Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
0642816
Nº Convencional: JTRP00039233
Relator: JOSÉ PIEDADE
Descritores: RECUSA DE JUÍZ
Nº do Documento: RP200605310642816
Data do Acordão: 05/31/2006
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: INCIDENTE.
Decisão: INDEFERIMENTO.
Indicações Eventuais: LIVRO 225 - FLS. 65.
Área Temática: .
Sumário: Não é suficiente para recusar a intervenção de um juiz num processo o facto de contra ele terem sido apresentadas pelo defensor uma queixa criminal e uma participação ao Conselho Superior da Magistratura.
Reclamações:
Decisão Texto Integral: ACORDAM, EM CONFERÊNCIA, OS JUIZES DA 2ª SECÇÃO CRIMINAL DO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DO PORTO:

B……., em requerimento subscrito pela sua co-mandatária Drª C…….., deduziu o incidente de recusa de intervenção da Srª Juíza titular do processo Drª D……., alegando o que a seguir se transcreve:
1.- A requerente, em Julho de 2003, no exercício das suas funções denunciou criminalmente, para além de outros, o Sr. Comissário E……. e o Sr. Inspector Chefe Aposentado F……., queixa que deu origem aos presentes.
2.- Tal queixa levou a que estes dois, utilizando a comunicação social, a viessem a atingir na sua honorabilidade pessoal e profissional.
Desde logo, a requerente fez questão em clarificar que não deslocaria o assunto do palco obrigatório, face ao segredo de justiça, mas explicitava que houvesse ventos, tempestades, pressões ou mexericos, não deixaria de trilhar o caminho da verdade e de exigir que as instâncias que teriam de resolver o problema a procurassem e a encontrassem.
4.- no inquérito a que deu origem a sua participação, confluiriam novas queixas apresentadas pela mesma contra o Inspector Chefe F……. e o Chefe E……, pelas publicações efectuadas, uma queixa apresentada pelo Inspector Chefe contra a requerente e uma denúncia formalizada pelo Comissário E…… contra si e os homens que a acompanhavam aquando da intervenção da noite 9/10 de Julho.
Após a denúncia apresentada a requerente tem sido vítima de queixas originárias no Comissário E…… ou em pessoas que ele arregimenta.
O Comissário já foi pronunciado pelas atoardas que lançou nos jornais e televisão no Verão de 2003, tendo julgamento aprazado para Junho próximo (doc.1).
Tendo sido requerida a instrução no inquérito 245/03.1 TACHV, o processo veio a calhar ao 2º Juízo, em circunstâncias não muito claras.
À Sra. Juíza recusanda é conhecido, desde pelo menos Setembro de 2004, um relacionamento afectivo com o Comandante da Brigada de Trânsito de Chaves, sargento G…….., relacionamento que começou a causar algum alerta público, quando começou a provocar atrasos nas diligências a que a requerida preside.
É conhecido um caso em que detidos tiveram de aguardar, para além do horário do encerramento do tribunal, que a Sra. Juíza chegasse para levar a efeito o seu interrogatório judicial.
Por força do aludido relacionamento afectivo, a Sra. Juíza recusanda veio a criar laços de amizade com o Comissário E……., que, publicamente, se tomaram visíveis pelo facto de ele, diariamente, se dirigir ao gabinete da mesma e de ter sido a única civil que esteve presente na festa de Natal de 2004 da PSP de Chaves.
Os seus mandatários foram alertados para todo o conteúdo de 7 a 10 após a distribuição do processo.
Por isso, quando foram notificados do despacho de 25 de Janeiro de 2005, na parte em que aduzia que as diligências agendadas eram feitas sem intervenção do Mº Pº e dos mandatários/defensores dos arguidos, desde logo se dirigiram aos autos no sentido de perceberem se tal decisão teria alguma coisa a ver com o relacionamento da Sra. Dra. Juíza recusanda com o Comissário E…… .
A decisão proferida na sequência, deixou-lhe algum descanso, porquanto, tendo explicitado que queriam estar presentes a todas as diligências de instrução agendadas, tal foi expressamente permitido, com a clarificação desnecessária de que, no interrogatório complementar, as perguntas dos mandatários seriam formuladas pelo tribunal.
A requerente e os seus mandatários tinham feito questão em respeitar escrupulosamente o segredo de justiça enquanto o mesmo vigorou e faziam questão em que os jornais, que tinham publicado as ofensas à mesma, pudessem, eles próprios, no momento oportuno, aquilatar da verdade do que ocorrera, através da presença às diligências de instrução.
Porém, estranhamente, na sessão de 22 de Fevereiro, que começou pelas 15.35 horas e foi interrompida durante 40 minutos após o requerimento do mandatário da requerente, a Sra. Juíza recusanda ordenou a saída de todos os presentes na sala, sem qualquer fundamentação, apesar do despacho proferido em 16 de Fevereiro.
Atente-se que esta nova decisão, expressamente no que ao mandatário da requerente concerne, contradiz decisão anterior, sobre a mesma matéria sendo, pois, tal comportamento contrário à ordem jurídica e, então, um facto processual ilícito que não deve, por isso, subsistir (cfr. Alberto dos Reis, Código de Processo Civil Anotado, vol. V, 193 e Rodrigues Bastos, Notas ao Código de Processo Civil, ambos no comentário ao artigo 675º).
Por exigir o cumprimento da lei, o seu mandatário ainda foi punido.
A Sra. Dra. Juíza recusanda, apesar do que decidiu, não tomou qualquer iniciativa para impedir que os arguidos que especificou no seu despacho deixassem de contactar uns com os outros e, ela própria, que passou duas vezes pelo átrio, o constactou.
São bem estranhos, face à tramitação do inquérito, depoimentos prestados pelos arguidos H……, I……. e E……, em 22 de Fevereiro de 2005, com a nuance de todos falarem da BT da GNR.
A argumentação aduzida quanto aos 2º, 3º, 4º e 5º arguidos em nenhuma circunstância era aplicável à requerente, por a sua matéria ser distinta: foi acusada por um crime de natureza particular.
Em 25 de Fevereiro, sem qualquer fundamentação, a Sra. Dra. Juíza recusanda não permitiu que o seu mandatário arguísse em acta uma nulidade, que lhe foi clarificado ser questão prévia à diligência, como não permitiu que exarasse no mesmo documento o protesto atinente a tal proibição, apesar de ser esclarecida de que protesto, sob pena de infracção disciplinar, tinha de ficar exarado em acta.
Nessa sessão, a Sra. Dra. Juíza recusanda disse publicamente “...Aqui quem faz as regras sou eu...”.
A Sra. Dra. Juíza recusanda não tem permitido o acesso aos autos, desde 22 de Fevereiro, aos seus mandatários, dificultando conscientemente o exercício consciencioso do patrocínio nos mesmos.
Pretendia mesmo que o debate instrutório ocorresse, hoje, sem acesso prévio aos autos, como lhe foi solicitado na 5ª feira transacta.
São parcialmente falsos os autos das diligências ocorridas em 22 e 25 de Fevereiro de 2005.
Como já o fizera em 22 de Fevereiro de 2005, em 7 de Dezembro de 2005, a Sra. Dra. Juíza recusanda alterou um despacho, sem ser em sede de reparação da decisão.
Numa das diligências a que esteve presente o mandatário da requerente, a Sra. Dra. Juíza recusanda, apesar do decidido em 25 de Janeiro de 2005 deu-lhe a palavra.
Por sistema, os despachos que a Sra. Dra. Juíza recusanda proferiu nos autos não têm fundamentação de direito.
A Sra. Dra. Juíza recusanda tem dificultado a instrução de um recurso, que subiu em separado, na forma pretendida (docs. 3, 4 e 5).
A Sra. Dra. Juíza recusanda reteve a reclamação da não admissão de um recurso mais de um mês (doc. 6).
Com os factos narrados supra em 15 e seguintes a Sra. Dra. Juíza recusanda, que agiu, livre e conscientemente, bem sabendo que o seu comportamento estava previsto e era punido por lei, pretendeu obter benefícios para si e para o Comissário E……., fazendo com que o processado ocorresse sem o seu controlo, o do público e o da comunicação social e causar prejuízos à recorrente, quer ao seu mandatário, quanto às suas imagens profissional e pública, o que conseguiu.
A Sra. Dra. Juíza recusanda, sabendo que a requerente não tinha sido notificada do teor integral da decisão do Sr. Vice Procurador Geral da República de 2 de Março de 2004, taxou o comportamento da mesma, sem qualquer justificação para o quantitativo, apesar de, segundo a mesma decisão, o requerimento do Sr. Vice Procurador Geral da República deve ser despachado pelo Sr. Juiz de Instrução Criminal de Lisboa (doc. 7).
O comportamento da Sra. Dra. Juíza recusanda nestes autos e no processo 457/04.0PBCHV deu origem a participações criminais e disciplinares.
Termina, no Direito, afirmando que os factos articulados evidenciam que a Sra. Juíza recusanda não deve decidir no presente, por haver motivos muito sérios e graves para desconfiar da sua imparcialidade.
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A Sra. Juíza respondeu, nos seguintes termos, em síntese:
- exerce funções no 2º Juízo do TJ de Chaves, desde 5/01/2004.
- correm ali termos os Autos de Instrução com o nº245/03.1TACHV em que são arguidos e requerentes da Instrução, H……, I……, J……, E……, F……. e B… .
- são mandatários da B…… a Drª C…… e o Dr. L……. com quem trabalhou pela 1ª vez desde que foi aberta a Instrução.
- nestes autos o Dr. L…… que tem representado (com excepção do pedido de recusa de Juiz, incidente de falsidade de actas e requerimento a solicitar a correcção dos Autos de Interrogatório, todos subscritos pela Drª C…….. mas nos quais aquele causídico é indicado como testemunha) a arguida B……. tem tido, sistematicamente um comportamento que causa estranheza à ora requerente e que demonstra, salvo o devido respeito, uma grave inimizade para com a mesma, por motivos que se desconhecem, tendo o mesmo, desde o inicio da Instrução, comportamentos que visam atacar pessoalmente a ora signatária, relatando factos falsos, distorcendo e conotando negativamente outras realidades, retirando ilações descabidas por não corresponderem à realidade, como se à actuação da ora signatária presidisse uma intenção subreptícia e intenção de prejudicar a arguida B……. e o seu mandatário.
- na sequência de um requerimento subscrito pelo mandatário da B……, entrado em Juízo em 28/02/2005 em que era levantada suspeita sobre a sua “eventual imparcialidade” foi pela Srª Juíza suscitado no Tribunal da Relação do Porto um pedido de escusa que foi indeferido por Acórdão de 18/05/2005.
- o mandatário da B…… quer, a todo o custo, afastar a Srª Juíza destes Autos, não obstante o pedido de escusa ter sido indeferido.
- tal é a grave inimizade que o mandatário da arguida tem para com a Srª Juíza que o mesmo participou disciplinarmente da mesma, tendo o processo sido arquivado por deliberação do CSM.
- o mandatário da arguida participou criminalmente contra a Srª Juíza por abuso de poder, tendo sido proferido despacho de arquivamento.
- não se conformando com essa decisão de arquivamento, constituiu-se assistente nos Autos que correm termos nesta Relação e requereu a abertura de Instrução peticionando que seja proferido despacho de pronúncia pelo crime de abuso de poder.
- como transparece dos documentos que instruíram o processo disciplinar que correu termos no CSM e dos que instruíram os Autos de processo crime por abuso de poder, assim como do teor do requerimento de abertura de Instrução, o que o mandatário pretende é afastar a Srª Juíza do processo, de modo a não poder desempenhar a sua função, estando sempre a levantar suspeições sobre a sua actuação, quando as situações pelo mesmo relatadas nos Autos já foram esclarecidas em sede de processo disciplinar e criminal.
- no ponto 7 do pedido de recusa volta a levantar suspeitas sobre a “anormalidade da distribuição” já anteriormente suscitada.
- no ponto 8 reporta-se à vida privada da Srª Juíza que em nada interfere com a sua actividade profissional.
- no ponto 9 levanta mais suspeições que não concretiza como fez aquando da participação disciplinar para o CSM quando se refere a relações muito próximas com um dos arguidos (ponto 3) sem que identifique o arguido e em que se traduzem essas relações, obrigando a Srª Juíza a fazer diligências no sentido de encontrar todos os processos onde interveio em primeiros interrogatórios de arguidos detidos, a fim de aquilatar os horários dessas diligências.
- quando aos pontos 10 a 15, 18, 21 e 22, os mesmos já constam das outras participações disciplinar e criminal, tendo sido esclarecidas em sede própria.
- o ponto 19 do pedido de recusa é sintomático de que para o mandatário da requerente os meios justificam os fins, na medida em que, apesar de haver despachos de restrição de publicidade e de restrição de acesso aos Autos, o mesmo, por forma não apurada, tem conhecimento do teor daqueles, em violação de decisão judicial.
- nos seus requerimentos juntos aos Autos de Instrução (incluindo o recurso de agravo em separado e reclamação de não admissão do recurso), bem como nas participações disciplinar e criminal é sempre solicitado pelo mandatário da B……. que seja passada certidão precisamente dos Autos de interrogatórios de arguidos ocorridos em 22 e 25 de Fevereiro de 2005, de modo a ter conhecimento do que os outros arguidos declararam, não se conformando mesmo com a passagem de certidão por transcrição e com exclusão das declarações dos arguidos.
- se fosse na altura em que profere o despacho aqui em síntese, a decisão da Srª Juíza de restrição de publicidade e de acesso aos Autos seria estendida às diligências de inquirição de testemunhas, para assegurar as finalidades da Instrução, pois com o decorrer das inquirições foi constatando que a presença da B……… fez com que algumas testemunhas se mostrassem nervosas, alteradas, tendo chegado a dar ao dito por não dito, efectuado um depoimento condicionado, por serem agentes da PSP, subordinados daquela arguida.
- tal decisão poderia ter sido posta em crise, sem que o mandatário levasse aos Autos factos da vida privada da Srª Juíza e falseasse a verdade dos acontecimentos dando-lhes outra conotação, depois que atempadamente interpôs o competente recurso.
- o mencionado nos pontos 24 e 25 é rotundamente falso, não só porque não lhe foi dado conhecimento de qualquer pedido de acesso aos Autos formulado em 30/03/2006, como não são falsos os Autos de interrogatório de arguidos em 22 e 25 de Fevereiro de 2005 por nos mesmos estar documentado o efectivamente ocorrido.
- a reparação dos despachos foi efectuada nos termos constantes dos Autos de Instrução, assim que a Srª Juíza deu conta que tinha aplicado o art.º 16º do CCJ quando, no caso concreto, o normativo a aplicar era o art.º 84º do CCJ.
- nega peremptoriamente que esteja a dificultar a Instrução de um recurso que subiu em separado. O que acontece é que as certidões enviadas relativas aos Autos de interrogatório realizados nos dias 22 e 25 de Fevereiro do ano passado foram passadas por transcrição, com exclusão dos interrogatórios dos arguidos, para assegurar as finalidades de Instrução, o que não agrada ao mandatário porque o mesmo pretende ter acesso, por qualquer forma aos depoimentos dos outros arguidos, antes da sua constituinte prestar declarações em interrogatório complementar de arguida, diligência esta por duas vezes agendada sem que a mesma tenha prestado declarações.
- é falso que tenha retido a reclamação de não admissão de um recurso por mais de um mês. O que aconteceu é que a subida do apenso da reclamação estava dependente do pagamento de uma certidão para Instrução do mesmo, tendo sido ordenada a subida assim que a B……. procedeu ao pagamento da mesma.
- no ponto 32 distorce-se a realidade dos factos porque dá ideia que a Srª Juíza quer a todo o custo despachar processos em que seja interveniente a constituinte do sr. Mandatário, tendo chegado a despachar processos que deveriam ser do Sr. Juiz de Instrução Criminal de Lisboa, quando tal questão já foi apreciada por esta Relação, não tendo sido posta em causa a competência da Srª Juíza para decidir o pedido de aceleração processual e a condenação a custas.
- o que se decidiu foi que deveria ser dado cumprimento ao art. 3º, nº3 do CPC, decisão com a qual a Srª Juíza não concorda por entender que a condenação em custas não tem de ser precedida de audição do condenado por se tratar de uma decorrência obrigatória e legalmente prevista. Contudo assim que os Autos baixaram à 1ª Instância ordenou o cumprimento da decisão da Relação.
- teve conhecimento que o mandatário da B…… recorreu da deliberação do CSM de arquivamento do processo disciplinar contra a Srª Juíza movido, tendo o recurso sido indeferido por ilegitimidade e o mesmo condenado em 3 UC’s, atitude que demonstra que o mesmo pretende, a todo o custo, a sua punição disciplinar e criminal.
- nada a move contra a arguida B……, nem contra os seus mandatários, nem as suas decisões visam atingir benefícios para a própria ou para terceiros, sejam eles quem forem, apenas exigindo o cumprimento das suas decisões até que sejam postas em crise nos locais próprios.
- não pode compactuar com comportamentos lesivos da sua honra e consideração pessoal e profissional, efectuou participação criminal contra o mandatário da B…… e deu conhecimento à Ordem dos Advogados.
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Colhidos os Vistos, efectuada a Conferência, cumpre apreciar e decidir.
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Enunciação dos elementos que nos foram enviados pelo Tribunal de 1ª Instância, documentando o processado, antes da abertura da Instrução:
Nos Autos são arguidos:
- E…….., mandatário Dr. M………;
- F……., mandatária Drª. N………;
- H…….. e I…….., mandatário Dr. O………;
- J…….., mandatária Drª. P……..;
- Q…….., mandatário Dr. L……..;
- B………, mandatário Dr. L……. .
- Acusação proferida pelo MP contra: H………., I…….., J…….., Q…….. (todos os agentes da PSP em Chaves), E…….. (Comissário da PSP em Chaves), F……. (Inspector Chefe da PJ, aposentado), pela prática:
- O H……., I…….. e J……., em co-autoria material e concurso real de um crime de favorecimento de pessoal praticado por funcionário, p. e p. pelos arts. 367, nº1 e 368º do C.P.; um crime de falsificação de documento p. e p. pelo art. 256, nº1, al. b) e nº 4 do C.P.; um crime de denegação de Justiça p. e p. pelo art. 369º, nºs 1 e 2, do C.P.
- o E…….., em concurso real, de um crime de favorecimento de pessoal praticado por funcionário, p. e p. pelos arts. 367, nº1 e 368º do C.P.; um crime de denegação de Justiça p. e p. pelo art. 369º, nºs 1 e 2, do C.P.
- o F…….., um crime de condução de veículo em estado de embriaguez, p. e p. pelo art. 292º, nº1, do C.P.; um crime de falsificação de documento, p. e p. pelo art. 256º, nº1, al. b), do C.P.
- É indicada como testemunha a, ora recusante, B………;
- Pelo E…….. foi requerida abertura de Instrução (fls. 12 a 40);
- Foi requerida a abertura de Instrução por I…….. e H……. (fls. 43 a 59);
- Requerimento de abertura do F…….. (fls. 53 a 59);
- Foi requerida a abertura de Instrução por B…….. (fls. 63 a 65).
- Requerimento do Q……. afirmando “renunciar ao direito de requerer a abertura de instrução”, subscrito pelo seu mandatário L……. (fls. 69);
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Súmula do processado nos Autos, desde a abertura da Instrução, até à fase actual:
- Despacho da Sr.ª Juíza, datado de 25/01/2005, declarando a abertura da Instrução, admitindo e calendarizando diligências, e rejeitando outras. No final do despacho refere-se: “desde já se consigna que as diligências supra-agendadas são efectuadas sem a intervenção do MP e dos mandatários/defensores dos arguidos”.
- Requerimento de B……., subscrito pelo seu mandatário L……., com o seguinte teor (fls. 137):
“Existem normas legais que permitem que o arguido se faça acompanhar de mandatário nos seus interrogatórios (art. 61º, nº1, al. e), 141º e 144º do C.P.P.).
- Existem normas legais que permitem a presença dos advogados e bem assim de qualquer cidadão, às diligências de Instrução.
- Face ao teor da decisão de V.Ex.ª parece resultar que proibiu a presença dos seus advogados no interrogatório complementar que requereu como veda a presença dos mesmos às restantes diligências marcadas.
- O signatário pretende estar presente a todas as diligências de Instrução agendadas.
- Requer, com a fundamentação aduzida, se digne em esclarecimento do despacho a que se fez referência, clarificar se, na realidade há algum impedimento a que os seus mandatários estejam presentes a todas as diligências agendadas e, no caso, do seu interrogatório complementar, ter a intervenção que a lei prevê”.
- Despacho da Sr.ª Juíza, datados a 16/02/2005 (fls. 143): “(…) salvo o devido respeito a nossa decisão é bastante clara, na medida em que apenas fez consignar que as diligências seriam efectuadas sem a intervenção e não sem a presença dos ilustres mandatários. Na inquirição das testemunhas arroladas pela arguida apenas será o Tribunal a formular as perguntas às mesmas, já no Interrogatório complementar de arguido as perguntas do seu ilustre mandatário serão formuladas à arguida por intermédio do Tribunal”.
- Auto de interrogatório dos arguidos H……, I…….., J…….., E……… (fls. 148 a 160).
- São dados como presentes os Drs. O…….., M…….., N……. e L…… .
- Iniciada a diligência, foi dada a palavra ao mandatário da B……. que no uso dela disse:
“Sabe o mandatário da arguida B….. que há pessoas que querem assistir às diligências de Instrução sendo certo que até duas estão na sala.
A Sr.ª Dr.ª Juíza no início da diligência determinou a saída de tais pessoas.
Determina a lei (art. 86º, nº1, do C.P.P.) que o processo penal é sob pena de nulidade público e… a partir do recebimento do requerimento a que refere o art. 287º, nº1, al. a), do C.P.P., se a Instrução for requerida pelo arguido, e este no requerimento não declarar que se opõe à publicidade.
A situação dos presentes autos é exactamente essa: todos os arguidos que requereram a Instrução não declararam que se opunham à publicidade.
Nos termos da Lei (art. 87º, nº2, al. a), do C.P.P.) a publicidade do processo implica o direito de assistência do público em geral à realização dos actos processuais.
Tal significa que todo e qualquer cidadão que o queira, como no caso presente, tem o direito de assistir.
Assim sendo, se se mantiver a intenção de proibir a presença das pessoas que expressamente querem estar presentes à diligência de hoje, verifica-se nulidade, face ao previsto no art. 86º, nº1, já aduzido.
Assim, vem:
- arguir expressamente tal nulidade.
- desde já, no caso de a intenção se manter, requerer certidão deste requerimento e do despacho que se lhe seguir, para efeitos de participação criminal por abuso de poder, art. 382º, do C.P.P.
- perante este requerimento foi proferido o seguinte despacho:
“Por motivos relacionados com a descoberta da verdade e com vista a impedir que o 2º, 3º, 4º e 5º arguidos tomem conhecimento de que foi dito pelos anteriores arguidos e assim prepararem da melhor forma o seu interrogatório (até atento o princípio da igualdade de armas), na sequência dos nossos dois anteriores despachos, os interrogatórios de todos os arguidos para hoje agendados, serão realizados individualmente com o respectivo defensor/mandatário e com reserva de assistência dos outros arguidos e respectivos defensores/mandatários.
Na sequência dos nossos anteriores despachos de fls. 391-392 e 454, cujo teor damos por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais, o MP, os arguidos, os defensores, o assistente e o seu advogado apenas podem estar presentes sem intervir, despachos estes notificados, sem terem sido posto em causa pelos meios adequados.
Contrariando estes despachos, o ilustre mandatário da arguida B…… insistiu em fazer o requerimento que antecede arguindo uma nulidade de actos que ainda nem sequer foram praticados.
Assim, por extemporâneo e por contrariar os supre aludidos despachos, indefere-se o requerimento, condenando-se o ilustre mandatário nas custas do incidente anómalo a que deu causa.”
- requerimento do mandatário da B……. (fls. 162) onde se escreve “(…) acontece que, tendo os interrogatórios sido realizados individualmente, com as nuances que o requerimento da pena do signatário e o despacho que lhe seguiu atestam, os interrogados, após o seu interrogatório, saíram da sala e foram juntar-se exactamente, aos que ainda faltavam interrogar, conversando entre todos.
Não se notou qualquer iniciativa do Tribunal para que tal deixasse de ocorrer, sendo certo que quem quer que passasse pelo átrio, como aconteceu com V.Ex.ª, constataria o supra referido.
Por uma questão de lealdade processual que reclama para si e exige dos outros, não poderia deixar de levar aos autos o narrado.”
- Auto de interrogatório de F…… (fls.164 a 167).
- Auto de interrogatório de B….. (fls. 168 a 169), onde surge consignado o seguinte:
“Pretendendo eu dar início ao interrogatório complementar da arguida B……, o seu ilustre mandatário repetidamente pediu palavra para ditar um requerimento para a acta e depois de eu ter dito que não lhe concedia a palavra o mesmo voltou a insistir que pretendia ditar um protesto para a acta nos termos do artº 64.º do Estatuto da Ordem dos Advogados.
Após eu voltar a dizer que não lhe concedia a palavra, o mesmo levantou-se dizendo que se ia embora e que se eu não lhe desse a palavra que procederia disciplinarmente contra mim acrescentando, sempre em voz alta, para eu não me arriscar a falsificar a acta e que íamos ver como é que isto ia ficar.”
- A B…… não foi interrogada porque “não pretendia prestar declarações”.
- Surge consignado o seguinte: “Seguidamente, e após várias insistências do ilustre mandatário da arguida em pretender usar da palavra, a Mmª Juiz deu palavra ao ilustre mandatário da arguida B……., e no isso da mesma disse:
A arguida e o seu mandatário pretendem deixar exarado o seguinte:
1- Antes de se iniciar o interrogatório do arguido F…… o mandatário da arguida informou a secretaria que pretendia estar presente à mesma, pretensão que solicitou fosse comunicada à Sr.ª Dr.ª Juiz, face ao facto de na diligência de 22 de Fevereiro, apesar do requerimento de fls. 448 e do despacho de fls. 454, não lhe ter sido permitido a presença aos interrogatórios ocorridos nesse dia.
2- Antes de iniciar a diligência de hoje pediu a palavra para ditar um requerimento, e tenha de ser nessa altura porque o requerimento dizia respeito a questões prévias à diligência, no sentido de arguir a nulidade da mesma, se, como o andamento dos trabalhos lhe parecia previsível, fosse proibida a presença de pessoas à mesma, sendo certo que no átrio se encontravam familiares da arguido e jornalistas que queriam estar presentes.
3- A arguida só não prestou declarações hoje, e deixa expressamente exarado que as pretende prestar, porquanto, vedando a lei a prática de actos inúteis (art. 137º do CPC, cominando a mesma com sanção, face à proibição da publicidade iria permitir-se a prática de um acto inútil.
4- Porquanto o ditado para a acta pela Sr.ª Juiz contém uma omissão relativamente ao que o mandatário disse, pretende que fique exarado que quando disse que iria proceder disciplinarmente contra a Sr.ª Dr.ª Juiz, o que naturalmente irá acontecer, disse precedido da expressão … “se não me deixar exarar o protesto”…
Requer cópia certificada da acta da presente diligência para envio ao Conselho Superior Magistratura.”
- Despacho da Sr.ª Juíza:
“No caso que ora nos ocupa a instrução é pública, já que nenhum dos arguidos que a requereu se opôs à publicidade, é o que dispões o art. 86º, nº1 do C.P.P.
Nesse sentido apenas se fez referência no despacho de fls.392 a “intervenção”, já que a publicidade (entendida como a possibilidade de estar presente) não se confunde com a contraditoriedade e a possibilidade de intervir activamente nas diligências de instrução.
Sendo pública a instrução no caso vertente, entendeu-se no despacho de fls.460 e 461 restringir a publicidade de forma a que cada um dos arguidos fosse ouvido em separado e sem a presença de qualquer outro interveniente, com excepção do respectivo defensor/mandatário com vista a assegurar a cabal prossecução das finalidades da instrução e o normal decurso do acto, nos termos do disposto no art. 87º, nºs 1 e 2 do C.P.P.
De facto, entendeu-se que devia impedir-se que cada um dos arguidos tivesse prévio conhecimento das declarações prestadas pelos restantes arguidos de forma a que cada um deles prestasse declarações de forma espontânea, sem moldar a respectiva versão dos factos à versão dos factos aduzida pelos demais arguidos.
Por esse motivo, e exclusivamente por esse motivo, decidiu-se que o interrogatório de cada um dos arguidos decorresse com exclusão da publicidade.
Verificando-se que neste momento todos os arguidos (requerentes da instrução) já prestaram declarações, com excepção da arguida B……, que a tal se recusou por não prescindir da publicidade, nada obsta que o interrogatório da mesma decorra com a presença do público em geral, pois já se mostram asseguradas as finalidades visadas com o despacho que restringiu a publicidade relativamente aos interrogatórios dos demais arguidos.”
- Segue-se a calendarização do interrogatório da B….. .
- Requerimento do mandatário da arguida B……, entrado em 28/02/2005 (fls. 181 a 185), onde se refere o seguinte:
“Logo que o processo foi distribuído ao 2º Juízo, ainda antes de ser prolatado o despacho de 25 de Janeiro, várias pessoas de Chaves contactaram o signatário no sentido de o alertarem para o risco da eventual parcialidade de V.Ex.ª face ao relacionamento pessoal que terá com um dos arguidos, desde logo, narrando factos demonstrativos desse relacionamento próximo.”
- Perante este requerimento a Sr.ª Juíza proferiu este despacho, declarando que iria pedir a escusa do processo, e dando sem efeito as diligências agendadas (fls. 186).
- Recurso da B……., entrado em 10/03/2005, do despacho de 25/01/2005 que condenou o mandatário da arguida nas custas do incidente anómalo a que deu causa, onde se refere o seguinte: “pela primeira vez o signatário, renegando a tradição, não consegue epipetar da forma habitual no despacho recorrido: é que o mesmo não é douto… é simplesmente inqualificável”
“É tão anormal o teor da decisão recorrida que nem sequer consegue atingir a sua razão de ser.”
- Requerimento do mandatário da Ana Brás, entrado em 10/03/2005 (fls. 255), pedindo a disponibilização do processo para consulta na secretaria em que se refere o seguinte:
“Já não estranha a quantidade de surpresas com que é confrontado nos presentes autos. Não perdeu, no entanto, a esperança de um dia conseguir entender o porquê de tais surpresas. Não perdeu a esperança de saber que insondáveis razões lhe não permitir… o contacto com o processo desde 25 de Fevereiro, apesar de ter tido necessidade de formalmente solicitar tal acesso; não perdeu a esperança de saber que insondáveis desígnios permitiram que não fosse, bem como a sua mandante, desconvocados, em tempo útil, para a diligência de 3 de Março; não perdeu a esperança de conseguir entender por que razão, nesta altura, consta da respectiva acta que a diligência de 25 de Fevereiro, que terminou pelas 12.15h, teria afinal terminado pelas 12.30h.”
- Despacho da Sr.ª Juíza (fls. 269) mandando aguardar que fosse proferida decisão sobre o seu pedido de escusa e mandando notificar o mandatário da arguida para “indicar concretamente quais os actos que pretende praticar ou as finalidades que tem em vista” ao invocar a necessidade urgente de ter acesso aos autos.
- Requerimento do mandatário da arguida B…… (fls. 272), datado de 28/03/2005 referindo que a necessidade urgente de acesso ao processo tem a ver com o facto de pretender minutar as peças processuais a que fez referência no requerimento de 27 de Fevereiro, onde aludia a participação criminal, participação disciplinar e incidente de recusa, e escrevendo aquilo a que chama um comentário: “em nenhuma circunstância, um processo, suspenso na sua tremitação deve deixar de estar no seu local habitual, a secretaria. Se tal ocorresse não tinha necessidade de esmolar a V.Ex.ª o que vem, infrutiferamente esmolado e as queixas por demais anunciado, há quase um mês, estariam formalizadas, não fora o impedimento directo, interessado e objectivo da pessoa que sabe ir ser objecto directo de tais peças”.
- Despacho da Sr.ª Juíza (fls. 273), com o seguinte teor: “nenhum dos actos pretendidos praticar pelo ilustre mandatário da arguida B…….. tem, a nosso ver, carácter urgente, motivo pelo qual os autos irão aguardar que seja conhecida a decisão que incidiu sobre o nosso pedido de escusa”.
- Decisão do pedido de escusa, datada de 18/05/2005, mantendo a Sr.ª Juíza como titular do processo, por não ser conhecido nenhum facto que permitisse concluir pela existência de motivo adequado a gerar desconfiança sobre a imparcialidade.
- Despacho da Sr.ª Juíza calendarizando as diligências e autorizando o arguido J……. a ausentar-se do País (fls. 288).
- Requerimento da B…….. pedindo que seja tomada posição sobre o recurso de 09 de Março (fls. 298).
- Despacho da Sr.ª Juíza datado de 06/07/2005 (fls. 302):
- Em resposta ao pedido formulado pelo mandatário da B…….. de consulta dos autos, (fls.565), mantém o impedimento de consulta dos mesmos, “na medida em que se exige o cumprimento da nossa decisão de restrição de publicidade, a qual impede que a referida arguida tome conhecimento do que foi declarado pelos arguidos que já foram ouvidos.”
- Consigna que a possibilidade do mandatário de B……. assistir ao seu interrogatório, decorre na lei e permite “a sua presença sem qualquer intervenção”, nas diligências de inquirição das testemunhas.
- Quanto ao requerimento formulado pelo mandatário pela B…….. de correcção do exarado processualmente como ocorrido nos dias 22 e 25 de Fevereiro, decide:
“Relativamente às correcções do auto que documenta as diligências do dia 22/02/2005, diremos que os primeiros cinco pontos correspondem a frases ditadas pelo ilustre mandatário da arguida B……., ora requerente, sendo certo que as alterações pretendidas correspondem a lapsos de escrita, não podendo dizer-se que há uma desconformidade que altere o sentido daquilo que foi dito e do que consta documentado (contudo, por uma questão de rigor determina-se que se proceda às correcções nos moldes indicados nos primeiros cinco pontos (fls. 526 e 527).
A alteração requerida no ponto 6, do requerimento de folhas 257 corresponde efectivamente ao que foi ditado, motivo pelo qual se defere a correcção.
Relativamente às alterações/correcções do auto que documenta a diligência realizada no dia 25/02/2005, indefere-se o requerido na medida em que o que consta no auto foi determinado pela entidade que presidiu o mesmo, a qual ditou exactamente o que foi dito pelo ilustre mandatário da arguida B…. .
Pelo exposto, proceda-se às correcções em conformidade com o supra decidido, fazendo-se referência no local próprio ao presente despacho.”
- Fixa o pagamento de despesas a uma testemunha ouvida.
- Admite o recurso do interposto pelo mandatário da arguida B…… (fls.572), fixando-lhe o respectivo efeito e o regime de subida.
- Requerimento do mandatário da B…… (fls. 312), afirmando que “nenhuma razão concreta existe, quer de facto quer de Direito que possa impedir o seu acesso aos autos”, requerendo “se digne ordenar que possa ter acesso aos autos logo que se apresente para o efeito, dada a urgência que tem em consultá-los.”
- Despacho da Sr.ª Juíza, ouvido o MP, (fls. 314), indeferindo o requerido porque “já foi objecto de apreciação e decisão no despacho de fls. 610…”, e designando data para o interrogatório complementar da B…… .
- Resposta do MP, ao recurso do despacho de fls. 460, defendendo a improcedência desse recurso.
- Requerimento do mandatário da B……. (fls. 328) – entrado em 06/10/2005 –, requerendo o acesso aos autos para preparar o interrogatório daquela.
- Requerimento subscrito pela Sr.ª Advogada que subscreve o presente pedido de recusa, efectuado em nome da B……. (fls. 329) – e entrado nesse mesmo dia, 06/10/2005 –, deduzindo incidente de falsidade da acta de 25/02/2005 e oferecendo como testemunha o mandatário subscritor de todos os requerimentos anteriores.
- Despacho da Sr.ª Juíza (fls. 332), inferindo o pedido de acesso aos autos, considerando “que já foram proferidos vários despachos a reafirmar o impedimento de acesso aos autos até que seja efectuado o último interrogatório dos arguidos”, julgando o requerimento “totalmente impertinente e despropositado”, condenando a arguida em 6 UC’s de taxa de Justiça pelo incidente a que deu causa.
- Nesse mesmo despacho, indefere, por extemporâneo, o incidente de falsidade, considerando que “há muito a arguida tem conhecimento do auto de interrogatório ocorrido em 22/02/2005, estando, por isso, o prazo de 10 dias ultrapassado”.
- Requerimento do mandatário da B……, entrado em 10/10/2005 (fls. 333), anunciando que não iria comparecer à diligência aprazada para 10 de Outubro, por a arguida não prestar declarações, enquanto não lhe for facultado o acesso aos autos.
- Auto do interrogatório da arguida B…… (fls. 334), a mesma compareceu e referiu “que não pretendia prestar declarações”.
- Despacho da Sr.ª Juíza calendarizando a inquirição de testemunhas (fls. 338).
- Requerimento do mandatário da B……. requerendo cópia certificada do requerimento interposto em 06/10/2005 e despacho que recaiu sobre o mesmo, “para instruir participação criminal”.
- Despacho da Sr.ª Juíza (fls. 389) ordenando a passagem de cópia certificada das folhas 639 e 642 e verso.
- Auto de inquirição de testemunhas (fls. 396 a 402) com a presença do mandatário da arguida B……. .
- Auto de inquirição de testemunhas (fls. 410 a 414)
- Requerimento do mandatário da arguida B…….. pedindo o acesso aos autos “para minutar o enunciado incidente de recusa e definir os dias em que tem necessidade de estar presente às diligências de instrução marcadas”.
- Despacho da Sr.ª Juíza (fls. 418 a 419) indeferindo o pedido “por se manter os pressupostos das nossas anteriores decisões de impedimento de acesso aos autos” uma vez que a arguida não tem ainda a possibilidade de ser ouvida em interrogatório complementar. Condena a arguida nas custas do incidente, fixando a taxa de Justiça em 10 UC’s.
Manda informar a arguida das diligências de instrução agendadas e calendariza a inquirição de mais duas testemunhas.
- Requerimento (fls. 426) de recurso da B…….. do despacho de folhas 642.
- Despacho da Sr.ª Juíza admitindo o recurso fixando o efeito e regime de subida.
- Requerimento do mandatário da B……. invocando irregularidade no despacho de 02 de Novembro com o seguinte teor: “folhas 712: Visto”, por falta de fundamentação.
- Despacho do MP, pronunciando-se sobre aquele requerimento, defendendo não se vislumbrar qualquer irregularidade.
- Despacho da Sr.ª Juíza (fls. 445), ordenando a notificação da arguida da promoção do MP.
- Auto de inquirição de testemunhas (fls. 448 a 451).
- Requerimento do mandatário da arguida B……., respondendo à promoção do MP, reiterando o requerimento que fora formulado em 02 de Novembro.
- Despacho da Sr.ª Juíza (fls. 456), indeferindo a invocada irregularidade, por o despacho de folhas 725 e 725 verso estar fundamentado.
- Requerimento do mandatário da arguida B…….. (fls. 467), pedindo que lhe seja certificado narrativamente:
“A que horas se iniciou a diligência de 22 de Fevereiro;
A que horas foi interrompida…
A que horas recomeçou
A que horas terminou
A que horas se iniciou a diligência de 25 de Fevereiro”
- Resposta do MP ao recurso interposto pela B……. (documentadas fls. 426), defendendo que o despacho deve ser confirmado no que respeita ao acesso aos autos e substituído por outro que fixe a taxa de Justiça entre 1 e 5 UC’s, no que respeita à tributação do incidente.
- Requerimento da subscritora do requerimento do incidente de recusa, em representação de B……. (fls. 476), requerendo a correcção dos autos de diligências ocorridas em 22 e 25 de Fevereiro, sendo o mandatário da mesma oferecido como testemunha.
- Despacho da Sr.ª Juíza (fls. 479) indeferindo o pedido de correcção, por extemporâneo.
- Nesse mesmo despacho, procede-se à reparação da decisão recorrida, no que respeita à tributação do incidente (por se não ter atentado no disposto no art. 84º do C.C.J.), fixando-se a taxa devida em 3 UC’s.
- Ainda nesse despacho, reparando a decisão proferida em 02/11/2005 no que respeita à condenação em custas, alterando a taxa de Justiça para 4 UC’s.
- Requerimento de recurso da B……. do despacho exarado em 02/11/2005 com o seu complemento exarado em 16 do mesmo mês (fls. 484).
- Auto de inquirição de testemunhas (fls. 490 a 497).
- Despacho da Sr.ª Juíza, ordenando remessa para o Tribunal da Relação do recurso interposto com o requerimento das fls. 733.
- Nesse mesmo despacho, não admite o recurso documentado nas fls. 484, por extemporâneo.
- Despacho da Sr.ª Juíza (fls. 528), datado de 23/02/2006, designando o debate instrutório para o dia 03 de Abril deste ano.
- Requerimento do mandatário da arguida B……. reclamando da decisão de não admissão do recurso (fls. 555).
- Requerimento do mandatário da arguida B…….. requerendo a remessa a esta Relação do recurso interposto a 09 de Março.
- Despacho da Sr.ª Juíza indeferindo o pedido de envio do recurso interposto a 09 de Março, por, no despacho que o admitiu, lhe ter sido fixada subida diferida.
- Despacho da Sr.ª Juíza, datado de 03/04/2006 (fls. 572), declarando suspensos os autos, por ter dado entrada nesse dia um requerimento da arguida B….. suscitando o incidente de recusa de Juiz e dando sem efeito o debate instrutório, para aquele mesmo dia agendado.
- Requerimento do arguido E…… (fls. 585), solicitando autorização para se deslocar ao Brasil, entre 10 e 18 de Abril de 2006, em virtude de estar sujeito a TIR.
- Despacho da Sr.ª Juíza (fls. 588), deferindo o pedido, por não ter havido oposição do MP e se tratar de um período curto.
*
Enunciação dos elementos que compõem os presentes Autos de Incidente de Recusa de Juiz:
- Requerimento de recusa subscrito pela Sr.ª advogada C…… e oferecendo como testemunhas L……, R……, Q…….., B……. e L……...
- Acórdão deste Tribunal de Relação, proferido em 15/02/2006, sobre o recurso da decisão judicial datado de 16/03/2005 decidindo revogar o despacho que condenou a arguida Ana Brás numa multa de 10 UC’s, devendo “ser substituído por outro que possibilitando o exercício contraditório à recorrente, relativamente à promoção de folhas 46 e 47, decida como for de Direito.”
- Acórdão deste Tribunal de Relação, proferido em 18/05/2005, indeferindo o pedido de escusa, formulado pela Sr.ª Juíza, onde se refere o seguinte:
“Tanto quanto se percebe de certidão remetida a esta Relação (o despacho certificado a fls. 8 remete para outros anteriores), a Sr.ª Juiza decidiu interrogar vários arguidos separadamente. Para evitar que alguém pudesse contar aos arguidos ainda não ouvidos o que os outros já tinham dito, condicionou a publicidade dos interrogatórios.
Trata-se de decisão que poderá eventualmente ser objecto de recurso, mas nada a distingue de tantas outras que os juízes proferem todos os dias, contra as quais as partes podem reagir, recorrendo.
Pretender ver naquelas decisões caso de crime de abuso de poder ou matéria de foro disciplinar é, sem mais, simplesmente fantasioso.
É certo que o sr. advogado anunciou ir participar criminal e disciplinarmente contra a Sr.ª. juiz, mas nada nos autos demonstra, sequer, que já tenha tomado tais iniciativas. Em todo o caso, se mais elementos não houver para além dos que constam deste processo, não se descortina outro destino para as queixas e participações que não seja o arquivamento.
Decidir afastar agora a sra. juiz do processo seria permitir a descoberta da fórmula infalível para a remoção de qualquer juiz. Sob um qualquer pretexto, escrevinhavam-se algumas queixas crime e outras tantas participações ao CSM e tal seria bastante para que se suscitasse a questão da sua imparcialidade. Isso podia passar a ser usado como um intolerável meio de pressão sobre o titular do processo.
Percebe-se que está criada uma situação com cuja convivência a maior parte dos intervenientes judiciários se sentiria incomodada. Será certamente penoso para a sra. juiz continuar a presidir à instrução, mas a paciência e serenidade, sem prejuízo da firmeza nas decisões, são ónus da profissão por que optou.
Como quer que seja nenhum facto foi trazido a este tribunal que permita suspeitar existir motivo, sério e grave, adequado a gerar desconfiança sobre a imparcialidade.
Há, é certo, a opinião subjectiva do sr. advogado, que no aludido requerimento de 28-5-05 escreveu que “várias pessoas de Chaves o contactaram no sentido de o alertarem para o risco da eventual parcialidade de V. Exa, face ao relacionamento pessoal que terá com um dos arguidos, desde logo, narrando factos demonstrativos desse relacionamento próximo.” Mas esta frase é um deserto em termos de alegação de factos relevantes, pois não se identificam as pessoas que contactaram o sr. advogado, qual o arguido que tem relações pessoais com a sra. juiz, nem se esclarece em que consiste esse relacionamento.”
*
Participação disciplinar, subscrita pelo mandatário da arguida B…….., datada de 18/03/2005 (fls. 100/103) em que refere que a Sr.ª Dr.ª Juiz “tinha relações muito próximas com um dos arguidos, a ponto de ter sido a única civil a estar presente à festa de Natal da PSP e de jantarem com frequência”, “ainda o facto de esse mesmo arguido comissário da PSP, ser visita diária do gabinete da mesma Magistrada”, “… retorqui a todas essas pessoas que o relacionamento pessoal, só por si, não seria razão suficiente para deduzir o incidente de recusa”.
Resposta da Sr.ª Juíza ao CSM (fls. 104 a 114).
Deliberação do CSM de 24/05/2005 (fls. 116), arquivando o processo administrativo aberto com base na participação do mandatário da B….., em virtude de não se indiciar matéria de natureza disciplinar na actuação processual da Sr.ª Juíza.
Despacho de arquivamento do Inquérito, aberto por participação do mandatário da arguida B…….., por a arguida não ter praticado factos indiciadores de qualquer ilícito, nomeadamente, de abuso de poder. (fls. 119 a 127)
Participação crime da Sr.ª Juíza contra o mandatário da arguida B…….. e o jornalista pelos crimes p. e p. nos arts. 154º, 155º, 180º e 184º, do C.P.
Auto de interrogatório de arguido detido efectuado pela Sr.ª Juíza em 12/04/2004 pelas 15.45h (fls. 148).
Inquirição de L….. (fls. 200), em que este confirma o teor da participação efectuada e que o comissário ali referido é o E……. .
Inquirição da Sr.ª Juíza do TJ de Chaves, S……… (fls. 202) em que a mesma esclarece não ter havido qualquer anomalia na distribuição do processo de instrução em causa, não tendo a Sr.ª Juíza recusado qualquer intervenção nessa distribuição, só tendo conhecimento da mesma, um ou dois dias mais tarde.
Interrogatório da Sr.ª Juíza (fls. 205 a 211).
Inquirição do advogado O……. (fls. 215).
Inquirição do advogado M……. (fls. 217 a 218), afirma que o mandatário a arguida B……, “apontando com o dedo para a denunciada, ameaçou-a de que iria proceder criminalmente contra ela por abuso de poder e que isto não ia ficar assim. Decidiu a denunciar, em virtude da exaltação do denunciante, permitir que ele ditasse o requerimento pretendido (…).
Após o denunciante ter ditado o requerimento, de imediato solicitou certidão do mesmo, reafirmando que tal era para proceder criminalmente contra a Sr.ª Juiz (…)”
Inquirição da advogada N……. (fls. 219 a 220) em que esta afirma que o mandatário da arguida B……. “chegou ao Tribunal de Chaves, acompanhado da comunicação social e, estando a porta da sala de audiências aberta, entrou e fez entrar os jornalistas para dentro da sala, sendo que pelo menos dois desses jornalistas eram arguidos a inquéritos relativos à publicação de artigos sobre o processo”, ainda antes da diligência se iniciar “o denunciante dirigiu-se à denunciada e disse que queria que as pessoas que o acompanhavam assistissem à diligência, tendo a denunciada esclarecido que tais pessoas tinham de se ausentar da sala, fazendo o denunciante o seguinte comentário: eu já sabia que em Chaves me ia acontecer isto e até já trago um requerimento feito”, dizendo logo a seguir que pretendia formular esse requerimento para a acta, mais refere que o mandatário da arguida B…… se dirigiu à Sr.ª Juíza em tom exaltado e apontando o dedo na sua direcção. Perante essa exaltação a Sr.ª Juíza permitiu que ele ditasse o requerimento.
Inquirição de T……, funcionário judicial no TJ de Chaves (fls. 221) que teve intervenção nos actos de interrogatório dos arguidos, e elaborou as respectivas actas sob a direcção da Sr.ª Juíza, afirmou que os mesmos retratam aquilo que se passou durante as diligências realizadas.
Inquirição do Sr. Juiz Desembargador U……. (fls. 213) que referiu que a Sr.ª Juíza se sentia “moralmente angustiada porque dizia que o Dr. L….., após o despacho dela a indeferir o requerimento que ele tinha ditado para o auto – no sentido de não permitir a assistência de pessoas aos interrogatórios dos arguidos –, virou-se para ela, com o dedo apontado na sua direcção, na sala de audiências e na presença de várias pessoas, incluindo os ditos jornalistas, enquanto lhe dizia: a sr.ª não sabe onde se está a meter, isto não vai ficar assim, a sr.ª está a cometer o crime de abuso de poder”.
Inquirição, em Instrução, do mandatário Dr. –L…… (fls. 227).
Inquirição da B….., fls. 294, afirma que tem conhecimento que a Sr.ª Juíza “tem uma relação de amizade e confiança com o comissário E……..”.
Depoimento, em Instrução, de S……. (fls. 232) que afirmou “é a voz corrente na instituição policial em Chaves que devido às relações entre a Sr.ª Juíza Dr.ª D……, o sargento G…….. da GNR, o comissário E…….. da PSP de Chaves, os processos relacionados com estes ou com amigos destes e que estejam nas mãos da Sr.ª Juíza não trazem quaisquer problemas para os mesmos, por haver por parte da Sr.ª Juíza decisões, nesse aspecto, tendenciosas, mas não tem conhecimento de nenhum caso ou decisão em concreto. Esclarece que já algumas vezes viu o sr. comissário E…….. a dirigir-se ao gabinete da Sr.ª Juíza”.
Inquirição de V……. (fls. 233) que declarou ter sido o agente da PSP em Chaves “na época em que se passaram os factos relacionados” com o processo em causa. “Nessa altura, comentava-se na instituição policial que havia relações de amizade profunda entre a Sr.ª Juíza e o comissário E…….. e que por causa disso os arguidos no processo, amigos do comissário, assim como o próprio comissário, não teriam qualquer problema, uma vez que o processo estava sob a direcção da Sr.ª Juíza”. Admite, a seguir, não conhecer qualquer facto ou decisão concreta da autoria da Sr.ª Juíza.
Depoimento de R……., advogado com domicílio profissional no escritório do mandatário da B………, afirmando que aquele “recebeu um telefonema de alguém, informando que havia uma relação pessoal de amizade entre a Sr.ª Juíza do processo e o comissário E………”. Afirmou que estava presente na diligência de Instrução de 22/02/2005 “e alguns jornalistas” e que a Sr.ª Juíza, em voz alta, disse para os presentes: “quem faz aqui as regras sou eu”.
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Apreciando e decidindo.
A independência do Juiz é um princípio Constitucionalmente consagrado, no art.º 203º da CRP e constitui uma garantia para a Colectividade, em nome da qual os Tribunais exercem a Justiça.
Esta garantia de independência – direito, não só dos justiciáveis, mas de toda a Colectividade –, não se concretiza apenas em relação aos outros Poderes Institucionais (o Executivo e o Legislativo), mas compreende o direito dos Juízes decidirem serenamente, ao abrigo de qualquer pressão, seja ela de cariz social, mediático, económico ou resultante de alguma acção individual.
Assim, tal como a liberdade de imprensa tem por destinatário essencial o cidadão-leitor, e não os jornalistas, a independência dos Juízes beneficia, não o seu estatuto ou profissão, mas a Colectividade que deve contar com os Juízes exercendo ao abrigo de qualquer pressão.
É ao Conselho Superior de Magistratura, órgão cuja legitimidade provém directamente da Constituição, que está confiada a guarda da independência da autoridade Judiciária.
Estreitamente ligado a esta garantia de independência, está o principio do Juiz natural ou legal, consagrado no art.º 32º, nº9 da CRP – nenhuma causa pode ser subtraída ao Tribunal cuja competência esteja fixada em lei anterior.
Este principio concretiza-se no seguinte: intervém na causa o Juiz determinado de acordo com as regras da competência legal e anteriormente estabelecidas.
Este principio do Juiz natural só pode ser afastado, quando outros princípios ou regras, de igual ou maior dignidade, o ponham em causa, como sucede quando o Juiz natural não oferece garantias de imparcialidade e isenção no exercício da sua função.
Destinado, a assegurar essa imparcialidade, está consagrado no nosso Código de Processo Penal, um procedimento com a finalidade de garantir uma decisão imparcial e justa, afastando do processo o Juiz, em relação ao qual exista motivo, sério e grave, adequado a gerar desconfiança sobre a sua imparcialidade.
Esse procedimento, constitui um incidente processado por apenso, regulado nos art.ºs 43º a 46º do CPP.
Para que possa ser pedida a recusa de Juiz, impõe-se que:
- a sua intervenção no processo corra risco de ser considerada suspeita;
- por se verificar motivo sério e grave;
- adequado a gerar desconfiança sobre a sua imparcialidade.
A existência desse motivo sério e grave, adequado a gerar desconfiança sobre a sua imparcialidade, tem de ser de natureza a dar a aparência de parcialidade na condução do processo ou na decisão, e resultar dos factos ou do seu comportamento no processo, ou fora dele.
Incumbe à Jurisprudência estabelecer, caso a caso, as circunstâncias que justificam a recusa de um Magistrado Judicial.
É atribuída ao julgador – pelo seu estatuto, e pela natureza das suas funções – uma presunção de imparcialidade. Assim, a recusa deve perfilar-se como uma excepção e ela não pode ser admitida, a não ser por motivos sérios e graves. É, assim, necessário que em razão das circunstâncias examinadas objectivamente, seja criada uma aparência de parcialidade, pois o sentimento subjectivo de desconfiança não é suficiente para obter a recusa de um Juiz; é necessário que o sentimento de desconfiança repouse em factos concretos, adequados a por eles mesmos terem uma influência directa no desenvolvimento do procedimento.
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Do processado em Instrução – acima resumido – não é possível extrair, objectivamente, qualquer actuação parcial por parte da Sr.ª Juíza, nomeadamente que tenha proferido decisões com a intenção de prejudicar a arguida-recusante, ou a existência de uma pré-disposição contra a mesma.
E, analisando o que é dito no requerimento de recusa, verificamos o seguinte:
Os art.ºs 1º a 6º, correspondem a asserções que nada têm a ver com a actividade da Srª. Juíza.
No art.º 7º, lança-se uma suspeição sobre todos os intervenientes no procedimento de distribuição dos Autos, nomeadamente, sobre a Srª. Juíza encarregue de a ele presidir, totalmente infundada como se vê do seu depoimento, acima resumido.
No art.º 8º, produz-se uma afirmação sobre a vida pessoal da Srª. Juíza que atinge a esfera da sua privacidade; apesar das suas funções, a Srª Juíza tem direito, como qualquer outro cidadão, à reserva da sua vida privada, só a podendo ver escrutinada, na medida do estritamente necessário ao assegurar da dignidade da sua função.
No art.º 9º, lança-se uma afirmação sobre o desempenho da Srª. Juíza que nada tem a ver com a requerente de recusa e que é susceptível de atingir a sua honra profissional.
No art.º 11º, assumem que os motivos que invocam e em que pretendem basear a recusa, já eram do conhecimento da arguida – recusante e do seu mandatário, desde que o processo foi distribuído.
Nos art.ºs 12º a 32º, procede-se a um relato do processado nos Autos e da actuação da Srª. Juíza que não corresponde à realidade processual retratada na súmula que dos Autos foi efectuada.
O único facto susceptível de abalar a presunção de imparcialidade da Srª. Juíza, é o vertido no art.º 10º do seu requerimento.
Ácerca do mesmo, a Srª. Juíza esclarece – cfr fls. 208 dos presentes Autos – que conhece o Sr. Comissário da PSP e que, esporadicamente, o mesmo a visitava, exclusivamente por razões profissionais, o que deixou de acontecer assim que foram distribuídos os Autos de Instrução em causa, factos comprováveis pelos funcionários da Secção.
Tal como a mesma bem afirma, os funcionários da sua Secção seriam as testemunhas com razão de ciência bastante para serem oferecidos como meio de prova de tal facto. Não o foram. Mas, está junto aos Autos, o depoimento do funcionário que assessorou a Sr.ª Juíza nos actos judiciais praticados na Instrução, T……. que não faz qualquer referência a tal facto.
Também os Srs. Juízes que com a Sr.ª Juíza recusada, exerciam funções naquele Tribunal, quando ouvidos, não fazem qualquer referência a tal facto – cfr. fls. 202 e 213.
Para prova deste, como dos restantes “factos” vertidos no requerimento de recusa, são oferecidas como testemunhas:
L…….., o mandatário da arguida, interveniente em todo o procedimento documentado nos Autos, mas que não subscreve o pedido de recusa (de acordo com a resposta da Sr.ª Juíza, este é subscrito por uma Sr.ª advogada que tem mandato conjunto). Na sua qualidade de mandatário da arguida recusante, não pode ignorar que lhe está vedado a sua intervenção no mesmo, sob qualquer outro título. Também não pode ignorar que tendo um mandato conjunto, significando isso, uma representação conjunta da arguida-recusante, qualquer intervenção no processo, ou interposição de requerimento, por parte de um deles, consubstancia-se num exercício imputável aos dois.
Ou seja, a não assinatura do requerimento, não o exime da responsabilidade como mandatário, perante o mandante e perante o Tribunal, por tal acto.
R………, estagiário, na altura, do mandatário da arguida e com domicilio profissional no seu escritório.
Q…….., co-arguido no processo.
B…….., e L…….., pais da arguida-recusante (o que não é mencionado no requerimento com tal prova, mas se alcança a fls. 294).
Para além do próprio mandatário, a restante prova oferecida, ou tem ligações familiares ou profissionais, à arguida-recusante ou ao seu mandatário (3 delas), ou são elas próprias interessadas nos Autos (o Q……..).
Deste Q…….. e do V…….., existem depoimentos nos Autos que incidiram sobre esse facto, mas que não se mostram credíveis, nem susceptíveis de abalar a afirmação da Sr.ª Juíza; um é arguido no processo e o outro não demonstra razão de ciência suficiente para tornar credível as suas afirmações no que a essa matéria diz respeito: reconhece não conhecer qualquer facto ou decisão concreta da autoria da Sr.ª Juíza e que as suas afirmações se baseavam naquilo que ouvia “comentar”.
Quanto ao R……, o que afirma é que o mandatário da arguida terá recebido “um telefonema de alguém, informando que havia uma relação pessoal de amizade…”, o que pela sua inconsistência, e falta de concretização, dispensa qualquer outra valoração.
Essa imputação de uma relação pessoal de amizade entre a Sr.ª Juíza e o arguido E…….., é uma afirmação recorrente do mandatário da arguida-recusante no processo, tendo sido a mesma que suscitou o pedido de escusa por parte da Sr.ª Juíza.
E, por isso, foi objecto de análise, no Acórdão desta Relação que indeferiu esse pedido e manteve a Srª Juíza como titular do processo, à mesma não sendo atribuída credibilidade por não se identificarem as pessoas que terão comunicado ao sr. advogado esse “facto”.
Tal significa que esse “motivo de recusa”, vem a ser utilizado pelo mandatário da arguida-recusante, desde o início da Instrução.
Ora, o pedido de recusa deve ser formulado por escrito, motivado e dirigido à autoridade competente, a partir do momento em que o recusante tenha conhecimento dos factos que possam justificar a sua recusa, sob pena de perempção do seu direito de recusar. É contrário à boa fé, esperar por uma fase mais adiantada do procedimento – como acontece no caso, em que o requerimento dá entrada no dia designado para o Debate Instrutório – quando já conhecia o motivo dessa recusa, anteriormente.
Em conclusão, não se mostra existente por parte da Sr.ª Juíza qualquer pré-juízo ou preconceito em relação à matéria a decidir ou às pessoas afectadas pela decisão.
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Dos elementos constantes dos Autos, e do processado em Instrução, o que se colhe com evidência é a grande animosidade do mandatário da arguida-recusante, para com a Sr.ª Juíza, desde o início.
Essa animosidade é referida pelos testemunhos dos seus próprio colegas intervenientes no processo, Drs. M…… e N……., estes referem que o mandatário da arguida “apontando com o dedo para a denunciada, ameaçou-a de que iria proceder criminalmente contra ela por abuso de poder e que isto não ia ficar assim. Decidiu a denunciada, em virtude da exaltação do denunciante, permitir que ele ditasse o requerimento pretendido (…).
Após o denunciante ter ditado o requerimento, de imediato solicitou certidão do mesmo, reafirmando que tal era para proceder criminalmente contra a Sr.ª Juiz (…)” (M……), e que o mandatário da arguida B…….. “chegou ao Tribunal de Chaves, acompanhado da comunicação social e, estando a porta da sala de audiências aberta, entrou e fez entrar os jornalistas para dentro da sala, sendo que pelo menos dois desses jornalistas eram arguidos em inquéritos relativos à publicação de artigos sobre o processo”, ainda antes da diligência se iniciar “o denunciante dirigiu-se à denunciada e disse que queria que as pessoas que o acompanhavam assistissem à diligência, tendo a denunciada esclarecido que tais pessoas tinham de se ausentar da sala, fazendo o denunciante o seguinte comentário: eu já sabia que em Chaves me ia acontecer isto e até já trago um requerimento feito”, dizendo logo a seguir que pretendia formular esse requerimento para a acta, mais refere que o mandatário da arguida B……. se dirigiu à Sr.ª Juíza em tom exaltado e apontando o dedo na sua direcção (N…….).
No decurso da Instrução, o mandatário da arguida-recusante, interpôs mais de 20 requerimentos no processo (para além daqueles que exarou em Acta), deu origem a um processo criminal e um processo disciplinar contra a Sr.ª Juíza.
Esta perspectiva, levou a que, já no Acórdão que indeferiu o pedido de escusa da Sr.ª Juíza e a manteve no processo se sentenciasse:
“Decidir afastar agora a sra. juiz do processo seria permitir a descoberta da fórmula infalível para a remoção de qualquer juiz. Sob um qualquer pretexto, escrevinhavam-se algumas queixas crime e outras tantas participações ao CSM e tal seria bastante para que se suscitasse a questão da sua imparcialidade. Isso podia passar a ser usado como um intolerável meio de pressão sobre o titular do processo”.
A Instrução, declarada aberta em 25/01/2005, ainda não foi completada, durando há mais de 1 ano e 4 meses, tendo sido largamente ultrapassados o prazo máximo para a mesma fixado.
O interrogatório complementar da arguida-recusante, nunca se realizou, por recusa da mesma em prestar declarações.
Em relação à arguida-recusante, não se colhe dos Autos, nem é extraível do processado em Instrução, qualquer indício, por mínimo que seja, de parcialidade.
Existe no nosso Ordenamento Jurídico, um princípio que é o da Boa Fé que o conforma no seu todo, embora se encontre previsto no artº 334º do CC. Esse princípio, por muito esquecido, tem de ser lembrado, impondo-se aos nossos Tribunais que o façam respeitar.
A Boa Fé e o seu corolário, a interdição do abuso de Direito, inscrito no artº 334º do CC, é um princípio geral do Direito que encontra aplicação em todos os domínios do Direito e em particular no Procedimento Penal.
O respeito das regras da Boa Fé e da interdição do abuso de Direito – tal como refere Gerar Piquerez, Prócedure Pénal Suisse: Traité Théorique et Pratique, pág. 193, a propósito do Ordenamento Jurídico Suíço, da mesma família do nosso e com disposições semelhantes, no caso o artº 2º do CC Suíço – valem igualmente em Processo Penal e vinculam todas as partes (incluindo arguido e lesado) assim como os seus mandatários.
O abuso de Direito pode resultar de Procedimentos temerários contínuos, de Procedimentos dilatórios ou de utilização de uma faculdade que a lei confere, a fins estranhos às razões pela qual ela foi concedida, ou para finalidades para as quais não estava prevista.
Do uso indevido da recusa, pode resultar, para além da lesão do princípio Constitucional do Juiz natural, ao afastar-se o Juiz por qualquer motivo fútil ou insuficientemente provado, a violação da garantia da independência e da imparcialidade do Magistrado.
A necessidade (e a conveniência) de preservar o mais possível a dignidade profissional e pessoal do Magistrado, e a garantia de que o mesmo tenha condições para decidir serenamente, e sem qualquer pressão, tornam intolerável o procedimento do sr. mandatário da arguida-recusante nos Autos, num Estado de Direito Democrático como o nosso.
Essa animosidade e hostilidade, não podem conduzir ao afastamento da Sr.ª Juíza do processo.
Ao colocar sistematicamente em causa a tarefa de condução do processo por parte da Sr.ª Juíza, o sr. mandatário visa uma verdadeira co-direcção do processo, destituindo qualquer autoridade.
Tal como afirma o Juiz Francês Antoine Garapon: “o princípio da Democracia corrompe-se não só quando perde o espírito de igualdade, mas também quando se adquire um principio de igualdade extrema e cada indivíduo pretende ser igual aqueles que escolheu para o julgar”.
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Nos termos relatados, decide-se julgar improcedente o pedido de recusa, mantendo-se a Sr.ª Juíza como titular da Instrução em causa.
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Custas pela arguida-recusante, fixando-se a taxa de Justiça em 8UC’s.
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Porto, 31 de Maio de 2006
José Joaquim Aniceto Piedade
Joaquim Rodrigues Dias Cabral
Isabel Celeste Alves Pais martins