarias do ano de 2013 no valor de €52.608,00.
xii) A diferença dos 50% do subsídio de férias referentes às férias vencidas em 1/1/2013 no montante de €2.192,00.
xiii) A diferença do subsídio de Natal de 2013 pago em duodécimos, no montante de €3.653,34.
xiv) A quantia de 62.761,60€ (sessenta e dois mil setecentos e sessenta e um euro e sessenta cêntimos) a título de indemnização decorrente da resolução do contrato por justa causa.
xv) O prejuízo decorrente da falta de subsídio de desemprego no montante de €881,01.
xvi) Tudo acrescido de juros de mora, nos termos do art. 559º do Código Civil, à taxa legal desde a data do seu vencimento e até integral pagamento quanto às prestações retributivas vencidas até à data da cessação do contrato de trabalho e desde a data de citação, quanto às demais prestações retributivas e indemnizatórias já liquidadas.
Absolvo a R. do demais peticionado.
Dos autos não se constata a decorrência de litigância de má fé.
Inconformada interpôs a ré o presente recurso de apelação, concluindo:
1. O Tribunal recorrido não fez inteira e completa justiça.
2. Com todo o devido respeito e salvo melhor entendimento, a douta sentença ora recorrida assentou em erro nos pressupostos de facto e de direito.
3. A junção aos autos, feita pelo A. de um contrato de trabalho falso configura litigância de má-fé do A.
4. Salvo melhor entendimento, a sentença recorrida, ao considerar que o A. não agiu com litigância de má fé, ao juntar aos autos um contrato de trabalho falso, (cf. nº 1, als. d) e e) do art. 256º do Código Penal, fazendo constar daquele documento uma data falsa e usando o documento para causar elevadíssimos prejuízos à Ré), a sentença incorreu em erro de julgamento sobre a factualidade dada como provada e numa incorrecta interpretação e aplicação do disposto no artigo acima citado e nos arts. 542º e 543º, ambos do Código de Processo Civil e art. 27º do Regulamento das Custas Processuais.
5. A sentença recorrida, ao reconhecer que o A tem direito a receber as diferenças de retribuição entre €1.500,00 e 5.884,00€, no período de 1/1/2011 a 4/12/2013, representando uma diferença de 4.384,00€, incorreu em erro de julgamento sobre a factualidade material e procedeu a uma incorrecta interpretação e aplicação do disposto no art. 334º do Código Civil, assentando em erro sobre os pressupostos de facto e de direito.
6. A sentença recorrida, ao decidir como decidiu, na questão das diferenças salariais, incorreu em erro de julgamento por errada aplicação e interpretação do direito aplicável (arts. 102º, 126º, 128º, nº 1, f), 285º a 287º do Código do Trabalho e artigos 227º, 236º, 334º e 335º do Código Civil).
Sem prescindir,
7. Entende a Ré que a conduta do A., peticionando aquelas astronómicas diferenças salariais, decorridos mais de três anos, após ter sido admitido a trabalhar para a Ré, integra uma conduta que deve ser sancionada como flagrante abuso de direito.
8. Também a indemnização decorrente da cessação do contrato de trabalho que o tribunal entendeu como adequado fixar os dias de retribuição base em 30 dias, por cada ano completo de antiguidade (10 anos) no montante global de 62.761,60€, deve ser fixado em 15 dias, por cada ano completo de antiguidade, nos termos do art. 396º, nº 1 do Código do Trabalho, por se considerar um valor mais justo e equitativo, atendendo ao caso concreto dos autos e, nomeadamente, à falta de recursos financeiros da Ré, para pagar montantes tão elevados, para não causar a inexorável sua insolvência e o despedimento dos trabalhadores.
9. Conforme foi alegado nos nº 83 da Contestação e documentalmente provado pelos documentos nº 10 e 11, e pelo depoimento da testemunha G......., da matéria de facto dada como provada devia constar que a sociedade comercial H....... – Import. Exp, Lda., com sede no Brasil, deve à Ré o montante de 113.851,13€ (Doc. 11) e a sociedade comercial I…., S.L., com sede em …., Espanha, deve à Ré o valor de 302.110,65€ (Doc.10).
10. Aqueles elevados valores não foram cobrados por desleixo e incúria e falta de zelo profissional do A, que exercendo a gerência de facto, devia diligenciar para cobrar atempadamente aqueles montantes.
11. Ainda devia constar como provado na matéria de facto constante da sentença o alegado no nº 78º da Contestação e provado documentalmente (Doc. nº 6): que a Ré, no ano de 2013, até á data da Contestação, tinha um exercício económico negativo no valor de 289.652,86€, verificando-se erro de julgamento sobre a factualidade dada como provada na sentença recorrida.
12. Nos pontos 10 e 11 dos Factos assentes, a sentença, ao considerar provado o teor da escritura pública, datada de 30 de Dezembro de 2010, sobre a alienação do estabelecimento industrial da insolvente “D......., Lda.”, devia ter considerado como provado que, em anexo a essa mesma escritura, consta o documento denominado “Lista de Trabalhadores ao Serviço do Estabelecimento”, junto aos autos com a P.I. do A. – Doc. nº 6 – e onde consta o nome do A. e o salário de 1.500,00€ mais 6,41€ de subsídio de alimentação, que passava a auferir na Ré, constando ainda do mesmo documento a notação “os salários tiveram o acordo dos trabalhadores” , verificando-se, mais uma vez, erro de julgamento sobre a factualidade dada como provada na sentença recorrida.
13. Como a Ré apelante defendeu na Contestação, o A. devia ter sido condenado como litigante de má fé, em multa e indemnização (cf. arts. 542º e 543º, ambos do Código de Processo Civil e art. 27º do Regulamento das Custas Processuais).
14. Como prescreve o nº 2 do art. 456º do CPC, a conduta do A. demonstra uma litigância de má fé, uma vez que o contrato de trabalho junto aos autos como prova documental é falso, pois, a data que consta no seu teor, como data de outorgação – 7 de Abril de 2003, não corresponde à realidade.
15. Tanto mais que o Tribunal ficou convicto de que o contrato de trabalho não foi elaborado na data constante no mesmo, isto é, que é um documento falso.
16. A Ré requereu uma peritagem ao referido documento, a qual não foi possível realizar unicamente por falta de meios técnicos do Laboratório da Polícia Científica.
17. Mas basta olhar com atenção para o original junto aos autos (fls. 128 a 131) para verificar que aquele documento foi elaborado em data muito recente, não tendo cumprido a formalidade da liquidação do imposto de selo, como era legal e era observado na Firma D......., Lda., tudo com bem salienta a sentença recorrida, na parte da Motivação.
18. Tudo leva a inferir que aquele contrato foi elaborado recentemente, para nele fazer constar, falsamente, a cláusula dos 300.000,00€ de indemnização que a própria sentença não considerou provada, conforme consta de i) dos Factos não provados e que ali foi incluída com a intenção de prejudicar a Ré, neste processo, tentando que o Tribunal atribuísse ao A. o montante de 300.000,00€!
19. Bem andou o tribunal em considerar que o contrato de trabalho junto aos autos não foi outorgado na data indicada no mesmo, desconhecendo-se quando o mesmo foi elaborado.
20. A testemunha E…., antigo administrador de “D......., S.A.” é, como consta da sentença, arrendatário do A. Isto é, em 2003, o A. foi contratado como trabalhador de “D......., S.A.” (ponto 1 de Factos assentes).
21. Em 7 de Janeiro de 2008, esta sociedade foi declarada insolvente, tendo a Exma. Sra. Administradora da Insolvência apurado na lista de créditos reconhecidos, o valor global de €11.696.569,07, dos quais o Instituto da Segurança Social, IP, requerente da insolvência, reclamava um crédito de €825.689,92, acrescido de €99.327,18 de juros (pontos 9 e 34 dos Factos provados).
22. Até a magnífica moradia do Sr. E.......é agora, por artes mágicas, propriedade do A., que a arrendou ao seu antigo patrão e ex-dono da moradia!
23. O A. começou a trabalhar para a Ré em 1 de Janeiro de 2011, sociedade comercial que iniciou a sua actividade sem qualquer passivo e com todas as instalações fabris pagas.
24. Passados pouco mais de dois anos e meio, já a sócia da Ré, J….., Lda. e o gerente da Ré, Senhor K......., tiveram que emprestar à Ré o montante de €305.989,46, para pagar salários aos trabalhadores, contribuições e até despesas correntes de funcionamento (pontos 13 e 35 dos Factos provados).
25. Sucede que actualmente o valor dos empréstimos e suprimentos é muito mais elevado.
26. Tudo isto mostra que é muito pouco razoável o que consta da sentença ao afirmar que “as testemunhas inquiridas de modo coerente (...) salientaram que o A. é uma pessoa com brio nas suas funções, com muito profissionalismo reconhecido pelas pessoas que laboraram com o mesmo”.
27. O recurso deve ser julgado procedente e o A. deve ser condenado como litigante de má fé em pagamento de multa e indemnização, conforme peticionado, nos termos dos arts. 542º e 543º do CPC e 27º do RCP.
Ainda com todo o devido respeito, a sentença recorrida, ao reconhecer que o A. tem direito a receber as diferenças de retribuição entre €1.500,00 e 5.884,00€, no período de 1/1/2011 a 4/12/2013, representando uma diferença de 4.384,00€, assim:
- 2011 (5.884,00€ - 1.500,00€ x 14) = 61.376,00€
-2012 (5.884,00€ - 1.500,00€ x 14) = 61.376,00€
-2013 (5.884,00€ - 1.500,00€) x 12 = 52.608,00€,
acrescendo a diferença dos 50% do subsídio de férias (cf. arts. 245º nº 1 al. b) e 263º nº 2 al. b) ambos do CT) referentes às férias vencidas em 1/1/2013: €2.192,00;
bem como diferença do subsídio de Natal de 2013 pago em duodécimos: €3.653,34, a sentença recorrida, ao decidir como decidiu, incorreu em erro de julgamento sobre a factualidade material e procedeu a uma incorrecta interpretação e aplicação do disposto nos arts. 102º e 126º, nº 1 do Código do Trabalho e 227º, 236º, 334º e 762º, nº 2 do Código Civil, assentando em erro sobre os pressupostos de direito e de facto.
28. Para fundamentar a sua decisão nesta questão, o Tribunal invoca o princípio da irredutibilidade da remuneração, o art. 285º a 287º do Código do Trabalho, vária jurisprudência e sobretudo a Escritura Pública da “alienação de estabelecimento industrial em liquidação da massa insolvente” junto aos autos.
29. A R. pugna, salvo melhor entendimento, que não deve manter-se a decisão recorrida neste aspecto das diferenças salariais, devendo a Ré ser absolvida do pagamento das diferenças salariais nos montantes do ano de 2011 e 2012, respectivamente, no valor de €61.376,00 e no ano de 2013 no valor de €52.608,00, acrescendo a diferença dos 50% do subsídio de férias (cf. arts. 245º nº 1 al. b) e 263º nº 2 al. b) ambos do CT) referentes às férias vencidas em 1/1/2013: €2.192,00; bem como diferença do subsídio de Natal de 2013 pago em duodécimos: €3.653,34.
30. O princípio da irredutibilidade da remuneração não é absoluto na nossa actual legislação nem, infelizmente, no dia a dia de milhares e milhares de trabalhadores, que viram os seus salários reduzidos, incluindo os magistrados judiciais.
31. A Lei do Contrato de Trabalho (LCT), aprovada pelo Decreto-Lei nº 49408, de 24 de Novembro de 1969, no art. 21º, nº 1, al. c), vedava à entidade patronal diminuir a retribuição, salvo nos casos previstos na lei, nas portarias de regulamentação colectiva ou quando, precedendo autorização do Ministério para a Qualificação e Emprego, haja acordo do trabalhador (art. 21º, nº 1, al. c), da LCT).
32. O actual Código do Trabalho dispõe no art. 129º, al. d) que é proibido ao empregador “diminuir a retribuição, salvo nos casos previstos neste Código ou em instrumentos de regulamentação colectiva de trabalho”.
33. As citadas disposições legais consagram o princípio da irredutibilidade da retribuição, ou seja, a proibição do empregador diminuir, unilateralmente, o seu montante.
34. Mas, pergunta-se, o legislador proíbe diminuir a retribuição em qualquer circunstância, mesmo havendo acordo do trabalhador? A Ré não tem que suportar o montante de 5.884,00€, quando assinou uma escritura pública com um documento anexo, rubricado por todos os outorgantes e onde constava que o A. passaria a auferir a retribuição salarial mensal de 1.500,00€, acrescida do subsídio de refeição.
35. Da mesma Lista constava que os novos salários dos trabalhadores ali indicados tinham o acordo dos trabalhadores, entre os quais estava o A. com o salário de 1.500,00€.
36. Caso o representante legal da Ré fosse devidamente esclarecido no sentido de que era obrigado a pagar ao A. o salário mensal de €5.884,00 nunca outorgaria a referida escritura.
37. A irredutibilidade da retribuição não pode, sob pena de criar situações absurdas, e de injustificada disparidade retributiva entre trabalhadores que desempenham funções semelhantes, ser entendida de modo formalista e desatendendo à substância das situações, nomeadamente a que consta da realização da escritura pública constante dos autos, que é contraditória e incoerente no seu conteúdo quando comparada com o documento anexo que dela faz parte integrante.
38. Colocados perante a questão de saber se face ao princípio da irredutibilidade da retribuição, o salário anterior do A. deverá ser mantido, mesmo quando o A. durante três anos não reivindicou a diferença e, como está provado (ponto 15 da sentença) “era o colaborador que, regularmente e com a posição hierárquica mais elevada, assumia a gestão quotidiana da empresa”, a resposta tem que ser negativa.
39. O A. tinha todas as condições internas e externas para processar o seu salário, conforme julgasse que era legal e devido, pois, repete-se, “assumia a gestão quotidiana da empresa”.
40. Foi da exclusiva vontade do A. processar ou mandar processar o seu salário no montante de €1.500,00 mensais durante quase 3 anos.
41. Sejamos claros: a nosso ver, a decisão constante da sentença conduz a um tão patente absurdo que é forçoso admitir, neste caso concreto, um desvio ao mencionado princípio da irredutibilidade da remuneração.
42. A recorrente requer a junção a este articulado de documentação muito relevante e que só recentemente, depois da decisão proferida, foi encontrada pelo gerente, Sr. K…..
43. E só por esta razão a documentação não foi junto aos autos em momento oportuno, mas cuja junção se requer ao abrigo do disposto no art. 651º, nº 1, parte final, do CPC.
44. No ano de 2011, o gerente da Ré, Sr. K…., acordou com o A. pagar-lhe a parte do salário que era sujeita a descontos obrigatórios, de modo a que o A. recebesse 1.500,00€ líquidos de remuneração mensal, conforme constava da Lista de Trabalhadores ao Serviço do Estabelecimento – Doc 1 e 2.
45. O A. recebeu por esta forma as importâncias de 1.327,21€ e 1.492,85€, conforme acordado entre o gerente e o A.
46. Estes pagamentos foram feitos por iniciativa do gerente, Sr. K….., mas com a concordância do A.
47. Analisada a decisão recorrida, constata-se que na questão primordial que se colocava nas diferenças salariais, em face da matéria de facto considerada por assente, não foi dada resposta de forma acertada e categórica nesta decisão, ao concluir-se, erradamente, que o A. tinha direito a receber as diferenças salariais.
48. Salvo o devido respeito, a decisão sindicada não está correctamente estruturada e devidamente fundamentada, devendo este Tribunal considerar a fundamentação deduzida neste articulado,
49. Pois, há necessidade de explanar outros raciocínios e atender o argumento muito convincente de que o A., com posição hierárquica mais elevada, assumindo a gestão quotidiana da empresa, nunca reivindicou o salário diferente do que lhe foi pago durante cerca de 3 anos.
50. Aliás, a Recorrente produziu na Contestação uma persistente alegação, que aqui se dá como reproduzida, ao apresentar o seu dissentimento em relação à reivindicação das diferenças salariais, pugnando por uma solução justa e equitativa.
51. Mas está agora convincentemente certa de que o Tribunal vai considerar relevante para o êxito do recurso, o contributo da documentação ora junta.
52. Entende a RECORRENTE que a sentença recorrida não decidiu o mérito da referida questão da forma juridicamente devida, violando, respectivamente, artigos 102º e 126º do Código do Trabalho e artigos 227º, 236º, 334º e 762º, nº 2 do Código Civil.
53. Concluindo, não deve ter-se como violadora do princípio da irredutibilidade retributiva que se extrai da proibição consagrada na al. d), do nº 1, do art. 129º do CT de 2009, o não pagamento ao A. do valor correspondente a €5.884,00 de salário mensal, acrescido de subsídio de alimentação, que auferia na sociedade “D......., S.A”, uma vez que a redução dessa retribuição para €1.500,00 de salário mensal, acrescido do subsídio de alimentação, não foi unilateralmente decidida pela Ré, tendo durante 3 anos a plena concordância do A.
54. Tal redução retributiva constava expressamente do documento anexo à Escritura Pública realizada em 30 de Dezembro de 2010, denominado “Lista de trabalhadores ao serviço do estabelecimento”.
55. Deve ser entendida como violadora do dever de agir de boa fé e com lealdade (art. 227º, nº 1, 239º do CC, 126º e 128º, nº 1, al. f) do CT), no exercício do direito da relação obrigacional laboral, a pretensão do trabalhador/Autor que desfrutava de uma posição hierárquica mais elevada e que assumia a gestão quotidiana da empresa, quando, passados, três anos, ao cessar o contrato de trabalho por sua iniciativa, só nesta altura, vem reivindicar as diferenças salariais em montantes que atingem centenas de milhares de euros, cujo pagamento levará a Ré à insolvência.
56. Da matéria de facto dada por assente, resulta claramente que o Tribunal recorrido jamais poderia ter considerado que a Ré reduziu ilícita e unilateralmente a retribuição do A.
57. Da matéria de facto dada por assente resulta, sem margem para dúvidas, que o Tribunal recorrido errou quando não considerou como provado que juntamente com a Escritura Pública da alienação do estabelecimento foi elaborada uma Lista com o nome do A. com o salário que passaria a auferir ao serviço da Ré.
58. A conduta do A. viola o princípio geral de direito civil que impõe que as partes procurem o balanço ou equilíbrio contratual e, nomeadamente, que as partes procedam de boa fé no cumprimento da obrigação e no exercício do respectivo direito (art. 762º nº 2 do CCivil).
59. O A. não pode andar 3 anos a violar as leis da Segurança Social e da Fazenda Nacional, não descontando os valores da TSU e não retendo na fonte o IRS correspondente ao valor do salário que agora vem reivindicar, sem incorrer nas penalidades da lei fiscal.
60 Da Lista anexa à escritura pública resulta sem margem para dúvidas que o Tribunal errou quando considerou que a RECORRENTE estava obrigada a pagar ao RECORRIDO as diferenças salariais em razão da diminuição da retribuição, pois, esta diminuição é lícita e foi feita com a concordância do A.
61. O RECORRIDO sabia que o montante da sua remuneração de €1.500,00 era a que constava da tal Lista, e sabia-o porque é isso que resulta do conhecimento que ele tinha do documento e que ele próprio juntou com a P.I.
62. A diminuição do salário do A. constituiu elemento essencial para a vinculação contratual da Ré, ao adquirir o estabelecimento da “D......., S.A.”
63. Assim, a diminuição da retribuição do A. é legítima porque resulta do estipulado no documento complementar do contrato a que a Ré e a Exma. Administradora da massa insolvente se vincularam de mútuo acordo, não havendo qualquer violação ao princípio da irredutibilidade da remuneração.
64. A irredutibilidade da retribuição não é impeditiva da supressão de atribuições patrimoniais, assim como não obsta a que, perante a redução da actividade da empresa no início da sua actividade, haja uma inerente diminuição salarial.
65. A RECORRENTE jamais violou as legítimas expectativas do RECORRIDO, pois, este sempre soube que a sua retribuição foi reduzida, em função do que constava da Lista de trabalhadores que não seriam despedidos, mas continuariam ao serviço da Ré.
66. O A. ao peticionar a diferença remuneratória, depois de durante 3 anos receber o salário mensal de 1.500,00€, está a agir com abuso de direito, na modalidade de venire contra factum proprium.
67. A Ré considerou que o A. tinha conhecimento que o seu salário era de 1.500,00€ pelo que sempre confiou que três anos depois do A. ser trabalhador da Ré, este nunca viria a peticionar um salário diferente.
68. A douta decisão recorrida decidiu que improcede a excepção de abuso de direito, citando a doutrina e alguma jurisprudência.
69. Ora, analisando o caso do Ac. do STJ, de 13 de Dezembro de 2012, citado na sentença, vemos que ele é completamente diferente do caso dos autos.
70. No caso dos autos, o A. era simultaneamente trabalhador e tinha também funções de gerência.
71. Conforme consta dos pontos 12 e 15 da matéria de facto, os gerentes raramente se encontravam presentes na empresa, e desde o início de 2012, nem sequer compareceram pessoalmente e o A., por regra, era o colaborador que, regularmente e com a posição hierárquica mais elevada, assumia a gestão quotidiana da empresa.
72. No caso dos autos, o A. tinha perfeito conhecimento dos seus direitos, não tinha receio de perder o emprego, era o gerente de facto e não tinha que ter quaisquer expectativas de reparação do alegado incumprimento por parte da Ré, pois, concordou até em receber uma compensação para que o seu salário líquido fosse de €1.500,00, assim entendendo o valor que constava da já mencionada Lista.
73. Assim, a conduta do A. demonstrada na factualidade provada na sentença excede manifestamente os limites impostos pela boa fé, pelos bons costumes ou pelo fim social e económico do direito, que se arroga.
74. O A. teve oportunidade de cessar o seu contrato de trabalho por sua iniciativa, pois, antes da insolvência de “D......., S.A.” tinha vários meses de salários em atraso.
75. Passaria a receber o subsídio de desemprego com base no salário mensal de €5.884,00, poderia exigir a alegada compensação de €300.000,00, além da indemnização decorrente da cessação do contrato, nos termos do art. 396º do CT.
76. E, mesmo assim, estranhamente, preferiu continuar ao serviço da Ré com a retribuição de €1.500,00.
77. Durante os últimos 3 anos, exercendo a gerência de facto, como ficou provado na sentença, a actuação do A. foi de tal modo desastrosa que a Ré, uma micro empresa familiar, já careceu de contrair empréstimos no valor de muitas centenas de milhares de euros, por falta de recursos financeiros.
78. No final de tudo isto, verdadeiro plano maquiavélico, orquestrado a longo prazo, o A. toma a iniciativa da cessação do seu contrato de trabalho e peticiona como créditos laborais a astronómica quantia de €603.634,72!
79. Na nossa modesta opinião, o juiz do direito do trabalho deve ter presente o primado do Estado democrático e social de Direito material, num contexto de uma vida económica que sirva as pessoas e a sociedade, uma vez que o actual Estado Português na U.E. é um Estado social, como resulta da nossa C.R.P.
80. A recorrente está naturalmente preocupada com a aceitabilidade racional da decisão recorrida pelos outros trabalhadores da Ré, que ganham ordenados muito menores, tendo presente o direito como uma ordem fundada na axiologia, na dignidade do ser humano e das pessoas inseridas em certa comunidade nacional, familiar e também local.
81. A escolha, a explicitação e a justificação (externa) das premissas de facto e de direito é hoje algo de perigosamente (por sair da lógica dedutiva) essencial em qualquer sentença.
82. Também a sentença recorrida, que condena uma PME à insolvência e declara o enriquecimento do A., aliás, desde há muito também empresário conforme declarou a sua esposa e outra testemunha na audiência de julgamento, implica “entender a lei melhor do que aqueles que participaram na sua feitura”.
83. Também a indemnização decorrente da cessação do contrato de trabalho que o tribunal entendeu como adequado fixar os dias de retribuição base em 30 dias, por cada ano completo de antiguidade (10 anos) no montante global de 62.761,60€, deve ser fixado em apenas 15 dias, por cada ano completo de antiguidade, nos termos do art. 396º, nº 1 do Código do Trabalho, por se considerar um valor mais justo e equitativo, atendendo ao caso concreto dos autos e , nomeadamente, à falta de recursos financeiros da Ré, para pagar montantes tão elevados, causando a sua inexorável insolvência e o despedimento dos restantes trabalhadores.
84. No caso dos autos, a falta de pagamento dos salários deve-se á gerência desastrosa do A. que esbanjou milhares e milhares de euros, conforme consta do ponto 35, não tendo conseguido cobrar as dívidas de clientes da Ré, pois, a I….. deve 302.110,65€ e a H.......- Import. Export. Deve 113.851,13€, só para mencionar estas duas.
85. Na verdade, como diz a sentença recorrida, os factos revelam uma situação crónica de remunerações em atraso, mas por culpa do A. que exercia a gerência de facto.
86. A indemnização fixada na sentença nos termos do art. 396º nº 1 do Código do Trabalho, no montante global de 62.761,60€ (sessenta e dois mil setecentos e sessenta e um euro e sessenta cêntimos) é desproporcionada e muito gravosa para o património da Ré.
87. A recorrente considera que a decisão recorrida contem um erro de julgamento sobre a factualidade dada como provada e não provada.
88. Conforme foi alegado nos nº 83 da Contestação e documentalmente provado pelos documentos nº 10 e 11, e pelo depoimento da testemunha G......., da matéria de facto dada como provada devia constar: Que a sociedade comercial H....... – Import. Exp, Lda., com sede no Brasil, deve à Ré o montante de 113.851,13€ (Doc 11) e a sociedade comercial I…., S.L., com sede em , Espanha, deve à Ré o valor de 302.110,65€ (Doc.10).
89. Ainda devia constar como provado na matéria de facto constante da sentença o alegado no nº 78º da Contestação e provado documentalmente (Doc nº 6): - Que a Ré, no ano de 2013, até á data da Contestação, tinha um exercício económico negativo no valor de 289.652,86€, verificando-se erro de julgamento sobre a factualidade dada como provada na sentença recorrida.
90. Nos pontos 10 e 11 dos Factos assentes, a sentença, ao considerar provado o teor da escritura pública, datada de 30 de Dezembro de 2010, sobre a alienação do estabelecimento industrial da insolvente “D......., Lda.”, devia ter considerado como provado que:
91. Em anexo a essa mesma escritura, consta o documento denominado “Lista de Trabalhadores ao Serviço do Estabelecimento”, junto aos autos com a P.I. do A. - Doc nº 6 - e onde consta o nome do A. e o salário de 1.500,00€, mais 6,41€ de subsídio de alimentação, que passava a auferir na Ré, constando ainda do mesmo documento a notação “os salários tiveram o acordo dos trabalhadores”, verificando-se , mais uma vez, erro de julgamento sobre a factualidade dada como provada na sentença recorrida.
92. Mostram-se violadas ou mal interpretadas e aplicadas as disposições legais constantes destas alegações, devendo ser interpretadas e aplicadas com o sentido supra referido.
O autor interpôs igualmente recurso da sentença, concluindo:
1. A douta sentença recorrida está ferida de nulidade em virtude de, salvo melhor opinião, se verificar contradição entre o teor do facto 8. dos “Factos Assentes/Provados” com a respectiva motivação e com outros factos dados como provados e ainda entre esse facto, tal como está dado como provado, e a decisão de improcedência total do pedido de condenação da R. no pagamento da cláusula penal de €300.000,00.
2. O A. suscitou esta questão da nulidade da sentença perante o Tribunal “a quo”, advertindo embora que noutro entendimento possível, se possa considerar que se trata de um erro de julgamento em sede de fixação da matéria de facto, nesse caso a ser analisado e decidido pelo Tribunal “ad quem”, razão porque retomamos nestas conclusões as questões suscitadas na arguição da nulidade da sentença deduzida em 1ª Instância.
3. A formulação dada ao facto 8. dos “Factos Assentes/Provados” contém uma contradição nos seus próprios termos, pois não fixa qualquer valor indemnizatório relativo à já mencionada cláusula penal por se não haver apurado o valor e os moldes do direito a essa verba quando o próprio teor do facto 8. contém os moldes em que se baseava a atribuição de tal verba.
4. O documento “contrato de trabalho” (doc. 1 junto com a p.i.) entrou em vigor em data anterior à declaração de insolvência da sociedade D......., S.A. (07.01.2008), pois a concretização da relação de trabalho nas suas várias facetas (retribuição, funções, horário, etc) corresponde às estipulações consagradas nesse contrato de trabalho e tem de se ter como seguramente demonstrado que o A. iniciou a prestação do seu trabalho à referida sociedade em 7 de Abril de 2003.
5. Não obsta à conclusão anterior o facto de na relação de créditos na insolvência da sociedade já referida nada ser dito sobre tal indemnização, pois o contrato de trabalho do A. não cessou com a declaração de insolvência nem poderia cessar a não ser que o Sr. Administrador da Insolvência comunicasse a cessação do contrato de trabalho (art. 391º do CT de 2003 e 347 do CT de 2009).
6. Verifica-se contradição entre o facto 8. e a respectiva motivação, por um lado, e a conclusão de que se não demonstrou qual o valor efectivamente estipulado pelas partes e, por outro lado, entre o teor do facto 8. fixado e a omissão da condenação da R. no que se liquidasse em execução de sentença ou, noutra alternativa, entre o facto fixado e a omissão da condenação da R. no pagamento da quantia que se liquidasse em execução de sentença, mas de valor nunca inferior a 150.000,00 €, constituindo tal contradição causa de nulidade da sentença por força do disposto no art. 615º nº 1 c) do C. Processo Civil.
7. A contradição entre o facto 8. dos “Factos Assentes/Provados” e a sua motivação revela-se , designadamente, nas posições expressas pelo Sr. Juiz “a quo” na douta sentença recorrida no sentido de que houve um acordo entre o A. e a sociedade D......., S.A. pelo menos quanto ao valor indemnizatório de 150.000,00€.
8. Na verdade, o Sr. Juiz atendeu aos depoimentos das testemunhas E...., L.... e M.... para concluir que foi acordada uma determinada verba que no início era de 150.000,00€, exarando mesmo que o tribunal aceita a existência de um acordo quanto à atribuição de uma indemnização.
9. Por sua vez a conduta do A. ao desvincular-se da “F.......” e ao iniciar de imediato a prestação do seu trabalho à mencionada sociedade constitui aceitação implícita da proposta de Fevereiro de 2003 por força do disposto no art. 234º do C. Civil.
10. Nunca poderá hipotizar-se que a indemnização poderá ser de valor inferior a 150.000,00 € quando a proposta da sociedade D......., S.A. era no valor de 150.000,00 € e o A., com a sua conduta de se desvincular da “F.......” e de passar a trabalhar para a referida sociedade, traduziu aceitação da proposta que fixou em 150.000,00 € a cláusula penal (art. 234º do C. Civil) no sentido de que estava em aberto a possibilidade de vir a ser convencionado um novo valor, mas que seria sempre do valor mínimo de 150.000,00 €.
11. É irrelevante o facto do exemplar do contrato de trabalho celebrado com o A. não conter o carimbo comprovativo do pagamento do imposto de selo quando em confronto com os exemplares de dois contratos de trabalho a termo celebrados com outrem, juntos pela R. e que contêm o carimbo comprovativo do pagamento do imposto de selo, pois era o empregador que tratava do imposto de selo e o pagamento deste ficava anotado nos exemplares dos contratos de trabalho em posse da empresa e não nos duplicados que ficaram para o trabalhador, que é exactamente o caso do exemplar junto pelo A..
12. A prova do contrato de trabalho subscrito pelo A. e pela sociedade D......., S.A., e muito em particular da sua cláusula 6ª não resulta apenas da análise do facto 8., da sua motivação e dos argumentos decorrentes da lógica interna da sentença, mas também da prova documental e testemunhal produzidas pelo A..
13. Quanto à prova documental ela é basicamente a seguinte: a proposta de condições do contrato de trabalho apresentada por escrito ao A. em Fevereiro de 2003 e o contrato de trabalho já assinado após o início da prestação de trabalho pelo A..
14. Não foram validamente impugnados pela R. tais documentos quanto à sua genuinidade, pois a R. reconheceu que os aparentes signatários dos dois documentos foram de facto os que realmente assinaram, ficando assim reconhecida a genuinidade desses documentos (arts. 374º e 376º do C. Civil e arts. 444º a 450º do CPC; e ainda José Lebre de Freitas (“A acção declarativa comum”, 3ª edição, páginas 235 e seguintes).
15. Apenas foi validamente impugnada a data do contrato de trabalho que, face à razão aduzida pela R., se aceita ter sido assinado pelas partes já depois de o A. ter sido admitido ao serviço, mas seguramente antes da declaração de insolvência da sociedade D......., S.A.. Aliás,
16. O A. não alegou que o contrato de trabalho foi celebrado por escrito, mas sim (cfr. art. 11º da p.i.) que o contrato “foi reduzido a escrito e assinado pelas partes”.
17. Em resultado da posição tomada pela R. face aos citados documentos tem de se ter como provada a genuinidade desses documentos (isto é, que são verdadeiros) e que os outorgantes emitiram as declarações contidas no documento; poderia a contraparte, face à apresentante, neste caso, alegar e provar a falsidade de algum dos factos declarados pelos subscritores dos documentos.
18. A R. não produziu qualquer prova susceptível de demonstrar que as declarações contidas no documento “contrato de trabalho” não são genuínas.
19. Por outro lado, foi concludente a prova produzida pelas três testemunhas que eram, à data, os administradores da sociedade D......., S.A.: E...., L.... e M.....
20. Foi reconhecida pelo próprio Tribunal “a quo” a seriedade, espontaneidade e honestidade dos depoimentos destas testemunhas, que foram valorados positivamente, acrescendo a sua fortíssima razão de ciência, pois foram as pessoas que subscreveram a proposta de contrato e o próprio contrato.
21. Foram considerados e tomadas em conta as seguintes partes dos seus depoimentos (aliás, transcritas no corpo destas alegações):
a) Testemunha E....: minutos 02:53 a 06:37, 07:25 a 07:43, 08:18 a 11:53, 13:06 a 13:12;
b) Testemunha L....: minuto 03:35 a 05:43, 06:00 a 08:39, 10:02 a 13:15;
c) Testemunha M....: minuto 04.03 a 05:20, 06:03 a 10:01, 11:33 a 11:43, 12:44 a 15:29, 15:46 a 16:15, 16:43 a 17:50.
22. Da conjugação da prova documental e testemunhal referida nestas alegações, e também nestas conclusões, e da sua apreciação critica, que evidencia a verosimilhança e a credibilidade de tal prova, é seguro tirar a conclusão de que o contrato de trabalho escrito junto aos autos é genuíno e traduz o acordo de vontades entre as partes.
23. Assim relativamente à matéria do facto 8. dos “Factos Assentes/Provados”, o recorrente entende que deve o mesmo ser ampliado e concretizado nos seguintes termos:
“Entre A. e a sociedade D......., S.A. foi celebrado o contrato de trabalho constante do documento no 1 junto com a p.i. cuja cláusula 6ª estipulava o seguinte:
“1 – O presente contrato de trabalho é celebrado nos seguintes pressupostos e circunstâncias:
f) Foi a Primeira Outorgante que tomou a iniciativa de apresentar uma proposta ao Segundo Outorgante com vista à celebração deste contrato de trabalho;
g) Fê-lo sabendo que o segundo outorgante se encontrava vinculado por contrato de trabalho a outra entidade patronal há 17 anos;
h) Este contrato de trabalho só podia ser celebrado se o Segundo Outorgante promovesse a cessação unilateral desse outro contrato de trabalho;
i) A denúncia do contrato de trabalho que era subsistente implicava prejuízo para o Segundo Outorgante emergente da perda da antiguidade adquirida ao serviço da sua anterior entidade patronal e das vantagens decorrentes da evolução consolidada da carreira profissional na respectiva empresa;
j) A Primeira e o Segundo Outorgantes acordaram, como condição para a celebração do presente contrato de trabalho, que a Primeira pague ao Segundo a compensação indemnizatória prevista no número seguinte desta cláusula para o ressarcir dos já aludidos prejuízos.
2 – Os outorgante acordam que, na eventualidade deste contrato de trabalho cessar por virtude de facto ou decisão exteriores à vontade do Segundo Outorgante, sejam de natureza objectiva (designadamente extinção do posto de trabalho, despedimento colectivo, caducidade, insolvência) ou culposa, ou em resultado de despedimento com invocação de justa causa declarado ilícito judicialmente, a Primeira Outorgante obriga-se a pagar ao Segundo Outorgante a quantia de 300.000,00 €, a título da compensação indemnizatória prevista na alínea e) do número anterior, indemnização essa que se vencerá na data da cessação do contrato de trabalho em qualquer das circunstâncias referidas, salvo no caso de despedimento ilícito, em que se vencerá na data em que transitar em julgado a decisão judicial.”
ou, sem conceder
“Ficou acordada uma verba cujo valor exacto não foi possível apurar, mas que era de pelo menos 150.000,00 € no caso da ocorrência de qualquer factualidade que cessasse o contrato de trabalho por motivos não imputáveis ao A., pelo dano sofrido na sua antiguidade e pelo acréscimo de risco profissional decorrente de se desvincular da anterior entidade patronal – F....... –, entidade que lhe dava a expectativa legítima de emprego com futuro.”
Ou, sem conceder
“Ficou acordada uma verba a pagar ao A. pelo dano sofrido na sua antiguidade e pelo acréscimo de risco profissional decorrente de se desvincular da anterior entidade patronal que lhe dava espectativa de trabalho com futuro no valor, termos e condições previstos na cláusula 6ª do contrato de trabalho junto aos autos, que se dá aqui por reproduzido”.
24. Igualmente, quanto ao acordo do A., como base mínima, à proposta de condições contratuais de Fevereiro de 2003 ele resulta da prova cabal produzida, muito em particular dos depoimentos das testemunhas L.... e M...., convicção formada na credibilidade e razão de ciência destas testemunhas e na correspondência dos seus depoimentos com a realidade da execução da relação contratual de trabalho:
- testemunha L....: minuto 06:00 a 08:08;
- testemunha M....: minuto 07:52 a 08:59
25. Deverão assim também ser dados como provados os factos alegados nos arts. 68º, 69º e 70º da resposta do A. à contestação.
26. Conduz inexoravelmente à conclusão de que se estabeleceu entre as partes um acordo mínimo que corresponde às condições propostas pela referida sociedade , pois foi ao abrigo delas que o A. aceitou desvincular-se da “F.......” e iniciou a prestação de trabalho para a sociedade D......., S.A., o que representa acordo implícito do A. conforme dispõe o art. 234º (2ª parte) do C. Civil.
27. Ademais, mesmo que se considerasse, no que se não concede, como validamente impugnados os dois documentos já referidos, sempre se teriam de considerar como provadas pela mencionada prova testemunhal as condições contratuais vertidas nesses dois documentos pois não era exigível a observância de forma escrita para este contrato e, consequentemente, a prova documental do mesmo (art. 102º do C. do Trabalho de 2003 e art. 110º do CT de 2007).
28. Por sua vez devem ser integrados nos factos assentes os factos vertidos nos arts. 16º a 23º e 25º da PI, resultando a sua inequívoca prova do depoimento credível e bem fundamentado das seguintes testemunhas:
a) testemunha N...., minutos 02:26 a 04:55, 06:20 a 10:20;
b) testemunha O..., minuto 01:17 a 02:10, 03:00 a 09:47;
c) testemunha P..., minuto 04:21 a 15:48.
29. O acordo contratual quanto à referida indemnização de 300.000,00€ confere a esta a natureza de cláusula penal que visa reparar os danos enunciados no facto 8. dos factos assentes bem como desempenhar um papel cominatório e dissuasor (art. 810 e 812 do C. Civil).
30. Dada a sua natureza de cláusula penal, resulta que:
a) Estando prevista e estabelecida a cláusula penal, o credor fica dispensado de demonstrar a efectiva verificação de danos em consequência do incumprimento do contrato e os respectivos montantes, pois a pré-fixação de indemnização visa claramente prescindir de averiguações sobre esta matéria;
b) Recai sobre o devedor o ónus de alegar e provar os factos que eventualmente integrem desproporcionalidade entre o valor da cláusula estabelecida e o valor dos danos a ressarcir ou um excesso da cláusula em relação aos danos causados, ficando o credor dispensado de fazer a prova quer dos danos quer do seu montante;
c) A faculdade de redução equitativa da cláusula penal, concedida pelo arto 812º, nº 1 do C. Civil não é oficiosa, estando dependente de pedido do devedor de indemnização, que poderá ser formulado “por via da acção ou da reconvenção ou de defesa por excepção, a deduzir na contestação, mas não apenas nas alegações”.
31Ora a R. não alegou nem provou qualquer facto atinente à verificação ou não dos danos e ao seu montante, não tendo também invocado qualquer desproporcionalidade entre os danos e a indemnização. Daí que só por mera cautela o A. reclamou a ampliação da base fáctica da acção nos sobreditos termos.
32. Na douta sentença recorrida está reconhecida a existência de danos, como se colhe do que o Sr. Juiz consignou na alínea C do capitulo “Do Direito”.
33. Verificada a existência dos danos e mesmo que não se considere liquidado o valor total ou parcial da indemnização desses danos, sempre estaria obrigado o Sr. Juiz “a quo” , apesar do A. ter formulado um pedido líquido , a relegar para execução de sentença a determinação desse valor, tendo violado, ao não o fazer, o disposto nos arts. 564º, 565º e 569º do C. Civil e 609º nº 2 do C. Processo Civil.
34. Daí que, concluindo-se como provado que foi pré-fixado em 300.000,00 € ou, noutra hipótese e sem conceder, no valor de 150.000,00€, deverá a R. ser condenada nos termos peticionados e assim ser a douta sentença de primeira instancia revogada na parte que dela o A. recorre.
35. A douta sentença recorrida violou o disposto nos arts. 234º, 374º, 376º nº 1, 564º, 565º, 569º e 810º do C. Civil, nos arts. 444º a 450º e 609º nº 2 do C. Processo Civil, nos arts. 102º, 347º e 391º do C. do Trabalho de 2003 e nos arts. 110º e 347º do C. do Trabalho de 2007.
O autor contra-alegou ao recurso da ré, concluindo:
1. Pretendendo a R. que o recurso abranja também a impugnação de decisões do Tribunal “a quo” em sede de fixação da matéria de facto, a R. tinha de dar cumprimento aos procedimentos estabelecidos no art. 640º do CPC, o que a R. não fez.
2. Nesta parte deverá ser rejeitado o recurso (art. 640º, nº 1 do CPC).
3. A R. juntou aos autos com as suas alegações dois documentos (fotocópias parcialmente ilegíveis de dois cheques e uma relação de valores e datas sem assinaturas), fazendo-o, porém fora das hipóteses excepcionais previstas nos arts. 425º e 651º, nº 1 do CPC, porquanto não se trata de documentos que não fosse possível à R. juntar aos autos nem a junção se tornou necessária por virtude do julgamento proferido.
4. Acresce que a R. pretende provar facto contrário ao expressamente por si própria admitido (cfr. art. 45º da p.i. e art. 1º da contestação).
5. Não deve assim ser admitida a junção dos referidos documentos, que devem ser desentranhados dos autos e devolvidos à R. e, se assim não for entendido, no que se não concede, impugnam-se tais documentos e não lhes deverá ser atribuída a virtualidade probatória e a de contrariar facto expressamente aceite pela R..
6. Inovando, veio a R. nas suas alegações introduzir questões como as referidas nos pontos 2. e 3. das suas alegações.
7. Contrariando a ideia que a R. pretende passar de que foi vítima de um negócio ruinoso, sublinha-se que, mesmo não tomando em consideração todo o demais património adquirido pela R., só os imóveis envolvidos na transmissão do estabelecimento industrial têm o valor patrimonial de €2.063.600,18.
8. A imputação feita nas alegações ao A. de ter usado o documento do contrato de trabalho para causar danos à R. carece de qualquer fundamento e é inverosímil, pois o contrato de trabalho é de 2003 e a R. só se constituiu em Outubro de 2010, cerca de 7 anos depois.
9. Não tem fundamento na matéria articulada pelas partes nem na prova feita a conclusão de que não foram cobrados créditos a clientes “por desleixo, inércia e falta de zelo profissional” do A. e a maldosa associação que a R. faz entre o objecto desta acção e a repetidamente falada qualidade do A. de senhorio de E...., administrador da sociedade D......., S.A..
10. É nova a questão de saber se a R. teria ou não outorgado a escritura de transmissão do estabelecimento se tivesse sido esclarecido que teria de pagar ao A. o salário mensal de €5.884,00 e contradiz a posição inicialmente assumida na contestação de que admitiu ao serviço o A. em 01.01.2011 mediante o salário mensal de €1.500,00 cuja apreciação neste momento não é admissível e em relação à qual o A. é estranho.
11. É falsa e mistificadora a alegação de que a declaração de insolvência conferia ao A. direito à indemnização que reclama e, apesar disto, não a reclamou, porquanto, contrariamente ao alegado pela R., o direito à indemnização só se constituiria, em caso de insolvência, se em virtude desta cessasse o contrato de trabalho, o que não foi o caso.
12. A ideia repetidamente expressa pela R. de que a celebração do contrato de trabalho entre o A. e a sociedade D......., S.A. teve como fim último e essencial prejudicar a R. não tem qualquer apoio nos factos nem é compreensível à luz duma apreciação sensata dos factos, pois contraria toda e qualquer regra de experiência que fosse dado determinado conteúdo a um contrato de trabalho para prejudicar uma sociedade que ainda não existia, que não se sabia se alguma vez existiria e que implicava para a contraente entidade patronal o pagamento das exigentes condições contratuais negociadas e acordadas com o A. por um período de tempo que poderia, como veio a ser, longo.
13. Quanto aos documentos “Proposta de Condições Contratuais”, “Contrato de Trabalho” são genuínos, como se demonstrou nas alegações de recurso que o A. apresentou, não podendo tais documentos, à luz dos factos e das normas e princípios jurídicos, ser classificados de falsos, sendo apenas admissível que poderá ser tido como falsa a data aposta no contrato de trabalho como data da sua outorga.
14. Mesmo que o A. tivesse dado o acordo à redução do seu salário, e não deu nem se provou que o tivesse dado, sempre ofenderia o disposto no art. 129º, nº 1, al. d) do CT, a redução da retribuição base do A., inexistindo fundamento de facto e de direito para que tal redução pudesse ser feita.
15. No presente caso, sendo embora ilegal e nulo todo o acto unilateral ou mediante acordo de redução do salário mensal auferido pelo A., no presente caso é ainda mais inverosímil e chocante a redução operada, pois o novo salário passou a ser apenas 25,4% do que antes auferia e 52,69% do que que auferia na “F.......”.
16. Não incorre em abuso de direito o A., ao reclamar as diferenças salariais identificadas nos autos, pois ao A. assiste o direito a essas diferenças retributivas, não deu o A. acordo à diminuição das suas retribuições e, mesmo que o acordo tivesse dado, no que se não concede, seria nulo tal acordo pois o direito à retribuição é indisponível.
17. Aliás, impedir o exercício deste direito pelo A. quando o art. 377º do CT lhe confere o direito de o fazer até um ano depois da data da cessação do contrato de trabalho equivaleria à denegação de um direito que a lei confere e à desvalorização da motivação do legislador nesta matéria que foi o de prolongar o prazo de prescrição para além da data da cessação do contrato de trabalho, pois só desse modo era assegurado que o trabalhador ficava numa situação livre de qualquer constrangimento para exercer os seus direitos.
18. Não pode também a R. invocar o abuso de direito quando nos articulados, e na audiência de julgamento não admitiu, total ou parcialmente, que o A. fosse titular do direito de crédito que invocou; se, como fez a R., se nega o direito invocado não assiste ao oponente o direito de se opor ao exercício desse direito por o mesmo ser supostamente abusivo.
19. A R., ao pretender reverter contra o A. as consequências da sua conduta ilícita, torna abusiva e ilegítima tal conduta à luz do princípio da boa fé e de acordo com a locução nominada “tu quoque”.
20. O A. litiga de boa fé reclamando direitos que se alicerçam na lei, no contrato individual de trabalho e em condutas ilícitas da R..
21. Ao invés, a R. litiga de má fé, invocando factos que sabe não corresponderem à verdade e fazendo um uso reprovável do processo, pelo que deverá ser condenada em multa e em indemnização à A., em valor pelo menos correspondente aos honorários a pagar ao seu mandatário, em montante, que, atenta a dificuldade da causa, o tempo despendido e o valor da acção, não deverão ser de valor inferior a €25.000,00.
22. A indemnização de antiguidade calculada na base da retribuição de um mês por cada ano de antiguidade está conforme ao disposto no art. 5º da Lei 69/2013 de 30/10.
23. A sentença, na parte em que condena a R. e que esta pretende impugnar pela via do recurso, está conforme aos factos e à lei, não merecendo censura.
Pede a condenação da ré como litigante de má fé.
A ré contra-alegou o recurso do autor, pugnando pela improcedência do mesmo.
Foi proferido despacho julgando improcedente a arguição de nulidade.
O Ministério Público teve vista nos autos, pronunciando-se pela improcedência de ambos os recursos.
Ambas as partes responderam ao parecer, pugnando pela procedência das respectivas pretensões.
Admitidos os recursos e colhidos os vistos legais, cumpre decidir.
Como se sabe, o âmbito objectivo dos recursos é definido pelas conclusões dos recorrentes (artigos 635º, nº 4, e 639º, nº 1 e 2, do CPC, por remissão do art. 87º, nº 1, do CPT), importando assim decidir quais as questões naquelas colocadas.
Recurso do autor:
I. Nulidade da sentença;
II. Impugnação da matéria de facto;
III. Obrigação de pagamento da indemnização contratual por cessação do contrato de trabalho;
IV. Condenação da ré como litigante de má fé.
Recurso da ré:
I. Impugnação da matéria de facto;
II. Litigância de má fé por parte do autor;
III. Valor da retribuição devida ao autor;
IV. Abuso de direito;
V. Valor da indemnização decorrente da cessação do contrato de trabalho.

II. Factos provados:
Na sentença foram considerados como provados os seguintes factos:
1. O A. foi admitido pela sociedade “D......., S.A.” em Abril de 2003.
2. Para trabalhar sob as suas ordens e instruções.
3. O A. no ano de 2010 e antes da outorga da escritura pública id. em 10., auferia o rendimento mensal ilíquido de 5.884,00€,
4. acrescido de subsídio de alimentação.
5. (em branco).
6. O horário convencionado foi de 37,50 horas semanais.
7. Para exercer as funções de director-geral da empresa, reportando directamente à administração da sociedade e exercendo poder hierárquico sobre todos os departamentos da empresa.
8. Ficou acordado uma verba a ser atribuída, em valor e em moldes não concretamente apurado, no caso da ocorrência de qualquer factualidade que cessasse o contrato de trabalho por motivos não imputáveis ao A., pelo dano sofrido na sua antiguidade e pelo acréscimo de risco profissional decorrente de se desvincular da anterior entidade patronal – F....... –, entidade que lhe dava a expectativa legítima de emprego com futuro.
9. A sociedade D......., S.A. foi declarada insolvente em 7 de Janeiro de 2008.
10. Por escritura pública datada de 30 de Dezembro de 2010 foi efectuada a “alienação do estabelecimento industrial em liquidação da massa insolvente” outorgada entre a legal representante (Administradora da Insolvência) da sociedade “D......., S.A., em liquidação” – e a ora R. – cf. fls. 25 a 29 cujo teor e dá por integralmente reproduzido –, onde se constata que a R. aceitou a transmissão plena do aludido estabelecimento e dos bens imóveis, móveis, créditos, direitos e obrigações laborais (...)”.
11. Sendo realçado na escritura que “também como contrapartida da transmissão do estabelecimento industrial, a sociedade adquirente assume, de forma exclusiva, todos os direitos e obrigações decorrentes dos contratos de trabalho dos trabalhadores identificados no documento complementar anexo a esta escritura, contratos esses que, a partir da presente data passam a vigorar entre ela e os referidos, mantendo os trabalhadores a antiguidade, categorias profissionais e as retribuições que vêm auferindo na insolvente e que ali estão mencionadas, bem como assume, também de forma exclusiva e sem direito a imputar qualquer custo à transmitente, a obrigação de lhes pagar integralmente, no momento em que forem exigíveis, as retribuições vencidas a partir da presente data, as retribuições relativas às férias ainda não gozadas, respectivo subsídio, relativos ao trabalho prestado no ano em curso e a de lhes permitir a efectivação do direito às férias ainda não por ele gozadas.
Que ainda como contrapartida da transmissão do estabelecimento industrial, a sociedade adquirente assume também a obrigação de dar preferência, nas admissões de pessoal que vier a efectuar até trinta e um de Agosto de dois mil e onze, aos trabalhadores que se encontravam ao serviço da insolvente “D......., S.A.” em um de Janeiro de dois mil e dez e que entretanto cessaram os respectivos contratos de trabalho.
12. Em resultado da alienação referenciada em 10. o A. laborou na sociedade R., como director-geral, funções que anteriormente exercia.
13. A R. a partir de 1 de Janeiro de 2011 e até à cessação do contrato de trabalho liquidou junto do A. a retribuição ilíquida mensal de €1.500,00, acrescido de subsídio de alimentação.
14. Por carta datada de 22 de Novembro de 2013, enviada à R. por correio registado com aviso de recepção no dia 25 do mesmo mês, o A. comunicou à R. que procedia à resolução com justa causa do contrato de trabalho – cf. fls. 32 a 34 cujo teor se dá por integralmente reproduzido.
15. Como os gerentes da R. raramente se encontravam presentes na empresa, e desde o início de 2012 nem sequer compareceram pessoalmente, o A., por regra, era o colaborador que, regularmente e com a posição hierárquica mais elevada, assumia a gestão quotidiana da empresa.
16. Até à data da comunicação da resolução, id. em 14., não tinham sido liquidadas, como ainda não foram, as seguintes retribuições:
i) 50% do subsídio de férias correspondente às férias vencidas em 01.01.2013 e um duodécimo de subsídio de férias, vencidos em 31.08.2013, no montante ilíquido de €812,50 e líquido de €571,29;
ii) a retribuição do mês de Agosto de 2013, vencida em 31.08.2013, no montante ilíquido de €1.697,11 e líquido de €1.196,46 (salário mensal – €1.500,00 + subsídio de alimentação - €134,61 + duodécimo de subsídio de Natal de 2013 - €62,50);
iii) a retribuição do mês de Setembro de 2013, vencida em 30.09.2013, no montante ilíquido de €1.759,61 e líquido de €1.241,25 (salário mensal – €1.500,00 + subsídio de alimentação - €134,61 + duodécimo de subsídio de férias - €62,50 + duodécimo de subsídio de Natal - €62,50);
iv) a retribuição do mês de Outubro de 2013, vencida em 31.10.2013, no montante ilíquido de €1.772, 43 e líquido de €1.252,60 (salário mensal – €1.500,00 + subsídio de alimentação - €147,43 + duodécimo de subsídio de férias - €62,50 + duodécimo de subsídio de Natal - €62,50).
17 A R., até 4 de Novembro de 2013, não procedera ao pagamento aos demais trabalhadores das suas equivalentes retribuições do mesmo período e a igual título referidos em 16.
18. Por determinação expressa da R. dirigida ao A., este processou a “folha de salários” relativa ao mês de Outubro de 2013, nela tendo o A. incluído todos os trabalhadores incluindo ele próprio.
19. Na referida “folha de salários” o A. manuscreveu que quanto a dois vendedores da empresa (Q...... e R......), tinham cessado os respectivos contratos de trabalho em 11/10/2013 e estava em curso o cumprimento do acordo de pagamento de montante e na forma que fora negociados pelo Sr. S...... e pelo Dr. T...... com estes vendedores.
20. No fax do A. que acompanhava a referida “folha de salários” e que o sócio-gerente da R. Sr. K...... recebeu, o A. anotou o facto do Dr. T...... lhe ter transmitido que, por ordens do sócio-gerente da R. Sr. K......, a retribuição a processar para pagamento era a de Outubro de 2013 e não, contrariamente ao que era prática habitual, as mais antigas em dívida, neste caso o salário de Agosto de 2013 mais a parte do subsídio de férias em falta.
21. A “folha de salários” remetida pelo A. e recebida pelo Sr. K...... foi-lhe por este devolvida com o seu nome e o de dois colegas de trabalho riscados por cima e com cálculos manuscritos pelo Sr. K...... donde decorria que não for considerado o pagamento da retribuição do A. e da dos outros referidos colegas, sendo previsto o pagamento aos demais trabalhadores, procedimento que se confirmou ao terem sido, como foram, emitidos pela gerência cheques para pagamento a todos os trabalhadores da empresa, à excepção do A. e dos outros colegas de trabalho, cheques esses que foram entregues pelo A. aos seus destinatários.
22. Não obstante não ter sido paga a retribuição do A. que aos demais foi paga, o A. remeteu o mapa integral de retribuições para a Segurança Social e para a Autoridade Tributária, facto que foi censurado posteriormente pela gerência e por esta exigido que fossem abatidos os encargos que em sede de TSU e de IRS resultavam para a empresa relativamente aos trabalhadores constantes do mapa de retribuições.
23. O A. juntou e remeteu com a comunicação de resolução com justa causa do contrato de trabalho os modelos “Declaração de retribuições em mora” e “Declaração de Situação de Desemprego” de modo a serem emitidas e assinadas pela gerência da R., tendo advertido a R. de que caso não o faça no prazo de cinco dias úteis a contar da data da recepção da comunicação, recorriam aos meios legais adequados para o efeito.
24. Os CTT, em 29 de Novembro de 2013, tentaram entregar à R. a carta remetida pelo A. que continha a resolução do contrato de trabalho, o que não conseguiram porque na R. não atenderam.
25. O funcionário dos CTT deixou na sede da R. aviso de que se encontrava depositada a carta na Estação dos Correios e de que devia a R. aí levantá-la.
26. Os CTT através do seu funcionário U......, que manuscreveu assinou e datou, exararam no sobrescrito, com data de 4 de Dezembro de 2013, que a R. recusou receber a carta, como efectivamente sucedeu, pelo que a mesma foi devolvida ao A.
27. O A. remeteu missiva dirigida ao Sr. K......., na sua qualidade de sócio-gerente da R., para o fax com o nº 2346624243, no dia 9 de Dezembro de 2013, cópia da comunicação de resolução do contrato de trabalho acompanhada da comunicação explicativa do facto de se haver remetido por correio, que a R. recusou receber, e do caráter complementar desta comunicação via fax.
28. Na pessoa do sócio-gerente da R., Sr. K......, foi efectuada, em 10 de Janeiro de 2014, a notificação judicial avulsa, da comunicação da resolução.
29. Perante a conduta da R., exarada em 16. a 22. o A. sentiu-se humilhado perante os colaboradores da sociedade tendo ficado nervoso e tenso.
30. Sente-se inseguro quanto ao futuro face à crise económica.
31. A R. por não ter entregue o impresso necessário para efeitos de subsídio de desemprego teve de recorrer à ACT para a emissão da respectiva declaração.
32. O A. candidatou-se ao subsídio de desemprego, começando a receber o respectivo subsídio em 6 de Janeiro, no montante diário de €32,63.
33. Na R. estava a ser aplicado o regime de pagamento ao subsídio de férias e de Natal previsto na Lei nº 91/2013, de 28/11: pagamento em duodécimos de 50% destes subsídios e o pagamento dos restantes 50% no início de gozo de férias (que na R. foi em Agosto) e até 15 de Dezembro quanto ao subsídio de Natal.
34. O Instituto da Segurança Social, IP, requerente da insolvência da sociedade “D......., S.A.” reclamava um crédito de € 825.689,92 acrescidos de €99.327,18 de juros, tendo a Exma. Sra. Administradora da Insolvência apurado, na lista de créditos reconhecidos, o valor global de €11.696.569,07.
35. A sócia da R. J….. Lda e o gerente da R. (K.......) emprestaram à R. o montante de 305.989,46€ para pagar salários aos trabalhadores, contribuições e até despesas correntes de funcionamento.
36. Os administradores da sociedade D......., S.A. subscreveram um documento denominado por “proposta de condições contratuais – Empresa C…..”, dirigida ao A., datada de 12/2/2003 do seguinte teor:
-Vencimento base líquido de 3500 €uros, sendo a base de cálculo usada para chegar a este valor totalmente abrangida por todas as disposições legais em vigor para a tributação e impostos e a cargo da empresa;
- Atribuição de viatura de 5 lugares – carrinha Audi A4 ou equivalente, sendo uma viatura de meu uso exclusivo e permanente, com todos os encargos legais e de manutenção a cargo da empresa;
- Celebração de contrato de seguro de vida e de saúde;
- Atribuição de telemóvel de serviço;
- Pagamento dos custos de alimentação e deslocações em serviço;
- Entrada na empresa com contrato de trabalho efectivo por tempo indeterminado;
- Regime de isenção de horário de trabalho;
- Reserva de verba a ser atribuída no valor de 150.000€ com actualização anual igual ou superior à taxa de inflação verificada, no caso de qualquer situação com que a empresa se depare e que extinga o posto de trabalho ou necessidade de manter o colaborador após a entrada em funções;
- Este contrato terá validade permanente durante todo o período de permanência na empresa.
E foi considerado como não provado:
i) No contrato de trabalho outorgado entre as partes, à data da admissão do A. e em vigor antes da data referenciada em 9. ficou expressamente consagrado o seguinte:
1 – O presente contrato de trabalho é celebrado nos seguintes pressupostos e circunstâncias:
a) Foi a Primeira Outorgante [D......., S.A.] que tomou a iniciativa de apresentar uma proposta ao Segundo Outorgante [B…..] com vista à celebração deste contrato de trabalho;
b) Fê-lo sabendo que o segundo outorgante se encontrava vinculado por contrato de trabalho a outra entidade patronal há 17 anos;
c) Este contrato só podia ser celebrado se o Segundo Outorgante promovesse a cessação unilateral desse outro contrato de trabalho;
d) A denúncia do contrato de trabalho subsistente implicava prejuízo para o Segundo Outorgante emergente da perda da antiguidade adquirida ao serviço da sua anterior entidade patronal e das vantagens decorrentes da evolução consolidada da carreira profissional na respectiva empresa;
e) A Primeira e o Segundo Outorgantes acordam, como condição para a celebração do presente contrato de trabalho, que a Primeira pague ao Segundo a compensação indemnizatória prevista no número seguinte desta cláusula para o ressarcir dos já aludidos prejuízos.
2 – Os outorgantes acordam que, na eventualidade deste contrato de trabalho cessar por virtude de facto ou decisão exteriores à vontade do Segundo Outorgante, sejam de natureza objectiva (designadamente extinção do posto de trabalho, despedimento colectivo, caducidade, insolvência) ou culposa, ou em resultado despedimento com invocação de justa causa declarado ilícito judicialmente, a Primeira Outorgante obriga-se a pagar ao Segundo Outorgante a quantia de €300.000,00, a título de compensação indemnizatória prevista na alínea e) do número anterior, indemnização essa que se vencerá na data da cessação do contrato de trabalho em qualquer das circunstâncias referidas, salvo no caso de despedimento ilícito, em que se vencerá na data em que transitar em julgado a decisão judicial.
ii) Não obstante a remuneração efectuada em 13., foi prometido ao A. pela R. que, por forma a estudar, viria a ser assegurada a retribuição que antes auferia e essa promessa manteve o A. inerte, sempre na expectativa de que seria cumprida, repondo-se o salário que antes auferia (5.884,00€) e as diferenças salariais que se iam vencendo e se venceram em 1 de Janeiro de 2011 em diante.
iii) O fax mencionado em 27 foi recepcionado pelo sócio gerente da R.
iv) Perante a conduta da R., exarada em 16. a 22, o A. passou noites sem dormir tendo o assunto sido motivos de conversas entre os colaboradores da empresa, onde se observou que o A. fora destituído de poderes na empresa e era tratado sem consideração.
v) O salário auferido pelo A. junto da R. teve a concordância do A.
vi) A R. não pagou pontualmente os salários do A. unicamente por falta de recursos financeiros e pela ruptura da tesouraria.

III. Questão prévia (junção de documentos)
A ré veio juntar com as alegações de recurso quatro documentos, que consistem em cópia de dois cheques emitidos a favor do autor, datados de 2011 e 2012, e dois documentos intitulados “valores a receber para perfazer o valor 1.500€”.
Também juntou, com a resposta às alegações do autor, cópia da apresentação de participação crime apresentada por K...... contra o autor, E…. e L.... por falsificação de documentos, em data de 2014, que não se mostra legível, e uma carta datada de 29-6-2011.
A propósito dos primeiros alegou a ré, nas conclusões das suas alegações de recurso:
A recorrente requer a junção a este articulado de documentação muito relevante e que só recentemente, depois da decisão proferida, foi encontrada pelo gerente, Sr. K....... E só por esta razão a documentação não foi junto aos autos em momento oportuno, mas cuja junção se requer ao abrigo do disposto no art. 651º, nº 1, parte final, do CPC.
O autor respondeu sustentando que:
Para justificar a junção de documentos com as suas alegações de recurso, a R. alega “ex novo” que, “no ano de 2011, o gerente da R. Sr. K...... acordou com o A. pagar-lhe a parte do salário que era sujeita a descontos obrigatórios, de modo a que o A. recebesse 1.500,00 líquidos de remuneração mensal, conforme consta da “Lista de Trabalhadores ao Serviço do Estabelecimento” e que, em consequência, o A. recebeu “as importâncias de 1.327,21 € e 1.492,85 €, conforme acordado entre o gerente e o A.”, acrescentando que “estes pagamentos foram feitos por iniciativa do gerente Sr. K......, mas com a aprovação do A.”.
Os documentos que a R. pretende agora juntar aos autos contradizem, como a seguir se demonstrará, o alegado pela R. nos seus articulados e nas suas próprias alegações de recurso, documentos esses que o A. impugna:
- o doc. 2 (designado por “valores a receber para perfazer o valor de 1.500 €”) por desconhecer o A. quando, quem e com que finalidade foi elaborado tal documento e a que correspondem exactamente os valores constantes deste documento, não se aceitando a sua genuinidade;
- o designado doc. 1 (fotocópias, aparentemente, da frente de dois cheques, apenas parcialmente legíveis) não sabendo o A. se corresponde à verdade a letra e assinatura delas constantes e qual a finalidade da sua emissão.
Se forem cópias de cheques da conta ou contas tituladas em nome do Sr. K......., sócio-gerente da R. ou em nome da R., o que se não consegue descortinar nas cópias a que o A. teve agora acesso, impugnam-se tais cheques quanto à sua genuinidade e ao alcance que a R. lhes atribui, tanto mais que a posição da R. ora defendida contradiz o por si alegado na contestação, como se vai ver.
Ademais, sendo cheques da conta do sócio-gerente da R. ou desta própria, a R. a eles tinha e tem fácil e imediato acesso, só não os tendo juntado aos autos antes porque o não quis, não porque o não pudesse fazer.
Além do já dito sobre estes documentos, há que realçar a circunstância da R. nunca haver alegado, directa ou indirectamente o que agora vem alegar e pretende provar.
Relativamente aos segundos, refere a ré nas contra alegações ao recurso do autor:
A empresa D......., S.A. nunca teve registada uma provisão no montante de €150.000,00, ainda mais actualizada pela taxa de inflação, para fazer face à responsabilidade que teria assumido, tratando-se de mais um documento com indícios de falsidade, como se provará no Inq. 314/14.2T3AGD- DIAP – Águeda. Doc. 1
(…) só há poucos dias, a gerência da Ré encontrou, com grande surpresa, nos escritórios da sua sede, onde funcionava também o escritório de I……, S. L., o documento que se pede vénia para juntar, nos termos do art. 651º, nº 1, última parte, do CPC, em que o A./Recorrente, assina uma carta, datada de 29 de Junho de 2011, em papel timbrado desta empresa, como representante da Direcção Geral de I….., S.L., dirigindo-se a V…. – DIST. BRICOLAGE, SA ….. PORTIMÃO, comunicando a concessão da Certificação FSC, tudo indicando que o A., ao mesmo tempo que trabalhava para a Ré, também era trabalhador da I….., auferindo remuneração, configurando esta conduta um gravíssimo acto ilegal, de oportunismo e deslealdade para com a Ré. Doc. 2
Respondeu o autor:
(…) voltou a R. voltou a juntar documentos aos autos na fase do recurso; desta vez, a R. juntou uma cópia do que aparenta ser uma participação crime. Dado que a pretendida junção destes documentos não cabe dentro das hipóteses previstas no art. 651º, nº 1 do CPC, não deve a mesma ser admitida.
Nos termos do art. 651º, nº 1, do CPC, as partes apenas podem juntar documentos às alegações nas situações a que se refere o art. 425º ou no caso de a junção se ter tornado necessária em virtude do julgamento proferido em 1ª instancia.
Mais se acrescenta no art. 423º, nº 1, que os documentos destinados a fazer prova dos fundamentos da ação ou da defesa devem ser apresentados com o articulado em que se aleguem os factos correspondentes.
Porém, se não forem juntos com o articulado respetivo, os documentos podem ser apresentados até 20 dias antes da data em que se realize a audiência final, mas a parte é condenada em multa, exceto se provar que os não pôde oferecer com o articulado (nº 2 do mesmo preceito).
Mais se acrescenta no nº 3 ainda do art. 423º que, após o limite temporal previsto no número anterior, só são admitidos os documentos cuja apresentação não tenha sido possível até aquele momento, bem como aqueles cuja apresentação se tenha tornado necessária em virtude de ocorrência posterior.
O art. 425º do CPC acrescenta que, depois do encerramento da discussão só são admitidos, no caso de recurso, os documentos cuja apresentação não tenha sido possível até àquele momento.
No caso os primeiros documentos têm datas 2011 e 2012, pelo que tendo a ré apenas alegado que o seu legal representante apenas os encontrou recentemente, justificação manifestamente insuficiente.
Quanto aos segundos, os mesmo foram juntos já após as alegações, pelo que igualmente se revelam extemporâneos.
Assim, não se admite a junção dos documentos, os quais deverão, oportunamente, ser desentranhados e devolvidos à ré, que é condenada, nos termos do art. 443º, nº 1, do CPC, em 1 (uma) UC de multa.

IV. O Direito
1. Nulidade da sentença (recurso do autor)
Alega o autor:
A nulidade da sentença que ora se vem invocar tem como causa a circunstância da decisão sobre o facto 8. dos “Factos Assentes/Provados” no que respeita ao “valor” e “moldes”, estar em contradição com a respectiva motivação e com outros factos dados como provados e de tal contradição existir igualmente entre tal facto tal como está dado como provado e a decisão de improcedência total e absoluta e de absolvição da R. no que respeita à peticionada indemnização de 300.000,00 €.
(…)
Salvo o devido respeito, sublinha-se, em primeiro lugar, que a formulação dada ao facto 8. contém uma contradição nos próprios termos, pois, por um lado, afirma-se que “ficou acordada uma verba a ser atribuída, em valor e em moldes não concretamente apurados e, por outro lado, imediatamente a seguir se explicita que tal verba seria atribuída” no caso de ocorrência de qualquer factualidade que cessasse o contrato de trabalho por motivos não imputáveis ao A. pelo dano sofrido na sua antiguidade e pelo acréscimo do risco profissional decorrente de se desvincular da anterior entidade patronal – F....... – entidade que lhe dava a expectativa legítima do emprego com futuro”.
Por sua vez, no ponto 36. dos “Factos Assentes/Provados”, está exarado que “os administradores da sociedade D......., S.A.” subscreveram um documento denominado por “Proposta de Condições Contratuais – Empresa C…..” dirigida ao A., datada de 12/2/2003 com o teor que é reproduzido integralmente”, teor esse que contém, entre outras, as duas seguintes estipulações:
- “Reserva de verba a ser atribuída no valor de 150.000 €uros com actualização anual igual ou superior à taxa de inflação verificada, no caso de qualquer situação com que a empresa se depare e que extinga o posto de trabalho ou necessidade de manter o colaborador após a entrada em funções.”
- “Este contrato terá validade permanente durante todo o período de permanência na empresa.”
Estas duas estipulações são explicitadas no designado contrato de trabalho junto aos autos com a p.i. como documento nº 1, que não foi dado como provado quanto à sua outorga “à data da admissão do A.” e que tenha entrado em vigor “antes da data referenciada em 9.” dos Factos Assentes (07 de Janeiro de 2008 – data da declaração de insolvência da sociedade D......., S.A.).
Há, desde logo, o que o A. considera um equívoco, resultante de lapso manifesto, quando o Senhor Juiz dá relevância ao facto de da análise da lista de créditos reclamados na insolvência não constar qualquer referência à indemnização no valor de 300.000,00 € apesar de constar na cláusula 6ª do contrato de trabalho que “a insolvência determina a obrigação da “D......., S.A.” liquidar a quantia de 300.000,00 €” (sic!).
Só que na cláusula 6ª do contrato de trabalho não se diz que assistiria direito ao A. a essa indemnização de 300.000,00 € em caso de insolvência da sociedade sua entidade patronal, mas se o contrato de trabalho cessasse em caso de insolvência. Ora,
Como resulta de toda a factualidade provada, o contrato de trabalho não cessou com a insolvência...
Refere o Senhor Juiz na motivação já aludida que “o Tribunal atendeu ao depoimento de E.......– tendo sido administrador da “D......., S.A. o qual referenciou que de modo a que o A. tivesse segurança para se desligar da “F.......” (entidade patronal a que o A. exercia funções antes do ingresso na “D.......s, S.A.), entidade com a qual o A. se encontrava numa boa posição (atenta a antiguidade atingida e perspectivas de progressão) foi acordado uma determinada verba, a qual no início foi no valor de 150.000,00 €.” (sublinhado nosso).
Existe assim contradição entre não dar como provado qualquer valor da indemnização aqui em causa e na motivação referir-se de modo claro que, repete-se, foi “acordada uma determinada verba, a qual no início foi no valor de 150.000 €” e que “o acordado relativamente a essa verba foi confirmado pela testemunha L….”.
Mais adiante consignou-se na motivação que “M.... – o qual foi administrador da sociedade “D......., S.A.” – salientou a existência da estipulação da aludida verba”.
E ainda mais adiante o Senhor Juiz exarou na sentença que “o Tribunal aceita a existência de um acordo relativamente a esse valor a ser atribuído no caso da ocorrência de qualquer factualidade que cessasse o contrato de trabalho por motivos não imputáveis ao A., pelo dano sofrido na sua antiguidade e pelo acréscimo de risco profissional decorrente de se desvincular da anterior entidade patronal – F........”
(…)
Já existe a referida contradição quando o Senhor Juiz não retira a consequência imperiosa da sua motivação que é a de que o valor da verba indemnizatória em causa é pelo menos de 150.000,00 €, sendo certo que, como dispõe o citado art. 565º do C. Civil, “devendo a indemnização ser fixada em liquidação posterior, pode o Tribunal condenar desde logo o devedor no pagamento de uma indemnização, dentro do quantitativo que considera já provado” (sublinhado nosso).
Esta contradição constitui nulidade ( art. 615º do CPC) , cuja superação pode ser efectuada por três vias possíveis, cada uma de per si ou conjugadamente: dar como provado o valor acordado de pelo menos 150.000,00 €, fixar que o valor da verba em causa é de 300.000,00 € ou ser a R. condenada no pagamento da verba prevista no facto 8. a liquidar em execução de sentença em valor que nunca será inferior a 150.000,00 €.
Respondeu a ré:
Alega o Recorrente a nulidade da sentença, concluindo que a nulidade deve ser superada, dando como provado o valor acordado de pelo menos €150.000,00, constante da Proposta negocial , onde consta a tal “Reserva” ou €300.000,00 do contrato – falso – ou um valor que se encontre em liquidação de sentença.
Mas, como reconhece o Recorrente, não sabe se deve considerar “nulidade da sentença” ou “erro de julgamento”.
Nesta questão, a sentença recorrida não é nula, é coerente e está bem fundamentada na sua motivação, não ocorrendo qualquer erro de julgamento.
Para o Ministério Público o que é invocado é um erro de julgamento e não uma nulidade.
Nos termos do art. 615º, nº 1, al. c), do CPC, é nula a sentença quando os fundamentos estejam em oposição com a decisão ou ocorra alguma ambiguidade ou obscuridade que torne a decisão ininteligível.
A nulidade do acórdão, por contradição entre os fundamentos e a decisão, verifica-se, apenas, quando ocorre um vício real no raciocínio expresso na decisão, consubstanciado na circunstância da fundamentação explicitada na mesma apontar num determinado sentido, e, por seu turno, a decisão que foi proferida seguir caminho oposto, ou, pelo menos, diferente. Dito de outro modo, quando a fundamentação adoptada conduz logicamente a determinada conclusão e, a final, o juiz extrai outra, oposta ou divergente (de sentido contrário).[1]
No caso, é imputado tal vício à sentença com base em contradição entre os factos provados nº 8 e 36º e a decisão de absolvição da R. no que respeita à peticionada indemnização de 300.000,00 €.
Consta da sentença:
Requer o A. o pagamento de uma indemnização no montante de 300.000,00€ correspondente ao teor da cláusula 6ª do contrato de trabalho decorrente do contrato ter cessado por factos não imputáveis ao A.
Contudo, não se demonstrou o valor de tal indemnização – por falta de prova não obstante os meios carreados para os autos - , conforme se constata dos factos dados como não provados, razão pela qual desde logo falece a apreciação da sua procedência.
Consta do facto provado nº 8: Ficou acordado uma verba a ser atribuída, em valor e em moldes não concretamente apurado, no caso da ocorrência de qualquer factualidade que cessasse o contrato de trabalho por motivos não imputáveis ao A., pelo dano sofrido na sua antiguidade e pelo acréscimo de risco profissional decorrente de se desvincular da anterior entidade patronal – F....... –, entidade que lhe dava a expectativa legítima de emprego com futuro.
Consta do facto provado nº 36: Os administradores da sociedade D......., S.A. subscreveram um documento denominado por “proposta de condições contratuais – Empresa C......”, dirigida ao A., datada de 12/2/2003 do seguinte teor: (...) Reserva de verba a ser atribuída no valor de 150.000€ com actualização anual igual ou superior à taxa de inflação verificada, no caso de qualquer situação com que a empresa se depare e que extinga o posto de trabalho ou necessidade de manter o colaborador após a entrada em funções (...)
Resulta do exposto que se entendeu na sentença sob recurso que a aludida reserva não estipulava uma indemnização no mesmo valor, nem que tivesse sido acordado qualquer montante indemnizatório superior, ou a acrescer, ao montante resultante da lei laboral.
Este entendimento poderá estar errado, mas não consubstancia qualquer contradição entre os fundamentos e a decisão, antes se podendo repostar a erro de julgamento.[2]
Assim, improcede a aludida arguição de nulidade.

2. Impugnação da matéria de facto
2.1. Recurso do autor
Pretende o autor que seja dada como provado que o valor da verba referida no facto 8. dos factos assentes/provados é de 300.000,00 € ou pelo menos de 150.000,00 €, o teor do contrato de trabalho celebrado entre o A. e a sua então entidade patronal D......., S.A., e a matéria constante dos arts. 16º, 17º, 18º, 19º, 20º, 21º, 22º, 23º e 25º da petição inicial e 68º, 69º e 70º da resposta à contestação.
O autor deu cumprimento ao formalismo do art. 640º do CPC, pelo que importa conhecer da impugnação por si apresentada.
É o seguinte o teor do ponto 8º da matéria de facto provada: “Ficou acordado uma verba a ser atribuída, em valor e em moldes não 
concretamente apurado, no caso da ocorrência de qualquer factualidade que cessasse o contrato de trabalho por motivos não imputáveis ao A., pelo dano sofrido na sua antiguidade e pelo acréscimo de risco profissional decorrente de se desvincular da anterior entidade patronal – F....... –, entidade que lhe dava a expectativa legítima de emprego com futuro.
Quanto aos referidos artigos da petição inicial, consta dos mesmos:
16º O A. estava ao serviço da F......., S.A. desde 01 de Janeiro de 1987 e, quando lhe foi feito este convite, era, desde Abril de 1999, o Gestor da Plataforma Logística de Vila do Conde desta sociedade, que englobava um volume de negócios que rondava os 200 milhões de euros por ano e onde trabalhavam, sob a dependência hierárquica do A., directa (que reportavam directamente ao A.) e indirecta (que reportavam a uma chefia que por sua vez reportava ao A.), cerca de 113 trabalhadores.
17º A F......., S.A. era e é uma sociedade de grande dimensão, com actividade industrial e comercial em Portugal e no estrangeiro, com grande expansão em volume de negócios e territorialmente, sendo considerada a maior empresa da Península Ibérica na indústria de produtos lácteos.
18º A posição do A. era sólida na “F.......” e ascendente em termos de remuneração e responsabilidade, sendo considerado um quadro com grande futuro na empresa.
19º Auferia então o A. na “F.......” a retribuição mensal de €2.846,31 (€2.337,00 de vencimento + €41,91 de diuturnidades + €467,40 de subsídio de isenção de horário de trabalho).
20º Era também atribuído ao A., com finalidade retributiva, pela “F.......” um veículo automóvel para uso permanente, profissional e pessoal.
21º A sua avaliação profissional ao nível das suas competências oscilava, conforme os itens, entre as posições 4 e 5 numa escala de 1 a 5, correspondendo a posição 4 a “bastante capacidade” e a posição 5 a “total capacidade” (doc. 4, que se junta e cujo teor se dá aqui por reproduzido).
22º Por regra, ao A. foi atribuído, enquanto esteve ao serviço da F......., S.A., prémio anual monetário pelo bom desempenho de funções.
23º Sair da F......., S.A. para ir trabalhar para a sociedade D......., S.A. implicava para o A. a perda da antiguidade adquirida ao serviço da “F.......” de já mais de 17 anos, a segurança e perspectivas de progressão profissional que tinha na “F.......” e a solidez desta empresa que lhe dava a expectativa legítima de emprego com futuro, pelo que só sairia da “F.......” se fosse assegurada uma compensação pecuniária para estes prejuízos e riscos, o que foi aceite pela contraparte.
25º Ambas as partes acordaram que, no caso de vir a cessar o contrato de trabalho que celebraram entre si por facto que não fosse imputável ao A., este seria compensado com o convencionado valor de €300.000,00 pelo dano sofrido na sua antiguidade e pelo acréscimo de risco profissional.
Quanto à matéria da resposta à contestação, é ela a seguinte:
68º À excepção do ponto referente à indemnização convencionada, houve acordo total quanto a todos os outros pontos.
69º As divergências quanto à indemnização tinham a ver com o montante, que o A. pretendia que fosse superior e quanto à definição das situações que confeririam ao A. o direito a essa indemnização.
70º A posse desta proposta deu segurança ao A. para que este tomasse a decisão de desvincular-se da F....... com vista a passar a trabalhar para a referida sociedade.
Fundamentando a decisão, consignou-se na sentença sob recurso:
É de realçar que sobre o referido em 8. o Tribunal atendeu ao depoimento de E.......– tendo sido administrador da “D......., S.A.” o qual referenciou que de modo a que o A. tivesse segurança para se desligar da “F.......” (entidade patronal a que o A. exercia funções antes do ingresso na “D......., S.A.”), entidade com o qual o A. se encontrava numa boa posição (atenta a antiguidade atingida e perspectivas de progressão) foi acordado uma determinada verba, a qual no início foi no valor de 150.000,00€.
A estipulação de uma verba em caso de cessação do contrato por facto não imputável ao A. de modo a salvaguardar o dano sofrido na sua antiguidade e o acréscimo de risco por se desvincular da “F.......”, é compreensível e encontra-se de acordo com as regras da normalidade, atento, desde logo, as funções que o A. exercia – Director-geral.
Acresce que o acordado relativamente a uma verba foi confirmado pela testemunha L...... – a qual exerceu funções na sociedade E....,..., S.A.”.
Não se podendo ignorar que se encontra junto aos autos, a fls. 116, uma proposta para admissão do A. junto da “E...., ..., S.A.”, onde é proposto, a dado momento, “uma reserva de verba a ser atribuída no valor de 150.000,00€ com actualização anual igual ou superior à taxa de inflação verificada, no caso de qualquer situação com que a empresa se depare e que extinga o posto de trabalho ou necessidade de manter o colaborador após a entrada em funções”.
M.... – o qual foi administrador da sociedade “E....,.., S.A.” – salientou a existência da estipulação da aludida verba. Referiu que o A. laborava junto de uma empresa pelo que sentiram-se na necessidade de efectuar a referida proposta.
Confrontado esclareceu que a proposta de fls. 116 foi por si subscrita – como administrador –
Não se podendo olvidar que as testemunhas inquiridas de modo coerente, não se denotando hesitações, salientaram que o A. é uma pessoa com brio nas suas funções, com muito profissionalismo reconhecido pelas pessoas que laboraram com o mesmo.
Pelo que, atento o exposto e conjugada a prova testemunhal e documental carreada para os autos, o Tribunal aceita a existência de um acordo relativamente a um valor a ser atribuído no caso da ocorrência de qualquer factualidade que cessasse o contrato de trabalho por motivos não imputáveis ao A., pelo dano sofrido na sua antiguidade e pelo acréscimo de risco profissional decorrente de se desvincular da anterior entidade patronal – F....... –.
Contudo, não se conseguiu demonstrar qual o valor que foi efectivamente alcançado (se o constante na proposta, ou em montante superior ou inferior). O constante a fls. 116, no montante de 150.000,00€ trata-se apenas de uma proposta.
Para prova do valor acordado de 300.000,00€ foi junto o contrato de trabalho.
Da sua análise – cf. fls. 128 a 131 – constatamos que é referido na cláusula sexta ponto 2., “Os outorgantes acordam que, na eventualidade deste contrato de trabalho cessar por virtude de facto ou decisão exteriores à vontade do Segundo Outorgante, sejam de natureza objectiva (designadamente extinção do posto de trabalho, despedimento colectivo, caducidade, insolvência) ou culposa, ou em resultado despedimento com invocação de justa causa declarado ilícito e judicialmente, a primeira outorgante obriga-se a pagar ao Segundo Outorgante a quantia de 300.000,00€, a título da compensação indemnizatória prevista na alínea e) do número anterior, indemnização essa que se vencerá na data da cessação do contrato de trabalho em qualquer das circunstâncias referidas, salvo no caso de despedimento ilícito, em que se vencerá na data em que transitar em julgado a decisão judicial”.
Porém, a R., que não subscreveu o aludido contrato, colocou-o em causa atenta a respectiva data de outorgação e o constante na cláusula nona.
Com efeito, verificamos que o contrato é datado de 7 de Abril de 2003 constando na cláusula nona referências a determinados normativos do Código do Trabalho aprovado pela Lei nº 99/2003, de 27 de Agosto.
Ora, o referido Código foi publicado em Diário da República, mais de quatro meses após a data de 7 de Abril de 2003, razão pela qual o Tribunal analisando o contrato conclui, segundo as regras da normalidade, que o seu teor foi elaborado pelo menos posteriormente a 27 de Agosto de 2003 (data em que foi publicado o Código) – não se valorando o depoimento da testemunha E.......– Administrador da “D...., ..., S.A.” no sentido de que o contrato junto aos autos foi subscrito pelas partes em Abril de 2003.
Acresce que verificamos que os dois contratos de trabalho subscritos pela “D....,..., S.A.”, de fls, 82 v. a fls. 83 v. e o de fls. 84 a fls. 85 (respectivamente de Setembro de 2002 e de Setembro de 2003) constavam a liquidação do imposto de selo, sendo certo que o contrato do A., com a inserção de cláusulas de valores elevados – 300.000,00€ - não cumpriu com tais formalidades.
Sendo de realçar, como refere a R. na sua contestação, que da análise da lista provisória dos créditos reclamados – fls. 81 v. – efectuada no Processo que decretou a insolvência da “D......., S.A.” não consta qualquer referência à indemnização no valor de 300.000,00€, ora peticionada, não obstante o reconhecimento de determinados créditos salariais.
[Constando na referida cláusula sexta do contrato de trabalho que a insolvência determinaria a obrigação da “D...., ..., S.A.” liquidar a quantia de 300.000,00€].
As testemunhas que laboraram junto da “D......., S.A.”, mormente os subscritores – administradores – salientaram, de modo unânime, que o A. iniciou a sua laboração em Abril de 2003.
Sendo que se terá de tomar em consideração que o A. cessou as suas funções junto da anterior entidade patronal – “F.......”, tendo o Tribunal apurado que o mesmo queria se salvaguardar da respectiva cessação e ingresso junto da “D...., ..., S.A.”(o que se encontra de acordo com as regras da normalidade).
Porém, como é sabido, segundo o critério de uma pessoa diligente, tal ingresso, de modo a salvaguardar os interesse do A., deverá ocorrer com a subscrição de um acordo, mormente de um contrato de trabalho onde ficassem garantidas as condições que tenham sido finalmente acordadas entre as partes (após a efectivação de propostas e contra-propostas).
Não estando de acordo com as regras da normalidade que o A. tivesse subscrito um contrato decorridos, pelo menos, mais de quatro meses após ter iniciado as suas funções junto da R. – considerando a necessidade de salvaguardar as condições que tenham sido acordados, mormente a eventual compensação – caso se verifiquem determinados pressupostos - no valor de 300.000,00€.
Pelo exposto, atento o atrás mencionado, considerando que o Tribunal ficou convicto de que o contrato não foi outorgado na data indicada, desconhecendo quando o mesmo foi elaborado, não conseguiu formar uma convicção positiva no sentido de que as partes tenham acordado o referido montante de 300.000,00€ antes da declaração de insolvência da “D...., ..., S.A.”.
É certo que as testemunhas – administradores da “D....,..., S.A.,” salientaram que o valor de 300.000,00€ foi o acordado quando o A. iniciou as suas funções, porém, considerando o supra exposto e não se ignorando que a testemunha E.......é arrendatário do A. – existindo, assim, uma relação próxima entre ambos, o Tribunal não conseguiu dar como provado o facto referenciado em i).
Sustentando a sua posição começa o autor por alegar:
Quanto à prova documental útil para a prova dos factos acima identificados, ela reconduz-se a dois documentos fulcrais:
- a proposta de condições contratuais apresentada ao A. pelos administradores da sociedade D......., S.A. em 12.02.2003 referida no facto 36. dos “Factos Assentes/Provados”;
- o contrato de trabalho escrito junto com a p.i. como doc. 1.
Quanto ao primeiro documento, está reconhecida a sua genuinidade e a própria R. não a pôs em causa, pois na sua pronúncia sobre o documento limitou-se a dizer, de modo ineficaz como impugnação, designadamente da genuinidade do documento, que se impugnam “os documentos juntos pelo A. com a resposta” (nada mais!) o que equivale a nada enquanto impugnação da genuinidade do documento.
Quando ao segundo documento (o contrato de trabalho), a R., segundo o Senhor Juiz “a quo” diz na sentença, “colocou-o em causa”. Não partilha o A. deste entendimento, pois a única coisa que a R. pôs em causa foi a data da assinatura do documento, não a sua genuinidade.
(...)
Ora, atento o exposto, a R. não impugnou a genuinidade dos dois citados documentos, pois, quanto à proposta de condições contratuais, a R. limitou-se a afirmar abstrata e conclusivamente a sua impugnação, não tendo posto em causa a letra e ou a assinatura deste documento nem arguiu a falsidade do conteúdo de qualquer das declarações constantes do documento subscrito pelos autores da declaração, que sendo seus subscritores aparentes, foram aceites pela R. como seus reais subscritores.
Igualmente a R. não atacou a genuinidade do documento “contrato de trabalho”. Aparentemente, poder-se-ia dizer que o fez no art. 2º da contestação. Mas só aparentemente, porquanto a R. aceitou, no mesmo articulado e de forma expressa, que o referido documento é genuíno, no sentido de que a assinatura dos seus autores aparentes é a assinatura dos seus autores reais. Assim, a R. expressamente reconheceu que o A. e os administradores da sociedade D......., S.A., E.......e L...., assinaram esse documento (cfr. arts. 29, 30 e 31 da Contestação). (...)
Sem entrar em controvérsia sobre se a data “ como objecto da declaração (de ciência) do subscritor” fica fora do âmbito da prova testemunhal (autor e obra citados, pág. 237, nota 31), a verdade é que o documento em causa não foi subscrito na data nela aposta, mas meses mais tarde, como o A. reconheceu e pelas razões que este expôs na sua resposta à contestação.
(...)
Sobre estes dois documentos, e sobre as condições contratuais acordadas e sobre as circunstâncias em que foram negociadas foram inquiridas as três seguintes testemunhas: E...., L.... e M...., todos administradores da sociedade D......., S.A., os dois primeiros subscritores do contrato de trabalho e o primeiro e terceiro subscritores da já aludida proposta de condições contratuais de Fevereiro de 2003.
Nos seus depoimentos (que o Senhor Juiz “a quo” considerou globalmente credíveis, coerentes e sérios) as referidas testemunhas confirmaram o que o A. alegou e depuseram sobre factos que conheciam com uma evidente e forte razão de ciência, pois intervieram nas negociações que conduziram aos documentos referidos por eles outorgados. Fazemos apenas a ressalva quanto à testemunha E....... no que à data da efectiva outorga do contrato de trabalho diz respeito, que, por evidente lapso de memória, disse ter sido Abril de 2003.
Respondeu a ré:
29. O A. ora recorrente e os outros responsáveis pela falsificação do contrato de trabalho terão que ser sancionados no foro próprio, onde, desde 20 de Junho de 2014, já está pendente o Inq. nº 314/14.2T3AGD – Comarca do Baixo Vouga – DIAP – Águeda.
30. Na P.I. o A, alude à indemnização de €300.000,00 apenas no nº 12º e 108º, nunca a classificando como “cláusula penal”.
31. Se o A., tivesse junto à P.I. aquela “Proposta”, com o carácter de cláusula penal, ou “Reserva de verba”, provisão, a Ré, na Contestação, certamente que a impugnava, por não ter feito qualquer Proposta negocial.
32. Na verdade, “reserva de verba” não tem o significado de qualquer cláusula pena, mas sim que a empresa promitente obriga-se a ter provisionada a verba de €150.000,00, para fazer face a uma determinada despesa.
33. A empresa D......., S.A. nunca teve registada uma provisão no montante de €150.000,00, ainda mais actualizada pela taxa de inflação, para fazer face à responsabilidade que teria assumido, tratando-se de mais um documento com indícios de falsidade, como se provará no Inq. 314/14.2T3AGD – DIAP – Águeda.
Para o Ministério Público:
(…) reportando-nos à impugnação da decisão de facto (formalmente válida), por banda do autor, que em atenção à exposição de motivos/considerações sobre os “testemunhos”, constante da respetiva rubrica, da sentença, deve dizer-se que a “crença” do apelante não belisca minimamente com a “explanação” do Tribunal, em termos de possibilitar uma adesão à sua pretensão, em detrimento do fixado na sentença.
Estabelece o art. 374º, nº 2, do Código Civil, que se a parte contra quem o documento é apresentado impugnar a veracidade da letra ou da assinatura, ou declarar que não sabe se são verdadeiras, não lhe sendo elas imputadas, incumbe à parte que apresentar o documento a prova da sua veracidade.
Relativamente ao invocado contrato de trabalho, alega a ré no art. 19º da contestação “embora a Ré não esteja na posse do original, nem nunca o viu, apenas dispondo da cópia enviada pelo Tribunal, o conteúdo do contrato de trabalho que o A. juntou como Doc nº 1 evidencia fortes indícios de ser falso.”
Arguição de falsidade que repete nos artigos seguintes da mesma peça processual.
Assim, não pode proceder o argumento do autor de que a ré apenas impugnou a data da assinatura de tal documento e não que tenha sido assinado pelas pessoas referidas pelo autor como sendo os subscritores do mesmo. Efectivamente, a ré claramente refere desconhecer o documento em questão, de onde resulta o desconhecimento da autoria das assinaturas dele constantes.
Certo é, contudo, que o autor fez prova testemunhal bastante de que o documento em causa foi assinado pelos representantes da empresa D......., S.A., a quem foi imputado, conforme depoimentos prestados pelos mesmos em audiência, transcritos pelo autor nas suas alegações.
Daqui não resulta, porém, por si só que se deva considerar provada a matéria em causa.
Procedeu-se à audição da gravação dos depoimentos prestados em audiência de julgamento.
A questão fundamental aqui em causa, a convenção do pagamento de € 300.000,00, não resulta efectivamente demonstrada da prova produzida.
As testemunhas inquiridas sobre a matéria, E...., L.... e M...., não conseguiram explicar a circunstância de o contrato aqui em causa ter data claramente anterior ao da sua invocada elaboração.
Este facto impunha, efectivamente, especial esforço de prova sobre o autor, uma vez que cria a suspeição da sua elaboração posterior apenas para efeito do pedido formulado nestes autos.
A testemunha E....... referiu que o documento teria sido subscrito apenas alguns dias após a data nele aposta. Já a testemunha L.... refere que o contrato foi assinado “uns meses” depois de o autor ter começado a trabalhar na empresa, e a testemunha M.... afirma que terá sido assinado “uns meses” depois, concretizando posteriormente em “um, dois, três meses”.
Ora, para além das demais circunstância enunciadas na decisão sob recurso, como seja a falta de pagamento de imposto de selo, quando os outros contratos celebrados pela mesma sociedade cumpriam os formalismos fiscais (fls. 82 a 85), sendo o justificado erro resultante do facto de o documento ser assinado depois da publicação do Código do Trabalho, mas com data repostada ao início da relação contratual, a mesma não coincide com a mais dilatada data indicada pelas testemunhas (“três meses”).
Conforme salientado pelo Ministério Público no seu perecer, “segundo o critério de uma pessoa diligente, tal ingresso, de modo a salvaguardar os interesse do A., deverá ocorrer com a subscrição de um acordo, mormente de um contrato de trabalho onde ficassem garantidas as condições que tenham sido finalmente acordadas entre as partes (após a efectivação de propostas e contra - propostas). Não estando de acordo com as regras da normalidade que o A. tivesse subscrito um contrato decorridos, pelo menos, mais de quatro meses após ter iniciado as suas funções junto da R. – considerando a necessidade de salvaguardar as condições que tenham sido acordados, mormente a eventual compensação – caso se verifiquem determinados pressupostos – no valor de 300.000,00€.
Mais foi referido que o autor começou a trabalhar para tal empresa a 1 de Abril (testemunha M....), pelo que não se entende porque o contrato foi datado de 7 de Abril, em vez da data em que foi alegadamente assinado.
Nem foi apresentada qualquer justificação para se datar o contrato de uma data anterior à da sua assinatura, quando nada o impunha.
Mas, ainda que se possa aceitar um erro da testemunha quanto a esta data, não é aceitável, por violação das regras da experiência e da lógica, que o autor deixasse em aberto um elemento essencial do acordo, despedindo-se entretanto do emprego que manifestamente lhe dava maiores garantias no futuro. Sendo este, aliás, o fundamento de tal cláusula indemnizatória.
Por outro lado, embora não tenha sido questionada a credibilidade das testemunhas, certo é que estes considerariam que haviam criado uma expectativa no autor que se frustrou, do que as testemunhas estavam conscientes, o que poderá ter levado as mesmas a aceitar assinar o documento em causa, embora em data muito posterior, sendo admissível que em data em que já não podiam vincular a sociedade, como pretende a ré.
Sintomática é ainda a circunstância de o autor aceitar, subsidiariamente, que tenha sido acordada “apenas” a indemnização de € 150.000,00, com base no documento transcrito no facto provado 36º.
Relativamente a este, as mesmas testemunhas referiram-se-lhe como um pré-acordo. Sendo certo que, segundo as testemunhas em causa, o valor de uma eventual indemnização não estava ainda determinado em definitivo, resulta da leitura do documento em causa e da prova testemunhal, conjugados com as regras da experiência, que esse seria o valor mínimo da indemnização a pagar ao autor.
Daí que se afigure dever proceder parcialmente a apelação, passando o ponto 8º da matéria de facto provada a ter a seguinte redacção: Ficou acordado uma verba a ser atribuída, em valor não inferior a € 150.000,00, e em moldes não 
concretamente apurados, no caso da ocorrência de qualquer factualidade que cessasse o contrato de trabalho por motivos não imputáveis ao A., pelo dano sofrido na sua antiguidade e pelo acréscimo de risco profissional decorrente de se desvincular da anterior entidade patronal – F....... –, entidade que lhe dava a expectativa legítima de emprego com futuro.

2.2. Recurso da ré
O autor e o Ministério Público pronunciaram-se pela rejeição do recurso, neste particular, por entenderem não ter sido cumprido o formalismo previsto no art. 640º do CPC.
Nos termos do art. 640º, nº 1, do CPC, quando seja impugnada a decisão sobre a matéria de facto, deve o recorrente obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição: a) Os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados; b) Os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida; c) A decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas.
Acrescenta- se no nº 2 do mesmo artigo: No caso previsto na alínea b) do número anterior, observa-se o seguinte: a) Quando os meios probatórios invocados como fundamento do erro na apreciação das provas tenham sido gravados, incumbe ao recorrente, sob pena de imediata rejeição do recurso na respetiva parte, indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda o seu recurso, sem prejuízo de poder proceder à transcrição dos excertos que considere relevantes; b) Independentemente dos poderes de investigação oficiosa do tribunal, incumbe ao recorrido designar os meios de prova que infirmem as conclusões do recorrente e, se os depoimentos tiverem sido gravados, indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda e proceder, querendo, à transcrição dos excertos que considere importantes.
Impõe-se aqui um ónus rigoroso ao recorrente, cujo incumprimento implica a imediata rejeição do recurso.[3]Analisando as alegações, constata-se que a recorrente indicou a matéria de facto que considera erradamente julgada (pontos 10 e 11 da matéria de facto provada, e arts. 78º e 83º da contestação, não considerados como provados), mais esclarecendo o sentido que entende dever ser dada à decisão, bem como os meios de prova que fundamentam tal pretensão, essencialmente prova documental e o depoimento da testemunha G........
A mesma referência é feita nas conclusões.
Certo é, porém, que não fez a indicação das concretas passagens da gravação do depoimento da testemunha, nem reproduziu as mesmas na parte relevante.
Assim, não poderá considerar-se a prova testemunhal em causa, na reapreciação da matéria de facto, mas pode e deve ser a mesma analisada à luz dos documentos invocados.
Alega a ré:
Conforme foi alegado nos nº 83 da Contestação e documentalmente provado pelos documentos nº 10 e 11, e pelo depoimento da testemunha G......., da matéria de facto dada como provada devia constar:
Que a sociedade comercial H....... – Import. Exp, Lda., com sede no Brasil, deve à Ré o montante de 113.851,13€ (Doc 11) e a sociedade comercial I…., S.L., com sede em …., Espanha, deve à Ré o valor de 302.110,65€ (Doc.10).
Ainda devia constar como provado na matéria de facto constante da sentença o alegado no nº 78º da Contestação e provado documentalmente (Doc nº 6):- Que a Ré, no ano de 2013, até á data da Contestação, tinha um exercício económico negativo no valor de 289.652,86€, verificando-se erro de julgamento sobre a factualidade dada como provada na sentença recorrida.
Nos pontos 10 e 11 dos Factos assentes, a sentença, ao considerar provado o teor da escritura pública, datada de 30 de Dezembro de 2010, sobre a alienação do estabelecimento industrial da insolvente “D......., Lda.”, devia ter considerado como provado que:
Em anexo a essa mesma escritura, consta o documento denominado “Lista de Trabalhadores ao Serviço do Estabelecimento”, junto aos autos com a P.I. do A. - Doc nº 6 - e onde consta o nome do A. e o salário de 1.500,00€ , mais 6,41€ de subsídio de alimentação, que passava a auferir na Ré, constando ainda do mesmo documento a notação “os salários tiveram o acordo dos trabalhadores”, verificando-se , mais uma vez, erro de julgamento sobre a factualidade dada como provada na sentença recorrida.
Relativamente aos factos alegados nos arts. 78º e 83º da contestação, têm estes o seguinte teor:
78º Praticamente, desde o início da sua actividade em 1 de Janeiro de 2011, os resultados foram pouco positivos e ultimamente até são negativos com prejuízos avultados.
83º A Ré, durante o período em que o A. era seu trabalhador, vendeu grandes quantidades de mercadorias a clientes, não tendo conseguido o pagamento pontual de muitas das facturas já vencidas no valor de centenas de milhares de Euros, nomeadamente, a empresa I…., S.L., com sede em …., Espanha, devedora de €302.110,65 e a empresa H…. - Imp. Exp. Lda., com sede no Brasil, devedora de €113.851,13.
A matéria em causa (primeiros factos) nenhuma relevância tem para a decisão do presente litígio, pelo que não se justifica a alteração pretendida da matéria de facto.
Acontece ainda que, os documentos em causa são meros documentos contabilísticos da própria ré, os quais, por si só nada provam, uma vez que os factos em causa, que se pretendiam provar com tais documentos, foram expressamente impugnados pelo autor.
Neste aspecto improcede, pois, a impugnação.
Relativamente ao segundo facto, embora o mesmo possa sempre ser considerado, uma vez que se trata de facto constante de documento com força probatória plena e parcialmente reproduzido, afigura-se que se deve consignar a matéria em causa, pelo que se acrescenta ao facto provado nº 11 o seguinte: Em anexo à escritura consta uma “Lista de Trabalhadores ao Serviço do Estabelecimento”, da qual consta o nome do autor, o salário de € 1.500,00, mais € 6,41 de subsídio de alimentação, dele constando ainda a notação “os salários tiveram o acordo dos trabalhadores”.

3. Obrigação de pagamento da indemnização contratual (recurso do autor)
Alega o autor:
A divergência , em sede de decisão de mérito, relativamente à douta sentença recorrida restringe-se à absolvição da R. do pedido de indemnização prevista na “proposta de condições contratuais” e no “contrato de trabalho” (cl. 6ª), divergência que nasce e que se justifica logo face ao quadro factual tal como o Senhor Juiz “a quo” o definiu e que, por maioria de razão, se aprofunda face ao quadro fáctico que o A. entende que deve ser definido e que resulta do acolhimento que for dado aos seus pedidos de alteração da matéria de facto…
Em primeiro lugar, parece claro, face aos factos e ao disposto no art. 810º, nº 1 do C. Civil, que a indemnização pré-fixada a que se refere o facto 8. dos “Factos Assentes” tem a natureza de cláusula penal, com uma dupla vertente, a de indemnização pré-fixada de determinados danos e a do seu valor cominatório e dissuasor da contraparte…
Ora a R. não alegou nem provou qualquer facto atinente à verificação ou não dos danos e ao seu montante, não tendo também invocado qualquer desproporcionalidade entre os danos e a indemnização. Daí que só por mera cautela o A. reclamou a ampliação da base fáctica da acção nos sobreditos termos.
Aliás, o Sr. Juiz “a quo”, quando na c) do capítulo “Do Direito” da douta sentença recorrida, se pronuncia sobre a peticionada indemnização, pressupõe verificada a existência dos prejuízos sofridos pelo A., considerando apenas não demonstrado o valor de tal indemnização, consignando que por essa razão “falece a apreciação da sua procedência”.
Concluindo-se provado que foi pré-fixado em 300.000,00 € ou, noutra hipótese e sem conceder, no valor de 150.000,00 € , competirá ao Tribunal condenar a R. nos termos peticionados.
Pode-se colocar como hipótese de raciocínio que o Tribunal não atenda aos argumentos do A. e considere a matéria bem fixada, designadamente o facto 8. dos “Factos Assentes”. Mesmo nessa hipótese o Tribunal, face à prova de que ocorreram danos, podia e devia ter condenado pelo montante que se viesse a liquidar em execução de sentença. Na verdade, tal decisão impõe-se face ao teor do facto 8. já citado e ao disposto no art. 564º, 565º e 569º do C. Civil e no art. 609º, nº 2 do CPC...
E se porventura se entendesse que cabia ao recorrente demonstrar a existência dos danos e do seu montante, a verdade é que o próprio facto 8. dos “Factos Assentes” se refere aos danos e, mais precisa e concretamente, tal foi alegado nos arts. 16º a 23º e 25º da p.i. e abundantemente provado em audiência de julgamento através dos depoimentos das testemunhas acima mencionadas.
Sobre esta questão respondeu a ré:
A Ré nunca negociou qualquer cláusula penal com o Recorrente nem lhe fez qualquer Proposta, onde constasse “uma reserva de verba”, isto é, o registo de provisão, no montante de €150.000.
A Ré nunca tinha visto o contrato de trabalho do A. até à data em que foi notificada pelo Tribunal da P.I., desconhecendo completamente a existência da alegada cláusula bem como de todo o contrato e da famigerada “Proposta”, que só aparece nos autos, quando o A. Responde à Contestação da Ré e junta esse documento.
O A. na carta que, em 22 de Novembro de 2013, enviou à Ré a comunicar a cessação do contrato de trabalho, não fez qualquer referência ao pagamento da indemnização relacionada com a referida “Proposta” com a reserva de verba, nem com o montante de €300.000,00 constante do contrato de trabalho.
O A. que, segundo consta da sentença recorrida, (...) “era o colaborador que, regularmente e com a posição hierárquica mais elevada, assumia a gestão quotidiana da empresa”, nunca comunicou à gerência da Ré, como era seu dever de lealdade e boa fé, que, em caso de despedimento, tinha direito a receber €300.000,00, além dos normais créditos laborais e da indemnização por antiguidade prevista nos arts. 396º e 394º do CT.
Junto com a P.I., o A. juntou o contrato de trabalho, documento com falsidades, como se alegou nos nº 18 a 33 da Contestação e nas conclusões 13º a 18º acima transcritas.
Somente com a Resposta à Contestação, depois de na audiência de partes se constatar a falsidade do contrato de trabalho, depois de lhe cair a máscara, é que o A. resolve tirar da cartola o documento que agora esgrime como um grande trunfo, falando de “reserva de verba”.
Esse documento, referido em 5º das alegações de recurso, intitulado “Proposta de condições contratuais – Empresa C......”, é ,alegadamente, dirigido ao A. por dois administradores da sociedade D......., S. A., com assinaturas ilegíveis.
Entre outras cláusulas, continha: “ Reserva de verba a ser atribuída no valor de 150.000 €uros (sic) com actualização anual igual ou superior à taxa de inflação verificada, no caso de qualquer situação com que a empresa se depare e que extinga o posto de trabalho ou necessidade de manter o colaborador após a entrada em funções”.
Primeiro que tudo, pode perguntar-se qual o verdadeiro significado de: “Reserva de verba”?
A sociedade D......., S. A., pouco tempo após o A. ter sido contratado, como um génio da gestão empresarial, com todas as competências referidas no nº 9º da P.I., principescamente pago, foi declarada insolvente em 7 de Janeiro de 2008,com uma dívida ao Instituto da Segurança Social, IP, de €825.689,92, acrescidos de €99.327,18 de juros, tendo a Exma. Sra. Administradora da Insolvência apurado, na lista de créditos reconhecidos, o valor global de €11.696.569,07. (nº 34 dos Factos assentes/provados da sentença).
Certamente que a Sra. Administradora da Insolvência não encontrou na caixa social ou na contabilidade da sociedade D......., S.A. a tal provisão , a “reserva da verba de €150.000” e com a actualização anual igual ou superior à taxa de inflação, ali “reservada” para cumprir a tal Proposta que a Administração terá feito ao Recorrente.
O disposto no artigo 285º do CT, e o teor da escritura pública datada de 30 de Dezembro de 2010, (art. 11 dos Factos assentes), ao dizer que a sociedade adquirente, a ora Recorrida, assume todos os direitos e obrigações decorrentes dos contratos de trabalho dos trabalhadores identificados no documento particular anexo a esta escritura (...) mantendo os trabalhadores a antiguidade, categorias profissionais e as retribuições que vêm auferindo na insolvente e que ali estão mencionadas, não leva a concluir que a Recorrida esteja legalmente obrigada a pagar a tal “reserva de verba” de €150.000,00 reclamada pelo Recorrente ou a cumprir uma Proposta Negocial que só obriga quem a fez.
É certo que a decisão recorrida no nº 36 dos Factos assentes/provados dá como provada a existência dessa “Proposta”.
Mas a sentença recorrida, compreensivelmente, chama-lhe o mesmo nome que o A. lhe chamou: “Proposta”, dizendo assertivamente. “O constante de fls. 116 no montante de 150.000,00€ trata-se apenas de uma proposta”.
Relativamente a esta questão provou-se que:
8. Ficou acordado uma verba a ser atribuída, em valor não inferior a € 150.000,00, e em moldes não concretamente apurados, no caso da ocorrência de qualquer factualidade que cessasse o contrato de trabalho por motivos não imputáveis ao A., pelo dano sofrido na sua antiguidade e pelo acréscimo de risco profissional decorrente de se desvincular da anterior entidade patronal – F....... –, entidade que lhe dava a expectativa legítima de emprego com futuro.
10. Por escritura pública datada de 30 de Dezembro de 2010 foi efectuada a “alienação do estabelecimento industrial em liquidação da massa insolvente” outorgada entre a legal representante (Administradora da Insolvência) da sociedade “D......., S.A., em liquidação” – e a ora R. – cf. fls. 25 a 29 cujo teor e dá por integralmente reproduzido –, onde se constata que a R. aceitou a transmissão plena do aludido estabelecimento e dos bens imóveis, móveis, créditos, direitos e obrigações laborais (...)”.
11. Sendo realçado na escritura que “também como contrapartida da transmissão do estabelecimento industrial, a sociedade adquirente assume, de forma exclusiva, todos os direitos e obrigações decorrentes dos contratos de trabalho dos trabalhadores identificados no documento complementar anexo a esta escritura, contratos esses que, a partir da presente data passam a vigorar entre ela e os referidos, mantendo os trabalhadores a antiguidade, categorias profissionais e as retribuições que vêm auferindo na insolvente e que ali estão mencionadas, bem como assume, também de forma exclusiva e sem direito a imputar qualquer custo à transmitente, a obrigação de lhes pagar integralmente, no momento em que forem exigíveis, as retribuições vencidas a partir da presente data, as retribuições relativas às férias ainda não gozadas, respectivo subsídio, relativos ao trabalho prestado no ano em curso e a de lhes permitir a efectivação do direito às férias ainda não por ele gozadas.
Que ainda como contrapartida da transmissão do estabelecimento industrial, a sociedade adquirente assume também a obrigação de dar preferência, nas admissões de pessoal que vier a efectuar até trinta e um de Agosto de dois mil e onze, aos trabalhadores que se encontravam ao serviço da insolvente “D......., S.A.” em um de Janeiro de dois mil e dez e que entretanto cessaram os respectivos contratos de trabalho.
Em anexo à escritura consta uma “Lista de Trabalhadores ao Serviço do Estabelecimento”, da qual consta o nome do autor, o salário de € 1.500,00, mais € 6,41 de subsídio de alimentação, dele constando ainda a notação “os salários tiveram o acordo dos trabalhadores”.
12. Em resultado da alienação referenciada em 10. o A. laborou na sociedade R., como director-geral, funções que anteriormente exercia.
13. A R. a partir de 1 de Janeiro de 2011 e até à cessação do contrato de trabalho liquidou junto do A. a retribuição ilíquida mensal de €1.500,00, acrescido de subsídio de alimentação.
14. Por carta datada de 22 de Novembro de 2013, enviada à R. por correio registado com aviso de recepção no dia 25 do mesmo mês, o A. comunicou à R. que procedia à resolução com justa causa do contrato de trabalho.
36. Os administradores da sociedade D......., S.A. subscreveram um documento denominado por “proposta de condições contratuais – Empresa C......”, dirigida ao A., datada de 12/2/2003 do seguinte teor:
-Vencimento base líquido de 3500 €uros, sendo a base de cálculo usada para chegar a este valor totalmente abrangida por todas as disposições legais em vigor para a tributação e impostos e a cargo da empresa;
- Atribuição de viatura de 5 lugares – carrinha Audi A4 ou equivalente, sendo uma viatura de meu uso exclusivo e permanente, com todos os encargos legais e de manutenção a cargo da empresa;
- Celebração de contrato de seguro de vida e de saúde;
- Atribuição de telemóvel de serviço;
- Pagamento dos custos de alimentação e deslocações em serviço;
- Entrada na empresa com contrato de trabalho efectivo por tempo indeterminado;
- Regime de isenção de horário de trabalho;
- Reserva de verba a ser atribuída no valor de 150.000€ com actualização anual igual ou superior à taxa de inflação verificada, no caso de qualquer situação com que a empresa se depare e que extinga o posto de trabalho ou necessidade de manter o colaborador após a entrada em funções;
- Este contrato terá validade permanente durante todo o período de permanência na empresa.
Pretende o autor que se considere verificada a obrigação de pagamento da cláusula penal prevista na “proposta de condições contratuais” e no “contrato de trabalho” (cl. 6ª).
Trata-se, porém, de questões distintas.
Relativamente à primeira (a cláusula estipulando uma indemnização de € 300.000,00), face à improcedência da apelação relativamente à impugnação da matéria de facto, logo fica condicionado o seu conhecimento.
Quanto à segunda, como refere a ré, estamos perante uma “proposta de condições contratuais – Empresa C......”, na qual a consta a obrigação de constituição uma “Reserva de verba a ser atribuída no valor de 150.000€ com actualização anual igual ou superior à taxa de inflação verificada, no caso de qualquer situação com que a empresa se depare e que extinga o posto de trabalho ou necessidade de manter o colaborador após a entrada em funções.”
Nos termos do art. 232º do Código Civil, o contrato não fica concluído enquanto as partes não houverem acordado em todas as cláusulas sobre as quais qualquer delas tenha julgado necessário o acordo.
Esse acordo de vontades consubstancia-se por uma declaração inequívoca do destinatário da proposta de aceitação da mesma.
No caso o autor não provou, como lhe competia de harmonia com as regras de distribuição do ónus da prova, que tenha expressamente aceite a proposta (art. 342º, nº 1, do Código Civil).
Certo é, porém, conforme salienta o mesmo, que o autor aceitou começar a trabalhar para a sociedade “D......., S.A.”, sendo ainda seguro que a aceitação pode ser tácita quando “a própria natureza ou circunstâncias do negócio, ou os usos tornem dispensável a declaração de aceitação” (art. 234º do Código Civil).
Afigura-se, portanto, correcto concluir que, ao iniciar a prestação de trabalho, o autor aceitou a referida proposta de € 150.000,00, como valor mínimo, conforme já se concluiu aquando da alteração da matéria do ponto 8º da matéria de facto provada.
O ponto 8º da matéria de facto provada passou a ter a seguinte redacção: “Ficou acordado uma verba a ser atribuída, em valor não inferior a € 150.000,00, e em moldes não concretamente apurados, no caso da ocorrência de qualquer factualidade que cessasse o contrato de trabalho por motivos não imputáveis ao A., pelo dano sofrido na sua antiguidade e pelo acréscimo de risco profissional decorrente de se desvincular da anterior entidade patronal – F....... –, entidade que lhe dava a expectativa legítima de emprego com futuro.
Não se apurou, contudo, quais os pressupostos (“moldes”) da atribuição de tal cláusula.
Assim sendo, embora se possa concluir que foi acordada a aludida compensação ao autor, no caso da ocorrência de qualquer factualidade que cessasse o contrato de trabalho, por motivos que não lhe fossem imputáveis, esse montante não pode ser atribuído, nem mesmo mediante liquidação posterior (nos termos do art. 609º, nº 2, do CPC), uma vez que não se provando os pressupostos de tal pagamento, não se pode concretizar se o mesmo é devido no caso concreto.
Nos termos do art. 810º, nº 1, do Código Civil, as partes podem fixar por acordo o montante da indemnização exigível nos casos de não cumprimento ou mora do devedor.
Resulta do exposto que não foram determinadas as condições em que se devia proceder ao pagamento da indemnização. Sendo assim, uma vez que, salvo convenção expresssa, a cláusula penal não se cumula com a indemnização legal, terá que se considerar que a mesma corresponda apenas a esta, como se fez na sentença sob recurso.[4]
Assim, improcede aqui a apelação do autor.

4. Condenação da ré como litigante de má fé (recurso do autor)
Alega o autor:
(…) diz a R. (pág. 39/63 das suas alegações) que “foi da exclusiva vontade do A. processar ou mandar processar o seu salário no montante de €1.500,00 durante quase três anos”. Pois é, pois é, mas foi a R. que riscou o nome do A. no mapa retribuições que constitui o doc. 15 junto com a p.i., que proibiu que o A. incluísse o seu nome na folha de retribuições de Novembro de 2013, que ameaçou o A. de não pagar qualquer salário aos demais trabalhadores se ele não cumprisse esta determinação (doc. 16 com a p.i.) e que ordenou que fossem abatidos os encargos com IRS e Segurança Social referentes à retribuição a que o A. tinha direito e que foram pagos (ainda que não as retribuições respectivas). Isto foram instruções do Sr. K....... (doc. 17 junto com a p.i.). O A., diz a R., era livre de se pagar como e quando quisesse. Se tivesse perfil ético apropriado, não teria dito o que diz nas suas alegações tendo feito o que fez.
Nos termos do art. 542º, nº 2, do CPC, diz-se litigante de má fé quem, com dolo ou negligência grave: a) Tiver deduzido pretensão ou oposição cuja falta de fundamento não devia ignorar; b) Tiver alterado a verdade dos factos ou omitido factos relevantes para a decisão da causa; c) Tiver praticado omissão grave do dever de cooperação; d) Tiver feito do processo ou dos meios processuais um uso manifestamente reprovável, com o fim de conseguir um objetivo ilegal, impedir a descoberta da verdade, entorpecer a ação da Justiça ou protelar, sem fundamento sério, o trânsito em julgado da decisão.
Este preceito, ao referir o dolo ou negligência grave como tipificadores da litigância de má fé, passou a sancionar, ao lado da litigância dolosa, a litigância temerária: quer o dolo, quer a negligência grave, caracterizam hoje a litigância de má fé, com o intuito, como se lê no preâmbulo do diploma, de atingir uma maior responsabilização das partes.[5]
Assim, pode dizer-se que a má fé psicológica, o propósito de fraude, exige, no mínimo, uma actuação com conhecimento ou consciência do possível prejuízo do acto; tal conhecimento ou consciência pode corresponder quer a dolo eventual quer a negligência consciente e, neste último quadro, aquela consciência pode reportar-se a uma simples previsão do prejuízo resultante do acto, nada se fazendo para o evitar, isto é, mesmo assim pratica-se o acto que se tem como potencialmente lesante.[6]
Distinguem-se claramente, na formulação legal, a má fé substancial – que se verifica quando a atuação da parte se reconduz às práticas aludidas nas alíneas a) e b) do nº 2 do art. 456º, supra transcrito – e a má fé instrumental [als. c) e d) do apontado normativo]. Mas, em ambas, está presente uma intenção maliciosa, ou uma negligência de tal modo grave ou grosseira que justifica um elevado grau de reprovação ou de censura e idêntica reação punitiva.[7]
Ora, no caso vertente, não resulta da matéria de facto provada qualquer conduta da ré indiciadora da invocada má fé processual. O que se verifica é a alegação de factos, ou argumentos jurídicos não aceites pelo autor e na sentença.
Assim, improcede a apelação do autor, também quanto a este aspecto.

5. Litigância de má fé por parte do autor (recurso da ré)
Alega a ré:
Ao contrário da decisão recorrida, dos autos pode e deve concluir-se que é notório que a junção aos autos feita pelo A. de um contrato de trabalho falso, corresponde a uma realidade cuja falta de legalidade o A. não devia ignorar. Tanto mais que o Tribunal ficou convicto de que o contrato de trabalho não foi elaborado na data constante no mesmo, isto é, que é um documento falso.
A Ré requereu uma peritagem ao referido documento, a qual não foi possível realizar unicamente por falta de meios técnicos do Laboratório da Polícia Científica. Mas basta olhar com atenção para o original junto aos autos (fls. 128 a 131) para verificar que aquele documento foi elaborado em data muito recente, não tendo cumprido a formalidade da liquidação do imposto de selo, como era legal e era observado na Firma D......., Lda., tudo com bem salienta a sentença recorrida, na parte da Motivação.
Tudo leva a inferir que aquele contrato foi elaborado recentemente, para nele fazer constar, falsamente, a cláusula dos 300.000,00€ de indemnização que a própria sentença não considerou provada, conforme consta de i) dos Factos não provados e que ali foi incluída com a intenção de prejudicar a Ré, neste processo, tentando que o Tribunal atribuísse ao A. o montante de 300.000,00€!
Não fosse o alto critério do Tribunal e a análise e ponderação de toda a factualidade dada como provada e o A. teria conseguido convencer o tribunal da validade daquele contrato.
Respondeu o autor:
Esta dúvida da R. (se se quiser, chame-se-lhe suspeita) sobre a genuinidade do contrato de trabalho já foi escalpelizada nas alegações do A.. Aqui realça-se, no entanto, que a referida dúvida e ou suspeita, converteu-se em certeza nas alegações da R., classificando, insistentemente de falso o contrato de trabalho, exactamente quando a R. já dispunha de acrescida prova testemunhal, reconhecida como coerente e séria pelo Senhor Juiz “a quo”, que confirmou a genuinidade quer da proposta de contrato quer do contrato de trabalho (neste documento, com excepção do dia da outorga do contrato). Por sua vez, o documento de Fevereiro de 2003 (“Proposta de Condições Contratuais”), cuja genuinidade e veracidade do seu conteúdo não estão postas em causa veio reforçar a própria genuinidade do contrato de trabalho, pois há uma coerência evidente, numa perspectiva de dinâmica negocial, entre um e outro documento, que só divergem no valor da indemnização, que de €150.000,00 passa para €300.000,00. Acresce que a prática da execução da relação contratual (máxime, o salário e as funções) confirmaram, por a ela corresponderem, o conteúdo da proposta de contrato e do próprio contrato.
Diga-se ainda que a R. confunde os conceitos de “documento não genuíno” e de “documento falso”.
Dá-se aqui por reproduzido o aduzido supra quanto à má fé da ré.
A circunstância de não ter sido considerado na matéria de facto provada a celebração do acordo dos autos, não implica que o mesmo seja falso, ou tenha sido preparado apenas para ser apresentado nos presentes autos.
Também não releva, por si só, a circunstância de o autor não ter referido que o documento fora assinado em data posterior à que consta do documento, aquando da apresentação deste.
Assim, improcede aqui a apelação da ré.

6. Valor da retribuição devida ao autor (recurso da ré)
Alega a ré:
O princípio da irredutibilidade da remuneração não é absoluto na nossa actual legislação nem, infelizmente, no dia a dia de milhares e milhares de trabalhadores que viram os seus salários reduzidos, incluindo os dos magistrados judiciais.
(...)
Mas, pergunta-se, o legislador proíbe diminuir a retribuição em qualquer circunstância, mesmo havendo acordo do trabalhador? A Ré não tem que suportar o montante de 5.884,00€, quando assinou uma escritura pública com um documento anexo, rubricado por todos os outorgantes e onde constava que o A. passaria a auferir a retribuição salarial mensal de 1.500,00€, acrescida do subsídio de refeição.
Da mesma Lista constava que os novos salários dos trabalhadores ali indicados tinham o acordo dos trabalhadores, entre os quais estava o A. com o salário de 1.500,00€.
Caso o representante legal da Ré fosse devidamente esclarecido no sentido de que era obrigado a pagar ao A. o salário mensal de €5.884,00 nunca outorgaria a referida escritura. A irredutibilidade da retribuição não pode, sob pena de criar situações absurdas, e de injustificada disparidade retributiva entre trabalhadores que desempenham funções semelhantes, ser entendida de modo formalista e desatendendo à substância das situações, nomeadamente a que consta da realização da escritura pública constante dos autos, que é contraditória e incoerente no seu conteúdo quando comparada com o documento anexo que dela faz parte integrante.
Colocados perante a questão de saber se face ao princípio da irredutibilidade da retribuição, o salário anterior do A. deverá ser mantido, mesmo quando o A. durante três anos não reivindicou a diferença e, como está provado (ponto 15 da sentença) “era o colaborador que, regularmente e com a posição hierárquica mais elevada, assumia a gestão quotidiana da empresa”, a resposta tem que ser negativa.
O A. tinha todas as condições internas e externas para processar o seu salário, conforme julgasse que era legal e devido, pois, repete-se, “assumia a gestão quotidiana da empresa”.
Foi da exclusiva vontade do A. processar ou mandar processar o seu salário no montante de €1.500,00 mensais durante quase 3 anos.
Respondeu o autor:
O documento complementar à escritura de transmissão que a R. invoca é irrelevante no domínio das relações entre o A. e a R., pois o A. não interveio nesta escritura e não deu por qualquer forma acordo à redução salarial drástica operada.
Nesta particular parte das suas alegações referente à questão da irredutibilidade da retribuição revela-se com particular clareza a ausência de filtro ético na conduta processual da R.. Como resulta claro dos articulados da R., esta nunca aceitou que tivesse ocorrido a diminuição da retribuição do A., não aceitando sequer que, anteriormente a 01.01.2011, a retribuição mensal do A. fosse de €5.884,00. No art. 2º da sua contestação a R. impugnou especificamente o art. 44º da p.i. onde se alegou que, à data da transmissão do estabelecimento industrial o A. auferia o salário mensal de €5.884,00.
A R., “esquecendo-se” da sua anterior posição nesta matéria, a páginas 40/63 e 41/63, aceita que houve uma diminuição do salário do A. de €5.884,00 para €1.500,00, alega que a mesma foi acordada com o A., que tal diminuição do salário foi essencial para a vinculação contratual da R., concluindo que “a diminuição da retribuição do A. é legítima porque resulta do estipulado no documento complementar do contrato a que a R. e a Exma. Administradora da massa insolvente se vincularam de mútuo acordo, não havendo qualquer violação ao princípio da irredutibilidade da retribuição”.
Provou-se que:
3. O A. no ano de 2010 e antes da outorga da escritura pública id. em 10., auferia o rendimento mensal ilíquido de 5.884,00€,
4. acrescido de subsídio de alimentação.
10. Por escritura pública datada de 30 de Dezembro de 2010 foi efectuada a “alienação do estabelecimento industrial em liquidação da massa insolvente” outorgada entre a legal representante (Administradora da Insolvência) da sociedade “D......., S.A., em liquidação” – e a ora R. – cf. fls. 25 a 29 cujo teor e dá por integralmente reproduzido –, onde se constata que a R. aceitou a transmissão plena do aludido estabelecimento e dos bens imóveis, móveis, créditos, direitos e obrigações laborais (...)”.
11. Sendo realçado na escritura que “também como contrapartida da transmissão do estabelecimento industrial, a sociedade adquirente assume, de forma exclusiva, todos os direitos e obrigações decorrentes dos contratos de trabalho dos trabalhadores identificados no documento complementar anexo a esta escritura, contratos esses que, a partir da presente data passam a vigorar entre ela e os referidos, mantendo os trabalhadores a antiguidade, categorias profissionais e as retribuições que vêm auferindo na insolvente e que ali estão mencionadas, bem como assume, também de forma exclusiva e sem direito a imputar qualquer custo à transmitente, a obrigação de lhes pagar integralmente, no momento em que forem exigíveis, as retribuições vencidas a partir da presente data, as retribuições relativas às férias ainda não gozadas, respectivo subsídio, relativos ao trabalho prestado no ano em curso e a de lhes permitir a efectivação do direito às férias ainda não por ele gozadas.
Que ainda como contrapartida da transmissão do estabelecimento industrial, a sociedade adquirente assume também a obrigação de dar preferência, nas admissões de pessoal que vier a efectuar até trinta e um de Agosto de dois mil e onze, aos trabalhadores que se encontravam ao serviço da insolvente “D......., S.A.” em um de Janeiro de dois mil e dez e que entretanto cessaram os respectivos contratos de trabalho.
Em anexo à escritura consta uma “Lista de Trabalhadores ao Serviço do Estabelecimento”, da qual consta o nome do autor, o salário de € 1.500,00, mais € 6,41 de subsídio de alimentação, dele constando ainda a notação “os salários tiveram o acordo dos trabalhadores”
Importa lembrar que não se considerou procedente a impugnação da matéria de facto, pelo que a matéria dos pontos 3º e 4º da matéria de facto provada se considera definitivamente assente.
Relativamente à segunda questão pronunciou-se recentemente este Tribunal no acórdão de 29-6-2015,[8] nos seguintes termos:
É certo que no “Documento complementar elaborado nos termos do número 2 do artigo 64º do Código do Notariado” se menciona a lista dos trabalhadores ao serviço do estabelecimento, onde se inclui o nome do autor, com um “salário” de [€ 1.500,00] e um subsídio de alimentação de € 6,41.
Porém, atente-se, os documentos autênticos apenas fazem prova dos factos que referem como praticados pela autoridade ou oficial público respectivo, assim como dos factos que neles são atestados com base nas percepções da entidade documentadora (n.º 2 do artigo 363.º e n.º 1 do artigo 371.º, ambos do Código do Civil).
Como ensina Manuel de Andrade (Noções Elementares de Processo Civil, Coimbra Editora, 1979, pág. 227), «[o]s actos e declarações que o funcionário atesta como praticados, emitidas ou prestadas perante ele terão o valor jurídico que lhes competir, podendo ser impugnados pelos interessados, nos termos gerais de direito (erro na declaração ou erro-vício, coacção, simulação, etc.) não importando isso arguição de falsidade.
O documento faz assim prova plena quanto à materialidade (prática, efectivação) de tais actos e declarações; mas não quanto à sua sinceridade, à sua veracidade ou à falta de qualquer outro vício ou anomalia».
Tal significa, revertendo ao caso em apreço, que na escritura os outorgantes fizeram as declarações em causa, designadamente quanto à retribuição do Autor, mas já não que o declarado corresponda à realidade.
Ora, o trabalhador não interveio nessa escritura, pelo que a materialidade do declarado e eventual não veracidade do mesmo só pode ser imputado a um ou ambos os outorgantes dessa escritura.
Daí que, apenas com base nesta, não possa ser dado como provado que o autor auferia a retribuição mensal de [€ 1.400,00] acrescida de € 6,41 de subsídio de alimentação por cada dia de trabalho.
(...)
Importa, antes de mais, ter presente o que dispõe o artigo 129.º, n.º 1, alínea d), do Código do Trabalho:
«1- É proibido ao empregador: (...)
d) Diminuir a retribuição, salvo nos casos previstos neste Código ou em instrumento de regulamentação colectiva de trabalho».
Extrai-se da letra deste preceito que a redução da retribuição apenas pode ocorrer nos casos previstos no Código [como ocorre, por exemplo, em situações de mobilidade funcional do trabalhador – artigo 120.º –, de redução do tempo de trabalho ou da suspensão do contrato de trabalho em situação de crise da empresa – artigo 305.º, n.º 1, alínea a) –, ou nas situações em que cessa a comissão de serviço e o trabalhador se mantém na empresa, a exercer a actividade que exercia antes da referida comissão de serviço – artigo 164.º, n.º 1, alínea a)] e nos instrumentos de regulamentação colectiva de trabalho.
Por isso, como adverte Pedro Romano Martinez (et alii, Código do Trabalho anotado, 2013 – 9.ª Edição, Almedina, pág. 344), “ (…) deixou de ser lícita a diminuição da retribuição, que não resulte de modificações contratuais, por mero acordo das partes”.
No caso em apreciação, tem-se por incontroverso que a letra da lei [a referida alínea d), do n.º 1, do artigo 129.º) aponta no sentido que caso não se verifique modificação no contrato de trabalho não é permitida a redução da retribuição, ainda que houvesse acordo das partes, que não existe.
A recorrente argumenta que caso tivesse sido devidamente esclarecida, no sentido de que era obrigada a pagar ao Autor a retribuição mensal de [€ 5.884,00], nunca outorgaria a escritura pública.
Trata-se de uma questão que se insere nos vícios da vontade, com eventual repercussão no negócio celebrado entre as partes e titulado por escritura pública, mas a que o Autor é alheio, pelo que não pode por eles (vícios) ser afectado, em termos de ver diminuída a retribuição.
Aliás, nas suas alegações, justificando o proveito do autor ao deixar a F......., vem a ré admitir a remuneração atribuída ao autor.
Subscreve-se, portanto, a doutrina transcrita, pelo que se conclui pela improcedência da apelação quanto a este ponto.

7. Abuso de direito (recurso da ré)
Alega a ré:
Foi alegado pela Ré na sua Contestação que o A. ao peticionar a diferença remuneratória, depois de durante 3 anos receber o salário mensal de 1.500,00€, está a agir com abuso de direito, na modalidade de venire contra factum proprium.
A Ré considerou que o A. tinha conhecimento que o seu salário era de 1.500,00€ pelo que sempre confiou que três anos depois do A. ser trabalhador da Ré, este nunca viria a peticionar um salário diferente.
A Ré na sua contestação concluía que é inadmissível e contrária à boa fé a conduta assumida pelo A. na exacta medida em que trai a confiança gerada junto da Ré, atento o seu comportamento.
A douta decisão recorrida decidiu que improcede a excepção de abuso de direito, citando a doutrina e alguma jurisprudência. Ora, analisando o caso do Ac. do STJ, de 13 de Dezembro de 2012, citado na sentença, vemos que ele é completamente diferente do caso dos autos.
O A. era simultaneamente trabalhador e tinha funções de gerência.
Conforme consta dos pontos 12 e 15 da matéria de facto, os gerentes raramente se encontravam presentes na empresa, e desde o início de 2012, nem sequer compareceram pessoalmente e o A., por regra, era o colaborador que, regularmente e com a posição hierárquica mais elevada, assumia a gestão quotidiana da empresa.
No caso dos autos, o A. tinha perfeito conhecimento dos seus direitos, não tinha receio de perder o emprego, era o gerente de facto e não tinha que ter quaisquer expectativas de reparação do alegado incumprimento por parte da Ré, pois, concordou até em receber uma compensação para que o seu salário líquido fosse de €1.500,00, assim entendendo o valor que constava da já mencionada Lista.
Assim, salvo melhor opinião, a conduta do A. demonstrada na factualidade provada excede manifestamente os limites impostos pela boa fé, pelos bons costumes ou pelo fim social e económico do direito, que se arroga.
O A. teve oportunidade de cessar o seu contrato de trabalho por sua iniciativa, pois, antes da insolvência de “D......., S.A.” tinha vários meses de salários em atraso. Passaria a receber o subsídio de desemprego com base no salário mensal de €5.884,00, poderia exigir a alegada compensação de €300.000,00, além da indemnização decorrente da cessação do contrato, nos termos do art. 396º do CT. Estranhamente, preferiu continuar ao serviço da Ré com a retribuição de €1.500,00.
Respondeu o autor:
Não tendo reconhecido o direito do A. ao salário de €5.884,00, não pode a R. opor ao A. uma suposta natureza abusiva do exercício desse direito quando o prolongamento no tempo de uma omissão que se traduza numa não reação à diminuição salarial pudesse ter criado na R. a expectativa, que supostamente seria legítima, de que o A. se conformara com o salário mensal de €1.500,00. À luz da versão que a R. dá dos factos, o A., ao não reclamar, antes da cessação do contrato de trabalho, o salário mensal de €5.884,00 e as correspondentes diferenças salariais, não está, aos olhos da R. a ter uma conduta contraditória susceptível de criar na R. a expectativa legítima de que o A. não exerça o direito que a R., na lógica do que alega, entende que o A. não tem. Não tendo reconhecido assim o direito do A. não pode opor o carácter abusivo que teria o exercício desse direito.
Acresce que, ademais, estamos no domínio dos direitos indisponíveis, o que impede que se valide um acto nulo pelo mero decurso do tempo, pois isso ofenderia valores e interesses de ordem pública.
Retoma-se aqui o acórdão deste Tribunal de 29-6-2015, que se continua a reproduzir:
Decorre do artigo 334.º do Código Civil que o abuso do direito consiste no exercício ilegítimo de um determinado direito, traduzindo-se a ilegitimidade em actuação, por parte do respectivo titular, que manifestamente exceda os limites impostos pela boa fé, pelos bons costumes ou pelo fim económico ou social desse direito.
Para que o exercício do direito seja considerado abusivo, não basta, pois, que cause prejuízos a outrem; é necessário que o titular exceda, visível, manifesta e clamorosamente, os limites que lhe cumpre observar, impostos quer pelo princípio da tutela da confiança (boa fé), quer pelos padrões morais de convivência social comummente aceites (bons costumes), quer, ainda, pelo fim económico ou social que justifica a existência desse direito, de tal modo que o excesso, à luz do sentimento jurídico socialmente dominante, conduz a uma situação de flagrante injustiça.
Dito ainda de outro modo: para determinar os limites impostos pela boa fé e pelos bons costumes, há que atender de modo especial às concepções ético-jurídicas dominantes na colectividade; quando esses limites decorrem do fim económico e social do direito impõe-se apelar para os juízos de valor positivo consagrados na própria lei (Antunes Varela, das Obrigações em Geral, 10.ª edição, pág. 544 e segts.).
Pessoa Jorge (Ensaio sobre os Pressupostos da Responsabilidade Civil, Cadernos de Ciência e Técnica Fiscal, 1968, nota 166) sublinha que a orientação que fundamenta o abuso do direito não assenta na preocupação de evitar que uma lei, justa em abstracto, se torne iníqua no caso concreto, já que a relevância do abuso do direito não afecta o princípio da aplicabilidade da lei a todos os casos nela previstos, mesmo que, num ou noutro, tal aplicação se revele injusta: a reprovação do abuso do direito procura, sim, que não se desvirtue o verdadeiro sentido da norma abstracta.
A manifestação mais evidente do abuso do direito é a chamada conduta contraditória (venire contra factum proprium) em combinação com o princípio da tutela da confiança (exercício dum direito em contradição com uma conduta anterior em que a outra parte tenha confiado, vindo esta com base na confiança gerada, e de boa fé, a programar a sua vida e a tomar decisões). Como figuras próximas, encontra-se a renúncia (acto de disposição jurídico-negocial que pressupõe a vontade de abdicar do direito, de o extinguir) e a neutralização do direito.
Segundo Baptista Machado (Revista de Legislação e Jurisprudência, n.º 118, pág. 228), esta última figura é considerada, em geral, como uma modalidade especial da proibição do venire contra factum proprium e ocorre quando se verificam cumulativamente as seguintes circunstâncias: (i) o titular dum direito deixa passar longo tempo sem o exercer; (ii) com base neste decurso do tempo e com base ainda numa particular conduta do dito titular ou noutras circunstâncias, a contraparte chega à convicção justificada de que o direito já não será exercido; (iii) movida por esta confiança, essa contraparte orienta em conformidade a sua vida, tomando medidas ou adoptando programas na base daquela confiança, pelo que o exercício tardio e inesperado do direito lhe acarretará uma desvantagem maior do que o seu exercício atempado.
A irrenunciabilidade dos créditos salariais por banda do trabalhador radica desde logo na natureza da relação juslaboral: trata-se de uma relação marcada pela subordinação jurídica e económica do trabalhador ao empregador, o que coloca aquele numa posição mais débil perante este, e nessa medida pode afectar o exercício dos direitos por parte do trabalhador na pendência da relação de trabalho, maxime ao aceitar uma redução da retribuição, ou ao não reclamar dessa redução.
Daí que a jurisprudência venha entendendo, ao que se conhece de modo uniforme, que na vigência da relação de trabalho se mantém a indisponibilidade dos direitos de natureza pecuniária emergentes do contrato de trabalho a fim de obstar a que o estado de subordinação jurídica e económica do trabalhador relativamente ao empregador possa afectar o exercício desses direitos pelo trabalhador; mas aquela indisponibilidade deixa de vigorar após a cessação do contrato de trabalho, pois cessando igualmente aquele estado de subordinação não há qualquer impedimento legal a que o trabalhador disponha livremente do seu direito às retribuições [vide, entre outros, os acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 18-06-2003 (Recurso n.º 836/03), de 03-03-2005 (Recurso n.º 3154/04) e de 31-10-2007, todos da 4.ª Secção e disponíveis em www.dgsi.pt].
Mas a irrenunciabilidade de créditos salariais radica também na natureza alimentar destes, visando-se com aquela a protecção do trabalhar e da sua família e, por essa via, a própria harmonia, bem estar social e realização integral dos mesmos.
Ora, recebendo o trabalhador, por virtude do contrato de trabalho, uma determinada retribuição mensal – que se destina, essencialmente, a satisfazer as suas necessidades alimentares, lato sensu, sendo, por isso, com essa retribuição que ele organiza e gere o seu orçamento familiar –, a sua diminuição não poderá deixar de ser susceptível de afectar o seu orçamento familiar e, bem assim, o próprio bem estar social.
Daí que se justifique que, exceptuando nos casos previstos no Código ou em instrumento de regulamentação colectiva (e aqui não pode deixar de ponderar-se que tratando-se de uma negociação colectiva poderá cada um dos intervenientes abdicar de alguns direitos/vantagens, em contrapartida de outros que ganha), o empregador não possa diminuir a retribuição do trabalhador.
Tal como se salienta ainda no mesmo acórdão, não só não se provou que o autor tivesse a possibilidade de determinar o seu próprio salário, antes resultando o oposto, como também não resulta da factualidade provada que houvesse qualquer acordo entre a ré e o autor, aquando da transmissão do estabelecimento ou posteriormente, no sentido de este aceitar a diminuição da retribuição.
Relativamente ao argumento do não exercício do direito por parte do autor desde a transmissão do estabelecimento até à resolução do contrato de trabalho, continuamos a seguir o mesmo acórdão deste Tribunal, no qual se considerou:
(...) na vigência da relação do trabalho o trabalhador mantém-se na dependência do empregador, pelo que se compreende que nesse período ele não reclame créditos que entende assistirem-lhe e que a lei lhe conceda a faculdade de reclamar os mesmos durante o ano seguinte ao termo do contrato (n.º 1 do artigo 337.º do Código do Trabalho).
Como se escreveu no acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 15-12-2011 (Proc. n.º 2/08.9TTLMG.P1.S1, disponível em www.dgsi.pt), numa situação com paralelismo com a presente, «[o] facto de o trabalhador vir a exigir do empregador prestações salariais que há longos anos lhe eram devidas, prestações que na altura podia ter exigido, mas que não exigiu, qualquer que tenha sido o motivo — imperfeito conhecimento dos seus direitos, receio de perda do emprego, expectativa de reparação do incumprimento do empregador, etc. — não integra, por princípio, uma actuação com abuso do direito, mas antes um exercício incensurável do mesmo direito.
É que a não reclamação na altura própria de direitos que assistam ao trabalhador não comporta o significado, atenta a natureza e posição das partes no contrato, que o mesmo deles tivesse pretendido abdicar, tanto mais tratando-se de direitos indisponíveis, para mais tarde assumir uma conduta antagónica e surpreender o empregador com um pedido inesperado.
A relação laboral está concebida na lei em termos de ambas as partes poderem reclamar uma da outra créditos que lhes assistam, quer durante a vigência do contrato quer durante o ano seguinte ao seu termo, enquanto tais créditos se não mostrem prescritos. E, assim sendo, cada uma delas, tem de estar consciente e prevenida para a eventualidade de uma petição reclamadora de direitos, tanto mais nas situações em que não possam ignorar a falta de cumprimento da sua parte, por longínqua que ela já se mostre.
E no caso dos autos nem releva que fosse o trabalhador, ora Recorrido, a processar os seus próprios vencimentos, pois que é suposto que o fazia nos termos determinados pela entidade empregadora e não por alvitre próprio.».
Assim, no caso, pode-se até admitir que o trabalhador só tomou consciência do seu direito às diferenças salariais aquando da resolução do contrato.
Contudo, ainda que assim não seja, da falta de reclamação contra o pagamento de uma retribuição inferior à devida não se pode concluir pela aceitação por parte do trabalhador do salário que lhe foi sendo pago, pois esta situação envolveria uma violação do princípio da irredutibilidade da retribuição, que só podia ser reduzida nas circunstâncias supra analisadas e descritas, que, no caso, não se verificavam.
Assim, importa concluir pela não verificação do abuso do invocado direito.

8. Valor da indemnização decorrente da cessação do contrato de trabalho (recurso da ré)
Alega a ré:
Também a indemnização decorrente da cessação do contrato de trabalho que o tribunal entendeu como adequado fixar os dias de retribuição base em 30 dias, por cada ano completo de antiguidade (10 anos) no montante global de 62.761,60€, deve ser fixado em apenas 15 dias, por cada ano completo de antiguidade, nos termos do art. 396º, nº 1 do Código do Trabalho, por se considerar um valor mais justo e equitativo, atendendo ao caso concreto dos autos e , nomeadamente, à falta de recursos financeiros da Ré, para pagar montantes tão elevados, causando a sua inexorável insolvência e o despedimento dos restantes trabalhadores.
Do cotejo da matéria de facto dada como assente, resulta provado que a R., à data da cessação do vínculo laboral, devia ao A. as retribuições constantes no ponto 16. Todavia, não podemos esquecer que o A., exercendo o cargo de director-geral e a gerência de facto, era também o principal responsável pela gestão dos recursos financeiros para garantir o pagamento dos salários e outras despesas de funcionamento.
Respondeu o autor:
A solução da lei é clara – um mês por cada ano completo de antiguidade (art. 5º da Lei 69/2013 de 30/10).
Antes de mais importa referir não ter aqui aplicação o disposto no mencionado art. 5º da Lei nº 69/2013, de 30 de Outubro.
Efectivamente, conforme resulta evidente do preceito em causa, o mesmo veio estabelecer um regime transitório para os casos de despedimento colectivo, cujo regime foi alterado pelo diploma em causa, sendo a indemnização por resolução do contrato com justa causa, aqui em questão objecto de regulação própria.
Voltando ao acórdão deste Tribunal de 29-6-2015, diremos que:
De acordo com o disposto no n.º 1 do artigo 396.º do Código do Trabalho, em caso de resolução do contrato com fundamento em justa causa, por comportamento culposo do empregador, o trabalhador tem direito a indemnização, a determinar entre 15 e 45 dias de retribuição base e diuturnidades por cada ano completo de antiguidade, «(…) atendendo ao valor da retribuição e ao grau de ilicitude do comportamento do empregador, não podendo ser inferior a três meses de retribuição base e diuturnidades».
No caso de fracção de ano de antiguidade, o valor da indemnização é calculado proporcionalmente (n.º 2 do artigo).
O valor da indemnização pode ser superior ao que resultaria do critério referido sempre que o trabalhador sofra danos patrimoniais e não patrimoniais de montante mais elevado (n.º 3 do mesmo artigo).
O critério geral da indemnização em caso de resolução com justa causa do contrato pelo trabalhador parte, pois, da fixação de uma retribuição entre 15 e 45 dias de retribuição base e diuturnidades por cada ano de antiguidade ou fracção, atendendo-se na determinação concreta daquela ao valor da retribuição e ao grau de ilicitude do comportamento do empregador.
Trata-se de um critério em tudo semelhante ao previsto para as situações de despedimento ilícito e em que a pedido do trabalhador é fixada indemnização em substituição da reintegração (cfr. artigo 391.º).
A jurisprudência do Supremo Tribunal de Justiça tem afirmado [por todos, vejam-se os acórdãos de 06-02-2008 (Recurso n.º 2621/07) e de 26-03-2008 (Recurso n.º 50/07), disponíveis em www.dgsi.pt] que nesta última situação, a indemnização, para além de um cariz reparador ou ressarcitório, associado à ideia geral de obtenção pelo trabalhador de uma compensação pela perda do emprego, que o acautele e prepare para o relançamento futuro da sua actividade profissional, assume uma natureza sancionatória ou “penalizadora” da actuação ilícita do empregador; o juízo de graduação da indemnização de antiguidade há-de ser global, ponderando em concreto os critérios referidos na lei e considerando, essencialmente, o grau de ilicitude do despedimento, particularmente influenciada pelo nível de censurabilidade da actuação do empregador, na preparação, motivação ou formalização da decisão de despedimento.
A fixação de uma indemnização de antiguidade próxima do limite máximo previsto deve ficar reservada para situações de grosseira violação/omissão procedimental e, bem assim, para aquelas em que a sanção deva considerar-se ostensivamente violadora de princípios fundamentais e estruturantes, maxime, o da igualdade [cfr. neste sentido os acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 27-05-2010 (Recurso n.º 467/06.3TTCBR.C1.S1) e de 16-12-2010 (Recurso n.º 314/08.1TTVFX.L1.S1), disponíveis em www.dgsi.pt] ou, noutra perspectiva, no entendimento do mesmo tribunal, na fixação do valor referência da indemnização de antiguidade relevam, por um lado, o valor da retribuição e, por outro lado, o grau de ilicitude: quanto menor for a retribuição, mais elevada deve ser a indemnização; e mais elevada deve ser indemnização quanto maior for a ilicitude (acórdão de 24-02-2011, Recurso n.º 2867/04.4TTLSB.S1, também disponível em www.dgsi.pt).
Isto é, e em suma: na aplicação do quantum indemnizatório aos casos de despedimento ilícito, a jurisprudência do Supremo Tribunal de Justiça tem partido do entendimento que só se justifica uma indemnização próximo dos limite máximo de 45 dias nas situações de ostensiva violação dos direitos do trabalhador, o que significa que quanto maior for a ilicitude maior deve ser a indemnização, assim como quanto mais baixa for a retribuição mais elevada deve ser a indemnização,
Também neste mesmo sentido parece pronunciar-se a doutrina.
Assim, Monteiro Fernandes (Direito do Trabalho, 13.ª Edição, Almedina, págs. 570-571) “admite” que «(…) a lei pretenda sugerir tanto maior aproximação do limite superior quanto mais baixo for o salário, visando garantir um valor absoluto compensador. Relativamente ao grau de ilicitude, o art. 439.º/1 referencia o art. 429.º, onde, na verdade, se encontram listadas, mas não hierarquizadas nem graduadas, as causas de ilicitude do despedimento. Pode supor-se – numa perspectiva inteiramente apriorística – que deva considerar-se “mais baixo” o grau de ilicitude do despedimento com vício processual do que o de despedimento por motivos políticos, e que seja razoável colocar em posição intermédia a improcedência de motivos ou a inexistência de justa causa».
Bernardo Lobo Xavier assinala a este propósito (Direito do Trabalho, Verbo, 2011, pág. 807) que, «[p]ara além do grau de ilicitude – o que parece adequado -, a referência à retribuição como graduando o cálculo da indemnização é equívoca, pois pode funcionar para beneficiar ou não o despedido. É de pensar que os tribunais tenderão a aumentar o número de dias como factor de cálculo quando a retribuição for baixa e a reduzir esse número quando a retribuição for alta. A verdade é que o que pareceria interessar seria a compensação do dano da perda do emprego e esse tem de ser avaliado de acordo com os factores de empregabilidade e, porventura, aceitando outros factores relevantes, como por exemplo a proximidade da reforma».
No caso dos autos, provou-se que:
O A. foi admitido pela sociedade “D......., S.A.” em Abril de 2003 (facto 1º).
O A. no ano de 2010 e antes da outorga da escritura pública, auferia o rendimento mensal ilíquido de 5.884,00€, acrescido de subsídio de alimentação (factos 3º e 4º).
A R. a partir de 1 de Janeiro de 2011 e até à cessação do contrato de trabalho liquidou junto do A. a retribuição ilíquida mensal de €1.500,00, acrescido de subsídio de alimentação (facto 13º).
Por carta datada de 22 de Novembro de 2013, enviada à R. por correio registado com aviso de recepção no dia 25 do mesmo mês, o A. comunicou à R. que procedia à resolução com justa causa do contrato de trabalho (facto 14º).
A R., até 4 de Novembro de 2013, não procedera ao pagamento aos demais trabalhadores das suas equivalentes retribuições do mesmo período e a igual título referidos em 16 (facto 17º).
Por determinação expressa da R. dirigida ao A., este processou a “folha de salários” relativa ao mês de Outubro de 2013, nela tendo o A. incluído todos os trabalhadores incluindo ele próprio (facto 18º).
Na referida “folha de salários” o A. manuscreveu que quanto a dois vendedores da empresa (Q...... e R......), tinham cessado os respectivos contratos de trabalho em 11/10/2013 e estava em curso o cumprimento do acordo de pagamento de montante e na forma que fora negociados pelo Sr. S...... e pelo Dr. T...... com estes vendedores (facto 19º).
No fax do A. que acompanhava a referida “folha de salários” e que o sócio-gerente da R. Sr. K...... recebeu, o A. anotou o facto do Dr. T...... lhe ter transmitido que, por ordens do sócio-gerente da R. Sr. K......, a retribuição a processar para pagamento era a de Outubro de 2013 e não, contrariamente ao que era prática habitual, as mais antigas em dívida, neste caso o salário de Agosto de 2013 mais a parte do subsídio de férias em falta (facto 20º).
A “folha de salários” remetida pelo A. e recebida pelo Sr. K...... foi-lhe por este devolvida com o seu nome e o de dois colegas de trabalho riscados por cima e com cálculos manuscritos pelo Sr. K...... donde decorria que não for considerado o pagamento da retribuição do A. e da dos outros referidos colegas, sendo previsto o pagamento aos demais trabalhadores, procedimento que se confirmou ao terem sido, como foram, emitidos pela gerência cheques para pagamento a todos os trabalhadores da empresa, à excepção do A. e dos outros colegas de trabalho, cheques esses que foram entregues pelo A. aos seus destinatários (facto 21º).
Não obstante não ter sido paga a retribuição do A. que aos demais foi paga, o A. remeteu o mapa integral de retribuições para a Segurança Social e para a Autoridade Tributária, facto que foi censurado posteriormente pela gerência e por esta exigido que fossem abatidos os encargos que em sede de TSU e de IRS resultavam para a empresa relativamente aos trabalhadores constantes do mapa de retribuições (facto 22º).
Consignou-se na sentença:
Cumpre salientar que consideramos que a antiguidade, por força da transmissão de estabelecimento ocorrida (cf. fls. 10 a 12), computar-se-á desde Abril de 2003. Conforme foi decidido pelo Ac. do Tribunal da Relação do Porto, datado de 31 de Maio de 2010, disponível no site www.dgsi.pt, antiguidade a atender para efeitos no disposto no art. 396º nº 1 e 2 do CT/2009, é a antiguidade na empresa e esta corresponde ao período temporal em que o trabalhador se encontra integrado na organização laboral do empregador, devendo atender-se ao período de trabalho prestado na sociedade cedente.
Assim , considerando o valor da retribuição e ao grau de ilicitude do comportamento do empregador, que atento os factos provados, conduzir-se-á ao não pagamento de 3 meses de retribuição e à discriminação ocorrida pelo seu não pagamento, entendemos como adequado fixar os dias de retribuição base em 30 dias, por cada ano completo de antiguidade (10 anos).
Sendo que no caso de fracção de ano de antiguidade, o valor da indemnização é calculado proporcionalmente.
Face à aludida factualidade, considerando que o trabalhador auferia uma remuneração muito superior à média, sendo reduzida a ilicitude da empregadora, considerando a sua precária situação financeira, enunciada no facto 35º da matéria de facto provada, afigura-se correcto, como pretende a ré, fixar o valor da indemnização no seu mínimo.
Efectivamente, o facto provado 21º não demonstra, por si só a descriminação invocada na sentença sob recurso.
Assim, deve proceder neste aspecto a apelação da ré, reduzindo a 15 dias de salário por cada ano de serviço a indemnização prevista no art. 396º, nº 1, do Código do Trabalho.

V. Decisão
Pelo exposto, acorda-se em julgar improcedente a apelação do autor e julgar parcialmente procedente a apelação da ré, reduzindo-se a indemnização por resolução lícita do contrato de trabalho, ao montante de € 31.380,80 (trinta e um mil trezentos e oitenta euros e oitenta cêntimos), no mais se confirmando a sentença recorrida.
Custas em ambas as instâncias na proporção do vencido.

Porto, 8-7-2015
Rui Penha – relator
Maria José Costa Pinto
João Luís Nunes
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Sumário
I. A nulidade do acórdão, por contradição entre os fundamentos e a decisão, verifica-se, apenas, quando ocorre um vício real no raciocínio expresso na decisão, consubstanciado na circunstância da fundamentação explicitada na mesma apontar num determinado sentido, e, por seu turno, a decisão que foi proferida seguir caminho oposto, ou, pelo menos, diferente.
II. Salvo convenção expressa, a cláusula penal não se cumula com a indemnização legal.
III. A diminuição da retribuição apenas é possível nas específicas situações previstas no Código do Trabalho ou em instrumento de regulamentação colectiva de trabalho.
IV. Da circunstância de a um trabalhador, director geral da empresa, ao longo de três anos ter sido paga retribuição inferior à devida e de o mesmo não ter reclamado de tal situação não se pode concluir pela aceitação da retribuição que lhe foi paga, pois esta situação envolveria uma violação do princípio da irredutibilidade da retribuição.
V. Por isso, não age com abuso do direito o trabalhador que, decorridos esses três anos e na sequência da resolução do contrato de trabalho com outro fundamento, vem pedir o pagamento das diferenças entre a retribuição que lhe foi paga e a devida.\
VI. Mostra-se ajustada a fixação de uma indemnização de 15 dias de retribuição base e diuturnidades, por cada ano de antiguidade ou fracção, a um trabalhador, director geral da empresa, que resolveu o contrato de trabalho com justa causa, e em que, de relevante, apenas se apura que ocorreu falta de pagamento da retribuição mensal de € 5.884,00 durante três meses seguidos, sendo que tinha de antiguidade cerca de 10 anos, sendo deficitária a situação económica da empresa.

Rui Penha
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[1] Acórdão do STJ de 12-2-2013, processo 110/2000.L1.S1, relator Bettencourt de Faria, acessível em www.dgsi.pt/jstj.
[2] Acórdão do STJ de 30-5-2013, processo 660/1999.P1.S1, relator Álvaro Rodrigues, acessível em www.dgsi.pt/jstj.
[3] Fernando Amâncio Ferreira, Manual dos Recursos em Processo Civil, 7ª edição, Coimbra, Almedina, 2006, pág. 170.
[4] Entre outros, o acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 15-12-2005, processo 11246/2005-7, relator Pimentel Marcos, acessível em www.dgsi.pt/jtrl.
[5] Acórdão do STJ de 30-9-2004, processo 04B2279, relator Araújo de Barros, acessível em www.dgsi.pt/jstj, citando José Lebre de Freitas, A. Montalvão Machado e Rui Pinto, Código de Processo Civil Anotado, vol. 2º, Coimbra, 2001, pág. 195.
[6] Acórdão do STJ de 6-1-2000, processo 1034/00, relator Lúcio Teixeira, ainda citado no mesmo acórdão do STJ de 30-9-2004.
[7] Acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 17-9-20012, processo 1052/07.8TTVNG-D.P1, relator Machado da Silva, acessível em www.dgsi.pt/jtrp.
[8] Processo 682/13.3TTOAZ.P1, sendo ré a mesma dos presentes autos, relatado por João Luís Nunes, nestes adjunto.