Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
484/13.7TBPVZ.P1
Nº Convencional: JTRP000
Relator: MIGUEL BALDAIA DE MORAIS
Descritores: CONTRATO DE MEDIAÇÃO IMOBILIÁRIA
REAPRECIAÇÃO DA MATÉRIA DE FACTO
VÍCIO DE FORMA
INVOCAÇÃO DA NULIDADE
ABUSO DE DIREITO
APRESENTAÇÃO GRÁFICA
COMISSÃO
JUROS DE MORA
Nº do Documento: RP20170327484/13.7TBPVZ.P1
Data do Acordão: 03/27/2017
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: CONFIRMADA
Indicações Eventuais: 5ª SECÇÃO, (LIVRO DE REGISTOS N.º 647, FLS. 128-158)
Área Temática: .
Sumário: I - Tendo o recurso por objeto a reapreciação da matéria de facto, deve o recorrente, para além de delimitar com toda a precisão os concretos pontos da decisão que pretende questionar, motivá-lo através da indicação das passagens da gravação que reproduzam os meios de prova que, no seu entendimento, determinam decisão dissemelhante da que foi proferida pelo tribunal a quo.
II - Esse ónus não pode considerar-se cumprido pela simples transcrição dos depoimentos produzidos e fonograficamente registados na audiência final.
III- A impugnação da decisão da matéria de facto não se basta com uma manifestação de discordância em relação à forma como essa materialidade foi decidida acompanhada de uma mera transcrição de excertos de alguns dos depoimentos prestados na audiência final, antes se exige da parte que pretende usar desta faculdade a demonstração da existência de incongruências na apreciação do valor probatório dos meios de prova que efetivamente, no caso, foram produzidos.
IV - O incumprimento dos ónus referidos em I e III implica a rejeição do recurso, na parte respeitante, sem possibilidade sequer de introdução de despacho de aperfeiçoamento.
V - A invocação pelo réu de nulidade do contrato de mediação imobiliária por inobservância da indicação constante da alínea b) do nº 2 do art. 19º do DL nº 211/2004, de 20.08, já após a conclusão do negócio visado pelo exercício da mediação, em contraste com a sua anterior atitude - ao beneficiar dos serviços prestados pela autora em execução daquele contrato e ao aceitar realizar contrato promessa de permuta pelo preço ajustado com entidade por ela angariada – traduz, objetivamente, um comportamento abusivo, na modalidade de venire contra factum proprium.
VI - Não afronta o disposto na alínea c) do art. 8º do DL nº 446/85, de 25.10 a cláusula que se apresente graficamente de forma a permitir a sua leitura por um leitor de acuidade média, não exigindo um esforço excessivo de visão.
VII - A existência de um contrato de mediação imobiliária em regime de exclusividade autoriza a presunção (de facto) de que a atividade da empresa mediadora contribuiu para a aproximação entre o comitente e terceiros, facilitando o negócio, sendo devida a remuneração se o negócio visado não se concretizar por causa imputável ao comitente.
VIII - Independentemente de o contrato de mediação imobiliária não ser ato subjetivamente comercial do lado do comitente, porque a empresa que medeia é uma sociedade comercial e porque os atos por ela praticados são também comerciais, o ato é comercial sendo, por isso, devidos os juros de mora à taxa supletiva comercial referidos no art.º 102, § 3º do Código Comercial.
Reclamações:
Decisão Texto Integral: Processo nº 484/13.7TBPVZ.P1
Origem: Tribunal Judicial da Comarca do Porto, Póvoa de Varzim – Juízo Local Cível, Juiz 3
Relator: Miguel Baldaia Morais
1º Adjunto Des. Jorge Miguel Seabra
2º Adjunto Des. José Sousa Lameira
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Sumário
I - Tendo o recurso por objeto a reapreciação da matéria de facto, deve o recorrente, para além de delimitar com toda a precisão os concretos pontos da decisão que pretende questionar, motivá-lo através da indicação das passagens da gravação que reproduzam os meios de prova que, no seu entendimento, determinam decisão dissemelhante da que foi proferida pelo tribunal a quo.
II - Esse ónus não pode considerar-se cumprido pela simples transcrição dos depoimentos produzidos e fonograficamente registados na audiência final.
III - A impugnação da decisão da matéria de facto não se basta com uma manifestação de discordância em relação à forma como essa materialidade foi decidida acompanhada de uma mera transcrição de excertos de alguns dos depoimentos prestados na audiência final, antes se exige da parte que pretende usar desta faculdade a demonstração da existência de incongruências na apreciação do valor probatório dos meios de prova que efetivamente, no caso, foram produzidos.
IV - O incumprimento dos ónus referidos em I e III implica a rejeição do recurso, na parte respeitante, sem possibilidade sequer de introdução de despacho de aperfeiçoamento.
V - A invocação pelo réu de nulidade do contrato de mediação imobiliária por inobservância da indicação constante da alínea b) do nº 2 do art. 19º do DL nº 211/2004, de 20.08, já após a conclusão do negócio visado pelo exercício da mediação, em contraste com a sua anterior atitude - ao beneficiar dos serviços prestados pela autora em execução daquele contrato e ao aceitar realizar contrato promessa de permuta pelo preço ajustado com entidade por ela angariada – traduz, objetivamente, um comportamento abusivo, na modalidade de venire contra factum proprium.
VI - Não afronta o disposto na alínea c) do art. 8º do DL nº 446/85, de 25.10 a cláusula que se apresente graficamente de forma a permitir a sua leitura por um leitor de acuidade média, não exigindo um esforço excessivo de visão.
VII - A existência de um contrato de mediação imobiliária em regime de exclusividade autoriza a presunção (de facto) de que a atividade da empresa mediadora contribuiu para a aproximação entre o comitente e terceiros, facilitando o negócio, sendo devida a remuneração se o negócio visado não se concretizar por causa imputável ao comitente.
VIII - Independentemente de o contrato de mediação imobiliária não ser ato subjetivamente comercial do lado do comitente, porque a empresa que medeia é uma sociedade comercial e porque os atos por ela praticados são também comerciais, o ato é comercial sendo, por isso, devidos os juros de mora à taxa supletiva comercial referidos no art.º 102, § 3º do Código Comercial.
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Acordam no Tribunal da Relação do Porto:
I- RELATÓRIO
“B… Unipessoal, Ldª” intentou a presente ação declarativa comum na forma ordinária contra C…, pedindo a condenação deste no pagamento da quantia de 38.437,50€, acrescida de juros legais comerciais vencidos e vincendos até efetivo e integral pagamento.
Para substanciar tal pretensão alegou, em síntese, que no exercício da sua atividade celebrou com o réu, em 5 de maio de 2011, um contrato de mediação imobiliária nos termos do qual aceitou promover e mediar a venda ou permuta, em regime de exclusividade, de dois imóveis pertencentes a este último pelo valor de €625.000,00.
Acrescenta que, por força do aludido contrato, o réu se obrigou a pagar-lhe, a título de remuneração pelos serviços de mediação imobiliária, o valor correspondente a 5% do preço pelo qual o negócio fosse efetivamente concretizado, valor a que acresceria IVA à taxa legal em vigor, ficando ainda convencionado que o pagamento do total da remuneração seria feito aquando da celebração do contrato‐promessa.
Mais alega que promoveu e publicitou a venda ou permuta dos referidos imóveis, sendo que na sequência desses esforços, em 30 de Junho de 2011, o réu, por si e como procurador de sua mulher, ajustou a alienação dos mesmos com uma sociedade comercial angariada pela autora a quem prometeram permutá-los por bens imóveis futuros no valor global de 625.000,00€.
Refere, por último, que, apesar de interpelado para o efeito, o réu não lhe pagou qualquer quantia a título de remuneração.
Citado o réu apresentou contestação na qual, desde logo, se defende por exceção, invocando a nulidade do ajuizado contrato por falta de identificação no seu texto do negócio visado pelo exercício da mediação e bem assim porque a apresentação gráfica da parte final do nº 1 da sua cláusula 5ª passa despercebida a um contraente normal.
Alegou ainda que já após haver assinado o contrato promessa de permuta, verificou, por informações que recolheu, tratar-se de um negócio ruinoso para si, pelo que volvidos cinco meses sobre a sua celebração, assinou a sua “rescisão”.
Acrescenta que nenhum contrato se concretizou que permita à Autora reclamar o pagamento de qualquer remuneração, dado que nenhum sinal foi recebido, pelo que nada tem esta a receber, sendo que o ajuizado contrato acabou por ser por si denunciado em 22 de abril de 2013.
Replicou a autora pugnando pela improcedência das invocadas exceções.
Formulou pedido de condenação do réu como litigante de má-fé.
Proferiu-se despacho saneador em termos tabelares, definiu-se o objeto do litígio e os pertinentes temas probatórios.
Realizou-se audiência final com observância do formalismo legal.
Foi proferida sentença na qual se decidiu julgar a ação procedente, por provada, e em consequência condenar o Réu a pagar à Autora a quantia de €38.437,50, acrescida de juros de mora vencidos desde 30.6.2011 e vincendos até integral pagamento, à taxa comercial vigente em cada momento.
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Não se conformando com o assim decidido, veio o réu interpor o presente recurso, que foi admitido como apelação, a subir nos próprios autos e com efeito meramente devolutivo.
Com o requerimento de interposição do recurso apresentou alegações, formulando, a final, as seguintes
CONCLUSÕES:
A. - O CONTRATO CELEBRADO ENTRE AS PARTES NÃO IDENTIFICA CONCRETAMENTE O TIPO DE CONTRATO.
B. - TAL CONTRATO NÃO PREVÊ A CELEBRAÇÃO DE QUALQUER CONTRATO DO TIPO “CONTRATO PROMESSA”.
C. - Por isso, tal Acordo é nulo, nos termos do disposto no nº 1 do art. 19º do Decreto-Lei nº 211/2004, de 20 de Agosto, que preceitua “o contrato de mediação imobiliária está sujeito à forma escrita”.
- Nos termos do nº 2, al. b), do mesmo dispositivo legal, do contrato constam, obrigatoriamente, os seguintes elementos: “A identificação do negócio visado pelo exercício da mediação”.
- Nos termos do disposto no nº 8 do referido art. 19º, o “incumprimento do disposto nos nºs 1, 2 e 7 do presente artigo gera a nulidade do contrato, não podendo esta, contudo, ser invocada pela empresa de mediação.”
- O contrato sempre seria nulo, ao abrigo do disposto na al. c) do art. 8º do Dec. Lei nº 446/85, de 25.10, na medida em que a apresentação gráfica da parte final da Cláusula 5ª, nº 1, do contrato junto aos autos passa despercebida a um contraente normal, colocado na posição do contraente real, o que sucedeu com o Autor (artº 7 DO DITO CONTRATO);
D. - QUER DO ACORDO celebrado COM A AUTORA/Recorrida, QUER DO CONTRATO DE PROMESSA DE PERMUTA, celebrado COM A CONSTRUÇÕES D…, LDA - contrato elaborado por esta, acompanhada por advogado seu e a Autora - NÃO RESULTOU PARA O ORA RECORRENTE A CONCRETIZAÇÃO DE QUALQUER NEGÓCIO, SENDO CERTO QUE, COMO RESULTA DO DEPOIMENTO DAS PRÓPRIAS TESTEMUNHAS ARROLADAS PELA AUTORA, ASSIM COMO DA PRÓPRIA FUNDAMENTAÇÃO DA SENTENÇA PROFERIDA, TAL NÃO CONCRETIZAÇÃO FICOU A DEVER-SE – APENAS E TÃO SÓ – À VONTADE DA GERÊNCIA DA DITA CONSTRUÇÕES D…, LDA, APÓS TER SIDO CONFRONTADA COM CONTACTOS DE ADVOGADOS QUE DIZIAM TER CONTRATOS PROMESSAS DE COMPRA E VENDA DE FRACÇÕS AUTÓNOMAS, DE CLIENTES SEUS, CELEBRADOS COM UM CONSTRUTOR QUE NADA TINHA A VER COM O RÉU/RECORRENTE, C….
E.- No sentido da nulidade do contrato em causa, e que se assim não fosse, nada era devido pelo Réu à Autora, destacámos os seguintes Acórdãos e Doutrina, que detalhamos no ITEM VI deste Recurso, resumidos a seguir:
ACÓRDÃOS DO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA - DE 18/03/97, CJ (ACÓRDÃOS DO STJ), ANO V, TOMO 1, 158; DE 31/03/98, BMJ 47521, 680; E DE 31/05/2001, CJ (ACÓRDÃOS DO STJ), ANO IX, TOMO II,108.-DE 15/09/2009, REVISTA 5339/06.9TVLSB; DE 29/03/2011, REVISTA 2439/07.ITBPMT.E1.51 E DE 29/09/2001, REVISTA N.2 6067/07.3TCLRS.L1.S1, TODOS COM SUMÁRIO DISPONÍVEL EM WWW.STJ.PT. -DE 22/01/2009, REVISTA N.2 976108, DISPONÍVEL WWW.DGSI.PT.
- O direito à remuneração implica a execução da prestação contratual a que o mediador se obrigou, nomeadamente a prática dos actos adequados a conseguir que seja atingido o objectivo do contrato, objectivo este que é a concretização e perfeição do negócio visado com a mediação.
1216/11.0YIPRT.P1 - Relator: MARIA AMÁLIA SANTOS - Descritores: CONTRATO DE MEDIAÇÃO IMOBILIÁRIA REMUNERAÇÃO DO MEDIADOR - Nº Documento: RP201502101216/11.OYIPRT.P1 1OO22O15 - Votação: UNANIMIDADE - Decisão: CONFIRMADA - Indicações: 2ª SECÇÃO - Num contrato de mediação imobiliária, a remuneração do mediador está dependente duma condição essencial, que alguns apelidam de condição suspensiva, que se traduz na realização do negócio objecto do contrato de mediação.
- Acresce que o mediador, devido ao risco/álea inerente à actividade comercial da mediação, apenas tem direito a ser remunerado quando a sua actuação determine a conclusão e perfeição do negócio visado pelo exercício da mediação, o que significa que tem que existir um nexo de causalidade adequada entre a sua actividade e a realização do negócio pretendido, de modo a que possa afirmar-se que a concretização deste foi o corolário ou a consequência daquela actuação.
ACÓRDÃO DO STJ DE 17/03/1967, BMJ 165, P. 333.
- "Supõe, na sua essência, a incumbência a uma pessoa de conseguir interessado para certo negócio, a aproximação feita pelo mediador entre o terceiro e o comitente e a conclusão do negócio entre este e o terceiro em consequência da atividade do intermediário."
MARIA DE FÁTIMA RIBEIRO, «O contrato de mediação e o direito do mediador à remuneração», 2013, p. 78.
- Em anotação a acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 7 de Março de 1967, VAZ SERRA define o contrato de mediação como «um contrato pelo qual uma das partes se obriga a conseguir interessado para certo negócio e a aproximar esse interessado da outra parte». Em acórdão do Supremo de 17/03/1967, prolatado pela mesma altura, lê-se que o contrato de mediação «supõe, na sua essência, a incumbência a uma pessoa de conseguir interessado para certo negócio, a aproximação feita pelo mediador entre o terceiro e o comitente e a conclusão do negócio entre este e o terceiro em consequência da atividade do intermediário».
F. TENDO EM CONTA, quer a PROVA DOCUMENTAL - Contrato de Mediação, sem a identificação do Tipo concreto de Contrato, sequer da menção de Contrato Promessa, assim como do contrato promessa de permuta, onde a Promitente Sociedade se fez acompanhar por advogado e o Réu desacompanhado de quem quer que fosse, Contrato Promessa donde constam CLAUSULAS VANTAJOSAS PARA A EMPRESA E SEM QUAISQUER GARANTIAS PARA O RÉU, ONDE AVULTAM CLAUSULAS PENAIS, VERDADEIRAMENTE DESAJUSTADAS AO VALOR E IMPORTÂNCIA DO NEGÓCIO, condições que, em tudo, protegem a Sociedade Promitente e em tudo penalizam o Réu/Recorrente, v. g. duas penalizações de €250.000,00 e €500.000,00, assim como o pagamento por este de todas as despesas feitas por Sociedade Promitente, que deu causa à não concretização do contrato definitivo - quer a PROVA TESTEMUNHAL - O Réu é emigrante nos E.U.A. praticamente desde criança, fala português com sotaque, vem a Portugal de dois em dois anos e apenas por 15 dias e o depoimento da testemunha E…, sócio gerente da Construções D…, Lda, Sociedade Promitente Permutante, que declarou nada perceber dessas coisas de direito de retenção, ……… providências cautelares, etc …
–DEVERIA O TRIBUNAL RECORRIDO, TER DADO POR PROVADOS OS SEGUINTES FACTOS ALEGADOS PELO RÉU:
a)- O Réu é emigrante nos E.U.A., desconhecendo a realidade portuguesa no ramo do imobiliário.
b)- No caso concreto, mormente da crise do imobiliário. – Artº 10 da contestação.
c)- Crise que, obviamente, se reflecte na vida das imobiliárias, como a Autora, assim como na vida das pessoas, como o Réu, que precisava de vender o prédio de sua propriedade.
d)-Já após haver assinado o contrato de promessa de permuta junto aos autos como documento nº 2, verificou, por informações que recolheu junto de familiares e industriais da construção civil, tratar-se de um negócio ruinoso para si.
e)-A celebração do contrato promessa a que se alude nos autos, em nada prejudicou a Autora.
f)- A promitente permutante “Construções D…, Lda.” foi arranjada pela Autora, e ambas prepararam, elaboraram, ambas redigiram, o contrato promessa.
g)-Limitando-se o Réu a assiná-lo.
h)- Sem perceber que, ausente nos EUA, distante e desconhecedor da realidade – a crise da imobiliária em Portugal nessa altura - jamais conseguiria retirar dele proveito algum.
i)- Volvidos cinco – 5 – meses sobre a sua celebração, o Réu assinou a rescisão do contrato promessa de permuta, suportou alguns encargos tidos pela outra promitente, A QUAL DESISTIU DE TAL NEGÓCIO, POR SUA LIVRE VONTADE, AO VER-SE CONFRONTADA COM CARTAS DE TERCEIROS., QUE RECLAMAVAM DE NEGÓCIOS QUE HAVIAM CELEBRADO CONTRATOS DE PROMESSA RELATIVOS A FRACÇÕES AUTÓNOMAS NO PRÉDIO OBJECTO DO CONTRATO PROMESSA CELEBRADO COM O RÉU, NEGÓCIOS ESTES QUE ERAM ESTRANHOS AO RÉU E CELEBRADOS ANTES DE ELE HAVER SER DONO DESSES IMÓVEIS.
j)- Os factos acima alegados de a) a i) eram do perfeito conhecimento da Autora,
l)- Assinado o contrato promessa de compra e venda, rescindido que foi o mesmo cinco meses após a sua assinatura, jamais a Autora reclamou ao Réu o que quer que fosse.
m)- A Autora, embora sem sucesso algum, sem dar ao Réu notícia alguma sobre o estar na eminência de dar saída ao negócio que celebrara com o Réu, foi promovendo a venda do imóvel.
n)- Embora - apenas e tão só - com anúncios em I…, colocados na parte frontal do imóvel identificado no contrato de mediação imobiliária e no contrato de promessa de compra e venda – a venda do imóvel, 30. - Com os dizeres, em letras garrafais “N… – VENDE T1, T2, T3” – “WWW.N....PT/POVOAVARZIM “ – doc. 2 junto.
o)-Nunca o negócio celebrado com a “Construções D…, Lda.” impediu a Autora de continuar a promover a venda do imóvel identificado no contrato de mediação imobiliária.
p)- O Réu, através de uma sua procuradora, com poderes para o acto, denunciou, oportunamente, porque dentro do prazo previsto, o contrato em causa, ao abrigo do disposto na Cláusula 9ª (Prazo de Duração do Contrato).
G. TENDO A TESTEMUNHA DA AUTORA, E…, SÓCIO GERENTE DA PROMITENTE PERMUTANTE, DECLARADO QUE: - Fls. 22 a 25, 55 a 58, 63 a 74.
a)- Foi CONFRONTADO POR ADVOGADOS QUE LHE MOSTRARAM CONTRATOS, NÃO ASSINADOS PELO RÉU, RECORRENTE, MAS SIM POR UM CONSTRUTOR QUE EXISTIA ANTIGAMENTE.
b)- Ficou receoso e DESISTIU DO MEU NEGÓCIO.
c)-NADA TEM A DIZER DO SR. C…,ANTES PELO CONTRÁRIO.
d)- Não sabe do que estão a falar, quando no contrato promessa de permuta, que assinou, como sócio e gerente da Promitente Permutante, se fala em direito de retenção,
IMPÕE-SE CONCLUIR QUE:
1.
- O RÉU/RECORRENTE NÃO DEU CAUSA À NÃO CONCRETIZAÇÃO DO CONTRATO DEFINITIVO, PELO QUE COM TODA A RAZÃO QUANDO SE RECUSA A PAGAR QUALQUER COMISSÃO.
2.
- O Réu limitou-se a assinar o contrato promessa de permuta, que foi elaborado pela Autora e pela Sociedade Permutante, acompanhados por advogado desta.
H.- O depoimento prestado pela Jurista da Autora e que assistiu à assinatura do Acordo de Mediação, não pode servir para fundamentar respostas negativas dadas aos factos alegados pelo Recorrido na sua Contestação, acima identificados, PORQUANTO, COMO DECORRE DO SEU DEPOIMENTO, ACIMA TRANSCRITO: - Fls. 41 a 47.
a)-FICOU ESPANTADA e NÃO PERCEBER A RAZÃO pela qual o dito Acordo de Mediação não contém a IDENTIFICAÇÃO DO NEGÓCIO.
b)-DECLAROU que o Réu não tinha dúvidas sobre as condições/cláusulas do Contrato Promessa, PORQUE SENÃO NÃO O TINHA ASSINADO.
I. De igual modo, não pode servir para fundamentar respostas negativas dadas aos referidos factos alegados pelo Recorrido na sua Contestação, o depoimento prestado pelo Director Comercial da Autora/Recorrida, F…, acima transcrito de fls. 47 a 53 -,DO QUAL RESULTA QUE, PARA ELE, o que está em causa nesta acção, É A EFECTIVAÇÃO DE UM NEGÓCIO QUE DEVIA TER SIDO ESCRITURADO E NÃO FOI, MAIS REFERINDO QUE O RÉU, ORA RECORRENTE DISSE QUE NÃO TINHA QUE PAGAR QUALQUER COMISSÃO.
J. TAMBÉM O DEPOIMENTO DA TESTEMUNHA G…, não pode, de modo algum, servir para fundamentar respostas à matéria de facto, já que o seu depoimento em nada condiz com os depoimentos das demais testemunhas, a propósito dos mesmos factos, UMA VEZ QUE, referiu havendo dito que: - Fls. 58 a 63.
a)- O Réu prometeu pagar a comissão e até assinou um documento a confirmar que ainda a não pagara.
b)- Que mais tarde soube, pelo “Sr. E…” (da sociedade promitente compradora), que o contrato promessa foi “desfeito”, o qual lhe disse que fora “ameaçado com providências cautelares de pessoas que já tinham prometido comprar apartamentos ao Sr. C… antes deste negócio”, tendo ficado com receio.
TAL DEPOIMENTO É TOTALMENTE CONTRARIADO POR TODOS OS DEPOIMENTOS, MORMENTE PELO PRESTADO PELA TESTEMUNHA E…, SÓCIO GERENTE DA PROMITENTE PERMUTANTE “ CONSTRUÇÕES D…, LDA “, - Fls. 22 a 25, 55 a 58, 63 a 74 - QUE AFIRMOU QUE OS CONTRATOS DE QUE ADVOGADOS LHE FALARAM NADA TINHAM A VER COM O RÉU, ORA RECORRENTE.
L. - O Tribunal Recorrido, com base no depoimento da testemunha da Autora, F… – Gerente Comercial, DEU POR NÃO PROVADO, em g) dos factos não provados, o facto alegado pela Autora “A Autora soube do acordo referido em I e J na altura da celebração do mesmo.”
ESTE FACTO – alegado pelo Réu - DEVE SER DADO POR PROVADO, UMA VEZ QUE A TESTEMUNHA E…, SÓCIO GERENTE DA CONSTRUÇÕES D…, LDA, PROMITENTE PERMUTANTE, DECLAROU QUE DESISTIU DO NEGÓCIO, NA REUNIÃO QUE TEVE COM O RÉU E COM A AUTORA, B…, LDA, como novamente se transcreve:
T: em seguida que eu dei-lhe conhecimento de tudo, PEDI AO SR. C… DE NOS REUNIRMOS, INCLUSIVAMENTE A B…, TAMBÉM. REUNIMO-NOS.
Se ele assumisse os problemas que tivesse para trás, a gente podia ir para a frente.
Se ele não assumisse acabávamos o nosso negócio ali.
Adv: e então o que é que ele disse?
: e ELE DISSE-ME NÃO, EU NÃO TENHO QUE ASSUMIR NADA, QUE EU NÃO ASSINEI NADA COM NINGUÉM. E ENTÃO EU DISSE, ENTÃO, UMA VEZ QUE O SR. NÃO ASSUME NADA, EU TAMBÉM NÃO ME INTERESSA ISSO PARA NADA.
M. Inexiste qualquer prova nos autos comprovativa de que a Autora -antes de haver recebido a carta que o Autor, através da testemunha H…, lhe enviou denunciando o contrato – reclamou comissão alguma.
Prova disso foi que, conforme resulta da prova testemunhal e documental produzida, a Autora:
a)- Manteve no imóvel do Réu I…, anunciando a venda de apartamentos.
b)- Criou um conjunto de dificuldades à dita H… o conjunto de dificuldades – v. g. intervenção da PSP e de um escritório de advogados -, com a finalidade única e exclusiva de evitar tal denúncia do contrato, tudo como resulta do depoimento que acima transcrevemos, Fls. 26 a 30 e 75 a 85.
c)- Factos inequívocos de que o contrato, então assim denunciado, se mantinha em vigor e a sua prestação por cumprir.
N. Mesmo que devidos – o que se não concede - O Tribunal Recorrido não podia condenar o ora Recorrente a pagar juros de mora à taxa legal comercial aplicável, vencidos e vincendos até integral pagamento, porquanto não se está na presença de uma dívida comercial e não poderiam senão contar-se senão a partir da instauração da acção.
O. A sentença recorrida violou o disposto nos artºs 8º e 19º do Dec. Lei nº 2011/2004, de 20.08, artº 8º, alª c) do Dec. Lei nº 446/85 de 25.10, artºs 220º, 236º, 286º, 289º a 293º e 423º do Cód. Civil e artº 607º do C. P. Civil.
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A autora apresentou contra-alegações, pugnando pela improcedência do recurso.
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Após os vistos legais cumpre decidir.
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II- DELIMITAÇÃO DO OBJETO DO RECURSO
O objeto do recurso é delimitado pelas conclusões da alegação da recorrente, não podendo este tribunal conhecer de matérias nelas não incluídas, a não ser que as mesmas sejam de conhecimento oficioso – cfr. arts. 635º, nº 4, 637º, nº 2, 1ª parte e 639º, nºs 1 e 2, todos do Cód. Processo Civil.
Porque assim, atendendo às conclusões das alegações apresentadas pela apelante, são as seguintes as questões solvendas:
. determinar se o tribunal a quo incorreu num error in iudicando, por deficiente avaliação ou apreciação das provas e consequentemente se, reponderado esse julgamento, devem considerar-se provados os factos que na decisão recorrida se consideraram não provados;
. apurar se o contrato celebrado entre as partes enferma de vício de nulidade por falta de identificação no seu texto do negócio visado pelo exercício da mediação e bem assim porque a apresentação gráfica da parte final do nº 1 da sua cláusula 5ª passa despercebida a um contraente normal;
. decidir em conformidade face à alteração, ou não, da aludida matéria factual, mormente se o réu apelante está constituído no dever de proceder ao pagamento das quantias reclamadas pela autora.
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III- FUNDAMENTOS DE FACTO
O tribunal de 1ª instância considerou provados os seguintes factos:
A. A Autora dedica-se à atividade de mediação imobiliária, explorando para o efeito, designadamente, um estabelecimento na cidade de Póvoa de Varzim: agência sita na Avenida …, n.º …, ….-… Póvoa de Varzim.
B. No dia 5 de Maio de 2011, na agência referida em A, o Réu celebrou com a Autora o acordo que consta a fls. 12 e 13 dos autos, epigrafado de “CONTRATO DE MEDIAÇÃO IMOBILIÁRIA”, a que foi atribuído o n.º ……., que aqui se dá por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais.
C. Acordaram então Autora e Réu, aquela enquanto Mediadora e este enquanto Proprietário, o “presente Contrato de Mediação Imobiliária, que se rege pelas seguintes cláusulas:
Cláusula 1ª (Identificação do imóvel)
O Segundo Contraente é proprietário e legítimo possuidor da fracção autónoma / prédio (rústico/urbano) / estabelecimento comercial; destinado(a) a construção, sendo constituído por ____ divisões assoalhadas, com uma área total de 146 m2, sito na (Rua, Av., Etc.) Rua …, n.º .. e .., (freguesia) …, (concelho) Póvoa de Varzim, descrito na Conservatória do Registo Predial de Póvoa de Varzim, sob a ficha 2707, com a licença de construção / utilização n.º _____, emitida pela Câmara Municipal de ________________, em ___/___/___ e inscrito na matriz predial (urbana / rústica) com o artigo n.º _____ da Freguesia de ______ / omisso na matriz______.
Cláusula 2ª (Identificação do negócio)
1. A Mediadora obriga-se a diligenciar no sentido de conseguir interessado na Compra ou Permuta Trespasse Arrendamento _____________, pelo preço de Euros: 625.000.00 (seiscentos e vinte e cinco mil euros), desenvolvendo para o efeito, acções de promoção e recolha de informações sobre os negócios pretendidos e características dos respectivos imóveis.
2. Qualquer alteração ao preço fixado no número anterior deverá ser comunicado de imediato e por escrito à mediadora.
Cláusula 3ª (Ónus e Encargos)
X O imóvel encontra-se livre de quaisquer ónus ou encargos. O Segundo Contratante declara que sobre o imóvel descrito no número anterior recaem os seguintes ónus e encargos (hipotecas e penhoras) ______________, pelo valor de Euros: __________.
Cláusula 4ª (Regime de Contratação)
1- O Segundo Contratante contrata a Mediadora em regime de:
Não Exclusividade
X Exclusividade
2- a) Nos termos da legislação aplicável, quando o contrato é celebrado em regime de exclusividade só a Mediadora contratada tem o direito de promover o negócio objecto do contrato de mediação durante o respectivo período de vigência.
b) Quando o regime contratado é a não exclusividade, só a mediadora B… Unipessoal, Lda. poderá colocar placa(s) ou sinalética na fachada do imóvel, durante o período de vigência do contrato.
Cláusula 5ª (Remuneração)
1 - A remuneração só será devida se a Mediadora conseguir interessado que concretize o negócio visado pelo presente Contrato, nos termos e com as excepções previstas no art. 18º do D.L. n.º 211/2004, de 20 de Agosto.
2 - O Segundo Contratante obriga-se a pagar à Mediadora a título de remuneração:
X a quantia de 5% calculada sobre o preço pelo qual o negócio é efectivamente concretizado, sendo o seu valor mínimo a quantia de €5.000,00 (cinco mil euros).
a quantia de___________ Euros (___________).
Aos valores em questão acresce o IVA à taxa legal em vigor.
O pagamento do total da remuneração é feito aquando da celebração do contrato promessa, até ao limite do sinal recebido.
Cláusula 6ª (Concretização do Negócio)
A remuneração será devida caso o negócio visado pelo presente contrato, com o cliente angariado pela primeira contraente, se venha a concretizar após a cessação ou denúncia do mesmo.
Cláusula 7ª (Obtenção de Documentos)
1 - No âmbito do presente contrato, a Mediadora, na qualidade de mandatária sem representação, obriga-se a prestar os serviços conducentes à obtenção da documentação necessária à concretização do(s) negócio(s) visado(s) pela mediação.
2 - A) Pela prestação dos serviços previstos no número anterior, o segundo contratante pagará a quantia de €100,00 (cem euros) acrescida de IVA à taxa em vigor, para além do pagamento do montante devido pela obtenção dos documentos OU
B) X A remuneração pelos serviços referidos no número anterior considera-se incluída no montante acordado na cláusula 5ª e só será devida nos termos ali descritos.
3- Sem prejuízo do disposto no n.º 2, a mediadora mantém, sempre, o direito de reembolso das despesas efectuadas com a obtenção da documentação.
Cláusula 8ª (Garantia da Actividade de Mediação)
Para garantia da responsabilidade emergente da sua actividade profissional, a Mediadora celebrou um contrato de seguro obrigatório de responsabilidade civil no valor de €150.000,00 (cento e cinquenta mil euros), apólice n.º 68.305/9370, através da seguradora «Companhia de Seguros J…, S.A.».
Cláusula 9ª (Prazo de Duração do Contrato)
O presente contrato tem uma validade de 12 meses contados a partir da data da sua celebração, renovando-se automaticamente por iguais e sucessivos períodos de tempo, caso não seja denunciado por qualquer das partes contratantes através de carta registada com aviso de recepção ou outro meio equivalente, com a antecedência mínima de 10 dias em relação ao seu termo.
Cláusula 10ª (Dever de Colaboração)
O Segundo Contratante colaborará com a Mediadora na entrega de todos os elementos julgados necessários e úteis no prazo de 10 dias, a contar da data de assinatura do presente contrato.
Cláusula 11ª (Foro competente)
Para dirimirem quaisquer litígios emergentes da execução do presente contrato, as partes acordam entre si estabelecer como competente o foro da Comarca de Póvoa de Varzim, com expressa renúncia a qualquer outro.
Depois de lido e ratificado, as partes comprometem-se a cumprir este contrato segundo os ditames da boa-fé, e vão assinar. Feito em duplicado, destinando-se um exemplar a cada uma das partes intervenientes.”
D. No cumprimento do acordo referido em B e C, a Autora promoveu e publicitou a venda ou permuta dos imóveis referidos em C, através da sua carteira de potenciais interessados e ainda com afixação de placas, bem como encarregou os seus vendedores de promoverem a respectiva venda junto dos seus contactos e conhecimentos e potenciais interessados, o que estes fizeram.
E. Na sequência do referido em D, a Autora encontrou a sociedade «Construções D…, Lda.», que colocou em contacto com o Réu.
F. Beneficiando da actividade de promoção e publicitação feita pela Autora, e na sequência da mesma, em 30 de Junho de 2011, o Réu celebrou com a sociedade «Construções D…, Lda.», com sede na Rua …, n.º …, …, concelho de Guimarães, NIPC ………, representada pelos seus sócios gerentes K… e E…, o «Contrato promessa de permuta de prédios urbanos e benfeitorias por bens futuros», nos termos do documento de fls. 14 a 21 e que aqui se dá por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais.
G. De tal acordo consta o seguinte: “No dia trinta do mês de Junho do ano de dois mil e onze, livremente e de boa-fé, celebram os outorgantes:
PRIMEIRO – C…, natural da freguesia …, do concelho de Vila Nova de Famalicão, contribuinte fiscal com o número ………, titular do cartão de cidadão número …….., válido até 16/02/2015, que intervém por si e como procurador de sua mulher com quem é casado em comunhão de adquiridos:
- L…, que também usa o nome de L1…, natural da freguesia de …, da Província de Ourense, em Espanha (….).
SEGUNDO – CONSTRUÇÕES D…, LDA., sociedade comercial por quotas cujo escopo social é a construção civil e a compra e venda de imóveis, Pessoa Colectiva com o número de identificação fiscal e comercial ………, com sede na Rua …, n.º …, à …, deste concelho e comarca de Guimarães, representada pelos seus sócios gerentes K… e E…, com poderes especiais para este acto conferidos que lhes advém do pacto social. Entre os primeiro e a segunda contraentes é celebrado, livremente e de boa fé, o presente contrato promessa de permuta que se rege pelas seguintes cláusulas:------- E pelos primeiros contraentes foi dito que com exclusão de quaisquer outros são donos e legítimos proprietários de dois prédios urbanos e benfeitorias a seguir discriminadas:----
a) Prédio urbano composto de casa de habitação de rés de chão e andar com quintal, com a área coberta de oitenta e sete metros (87m2) quadrados e área descoberta de cinquenta e nove metros quadrados (59m2), tendo a área total de cento e quarenta e seis metros quadrados (146m2), sito na Rua …, n.º .., à cidade e concelho de Póvoa de Varzim, descrito na Conservatória do Registo Predial da Póvoa de Varzim sob o número dois mil setecentos e sete (2707), nela registado a seu favor, pela inscrição apresentação 22 de 2006/11/23, inscrito à matriz predial urbana respectiva sob o artigo quatro mil duzentos e oito (4208º), com o valor patrimonial tributável de 23.623.88€ (vinte e três mil seiscentos e vinte e três euros e oitenta e oito cêntimos) e o atribuído de duzentos e setenta e cinco mil euros (275.000,00€), que apesar do seu ano de inscrição matricial ser de 1957, dispensa qualquer licença de habitação / ocupação em virtude da sua construção ser anterior à exigência de qualquer licença camarária.
b) Prédio urbano composto de morada de casas térreas, com quintal, com a área coberta de noventa e quatro metros quadrados (94m2) e área descoberta de trinta e sete metros quadrados (37m2), tendo a área total de cento e trinta e um metros quadrados (131m2), sito na Rua …, n.º .., à cidade e concelho da Póvoa de Varzim, descrito na Conservatória do Registo Predial da Póvoa de Varzim sob o número dois mil quinhentos e trinta e um (2531), nela registado a seu favor pela inscrição apresentação 15 de 1997/07/01, inscrito à matriz predial urbana respectiva sob o artigo quatro mil duzentos e nove (4209º), com o valor patrimonial tributável de 8.765,40€ (oito mil setecentos e sessenta e cinco euros e quarenta cêntimos) e o atribuído de duzentos e setenta e cinco mil euros (275.000,00€), que apesar do seu ano de inscrição matricial ser de 1988, dispensa qualquer licença de habitação / ocupação em virtude da sua construção ser anterior à exigência de qualquer licença camarária. -----
c) Um conjunto de benfeitorias constituídas pela estrutura em ferro e cimento (betão armado) de um edifício de seis andares, implantadas nos dois prédios urbanos (4208º e 4209º) acima descritos que têm assim a sua composição habitação e casas térreas parcialmente destruídas, benfeitorias com o valor atribuído de setenta e cinco mil euros (75.000,00€), em mau estado de construção e conservação.-----
Abrangendo a totalidade destes dois prédios urbanos, foi pela Câmara Municipal da Póvoa de Varzim aprovado um pedido de construção de edifício de seis andares destinado a várias habitações e comércio, no âmbito do processo aí autuado sob o número 209/93, que se encontra presentemente caducado, mas que irá ser objecto de aditamento e reapreciação no sentido de ser novamente viabilizada a construção das habitações licenciadas, num mínimo de treze fracção habitacionais e comerciais.----
Tal pedido de viabilização / reapreciação de nova licença de construção será requeridos em nome dos primeiros outorgantes, que para este efeito se obrigam desde já a requerer, assinar e diligenciar tudo quanto lhes for solicitado pela ora segunda contraente, mas serão suportados pela sociedade que os segundos representam todos os custos relacionados com levantamentos topográficos, instrução e licenciamento do processo, sendo o custo da emissão do alvará de licença de construção a suportar pela segunda contraente.----
A aprovação por parte da Câmara Municipal da Póvoa de Varzim do processo / projecto de construção deverá contemplar o máximo de cércea e ocupação permitidos, mas deverá sempre permitir a construção de um mínimo de treze fracções, sendo doze habitacionais e uma comercial e eventualmente lugares de aparcamento na cave ou no logradouro, integrados no prédio a constituir em propriedade horizontal.----
As fracções que deverão integrar projecto de construção e aditamento a ser objecto de aprovação pela Câmara Municipal de Guimarães, são as seguintes:----
- Uma loja comercial no rés do chão;----
- Duas habitações de tipo T2 e uma habitação de tipo T1+1 no primeiro andar;----
- Duas habitações de tipo T2 e uma habitação de tipo T1+1 no segundo andar, com a área máxima de duzentos e sessenta e nova metros quadrados (269m2), incluindo elevador e caixa de escadas;----
- Duas habitações de tipo T2 no terceiro andar:---
- Duas habitações de tipo T2 no quarto andar;---
- Uma habitação de tipo T3 no quinto andar;----
- Uma habitação de tipo T3 no sexto andar.---
Pelo presente contrato promessa de permuta os ora primeiros contraentes prometem ceder à sociedade que os segundos representam os dois mencionados prédios urbanos, bem como as benfeitorias estrutura de aço e betão armado neles implantadas de que são exclusivos proprietários e possuidores, no valor global de seiscentos e vinte e cinco mil euros (625.000,00€), livre de qualquer ónus, encargos e responsabilidades, nomeadamente e entre outros, completamente devolutos de pessoas e bens, sem quaisquer arrendamentos, penhoras, hipotecas, contratos promessas de compra e venda, sem dívidas a fornecedores, promotores, empreiteiros e construtores.---
Em troca a sociedade que os segundos contraentes representam promete ceder aos ora primeiro outorgantes, três fracções autónomas: duas de tipo T2 e uma de tipo T1+1, acima identificadas, todas localizadas no segundo andar do edifício a construir e a constituir em regime de propriedade horizontal, as fracções autónomas duas de tipo T2 e uma de tipo T1+1 prontas a ser habitadas e utilizadas, devidamente licenciadas para os fins habitacionais a que se destinam e acima mencionado, edificadas de acordo com o projecto em parte já aprovado mas caducado e ainda a aprovar por meio de aditamento à inteira e total escolha, gostos e critérios em termos de área, disposição interior das diversas divisões, condutas de água, saneamento, telefone, gás, electricidade, televisão, caixa de escadas e elevador da segunda contraente e construídas de acordo com um caderno de encargos anexo à presente promessa de permuta, a implantar e construir nos sobreditos prédios urbanos 4208º e 4209º com a área global de duzentos e setenta e sete metros quadrados (277m2), duas fracções autónomas de tipo T2 e uma fracção autónoma de tipo T1+1 no valor atribuídos de seiscentos e vinte e cinco mil euros (625.000,00€).----
Que esta promessa de permuta fica condicionada à emissão do correspondente alvará de licenciamento da construção já aditada com o mínimo de treze fracções habitacionais e comerciais na construção aprovada pelo processo 209/93 e a concretização da prometida permuta condicionada à concessão dos necessários alvarás de habitação e utilização para as três fracções (duas T2 e uma T1+1) ora objecto de permuta.----
Aos imóveis objectos de prometida troca descritos nas alíneas antecedentes é assim atribuído o valor global de um milhão duzentos e cinquenta mil euros (1.250.000,00€), que para igualação de valores os primeiros outorgantes entregarão à segunda os dois prédios urbanos 4208º e 4209º supra descritos e todas as benfeitorias neles implantadas, no valor global atribuído de 625.000,00€ (seiscentos e vinte e cinco mil euros) e receberão em troca da segunda contraente duas fracções autónomas de tipo T2 e uma de tipo T1+1, todas localizadas no segundo andar, no valor global atribuído de seiscentos e vinte e cinco mil euros (625.000,00€), correspondente a duzentos e vinte e cinco mil euros (225.000,00€) para cada uma das duas fracções autónomas de tipo T2 e cento e setenta e cinco mil euros (175.000,00€) para a fracção autónoma de tipo T1+1, no acto da celebração da escritura notarial de concretização da permuta. A representada dos segundos contraentes obriga-se a obter junto da Câmara Municipal da Póvoa de Varzim o alvará de licença de habitação e utilização para as fracções autónomas habitacionais ora objecto de permuta, no prazo máximo de trinta seis meses, a contar da data da obtenção do alvará de licença de construção, procedendo de sua conta à apresentação do pedido de deferimento do processo de licenciamento para construção, apresentação de projectos térmicos, acústicos, gás, telefónicos, solicitados por quaisquer entidades necessárias, desenhos e plantas solicitados pela Câmara Municipal, requerendo, promovendo, apresentando, diligenciando tudo quanto necessário ao deferimento do processo de licenciamento respectivo, obrigando-se os primeiros contraentes a requerer, assinar e diligenciar tudo quanto for necessário para o processo de construção, sempre que tal lhes for solicitado pelos segundos contraentes.—
- Serão da responsabilidade da representada dos segundos contraentes a obtenção e levantamento junto da Câmara Municipal de Póvoa de Varzim de todas as licenças de construção, habitação e utilização, suportando todas as despesas inerentes.----
Serão da responsabilidade da representada dos segundos contraentes os pagamentos de todas e quaisquer taxas camarárias devidas em cumprimento das obrigações contratualmente assumidas.---
A ora prometida permuta, isto é, a concretização da permuta das fracções prometidas, será escriturada notarialmente no prazo máximo de trinta e seis meses a contar da data da emissão do alvará de licença de construção ou em alternativa no prazo máximo de noventa dias a contar da emissão do alvará de licença de habitação e ocupação para as fracções objecto de permuta, notificando para este efeito os segundos contraentes ou qualquer uma sua representada sociedade os primeiros contraentes através de carta registada expedida com pelo menos oito dias de antecedência, para a morada ora contratualmente indicada, obrigando-se para o efeito, por sua vez, os ora primeiros contraentes a entregar no cartório notarial assim designado todos os elementos documentais pessoas necessários à realização da escritura ora prometida, sendo certo que a escritura de permuta dos prédios urbanos 4208º e 4209º e benfeitorias será outorgada no prazo máximo de seis meses a contar da presente data da celebração do presente contrato promessa ou se a segunda contraente preferir e optar no prazo máximo de sessenta dias a contar da concessão do alvará de licença de construção para o mínimo de treze fracções presentemente objecto de aditamento junto da Câmara Municipal da Póvoa de Varzim.-----
A troca ou permuta ora prometida será outorgada e realizada livre de quaisquer encargos, ónus ou responsabilidades, completamente devolutas de pessoas e bens, sem quaisquer arrendamentos, penhoras, arrestos, embargos, hipotecas, contratos promessa de compra e venda, sem dívidas a fornecedores, promotores, empreiteiros e construtores.-----
As despesas ocasionadas com a escrituração da ora prometida permuta serão suportadas pelos ora contraentes na proporção dos montantes das suas aquisições, nomeadamente o pagamento do respectivo imposto municipal de transmissão, dos emolumentos notariais e dos custos de registo de aquisição, serão da exclusiva responsabilidade dos promitentes adquirentes das fracções / prédios.---
Declaram ambas as partes estarem de acordo com todas as cláusulas do presente contrato promessa de compra e venda, por o presente contrato traduzir a vontade de ambas as partes, ficando o mesmo subordinado aos princípios legais aplicáveis, e implicando o seu não cumprimento o direito à execução específica, nos termos do artigo 830º do Código Civil, podendo qualquer dos ora promitentes obter sentença judicial que produza os efeitos da declaração negocial do promitente faltoso, sendo certo que a não celebração da escritura pública ora prometida no acima aludido prazo máximo de seis meses a contar da data da celebração do presente contrato promessa por parte dos primeiros contraentes confere à segunda contraente o direito de reclamar dos primeiros contraentes a título de cláusula penal a quantia de duzentos e cinquenta mil euros (250.000,00€).----
No caso de não ser concedido licenciamento camarário para construção de um mínimo de treze fracções ora contratadas, haverá lugar à redução a acordar nas fracções ora objecto de troca e permuta, sem prejuízo da segunda contraente poder optar pela resolução da presente permuta.-----
No caso de depois de outorgada a escritura de permuta mas antes de outorgada a escritura de concretização da permuta vir a ser decretado embargo de obra, arresto qualquer outro tipo de providência cautelar, penhora, acções de reivindicação, acções e execuções específicas e direitos de retenção sobre eventuais contratos promessa de terceiros estranhos ao presente contrato, confere à segunda contraente o direito de resolução do presente contrato, sem prejuízo de reclamar e recuperar dos primeiros contraentes todas as importâncias que já estiverem pagas para licenciamento, construção do edifício e todas as importâncias gastas pela segunda contraente na edificação de quaisquer benfeitorias ou prédio implantadas nos prédios urbanos objecto da prometida permuta, em cumprimento do presente contrato, acrescidas da quantia de €500.000,00 (quinhentos mil euros) a título de indemnização.----
Feito em dois exemplares, assinado por todas as partes, com reconhecimento presencial notarial.”
H. O Réu é emigrante nos Estados Unidos da América.
I. No dia 22 de Dezembro de 2011, o Réu, casado com L…, representada pela sua procuradora H…, celebrou com «Construções D…, Lda.», representada no acto por M…, um “Acordo de rescisão de contrato promessa de permuta de prédios urbanos e benfeitorias por bens futuros”.
J. De tal acordo consta: “Entre os primeiros e a segunda contraentes é celebrado, livremente e de boa-fé, o presente acordo de rescisão de contrato promessa de permuta que ambas as partes celebraram a 30 de Junho de 2011, relativamente aos prédios urbanos sitos na Rua …, n.º .. e .., à cidade e concelho da Póvoa de Varzim, descritos na Conservatória do Registo Predial da Póvoa de Varzim sob o número dois mil setecentos e sete (2707) e dois mil quinhentos e trinta e um (2531), inscritos à matriz predial urbana respectiva sob os artigos quatro mil duzentos e oito (4208º) e quatro mil duzentos e nove (4209º) e a um conjunto de benfeitorias constituídas pela estrutura em ferro e cimento (betão armado) de um edifício de seis andares, implantadas nos dois prédios urbanos (4208º e 4209º) mediante o pagamento por parte dos primeiros contraentes à segunda contraente da quantia de €13.514,17 (treze mil quinhentos e catorze euros e dezassete cêntimos), correspondente a todas as despesas e custos com licenças, projectos, arquitectura, levantamento topográfico, despesas notariais e de advocacia havidos até esta data com a concretização da permuta prometida, sendo que no que concerne às licenças, projectos, arquitectura, levantamento topográfico a segunda contraente obriga-se a entregar aos primeiros outorgantes tais elementos, sendo certo que com o recebimento da aludida quantia todos os ora contraentes declaram nada mais ter a receber ou reclamar reciprocamente, ficando o contrato a partir deste pagamento sem qualquer efeito, extinguindo-se os direitos e obrigações recíprocos prometidos por aquele contrato assim resolvido.---
Ambos os contraentes declaram que todas estas despesas e custos com a concretização da permuta prometida ora paga pelos primeiros contraentes à segunda, no caso de voltarem a outorgar entre eles no futuro uma qualquer outra promessa de permuta que tenha por objecto os dois imóveis 2707 e 2531 supra aludidos, voltarão a ser reembolsados pela segunda contraente aos primeiros, no caso destas despesas e custos: licenças, projectos, arquitectura e levantamento topográfico manterem na ocasião da celebração dessa futura promessa de permuta actualidade e validade à luz do direito urbanístico então vigente. ----
Feito em dois exemplares, assinado por todas as partes, como reconhecimento presencial notarial.”
K. Após a celebração do acordo referido em F e G, a Autora colocou um anúncio na benfeitoria referida em F e G, com os dizeres «N… – VENDE T1, T2, T3» E «WWW.N….PT/POVOAVARZIM».
L. O referido em K foi efectuado com o acordo do Réu e da sociedade CONSTRUÇÕES D…, LDA.
. M. Com a data de 22 de Abril de 2013, foi enviada à Autora uma carta registada, com o seguinte teor: “Dona H…, titular do DNI espanhol ………, e domicílio en … de Ourense, Espanha (CP …..) em representação de Don C…, contribuinte fiscal com o número ………, titular do cartão de cidadão número ………, válido até 16/02/2015, casado sob o regime de comunhão de adquiridos com L…, que também usa o nome de L1…, contribuinte fiscal com o número ………, titular do passaporte norte americano número ………, emitido em 09/07/2004, pelo National Passport Center, segundo procuração que constituem o 26 de Outubro de 2011 perante Lic. O…, según copia qie se acompanha, comparece e manifesta Que entre os mandantes (Don C… e Dona L…) e B… Unipessoal, Lda. com sede social na Rua … em Viana do Castelo, na sede da empresa em Av. …, n.º …, de Póvoa de Varzim ….-…, foi celebrado um contrato de mediação imobiliária (contrato n.º …….) a cinco de maio de 2011, relativamente ao prédio destinado a construção – com uma área total de 146 m2 – situado na Rua …, n.º .. e .., da freguesia de …, concelho de Póvoa de Varzim descrito na Conservatória do Registo Predial de Póvoa de Varzim sob a ficha n.º 2707.
Na cláusula 9ª do contrato estabeleceu-se que o contrato tem uma validade de 12 meses renovando-se automaticamente por iguais e sucessivos períodos de tempo, caso não seja denunciado por qualquer das partes contratantes através de carta registada com aviso de recepção ou outro meio equivalente, com a antecedência mínima de 10 dias em relação ao seu termo.
E por isso que pela presente esta parte vem a denunciar, com a antecedência mínima de 10 dias em relação ao seu termo, o contrato referido anteriormente, manifestando expressamente esta parte não querer renovar o contrato celebrado.
En Ourense a 22 de Abril de 2013 Dona H….”
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O Tribunal de 1ª instância considerou ainda não provados os seguintes factos:
a) O referido em D ocorreu em toda a área do concelho de Póvoa de Varzim e através de publicações da especialidade de âmbito nacional.
b) O Réu desconhece a realidade portuguesa no ramo do imobiliário.
c) O Réu não se apercebeu da parte final da cláusula 5ª, n.º 1, do acordo referido em B e C, a qual passa despercebida a qualquer contraente.
d) Após assinar o acordo referido em F e G, o Réu verificou, por informações que recolheu nesta zona de Portugal, junto de amigos, familiares e industriais da construção civil, que se tratava de um negócio ruinoso para si.
e) A Autora e «Construções D…, Lda.” prepararam, elaboraram e redigiram o «contrato promessa» referido em F e G.
f) O Réu limitou-se a assinar o «contrato promessa» referido em F e G, sem o perceber e sem perceber que dele jamais retiraria proveito algum.
g) A Autora soube do acordo referido em I e J na altura da celebração do mesmo.
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IV – FUNDAMENTOS DE DIREITO
IV.1 – Erro na apreciação e valoração da prova
Conforme resulta das alegações apresentadas pelo apelante, o presente recurso tem por objeto, para além do mais, a reapreciação da matéria de facto relativamente a alguns factos, rectius afirmações de facto, que aquele entende incorretamente julgados.
Esta possibilidade de reapreciação da prova produzida em 1ª instância, enquanto garantia do duplo grau de jurisdição em sede de matéria de facto, está, como é consabido, subordinada à observância de determinados ónus que a lei adjetiva impõe ao recorrente.
Na verdade, a apontada garantia nunca poderá envolver, pela própria natureza das coisas, a reapreciação sistemática e global de toda a prova produzida na audiência final, impondo-se, por isso, ao recorrente, no respeito dos princípios estruturantes da cooperação e da lealdade e boa-fé processuais, que proceda à delimitação com toda a precisão dos concretos pontos da decisão que pretende questionar, os meios de prova, disponibilizados pelo processo ou pelo registo ou gravação nele realizada, que imponham, sobre aqueles pontos, distinta decisão, e a decisão que, no ver do recorrente, deve ser encontrada para os pontos de facto objeto da impugnação.
Sob a epígrafe ónus a cargo do recorrente que impugne a decisão relativa à matéria de facto, dispõe, com efeito, o nº 1 do art. 640º do Código de Processo Civil[1] que “Quando seja impugnada a decisão sobre a matéria de facto, deve o recorrente obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição:
a) Os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados;
b) Os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida;
c) A decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas”.
Por seu turno, em conformidade com o nº 2 do citado normativo, sempre que “os meios probatórios invocados como fundamento do erro na apreciação das provas tenham sido gravados, incumbe ao recorrente, sob pena de imediata rejeição do recurso na respetiva parte, indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda o seu recurso, sem prejuízo de poder proceder à transcrição dos excertos que considere relevantes”.
Deve, assim, o recorrente, sob cominação de rejeição do recurso, para além de delimitar com toda a precisão os concretos pontos da decisão que pretende questionar, motivá-lo através da indicação das passagens da gravação que reproduzam os meios de prova que, no seu entendimento, determinam decisão dissemelhante da que foi proferida sobre a matéria de facto.
Isto posto, procedendo à exegese das alegações recursórias apresentadas pelo apelante, afigura-se-nos patente o incumprimento desse ónus de indicação, com exatidão, das concretas passagens dos registos fonográficos em que funda a sua discordância, no segmento referente à impugnação da decisão das identificadas questões de facto.
Com efeito, in casu, o apelante estriba essencialmente a sua divergência em relação à materialidade que considera indevidamente julgada pelo tribunal a quo, em alguns dos depoimentos prestados por testemunhas inquiridas no decurso da audiência final, depoimentos esses que, na leitura que deles faz, apontam no sentido da demonstração da factualidade que o tribunal recorrido considerou não provada.
O certo é que, quanto ao cumprimento do aludido ónus, o apelante, no corpo das alegações[2], limitou-se a transcrever excertos dos depoimentos das referidas testemunhas que, na sua perspetiva, são de molde a lograr a alteração da mencionada matéria de facto que considera ter sido indevidamente apreciada pelo tribunal de 1ª instância.
Questão que se coloca e que importa dirimir é a de saber se esse procedimento satisfaz o aludido ónus de indicação, ónus esse que, em conformidade com o já transcrito inciso, impõe ao apelante, sob pena de rejeição do recurso, a “indicação exata das passagens da gravação em que se funda”, sem prejuízo de poder proceder à transcrição dos excertos que considere relevantes.
Primo conspectu afigura-se-nos que o estrito cumprimento da mencionada imposição legal não se basta sequer (como por vezes ocorre, o que, ainda assim, não foi o caso) com a indicação do início e do fim da gravação do depoimento das diversas testemunhas ou de outros intervenientes processuais ouvidos no decurso da audiência final ou, muito menos, com a mera transcrição de excertos desses depoimentos. A lei adjetiva exige bem mais do que uma indicação nesses moldes, reclamando que seja feita uma indicação precisa (exata, na terminologia legal) das concretas passagens dos depoimentos (fonograficamente registados) que, na perspetiva do apelante, apontem em sentido diverso daquele que foi considerado pelo juiz a quo aquando da fixação da materialidade que considerou provada ou não provada.
De facto, conforme tem sido assinalado, a ratio essendi dessa exigência legal destina-se a permitir que o tribunal de recurso fique habilitado a reconhecer de forma inequívoca os concretos segmentos da prova pessoal produzidos na audiência final suscetíveis de inculcar ou confirmar o error in iudicando que o apelante assaca à decisão da questão de facto. Por outro lado, o cumprimento rigoroso desse ónus destina-se outrossim a permitir que a parte contrária possa exercer na plenitude a contraditoriedade relativamente aos argumentos que o apelante convoca para defender decisão diversa sobre a factualidade que considera indevidamente apreciada/julgada, tanto mais que, na resposta ao recurso, terá, nos termos da 2ª parte da al. b) do nº 2 do citado art. 640º, de indicar “os meios de prova que infirmem as conclusões do recorrente e, se os depoimentos tiverem sido gravados, indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda (…)”.
Portanto, a exigência de que a indicação seja exata, precisa, específica, visa permitir, tanto à parte contrária, quer, sobretudo, ao tribunal ad quem uma audição, fácil e célere, das passagens da gravação em que se funda a impugnação, de modo a avaliar, de forma expedita (maxime quando os depoimentos são extensos, como é o caso), se os troços do registo apontados pelo recorrente são ou não adequados a inculcar o error in iudicando por si invocado[3], sem prejuízo, todavia, da atuação, pelo tribunal superior dos seus poderes de investigação oficiosa, isto é, da faculdade de proceder à audição de quaisquer outros segmentos do registo, do mesmo ou de outros depoimentos.
Como assim, dada a assinalada finalidade da determinação legal, o ónus daquela indicação não pode considerar-se cumprido pelas simples transcrição, ainda que integral, dos depoimentos produzidos e fonograficamente registados na audiência final[4]. De facto, de acordo com os cânones interpretativos, à expressão sem prejuízo de poder proceder à transcrição dos excertos que considere relevantes, não pode atribuir-se o sentido de a transcrição dos depoimentos constituir uma alternativa à indicação precisa da sua localização no registo sonoro, tanto mais que o atual sistema de gravação permite a fácil identificação dos ficheiros respeitantes a cada depoimento, seu início e fim, sendo igualmente fácil concretizar em que momento do depoimento a testemunha ou outro depoente se pronunciou sobre uma determinada matéria, identificando, de modo preciso, a hora, minutos e segundos.
Como bem se observa no acórdão da Relação de Guimarães de 30.01.2014[5], a expressão “sem prejuízo da possibilidade de, por sua iniciativa, proceder à respetiva transcrição”, que é antecedida pela imposição da obrigação de “indicar com exatidão as passagens da gravação”, tem que ser interpretada no sentido de que o legislador entendeu que a possibilidade de se “proceder à respetiva transcrição” não era suficiente para se poder ter como feita a indicação “com exatidão das passagens da gravação”. Neste contexto, atento o atual sistema de gravação dos depoimentos, terá que se concluir que a indicação “com exatidão das passagens da gravação em que se funda” concretiza-se mencionando, de forma precisa, o momento em que cada uma de tais passagens tem o seu início e o seu termo. A parte, se assim o quiser, para além disso poderá também, não porque esteja obrigada, mas porque nisso vê algum interesse, proceder à transcrição das passagens que considera importantes.
De contrário, na ausência de tal indicação (indicação essa que, repise-se, não se satisfaz sequer com a indicação do início e fim de cada um dos depoimentos), podem registar-se situações em que, malgrado a impugnação da matéria de facto se restrinja a um concreto ponto de facto relativamente ao qual as testemunhas apenas tenham sido inquiridas por breves instantes, o tribunal de recurso se veja “obrigado” a ter de proceder à audição integral dos registos fonográficos de todos os depoimentos das pessoas que tenham sido inquiridas sobre tal matéria (depoimentos esses que podem ter durado várias horas), apesar de a matéria de facto impugnada representar um segmento claramente limitado dos mesmos.
Indiscutivelmente que a justificação (e consagração legal) do aludido ónus ancora-se primordialmente em razões de economia processual e de cooperação intersubjetiva, propósito esse que, naturalmente, sairá frustrado caso o tribunal de recurso tenha de proceder à audição integral dos registos fonográficos, apesar de no contexto da concreta impugnação da matéria de facto tal se revelar espúrio, importando, desse modo, a realização de uma atividade inútil que a lei adjetiva claramente proscreve (cfr. art. 130º).
De igual modo, não se pode escamotear que o objetivo do 2º grau de jurisdição na apreciação da matéria de facto não é (nem pode ser) pura e simples repetição (repetição a que tendencialmente conduzirá o entendimento de que o cumprimento do mencionado ónus se bastará com a indicação do início e termo de cada um dos depoimentos produzidos) das audiências perante a Relação mas a deteção e correção de concretos, pontuais e claramente apontados e fundamentados erros de julgamento, sem prejuízo de aquando da apreciação dos meios probatórios colocados à sua disposição formar uma convicção autónoma sobre a materialidade impugnada, o que exige, pois, um cabal cumprimento dos ónus que a lei adjetiva impõe ao recorrente, de molde a permitir que o tribunal de recurso possa cumprir um efetivo controlo sobre o julgamento da matéria de facto realizado pela 1ª instância, maxime quando se pretenda a reponderação[6] da decisão proferida tendo por base os elementos probatórios já constantes do processo.
Destarte, na sequência das considerações acima expendidas, não tendo o apelante procedido, de todo, à indicação exata, precisa, das passagens da gravação em que fundamenta o recurso relativamente à decisão da questão de facto, não cumpriu, por conseguinte, o apontado ónus.
Acresce, por outro lado, que, na motivação de um recurso, para além da alegação da discordância, é outrossim fundamental a alegação do porquê dessa discordância, isto é, torna-se mister evidenciar a razão pelo qual o recorrente entende existir divergência entre o decidido e o que consta dos meios de prova invocados.
Nesse sentido tem sido interpretado o segmento normativo “impunham decisão diversa da recorrida” constante da 2ª parte da al. b) do nº 1 do art. 640º, acentuando-se que o cabal exercício do princípio do contraditório pela parte contrária impõe que sejam conhecidos de forma clara os concretos argumentos do impugnante[7].
Com efeito, da mesma maneira que ao tribunal de 1ª instância é atribuído o dever de fundamentação e de motivação crítica da prova que o conduziu a declarar quais os factos que julga provados e não provados (art. 607º, nº 4), devendo especificar, por razões de sindicabilidade e de transparência, os fundamentos que concretamente se tenham revelado decisivos para formar a sua convicção, facilmente se compreende que, em contraponto, o legislador tenha imposto à parte que pretenda impugnar a decisão de facto o respetivo ónus de impugnação, devendo expor os argumentos que, extraídos de uma apreciação crítica dos meios de prova, determinem, em seu entender, um resultado diverso do decidido pelo tribunal a quo.
Portanto, como sublinha ANA LUÍSA GERALDES[8], o recorrente ao enunciar os concretos meios de prova que devem conduzir a uma decisão diversa, “deve fundar tal pretensão numa análise (crítica) dos meios de prova, não bastando reproduzir um ou outro segmento descontextualizado dos depoimentos”. Exige-se, pois, o confronto desses elementos com os restantes que serviram de suporte para a formulação da convicção do Tribunal de 1ª instância (e que ficaram expressos na decisão), com recurso, se necessário, aos restantes meios probatórios, v.g., documentos, apontando as eventuais disparidades e contradições que infirmem a decisão impugnada e é com esses elementos que a parte contrária deverá ser confrontada, a fim de exercer o contraditório, no âmbito do qual poderá proceder à indicação dos meios de prova que, em seu entender, refutem as conclusões do recorrente.
Cumpre, de igual modo, ressaltar que, como já se enfatizou, o objetivo do 2º grau de jurisdição na apreciação da matéria de facto não é pura e simples repetição das audiências perante a Relação mas a deteção e correção de concretos, pontuais e claramente apontados e fundamentados erros de julgamento, sem prejuízo de aquando da apreciação dos meios probatórios colocados à sua disposição formar uma convicção autónoma sobre a materialidade impugnada.
Por via disso, a jurisprudência tem vindo a considerar que o recorrente que impugne a decisão da matéria de facto terá de alegar, especificar e esclarecer o porquê da discordância, isto é, como e qual a razão por que é que determinados meios probatórios indicados e especificados contrariam/infirmam a conclusão factual do Tribunal de 1ª instância. Encontra-se, pois, constituído no ónus, como se decidiu no acórdão do STJ de 15.09.2011[9], “de apontar a divergência concreta entre o decidido e o que consta do depoimento ou parte dele, ou seja, obrigado está o recorrente a concretizar e a apreciar criticamente os meios probatórios constantes dos autos ou da gravação que, no seu entender, impliquem uma decisão diversa; (…) é exatamente esse o sentido da expressão legal «quais os concretos meios probatórios de registo ou gravação que imponham decisão, sobre os pontos da matéria de facto impugnados, diversa da recorrida»”.
Certo é que, como deriva das alegações recursórias, o apelante limitou-se, praticamente, a transcrever excertos de alguns dos depoimentos produzidos na audiência final, não evidenciando em que medida os mesmos possam pôr em crise os meios probatórios que o tribunal de 1ª instância considerou para firmar a sua convicção.
Ora, na sequência das considerações supra expendidas, a impugnação da decisão da matéria de facto não se basta com uma manifestação de discordância em relação à forma como essa materialidade foi decidida acompanhada de uma mera transcrição de excertos de alguns dos depoimentos prestados na audiência final, antes se exige da parte que pretende usar desta faculdade a demonstração da existência de incongruências na apreciação do valor probatório dos meios de prova que efetivamente, no caso, foram produzidos.
Resulta do exposto que o apelante não deu integral cumprimento aos mencionados ónus.
Daí que, em consonância com o disposto na 1ª parte da al. a) do nº 2 do art. 640º, impõe-se a rejeição, nessa parte, do recurso, sendo que, dada a expressão perentória da lei (através do emprego do adjetivo imediata), não cabe convite ao aperfeiçoamento no sentido de lograr suprir a inobservância desses ónus[10].
Destarte nenhuma alteração se poderá introduzir na matéria de facto que o tribunal a quo considerou não provada, inexistindo nos autos outros elementos probatórios que consistentemente ponham em crise esse sentenciamento, sendo de registar, de qualquer modo, que o que acontece in casu, o que ressuma já da motivação da decisão sub iudicio, já da motivação do recurso sub specie, é uma divergente valoração da prova produzida, mormente dos depoimentos das testemunhas H… e E…: tribunal recorrido e recorrente não divergem na leitura das provas, divergem na respetiva valoração, sendo que, neste particular – tal como deflui das considerações a fls. 14 a 20 da sentença recorrida - a manifestação desse convencimento pelo julgador revela uma tomada de posição clara e inequívoca, aí se indicando, de forma que reputamos adequada e coerente, as razões que fundaram a sua convicção, sendo certo que o tribunal é livre de dar credibilidade a determinados depoimentos, em detrimento de outros, desde que essa opção seja explicitada e convincente. Tal é o caso, posto que na sentença recorrida, no segmento em que procedeu à motivação da decisão de facto, o julgador exteriorizou o percurso lógico que o conduziu à formulação do juízo probatório sobre os aludidos factos, expondo com clareza os motivos essenciais que o determinaram a considerar não provadas as afirmações de facto vertidas nas mencionadas alíneas a) a g), aí se afirmando “que, quanto a estes factos, a prova assim produzida não os corroborou de forma bastante, como se exige numa audiência de julgamento (considerando-se, por exemplo, as afirmações de H…, que não é conhecedora do imobiliário em Portugal e não demonstrou conhecimentos a propósitos relevantes, insuficientes para considerar provado o alegado em d), do mesmo modo que a prova produzida não sustentou o alegado na al. c), antes pelo contrário, pois se prova testemunhal houve a propósito foi a produzida pela Autora e esta indica que o Réu bem conhecia esta matéria, tanto que tentou “descer” a comissão a pagar por si e reconheceu estar em dívida quanto à comissão, logo após assinar o contrato promessa, contrato este que de modo algum se provou ter sido negociado e gizado pela Autora, com a promitente compradora prejudicando inclusivamente os interesses do Réu)”.
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IV.2 – Da nulidade formal do contrato celebrado entre as partes
Relativamente a esta questão, o apelante recupera nesta sede recursória a mesma argumentação já anteriormente expendida em 1ª instância e que mereceu no ato decisório sob censura uma resposta de sentido negativo, por se ter considerado que o ajuizado contrato não afronta o disposto no art. 19º, nºs 1, 2 al. b) e 8 do DL nº 211/2004, de 20.08, nem desrespeita a regra vertida no art. 8º, al. c) do DL nº 446/85, de 25.10.
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IV.2.1 – Da nulidade do contrato por falta de identificação do negócio visado pelo exercício de mediação
Em consonância com o quadro factual apurado, autora e réu celebraram, em 5 de maio de 2011, o contrato que denominaram de “mediação imobiliária” que foi apresentado como documento nº 1 junto com a petição inicial.
Este tipo contratual tem sido uniformemente considerado pela doutrina e pela jurisprudência como um contrato de prestação de serviços, sendo definido como o negócio pelo qual uma parte (o mediador) se vincula para com a outra (o comitente ou solicitante) a, de modo independente e mediante retribuição, preparar e estabelecer uma relação de negociação entre este último e terceiros (os solicitados) com vista à eventual conclusão definitiva de negócio jurídico.
Assim, para que exista essa mediação, tem o mediador que ter recebido uma incumbência, expressa ou tácita, para certo negócio. Ou seja, tem que haver um acordo entre mediador e solicitante no sentido do primeiro servir de intermediário num ou mais contratos a celebrar pelo último com terceiros, preparando e aproximando as respetivas partes, devendo a conclusão do negócio entre o comitente e o terceiro ser consequência da atividade do mediador/intermediário[11].
No caso vertente, todos os descritos elementos essenciais se mostram presentes na relação contratual firmada entre as partes, posto que, por mor do vínculo assim estabelecido, a autora, a solicitação do réu, aceitou promover e mediar a venda ou permuta, em regime de exclusividade, de dois imóveis pertencentes a este último pelo valor de €625.000,00, ficando outrossim convencionado que pagaria, a título de remuneração pelos serviços prestados de mediação imobiliária, a quantia correspondente a 5% do preço pelo qual o negócio fosse efetivamente concretizado, valor a que acresceria IVA à taxa legal em vigor.
Perante tal qualificação jurídica do ajuizado contrato, importa, pois, dilucidar se o mesmo enferma dos vícios formais que lhe são assacados pelo apelante.
Considerando que, por força da regra enunciada na 1ª parte do nº 2 do art. 12º do Cód. Civil, as condições de validade formal dos contratos são regidas pela lei em vigor ao tempo da sua celebração (tempus regit actum), segue-se que na apreciação de tal questão haverá que convocar o regime vertido no DL nº 211/2004, de 20.08, por ser aquele que se encontrava em vigor à data em que foi firmado o negócio entre as partes.
Ora, à luz de tal diploma, o contrato de mediação imobiliária é de natureza formal, como indelevelmente resulta dos nºs 1 e 8 do seu art. 19º, já que obrigatoriamente tem de revestir a forma escrita e dele tem de constar, sob pena de nulidade[12], as menções indicadas no seu nº 2, entre as quais se conta, no que ao caso releva, “a identificação do negócio visado pelo exercício da mediação” (al. b)).
Procedendo à exegese do documento que ficou a suportar as declarações negociais das partes, dele emerge que no local destinado à identificação do objeto do negócio visado (cfr. nº 1 da cláusula 2ª) não foi feita essa indicação através de aposição de cruz em alguma das quadrículas aí constantes com esse desiderato[13].
Apesar dessa omissão, certo é que aí se fez expressa referência ao valor do negócio visado pelo contrato de mediação (concretamente €625.000,00), o que, pelo montante envolvido, permite inferir, em termos de normalidade (id quod plerumque accidit), que esse negócio somente poderia reportar-se a uma compra e venda ou a uma permuta.
Como quer que seja - mesmo na hipótese de se admitir a existência de omissão da indicação mencionada na citada al. b) do nº 2 do art. 19º do DL nº 211/2004 -, concordamos com o sentido decisório sufragado na decisão recorrida quando, tendo por referência o substrato factual apurado (concretamente factos provados D, E, F e G), afirma que a invocação desse vício por banda do réu consubstancia um abuso de direito.
Como aí se refere, malgrado no ajuizado contrato não esteja identificado expressamente o negócio visado pelo exercício da atividade de mediação da autora, facto é que o réu aceitou que esta «o cumprisse, procurasse e encontrasse um interessado na aquisição dos seus prédios, que lhe foi apresentado e com quem passou a negociar, até celebrar um contrato promessa. Passou, assim, a atuar para com a autora em termos de gerar nesta a razoável expectativa de que não considerava o contrato inválido».
A propósito de tal temática, como é consabido, vem sendo objeto de controvérsia[14] saber se a invocação da nulidade por vício de forma pode ser excluída por aplicação da cláusula geral do abuso do direito, preconizando-se, maioritariamente, que só caso a caso, perante as particularidades de cada situação se poderá aferir se o contraente que invoca tal vício excede ou não manifestamente os limites impostos pela boa-fé.
Como deflui do art. 334º do Cód. Civil, com a reprovação do abuso do direito procura-se que se não desvirtue o verdadeiro sentido da norma abstrata que o confere. Visa-se, pois, evitar o exercício anormal, em termos reprováveis, do direito próprio, só formalmente adequado ao direito objetivo e, portanto, sancionam-se os manifestos abusos no exercício do direito, numa direção ilegítima ou para fim diverso daquele para que foi atribuído ao seu titular[15].
Do exposto decorre que a censura do exercício abusivo do direito não pretende suprimir ou extinguir o direito, mas apenas impedir que o seu titular o exerça numa direção ilegítima, visando, deste modo, manter o seu exercício em moldes adequados a um salutar equilíbrio de interesses, requerido pela boa-fé, pelos bons costumes e pelo fim social e económico do direito.
No entanto, tal como salienta GALVÃO TELLES[16], à verificação do exercício abusivo do direito não é necessário que o agente tenha consciência do seu procedimento ser abusivo; basta que o seja na realidade, sendo certo, todavia, que o citado inciso normativo impõe que tal abuso seja manifesto, que o titular do direito ultrapasse de forma evidente ou inequívoca “os limites impostos pela boa- fé, pelos bons costumes ou pelo fim social ou económico desse direito”, não bastando que o exercício do direito cause prejuízos a outrem, visto que a atribuição de direitos traduz deliberadamente a supremacia de certos interesses sobre outros interesses com eles conflituantes.
Isto posto, como resulta da posição assumida nos autos pela autora (e que foi secundada pela sentença sob censura), advoga esta, como forma de neutralizar a invocação por parte do demandado da nulidade do contrato que com ele celebrou, a ocorrência de um venire contra factum proprium.
Tal como vem sendo assinalado, a censura do venire contra factum proprium supõe que o titular do direito criou naquele com quem entre em relação uma situação de confiança que veio a frustrar por conduta posterior contrária à que motivou essa confiança. A confiança digna de tutela deve ser objetivamente motivada, sendo, pois, aquela que resulte de uma apreciação objetiva do conjunto dos atos e comportamentos das partes no quadro económico e social em que se desenvolve o processo de constituição e exercício das relações jurídicas entre elas. Essa confiança deve assim filiar-se em conduta da outra parte que, objetivamente considerada, revele intenção de se vincular a determinado modo de agir futuro, sendo nessa conduta concludente que a contraparte cria expectativas legítimas, nela confiando e investindo, orientando a sua vida em conformidade.
Na verdade, contraria o princípio da boa-fé que alguém exerça um direito em contradição com conduta anteriormente assumida, frustrando as legítimas expectativas da outra parte que adquiriu convicção fundada de que aquele não viria a adotar conduta contrária no futuro[17].
Destarte, como vem sendo consistentemente defendido[18], os efeitos do abuso de direito nesta especial modalidade exige a verificação dos seguintes pressupostos:
. uma situação objetiva de confiança: uma conduta de alguém que de facto possa ser entendida como uma tomada de posição vinculante em relação a dada situação futura;
. investimento na confiança: o conflito de interesses e a necessidade de tutela jurídica surgem quando uma contraparte, com base na situação de confiança criada, toma disposições ou organiza planos de vida de que lhe surgirão danos se a confiança legítima vier a ser frustrada;
. boa-fé da contraparte que confiou: a confiança do terceiro ou da contraparte só merecerá proteção jurídica quando de boa-fé e tenha agido com cuidado e precaução usuais no tráfico jurídico.
Ora, tendo em conta os elementos que podem ser colhidos nos autos, afigura-se-nos que, em concreto, a arguição da nulidade formal feita pelo réu está a ser exercido em contradição com a sua conduta anterior, posto que aceitou que a autora levasse a cabo a convencionada atividade de promoção, na sequência da qual acabou até por celebrar contrato promessa de permuta com entidade que lhe foi apresentada por aquela.
Acresce, por outro lado, que tendo sido efetivamente executada a obrigação contratual por banda da autora nos termos convencionados, não se antolha em que medida a referida omissão no texto negocial tenha importado desproteção ou prejuízo do réu face à empresa mediadora autora, sendo certo outrossim que até ao momento da apresentação da sua contestação no âmbito do presente processo (ou seja, durante quase três anos) não manifestou, de qualquer forma, o propósito de pôr em crise a validade formal do ajuizado contrato.
O descrito comportamento é claramente indiciador de que o réu aceitou o negócio em questão, podendo, pois, razoavelmente concluir-se ter gerado na demandante a fundada expectativa da não invocação do vício e de que procederia ao pagamento da remuneração acordada[19].
Como assim, a invocação pelo réu da nulidade do contrato de mediação imobiliária, já após a conclusão do negócio visado pelo exercício da mediação, em contraste com a sua anterior atitude - ao beneficiar dos serviços prestados pela autora em execução daquele contrato e ao aceitar realizar, pelo preço ajustado, contrato promessa de permuta com entidade angariada pela autora mediadora – traduz, objetivamente, um comportamento abusivo, na modalidade de venire contra factum proprium.
Daí que, pelo funcionamento do instituto do abuso do direito, sempre estaria vedado ao réu invocar a referida nulidade formal[20].
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IV.2.2 – Da nulidade do contrato por inobservância do disposto no art. 8º, al. c) do DL nº 446/85, de 25.10
O apelante esgrime ainda (e novamente) o argumento de que a parte final do nº 1 da 5ª cláusula contratual, por afrontar o disposto na al. c) do art. 8º do DL nº 446/85, de 25.10, importa a nulidade do contrato.
Dispõe o referido preceito legal que “consideram-se excluídas dos contratos singulares as cláusulas que, pelo contexto em que surjam, pela epígrafe que as precede ou pela sua apresentação gráfica, passem despercebidas a um contratante normal, colocado na posição do contratante real”.
Portanto, em consonância com o transcrito segmento normativo[21], os contratos devem dispor de uma apresentação gráfica que permita a sua leitura fácil por um leitor de acuidade média, o que demanda a utilização de carateres de tamanho tal que possam ser lidos sem necessidade de um esforço excessivo de visão, ou seja, que não constituam obstáculo a uma leitura integral sem necessidade de paragens.
Ora, no caso vertente, a matéria atinente a esta questão foi objeto de apreciação durante a instrução do processo, tendo o tribunal a quo considerado não provado que «O Réu não se apercebeu da parte final da cláusula 5ª, n.º 1, do acordo referido em B e C, a qual passa despercebida a qualquer contraente» (al. c).
De qualquer modo, da visualização do texto do contrato não se nos afigura que o tamanho da letra utilizada na redação da mencionada cláusula (sensivelmente análoga à que foi usada no restante clausulado – que, note-se, não foi posto em crise) seja de molde a obstaculizar a sua integral leitura, exigindo um esforço excessivo da visão.
Por conseguinte, carece de fundamento a invocação, in casu, dos apreciados vícios formais.
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IV.3 - Saber se, mau grado permaneça inalterada a decisão sobre a matéria de facto, se mostra corretamente efetuada a sua subsunção jurídica
Considerando que não se procedeu à alteração da matéria de facto, importa, ainda assim, dilucidar se existe razão válida para alterar a decisão de direito.
No caso sub judicio, como se referiu, a autora fez ancorar a concreta pretensão de tutela jurisdicional que aduz nestes autos tendo por base o inadimplemento contratual por banda do réu, já que, apesar de ter cumprido a sua prestação debitória, este recusa, infundadamente, proceder ao pagamento da comissão devida.
Tal pretensão de tutela mostra-se perfeitamente fundada à luz da materialidade provada, como, aliás, foi reconhecido no ato decisório censura em termos que merecem a nossa concordância.
Na verdade, em conformidade com o tecido fáctico apurado, por mor do contrato que celebrou com o demandado, a autora, no exercício da sua atividade de mediação imobiliária[22], promoveu, publicitou e mediou a venda/permuta, em regime de exclusividade, de dois imóveis pertencentes àquele pelo valor de €625.000,00.
Na sequência desse labor, em 30 de Junho de 2011, o réu, por si e como procurador de sua mulher, veio a celebrar com uma sociedade comercial angariada pela demandante um contrato promessa de permuta desses imóveis por bens imóveis futuros no valor global de 625.000,00€, sendo de registar, contudo, que posteriormente não foi formalizado o respetivo contrato prometido dado que o réu, com a anuência da promitente permutante, decidiu pôr termo àquele contrato.
Perante o descrito quadro, a questão que se coloca é a de saber se a demandante tem título (entendida a expressão no seu sentido civilístico, isto é, enquanto fundamento ou causa da titularidade de determinado direito) que legitime o pedido condenatório do réu apelante no pagamento da remuneração ajustada pelos serviços de mediação imobiliária (concretamente 5% sobre o preço pelo qual o negócio fosse efetivamente concretizado, valor a que acresceria IVA à taxa legal em vigor).
É certo que, por via da regra enunciada no nº 1 do art. 18º do DL nº 211/2004, essa remuneração somente é devida com a conclusão e perfeição do negócio visado pelo exercício da mediação.
Portanto, mesmo que a mediadora se tenha empenhado na busca de interessados na conclusão do negócio, se este não se concretizar, não haverá, pois, lugar a remuneração, suportando, então, aquela o risco da sua atividade comercial[23].
Há, porém, exceções a essa regra, as quais se mostram enunciadas no nº 2 do citado normativo.
Desde logo, em conformidade com o disposto na sua al. b), nas situações em que “tenha sido celebrado contrato-promessa relativo ao negócio visado pelo contrato de mediação, nos quais as partes podem prever o pagamento da remuneração após a celebração”.
Ora, no caso em apreço, foi estipulado entre as partes a antecipação da remuneração para o momento da celebração do contrato-promessa (cfr. 5ª cláusula contratual), pelo que, primo conspectu, com a formalização com terceiro interessado[24] angariado pela autora do contrato que se mostra documentado de fls. 14 a 21 dos autos, adquiriu esta o direito à remuneração convencionada[25].
Acresce que, por mor do disposto na al. a) do nº 2 do citado art. 18º, se tiver sido acordada a mediação imobiliária para a concretização do negócio em regime de exclusividade entre o mediador e o proprietário do imóvel - como sucede no caso (cfr. 4ª cláusula contratual) -, o direito à remuneração do mediador que tiver sido acordada também existe, independentemente desse facto, desde que essa não concretização do negócio se fique a dever a causa imputável ao proprietário cliente do mediador.
Tal não significa, porém, que o mediador num contrato com exclusividade fique desonerado de praticar os atos de mediação adequados a promover e facilitar a concretização do negócio.
Bem ao contrário, o direito à remuneração implica a execução da prestação contratual a que o mediador se obrigou, nomeadamente a prática dos atos adequados a conseguir que seja atingido o objetivo do contrato – a concretização e perfeição do negócio visado com a mediação – e que tal objetivo só não seja atingido por conduta impeditiva do cliente, o que traduz e acentua a existência da relação causal entre as condutas do proprietário e do mediador e a concretização do negócio visado pela mediação.
De facto, constitui entendimento pacífico na casuística[26] que no contrato de mediação imobiliária a regra é a de que a remuneração da empresa mediadora só é devida com a conclusão e perfeição do negócio visado pelo exercício da mediação, ou seja, que a comissão do mediador apenas é devida quando a sua atividade tenha contribuído, de forma determinante (causal), para a celebração (e perfeição) do negócio, por via da aproximação do comitente com terceiros para o efeito.
Registe-se, de qualquer modo, que pese embora se venha afirmando a necessidade desse nexo causal, vem-se igualmente defendendo que a existência de um contrato de mediação em regime de exclusividade autoriza a presunção (de facto) de que a atividade da empresa mediadora contribuiu para a aproximação entre o comitente e terceiros, facilitando o negócio (ou seja, presunção de existência do nexo causal), sendo devida a remuneração[27].
Por isso, visando a cláusula de exclusividade, de facto, proteger o interesse da empresa mediadora em só ela diligenciar no sentido da realização do negócio intencionado, de modo a garantir a remuneração dos atos materiais que, para tanto, leve a cabo, compreende-se a solução legal vertida na al. a) do nº 2 do citado art. 18º de que o cliente não pode fazer cessar unilateralmente o contrato, sem justa causa. Se o pudesse, a cláusula seria de todo ineficaz.
Como assim, considerando que no caso vertente a autora cumpriu a sua prestação contratual, e uma vez que a sua remuneração depende apenas do cumprimento da sua obrigação e do sucesso desta, assiste-lhe, pois, o direito a receber a sua remuneração, posto que o negócio visado apenas se não concretizou por causa imputável ao réu.
Na verdade, como bem se refere na decisão recorrida, «é certo que o contrato prometido não se realizou, nem se realizará, pois o Réu revogou, juntamente com a promitente compradora, o contrato promessa em apreço.
Para esta revogação não contribuiu, pelo menos tendo em conta os factos provados, a Autora – e nada o Réu alegou nesse sentido, mormente imputando-lhe factos dolosos ou negligentes, mormente ao nível de informações prestadas, demonstrativos de que a mesma o levara a concluir um negócio “ruinoso”, tanto mais que o proprietário dos prédios era e é o Réu e seria e será ele quem em melhores condições está para saber a situação jurídica dos mesmos (tendo inclusivamente afirmado no contrato referido em B e C que os prédios se encontravam livres de ónus e encargos) e o seu estado actual –, podendo dizer-se ainda, então, que a remuneração sempre lhe é devida, uma vez que esta tem lugar no caso em que o negócio visado, no âmbito de um contrato de mediação celebrado, em regime de exclusividade, com o proprietário do imóvel, não se concretiza por causa imputável ao cliente da empresa mediadora, tendo ainda assim esta direito a remuneração (art. 18º, n.º 2, al. a), do D.L. n.º 211/2004).
No caso presente, o contrato de compra e venda / permuta não se concretizou, é certo; mas não se concretizou porque o Réu, com o acordo da promitente compradora, fez cessar o contrato promessa celebrado, na sequência das diligências levadas a cabo pela Autora, no âmbito do contrato de mediação imobiliária celebrado com o Réu, com o que se preenche a aludida alínea, tanto mais que, como se disse, não resultou provado (até porque nem sequer foi alegado) que esta revogação se deve a acto negligente ou doloso praticado pela Autora, no sentido de levar o Réu a celebrar com a sociedade Construções D…, Lda. um negócio “ruinoso”.
Por tal razão, o facto de não haver sinal prestado não obsta ao pagamento do preço devido pelos serviços prestados pela Autora; tal factualidade é inócua, atento o preenchimento da al. a) do n.º 1 do art. 18º do diploma legal citado: foi a desistência voluntária do Réu (e imotivada – pelo menos em termos de factos alegados e provados nesta acção - no que concerne à intervenção da Autora na celebração do contrato promessa e na execução do contrato de mediação imobiliária celebrado com o Réu), quanto ao contrato promessa celebrado, desistência com a qual a promitente compradora acordou, tendo sido indemnizada das despesas já suportadas, que impediu a concretização do negócio visado.
Acresce que, tendo sido celebrado um contrato promessa de permuta e não um contrato promessa de compra e venda, a inexistência de sinal aparece como normal e previsível, não parecendo possível entender-se que, nestas circunstâncias, as partes, ao acordarem a cláusula 5ª do contrato referido em B e C, tenham querido afastar o pagamento da remuneração da celebração do contrato promessa; é esta, cremos, a melhor interpretação a dar a esta cláusula, atendendo ao disposto no art. 236º, n.º 1, do Código Civil».
Portanto, em resultado do exposto, encontra-se o réu constituído no dever contratual de proceder ao pagamento da remuneração acordada, a que acresce o IVA à taxa legal devida (nos termos estabelecidos nos arts. 1º, al. a), 7º, nº 1 al. b), 8º, nº 1 e 29º, nº 1 al. b), todos do CIVA).
De igual modo, contrariamente ao entendimento sufragado pelo apelante, a taxa de juros moratórios a considerar será a taxa supletiva comercial referida no art. 102º, § 3º, do Código Comercial e não a taxa supletiva dos juros civis definida pela Portaria nº 291/2003, de 8.04.
Com efeito, como enfatiza CASSIANO DOS SANTOS[28], a razão de ser da existência de juros moratórios comerciais nada tem a ver com o devedor, mas tem tudo a ver com o credor: seja o devedor consumidor ou não o seja, a razão continua a ser a mesma; num caso ou noutro (mas já não quando, por exemplo, se trate de atos não comerciais praticados por comerciantes), a razão radica na necessidade de “compensar especialmente as empresas pela imobilização de capitais, pois que, para elas o dinheiro tem um custo mais elevado do que em geral, na medida em que deixam de o poder aplicar na sua atividade, da qual extraem lucros, ou têm mesmo de recorrer ao crédito bancário”. Em suma, a obrigação de pagamento de juros comerciais respeita a todos os atos comerciais e continua a ser independente da natureza da pessoa do obrigado.
Portanto, in casu, independentemente de o ato não ser subjetivamente comercial do lado do comitente, porque a empresa que medeia é uma sociedade comercial e porque os atos por ela praticados são também comerciais (cfr. arts. 2º, 13º e 99º do Cód. Comercial), o ato é comercial e são devidos os juros de mora à taxa supletiva comercial referida no citado art. 102º, § 3º do Cód. Comercial[29], contados desde a data em que ocorreu o vencimento da obrigação (o que, em consonância com o contratualmente definido – cfr. § 2º do nº 2 da 5ª cláusula contratual -, se verificou no dia 30 de junho de 2011) até efetivo pagamento.
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V- DECISÃO
Pelos fundamentos acima expostos, acordam os Juízes deste Tribunal da Relação em julgar a apelação improcedente, confirmando-se a decisão recorrida.
Custas do recurso a cargo do apelante (art. 527º, nºs 1 e 2).

Porto, 27.03.2017
Miguel Baldaia de Morais
Jorge Seabra
Sousa Lameira
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[1] Diploma a atender sempre que se citar disposição legal sem menção de origem.
[2] Tem sido alvo de discussão saber se essa indicação deva ser feita nas conclusões das alegações ou se se bastará com a sua indicação no corpo das alegações, sendo este último entendimento o que vem merecendo maior acolhimento na casuística – cfr., por todos, acórdão do STJ de 16.03.2011 (processo nº 263/1999.P1.S1), disponível em www.dgsi.pt.
[3] Para além dessas razões, tem igualmente sido apresentado como fundamento justificativo do cumprimento dessa imposição a necessidade de o recorrente motivar, fundadamente, o seu recurso, visando evitar, também por essa via, o uso abusivo e injustificado da faculdade de impugnar a decisão relativa à matéria de facto.
[4] Cfr., neste sentido, inter alia, acórdão do STJ de 25.11.2014 (revista nº 100482/10.6YIPRT.G1), acórdão desta Relação de 13.10.2015 (processo nº 1272/12.3TVPRT.P1), acórdão da Relação de Guimarães de 29.09.2014 (processo nº 81001/13.0YIPRT) e acórdãos da Relação de Coimbra de 6.12.2012 (processo nº 169487/08.3YIPRT-A), de 17.12.2014 (processo nº 6213/08.TBLRA) e de 10.02.2015 (processo nº 2466/11.4TBFIG), todos disponíveis em www.dgsi.pt, escrevendo-se neste último que “o sistema atual de registo de prova é o que minimiza, por comparação com a leitura, fria e inexpressiva da transcrição, os inconvenientes da assunção, pelo tribunal de recurso, dessa prova, sem a atuação, em toda a sua extensão, dos princípios da oralidade e da imediação. E são estes princípios que saem otimizados através da interpretação de harmonia com o qual o indicado ónus de impugnação do recorrente se cumpre com a indicação precisa das passagens da gravação e não através da transcrição, integral ou não, da prova produzida oralmente na audiência”.
[5] Prolatado no processo nº 272733/11.1YIPRT, disponível em www.dgsi.pt.
[6] Como tem sido assinalado pela doutrina – cfr., inter alia, TEIXEIRA DE SOUSA, ob. citada, pág. 414 e seguinte, o controlo efetuado pela Relação sobre a decisão da 1ª instância relativa à matéria de facto pode revestir, segundo a sua finalidade, três modalidades: esse controlo pode visar a reponderação da decisão proferida (porque não há elementos novos trazidos ao processo), o reexame da decisão (em que o julgamento do tribunal ad quem assenta em elementos novos) ou a anulação da decisão.
[7] Cfr., neste sentido, acórdão do STJ de 15.09.2011 (processo nº 1079/07.0TVPRT.P1.S1), de 2.12.2013 (processo nº 34/11.0TBPNI.L1.S1) e de 22.10.2015 (processo nº 212/06), acórdãos desta Relação de 5.11.2012 (processo nº 434/09.5TTVFR.P1) e de 17.03.2014 (processo nº 3785/11.5TBVFR.P1) e acórdãos da Relação de Guimarães de 15.09.2014 (processo nº 2183/12.TBGMR.G1) e de 15.10.2015 (processo nº 132/14.8T8BCL.G1), todos disponíveis em www.dgsi.pt.
[8] Impugnação e reapreciação da decisão da matéria de facto, pág. 4 e seguinte, trabalho disponível em www.cjlp.org/materias/Ana_Luisa_Geraldes_Impugnacao_e_Reapreciacao_da_Decisao_da_Materia_de_Facto.pdf.
[9] Processo nº 1079/07.0TVPRT.P1.S1. No mesmo sentido se pronunciaram, inter alia, os acórdãos do STJ de 2.12.2013 (processo nº 34/11.0TBPNI.L1.S1) e de 22.10.2015 (processo nº 212/06), acórdãos desta Relação de 5.11.2012 (processo nº 434/09.5TTVFR.P1) e de 17.03.2014 (processo nº 3785/11.5TBVFR.P1) e acórdãos da Relação de Guimarães de 15.09.2014 (processo nº 2183/12.TBGMR.G1) e de 15.10.2015 (processo nº 132/14.8T8BCL.G1), todos disponíveis em www.dgsi.pt.
[10] A este propósito, a doutrina, praticamente una voce, tem considerado que o incumprimento de tal ónus implica a rejeição do recurso, na parte respeitante, sem possibilidade sequer de introdução de despacho de aperfeiçoamento – cfr., por todos, ABRANTES GERALDES, ob. citada, pág. 134 e AMÂNCIO FERREIRA, ob. citada, pág. 170; LOPES DO REGO, ob. citada, vol. I, pág. 585 e LEBRE DE FREITAS, Código de Processo Civil Anotado, vol. III, 2ª edição, pág. 62. Idêntico entendimento tem sido trilhado na jurisprudência, de que constituem exemplo, inter alia, os acórdãos do STJ de 9.02.2012 (processo nº 1858/06.5TBMFR. L1.S1), de 22.09.2011 (processo nº 1368/04.5TBBNV.S1), de 15.09.2011 (processo nº 455/07.2TBCCH.E1.S1), de 21.06.2011 (processo nº 7352/05.4TCLRS.L1.S1), acórdãos da Relação de Lisboa de 13.03.2014 (processo nº 569/12.7TVLSB.L1) e de 12.02.2014 (processo nº 26/10.6TTBRR.L1) e acórdão da Relação de Guimarães de 12.06.2014 (processo nº 1218/10.3TBBCL.G1), todos disponíveis em www.dgsi.pt.
Registe-se que sobre esta temática, ainda que no domínio da jurisdição penal, o Tribunal Constitucional já foi chamado a pronunciar-se (v.g. acórdão nº 259/2002, publicado no Diário da República, II série, de 13.12.2002), decidindo pela compatibilidade constitucional de uma solução legislativa segundo a qual a falta de cumprimento dos ónus que impendem sobre o recorrente que pretenda impugnar a matéria de facto tem como efeito o não conhecimento dessa matéria e a improcedência do recurso nessa parte, sem que ao recorrente seja dada a oportunidade de suprir esses vícios.
[11] A este propósito LACERDA BARATA (Contrato de Mediação, em Estudos do Instituto de Direito do Consumo, I, pág. 192 e seguintes) considera como elementos essenciais deste contrato os seguintes: i) obrigação de aproximação de sujeitos; ii) atividade tendente à celebração do negócio; iii) imparcialidade; iv) ocasionalidade e v) retribuição.
[12] Conforme se vem entendendo, trata-se, contudo, de uma nulidade atípica, uma vez que apenas o comitente a pode invocar, não sendo de conhecimento oficioso – cfr., por todos, acórdãos do STJ de 10.04.2008 (processo n.º 52/08) e de 03.07.2008 (processo n.º 1727/08) e acórdão desta Relação de 07.09.2010 (processo nº 8/07.5TBABF.P1), disponíveis em www.dgsi.pt.
[13] Nessas quadrículas é feita referência a: i) compra ou permuta; ii) trespasse; iii) arrendamento; iv) outro negócio.
[14] Cfr., sobre a questão, CARLOS MOTA PINTO, Teoria Geral do Direito Civil, págs. 437 e seguintes; HEINRICH HÖRSTER, Teoria Geral do Direito Civil, págs. 285 e seguinte; PAIS DE VASCONCELOS, Teoria Geral do Direito Civil, pág. 666 e MENEZES CORDEIRO, Tratado de Direito Civil Português, Tomo IV, págs. 299 e seguintes, que expressamente afirma ser possível que “em nome da boa-fé, se possa bloquear a invocação de invalidades formais quando as mesmas forem determinadas por um contraente que, depois de aproveitar as vantagens do contrato, vem invocar a nulidade delas emergente. O reconhecimento de que este comportamento traduz abuso do direito funciona, então, através da chamada figura das inalegabilidades formais”.
[15] Cfr., neste sentido, MENEZES CORDEIRO, ob. citada, Tomo IV, págs. 238 e seguintes e CUNHA DE SÁ, Abuso do direito, págs. 171 e seguintes.
[16] In Direito das Obrigações, pág. 6.
[17] Cfr., neste sentido, BAPTISTA MACHADO, Tutela da confiança e venire contra factum proprium, Obra Dispersa, Vol. I, págs. 345 e seguintes.
[18] Cfr., por todos, BAPTISTA MACHADO, ob. citada, págs. 418 e seguintes; MENEZES CORDEIRO, Tratado de Direito Civil Português – Parte Geral, Vol. IV, págs. 184 e seguintes e EVA MOREIRA DA SILVA, Da responsabilidade pré-contratual por violação dos deveres de informação, págs. 45 e seguintes.
[19] A este respeito, não será, aliás, despiciendo salientar que, ainda que operasse a nulidade, sempre o réu, por mor do regime vertido no nº 1 do art. 289º do Cód. Civil, teria de proceder ao pagamento da “remuneração convencionada”. Com efeito, como se sublinha no acórdão do STJ de 11.02.2010 (processo nº 2044/07.2TBFAR.E1.S1, disponível em www.dgsi.pt), «não podendo o “cliente” restituir em espécie os serviços prestados pela entidade mediadora, o melhor critério para achar o valor daqueles é o comitente pagar a acordada comissão».
[20] A mesma solução vem sendo adotada, em análogas situações, pela jurisprudência claramente majoritária, de que constituem exemplo, inter alia, acórdão do STJ de 11.2.2010 (processo nº 2044/07.2TBFAR.E1.S1), acórdãos da Relação de Lisboa de 22.05.2012 (processo nº 118406/10.9YIPRT.L1-1), de 18.09.2007 (processo nº 8722/2006-1) e de 09.03.2004 (processo nº 7282/2003-1) e acórdão desta Relação de 20.03.2007 (processo nº 0720378), todos disponíveis no sítio www.dgsi.pt.
[21] Do qual resulta que, ao invés do entendimento sufragado pelo apelante, a sua eventual inobservância, por via de regra (cfr. art. 9º do DL nº 446/85), não importa a nulidade do contrato, afetando tão-somente a cláusula “viciada”.
[22] A definição da atividade imobiliária é dada pelo art. 2º do DL nº 211/2004, nos termos do qual “a atividade de mediação imobiliária é aquela em que, por contrato, uma empresa se obriga a diligenciar no sentido de conseguir interessado na realização de negócio que vise a constituição ou aquisição de direitos reais sobre bens imóveis, a permuta, o trespasse ou o arrendamento dos mesmos ou a cessão de posição em contratos cujo objeto seja um bem imóvel”.
[23] Como ressalta HIGINA ORVALHO CASTELO (in O contrato de mediação, págs. 397 e seguinte), no contrato de mediação, “para além da atividade suscetível de alcançar o resultado correspondente ao interesse do credor, existe um acontecimento final que desempenha um especial papel no contrato, na medida em que é condição necessária do nascimento do direito do mediador à remuneração. Este acontecimento não pode consubstanciar a obrigação do mediador uma vez que está fora da sua disponibilidade, dependendo do conjunto das vontades do cliente e do terceiro angariado”; em análogo sentido se pronuncia LACERDA BARATA, op. citada, pág. 201 e seguinte, referindo que a conclusão do contrato visado não marca apenas o momento em que a remuneração é devida, sendo, mais do que isso, uma circunstância sem a qual não nasce para o mediador o direito à remuneração, estando assim “em causa mais do que a mera exigibilidade, é da própria constituição do direito que se trata”.
[24] Nos termos da al. a) do nº 4 do art. 2º do DL nº 211/2004 considera-se interessado o terceiro angariado pela empresa de mediação, desde que esse terceiro venha a concretizar o negócio visado pelo contrato de mediação”.
[25] Cfr., sobre a possibilidade de antecipação da remuneração ou de parte dela para o momento da celebração do contrato-promessa, inter alia, acórdão desta Relação de 15.02.2012 (processo nº 1988/09.1TBPFR.P1) e acórdão da Relação de Évora de 17.03.2005 (processo nº 873/04-2), ambos disponíveis em www.dgsi.pt.
[26] Cfr., inter alia, acórdãos do STJ de 07.04.2011 (processo nº 393/05.3TCFUN.L1.S1) e de 19.05.2009 (processo nº 5339/06.9TVLSB), acórdão da Relação de Lisboa de 14.04.2011 (processo nº 5500/05.3TJLSB.L1-6) e acórdãos da Relação de Coimbra de 24.03.2015 (processo nº 811/13.7TBVIS.C1) e de 17.12.2014 (processo nº 242/11.3TBNZR.C1), disponíveis em www.dgsi.pt.
[27] Assim, acórdão do STJ de 10.10.20102 (processo nº 02B2469) e acórdão da Relação de Lisboa de 8.04.2010 (processo nº 2983/07.0TJLSB.L1-8), acessíveis em www.dgsi.pt.
[28] In Direito Comercial, vol. I, pág. 179.
[29] Cfr., neste sentido, acórdãos da Relação de Coimbra de 19.10.2010 (processo nº 286652/08.0YIPRT.C1), de 6.07.2010 (processo nº 3458/08.6TJCBR.C1) e acórdão da Relação de Lisboa de 8.03.2012 (processo nº 1724/09.2T2AMD.L1-2), disponíveis em www.dgsi.pt.